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PROFª: GISELE DE JESUS NUNES SOARES

Educação especial
SUMÁRIO

CAPÍTULO 1: Educação especial: conceitos, definições e princípios fundamentais

1.1 História da educação inclusiva no sistema educacional mundial e brasileiro

1.2 Etapas históricas da educação inclusiva

CAPÍTULO 2: Panorama histórico das concepções sociais e educacionais das pessoas com deficiência

2.1 Questão legal

CAPÍTULO 3: Deficiência física e auditiva

3.1 Tipos de deficiências físicas

3.2 Causas das deficiências físicas

3.3 Adaptações

3.4 Deficiência auditiva

3.4.1 Tipos de deficiência auditiva

3.4.2 Classificação

3.4.3 Causas da deficiência auditiva

3.4.4 Deficiência auditiva sensório-neural

3.4.5 Adaptações

3.4.6 Como evitar

3.4.7 O que fazer

3.4.8 Observações para o professor

CAPÍTULO 4: Deficiências visuais, mentais e sensoriais, surdo-cegueira, autismo, síndrome de Down

4.1 A Deficiência visual

4.1.1 Classificação

4.1.2 Causas: fatores de risco

4.1.3 Identificação

4.1.4 Adaptações

4.2 Deficiência mental

4.2.1 Causas

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Educação especial
4.3 Surdo-cegueira e múltipla deficiência sensorial

4.4 Autismo

4.4.1 Tratamento

4.5 Síndrome de Down

CAPÍTULO 5: Atendimento educacional de alunos com necessidades educacionais especiais

5.1 Um olhar sobre as políticas públicas da educação brasileira

CAPÍTULO 6: Integração e inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais

6.1 Integração e inclusão

6.2 Revisando as terminologias

6.3 Algumas conceitualizações

CAPÍTULO 7: Estrutura, funcionamento e legislação da educação especial no Brasil

7.1 A educação especial nas leis dos governos e dos órgãos internacionais

7.2 Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)

7.3 Declaração de Jomtien (confederação mundial sobre educação para todos – Tailândia, 1990)

7.4 Declaração de Salamanca (Confederação Mundial sobre necessidades educacionais especiais – Espanha, 1994)

7.5 Declaração da Guatemala (Convenção Interamericana para a eliminação de todas as formas de discriminação contra as
pessoas portadoras de deficiência, 1999)

7.6 Constituição Federal (1988)

7.7 Lei n. 7.853/89

7.8 Estatuto da Criança e do Adolescente (eca – 1990)

7.9 Lei n. 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)

7.10 Decreto n. 3.298/99

7.11 Resolução CNE/CEB n. 2/01

7.12 Resolução CNE/CEB n. 56/03

CAPÍTULO 8: Proposta de inclusão educacional e aceitação da diversidade

8.1 Desafios para incluir

8.2 Identidade versus diferença

CAPÍTULO 9: Diversidade, deficiência e cidadania

9.1 Educação inclusiva: mitos e verdades

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Educação especial
9.2 Política de inclusão: implicações e contradições

CAPÍTULO 10: Adaptações curriculares para alunos com necessidades especiais

10.1 Diretrizes curriculares: políticas afirmativas

10.2 Modelo de atendimento à diversidade nos ambientes educacionais

10.3 Diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica – Resolução 02/ 2001

CAPÍTULO 11: O professor e o processo de inclusão

11.1 Formação de educadores na educação inclusiva: construindo a base de todo processo

CAPÍTULO 12: Educação inclusiva: modalidade de ensino

12.1 Organização do atendimento na rede regular de ensino

12.2 Modalidades de ensino

12.2.1 Classe comum

12.2.2 Sala de recursos multifuncionais

12.2.3 Classe especial

EMENTA
Educação Especial: conceitos, definições e princípios fundamentais. Panorama histórico das concepções sociais
e educacionais com relação às pessoas com deficiência. Alunos com necessidades educacionais especiais:
pessoas com deficiência. Atendimento educacional dos alunos com necessidades educacionais especiais.

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Educação especial
Inclusão, integração e segregação. Principais causas, prevenção e detecção das deficiências. Estrutura,
funcionamento e legislação da educação especial no Brasil. Proposta de inclusão educacional e aceitação da
diversidade. Deficiência e cidadania.
O professor e o processo de inclusão. Considerações sobre currículo e adaptações curriculares para atender
alunos com necessidades especiais.

OBJETIVOS
• Analisar a trajetória histórica da educação inclusiva no sistema educacional mundial e brasileiro.
• Apresentar conceitos e princípios da educação especial/inclusiva.
• Propiciar estudos sobre a construção da inclusão a partir da educação.
• Propiciar estudos sobre os alunos com necessidades educativas especiais.
• Apresentar a importância do educador frente à educação inclusiva.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA
MAZZOTA, Marcos José Silveira. Educação especial no Brasil: história e políticas públicas. São Paulo: Cortez,
1999.
PERRENOUD, Phillippe. Pedagogia diferenciada: das intenções à ação. Porto Alegre: Artmed, 2001.
RODRIGUES, David (Org.). Inclusão e educação, doze olhares sobre a educação inclusiva. In: CORREIA, Luis
de Miranda. Dez anos de Salamanca, Portugal e os alunos com necessidades educativas especiais. São Paulo:
Summus Editorial, 2006.
SILVA, Shirley; VIZIM, Marli. Educação Especial: múltiplas leituras e diferentes significados. São Paulo:
Mercado das Letras, 2003.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Educação inclusiva: atendimento
educacional especializado para a Deficiência Mental. Brasília, 2005.
______. Política nacional de educação especial. Brasília: SEESP, 2001.
______. Secretaria de Educação Especial. Projeto Escola Viva. Garantindo o acesso e permanência de todos os
alunos na escola – Alunos com necessidades educacionais especiais. Brasília, 2000.
CARVALHO, Rosita E. A nova LDB e a educação especial. Rio de Janeiro: WVA, 1997.
FERREIRA, Elisa Caputo; GUIMARAES, Marly. Educação inclusiva. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
GAIO, Roberta; MENEGUETTI, Rosa. Caminhos pedagógicos da educação especial. São Paulo: Vozes, 2004.
LIMA, P. A. Educação inclusiva e igualdade social. São Paulo: AVERCAMP, 2006.
SASSAKI, R. K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. Rio de Janeiro: WVA, 1997.

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Educação especial
CAPÍTULO 1: Educação especial: conceitos, definições e princípios fundamentais

1.1 História da educação inclusiva no sistema educacional mundial e brasileiro


A sociedade que pensa a educação inclusiva somente em relação à criança com necessidades especiais
engana-se ao achar que todas as outras crianças já façam parte efetivamente do processo pedagógico. Nota-se
que, mesmo com a apresentação e articulação das políticas inclusivas, há ainda no Brasil uma taxa de
analfabetismo espantosa, evasão, repetência escolar e a exclusão dos que não aprendem no mesmo ritmo e da
mesma forma que os outros.
Para começar nossas reflexões sobre a história da educação inclusiva, é interessante analisar alguns
conceitos.
O surgimento do conceito de inclusão, segundo Sassaki (2002, p. 16), é recente devido à adoção da
filosofia da inclusão social para modificar os sistemas sociais existentes. Sassaki (2002, p. 27) afirma que

[...] é imprescindível dominarmos bem os conceitos exclusivistas


para que possamos ser participantes ativos na construção de uma
sociedade que seja realmente para todas as pessoas,
independentemente de sua cor, idade, gênero, tipo de necessidade
especial e qualquer outro atributo social.

Portanto, a partir de alguns pontos de vista, a educação inclusiva pode ser considerada como

• Capacidade das escolas de atender a todas as crianças, sem


qualquer tipo de exclusão. Ou seja, inclusão significa criar escolas
que acolham todos os alunos, independentemente de suas
condições pessoais, sociais ou culturais. Escolas que valorizem as
diferenças dos alunos como oportunidades para o desenvolvimento
dos estudantes assim como dos professores, em lugar de considerá-
las um problema a resolver. (BRASIL, 2005, p. 35).

• Provisão de oportunidades eqüitativas a todos os estudantes,


incluindo aqueles com deficiências severas, para que eles recebam
serviços educacionais eficazes, com os necessários serviços
suplementares de auxílios e apoios, em classe adequada à idade,
em escolas da vizinhança, a fim de prepará-los para uma vida
produtiva como membros plenos da sociedade. (SASSAKI, 2002,
p. 122).

• Construção de uma escola aberta para todos, que respeita e


valoriza a diversidade, desenvolve práticas colaborativas, forma
leis de apoio à inclusão e promove a participação da comunidade.
(BRASIL, 2004, p. 1)

A fundamentação de uma sociedade inclusiva está pautada em uma filosofia que reconhece e valoriza a
diversidade, como característica essencial à constituição de qualquer sociedade. Por meio desse princípio ético,

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apresenta-se a necessidade de se garantir o acesso e a participação de todos a todas as oportunidades,
independentemente das peculiaridades de cada pessoa e/ou grupo social.
Segundo Booth e Ainscow, citados por Brasil (2005, p. 41-42), as características da educação inclusiva
podem ser resumidas da seguinte maneira:
• a educação implica em processos para aumentar a participação dos estudantes e reduzir sua exclusão cultural,
curricular e comunitária nas escolas locais;
• a inclusão implica em reestruturar a cultura, as políticas e as práticas dos centros educacionais, para que
possam atender à diversidade dos alunos em suas respectivas localidades;
• a inclusão se refere à aprendizagem e à participação de todos os estudantes vulneráveis que se encontram
sujeitos à exclusão, não somente daqueles com deficiências ou rotulados como apresentando necessidades
especiais;
• a diversidade não pode ser considerada um problema a resolver, mas sim uma riqueza para auxiliar na
aprendizagem de todos;
• a educação inclusiva é um aspecto da sociedade inclusiva.

1.2 Etapas históricas da educação inclusiva


Os movimentos em busca de um mundo mais justo, em que todos tenham acesso à educação, moradia,
alimentação e saúde, não são recentes. A seguir, mostraremos a trajetória de alguns movimentos que lutaram
pelo direito de ser diferente, criando normas e acordos internacionais sobre educação de qualidade para todos.
Brasil (2004, p. 10) confirma esses dados ao atestar que
A deficiência foi, inicialmente, considerada um fenômeno
metafísico, determinado pela possessão demoníaca, ou pela
escolha divina da pessoa para purgação dos pecados de seus
semelhantes. Séculos da Inquisição Católica e, posteriormente, de
rigidez moral e ética da Reforma Protestante contribuíram para que
as pessoas com deficiência fossem tratadas como a personificação
do mal e, portanto, passíveis de castigos, torturas e mesmo de
morte. À medida que conhecimentos na área da Medicina foram
sendo construídos e acumulados na história da humanidade, a
deficiência passou a ser vista como doença, de natureza incurável,
gradação de menor amplitude da doença mental.

Do século XVI ao XIX, as pessoas com


deficiências físicas e mentais eram mantidas em confinamentos, pois vinham encaradas como um risco para o
resto da sociedade. Viviam em conventos, albergues e asilos. Neste período, surge o primeiro hospital

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psiquiátrico da Europa. As instituições desta época, porém, ainda são concebidas como prisões: não têm
tratamento especializado ou programas educacionais.
A partir do século XX, as pessoas com necessidades especiais são vistas como cidadãos que têm direitos
e deveres de participação na sociedade, embora segundo uma visão assistencial e filantrópica.
A partir da década de 40, são criadas várias instituições para o atendimento de necessidades específicas,
como o Lar Escola São Francisco, a Fundação para o Livro do Cego (Dorina Nowill), a Sociedade Pestalozzi e o
Centro Israelita de Assistência ao Menor – Ciam. O artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos
(1948) proclama, no art. 1º, que toda a pessoa tem direito a uma educação gratuita, correspondente ao ensino
elementar fundamental; que o ensino básico deve ser obrigatório e que o ensino técnico e profissional deve ser
generalizado. No art. 2º, a Declaração estabelece que a educação deve visar à plena expansão da personalidade
humana e ao reforço dos direitos do homem e das liberdades fundamentais e que deve favorecer a compreensão,
a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos. O item 1º do artigo 27
proclama que toda pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de usufruir
das artes e de participar do progresso científico e dos benefícios que deste resultam. A Declaração apresenta a
importância da interligação entre liberdade e igualdade. Dessa maneira, a importância da diversidade se impõe
como condição para o alcance da universalidade e da indivisibilidade dos direitos humanos (BRASIL, 2004, p.
14).
Em 1955, no Rio de Janeiro, com o apoio da Sociedade de
Pestalozzi do Brasil, começou a funcionar a primeira Associação
de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE, para crianças com
deficiências. Entre os anos de 1954 a 1962, foram criadas
dezesseis APAES no Brasil.

Na década de 60, pais e familiares de pessoas com necessidades especiais se unem e se organizam em
prol de um atendimento de qualidade para as pessoas com necessidades educacionais especiais. Criticam a
segregação e o afastamento da sociedade. A educação especial, no Brasil, aparece pela primeira vez na Lei de
Diretrizes e Bases (LDB) n. 4.024/61. Essa lei regulamenta as políticas e propostas educacionais para as pessoas
com necessidades especiais, estabelecendo, organizando e atribuindo funções aos serviços públicos e privados.
O atendimento das pessoas com necessidades especiais é realizado ainda de maneira inadequada, mas já é
introduzido um apoio financeiro para as instituições particulares credenciadas junto aos Conselhos Estaduais de
Educação.
Na década de 70, nos Estados Unidos, pesquisas científicas marcam avanços consideráveis na promoção
da qualidade de vida dos mutilados da Guerra do Vietnã. Dessa maneira, a educação inclusiva tem seu começo
nos Estados Unidos por meio da Lei n. 94.142/75, que gera uma mudança nos currículos e a criação de um
sistema integrado de informação entre escolas, bibliotecas, hospitais e clínicas (BENCINI, 2001).

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Educação especial
Em 1978, no Brasil, é realizada uma emenda à Constituição Brasileira em que são contemplados os
direitos das pessoas com necessidades especiais, às quais é assegurada a melhoria de sua condição sócio-
econômica, especialmente mediante educação especial e gratuita.
A partir da década de 80, surgem declarações e tratados mundiais que passam a defender a abrangência
universal do direito à inclusão. Em 1985, a Assembléia Geral das Nações Unidas lança o Programa de Ação
Mundial para as pessoas com necessidades especiais. Recomenda-se que, na medida do possível, o ensino de
pessoas com deficiência deve acontecer dentro do sistema escolar normal. Em 1988, no Brasil, é promulgada a
atual Constituição Federal, em cujo art. 205 a educação passa a ser direito de todos e dever do Estado e da
família, promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa,
ao preparo para o exercício da cidadania e à qualificação para o trabalho. Em 1989, a Lei n. 7.853 prevê a oferta
obrigatória e gratuita da educação especial em instituições escolares públicas e a reclusão de um a quatro anos e
multa para os dirigentes de ensino público ou particular que recusarem e/ ou suspenderem, sem justa causa, a
matrícula de um aluno (BRASIL, 1988).
No ano de 1990, a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em Jomtien, na Tailândia,
prevê que as ações educacionais básicas sejam oferecidas para todos (mulheres, camponeses, refugiados, negros,
índios, presos e deficientes), com a universalização do acesso, a promoção da igualdade, a ampliação de meios e
conteúdos da educação básica e a melhoria do ambiente de estudo. O Brasil, ao assinar a Declaração de Jomtien,
assume, perante a comunidade internacional, o compromisso de erradicar o analfabetismo e universalizar o
ensino fundamental no país (BRASIL, 2004, p. 15).
Em junho de 1994, mais de oitenta países se reúnem na Conferência Mundial sobre Necessidades
Educativas Especiais: Acesso e Qualidade, realizada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura (UNESCO), em Salamanca (Espanha), onde são firmados compromissos de garantia de
direitos educacionais. As escolas regulares inclusivas são consideradas o caminho mais eficiente ao combate à
discriminação. Determina-se que as instituições escolares devem acolher a todos, independentemente de suas
condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais ou lingüísticas. Os participantes da Conferência de
Salamanca, inclusive o Brasil, afirmaram os seguintes princípios:
• todas as crianças, de ambos os sexos, têm direito fundamental à educação; a elas deve ser dada a oportunidade
de obter um nível aceitável de conhecimentos;
• cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprios;
• os sistemas educativos devem ser projetados e os programas aplicados de modo a respeitar diferenças e
peculiaridades;
• as pessoas com necessidades educacionais especiais devem ter acesso às escolas comuns e nelas devem
encontrar um atendimento adequado às suas necessidades;
• as escolas comuns, com essa orientação integradora, representam o meio mais eficaz de combater atitudes
discriminatórias, criar comunidades acolhedoras, construir uma sociedade integradora e dar educação a todos;

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Educação especial
• em um contexto de mudança sistemática, os programas de formação inicial e permanente do professorado
devem estar voltados às necessidades educacionais especiais, em escolas integradoras.
No documento Educar na Diversidade, encontramos questões referentes à erradicação do trabalho infantil:

[...] o Brasil ao assinar esse documento comprometeu-se em


alcançar as metas propostas no que se refere à modificação dos
sistemas de educação em sistemas educacionais inclusivos
(BRASIL, 2005, p. 15).

