1) Os autores descrevem o caso de uma criança de 3 anos que foi encontrada desmaiada e em coma de causa desconhecida.
2) Exames iniciais não revelaram a causa, mas depois foi descoberto que a criança havia ingerido acidentalmente comprimidos de carbamazepina de uma prima epiléptica.
3) Análises mostraram níveis tóxicos de carbamazepina no sangue da criança, confirmando a intoxicação como causa do coma.
Descrição original:
Intoxicação Acidental por Carbamazepina - Relato de um Caso
1) Os autores descrevem o caso de uma criança de 3 anos que foi encontrada desmaiada e em coma de causa desconhecida.
2) Exames iniciais não revelaram a causa, mas depois foi descoberto que a criança havia ingerido acidentalmente comprimidos de carbamazepina de uma prima epiléptica.
3) Análises mostraram níveis tóxicos de carbamazepina no sangue da criança, confirmando a intoxicação como causa do coma.
1) Os autores descrevem o caso de uma criança de 3 anos que foi encontrada desmaiada e em coma de causa desconhecida.
2) Exames iniciais não revelaram a causa, mas depois foi descoberto que a criança havia ingerido acidentalmente comprimidos de carbamazepina de uma prima epiléptica.
3) Análises mostraram níveis tóxicos de carbamazepina no sangue da criança, confirmando a intoxicação como causa do coma.
Intoxicação Acidental por Carbamazepina - Relato de um Caso
Accidental Poisoning to Carbamazepine - Case Report
Iracema C. O. F. Fernandes1; Celso de Moraes Terra1; José Carlos Fernandes1; Fábio Ricardo Picchi Martins1; Albert Bousso2; Bernardo Ejzenberg3; Evandro Roberto Baldacci4; Yassuhiko Okay5.
Divisão de Pediatria do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo
RESUMO: recomendam a investigação sérica da Carbamazepina
Os autores descrevem um caso de coma causado por em crianças com manifestação aguda e grave não es- intoxicação acidental com Carbamazepina. São ana- clarecida do sistema nervoso central. lisadas as várias causas de coma em pediatria e a abor- dagem investigativa e terapêutica adotada. Os autores
Introdução Hipóteses Diagnosticas
1. Coma a esclarecer História Clínica 2. Insuficiência Respiratória Aguda A.S.T., 3 anos e 5 meses, feminina, negra, natural e procedente de São Paulo. Foi trazida ao Serviço de Investigação, Terapêutica e Evolução Pronto-Atendimento do Hospital Universitário da A criança foi imediatamente intubada, ventilada e Universidade de São Paulo com história de ter sido encaminhada à UTI pediátrica. A investigação inicial encontrada desmaiada. A mãe negava febre, vômitos, para esclarecimento etiológico do coma e insuficiência trauma, alterações do comportamento ou outras alte- respiratória decorrente abrangeram: rações prévias ao quadro. Os pais estavam ausentes 1. Avaliação sérica, urinaria e no suco gástrico qua- do domicílio nas últimas 12 horas e negavam qualquer litativa de "screening" para substâncias exógenas com possibilidade de intoxicação exógena. Interrogatório atuação no sistema nervoso central (SNC): álcool etíli- sobre diversos aparelhos e antecedentes: Sem alte- co, barbitúricos, hipnóticos, tranqüilizantes, solventes rações. Antecedentes familiares: pai usuário de cocaí- orgânicos, salicilatos, monóxido de carbono, cianetos, na e "crack". organoclorados e fosforados e anti histamínicos; 2. Liquor; Exame Físico 3. Exames bioquímicos séricos: sódio, potássio, cálcio, Peso: 15 kg. FC = 100 bpm. FR = 12 Ipm. uréia, transaminases, amônia, amilase e glicose; T = 36,4Q C PA = 91 x 49 mmHg. 4. Hemograma completo; Criança comatosa, hipotônica, não reagente à estí- 5. Gasometría arterial; mulos, hidratada, descorada +/4+, respiração irregular, 6. Coagulograma; cianose de extremidades e anictérica. Exame neu- 7. Rx de tórax; rológico: nível de consciência correspondente a 3 na 8. CT de crânio; Escala de Glasgow, pupilas isocóricas com midríase 9. Sorologia para HIV. bilateral, reflexo fotomotor presente mas lentificado. O restante do exame físico estava dentro dos padrões de Concomitantemente, a criança foi submetida aos normalidade para a idade. Fundo de olho: Normal. seguintes procedimentos:
1 - Médico Assistente do Hospital Universitário USP.
