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DISCURSOS BRASILEIROS
a
l. SÉRIE
SELEÇÃO PELO
Proj. Carlos Aurélio Mota de Souza
DE
1
LIVRARIA E EDITORA L O G O S LTDA.
In 15 de Novembro, 137 — 8.° andar — Tel.: 35-6080
SÃO PAULO
Í N D I C E
Manfredo Leite
O Destino e o Ideal • 21
Elogio F ú n e b r e 34
Xilo Peçanha
Discurso ^
Discurso ^5
Ramiz Galvão
A
Discurso
Octávio Mangabeira
Discurso HO
Epitácio Pessoa
1 L c y
Discurso
Discurso H4
Discurso H6
Alfredo Pujol
Discurso 1^0
Aloysio de Castro
Saudação 1 ^
Discurso
/âwio Quadros
Alocução à Bandeira 140
Alcântara Machado
U m H o m e m de O u t r o r a 142
Discurso 146
Brasílio Machado
Onze de Agosto 151
C e n t e n á r i o de C a m õ e s 15^
Carlos C o m e s 162
Campos Sales
Falecimento do M a r e c h a l D e o d o r o 163
Coelho Netto
Discurso 168
Rui Barbosa
Visita à T e r i a N a t a l 177
Sílvio Romero
Discurso 196
Biografias 202
CONSELHOS ÚTEIS AO LEITOR
POR
P a r a a m á x i m a simplificação, e p a r a a l c a n ç a r o m e l h o r proveito,
por p a r t e d o leitor, do e x a m e q u e i r á fazer dos discursos que ora
a p r e s e n t a m o s nesta o b r a , que foram t ã o inteligentemente escolhidos
pelo prof. Carlos A u r é l i o M o t a de Souza, v a m o s estabelecer algumas
análises e conselhos ao estudioso, c e r t a m e n t e benéficos para a tarefa
que empreende.
A CONSTRUÇÃO DO DISCURSO
de m e r a a g r e g a ç ã o , e m q u e as p a r t e s diversas c o n s t i t u e m certo a m o n -
t o a d o de proposições, como verificamos e m a l g u n s discursos m a l orga-
nizados, nos q u a i s as frases sucedem-se u m a s às o u t r a s , g u i a d a s mais
pelas associações d o espírito, ao sabor das características individuais
do o r a d o r , e q u e e s t r u t u r a m u m a t o t a l i d a d e sem m a i o r harmonia.
H á a i n d a a u n i d a d e q u e s u r g e da d i s t r i b u i ç ã o h a r m ô n i c a das p a r t e s
q u e f o r m a m , afinal, u m todo h o m o g ê n e o ; em s u m a , u m a nova forma.
Somos de o p i n i ã o q u e a p r i m e i r a p r o v i d ê n c i a q u e deve a t i n g i r u m
estudioso de o r a t ó r i a é a c o n s t r u ç ã o h a r m ô n i c a do discurso.
DA UNIDADE DO DISCURSO
O EXÓRDIO
O e x ó r d i o é o n o m e q u e se d á à a b e r t u r a do d i s c u r s o . É a parte
q u e coloca o o r a d o r imediatamente em contacto com o auditório.
12 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
As p r i m e i r a s p a l a v r a s p r o v o c a m n a t u r a l m e n t e u m a certa a t e n ç ã o .
H á u m a expectativa geral. E devem elas versar, n a t u r a l m e n t e , sobre
o tema fundamental d o discurso, m a s t r a t a n d o - o , de início, estetica-
mente, com a m á x i m a beleza, e m p r e g a n d o - s e frases bem construídas
e q u e p r o v o q u e m a g r a d a b i l i d a d e p o r p a r t e d o a u d i t ó r i o e, s o b r e t u d o ,
a sua p r o n t a s i m p a t i a e a d e s ã o . Observem-se os e x ó r d i o s dos diversos
discursos. Todos eles obedecem a essa r e g r a m á x i m a , p o r q u e só ex-
cepcionalmente p o d e o o r a d o r p r o v o c a r u m a repulsa do a u d i t ó r i o ou
desafiá-lo. Essa regra é: provocar a atenção, a concordância do
a u d i t ó r i o e a s i m p a t i a , u s a n d o frases d e g r a n d e beleza estética, q u e
sejam a s u m a do t e m a do discurso, m a s expostas n a q u e l e sentido ge-
nérico, capazes d e p r o v o c a r a p l e n a adesão.