Em 1996, na reunião dos ministros da educação da América Latina e do Caribe (Kingston), foi fechado
um acordo sobre o fortalecimento de condições e estratégias para o atendimento a crianças com necessidades
educacionais especiais, dificuldades de aprendizagem, escolaridade inadequada, vindas de ambientes sociais
periféricos.
No ano de 2000, na Reunião das Américas, preparatória do Fórum Mundial de Educação para Todos (São
Domingos), afirma-se o compromisso de elaborar políticas de educação inclusiva, dando-se preferência aos
grupos mais excluídos.
Em 2001, acontece a VII Reunião Regional de Ministros da Educação (Cochabamba). Nessa reunião, são
reafirmados a valorização, a diversidade e o interculturalismo como dados de desenvolvimento da
aprendizagem. Sugere-se que os procedimentos pedagógicos considerem as diferenças sociais, culturais, de
gênero, de capacidade e de interesses, com vistas a uma melhor aprendizagem, à compreensão mútua e à
convivência.
No ano de 2003, é criado pelo MEC o Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade. Conforme os
pressupostos legais e conceituais de uma educação de qualidade para todos, o programa têm o objetivo de
difundir a política de educação inclusiva nos municípios brasileiros e de apoiar a formação de gestores e
educadores para concretizar a mudança dos sistemas educacionais em sistemas educacionais inclusivos,
garantindo o direito de acesso e permanência escolar dos alunos com necessidades educacionais especiais. O
programa contou com a adesão de 144 municípios-pólo, que atuam como multiplicadores da formação de mais
de 4.646 municípios da área de abrangência.
Por meio desse programa, o Ministério da Educação e a Secretaria de Educação Especial adotaram o
compromisso de fomentar a política de construção de sistemas educacionais inclusivos. O processo foi
implementado nos municípios brasileiros, agrupando recursos da comunidade e consolidando convênios e
parcerias para abonar o atendimento das necessidades educacionais especiais dos alunos. Numa ação
compartilhada, o programa disponibilizou equipamentos, mobiliários e material pedagógico para a implantação
de salas de recursos para a organização da oferta de atendimento educacional especializado nos municípios-
pólo, com vistas a apoiar o processo de inclusão educacional na rede pública de ensino.

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Educação especial
Com essas ações, o programa atingiu a meta prevista de formação de gestores e educadores para a
educação inclusiva em 83,5% dos municípios brasileiros, beneficiando cerca de 80.000 educadores.
O avanço da educação inclusiva, nos últimos anos, está demonstrado nos números do Censo
Escolar/INEP, que registram o crescimento da matrícula de alunos com necessidades educacionais especiais,
passando de 337.326 alunos, em 1998, para 640.317, em 2005. A partir da garantia do acesso à educação
previsto na legislação, os sistemas de ensino se estruturam para ampliar a inclusão de alunos com necessidades
educacionais especiais em classes comuns do ensino regular. Esse trabalho tem alcançado avanços
significativos: em 1998, eram apenas 43.923 alunos; em 2005, esse número chegou a 262.243 alunos.
Destaca-se, como elemento fundamental para a estruturação da política educacional de inclusão, o
aumento da participação da esfera pública na educação de alunos com necessidades educacionais especiais, que
atualmente registra 60% (383.488) das 640.317 matrículas. Esse número se reflete também no aumento de
estabelecimentos públicos que registram matrículas de alunos com necessidades educacionais especiais,
passando de 4.498, em 1998, para 36.897, em 2005 (BRASIL, 2006).
A trajetória histórica da educação inclusiva é dada por meio de mudanças mundiais. Percebe-se que existe
uma tentativa de compreender melhor a diversidade humana e a função da escola no atendimento dos alunos
com necessidades educacionais especiais.

CAPÍTULO 2: Panorama histórico das concepções sociais e educacionais das pessoas com
deficiência

2.1 Questão legal

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Educação especial
As leis constituem um sustentáculo essencial, no processo de integração das diversidades no mundo da
educação, para que o ser humano esteja realmente incluído na escola e nos ambientes sociais em geral.
A política inclusiva, afinal de contas, deve se ocupar de quê?
Estudaremos alguns parâmetros estabelecidos pela legislação sobre a educação inclusiva.
Iniciaremos pela lei maior, a Constituição Federal de 1988 (CF/88), em que está garantido o direito à
educação para todos. Nela se afirmam as seguintes proposições.

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da


família, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes
princípios:
I – igualdade de condições para acesso e permanência na escola;
[...] Art. 208. O dever do estado com a educação será efetivado
mediante garantia de:
[...] III – atendimento educacional especializado aos portadores de
deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV – atendimento em creches e pré-escola às crianças até 5 (cinco)
anos de idade.
Art. 213. Os recursos públicos serão destinados às escolas,
podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou
filantrópicas, definidas em lei, que:
I – comprovem finalidade não lucrativa e apliquem seus
excedentes financeiros em educação.

Conforme define a atual LDB n. 9.394/96, educação especial é uma modalidade de educação escolar,
voltada para a formação de pessoas com necessidades educativas especiais. O projeto, a organização e a prática
pedagógica das instituições de ensino devem respeitar a diversidade dos alunos, como elemento principal,
integrante e distinto do sistema educacional, e oferecer diferenciações nos atos pedagógicos que contemplam as
necessidades educacionais de todos os alunos. Os serviços educacionais especiais, embora diferenciados, não
podem se desenvolver isoladamente, mas devem fazer parte de uma estratégia global de educação e visar as suas
finalidades gerais. Na LDB, são analisados dispositivos referentes à educação especial que apontam uma ação
mais ligada ao sistema e aos programas do ensino regular. A LDB n. 9394/96 reserva um capítulo exclusivo à
educação especial e reafirma o direito à educação pública e gratuita das pessoas com deficiência, com condutas
típicas e com altas habilidades.
Nas Leis n. 4.024/61 e n. 5.692/71, não se dava muita importância a essa modalidade educacional. A
presença da educação especial na LDB n. 9.394/96 certamente reflete um crescimento da área em relação à
educação geral nos sistemas de ensino.
Na Resolução CNE/CEB n. 2/2001, Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica,
consideram-se ajudas técnicas os elementos que permitem compensar uma das limitações funcionais motoras,

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sensoriais ou mentais da pessoa com deficiência, com o objetivo de permitir-lhe superar as barreiras da
comunicação e da mobilidade.
A expressão “portador de necessidades especiais”, embora ainda
esteja presente nas leis que amparam o aluno especial, precisa ser
substituída gradativamente pela expressão mais inclusiva “aluno
com necessidades educativas especiais”.

A definição de ajudas técnicas está conceituada no artigo 19, parágrafo único, do Decreto n. 3.298/99.
Essa definição, no âmbito pedagógico, relaciona- se com a ajuda que pode ser proporcionada a alunos e
professores e está contemplada no Parecer CNE/CEB n. 17/2001:

Todos os alunos, em determinado momento de sua vida escolar


podem apresentar necessidades educacionais especiais, e seus
professores em geral conhecem diferentes estratégias para dar
respostas a elas. No entanto, existem necessidades educacionais
que requerem, da escola uma série de recursos e apoios de caráter
mais especializados.

Conforme a Resolução CNE/CEB n. 2/2001, alunos com necessidades educacionais especiais são aqueles
que, durante o processo educacional, apresentam:
a) dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento, que
dificultam o acompanhamento das atividades curriculares e que são compreendidas em dois grupos:
• aquelas necessidades não vinculadas a uma causa orgânica específica;
• aquelas relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências;
b) dificuldades que demandam a utilização de linguagem e códigos aplicados;
c) altas habilidades/superdotação, grande facilidade de aprendizagem que levam a dominar rapidamente
conceitos, procedimentos e atitudes.
O trabalho realizado pelos profissionais da educação se volta ao auxílio desses alunos. Tais profissionais
necessitam estar preparados para atuar em classes comuns com alunos que apresentam alguma deficiência.
Nesse sentido, o art. 208 da Resolução CNE/CEB n. 2/2001 aponta algumas competências necessárias ao
professor:
• perceber as necessidades educacionais especiais dos alunos;
• flexibilizar a ação pedagógica nas diferentes áreas de conhecimento;
• avaliar, continuamente, a eficácia do processo educativo;
• atuar em equipe, inclusive com professores especializados em educação especial.

O Parecer CNE/CEB n. 17/2001 deixa claro que cabe a todos, principalmente aos setores de pesquisa e às
universidades, o desenvolvimento de estudos na busca de melhores recursos para auxiliar/ampliar a capacidade
das pessoas com necessidades educacionais especiais de se comunicar, de se locomover e de participar de

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Educação especial
maneira, cada vez mais autônoma, do meio educacional, da vida produtiva e da vida social, exercendo assim, de
maneira plena, a sua cidadania.

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Educação especial
CAPÍTULO 3: Deficiência física e auditiva

Você percorreu um panorama histórico das concepções sociais e educacionais com relação às pessoas
com deficiência no contexto educacional. Agora é importante para você, discente do curso de Pedagogia, ter
conhecimento e embasamento sobre algumas deficiências discutidas na atualidade, tais como a deficiência física
e a deficiência auditiva.
Ressaltamos que a deficiência física e a auditiva estão citadas na Lei n. 7.853/89.
Para iniciar nossa conversa sobre os tipos de deficiências, é necessário que seja retomado o que a lei
garante quanto às condições de cada classificação e o que aprova em relação ao atendimento dos alunos com
necessidades educativas especiais. No artigo 1º do capítulo 1º do Decreto n. 3.298/99, que regulamenta a Lei n.
7.853/89, encontramos um conjunto de orientações normativas que objetivam assegurar o pleno exercício dos
direitos individuais e sociais das pessoas que apresentam alguma deficiência (BRASIL, 2002).
Podemos definir a deficiência como toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou de uma função
psicológica, fisiológica ou anatômica (paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia,
tetraparesia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral,
membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam
dificuldades para o desempenho de funções) que torne um indivíduo incapaz de desempenhar uma atividade,
dentro do padrão considerado normal para o ser humano.
A deficiência pode ser considerada permanente a partir do momento em que é possível descartar qualquer
recuperação ou probabilidade de alteração.
A incapacidade do deficiente implica na necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos
especiais para seu bem-estar ou o desempenho de determinada atividade (BRASIL, 2002).

3.1 Tipos de deficiências físicas


Quanto aos tipos de deficiências físicas, podemos destacar: a lesão cerebral (paralisia, hemiplegias); a
lesão medular (tetraplegias, paraplegias); as miopatias (distrofias musculares); as patologias degenerativas do
sistema nervoso central (esclerose múltipla, esclerose lateral amiotrófica); as lesões nervosas periféricas; as
amputações; as seqüelas de politraumatismos; as malformações congênitas; os distúrbios posturais da coluna; as
seqüelas de patologias da coluna; os distúrbios dolorosos da coluna vertebral e das articulações dos membros; as
artropatias; os reumatismos inflamatórios da coluna e das articulações; as lesões por esforços repetitivos
(L.E.R.).

3.2 Causas das deficiências físicas

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 15


Educação especial
Os fatores causais, segundo Telford (1977), podem ser classificados de acordo com a época da sua
ocorrência no desenvolvimento do indivíduo.
Em relação à paralisia cerebral, as causas mais citadas para a deficiência são:
a) causas pré-natais – ocorrem devido a infecções ou a doenças contraídas pela mãe durante a gestação,
como, por exemplo, meningite, rubéola, herpes, diabetes. A falta de oxigênio na corrente sanguínea também
pode causar lesão cerebral. Outro fator causador pode ser a falta de compatibilidade sanguínea (fator Rh) entre o
sangue do feto e o da mãe.
Pode ocorrer paralisia cerebral ainda devido à deformação congênita;
b) causas natais – decorrem de um parto difícil, devido a bebês grandes e mães pequenas. A cabeça do
bebê pode deformar-se rompendo os vasos sanguíneos e danificar o cérebro. Segundo Wernek (1994), bebês que
nascem prematuramente (antes dos nove meses e com menos de 2 kg) têm maior probabilidade de apresentar
paralisia cerebral. A falta de oxigênio no bebê por mais de alguns minutos durante o parto pode causar paralisia
cerebral;
c) causas pós-natais – dizem respeito a tudo o que pode ocorrer com o indivíduo após o seu nascimento.
Portanto uma criança que acabou de nascer ou um idoso de oitenta anos estão igualmente sujeitos ao risco de
uma lesão cerebral.
As hemiplegias resultam de acidente vascular cerebral, aneurisma cerebral, tumor cerebral.
A lesão medular pode decorrer de ferimento por arma de fogo ou branca, de acidentes de trânsito, de
mergulho em águas rasas, de traumatismos diretos, como quedas, processos infecciosos, processos
degenerativos.
As amputações são normalmente ocasionadas por causas vasculares, traumas, malformações congênitas,
causas metabólicas.
No caso das más formações congênitas, temos como possíveis causas: exposição à radiação e uso de
drogas.
As artropatias podem acontecer por processos inflamatórios ou degenerativos, alterações biomecânicas,
hemofilia, distúrbios metabólicos.
As deficiências físicas podem ser classificadas em quadriplegia, diplegia, hemiplegia, monoplegia,
paraplegia, triplegia. Além disso, a paralisia cerebral pode ser classificada quanto à qualidade de tônus em:
atetóide, atáxica, espástica e hipotônica. Tanto a classificação do tipo de deficiência física quanto da qualidade
do tônus do aluno permitem a adequação das atividades pedagógicas em sala de aula.

3.3 Adaptações
Ao ensinar crianças e jovens com deficiência física a escrever, devemos escolher o processo mais rápido,
correto e fácil. Para alguns, embora com a mão deficiente, a aprendizagem da escrita é possível; para outros

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 16


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poderá ser mais difícil. A insistência nesse tipo de aprendizagem para estes últimos poderá resultar demasiado
frustrante, levando à perda de interesse e de gosto. Dependendo do grau de limitação, o deficiente físico terá
dificuldades em manipular objetos e até mesmo em segurar um lápis, fazendo-se necessárias uma adaptação e
uma aprendizagem.
Devemos ter em mente que a construção da escrita de crianças e jovens com ou sem deficiência física,
ocorre da mesma forma; a diferença consiste nas dificuldades que o indivíduo com deficiência física poderá
enfrentar para realizar a escrita.

3.4 Deficiência auditiva


Muito se tem discutido acerca da inserção de alunos com necessidades educativas especiais no ensino
regular. Há opiniões divergentes sobre este movimento mundial denominado inclusão. Sabemos que a exclusão
das minorias ainda permanece. Nesse grupo de minorias com necessidades especiais, temos a criança com
deficiência auditiva.
A deficiência auditiva é a perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras, com as seguintes
variações de graus e níveis:
• de 41 a 55 decibéis (dB) – surdez leve;
• de 56 a 70 dB – surdez moderada;
• de 71 a 90 dB – surdez severa;
• acima de 91 dB – surdez profunda.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, existe a deficiência auditiva leve, moderada e severa,
com comprometimento do ouvido médio, em casos de infecção, e a deficiência auditiva profunda, com
comprometimento do ouvido interno, em virtude de problemas ocorridos com a mãe, durante a gestação
(doenças, uso de medicamentos inadequados), ou com o filho, após o nascimento.
Indivíduos com níveis de perda auditiva leve, moderada e severa são chamados de deficientes auditivos,
enquanto os indivíduos com níveis de perda auditiva profunda são chamados de surdos.
A criança que assiste à televisão muito próxima do aparelho, que aumenta o volume constantemente, que
só percebe a fala do outro quando este está de frente para ela e que não reage a sons que não pode ver,
possivelmente, apresenta uma perda auditiva e precisa ser acompanhada de perto.

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3.4.1 Tipos de deficiência auditiva


A deficiência auditiva condutiva apresenta interferência na transmissão do som desde o conduto auditivo
externo até a orelha interna (cóclea).
A deficiência auditiva sensório-neural ocorre quando há uma impossibilidade de recepção do som por
lesão das células ciliadas da cóclea ou do nervo auditivo.
A deficiência auditiva mista caracteriza-se por uma alteração na condução do som até o órgão terminal
sensorial, associada à lesão do órgão sensorial ou do nervo auditivo.
Outra forma de deficiência auditiva (MARQUEZINE, 2003) que não podemos deixar de mencionar aqui
é a deficiência auditiva central. Esse tipo vem sendo discutido recentemente pela área da neuropsiquiatria e
manifesta-se por diferentes graus de dificuldade na compreensão das informações sonoras.
Decorre de alterações nos mecanismos de processamento da informação sonora no tronco cerebral
(sistema nervoso central), geralmente associadas ao transtorno por deficit de atenção.
3.4.2 Classificação
Existem dois tipos de surdez:
PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 18
Educação especial
• a surdez congênita, do indivíduo que nasce surdo;
• a surdez adquirida, própria do indivíduo que nasce com audição normal e que a perde, sucessivamente,
devido a uma doença ou a um acidente.