2 - Médico Responsável da UTIP Hospital Universitário USP. 3 - Doutor em Pediatria FMUSP. 4 - Livre Docente em Pediatria FMUSP. 5 - Professor Titular de Pediatria FMUSP. 1. Controle dos sinais vitais; exames laboratoriais e a tomografia afastaram estas 2. Sondagem nasogástrica (SNG); hipóteses, enquanto os exames toxicológicos estavam 3. Lavagem gástrica; sendo executados. 4. Utilização de solução de carvão ativado por SNG; Uma das intoxicações aventadas seria por cocaína 5. Infusão de manitol por SNG. e "crack" devido ao uso destas drogas pelo pai. O Os resultados dos exames coletados à internação "crack" é entorpecente, cloridrato de cocaína mistura- foram normais, exceto p^la detecção de substância do a alcalino como bicarbonato de sódio, e tem efeito não identificável no sangué\e urina. semelhante ao da cocaína pura. Os metabólitos da Após 12 horas de internação' os pais foram infor- cocaína podem ser detectados na urina por períodos mados por uma prima e vizinha da paciente, epilépti- de 2 dias até l semana após sua utilização14'17. No pre- ca em uso de carbamazepina (CBZ), do desapareci- sente caso, a cocaína poderia ter sido ingerida aciden- mento de 4 de seus comprimidos de 200 mg. A partir talmente, ou ainda inalada ("crack"). Os relatos de desta informação foi realizada avaliação quantitativa crianças intoxicadas descrevem a ocorrência de do nível sérico de carbamazepina que resultou em tremores, convulsões, coma, hipereflexia, hipertonía, 38,5 mcg/ml (nível tóxico maior que 10 mcg/ml). alteração do comportamento, taquicardia, sialorréia, A criança evoluiu em estado de coma profundo hipertensão e vômitos2'3'4'57'8'14. Porém, a droga e seus nas primeiras 24 horas de internação com melhora metabólitos não foram identificados no screening to- gradativa do nível de consciência e extubação 36 xicológico, afastando este diagnóstico. horas pós a admissão, sem intercorrências. Após 70 Os exames toxicológicos realizados abrangeram horas da hospitalização, estava lúcida e sem alterações substâncias com atuação no SNC4'6. A multiplicidade de neurológicas, Glasgow 14. Alta no quarto dia pós agentes implica em avaliação dirigida; no caso para admissão. drogas que ocasionam alteração do nível de consciên- cia. Foi constatado metabólito não identificável a nível sanguíneo e urinario. Isto é justificável pela transfor- Discussão mação parcial da substância envolvida na intoxicação. A complementação diagnostica foi realizada com a O coma é uma emergência pediátrica caracterizada dosagem quantitativa, sérica, de CBZ (método por pela depressão intensa do nível de consciência, de ensaio imunoenzimático)4'6. Para isto, a informação da fácil reconhecimento, porém de diagnóstico diferen- família foi crítica. cial difícil10. Sob aspecto causai pode ser dividido em O reconhecimento de intoxicações exógenas é difí- dois grandes grupos: patologias do SNC, principal- cil em pediatria pela freqüente inespecificidade do mente infecciosas (meningites, encefalites, abcessos) e quadro clínico, aliado à ocultação e/ou desconheci- metabólicas, entre as quais encontramos as intoxi- mento do acidente causai4'16'17. Em 1986, um levan- cações exógenas10. Os comas metabólicos são prepon- tamento realizado por hospitais contratados da derantes em pediatria. Sua freqüência é 15 vezes Previdência Social mostrou que, para cada 1.000 inter- maior do que aqueles causados por doenças primárias nações, 6,2 eram por intoxicações e estas foram do SNC. Através da história clínica e do exame físico responsáveis por 3% dos óbitos17. detalhado, podemos esclarecer a etiologia de parcela Nos Estados Unidos morrem aproximadamente 100 significativa dos casos4'10'16. crianças menores que 5 anos anualmente, devido às A abordagem desta emergência envolve: intoxicações. Isto, mesmo com as campanhas preven- 1. Suporte ventilatório; tivas de acidentes em pediatria. Em geral nestes 2. Estabilização circulatória e metabólica; pacientes a intoxicação é acidental em 90% das vezes, 3. Reconhecimento causai; sendo que os casos restantes ocorrem em maiores de 4. Terapêutica específica. 