Exemplifiquemos:
O CORPO DO DISCURSO
PERORAÇÃO
P o i s é esta a g r a n d e r e g r a d a p e r o r a ç ã o . A q u i , reúnem-se as m a i s
belas frases, as m a i s a f e t i v a m e n t e c o n s t r u í d a s , aquelas q u e m e l h o r to-
cam ao coração. Depois de havermos sensibilizado pela beleza no
exórdio, de termos convencido r a c i o n a l m e n t e n o c o r p o do discurso,
p e r s u a d i m o s , afinal, t o c a n d o n a afetividade, n a p e r o r a ç ã o . É aqui que
o tom de voz m u d a . Se n o e x ó r d i o é êle u m t a n t o solene e g r a v e ;
se n o c o r p o do discurso é claro, e n é r g i c o e concludente, m a s n o r m a l ,
n a p e r o r a ç ã o , é êle s e n t i m e n t a l , afetivo, v i n d o d o peito, cheio de u m a
g r a v i d a d e h a r m ô n i c a , a d m i t i n d o certos melismos n a voz, q u e devem
ser c u i d a d o s a m e n t e controlados, c e r t a s m o d u l a ç õ e s , q u e serão propor-
c i o n a d a s a o t e m a e aos r e c u r s o s t r i b u n í c i o s d o o r a d o r .
A UNIDADE CONQUISTADA
DO APRIMORAMENTO DO DISCURSO
E n t r e t a n t o , v a m o s c o m p e n d i a r , neste p e q u e n o t r a b a l h o , a l g u m a s d a s
r e g r a s p r i n c i p a i s , cuja o b e d i ê n c i a só t r a r á benefícios.
O e x ó r d i o , p o r ser a p a r t e q u e coloca d e i m e d i a t o o o r a d o r c o m
o a u d i t ó r i o , deve ser c o n s t r u í d o com frases l a p i d a r e s . N o s exercícios
sintéticos, expostos e m nossos livros, m o s t r a m o s q u a l o exercício q u e
se i m p õ e p a r a a l c a n ç a r a c o n s t r u ç ã o bela d e tais frases.
Observe-se esta a b e r t u r a d e M o n t e A l v e r n e :
" J á n ã o é d a d o i g n o r a r a causa deste í m p e t o q u e a r r e m e s s o u atra-
vés de m i l azares esses h o m e n s , escolhidos p a r a m u d a r a face d a t e r r a " .
O u esta d e R a m i z G a l v ã o :
" H á h o m e n s q u e possuem a l m a b a s t a n t e a p e n a s p a r a i m p e d i r q u e
se lhes a p o d r e ç a o c o r p o " (O. W. Holmes).
O exercício de c o n s t r u ç ã o de frases l a p i d a r e s é de u m a i m p o r t â n -
cia fundamental para o orador. E obtém-se b o m êxito, s e g u i n d o as
r e g r a s q u e t a n t a s vezes temos p r e c o n i z a d o .
DISCURSOS BRASILEIROS 17
E x e m p l i f i q u e m o s com esta f r a s e :
E x e m p l o s de frases balanceadas:
A c o n s e l h a m o s q u e p r a t i q u e falando, e p r o c u r a n d o b a l a n c e a r du-
r a n t e o processo d a c o n s t r u ç ã o d a frase falada, p a r a p r e d i s p o r o o u v i d o
DISCURSOS BRASILEIROS 19
a c o o p e r a r n a s u a f o r m a ç ã o e, s o b r e t u d o , p a r a a d q u i r i r a espontanei-
dade. Se p r i m e i r a m e n t e p e n s a r , e m e n t a l m e n t e construí-la, p a r a depois
pronunciá-la, a conquista desse d o m í n i o será m a i s lenta. É preciso
praticar imediatamente, embora haja tropeços no início. Terminar-
-se-á, afinal, p o r conseguir a p a l a v r a bela, a frase b e m h a r m ô n i c a e a
expressão adequada.