3.4.3 Causas da deficiência auditiva


As causas mais frequentes para a deficiência auditiva são: cerume ou corpos estranhos no conduto
auditivo externo; otites; redução de calibre ou ausência do conduto auditivo externo; malformação congênita;
trauma por agressão cirúrgica ou infecções graves; inflamação da membrana timpânica; perfurações da
membrana timpânica.

3.4.4 Deficiência auditiva sensório-neural


As causas da deficiência auditiva podem preceder o parto, ser concomitantes ao parto ou ocorrer após o
parto. Vejamos.
a) Causas pré-natais de origem hereditária (surdez herdada): é uma surdez associada a aberrações
cromossômicas.
b) Causas pré-natais de origem não hereditária: infecções maternas por rubéola, sífilis, herpes,
toxoplasmose, drogas ototóxicas, alcoolismo materno, irradiações, diabetes e outras doenças maternais graves.
c) Causas perinatais: prematuridade e/ou baixo peso ao nascimento; trauma de parto; fator anóxico;
icterícia grave do recém-nascido.
d) Causas pós-natais: infecções (meningite, encefalite, caxumba, sarampo), drogas ototóxicas, perda
auditiva induzida por ruído, traumas físicos que afetam o osso temporal.

3.4.5 Adaptações
É importante que a criança seja inserida em um sistema comunicativo em que sinais e falas estejam
presentes, para abrir a possibilidade do diálogo e da representação na criança surda; que seja inserida em sala de
aula em idade anterior à usual e em condições qualitativamente melhores; que seja aberta a possibilidade de
convívio e intercâmbio entre as crianças e as famílias, ampliando as vivências relativas à surdez e às suas
questões.
Atualmente, o uso de aparelhos auditivos e de implantes cocleares tem auxiliado no processo de
adaptação dos alunos com deficiência auditiva ao convívio escolar, familiar e social.
Ao dar explicações, o professor deve usar gestos bem acentuados e linguagem de sinais. A posição do
professor deve ser tal que a luz incida sobre o seu rosto para que o aluno possa vê-lo com facilidade,

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acompanhando os movimentos de seus lábios (leitura labial). A criança deve sentar mais perto da mesa do
professor e deve ter a oportunidade de realizar trabalhos em grupo.
O professor não deve falar enquanto escreve na lousa e deve utilizar material visual variado.
É importante também ressaltar que a escola deve providenciar intérpretes de linguagem de sinais. O uso
de comunicação alternativa em sala de aula (desenhos, mímicas e expressão corporal) auxilia o professor que
não domina as técnicas da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). A avaliação deve acontecer de acordo com as
necessidades do aluno, considerando mais o conteúdo do que a forma com a qual a criança se expressa.

3.4.6 Como evitar


Embora nenhuma deficiência seja transmitida, por não ser uma doença, alguns cuidados ajudam a
prevenir a deficiência auditiva. A mulher, por exemplo, deve sempre tomar a vacina contra a rubéola, de
preferência antes da adolescência, para que, durante a gravidez, esteja protegida contra a doença. Se a gestante
tiver contato com rubéola nos primeiros três meses de gravidez, o bebê pode nascer surdo.

3.4.7 O que fazer


Depois de verificar que a criança apresenta alguma perda auditiva, é necessário consultar um especialista
em otorrinolaringologia ou fonoaudiologia para realizar uma avaliação auditiva adequada. Quando a deficiência
auditiva é detectada, pode tornar-se necessário o uso de um aparelho auditivo, que deve ser adaptado às
necessidades específicas de cada pessoa.

3.4.8 Observações para o professor


Alguns sinais de deficiência auditiva podem ser observados por professores, pais ou pessoas do convívio
diário:
• defeito de linguagem;
• expressão oral pobre;
• ditados com muitos erros;
• irritabilidade;
• falta de interesse;
• dificuldade para a leitura e a escrita.
A constatação desses sinais implica no encaminhamento da criança, do adolescente ou do adulto para uma
avaliação clínica e fisiológica da audição, por meio de exames audiológicos e complementares.
Conhecemos a deficiência física e a deficiência auditiva, levando em consideração a Lei n. 7.853/89. Para
cada tipo de deficiência, distinguimos tipos, causas e adaptações que a escola pode efetivar para se adequar às
necessidades especiais de seus alunos.

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CAPÍTULO 4: Deficiências visuais, mentais e sensoriais, surdo-cegueira, autismo, síndrome de


Down

4.1 A Deficiência visual


A deficiência visual é representada por uma acuidade visual igual ou menor a 20/200 no melhor olho,
após a melhor correção, ou por um campo visual inferior a 20º (tabela de Snellen), ou por uma ocorrência
simultânea de ambas as situações.

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4.1.1 Classificação
A deficiência visual pode ser classificada em cegueira e baixa-visão. Vejamos os dois casos.
a) Cegueira: perda total da visão em ambos os olhos ou resíduos mínimos de visão que levam o indivíduo
à necessidade do sistema Braille, como meio de leitura e escrita, e do sorobã, para o raciocínio lógico
matemático.
b) Baixa-visão: perda parcial da visão com correção óptica máxima que permita ao educando ler
impressos à tinta, desde que não se empreguem recursos didáticos e equipamentos especiais.
Variáveis que podem interferir no desenvolvimento educacional do deficiente visual:
• idade da manifestação;
• tempo transcorrido;
• tipo de manifestação (súbita ou gradativa);
• causa do distúrbio: pode indicar se o estado geral do indivíduo está comprometido ou não.
Segundo Kirk (1996), podemos dividir as causas da seguinte maneira:
• causas congênitas: amaurose congênita de Leber, malformações oculares, glaucoma congênito, catarata
congênita;
• causas adquiridas: traumas oculares, catarata, degeneração senil de mácula, glaucoma, alterações
retinianas relacionadas à hipertensão arterial ou diabetes.

4.1.2 Causas: fatores de risco


Para Kirk (1996), o histórico familiar de deficiência visual por doenças de caráter hereditário, por
exemplo, o glaucoma, é um dos fatores de risco para a deficiência visual, assim como também o histórico
pessoal de diabete, hipertensão arterial, senilidade, catarata, degeneração senil de mácula e outras doenças
sistêmicas que podem levar ao comprometimento visual. Além disso, constituem-se como fatores de risco a não
realização de cuidados pré-natais, a não utilização de óculos de proteção durante a realização de determinadas
tarefas (por exemplo, durante o uso de solda elétrica), a não imunização contra rubéola da população feminina
em idade reprodutiva. Todos nós estamos sujeitos a esses riscos, por isso devemos nos conscientizar e, na
medida do possível, precaver-nos.

4.1.3 Identificação
Segundo Kirk (1996), é possível observar sinais de deficiência visual na criança, ao perceber desvio de
um dos olhos, não acompanhamento visual de objetos, não reconhecimento visual de familiares, baixo
rendimento escolar. No adulto, pode ocorrer o borramento eventual da visão, a insurgência de vermelhidão,

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 22


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manchas brancas nos olhos, dor, lacrimejamento, flashes, retração do campo de visão, que podem provocar
esbarrões e tropeços em móveis.

4.1.4 Adaptações
O Ábaco ou Sorobã é um instrumento de calcular característico dos povos orientais. Já era utilizado, bem
antes da era cristã. Os deficientes visuais utilizam o Sorobã na realização de operações matemáticas.

O Sistema Braille é o mais completo, perfeito, seguro e eficiente meio de acesso à instrução, à cultura e à
educação para a integração social das pessoas cegas.
Criado por Louis Braille na França, em 1825, o Sistema Braille é um dos códigos de apoio da língua, cuja
importância reside no fato de habilitar o ser humano a compreender o mundo por meio de um sistema
organizado de símbolos, substituindo o alfabeto convencional por um alfabeto de pontos em relevo, o que
possibilita ao deficiente visual a escrita e a leitura.
A escola deve oferecer material didático pertinente como: regletes, instrumentos para escrita em Braille,
sorobã ou ábaco japonês, sintetizadores de voz, softwares para deficiências visuais, auxílios ópticos. Entre os
softwares, há os que ampliam o texto, os que lêem o texto e sintetizam a voz e o DOSVOX.

Quanto à introdução dos conteúdos para os alunos que possuem deficiência visual, é necessário que o
professor tenha alguns cuidados como os relatados a seguir (BRASIL, 2003).
• O professor deve ler o que está no quadro ou no suporte utilizado.
• O material de estudo deve ser fornecido ao aluno em áudio, disquete,
Braille ou textos ampliados, com antecedência, considerando o tempo necessário para sua transcrição.

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• As provas também devem ser transcritas, possibilitando ao aluno a resposta em linguagens mais
acessíveis, como Braille, fitas cassetes ou textos ampliados.
Sendo assim, as provas não devem ser diferenciadas, pois isso pode ser considerado discriminatório em
relação aos outros colegas.
• Ao se dirigir ao aluno, basta tocar em seu braço ou chamá-lo pelo nome para indicar que está se
reportando a ele, não há necessidade de aumentar o tom da voz.

4.2 Deficiência mental


A deficiência mental é caracterizada por um funcionamento intelectual significativamente inferior à
média, com manifestação antes dos dezoito anos de idade e limitações de duas ou mais áreas de habilidades
adaptativas, tais como comunicação; cuidado pessoal; habilidades sociais; utilização da comunidade; saúde e
segurança; habilidades acadêmicas; lazer; trabalho.
De acordo com a Associação de Assistência à Criança Defeituosa (AAMD), na deficiência mental
observa-se uma substancial limitação da capacidade de aprendizagem do indivíduo e de suas habilidades
relativas à vida diária. A pessoa com deficiência mental, assim, caracteriza-se por um déficit de inteligência
conceitual, prática e social.

No ambiente escolar, é necessário agir naturalmente, com respeito, consideração e atenção, sem
superproteção.
A deficiência mental pode requerer um pouco mais de tempo para o aprendizado, mas permite adquirir
variadas habilidades. É importante ressaltar que é necessário tratar a pessoa com deficiência mental sempre de
acordo com a idade mental e cronológica que apresenta.

4.2.1 Causas

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Além das causas hereditárias, que são alterações genéticas ou cromossômicas – como a Síndrome de
Down, por exemplo – algumas deficiências podem ser provocadas por problemas de saúde da gestante.
Exames como o hemograma, a glicemia, a reação sorológica para a sífilis, o HIV (AIDS), a tipagem
sangüínea, a urina, a toxoplasmose e a hepatite nos ajudam a prevenir grande parte dos riscos, pois permitem
constatações importantes.
Por exemplo, a rubéola, a sífilis e a toxoplasmose adquiridas durante o primeiro trimestre de gravidez
podem provocar má formação fetal, aborto, deficiência visual e auditiva, microcefalia e deficiência mental.
Durante a gestação, o médico que acompanha a gestante pode se valer de outros exames disponíveis,
como a ultra-sonografia, com o objetivo de elaborar um histórico da saúde do próprio bebê.
Os casos de gravidez de risco exigem práticas preventivas específicas, tanto no período anterior à
concepção como no pré-natal, sempre – é claro – com a avaliação e o apoio de um profissional especializado.
Além das causas genéticas, a deficiência pode ser provocada por traumatismos, tentativas de aborto,
exposição a raios X, radioterapia e uso de medicamentos. A vitamina C pode causar má-formação no feto se
ingerida em altas doses. A exposição ao raio-X é indicada só quando estritamente necessária, e sempre
protegendo a barriga da gestante com avental de chumbo. Depois do pré-natal, é fundamental acompanhar o
parto e as condições gerais do recém nascido também.
Após o nascimento, as condições cardíacas, respiratórias, musculares e dos reflexos do recém-nascido
precisam ser avaliadas. Cada um desses itens recebe uma nota em três diferentes momentos: no primeiro,
segundo e quinto minuto de vida. A esse conjunto de avaliações chamamos de Apgar do recém-nascido, ou seja,
uma nota que indica as condições gerais de saúde do bebê. Essa informação será de grande importância para o
pediatra durante o desenvolvimento da criança.
Ainda na maternidade, o recém-nascido deve fazer o teste do pezinho pelo qual é possível detectar a
existência de duas doenças congênitas: o hipotireoidismo e a fenilcetonúria, que é uma alteração no
metabolismo. Essas duas doenças não causam nenhum problema se diagnosticadas e tratadas precocemente.
Portanto, do ponto de vista preventivo, o teste do pezinho é um recurso que jamais poderá ser dispensado.
Doenças como meningite, sarampo, além de traumatismos, intoxicação por medicamentos, ingestão de
alimentos contaminados, acidentes com soda cáustica, produtos de limpeza, instrumentos cortantes e fogo são as
causas mais freqüentes das deficiências durante os primeiros anos de vida. Além disso, problemas metabólicos,
desnutrição e maus tratos na primeira infância também podem causar deficiência.
Como prevenção, recomenda-se levar a criança mensalmente ao pediatra, pelo menos no primeiro ano de
vida; seguir a tabela de vacinação, priorizar o aleitamento materno e utilizar medicamentos somente com
orientação médica.
O cuidado sempre é importante, pois de 30% a 40% dos casos de deficiências podem ser evitados com
essas medidas.

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4.3 Surdo-cegueira e múltipla deficiência sensorial
A surdo-cegueira caracteriza-se pela perda da audição e da visão de tal forma que a combinação das duas
deficiências exige necessidades especiais de comunicação, provoca extrema dificuldade na conquista de metas
educacionais, vocacionais, o mundo circunstante (BRASIL, 2005). Os tipos de surdo-cegueira encontrados
freqüentemente são: cegueira congênita e surdez adquirida; surdez congênita e cegueira adquirida; cegueira e
surdez congênita; cegueira e surdez adquirida; baixa visão com surdez congênita ou adquirida.
A múltipla deficiência sensorial é identificada pela deficiência auditiva ou visual associada a outras
deficiências (mental e/ou física) ou a distúrbios neurológicos, emocionais, de linguagem e de desenvolvimento
global que causam atraso no desenvolvimento educacional, vocacional, social e emocional, dificultando a auto-
suficiência do indivíduo. Os tipos mais freqüentes de múltipla deficiência sensorial são: surdez com deficiência
mental leve ou severa; surdez com distúrbios neurológicos, de conduta e emocionais; surdez com deficiência
física (leve ou severa); baixa-visão com deficiência mental leve ou severa; baixa visão com distúrbios
neurológicos, emocionais, de linguagem e de conduta; baixa visão com deficiência física (leve ou severa);
cegueira com deficiência física (leve ou severa); cegueira com deficiência mental (leve ou severa); cegueira com
distúrbios emocionais, neurológicos, de conduta e de linguagem.
As causas mais freqüentes da múltipla deficiência sensorial são: icterícia, otite média crônica, falta de
oxigênio, sarampo, traumatismos (acidentes), glaucoma, medicação ototóxica, retinose pigmentar, tumor
cerebral, toxoplasmose prematuridade, meningite, fator Rh, caxumba, rubéola materna, sífilis congênita e
casamentos consangüíneos.
A pessoa com surdo-cegueira ou deficiência múltipla sensorial pode requerer um pouco mais de tempo
para o aprendizado, mas é capaz de adquirir variadas habilidades.

4.4 Autismo
Facilmente confundido com deficiência mental, o autismo é um transtorno do desenvolvimento que
geralmente está associado a outras deficiências. As causas ainda não foram descobertas, mas, ao contrário do
que se imagina, é possível evitá-lo, por meio de procedimentos pré-natais e/ou neonatais já destacados nas
outras deficiências.
O autismo é um transtorno do desenvolvimento independente de classe social e econômica, e quem o
possui apresenta, em muitos quadros, quociente de inteligência (QI) abaixo da média (BRASIL, 2005).
Em cooperação internacional, os especialistas concordaram em usar alguns critérios de comportamento
para diagnosticar o autismo. Atualmente, o diagnóstico da pessoa autista é realizado com base no Manual de
Diagnóstico e Estatística de Distúrbios Mentais (DSM-IV), da Associação Psiquiátrica Americana, ou por meio
da Classificação Internacional de Doenças (CID-10), publicada pela Organização Mundial de Saúde.
O autismo se manifesta por uma marcante lesão na interação social, com diminuição no uso de
comportamentos não verbais como contato ocular (o autista evita olhar nos olhos do interlocutor), expressão

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 26


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facial, postura corporal e gestos para interagir socialmente; dificuldade em desenvolver relações de
companheirismo apropriadas; ausência de procura espontânea em dividir satisfações, interesses ou realizações
com outras pessoas; ausência de reciprocidade social ou emocional (indiferença); marcante lesão na
comunicação, manifestada por atraso ou ausência total de desenvolvimento da linguagem oral, sem ocorrência
de tentativas espontâneas de compensação por meio de modos alternativos de comunicação, como gestos ou
mímicas; em pessoas com fala normal, diminuição da habilidade de iniciar ou manter uma conversa com outras
pessoas; ausência de ações variadas de imitação social apropriadas para o nível de desenvolvimento; padrões
restritos, repetitivos e estereotipados de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por obsessão por
atitudes ou objetos específicos;
fidelidade aparentemente inflexível a rotinas ou rituais específicos; hábitos motores repetitivos, por
exemplo, agitação ou torção das mãos ou dedos e repetidos movimentos corporais.