5 anos e a utilização é intencional. No caso em foco, a hipótese diagnostica de into- Atualmente, a CBZ é medicamento freqüentemente xicação exógena foi considerada, visto que a criança utilizado em adultos e crianças com convulsões e dis- não apresentava antecedentes patológicos e foi encon- túrbios de conduta. É um derivado carbamílico dos trada em coma. Outras possíveis etiologías nesta cir- compostos imidobenzílicos, com fórmula estrutural cunstância são trauma crânio encefálico, distúrbios semelhante aos antidepressivos tricíclicos17'18. O nível metabólicos, hemorragia e infecção do SNC10'16. Os sérico de CBZ até 10 mcg/ml ou 42 nmol/1, é consi- derado seguro (nível terapêutico de 5 a 10 mcg/ml), dimentos foram desnecessários no caso em foco, pela sendo que valores acima de 10 mcg/ml são potencial- evolução favorável. mente tóxicos. Na intoxicação aguda, alterações neu- Em conclusão, os autores descrevem um caso de rológicas e cardiocirculatórias guardam proporção coma a esclarecer que teve sua resolução diagnostica com o nível sérico da droga18. Quadros graves ocorrem feita através de dados da anamnese e exame clínico, quando grande quantidade do produto alcança a cor- associados à investigação toxicológica sistemática. rente sanguínea. A absorção intestinal da carba- Recomendam os autores a inclusão da pesquisa do mazepina varia individualmente6'17. As manifestações nível sérico da carbamazepina nos pacientes com neurológicas observadas são: movimentos coreifor- manifestações clínicas agudas e graves do SNC não mes, nistagmo, ataxia, distonia, mioclonias e, ocasion- elucidadas. Depreende-se que também é recomendá- almente, alucinações e convulsões. Pode ocorrer alter- vel o controle do nível sérico da droga em crianças ação do nível de consciência com soñolencia nos que utilizam o produto, visto que o nível terapêutico casos leves e coma com insuficiência respiratória, nos e tóxico são próximos. casos mais graves17'18. A ação cardiotóxica da droga pode causar hipotensão por depressão miocárdica, ar- ritmias e bloqueio cardíaco (prolongamento do inter- Summary valo PR, bradicardia, alargamento do complexo QRS e Accidental Poisoning to Carbamazepine intervalo QT). A ação cardíaca não foi observada no presente caso. The authors describe a case of accidental poi- Spiller H.A. et ai15 (1990) estudaram pacientes into- soning causing acute toxic reation to carba- xicados por CBZ e observaram que, para níveis séri- mazepine. Clinical and pharmacological obser- cos entre 10 e 19,9 mcg/ml, 4% dos pacientes estavam vations were done. The evaluation of the em coma, 4% apresentaram convulsões e 4% necessi- comatose child should include foccus on carba- taram de ventilação mecânica. Quando os níveis séri- mazepine overdose. cos situavam-se entre 20 e 29,9 mcg/ml, 27% evoluíam com coma, 21% com convulsões e 12% necessitavam ventilação mecânica. Níveis séricos entre 40 e 59,9 Referências Bibliográficas mcg/ml originaram 100% de coma, 33% de crises con- vulsivas, 100% de ventilação mecânica e 33% taquicar- 1. ARAÚJO, K.C.; KATAYAMA, D.; PILEGGI, F.L. dia sinusal. Weawer D.F. et ai19 (1988) estudaram into- Coma. In: Schvartsman, S. coord. Pronto xicações por CBZ e notaram que níveis séricos da Socorro em Pediatria. São Paulo, Sarvier, p. droga entre 11 e 15 mcg/ml estavam correlacionadas à 174-182, 1989. agitação e ataxia; níveis de 15 a 25 mcg/ml com aluci- 2. BATEMAM, D.A.; HEAGARTY, M.C. Passive free- nações e