E m o r a t ó r i a , deve-se c o m e ç a r pelo p r i n c í p i o , c o m o e m t u d o . É
inútil q u e r e r p u l a r os d e g r a u s , p o r q u e os d e g r a u s a c a b a m p o r v i n g a r -
-se, propiciando-nos grandes quedas. É conveniente começar pelos
exercícios q u e em " C u r s o de O r a t ó r i a e R e t ó r i c a " aconselhamos com
o uso d o v o c a b u l á r i o , n a p a r t e final. Deve-se construir, de início, frases
simples, guiando-se pelas p a l a v r a s q u e estão ali i n s e r t a s e, depois, com-
plexioná-las, à p r o p o r ç ã o q u e o d o m í n i o seja o b t i d o .
OS GESTOS
A VOZ
Senhores:
A q u e l a s solenidades, e m q u e as m u l t i d õ e s se p r e m i a m , tomadas
de alegria, aqueles esplendores e aqueles espetáculos simbolizavam p a r a
eles u m n o i v a d o — o n o i v a d o d a s e s p e r a n ç a s ; s i m b o l i z a v a m também
u m a i n i c i a ç ã o — a g r a n d e i n i c i a ç ã o d a existência, b a t i d a pelas aspe-
rezas do t r a b a l h o , pelos sofrimentos d a s lutas, d o m a d a pelos reveses ou
c o r o a d a pelas v i t ó r i a s .
* * #
N ã o m a l s i n e m o s o século em q u e à P r o v i d ê n c i a a p r o u v e r corres-
sem os nossos dias, e se realizassem os nossos destinos. É u m século,
p o r é m , fecundo e m t r a b a l h o s , e m lutas, e m pesquisas, e m resultados
admiráveis. 0 h o m e m sente-se t o m a d o d e v e r t i g e m , depois d e m u i t o
s o n h a r e depois d e m u i t o sofrer. Êle q u e r r a s g a r os véus d e todos os
mistérios a se e s c o n d e r e m n a s p r o f u n d e z a s d o espaço, n a e s c u r i d ã o d a
t e r r a , e a i n d a m a i s n o s s a g r a d o s recessos d a consciência. A esfinge
a n t i g a postava-se n o ádito d o s a n t u á r i o , g u a r d a n d o o terrível enigma
d a v i d a ou d a m o r t e . A esfinge m o d e r n a posta-se, todos os dias, t a m -
b é m frente d a civilização, d e s a f i a n d o o homem, cansado de ilusões,
cheio d e sobressaltos e c a r r e g a d o d e c i ê n c i a .
(1) Eymieu.
DISCURSOS BRASILEIROS 25
Bela i r o n i a , n ã o h á d ú v i d a ! A p r o x i m a - s e a h u m a n i d a d e do a n o
dois mil, e p a r a êle c a m i n h a a c e l e r a d a m e n t e . E a química espiritual
n ã o se descobre p a r a m a t a r a tristeza do c o r a ç ã o , a sede d o espírito,
a fome de justiça, o a r d e n t e desejo d a felicidade. Pelo contrário, mais
esquisita se h á t o r n a d o a sensibilidade h u m a n a aos toques d a s a n g ú s -
tias, e m a i s d e l i c a d a às a g o n i a s , sendo m e n o s sensível à s alegrias, e
m a i s indeferente a o p r a z e r .
O h o m e m , s e g u n d o a s u a a f i r m a ç ã o , " a i n d a se n ã o despojou d a
a n i m a l i d a d e e m q u e teve a s u a o r i g e m ; a evolução a i n d a está inconw
pleta. D a í os conflitos e n t r e seus diversos i n s t i n t o s ; d a í o sofrimento
e a imoralidade. C a b e à ciência m é d i c a c o m b a t e r o m a l e m sua r a i z .