4.4.1 Tratamento
De acordo com a Associação de Amigos do Autista (AMA), criada em 1983, não há cura para o autismo.
A pessoa autista pode ser acompanhada e pode desenvolver suas habilidades de uma forma mais intensiva do
que outra pessoa que não apresente o mesmo quadro. Poderá, então, assemelhar-se muito a uma pessoa não
autista em alguns aspectos de seu comportamento. Porém sempre existirão dificuldades, tais como comunicação
e interação social. O autista pode desenvolver comunicação verbal, integração social, alfabetização e outras
habilidades, dependendo de seu grau de comprometimento e da intensidade e adequação do tratamento que, em
geral, é realizado por equipe multidisciplinar nas áreas de fonoaudiologia, psicologia, pedagogia, educação
física, musicoterapia, psicopedagogia e outras.

4.5 Síndrome de Down


De acordo com Buckley (2000), a síndrome de Down é um atraso no desenvolvimento das funções
motoras do corpo e das funções mentais. O bebê é hipotônico, pouco ativo e molinho. A hipotonia diminui com
o tempo. A síndrome de Down era também conhecida como mongolismo, face às pregas no canto dos olhos que
lembram pessoas de raça mongólica (amarela). Essa expressão não se utiliza mais atualmente.
Dentro de cada célula do nosso corpo, estão os cromossomos responsáveis pela cor dos olhos, pela altura,
pelo sexo e também por todo o funcionamento e a forma de cada órgão do corpo interno, como coração,
estômago, cérebro, etc. Cada uma das células possui 46 cromossomos, que são iguais, dois a dois, quer dizer,
existem 23 pares ou duplas de cromossomos dentro de cada célula.
A causa da síndrome de Down é a alteração dos cromossomos de n. 21. A pessoa que possui a síndrome
de Down tem um cromossomo de n. 21 a mais, ou seja, tem três ao invés de dois cromossomos de n. 21 em
todas as suas células.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 27


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Esse acidente genético chama-se também de trissomia 21. Por ser uma anomalia das próprias células, a
síndrome de Down não tem cura, não existindo drogas, vacinas, remédios, escolas ou técnicas milagrosas para
curá-la. Com as pessoas que apresentam síndrome de Down, deverão ser desenvolvidos programas de
estimulação precoce que propiciem seu desenvolvimento motor e intelectual, iniciando-se com 15 dias após o
nascimento.

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CAPÍTULO 5: Atendimento educacional de alunos com necessidades educacionais especiais

5.1 Um olhar sobre as políticas públicas da educação brasileira


No Brasil, nas décadas de 60 e 70, foram estruturadas propostas de atendimento educacional para pessoas
com deficiência (população focalizada na época), com a pretensão de que elas estivessem o mais próximo
possível dos demais alunos. Tradicionalmente, é a educação especial que tem se responsabilizado por esse tipo
de atendimento. Nesse sentido, para Sousa e Pietro (2002, p. 123), “tem se previsto o ‘especial’ na educação
referindo-se a condições que possam ser necessárias a alguns alunos para que se viabilize o cumprimento do
direito de todos à educação”. O que se tem como objetivo precípuo é a defesa da educação escolar para todos
como um princípio.
Se os princípios da educação inclusiva vêm se fortalecendo desde meados da década de 90, na prática é o
modelo da integração escolar que ainda predomina.
A integração escolar tinha como objetivo “ajudar pessoas com deficiência a obter uma existência tão
próxima ao normal possível, a elas disponibilizando padrões e condições de vida cotidiana próximas às normas
e padrões da sociedade” (Anarc – American Nacional Association of Rehabilition Connseling, citado por
Aranha, 1973, p. 167).
O continuum de serviços, idealizado na década de 60 e 70, foi denominado por Reynolds (1962, p. 28)
como “hierarquia de serviços – modelo de educação especial”; por Deno (1970, p. 37) como “sistema de cascata
dos serviços de educação especial”; por Dunn (1973, p. 45-47) como “modelo da pirâmide invertida”. Propõe-
se, nesses modelos, que os alunos sejam atendidos em suas necessidades segundo duas orientações: encaminhá-
los para recursos especializados somente quando necessário; movê-los a fim de ocupar a classe comum tão logo
possível. Com essas indicações, e alertando para a existência de diferenças entre esses autores, estavam
previstos para seu atendimento: classe comum;
classe especial; escola especial; atendimento em ambiente domiciliar e/ ou hospitalar.
Assim, no que se refere à escolarização de pessoas com deficiência, uma das alternativas indicadas é a
classe comum, cuja matrícula está condicionada ao tipo de limitação que o aluno apresenta, ficando mais
distante desse espaço escolar quem menos se ajusta às normas disciplinares ou à organização administrativa e
pedagógica. Esses são dois dos critérios questionados pela proposta de inclusão escolar: acesso condicional de
alguns alunos à classe comum e manutenção das escolas no seu atual molde de funcionamento, na expectativa
de que os alunos a ela se adaptem.
Um breve comentário sobre a implantação da integração escolar no Brasil é necessário, uma vez que
críticas indiscriminadas foram lançadas diretamente a alguns tipos de serviços, particularmente às classes
especiais direcionadas a alunos com deficiência mental. Essas críticas muitas vezes não respeitaram as suas
próprias indicações: não foi oferecido um conjunto de serviços de maneira a garantir que o encaminhamento
respeitasse as necessidades das pessoas; o encaminhamento para a educação especial não se justifica pela
PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 29
Educação especial
necessidade do aluno, e sim por este ser rejeitado na classe comum; não foram seguidos os princípios de
transitoriedade, ou seja, de permanência do aluno em ambientes exclusivos de educação especial por tempo
determinado.
O que constatamos como herança desse modelo, da forma como foi implantado, é a permanência do aluno
em instituições especializadas e em classes especiais, pelo tempo em que esteve vinculado a algum atendimento.
Com vistas a se contrapor ao referido modelo, o objetivo da inclusão escolar é tornar reconhecida e
valorizada a diversidade como condição humana favorecedora da aprendizagem. Nesse caso, as limitações dos
sujeitos devem ser consideradas apenas como uma informação sobre eles que, assim, não pode ser desprezada
na elaboração dos planejamentos de ensino. A ênfase deve recair sobre a identificação de suas possibilidades,
culminando com a construção de alternativas para garantir condições favoráveis à sua autonomia escolar e
social, enfim, para que se tornem cidadãos de iguais direitos.
De acordo com as mais recentes normatizações para a educação especial (Resolução CNE/CEB 2/2001), a
opção brasileira é por manter os serviços especializados em caráter extraordinário e transitório. Há de se ter
cuidado para que, assim como proposta, a educação inclusiva não se configure apenas em retomada de antigas
propostas não realizadas na sua totalidade. Pérez Gomes (2001, p. 22) contribui para esse debate declarando não
estar claro se o que nasce é uma negação superadora do velho ou uma radicalização de suas possibilidades não
realizadas.
Sem desprezar os embates atuais sobre educação inclusiva – principalmente quanto à sua coexistência ou
não com serviços especializados para atendimento paralelo à classe comum, a proposta de atender alunos com
necessidades educacionais especiais nessas classes implica em atentar para mudanças no âmbito dos sistemas de
ensino, das unidades escolares, da prática de cada profissional da educação em suas diferentes dimensões e
respeitando suas particularidades.
Nesse sentido, alguns autores sustentam que
Vale sempre enfatizar que a inclusão de indivíduos com
necessidades educacionais especiais na rede regular de ensino não
consiste apenas na sua permanência junto aos demais alunos, nem
na negação dos serviços especializados àqueles que deles
necessitem. Ao contrário, implica uma reorganização do sistema
educacional, o que acarreta a revisão de antigas concepções e
paradigmas educacionais na busca de se possibilitar o
desenvolvimento cognitivo, cultural e social desses alunos,
respeitando suas diferenças e atendendo às suas necessidades
(GLAT; NOGUEIRA, 2002, p. 26).

O planejamento e a implantação de políticas educacionais para atender alunos com necessidades


educacionais especiais requerem domínio conceitual sobre inclusão escolar e sobre as solicitações decorrentes
de sua adoção enquanto princípio ético-político, bem como a clara definição dos princípios e diretrizes nos
planos e programas elaborados, permitindo a (re)definição dos papéis da educação especial e do lócus do
atendimento desse alunado.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 30


Educação especial
Tomando como referência os alunos com necessidades educacionais especiais, a tensão se evidencia pelo
confronto de duas posições. De um lado, estão os defensores da proposta de uma escola única, que se
comprometa com o atendimento de todos os alunos, e, de outro, aqueles que compreendem que a igualdade de
oportunidades pode ser traduzida inclusive pela diversidade de opções de atendimento escolar, o que pressupõe
a existência de recursos especializados para além daqueles de complementação, de suplementação e de apoio ou
suporte à sua permanência na classe comum.
Nesse contexto, a educação inclusiva está colocada como compromisso ético- político, que implica
garantir a educação como direito de todos. É preciso frisar que “em uma democracia plena, quantidade é sinal de
qualidade social e, se não há quantidade total atendida, não se pode falar em qualidade” (CORTELLA, 1988, p.
14).
Na LDB/96 e na Resolução CNE/CEB 2/01, a educação especial é definida como uma modalidade de
educação escolar. Em parte da literatura especializada e em documentos produzidos pela Secretaria de Educação
Especial do Ministério da Educação (SEEEP/MEC), o entendimento é de que os serviços da educação especial
devem ser parte integrante do sistema educacional brasileiro, e sua oferta deve “garantir a educação escolar e
promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais
especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica” (BRASIL, 2001). Ferreira (1998), analisando o
capítulo V da LDB/96, considera que, tal como definida, a educação especial está mais ligada à educação
escolar e ao ensino público. Nessa mesma direção, na Resolução CNE/CEB 2/01, a educação especial é um
processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais
especiais (BRASIL, 2001).
Enquanto na CF/88 a expressão de referência é “portadores de deficiência”, os documentos
posteriormente aprovados ampliam o alcance do dispositivo constitucional com uso da expressão necessidades
educacionais especiais (FERREIRA, 1998). No Parecer CNE/CEB 17/01, está assim especificado:

Com a adoção do conceito de necessidades educacionais especiais,


afirma-se o compromisso com uma nova abordagem, que tem
como horizonte a inclusão. Dentro dessa visão, a ação da educação
especial amplia-se, passando a abranger não apenas as dificuldades
de aprendizagem relacionadas a condições, disfunções, limitações
e deficiências, mas também aquelas não vinculadas a uma causa
orgânica específica, considerando que, por dificuldades cognitivas,
psicomotoras e de comportamento, alunos são freqüentemente
negligenciados ou mesmo excluídos dos apoios escolares
(BRASIL, 2001).

Quanto ao lócus do atendimento, a CF/88 e a LDB/96 adotam a mesma perspectiva. Estabelecem que o
atendimento educacional especializado e a educação especial, como respectivamente estão denominados nesses
documentos, devem ser oferecidos “preferencialmente na rede regular de ensino” (art. 208, inc. III, da CF/88 e

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 31


Educação especial
art. 58, da LDB/96, respectivamente). Contudo, segundo nos alerta Minto (2000, p. 9), “preferencialmente pode
ser o termo chave para o não-cumprimento do artigo, pois quem dá primazia já tem arbitrado legalmente a porta
de exceção”.
Para implantação do referido atendimento educacional especializado, a LDB/96 prevê serviços de apoio
especializados (art. 58), e a Resolução CNE/ CEB 2/01 assegura “recursos e serviços educacionais especiais,
organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os
serviços educacionais comuns” (art. 3º).
Se as imagens da educação inclusiva, da educação especial, bem como a população elegível para
atendimento educacional especializado, os tipos de recursos educacionais especiais e o lócus de atendimento
escolar do referido alunado ainda exigem aclaramento conceitual para que não restem dúvidas quanto às
diretrizes da política educacional brasileira a serem seguidas, é inegável, entre outras ações, que o atendimento
escolar de alunos com necessidades educacionais especiais deve ser universalizado, que os sistemas de ensino
precisam responder melhor às demandas de aprendizagem desses alunos, que aos professores deve ser garantida
formação continuada.
Ainda marcando as divergências nas formas de conceber a educação inclusiva, Mendes (2002, p. 70)
considera que:
No contexto da educação, o termo inclusão admite, atualmente,
significados diversos. Para quem não deseja mudança, ele equivale
ao que já existe. Para aqueles que desejam mais, ele significa uma
reorganização fundamental do sistema educacional. Enfim, sob a
bandeira da inclusão, estão práticas e pressupostos bastante
distintos, o que garante um consenso apenas aparente e acomoda
diferentes posições que, na prática, são extremamente divergentes.

Essas considerações contribuem para melhor contornar os pressupostos que embasam a inclusão escolar,
que deve ser caracterizada como um processo, à medida que as soluções vão sendo estruturadas para enfrentar
as barreiras impostas à aprendizagem dos alunos, barreiras essas que sempre existirão, porque haverá novos
ingressantes. E mesmo os alunos já existentes trarão sempre novos desafios cujas respostas atuais podem não ser
suficientes.
No âmbito particular das indicações para sua execução no plano das escolas, para Stainback e Stainback
(1999, p. 21-22), há três componentes práticos interdependentes no ensino inclusivo. O primeiro deles é a rede
de apoio, o componente organizacional, que envolve a coordenação de equipes e de indivíduos que apóiam uns
aos outros por meio de conexões formais e informais; grupos de serviço baseados na escola, grupos de serviço
baseados no distrito e parcerias com agências comunitárias. O segundo componente é a consulta cooperativa e o
trabalho em equipe, o componente de procedimento, que envolve indivíduos de várias especialidades
trabalhando juntos para planejar e implementar programas para diferentes alunos em ambientes integrados. O
terceiro é a aprendizagem cooperativa, o componente do ensino, que está relacionado à criação de uma

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 32


Educação especial
atmosfera de aprendizagem em sala de aula, em que alunos com vários interesses e habilidades podem atingir
seu potencial.

CAPÍTULO 6: Integração e inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais

6.1 Integração e inclusão


A evolução dos serviços de educação especial caminhou de uma fase inicial, eminentemente assistencial,
visando apenas ao bem-estar da pessoa com deficiência, para uma segunda fase, em que foram priorizados os
aspectos médicos e psicológicos. Em seguida, chegou às instituições de educação escolar e, depois, à integração

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 33


Educação especial
da educação especial no sistema regular de ensino. Hoje, finalmente, discute-se a proposta de inclusão total e
incondicional desses alunos nas salas de aula do ensino regular.
As atenções às pessoas com necessidades educativas especiais foram se modificando de maneira
significativa no decorrer da história da sociedade brasileira. Segundo Brasil (2004), para cada período histórico,
identificamos um paradigma de atendimento às necessidades especiais: 1) paradigma da institucionalização
(segregação) e dos serviços (integração); 2) paradigmas dos suportes (inclusão).

As primeiras idéias sobre integração surgiram como resposta social às condições a que foram submetidas
as pessoas com necessidades especiais por vários séculos. Totalmente excluídas da sociedade até o século
XVIII, as pessoas com deficiências eram internadas em orfanatos, manicômios, prisões e outros tipos de
instituições do Estado. Ali ficavam junto a delinqüentes, idosos e pobres.
Mantoan (1995) explica que, no início do século XIX, inicia-se o período da institucionalização
especializada de pessoas com necessidades especiais, momento que marca o início da educação especial, em
uma perspectiva assistencial e segregativa. Nesse período, integrar significava o esforço de inserir na sociedade
pessoas com deficiências que tivessem alcançado algum nível de competência compatível com os padrões
sociais vigentes. Sugeria-se que a integração do indivíduo deficiente só ocorreria caso ele fosse capacitado a
superar as barreiras físicas, pragmáticas e atitudinais existentes na sociedade, dando ênfase na reabilitação, na
época, objetivo principal das escolas especiais.
A partir da década de 70 do século passado, surgiu um movimento contra a institucionalização e
segregação, com ênfase no integracionismo, que deu origem à implantação de serviços de apoio à manutenção

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 34


Educação especial
de estruturas de ensino diferenciado e à proliferação de classes especiais, salas de recursos e serviços
especializados para onde eram encaminhados alunos com necessidades educativas especiais. Esse movimento
em favor da integração baseava-se na normalização, expressando que à pessoa com necessidades especiais
devem ser dadas condições semelhantes às oferecidas a uma pessoa “normal”. A pessoa com necessidades
especiais, assim, deveria participar das mesmas atividades sociais, educativas e recreativas freqüentadas por
grupos de sua idade. Segundo essa concepção, o indivíduo com necessidades especiais é uma pessoa com
direitos e deveres iguais a todo e qualquer ser humano.
Nesse sentido, a normalização deve ser entendida como objetivo e a integração como processo, pois, para
ele, integração é um fenômeno complexo que vai muito além de colocar ou manter excepcionais em classes
regulares, sendo parte do atendimento que atinge todos os aspectos do processo educacional.
Assim, o princípio da normalização implica na necessidade de grandes reformas na educação especial,
uma vez que ela precisa trabalhar com modalidades de atendimento mais integradoras.
A integração, segundo consta na Política Nacional de Educação Especial (BRASIL, 1994, p. 18), é:

[...] um processo dinâmico de participação das pessoas num


contexto relacional, legitimando sua interação nos grupos sociais.
A integração implica em reciprocidade. E, sob o enfoque escolar, é
um processo gradual e dinâmico que pode tomar distintas formas
de acordo com as necessidades e habilidades dos alunos.