movimentos coreiformes, e aqueles supe- base cocaine ("crack") inhalation by infants and riores a 25 mcg/ml, a coma e convulsões13. Os efeitos toddlers. Am. J. Dis. Child., 143: 25-27, 1989. deletéricos observados podem ser atribuídos adi- 3. BATLLE, M.A.; WILCOX, W.D. Pulmonary edema in cionalmente aos metabólitos da CBZ, particularmente an infant following passive inhalation of free- o 10-11 epóxido, que tem eliminação lenta. Devido à base ("crack") cocaine. Clin. Pediatr., 32(2): proximidade dos níveis terapêuticos e tóxicos, a into- 105-106, 1993. xicação por CBZ pode ocorrer com a utilização clíni- 4. BERKANTS, I.D.; BONNER JR, W.; ROGERS, M.C. ca da droga em quantidade inadequada ou, como no Poisoning and the critically ill child. In: presente caso, com a ingestão acidental. ROGERS, M.C., coord. Textbook of pediatric O tratamento da intoxicação por CBZ não é especí- intensive care. 2 ed., vol. 2, p. 1290-1354, 1994. fico; envolve suporte cardio-respiratório. A lavagem 5. CREGLER, L.L.; MARK, H. Medical complications of gástrica e o emprego de carvão ativado são realizados cocaine abuse. N. Engl. J. Med., 315(23): 1495- para impedir a continuidade da absorção gastrointesti- 1500, 1986. nal do fármaco. A indução de diurese forçada, diálise 6. HEPLER, B.; SUTHEIMER, C; SUNSHINE, I. Papel peritoneal e hemodiálise são ineficazes. Pode ser ten- do laboratorio de toxicologia nas ingestões sus- tada a hemoperfusão com carvão ativado e plasmafe- peitas. Pediatr. Clin. North. Am., 33(2): 259-275, rese nos casos com má evolução clínica. Estes proce- 1986. 7. JEKEL, J.F.; PODLEWSKI, H.; PATTERSON, S.D.; 15. SPILLER, H.A.; KRENZELOK, E.P.; COOKSON, E. ALLEN, D.F.; CLARKE, N.; CARTWRIGHT, P. Carbamazepine overdoses: a prospective study Epidemic free-base cocaine abuse. Lancet, 5: of serum levels and toxicity. Clin. Toxico!., 28: 459-462, 1986. 445-458, 1990. 8. KHARASCH, S.; VINCI, R.; REECE, R. Esophagitis, 16. TAIT, V.F.; DEAN, J.M.; HAWLEY, D.F. Evaluation of epiglottitis and cocaine alkaloid ("crack"). the comatose child. In: ROGERS, M.C., coord. "Accidental" poisoning or child abuse?. Textbook of pediatric intensive care. 2 ed., vol. Pediatrics, 86(1): 117-119, 1990. 1, p. 733-750, 1994. 9. PERRONE, J.M.; HOFFMAN, R.; GOLDFRANK, L.R. 17. TARR, J.E.; MACKLIN, M. Cocaína. Pediatr. Clin. Concepts and controversies in toxicology. North Am., 2: 341-353, 1987. Emerg. Med. Clin. North Am., 12(2): 285-300, 18. TIBBALLS, J. Acute toxic reaction to carba- 1994. mazepine: clinical effects and serum concentra- 10. SCHVARTSMAN, C. Intoxicações agudas. In: tions. J. Pediatr., 121(2): 295-299, 1992. SCHVARTSMAN, S., Pronto Socorro em 19- WEAVER, D.F.; CAMFIELD, P.; FRASER, A. Massive Pediatria. São Paulo, Sarvier, p. 89-95, 1989. carbamazepine overdose: clinical and pharma- 11. SCHVARTSMAN, S. Intoxicações agudas. 4 ed. São cological observations in five episodes. Paulo, Sarvier, cap. 12, p. 41-70: Conduta nas Neurology, 38: 755-759, 1988. intoxicações agudas, 1991. 12. SCHVARTSMAN, S. Intoxicações agudas. 4 ed. São Paulo, Sarvier, cap. 17, p. 94-102: Recebido para publicação: 15/02/95 Anticonvulsionantes, 1991. Aceito para publicação: 28/02/95 13. SCHVARTSMAN, S. Intoxicações agudas. 4 ed. São Paulo, Sarvier, cap. 24, p. 122-123: Endereço para Correspondência Descongestionantes nasais e sistêmicos, 1991. Dra. Iracema C.O.F. Fernandes 14. SCHVARTSMAN, S. Intoxicações agudas. 4 ed. São Divisão de Pediatria do Hospital Universitário da USP Paulo, Sarvier, cap. 26, p. 126-127: Opióides, Av. Prof. Lineu Prestes, 2565 - Cidade Universitária 1991. CEP 01508-900 - São Paulo - SP
Mercúrio, Arsênio e Colimetria Como Indicadores Biológicos, Na Avaliação Da Qualidade Do Pescado Artesanal Do Lago Guaíba Porto Alegre, Estado Do Rio Grande Do Sul