Ela h á d e s a l v a g u a r d a r os corpos c o n t r a a s e n f e r m i d a d e s , cujas c a u s a s
não m a i s serão m i s t e r i o s a s ; ela os h á de g a r a n t i r c o n t r a a decrepi-
t u d e q u e t o r n a odiosa a velhice. Ela h á de m o d e r a r as nossas p a i x õ e s ,
c o r r i g i n d o as faltas d o o r g a n i s m o " . Medicamentos, portanto, e higie-
ne! Sim. O h o m e m v a i a v a n ç a n d o , e as e n f e r m i d a d e s e os m a l e s
de toda espécie a m e a ç a m - l h e a v i d a e m todas as suas fases. A ve-
lhice ( 1 ) patológica, a velhice dolorosa n ã o t a r d a , e até hoje a p r ó p r i a
ciência m é d i c a n ã o l h e assinalou a s u a característica. Ela n ã o s a b e
se é u m a a l t e r a ç ã o dos tecidos, u m a d e s t r u i ç ã o de células n o b r e s p o r
elementos m a i s simples. E l a i g n o r a se é a esclerose ou o e n t o r p e c i -
mento d a s a r t é r i a s , d o figado ou dos r i n s . Tudo uma quimera! E
q u a n d o m e s m o se inventasse u m serum eficaz p a r a a p r o l o n g a ç ã o d a
vida, e u m reativo t ã o poderoso q u e neutralizasse os estragos micro-
(1) Eymieu.
26 ANTOLOGIA D E FAMOSOS
É v e r d a d e q u e p o r sobre o a b i s m o e m q u e t u d o vai i m e r g i r há
reflexos de sol, t i n t a s d e e s m e r a l d a e cintilações de o u r o . Mas tudo
isso é ilusório. É m i s t e r resignar-se o h o m e m ao i n e v i t á v e l " ( 1 ) . E
sem Deus, sem r e s i g n a ç ã o , sem o u t r a v i d a , o m u n d o e a sociedade
devem a c a b a r n a e p i d e m i a d o suicídio anestésico, de q u e fala Le D a n -
tec, o terrível p r e g o e i r o do ateísmo, o i m p e t u o s o corifeu do natura-
lismo c o n t e m p o r â n e o . — V e d e b e m a q u e e x t r e m o s d ã o essas teorias
imorais, anti-sociais e niilistas. Delas ressalta u m corolário: o de-
sespero n a vida, o desespero n a m o r t e ; a ferocidade no h o m e m , o
egoísmo n a s o c i e d a d e ; a d e s o r d e m em t u d o , o extinguir-se d a h u m a -
nidade!
(1) Eymieu.
DISCURSOS BRASILEIROS 27
A s pelejas feridas n o c a m p o r a s o da v i d a n ã o t ê m e s m a g a m e n t o s .
\ encedores e v e n c i d o s p o d e m a b r a ç a r - s e nos cimos i l u m i n a d o s da mi-
s e r i c ó r d i a infinita, e encontrar-se no seio dessa e t e r n a b o n d a d e , dessa
justiça sem filhos, q u e as nossas constantes aspirações r e c l a m a m e bus-
cam, n a sofreguidão de t o d a s as potências d o nosso ser. N ã o são en-
g a n a d o r a s as suas p r o m e s s a s , n e m o b s c u r a s as s e n d a s p o r êle t r a ç a d a s .
Mostra, n ã o h á d ú v i d a , a i m e n s i d a d e p e r t o ou distante n u m marulhar
doce ou e n c r e s p a d o de s u a s v a g a s .
Felizes os q u e s a b e m c r e r n a s d o u t r i n a s do Cristo e e s p e r a r n a s
suas promessas! Frederico Masson, r e s p o n d e n d o a o discurso d e re-
c e p ç ã o de P o i n c a r é n a A c a d e m i a F r a n c e s a , a 2 8 de j a n e i r o d e 1 9 0 9 ,
em t r a ç o s m u i t o r á p i d o s mostra-nos o sofrimento de um homem que
desejava sorrir m a s soluçava, e o júbilo de outro h o m e m que chegara
à placidez d a fé.
O p o b r e S u l l y - P r u d h o m m e , o g r a n d e p o e t a do Bonheur, gemia no
seu leito d e dores, q u a s e a b a n d o n a d o e esquecido pelos a m i g o s .
U m a t a r d e , F r a n ç o i s Coppée, o m a r a v i l h o s o c a n t o r dos p e q u e n i -
nos, apresentou-se-lhe à cabeceira, talvez e m visita d e d e s p e d i d a .