Essa afirmativa traz implícita outra: as providências em prol da integração na escola não devem partir
apenas dos educadores especializados, mas de todos os envolvidos no processo escolar. O risco, com efeito, é de
apenas inserir o aluno com necessidades especiais no convívio com outras crianças, sem que se efetivem trocas
interativas com plena aceitação desse aluno com necessidades especiais.
Para Glat (1995), a integração não pode ser vista simplesmente como um problema de políticas
educacionais ou de modificações pedagógico-curriculares na educação especial. Integração é também um
processo subjetivo e inter-relacional. Glat (1995) demonstra que, embora seja possível cumprir uma lei que
obrigue as escolas a receberem crianças especiais em suas classes, não se pode fazer uma lei obrigando que
pessoas aceitem e sejam amigas das pessoas com deficiência. O que ele quer dizer é que a integração também é
um processo individual.
Cabe aos profissionais da educação especial oferecer a essa clientela uma conscientização de sua
condição psicossocial e a instrumentalização para lutar por uma condição de vida mais ampla.
Com esse olhar sobre a integração, deixamos de ver o aluno especial como um objeto de estudo ou um
agente passivo de nossas decisões educacionais, e passamos a entender que esse indivíduo é também um
consumidor ou usuário do saber e dos serviços que temos a oferecer, auxiliando-o na difícil missão de romper
barreiras físicas, afetivas e sociais que lhe impedem de viver plenamente como qualquer outra pessoa.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 35


Educação especial
O termo inclusão começou a se fortalecer em 1994, com a Declaração de Salamanca, que teve o objetivo
de promover uma educação para todos, resultando numa escola inclusiva (BRASIL, 2005) que reformulou seu
conteúdo programático e treinou novamente seus professores sobre as mais variadas necessidades especiais.
Essas necessidades especiais não se referem apenas às deficiências, mas também a outras condições, como
talentos, minorias étnicas, lingüísticas ou culturais, crianças marginalizadas.
Presenciamos, hoje, a coexistência conflitiva entre os paradigmas da integração e da inclusão escolar, os
quais encerram modalidades distintas de inserção de alunos com necessidades especiais no ensino regular. As
palavras inclusão e integração podem ser metaforizadas. As propostas de organização do sistema educativo
inspiradas no processo de integração são comparadas a uma cascata, enquanto que as que se baseiam na escola
inclusiva têm como metáfora um caleidoscópio.
No modelo de integração, cuja metáfora é a cascata, a forma de inserção vai depender do aluno, do nível
de sua capacidade de adaptação às opções do sistema escolar, da sua integração, seja em sala regular, em classe
especial ou mesmo em instituições especializadas. Baseia-se no princípio de normalização, isto é, na preparação
do aluno para acompanhar uma turma ou série em um ambiente menos restrito possível. Esse modelo tem sido
alvo de críticas, pois depende exclusivamente do progresso do aluno, como se este fosse o responsável solitário
por seu destino escolar. Pouco se exige da sociedade em termos de modificação de atitudes, espaços físicos,
objetivos e práticas escolares.
Já no modelo inclusivo, cuja metáfora é o caleidoscópio, defende-se o acesso de todas as crianças ao
ensino regular. De acordo com Marsha citada por Mantoan (2003, p. 26), o modelo inclusivo tem como símbolo
a metáfora do caleidoscópio, pois
O caleidoscópio precisa de todos os pedacinhos que o compõem.
Quando se retiram pedaços dele, o desenho se torna menos
complexo, menos rico. As crianças se desenvolvem, aprendem e
evoluem melhor em um ambiente rico e variado.

No ensino regular, a presença de alunos com necessidades educacionais especiais, embora torne o
conjunto da turma de alunos mais heterogêneo e complexo, também o torna mais rico. Assim, a educação
inclusiva trata da questão da diversidade humana, por meio da defesa de princípios e valores éticos, de ideais de
cidadania, justiça e igualdade para todos.
O que se pretende, com essa conceituação de integração e inclusão, é mostrar como, embora sejam termos
com significados semelhantes, estão sendo empregados para expressar situações diferentes de inserção, com
posicionamentos divergentes para a consecução de suas metas. Mantoan (1995, p. 8) faz um comentário sobre
essa diferença existente entre integração e inclusão.
O paradigma vigente de atendimento especializado e segregativo é extremamente forte e enraizado no
ideário das instituições e na prática dos profissionais que atuam no ensino especial. A indiferenciação entre os

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 36


Educação especial
significados específicos dos processos de integração e inclusão escolar reforça ainda mais a vigência do
paradigma tradicional de serviços e muitos continuam a mantê-lo, embora estejam defendendo a integração.
Pode-se analisar que, por mais que as políticas inclusivas sejam apresentadas e articuladas, muitas
pessoas com deficiências ainda estão presentes nas taxas de analfabetismo, evasão e repetência escolar, havendo
ainda, na escola, a exclusão dos que não aprendem no mesmo ritmo e da mesma forma que os outros.

Para que se possa conceber a escola inclusiva, é imprescindível


que a instituição escolar acolha os interesses e as dificuldades
apresentadas pelos alunos no decorrer do processo de
aprendizagem. O ambiente escolar precisa constituir-se como
espaço aberto, preparado e disposto às peculiaridades de cada um
(FERREIRA; GUIMARAES, 2003).

6.2 Revisando as terminologias


Segundo Sassaki (2002), as terminologias utilizadas para definir a palavra inclusão surgem recentemente
a partir de adoção da filosofia da inclusão social para modificar os sistemas sociais existentes.
As definições que se apresentam são relevantes para que haja compreensão das práticas sociais. Sabe-se
que essas práticas moldam nossas ações e nos permitem avaliar nossos programas, serviços e políticas sociais, e
acredita-se que os conceitos seguem a evolução de determinados valores éticos. Para Sassaki (2002, p. 27),

[...] é imprescindível dominarmos bem os conceitos exclusivistas


para que possamos ser participantes ativos na construção de uma
sociedade que seja realmente para todas as pessoas,
independentemente de sua cor, idade, gênero, tipos de
necessidades especiais e qualquer outro atributo social.

6.3 Algumas conceitualizações


A educação inclusiva compreende a construção de uma escola aberta para todos, que respeita e valoriza a
diversidade, desenvolve práticas colaborativas, forma leis de apoio à inclusão e promove a participação da
comunidade (BRASIL, 2004, p. 1).
Para isso, é fundamental a provisão de oportunidades equitativas a todos os estudantes, incluindo aqueles
com deficiências severas, para receber serviços educacionais eficazes, com os necessários auxílios e apoios
suplementares, em classe adequada à idade, em escolas da vizinhança, a fim de prepará-los para uma vida
produtiva como membros plenos da sociedade (SASSAKI, 2002, p. 122).
Segundo Booth e Ainscow citados por Brasil (2005, p. 41), a educação inclusiva se caracteriza por
• ser uma manifestação pontual de uma realidade mais ampla que é a sociedade inclusiva;
• reestruturar a cultura, as políticas e as práticas dos centros educacionais, para o atendimento à
diversidade dos alunos em suas respectivas localidades;
• referir-se ao esforço mútuo de relacionamentos de ensino nas comunidades;

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 37


Educação especial
• aumentar a participação dos estudantes;
• corrigir os fatores de exclusão cultural, curricular e comunitária nas escolas.
Trabalhamos os conceitos de integração, inclusão e segregação, relacionados às condições de atendimento
escolar dos estudantes com necessidades educacionais especiais. No paradigma da integração, o nível de
inserção depende do aluno com necessidades especiais e de sua capacidade de adaptação a uma escola
predeterminada. No paradigma da inclusão, é a escola que se adapta ao aluno com necessidades especiais.

CAPÍTULO 7: Estrutura, funcionamento e legislação da educação especial no Brasil

7.1 A educação especial nas leis dos governos e dos órgãos internacionais
A educação especial é parte da educação básica e perpassa todos os níveis de ensino. Visa atender aos
alunos com necessidades educacionais especiais, utilizando recursos materiais, equipamentos, estratégias e
metodologias que facilitem sua participação no processo educativo e favoreçam seu desenvolvimento e o pleno
exercício de sua cidadania.
Diante do exposto, é importante atentar para o fato de que a programação em educação especial é
individual, de acordo com as necessidades, as possibilidades, os ritmos e as características de cada criança.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 38


Educação especial
No Brasil, há um esforço real pela escolarização de todos e é possível pontuar ações de inclusão, em nível
nacional, estadual e federal, que vêm contribuindo para que todas as pessoas com deficiência usufruam de seus
direitos.
Nesse contexto, é válido mencionar que o País, graças aos esforços do Ministério da Educação (MEC),
vive um momento intenso de estudos, debates, reflexões e ações que visam a disseminar a política de inclusão
em todos os municípios brasileiros. O Programa de Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, implantado no
País em 2003, desenvolve ações que alcançam todos os municípios brasileiros, graças a uma extensa rede de
multiplicadores. Nesse contexto, registram-se inovações em relação às áreas e modalidades de atuação
pedagógica, oferecidas em classes especiais, salas de recursos, classes hospitalares, atendimentos domiciliares e
escolas especiais, de forma a atender às necessidades especificas dos alunos, considerando os fatores pontuais
que dificultam a participação no processo educativo. Vamos analisar agora alguns documentos legislativos,
internacionais e nacionais, que representam o principal referencial para as políticas de inclusão pedagógica e
social as pessoas com necessidades especiais.

7.2 Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)


O primeiro e mais antigo documento é a Declaração universal dos direitos humanos, que assegura às
pessoas com deficiência o direito à liberdade, a uma vida digna, à educação fundamental, ao desenvolvimento
pessoal e social e à livre participação na vida da comunidade.
Em seus artigos 1º e 2º, a Declaração proclama que todos os homens nascem livres e iguais, em dignidade
e direitos sem distinção de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política, de origem nacional
ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. No artigo 7º, a Declaração acrescenta que,
sendo iguais perante a lei, todos os homens, sem distinção, têm direito à igual proteção da lei.

7.3 Declaração de Jomtien (confederação mundial sobre educação para todos – Tailândia, 1990)
Os países que participaram, em 1990, da Confederação mundial sobre educação para todos reiteraram que
a educação é um direito fundamental de todos, independentemente de sexo, idade ou nacionalidade. Declararam
também que a educação é de fundamental importância para o desenvolvimento das pessoas e das sociedades,
constrói um mundo mais seguro, sadio, próspero e ambientalmente mais puro, e favorece o progresso social,
econômico, cultural, a tolerância e a cooperação internacional.
Ao assinar a Declaração de Jomtien, o Brasil assumiu, perante a comunidade internacional, o
compromisso de erradicar, em seu território, o analfabetismo e de universalizar o ensino fundamental no País.
Para honrar esse compromisso, o Brasil tem criado instrumentos norteadores para a ação educacional e

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 39


Educação especial
documentos legais para apoiar a construção de sistemas educacionais inclusivos, nas esferas municipal, estadual
e federal.

7.4 Declaração de Salamanca (Confederação Mundial sobre necessidades educacionais especiais –


Espanha, 1994)
Na Confederação mundial sobre necessidades educacionais especiais, os países signatários, entre os quais
o Brasil, declararam que todas as crianças têm o direito fundamental à educação e que a elas deve ser dada a
oportunidade de obter um nível aceitável de conhecimento. Cada criança tem características, interesses,
capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprios.
Por isso, os sistemas educativos devem ser projetados, e os programas devem ser aplicados de modo a
contemplar essas diferentes características e necessidades.
As pessoas com necessidades educacionais especiais devem ter acesso às escolas comuns e ser integradas
numa pedagogia centralizada na criança, capaz de atender às suas necessidades.
A Declaração de Salamanca se dirige aos governos, incitando-os a dar prioridade política e orçamentária
à melhoria de seus sistemas educativos, para que possam abranger todas as crianças, independentemente de suas
diferenças ou dificuldades individuais. Recomenda-se que os governos adotem, em suas políticas públicas, o
princípio da educação integrada, que permita a matrícula de todas as crianças em escolas comuns.
A Confederação de 1994 propõe também a criação de mecanismos descentralizados e participativos de
planejamento, supervisão e avaliação do ensino de crianças e adultos com necessidades educacionais especiais.
Para isso, considera fundamental a promoção da participação dos pais, das comunidades de pertença e das
organizações de pessoas com deficiência no planejamento e no processo de tomada de decisões, para atender
alunos com necessidades educacionais especiais.

7.5 Declaração da Guatemala (Convenção Interamericana para a eliminação de todas as formas de


discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência, 1999)
A Convenção de Guatemala definiu a deficiência como uma restrição física ou mental, de natureza
permanente ou transitória, que limita ou impede o exercício de uma ou mais atividades humanas.
Os Estados participantes da Convenção interamericana reafirmaram que as pessoas com deficiência
gozam dos mesmos direitos e das mesmas liberdades das outras pessoas, inclusive o direito de não ser
submetidas a discriminação com base na própria deficiência.

7.6 Constituição Federal (1988)


O que tem realizado o Brasil, no campo legislativo, em relação às pessoas com necessidades especiais?
Vamos conhecer alguns documentos normativos, começando pela Constituição Federal de 1988 (CF/88).

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 40


Educação especial
Em seu artigo 205, a Carta Magna brasileira afirma que a educação é um direito de todos e um dever do
Estado e da família, que devem promovê-la e incentivá-la com a colaboração da sociedade. A educação visa ao
pleno desenvolvimento da pessoa, ao exercício da cidadania e à qualificação para o trabalho.
No artigo 208, inciso III, a Constituição reza, de maneira mais específica, que é dever do Estado assegurar
atendimento educacional especializado às pessoas com deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.

7.7 Lei n. 7.853/89


Um ano após a entrada em vigor da CF/88, a Lei n. 7.853/89 define como crime recusar, suspender, adiar,
cancelar ou extinguir a matrícula de um estudante por causa de sua deficiência, em qualquer curso ou nível de
ensino, seja ele público ou privado. A pena para o infrator pode variar de um a quatro anos de prisão, mais
multa.

7.8 Estatuto da Criança e do Adolescente (eca – 1990)


Em 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente garante:
• o direito à igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola (também aos que não
tiveram acesso na idade própria), sendo o ensino fundamental obrigatório e gratuito;
• o respeito dos educadores;
• o atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular.

7.9 Lei n. 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)


A LDB é outro passo importante na promoção das pessoas com necessidades especiais. Em seu artigo 58,
a Lei de Diretrizes e Bases fornece uma importante definição de educação especial, contemplada como uma
modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos com
necessidades especiais.
Como você pode observar, a maioria dos documentos oficiais aqui contemplados preocupa-se em frisar a
necessidade de incluir a pessoa com deficiência em redes regulares de ensino, eventualmente complementando
sua formação regular com formas específicas de atendimento, direcionadas às suas necessidades especiais.

7.10 Decreto n. 3.298/99


Outra etapa relevante é constituída pelo Decreto n. 3.298/99, que, ao dispor sobre a política nacional para
a integração da pessoa portadora de deficiência, regulamenta a Lei n. 7.853/89 e prevê, em nível federal, o
tratamento a ser concedido às pessoas com deficiência.
O decreto compreende o conjunto de orientações normativas que objetivam assegurar o pleno exercício
dos direitos individuais e sociais das pessoas com necessidades especiais.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 41


Educação especial
7.11 Resolução CNE/CEB n. 2/01
A Resolução CNE/CEB n. 2/01 institui as diretrizes nacionais da educação de alunos que apresentem
necessidades educacionais especiais, na educação básica, em todas as suas etapas e modalidades.
É um documento de grande peso para educadores de todos os níveis de ensino, envolvidos com a
educação especial. Nele devem se inspirar todo planejamento e toda ação educativa empreendida em prol dos
portadores de deficiências.

7.12 Resolução CNE/CEB n. 56/03


A Resolução n. 56/03 estabelece parâmetros para a oferta de educação especial nos sistemas estaduais de
ensino em consonância com as diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica. O atendimento
de alunos com necessidades educacionais especiais deverá ser realizado, no âmbito dos sistemas estaduais de
ensino, preferencialmente, em classes comuns do ensino regular.
Apresentamos uma visão de conjunto das mais importantes leis sobre necessidades especiais, em nível
nacional e internacional. Em nível internacional, conhecemos a Declaração Universal dos Direitos Humanos
(1948), a Declaração de Jomtien (1990), a Declaração de Salamanca (1994) e a Declaração de Guatemala
(1999). Em nível nacional, estudamos a Constituição Federal (1988), a Lei n. 7.853/89, o Estatuto da Criança e
do Adolescente (1990), a Lei de Diretrizes e Bases (1996), o Decreto n. 3.298/99, a Resolução CNE/CEB n.
2/01 e a Resolução CNE/CEB n. 56/03.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 42


Educação especial
CAPÍTULO 8: Proposta de inclusão educacional e aceitação da diversidade

8.1 Desafios para incluir


A escola brasileira é marcada pelo fracasso e pela evasão de uma parte expressiva dos seus alunos, que
são deixados à margem pelo insucesso e por não corresponderem às solicitações do sistema educacional. O
atendimento escolar desse tipo de alunos deveria adequar-se às suas necessidades e levar em conta que, muitas
vezes, a exclusão escolar é produto de uma prévia exclusão social.
Trata-se, por vezes, de alunos que são vítimas das condições de pobreza em que vivem, em todos os
sentidos (MANTOAN, 2003). Esses alunos que repetem várias vezes a mesma série são conhecidos, nas
escolas, como sobra. A maioria deles chega a ser expulsa da escola ou evade. Segundo Mantoan (2003), as
soluções comumente praticadas para se mudar essa situação parecem não buscar as causas que geraram as
dificuldades dos alunos. Muitas vezes não passam de medidas imediatistas, quando, no entanto, deveriam ser
preventivas. Pretende-se resolver a situação a partir de ações que não buscam novas saídas e que não vão a
fundo das causas geradoras do fracasso escolar. Esse fracasso continua sendo atribuído exclusivamente ao
aluno, pois a escola reluta em admitir sua parcela de responsabilidade.
Mantoan (2003, p. 28) atesta que a inclusão total irrestrita

[...] é uma oportunidade que temos para reverter a situação da


maioria de nossas escolas, as quais atribuem aos alunos as
deficiências que são do próprio ensino ministrado por elas. Sempre
se avalia o que o aluno aprendeu e o que ele não sabe. Mas
raramente se analisa o que a escola ensina, de modo que os alunos
não sejam penalizados pela repetência, evasão, discriminação,
exclusão.

Mantoan (2003) focaliza os questionamentos sobre a inclusão a partir de três pontos, que são o alvo de
toda ação inclusiva que queira revitalizar a educação escolar:
• a questão identidade versus diferença;
• a questão legal;
• a questão das mudanças.

8.2 Identidade versus diferença


As propostas e as políticas educacionais sobre inclusão consideram e valorizam verdadeiramente as
diferenças na escola, ou seja, os alunos com deficiências e todos os outros alunos excluídos?
As propostas distinguem e apreciam as diferenças como condição para que exista progresso,
transformação, ampliação e aprimoramento da educação?

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 43


Educação especial
De acordo com Mantoan (2003, p. 30), ao se avaliar as propostas de inclusão dentro das escolas, emergem
freqüentemente orientações predominantemente conservadoras. Trata-se de atitudes de tolerância e de respeito,
que, muitas vezes, deixam transparecer certa superioridade e a concepção de que as diferenças sejam fixas,
absolutamente estabelecidas, de tal maneira que não nos resta outro caminho que respeitá-las. As deficiências
são concebidas como inerentes à pessoa, como se fossem um sinal inapagável que só nos resta aceitar. De
acordo com essa visão, foram criados ambientes educacionais, protegidos, separados e reservados a
determinados indivíduos, considerados diferentes.
Para Mantoan (2003, p. 31),
A diferença nesses espaços é ‘o que o outro é’ – ele é branco, ele é
religioso, ele é deficiente. Como nos afirma Silva (2000), é o que
está sempre no outro, que está separado de nós para ser protegido
ou para nos protegermos dele. Em ambos os casos, somos
impedidos de realizar e de conhecer a riqueza da experiência da
diversidade e da inclusão. A identidade é o que se é, como afirma
o mesmo autor – sou brasileiro, sou negro, sou estudante.

Em uma dimensão analítica e transformadora, a ética vem respaldar a luta pela inclusão escolar das
pessoas e se opõe à ação conservadora que exclui os indivíduos nos espaços educacionais ou sociais. Toda ação
educativa deve apresentar como objetivo principal a convivência com as diferenças. A aprendizagem é uma
experiência feita de relações e de participação. A subjetividade do aprendiz é, ao mesmo tempo, prévia e
construída em grupo dentro da sala de aula.
A inclusão é resultado de uma educação plural, democrática e transgressora.
É causadora de crise de identidade escolar e institucional. Desestrutura também a identidade dos
professores, provocando assim uma (re)significação da identidade do aprendiz. Mantoan (2003) afirma que o
aprendiz da escola inclusiva é outro sujeito, que não tem identidade presa a modelos ideais, imutáveis e
essenciais.
O modelo educacional excludente, normativo e elitista é desconstruído a partir do direito à diferença no
espaço social da escola. Segundo Mantoan (2003), é necessário reconhecer as culturas, a pluralidade, o
aparecimento de outras manifestações intelectuais, sociais e afetivas. Necessitamos estabelecer uma nova ética
escolar, que nasce de uma consciência ao mesmo tempo individual, social e, talvez, planetária. Ao pensar em
uma cultura global e globalizada,
Mantoan (2003, p. 33) afirma que
Parece contraditória a luta de grupos minoritários por uma política
identitária, pelo reconhecimento de suas raízes – como fazem os
surdos, os deficientes, os hispânicos, os negros, as mulheres, os
homossexuais. Há, pois, um sentimento de busca das raízes e de
afirmação das diferenças. Devido a isso, contesta-se hoje a
modernidade nessa aversão pela diferença.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 44


Educação especial
É necessário refletirmos que nem toda diferença torna os indivíduos inferiores uns aos outros. Precisamos
ter consciência de que há diferenças e igualdades.
As pessoas têm suas particularidades. Nem tudo deve ser igual, nem tudo deve ser diferente. As pessoas,
de acordo com Santos citado por Mantoan (2003), têm o direito de ser diferentes, quando a igualdade as
descaracteriza, e o direito de ser iguais, quando a diferença as inferioriza.
Você pôde conferir os desafios de um efetivo processo inclusivo em nossa sociedade e em nosso sistema
escolar. Entre eles, a questão da identidade versus diferença e a questão legal que você estudou na aula 2. Para
quem avalia as estratégias de inclusão no universo escolar, resulta claro que, na maioria dos casos, trata-se de
tentativas conservadoras. Por isso, nesta aula, partimos do pressuposto de que, além de conhecer os direitos dos
alunos vinculados à educação especial, precisamos, sobretudo, aprender a respeitar esses direitos de forma que
de fato nossos alunos possam ser inclusos no sistema regular de ensino, sem prejuízos para a sua formação.

CAPÍTULO 9: Diversidade, deficiência e cidadania

9.1 Educação inclusiva: mitos e verdades


PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 45
Educação especial
Os mitos sempre fascinaram os indivíduos e influenciaram sua existência.
Para Ferreira e Guimarães (2003), os mitos consistem na transformação de acontecimentos históricos e de
seus personagens para a categoria divina. São expressão de uma realidade original mais poderosa e importante,
que governa a vida presente, o destino e os trabalhos da humanidade. Leia, a seguir, a história do nascimento do
deus grego Hefestos, filho de Hera. Essa história é uma demonstração de como o ser humano se comporta diante
de uma deficiência.
A deusa Hera, pacientemente, esperou que nascesse o filho. Tão
logo o examinou, sob a luz, tomada de expectativa e ansiedade, foi
assolada pela mais profunda decepção: o pequeno Hefestos
(Vulcano, nome latino de deus grego) era feio, disforme e coxo.
Um bebê com deficiência não lhe alegrava o coração, pois jamais
ela teria coragem de apresentar aos deuses do Olímpio tão
horrenda criança. Envergonhada com o aspecto do filho, agarrou-o
pela perna mais curta e atirou-o ao mar. Ao fim da longa queda, o
deus chocou-se contra a superfície rochosa da ilha de Lemos,
ficando deficiente para sempre (FERREIRA; GUIMARÃES,
2003, p. 55).

Talvez em decorrência desse mito, na antiga Grécia, das crianças que nasciam com deficiências poucas
sobreviviam: algumas eram abandonadas, outras, eliminadas. Isso não era visto como um ato de crueldade, mas
como o cumprimento das ordens dadas pelos deuses gregos.
De acordo com Ferreira e Guimarães (2003), o universo do homem é simbólico.
O ser humano vive em grupos familiares, sociais, profissionais, e é nesse convívio que se determinam
suas atitudes, ações e reações. A concepção antropológica do grupo de pertença tem um peso considerável no
desenvolvimento da nossa auto-imagem. O homem age na sociedade em consonância com os papéis sociais a
ele atribuídos. Fica claro, portanto, que certos preconceitos sociais, ainda que recusados com firmeza, exercem
até hoje uma influência profunda. Ferreira e Guimarães (2003, p. 70) afirmam que os

[...] grupos minoritários – negros, índios, idosos e pessoas com


deficiências – são vistos não raro com reserva e distância. É
desgastante ao extremo para qualquer ser humano enfrentar o
“olhar público” de sua diferença. Pior desgaste é o
constrangimento, causado por atitudes preconceituosas camufladas
de excesso de zelo, como, por exemplo, a de impedir publicamente
a curiosidade infantil a respeito de uma bengala ou uma cadeira de
roda.

A discriminação representa um peso social não só para a pessoa com deficiência, mas para toda a
sociedade. As definições de inclusão, vistas na aula anterior, sinalizam, em sua dimensão sócio-histórica, a
necessidade de aprofundar as dimensões da diversidade. Isso implica na busca de compreender a
heterogeneidade, as diferenças individuais e coletivas, as especificidades do ser humano e sobre tudo as
diferentes situações vividas na realidade social e no cotidiano escolar (BRASIL, 2002, p. 11). Precisamos
refletir sobre a diversidade na escola. De uma maneira tradicional a escola tem sido vista, em sua organização,
PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 46
Educação especial
segundo critérios seletivos e classificatórios, em conseqüência do enfoque homogeneizador do ensino. Isso se
reflete em um modelo marcado pela uniformidade no emprego do currículo, a partir dos falsos pressupostos de
que todos os alunos sejam iguais, aprendam da mesma maneira e tenham um mesmo ritmo de aprendizagem.
Por conseguinte, o aprendiz que não se adapta à metodologia da escola e ao currículo proposto é deixado à
margem, discriminado, muitas vezes afastado da escola ou encaminhado a especialistas com os mais variados
rótulos. Tendo em vista essa atitude discriminante e excludente, a escola tem contribuído muito mais para
aprofundar as desigualdades do que para resolvê-las (BRASIL, 2005, p. 37).
Precisamos pensar a inclusão numa perspectiva humana e sócio-cultural que procura enfatizar formas de
interação positivas. Precisamos olhar as possibilidades, proporcionar apoio às dificuldades, acolher as
necessidades, atender todos sem nenhum tipo de discriminação. Esse trabalho deve ser feito através de parcerias
com os pais, os alunos e a comunidade escolar, buscando sempre informações para que o processo de ensino e
aprendizagem realmente atenda as reais necessidades dos aprendizes, visando uma inclusão de todos no
processo educacional.
Surge então a necessidade de se compreender quais seriam as reais dificuldades que os alunos com
necessidades educacionais especiais encontram na classe comum, ou seja, nas salas de aula do ensino regular.
Com o propósito de igualar as oportunidades para todos, visando a uma educação realmente inclusiva, os
sistemas educacionais necessitam passar por reformas reais. Sua estrutura e sua organização devem ser
flexibilizadas, tanto no que se refere às formas de inclusão como ao currículo escolar.
A escola e a sociedade, ao pensar num processo inclusivo que atenda a diversidade humana, não devem
enfatizar as desvantagens ou deficiências do educando, mas sim a maneira de melhor compreender o contexto
educacional em que se manifestam as dificuldades, tornando mais adequado e acessível o currículo.

Somente quando o sistema educacional conseguir um ajuste real,


para melhor compreender o contexto escolar, é que estará
assegurando o direito de todos a uma educação de qualidade.
Nesse sentido, o recolhimento e a abordagem da diversidade
constituem o ponto de partida para evitar que as diferenças se
transformem em desigualdades e desvantagens entre os alunos.
(BRASIL, 2005, p. 37)
Ainda referindo-se ao atendimento à diversidade humana dentro do espaço escolar, Brasil (2005) sinaliza
alguns princípios, entre os quais, destacam-se os que apresentamos a seguir.
• Personalização, em lugar de padronização, para distinguir as diferenças individuais, sociais e culturais
de cada aluno inserido no espaço escolar.
A ação educacional se norteia a partir da diversidade, numa prática pedagógica personalizada.
• Resposta diversificada, em lugar de resposta uniforme, para adaptar os processos de ensino e
aprendizagem e o currículo escolar às diferentes situações iniciais.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 47


Educação especial
• Heterogeneidade, em lugar de homogeneidade, para educar com embasamento em valores de respeito e
aceitação.

9.2 Política de inclusão: implicações e contradições


O começo das discussões sobre a política educacional de inclusão ocorreu em 1990, na Tailândia (Carta
de Jomtin). Em 1993, essas discussões tomaram força no Plano Nacional de Educação para Todos. A
Declaração Mundial de Educação para Todos propõe uma educação destinada a satisfazer as necessidades
básicas de aprendizagem, o desenvolvimento pleno das potencialidades humanas, a melhoria da qualidade de
vida e do conhecimento e a participação do cidadão na transformação cultural de sua comunidade (art. 1º,
Declaração de Educação para todos, citado por Brasil, 2000, p. 12).
Outro importante acontecimento que trouxe modificações relevantes na educação especial, no que se
refere às questões político-educacionais de inclusão, foi a Declaração de Salamanca de 1994, que apresentou
como meta a inclusão de todas as crianças, inclusive das crianças com deficiências graves ou com dificuldades
de aprendizagem, no ensino regular. O desafio maior das escolas é propor uma práxis pedagógica que atenda as
especificidades de aprendizagem ou deficiências. O problema, porém, está nas propostas metodológicas
inadequadas que se configuram no espaço educacional. A escola necessita refletir sobre sua prática pedagógica,
questionar seus projetos político-pedagógicos com olhar crítico, verificando sua concepção de diversidade.
De acordo com Brasil (2000, p. 12), as manifestações sobre inclusão consideram necessária uma política
que tenha como objetivo a modificação do sistema, a organização e a estrutura do funcionamento educativo e a
diversidade como eixo central no processo de aprendizagem na classe comum. A mudança de entendimento ao
que se refere o documento respalda-se na confiança de que as mudanças estruturais, organizacionais e
metodológicas poderão atender às necessidades educativas e favorecer todos os estudantes, independentemente
de apresentarem algum tipo de deficiência. No projeto político-pedagógico da escola, é necessário que fique
explícito o compromisso da escola sobre o processo de ensino-aprendizagem, com provimento de recursos
pedagógicos especiais necessários, apoio aos programas educativos e capacitação de recursos pedagógicos
especiais para atender as diversidades dos alunos (DNEEEB, 2001, p. 27 citado por BRASIL, 2000).

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 48


Educação especial
CAPÍTULO 10: Adaptações curriculares para alunos com necessidades especiais

10.1 Diretrizes curriculares: políticas afirmativas


Educar na diversidade exige um currículo aberto, com propostas diversificadas e flexíveis quanto à
organização e ao funcionamento das instituições educacionais para atender a demanda diversificada dos alunos.
O currículo deve propiciar inclusão de todos os aprendizes e necessita ser adequado às reais necessidades,
capacidades e diferenças individuais de todos os alunos.
Essa adequação deve ser concebida como um componente vivo da educação para todos que têm por
finalidade flexibilizar a prática educacional para proporcionar o progresso do educando em função de suas
necessidades educacionais (BRASIL, 2002). O currículo é o resultado da seleção e organização de conteúdos
culturais a serem trabalhados em ambientes de ensino e aprendizagem, sob forma de componentes, atividades,
experiências e avaliações.
Os princípios que deverão fundamentar os currículos das escolas encontram- se nas Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental (Parecer CEB n. 4/98). A escola deve nortear suas ações
pedagógicas com base em três ordens de princípios:
a) os princípios éticos da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum;
b) os princípios políticos dos direitos e deveres de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à
ordem democrática;
c) os princípios estéticos da sensibilidade, da criatividade e da diversidade de manifestações artísticas e
culturais.
Você sabe que o currículo educacional pode ser concebido a partir de várias teorias. A concepção
tradicional e tecnicista pensa e faz a escola segundo uma racionalidade burocrática e técnica. A concepção
crítica articula-se em movimentos e tendências das décadas de 60 e de 70: a nova Sociologia da Educação,
originada na Inglaterra; a proposta de educação problematizadora de Paulo Freire, no Brasil; a crítica de Louis
Althusser em sua obra A ideologia e os aparelhos ideológicos de Estado; as teorias da reprodução social, de
Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron; o movimento de reconceitualização, originado nos Estados Unidos.
Com certeza, você se lembra dos estudos sobre essas teorias, realizados nas disciplinas de Currículo e
Conhecimento (2º período) e de Currículo e Programas (3º período). O nosso objetivo aqui é relembrar que o
currículo teve uma história importante para os espaços educacionais e sociais e para a sua abertura à
diversidade. Ao longo dessa história, houve uma preocupação crescente em função da existência do outro, das
suas diferenças, das suas diversidades e da multiculturalidade. Admitir o outro é reconhecer a existência de
outras leituras da realidade; negar a diferença é persistir em assumir o outro como inimigo. O sujeito
hegemônico possui em sua base identitária uma só linguagem, um único sistema de leitura da realidade. Suas
posturas teóricas reivindicam a propriedade exclusiva da verdade.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 49


Educação especial
As diretrizes curriculares em uma perspectiva inclusiva proporcionarão, então, uma interação entre
escola, sociedade e cultura, em que uma estará interligado à outra, como mostra a figura a seguir.