(1) Challemel-Lacour.
DISCURSOS BRASILEIROS 29
L e m b r a i - v o s t a m b é m q u e os c r i a d o r e s da ciência m o d e r n a , desde
P r i e s t l e y e Lavoisier até A m p è r e , F a r a d a y e P a s t e u r f o r a m profunda-
30 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
R e s p o n d e r e i s e n t ã o q u e , ou o Cristo d o m i n a o m u n d o , ou o m u n d o
se p r e c i p i t a p a r a a decadência.
R e b a t e i , m e u s a m i g o s , esse e r r o , r e c l a m a n d o p a r a a vossa c r e n ç a
e p a r a os seus m i n i s t r o s essa l i b e r d a d e q u e os g o v e r n o s fracos e pusi-
lânimes concedem a t é aos b a n d i d o s e aos p r o x e n e t a s . Afrontai essa
tendência dos governos escravizados p o r interesses subalternos, e ata-
cados p e l a m i o p i a d e u m a política m e s q u i n h a e estéril, essa t e n d ê n c i a
q u e p r o c l a m a a l i b e r d a d e p a r a todos e p a r a t u d o , e q u e , l u d i b r i a n d o
a m e s m a l i b e r d a d e , p õ e o clero fora d a lei, d a j u s t i ç a e d a i g u a l d a d e .
Aí t e n d e s u m fato q u e a h i s t ó r i a r e g i s t r a e m t o d a s a s épocas.
A c i m a d e todas as d e l i n q ü ê n c i a s , q u e u m p a g a n i s m o m o d e r n o nos
oferece, levantai, senhores, u m ideal q u e seja o programa de vossa
v i d a p r i v a d a , social, religiosa e política. O ideal é u m a v e r d a d e •—
limite p a r a a q u a l p r o p e n d e o ser q u e se desenvolve harmônicamente.
Êle é a idéia substituída e a idéia cristalizadora.
Sim! O Cristo n ã o é u m m e t e o r o h i e r á t i c o .
Se h á g r a n d e z a s n o t e m p o em q u e l a b u t a m o s , h á t a m b é m fraque-
zas e covardias, d e g r a d a ç õ e s e aviltamentos. T e n h o m e d o dos covar-
des. N ã o t e n h o m e d o dos fortes, dos violentos e dos h e r ó i s . É uma
i d o l a t r i a essa exclusiva p r e o c u p a ç ã o pelo d i n h e i r o .
(1) S. Verret.
(2) A expressão não é minha: é de Barbosa Lima.
DISCURSOS BRASILEIROS 33
q u e u m a i m p r e n s a m e r c e n á r i a lisongeia e a í a g a , e q u e os interesses
a r v o r a m e m á r b i t r o s d a s r i q u e z a s e d a salvação dos países.
Excelentíssimos S e n h o r e s .
Q u a n d o , h á p r e c i s a m e n t e onze anos e q u i n z e d i a s , p o r e n t r e os
círios a r d e n t e s da I g r e j a de S. P e d r o , e n r e g e l a d o e h i r t o se estendia
no ataúde o cadáver do grande Leão X I I I , u m a estranha e profunda
comoção a b a l a v a o m u n d o inteiro.
À b e i r a d a q u e l e a t a ú d e escrevia a h i s t ó r i a u m a d a s m a i s r u t i l a n -
tes p á g i n a s dos seus fastos, e a d m i r a v a - s e de v e r r e d u z i d o a t ã o m i -
núsculas p r o p o r ç õ e s a q u e l e q u e f o r a u m g i g a n t e , e q u e e n c h e r a a t e r r a
com os raios d a s u a glória, a g r a n d e z a do seu n o m e , e a beleza do
seu p o d e r . À b e i r a d a q u e l e a t a ú d e , f o r m u l a v a planos e cálculos a sa-
bedoria humana. Conjecturava a política. Suspeitava a diplomacia.
E dos q u a t r o ângulos do universo, r e v o a v a m p e n s a m e n t o s , volviam a s -
pirações, e despontavam anseios.
DISCURSOS BRASILEIROS 35
N a f ú n e b r e solenidade d a q u e l a h o r a , t u d o e r a incerteza, t u d o e r a
mistério.