10.2 Modelo de atendimento à diversidade nos ambientes educacionais


Um modelo de atendimento à diversidade exige apoios, na maioria das vezes, indiretos, dentro da sala de
aula. Só em casos excepcionais é que os apoios devem ser prestados fora das classes regulares. No modelo
inclusivo, o aluno é atendido conforme suas características e necessidades individuais, levando em conta três
níveis de desenvolvimento essenciais: o acadêmico, o socioemocional e o pessoal (CORREIA citado por
RODRIGUES, 2006). Veja a figura a seguir.

Dessa maneira, o discurso educacional, segundo Correia citado por Rodrigues (2006, p. 256), tem como
objetivo primordial responder às necessidades específicas dos aprendizes nos espaços educacionais,
fundamentando-se em três parâmetros distintos que permitem aos alunos corresponder, na medida do possível,
às solicitações do currículo comum do ano que freqüentam. Os problemas, assim, podem ser analisados como
emergentes
• de fatores sociais (pobreza, expectativas família/escola, diferenças culturais);
• dos ambientes de aprendizagem (ensino inadequado, recursos materiais insuficientes, recursos humanos
inexistentes);

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 50


Educação especial
• de peculiaridades individuais. Neste caso, devem-se identificar e avaliar as necessidades educativas
especiais de cada aluno, por meio de observações e avaliações pontuais.
Por meio desse discurso educacional inclusivo, os parâmetros tornam-se integrados, apresentando desta
maneira em seu modelo respostas à diversidade.
No art. 3º da Resolução n. 2, de 11 de dezembro de 2001, educação especial é uma modalidade da
educação escolar e
[...] um processo educacional definido por uma proposta
pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais
especiais, organizados institucionalmente para apoiar,
complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os
serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação
escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos
educandos que apresentam necessidades educacionais especiais,
em todas as etapas e modalidades da educação básica.

10.3 Diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica – Resolução 02/ 2001
Veremos agora como as escolas devem efetivar as necessárias adaptações curriculares para realizar uma
verdadeira educação inclusiva. Nosso referencial será a Resolução 2/01 que estabelece as diretrizes nacionais de
educação especial na rede regular de ensino.
A Resolução 2/01 prevê que o atendimento escolar dos alunos com necessidades educacionais especiais
tenha início na educação infantil, em creches e pré-escolas, assegurando serviços de educação especial sempre
que se evidencie a necessidade de atendimento educacional especializado.
Os sistemas de ensino têm obrigação de matricular todos os alunos. As escolas não podem recusar a
matrícula de um aluno com deficiência, alegando não possuir estrutura para atendê-lo, mas devem organizar-se
para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições
necessárias para uma educação de qualidade para todos.
Todo sistema de ensino deve destinar recursos humanos, materiais e financeiros à criação de um setor de
educação especial, responsável pela política inclusiva da escola.
As necessidades educacionais especiais dos alunos são avaliadas durante o processo de ensino e
aprendizagem, em classes regulares, a partir de assessoramento técnico do setor de educação especial, da
experiência do corpo docente, da direção, da coordenação, da orientação e da supervisão educacional, dos
serviços de saúde, da assistência social e da colaboração da família.
A estrutura organizativa da escola deve apresentar projetos político-pedagógicos, currículos,
metodologias de ensino e recursos didáticos flexíveis, com capacidade de contemplar e atender as diferenças.
Apesar de a educação especial ser fornecida em classes regulares de ensino, nos casos em que for
necessário, não se despensa o apoio pedagógico especializado, mediante professores especializados em
educação especial, professores intérpretes de linguagens e códigos aplicáveis, professores e outros profissionais

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 51


Educação especial
itinerantes intra e interinstitucionalmente, outros apoios necessários à aprendizagem, à locomoção e à
comunicação.
O calendário letivo também deve gozar de uma relativa flexibilização, de forma que alunos com
deficiência mental ou com graves deficiências múltiplas possam concluir em tempo maior o currículo previsto,
evitando-se grande defasagem entre a idade do aluno e a série cursada.
Em casos excepcionais em que certos alunos apresentem dificuldades acentuadas de aprendizagem ou
condições de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alunos e demandem ajudas e apoios intensos
e contínuos, as escolas podem criar, extraordinária e transitoriamente, classes especiais. A partir da observação e
avaliação do desenvolvimento apresentado pelo aluno, a equipe pedagógica da escola e a família devem decidir
o momento mais adequado para o retorno à classe comum. Em casos ainda mais excepcionais, quando as
necessidades especiais de certos alunos requeiram atenção individualizada, recursos, ajudas e apoios intensos e
contínuos, bem como adaptações curriculares tão significativas que a escola comum não consiga prover, a lei
permite o atendimento em escolas especiais. Aqui também, a partir da observação e avaliação por parte da
equipe pedagógica e da família do aluno, deve-se decidir o momento mais adequado para a inserção ou
reinserção do aluno com necessidades especiais na rede regular de ensino.
No processo de adaptação que a escola persegue com relação às necessidades especiais de seus alunos, no
espírito de uma educação realmente inclusiva assim como é preconizada atualmente pelo MEC, incluem-se
padrões arquitetônicos mínimos de acessibilidade e utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o
sistema Braille e a língua de sinais.
Concluindo esta aula, podemos questionar se as escolas que nós conhecemos estão preparadas para
acolher e atender as necessidades de cada caso, sem excluir ninguém do processo educacional. Embora com
dificuldades de natureza financeira e de capacitação profissional, cabe a cada escola trabalhar de acordo com a
realidade do seu alunado para uma aprendizagem realmente significativa e inclusiva.
Vimos que uma política inclusiva não pode limitar-se à inserção física das pessoas com necessidades especiais
nas salas regulares de ensino. Deve-se, de fato, promover uma reestruturação das concepções curriculares de
ensino e até dos espaços físicos e das metodologias de ensino. Deve-se repensar a escola.
CAPÍTULO 11: O professor e o processo de inclusão

11.1 Formação de educadores na educação inclusiva: construindo a base de todo processo


Analisar a inclusão dos indivíduos e das diversidades na rede regular de ensino brasileiro nos leva a
refletir primeiramente sobre a relação entre a formação do educador e as práticas pedagógicas contemporâneas.
Também nos obriga a pensar a formação desse educador para atuar em uma nova concepção de educação que
visa à igualdade de oportunidades e à qualidade nos serviços ofertados a todos os aprendizes.
A formação dos professores torna-se necessária diante dos novos cenários da educação inclusiva.
Percebe-se que um dos maiores dilemas da educação inclusiva ainda é a formação inicial dos educadores, que,
PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 52
Educação especial
em muitos casos, deparam-se com situações inusitadas em sala de aula, onde muitos alunos não correspondem
aos padrões de ensino e aprendizagem da escola. Um dos problemas apresentados pelos educadores é que, em
sua formação inicial, não tiveram componentes curriculares de educação inclusiva e conhecimentos sobre as
necessidades educacionais especiais dos alunos.
As principais dificuldades no campo da educação especial são relativas a uma formação inadequada dos
recursos humanos. Existe, portanto, uma necessidade urgente de repensar e redesenhar as bases curriculares da
formação inicial e da formação continuada de educadores e outros profissionais vinculados ao mundo da
educação especial. Outro dilema no processo de inclusão é o volumoso número de alunos em sala e a falta de
recursos para sustentação da prática pedagógica.
A Resolução 2/01, como vimos na aula 10, institui diretrizes nacionais para a educação especial na
educação básica e ressalta que cabe aos sistemas de ensino estabelecer normas para seu funcionamento, elaborar
seu projeto político-pedagógico e contar com professores capacitados e especializados. São considerados hábeis
a atuar em classes comuns com alunos que apresentam necessidades educacionais especiais aqueles que
comprovem que, em sua formação, tiveram componentes curriculares relativas à educação especial. Tais
professores devem ser competentes em flexibilizar a ação pedagógica nas diferentes áreas de conhecimento, de
modo adequado às necessidades especiais de aprendizagem; avaliar continuamente a eficácia do processo
educativo para o atendimento de necessidades educacionais especiais; atuar em equipes multidisciplinares,
inclusive com professores especializados em educação especial.
São considerados professores especializados em educação especial aqueles que sabem identificar as
necessidades educacionais especiais, para definir, implementar, liderar e apoiar a implementação de estratégias
de flexibilização, adaptação curricular, procedimentos didático-pedagógicos e práticas alternativas, adequados
ao atendimentos das mesmas, bem como trabalhar em equipe, assistindo o professor de classe comum nas
práticas que são necessárias para promover a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais.
Os professores especializados em educação especial deverão comprovar formação em cursos de
licenciatura em educação especial ou em uma de suas áreas, preferencialmente de modo concomitante e
associado à licenciatura para educação infantil ou para os anos iniciais do ensino fundamental; complementação
de estudos ou pós-graduação em áreas específicas da educação especial.
Aos professores que já estão exercendo o magistério devem ser oferecidas oportunidades de formação
continuada, inclusive em nível de especialização, pelas instâncias educacionais federais, estaduais ou
municipais.
A Libras deve ser inserida como componente curricular obrigatória nos cursos de formação de
professores para o exercício do magistério. Além disso, a legislação brasileira (Decreto n. 5.626/05; Lei n.
10.098/00) estabelece que a Libras deve ser ofertada como componente curricular optativa nos demais cursos de
educação superior e na educação profissional.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 53


Educação especial
A formação de docentes para o ensino de Libras nas séries finais do ensino fundamental, no ensino médio
e na educação superior deve ser realizada em nível superior, em curso de graduação de licenciatura plena em
Letras: Libras ou em Letras: Libras/Língua Portuguesa.
Somente com a realização de ações desse tipo, o profissional da educação estará realmente habilitado para
educar na diversidade.
Essa preocupação com os profissionais que atuam nas salas de aula regular ou nas salas de recursos veio
ao encontro das reais necessidades tanto dos professores como dos alunos. Observa-se, atualmente, nas escolas
regulares do nosso País, um grande número de alunos com perdas auditivas severas que pode, assim, beneficiar-
se dessas medidas formativas e educacionais previstas nos textos legislativos.
Vimos que existe uma demanda crescente de formação específica para a inclusão. Tratamos dos requisitos
necessários a um formador que queira trabalhar na perspectiva da inclusão das diferenças. Observamos como
tudo isso se apóia numa base legislativa peculiar e em políticas públicas próprias.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 54


Educação especial
CAPÍTULO 12: Educação inclusiva: modalidade de ensino

12.1 Organização do atendimento na rede regular de ensino


A escola regular, ao viabilizar a inclusão de alunos com necessidades especiais, deve promover a
organização de classes comuns e de serviços de apoio pedagógico especializado. Extraordinariamente, pode
promover a organização de classes especiais, para atendimento em caráter transitório.

12.2 Modalidades de ensino


Os serviços de apoio pedagógico especializado ocorrem no espaço escolar e envolvem professores com
diferentes funções. Vejamos a seguir as modalidades de ensino praticáveis no ensino regular.

12.2.1 Classe comum

A classe comum é um serviço que se efetiva por meio do trabalho de equipe, abrangendo professores da
classe comum e da educação especial, para o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos
durante o processo de ensino e aprendizagem. Pode contar com a colaboração de outros profissionais, como os
psicólogos escolares.
Na organização das classes comuns, faz-se necessário prever:
a) professores das classes comuns e da educação especial, capacitados e especializados para o
atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos;
b) alunos com necessidades educacionais especiais distribuídos pelas várias classes, de modo que essas
classes comuns se beneficiem das diferenças e ampliem positivamente as experiências de todo os alunos, dentro
do princípio de educar para a diversidade;
c) currículos flexíveis e adaptados que considerem o significado prático e instrumental
dos conteúdos básicos, metodologias de ensino e recursos didáticos diferenciados, processos de avaliação
adequados ao desenvolvimento dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais;
d) serviços de apoio pedagógico especializado: apoios necessários à aprendizagem, à locomoção e à
comunicação, na classe comum; equipamentos e materiais específicos, nas salas de recursos;
e) avaliação pedagógica durante o processo de ensino e aprendizagem, inclusive para identificação das
necessidades educacionais especiais e a eventual indicação dos apoios pedagógicos adequados;
f) temporalidade flexível do ano letivo, para atender às necessidades educacionais especiais de alunos
com deficiência mental ou graves deficiências múltiplas, de forma que possam concluir em tempo maior o
currículo previsto, evitando-se grande defasagem idade/série;

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 55


Educação especial
g) condições para reflexão, ação e elaboração teórica da educação inclusiva, articulando experiência e
conhecimento com as necessidades/ possibilidades surgidas na relação pedagógica, inclusive por meio de
colaboração com instituições de ensino superior e de pesquisa;
h) uma rede de apoio interinstitucional que envolva profissionais das áreas da Saúde e da Assistência
Social, por meio de convênios com organizações públicas ou privadas;
i) atividades que favoreçam o aprofundamento e o enriquecimento de aspectos curriculares aos alunos que
apresentam superdotação, de forma que sejam desenvolvidas suas potencialidades, permitindo-lhes concluir em
menor tempo a educação básica.
Para atendimento educacional aos superdotados, é necessário:
• organizar os procedimentos de avaliação pedagógica e psicológica de alunos com características de
superdotação;
• prever a possibilidade de matrícula do aluno em série compatível com seu desempenho escolar, levando
em conta, igualmente, sua maturidade sócioemocional;
• cumprir a legislação no que se refere:
• ao atendimento suplementar para aprofundar e/ou enriquecer o currículo;
• à aceleração ou ao avanço, regulamentados pelos respectivos sistemas de ensino, permitindo, inclusive,
a conclusão da educação básica em menor tempo;
• ao registro do procedimento adotado em ata da escola e no dossiê do aluno;
• incluir, no histórico escolar, as especificações cabíveis;
• incluir o atendimento educacional ao superdotado nos projetos pedagógicos e regimentos escolares,
inclusive por meio de convênios com instituições de ensino superior e com outros segmentos da comunidade.
As escolas de educação básica devem constituir parcerias com instituições de ensino superior com vistas à
identificação de alunos que apresentem altas habilidades/superdotação, para apoiar o prosseguimento de estudos
no ensino médio e no ensino superior, inclusive mediante a oferta de bolsas de estudo, destinando-se tal apoio
prioritariamente àqueles alunos que pertençam aos estratos sociais de baixa renda.

12.2.2 Sala de recursos multifuncionais


A sala de recursos multifuncionais é um serviço de natureza pedagógica, conduzido por professor
especializado, que suplementa (no caso dos superdotados) e complementa (para os demais alunos) o
atendimento educacional realizado em classes comuns da rede regular de ensino. Esse serviço realiza-se na
escola, em local dotado de equipamentos e recursos pedagógicos adequados às necessidades educacionais
especiais dos alunos, podendo estender-se a alunos de escolas próximas, nas quais não exista essa modalidade
de atendimento.
Pode ser realizado individualmente ou em pequenos grupos, para alunos que apresentem necessidades
educacionais especiais semelhantes, em horário diferente daquele em que ocorre a freqüência da classe comum.

PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 56


Educação especial

12.2.3 Classe especial


A classe especial é uma sala de aula em escola comum. Nesse tipo de atendimento o professor de
educação especial utiliza métodos, técnicas, procedimentos didáticos e recursos pedagógicos especializados,
visando a desenvolver o currículo com a flexibilidade necessária às condições específicas de cada aluno.
É importante lembrar que o atendimento especializado é um direito do aluno com necessidades educativas
especiais, paralelamente à sua inclusão na classe comum do ensino regular. A educação inclusiva é um processo
gradativo que permite aos sistemas se adequarem paulatinamente à nova realidade educacional, construindo
práticas institucionais e pedagógicas que garantam qualidade de ensino a todos os alunos.
Respeitar a diversidade significa dar oportunidades a todos de aprender os mesmos conteúdos, com as
necessárias adaptações em relação a eventuais deficiências.
Isso não significa elaborar atividades mais fáceis para quem apresenta necessidades especiais, mas levar
em conta as dificuldades de cada um, para que haja um desenvolvimento sadio e gradativo das competências e
habilidades de cada aluno.