Só n ã o existia incerteza e n e m h a v i a m i s t é r i o p a r a a P r o v i d ê n c i a
D i v i n a , q u e velava t a m b é m esses despojos e p r e p a r a v a os c a m i n h o s à s
rutilações de u m o u t r o sol, q u e se ia l e v a n t a r n o h o r i z o n t e p a r a a s
g r a n d e s projeções d e luz, p a r a o dissipar d a s trevas, e p a r a o calor
das almas. S u r p r e e n d e n d o e c o n t r a r i a n d o todas a s conjecturas, desi-
l u d i n d o todos os cálculos, a I g r e j a p r o n u n c i o u u m n o m e q u e d e v i a s e r
o sucessor d e Leão X I I I . Esse n o m e atravessou o espaço, voou d e boca
e m boca, e constituiu u m e n i g m a . Tão humilde era êle! E tão pe-
q u e n o se a f i g u r a v a p a r a a s i n v e s t i d u r a s d o m a i s alto p o d e r , e a m a i s
elevada d a s s o b e r a n i a s , a s o b e r a n i a d a s consciências. Pouco depois,
esse n o m e crescia, e c r e s c e n d o a r r a s t a v a s i m p a t i a s , e a r r a s t a n d o sim-
patias despertava veneração. E a v e n e r a ç ã o fazia-se a u r é o l a a circun-
d a r a fronte a u g u s t a d e P i o X , cujo d e s a p a r e c i m e n t o d e n t r e os vivos
l a m e n t a a c r i s t a n d a d e nesta h o r a , c h o r a o m u n d o , d e p l o r a a Igreja,
e c o m e m o r a S ã o P a u l o n a s p o m p a s d e luto e d o r destas h o m e n a g e n s ,
q u e a q u i vimos t r i b u t a r à s u a doce m e m ó r i a , e à s u a a l m a d e eleito.
* * *
U m a simples l á p i d e c o m e m o r a t i v a sobre o frontispício de u m a
casa m o d e s t a , n a a l d e i a d e Riese, p r o v í n c i a d e T r e v i s o , assinala q u e
ali, a 2 d e j u n h o d e 1 8 3 5 n a s c e u José S a r t o . D e s d e os p r i m ó r d i o s d a
s u a infância, b a f e j a d a pelo fervor religioso d e seus p a i s , c o n h e c e u êle
as privações e a s asperezas da pobreza, q u e o deveria acompanhar e m
todas a s fases d a s u a v i d a .
Depois d e f r e q ü e n t a r c o m a s s i d u i d a d e o g i n á s i o d e Castelfranco,
e n t r o u n o s s e m i n á r i o s d e T r e v i s o e P á d u a , i m p u l s i o n a d o pela vocação
a o sacerdócio.
Difícil e p e r t u r b a d o e r a o m o m e n t o histórico q u a n d o a s s u m i u a
d i r e ç ã o d a I g r e j a Católica. A s atenções e a s solicitudes d o P a s t o r con-
c e n t r a r a m - s e t o d a s n a s p r e m e n t e s e a n g u s t i o s a s necessidades q u e esta-
v a m c a u s a n d o aflições às consciências, perturbações a o s espíritos e
mágoas à Igreja de Deus. U m a voz, r e p a s s a d a d e a u t o r i d a d e , e feita
de i n q u e b r a n t á v e l e n e r g i a , p r e c i s a v a d i r i m i r certas questões e contro-
vérsias, a g i t a d a s d u r a n t e longos anos. U m b r a d o , cheio d e firmeza,
de constância e i n t r a n s i g ê n c i a , e r a necessário se fizesse o u v i r a o m u n d o
p a r a nele a p a r e c e r e m t o d a a s u a p u r e z a a i n t e g r i d a d e d a fé, a dou-
t r i n a d o Cristo e a s o b e r a n i a d a I g r e j a .
D u r a n t e l a r g o t e m p o , i d é i a s e r r ô n e a s e p r i n c í p i o s falsos, vindos
a t r a v é s d a s d o u t r i n a s de Y a n t e de S c h l e i e r m a c h e r , iam avassalando
a s inteligências, d e t e r m i n a n d o u m f e r m e n t o d e p e r t u r b a ç ã o e a n a r q u i a .