12.3 Integração das modalidades de ensino


Vale ressaltar que as modalidades de atendimento aqui discutidas são de fundamental importância para o
desenvolvimento do aluno com necessidades educativas especiais e devem ser previstas no projeto político-
pedagógico. Esse, por ser a matriz do trabalho escolar, deve ser elaborado por todos os segmentos da
organização escolar: gestores, educadores, funcionários, alunos e pais. O projeto define o tipo de sociedade e o
tipo de cidadão que se pretende formar.
Por ter caráter político e cultural, deve ser construído no âmbito da escola, observando as necessidades
educativas especiais dos alunos para que a organização dos atendimentos educacionais possa de fato dar
respostas pedagógicas condizentes à diversidade existente na escola.
A escola inclusiva é um espaço de construção de cidadania e de convivência social do ser humano,
durante as primeiras fases de seu desenvolvimento. Ela tem papel primordial no desenvolvimento da
consciência dos direitos e deveres do cidadão, já que é na escola que a criança e o adolescente começam a
conviver num coletivo diversificado, fora do contexto familiar.
O que se espera de uma escola inclusiva? Que reconheça os direitos de seus educandos; que respeite a
diversidade; que cada criança receba aquilo de que precisa; que ensine aos surdos, a língua de sinais; que
ofereça às pessoas com dificuldades motoras tecnologias de educação alternativas, às pessoas com problemas de
aprendizagem, jogos coloridos e muita repetição, aos cegos, BRAILLE, e a todos o direito de aprender com
modalidades e ritmos próprios.

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Educação especial
Verificamos que, além do atendimento em classe comum, o aluno com necessidades educacionais
especiais pode receber outros tipos de acompanhamento pedagógico e ser atendido em classes especiais e em
salas de recursos multifuncionais.
Assim pode-se evitar a mazela do fracasso escolar que tanto desestimula nossos alunos.

CAPÍTULO 13: O que são dificuldades de aprendizagem?

Numa perspectiva orgânica, as DA são desordens neurológicas que interferem com a recepção, integração
ou expressão de informação, caracterizando-se, em geral, por uma discrepância acentuada entre o potencial
estimado do aluno e a sua realização escolar.
PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 58
Educação especial
Numa perspectiva educacional, as DA refletem uma incapacidade ou impedimento para a aprendizagem
da leitura, da escrita, ou do cálculo ou para a aquisição de aptidões sociais.
Isto quer dizer que os alunos com DA podem apresentar problemas na resolução de algumas tarefas
escolares e serem “brilhantes” na resolução de outras. Quer ainda dizer que, em termos de inteligência, estes
alunos geralmente estão na média ou acima da média.
O termo dificuldades de aprendizagem aparece-nos em 1962 com o fim de situar esta problemática num
contexto educacional, tentando, assim, retirar-lhe o “estigma clínico” que o caracterizava. Surge, então, uma
primeira definição proposta por Kirk (1962) em que era bem evidente a ênfase dada à componente educacional e
o distanciamento, em termos biológicos, de outras problemáticas, tal como deficiência mental, privação
sensorial, privação cultural, entre outras.
Uma outra definição digna de nota foi a proposta por Barbara Bateman (1965) que veio a constituir-se
num marco histórico, dado que englobava três fatores importantes que a caracterizavam: discrepância (a criança
com DA é considerada como possuindo um potencial intelectual acima da sua realização escolar); irrelevância
da disfunção do sistema nervoso central (para a determinação dos problemas educacionais da criança não era
capital evidenciar uma possível lesão cerebral); e exclusão (as DA da criança não eram devidas a deficiência
mental, perturbação emocional, deficiência visual ou auditiva ou a privação educacional ou cultural).
Estas duas definições viriam a constituir a base fundamental para as definições atuais de DA das quais
vamos destacar duas pela importância que, hoje em dia, se lhes atribui.
A primeira, e aquela que parece ser a mais aceite internacionalmente, é a que figura na Public Law94-
142, hoje denominada Individuals with Disabilities Education Act (IDEA), que diz o seguinte:
“Dificuldades de aprendizagem específica” significa uma perturbação num ou mais dos processos
psicológicos básicos envolvidos na compreensão ou utilização da linguagem falada ou escrita, que pode
manifestar-se por uma aptidão imperfeita de escutar, pensar, ler, escrever, soletrar, ou fazer cálculos
matemáticos. O termo inclui condições como problemas perceptivos, lesão cerebral, disfunção cerebral mínima,
dislexia e afasia de desenvolvimento. O termo não engloba as crianças que têm problemas de aprendizagem
resultantes principalmente de deficiências visuais, auditivas ou motoras, de deficiência mental, de perturbação
emocional ou de desvantagens ambientais, culturais ou económicas (Federal Register, 1977, p. 65083, citado
por Correia, 1991).
Assim, uma criança pode ser identificada como inapta para a aprendizagem “típica” se:
1. não alcançar resultados proporcionais aos seus níveis de idade e capacidades numa ou mais de sete
áreas específicas quando lhe são proporcionadas experiências de aprendizagem adequadas a esses mesmo
níveis;
2. apresentar uma discrepância significativa entre a sua realização escolar e capacidade intelectual numa
ou mais das seguintes áreas:
a) Expressão oral;
b) Compreensão auditiva;
c) Expressão escrita;
d)Capacidade básica de leitura;
e) Compreensão da leitura;
f) Cálculos matemáticos; e
g) Raciocínio matemático (Federal Register, 1997, p. 65083, citado por Correia, 1991).

Uma segunda definição de DA, elaborada pelo National Joint Committee on Learning
Disabilities(NJCLD), citada por Smith et al. (1997), diz o seguinte:

“Dificuldades de aprendizagem” é um termo genérico que diz


respeito a um grupo heterogéneo de desordens manifestadas por
problemas significativos na aquisição e uso das capacidades de
escuta, fala, leitura, escrita, raciocínio ou matemáticas. Estas
desordens, presumivelmente devidas a uma disfunção do sistema
nervoso central, são intrínsecas ao indivíduo e podem ocorrer
durante toda a sua vida. Problemas nos comportamentos auto-
PROFA. GISELE DE JESUS NUNES SOARES Pá gina 59
Educação especial
reguladores, na percepção social e nas interações sociais podem
coexistir com as DA, mas não constituem por si só uma
dificuldade de aprendizagem. Embora as dificuldades de
aprendizagem possam ocorrer concomitantemente com outras
condições de incapacidade (por exemplo, privação sensorial,
deficiência mental, perturbação emocional grave) ou com
influências extrínsecas (tal como diferenças culturais, ensino
inadequado ou insuficiente), elas não são devidas a tais condições
ou influências (p. 41-42).

Face às definições descritas, e mesmo estando nós a par da falta de uma definição que receba consenso de
grande parte dos profissionais da área, podemos inferir que um aluno não terá dificuldades de aprendizagem
quando os seus problemas de aprendizagem são devidos principalmente a uma privação sensorial, a deficiência
mental, a perturbações emocionais, a fatores ambientais ou a diferenças culturais e que as DA tanto afetam
crianças, como jovens ou adultos.

13.1 O que causa as dificuldades de aprendizagem?


Correia (1991), ao reportar-se às causas das DA no seu livro “Dificuldade de Aprendizagem: Contributos
para a Clarificação e Unificação de Conceitos”, afirma: “Mesmo uma análise menos profunda da literatura sobre
dificuldades de aprendizagem revela uma ampla discordância entre os autores quanto à etiologia do problema”
(p. 57).
Também Fonseca (1999) é da mesma opinião e Hallahan et al. (1999) afirmam, até, que “na maioria dos
casos a causa das dificuldades de aprendizagem na criança permanecem um mistério” (p. 127).
Contudo, e como já o mencionámos anteriormente, a origem das DA encontra-se presumivelmente no
sistema nervoso central do indivíduo, podendo um conjunto diversificado de fatores contribuir para esse facto.
Um primeiro fator a ter em conta será a hereditariedade (fundamento genético) que, como afirma Johnson
(1998), parece ligar a família às DA.
Há um outro conjunto de fatores (pré ou perinatais) que podem vir a causar DA. Entre eles, são de
destacar os excessos de radiação, o uso de álcool e/ou drogas durante a gravidez, as insuficiências placentárias, a
incompatibilidade Rh com a mãe (quando não tratada), o parto prolongado ou difícil, as hemorragias
intracranianas durante o nascimento ou a privação de oxigênio (anoxia).
No que diz respeito a fatores pós-natais que podem causar DA, eles estão geralmente associados a
traumatismos cranianos, a tumores e derrames cerebrais, a má nutrição, a substâncias tóxicas (por exemplo, o
chumbo) e a negligência ou abuso físico.

13.2 Como identificar e avaliar as dificuldades de aprendizagem?


A identificação das DA deve ser feita o mais precocemente possível, contribuindo para este facto uma
observação cuidada dos comportamentos da criança. Assim, os profissionais (especialmente os educadores e
professores) e os pais devem estar atentos a um conjunto de sinais, que a criança exiba, contínua e
frequentemente, uma vez que não existem indicadores isolados para a identificação das DA.
Apresentamos a seguir uma lista de verificação que tem por base a Escala de Comportamento Escolar
(Correia, 1983) e uma lista de verificação do Centro Nacional Americano para as Dificuldades de
Aprendizagem (1997), onde está agrupado um conjunto de sinais que podem ser indicadores de DA.

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Educação especial
Lista de verificação

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Educação especial
Para além desta lista de verificação apresentamos também, no quadro que se segue, quatro listas por nível
escolar (Levine, 1990) contendo um conjunto de primeiros sinais a observar no que diz respeito às DA.

As listas apresentadas anteriormente permitem, desde que bem utilizadas, recolher informação que, junta
com a informação obtida através da observação direta do aluno em termos educacionais (ver Avaliação
Preliminar, Correia, 1997), possibilita a elaboração de uma primeira intervenção educativa com o fim de
minimizar ou até suprimir os seus problemas. Esta intervenção deve basear-se não só na informação recolhida
pelos professores, mas também deve considerar toda a informação adicional que eventualmente possa ser dada
por outros profissionais (professores de educação especial, médicos, psicólogos, terapeutas) ou pais, via
consulta. É, portanto, aconselhável que todo este processo se desenrole em colaboração.
Caso os problemas do aluno subsistam, deve proceder-se a uma avaliação compreensiva (Correia, 1997)
que tenha por base determinar o funcionamento global do aluno com o objetivo de se identificarem áreas fortes
e necessidades, quer na escola, quer em quaisquer outros ambientes em que ele interaja. Esta avaliação, que
deve ser sempre efetuada por uma equipa multidisciplinar, tem ainda por fim verificar se o aluno obedece a um

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Educação especial
conjunto de critérios tidos como base para se tomar uma decisão, ou seja, o aluno só deve ser considerado com
dificuldades de aprendizagem se o seu funcionamento intelectual (inteligência) estiver na média ou acima dela;
se existir uma discrepância significativa entre o seu potencial estimado e a sua realização escolar atual; e se o
seu insucesso escolar for devido a problemas numa ou mais das seguintes áreas: fala, leitura, escrita, matemática
e raciocínio. É de notar, ainda, que problemas de concentração e de atenção, de memória e de ajustamento social
são também comuns nos indivíduos com DA. Ela serve também para se determinar que tipo de serviços
adicionais (serviços de educação especial) serão necessários para maximizar o potencial do aluno.
No que respeita à equipa multidisciplinar, ela deve incluir, para além do professor do aluno e dos pais,
todos os elementos julgados necessários para a satisfação das suas necessidades educativas, tal como, por
exemplo, um professor de educação especial, um psicólogo e/ou um terapeuta da fala.
Só um procedimento deste tipo (quanto mais precocemente efetuado melhor), aliado a uma intervenção
adequada, poderá prevenir ou reduzir o insucesso escolar e social do aluno. Caso contrário, o aluno com DA
experimentará, com certeza, um prolongado insucesso escolar (académico e social) que, como afirmámos
anteriormente, o levará muitas vezes ao abandono escolar, à delinquência e/ou à toxicodependência. Portanto,
quando um aluno não está a progredir de acordo com os objetivos curriculares do ano que frequenta, o professor
não pode “cruzar os braços” ou ficar alheio ao seu problema. E, muito menos, quando o aluno já se afastou
significativamente dos objetivos curriculares propostos. A frustração e as consequências de se viver com DA
incompreendidas por todos aqueles que nos rodeiam podem ser devastadoras. A investigação assim no-lo diz. E
no nosso país, ao andarmos ainda a debater-nos com o conceito, estamos a entregar ao insucesso dezenas de
milhar de crianças com DA.

13.3. Que modalidades de atendimento e que tipo de serviços para o aluno com DA?
Em primeiro lugar, é bom que se saliente que a Lei Fundamental do Estado Português – A Constituição
da República –, a Lei de Bases do Sistema Educativo e o Decreto-Lei n.°319/91, de 23 de Agosto, garantem
uma educação igual e de qualidade para todos os alunos, pretendendo criar uma igualdade de oportunidades que
promova o seu sucesso escolar.
Neste sentido, a lei requer que qualquer aluno possa ter à sua disposição um conjunto de serviços
adequados às suas necessidades, prestados, sempre que possível, na classe regular. Para os alunos com DA, no
que diz respeito a serviços educacionais na classe regular, há que considerar um conjunto de fatores que podem
facilitar a sua aprendizagem, como são, por exemplo, a reestruturação do ambiente educativo; a simplificação
das instruções no que diz respeito às tarefas escolares; o ajustamento dos horários; a alteração de textos e do
trabalho de casa; o uso de tecnologias de informação e comunicação; a alteração das propostas de avaliação,
para citar alguns. Contudo, quando necessário, alguns serviços educacionais poderão ser prestados fora da classe
regular.
No que diz respeito aos serviços adicionais há que poder contar com serviços de psicologia, de terapia da
fala, de terapia ocupacional, clínicos e sociais, consoante as necessidades do aluno. Se estes serviços forem
insuficientes ou inexistentes, o sucesso escolar do aluno com DA será, com certeza, posto em causa.
Numa palavra, para que o aluno com DA receba uma educação apropriada às suas necessidades, para
além da atitude dos profissionais e pais, da adequada formação dos professores e demais agentes educativos, da
importância de se trabalhar em colaboração, há que ter em conta que o conceito de DA não implicita apenas o
reconhecimento do direito que assiste ao aluno de frequentar uma escola regular pois, caso as práticas
educativas se resumam apenas à sua colocação na escola, sem nenhum tipo de serviços auxiliares, tais práticas
resultam falaciosas e irresponsáveis.
O quadro que se segue pretende apresentar um conjunto de conceitos que nos parecem relevantes para o
processo de ensino aprendizagem do aluno com DA. Alguns destes conceitos andam, até, geralmente associados
às DA.
Educação: Processo de aprendizagem e de mudança que se opera no aluno através do ensino e de outras
experiências a que ele é exposto nos vários ambientes onde interage (Correia, 1997).
Inclusão: Inserção do aluno na classe regular onde, sempre que possível, deve receber todos os serviços
educativos adequados, contando-se, para esse fim, com o apoio apropriado (e. g., outros técnicos, pais…) às
suas características e necessidades (Correia, 1997).

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Educação especial
Educação especial: Conjunto de serviços de apoio especializados destinados a responder às necessidades
especiais do aluno com base nas suas características e com o fim de maximizar o seu potencial. Tais serviços
devem efetuar-se, sempre que possível, na classe regular e devem ter por fim a prevenção, redução ou supressão
da problemática do aluno, seja ela do foro mental, físico ou emocional e/ou a modificação dos ambientes de
aprendizagem por forma a que ele possa receber uma educação apropriada às suas capacidades e necessidades
(Correia, 1997).
Educação apropriada: Resposta às necessidades educativas do aluno, proporcionando-lhe experiências
que se construam a partir das suas realizações iniciais, com o fim de maximizar as suas aprendizagens
(académicas e sociais) (Correia, 1999).
Dislexia: Incapacidade severa de leitura (Hallahan, Kauffman e Loyd, 1999); dificuldade no
processamento da linguagem cujo impacto se reflete na leitura, na escrita e na soletração (NCLD, 1997).
Dispraxia (apraxia): Dificuldade na planificação motora, cujo impacto se reflecte na capacidade de um
indivíduo coordenar adequadamente os movimentos corporais (NCLD, 1997).
Disgrafia: Dificuldade na escrita. Os problemas podem estar relacionados com a componente
grafomotora (padrão motor) da escrita (e. g., forma das letras, espaço entre palavras, pressão do traço); com a
soletração; e com a produção de textos escritos (NCLD, 1997).
Discalculia: Dificuldade na realização de cálculos matemáticos (Hallahan, Kauffman e Loyd, 1999).
Discriminação auditiva: Capacidade para perceber as diferenças entre os sons da fala e para sequenciá-
los em palavras escritas; é uma componente essencial no que respeita ao uso correto da linguagem e à
descodificação da leitura. (NCLD, 1997).
Percepção visual: Capacidade para observar pormenores importantes e dar significado ao que é visto; é
uma componente crítica no processo de leitura e escrita (NCLD, 1997).
Desordem por déficit de atenção com/sem hiperatividade: É caracterizada por frequentes estados de
desatenção, de impulsividade e, geralmente, por um excesso de atividade motora (hiperatividade) que podem
interferir com a capacidade do indivíduo para a aprendizagem; pode ocorrer concomitantemente com as DA (as
estimativas de prevalência variam) (NCLD, 1997).

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