0 livro d e H a r n a c h , i n t i t u l a d o a Essência do Cristianismo, e o livro
d e A u g u s t o S a b a t i e r , i n t i t u l a d o Esboço de uma filosofia da Religião,
d i v u l g a r a m t e o r i a s q u e v u l n e r a v a m os s u p r e m o s ensinamentos d a fé,
a t e n t a v a m c o n t r a a i m u t a b i l i d a d e d o d o g m a , f o r m u l a v a m u m misto d e
sistemas, e criavam uma heresia, profundamente perturbadora. 0
DISCURSOS BRASILEIROS 37
A F r a n ç a , a n a ç ã o cavalheiresca, e cujas o r i g e n s m e r g u l h a m no
b a t i s t é r i o de R e i m s , e cuja g l ó r i a v a i c u l m i n a r n o h e r o í s m o de J o a n a
d ' A r c , a F r a n ç a v e m assistindo a u m espetáculo contristador.
M a i s d o q u e n u n c a , a I g r e j a , p e l a a d m i r á v e l beleza de s u a orga-
n i z a ç ã o , pelos laços d a s u a disciplina, pela c o m u n h ã o dos fiéis com os
seus guias e chefes, realiza nesta h o r a o p e n s a m e n t o de G u i z o t :
D e u m e x t r e m o a o u t r o d a t e r r a , p e r c o r r e , neste m o m e n t o , u m v e n t o
de destruição. E s t r e m e c e m os povos. Sofrem as r a ç a s . Perturba-se o
mundo. E j u s t a m e n t e nesta h o r a apocalítica da história humana, é
q u e d e s a p a r e c e o h o m e m d a paz, o s á b i o guia, o d i r e t o r das a l m a s !
S o b r e o r o c h e d o da I g r e j a Católica, de e n c o n t r o ao q u a l vão q u e b r a n d o
os séculos os seus vagalhões, e as p a i x õ e s h u m a n a s vão p e r d e n d o as
s u a s fúrias, P I O X e r a a sentinela, vestida de b r a n c o , q u e apontava
os horizontes, p r e g a v a a c a r i d a d e e a c o n c ó r d i a do E v a n g e l h o , e bra-
dava a clemência. A sentinela, porém, retira-se. Emudece. Diante
40 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
I m p r o v i s o n a Associação E n s a i o Filosófico, e m
10-12-1848, p o r ocasião de ser p o r ela a c l a m a d o
o mais genuíno representante d a filosofia do
Brasil.
T a n t a s h o n r a s , t a n t a c o n s i d e r a ç ã o p a r a u m h o m e m oculto n o si-
lêncio de s u a cela, p a s s a n d o d a o b s c u r i d a d e à g l ó r i a ; a velhice c o r o a d a
pela m o c i d a d e , a mente reanimada pela v i d a . . . são fenômenos tão
g r a n d e s , g e r a m sensações t ã o p o d e r o s a s q u e n ã o as posso ocultar!...
Doze a n o s t e n h o estado e m s i l ê n c i o ! . . . Sabeis q u e força é p r e c i s o
42 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
U m a n o v a a r e n a se a b r i u d i a n t e d e m i m n o s e m i n á r i o d e S ã o
José. . . M e u s serviços s ã o c o n h e c i d o s : a m o c i d a d e n ã o foi e n g a n a d a ;
o q u e n ã o e r a c o n h e c i d o foi a p r e s e n t a d o à s claras, e a e m u l a ç ã o n o b r e ,
e o c a r á t e r a r d e n t e d a m o c i d a d e , q u e conquistei p a r a as ciências, hoje
m e p a g a esses t r a b a l h o s , q u e t i n h a m sido esquecidos a t é a g o r a , m e re-
c o m p e n s a com u s u r a , e eu m e a c h o à frente desta m o c i d a d e esperan-
çosa, d a q u a l n u n c a d e s e s p e r e i . . . (Muito comovido)
T u d o espero, senhores!
Todos os g r a n d e s h o m e n s ( 1 ) c a í r a m ; a i n g r a t i d ã o m a r c h o u sem-
p r e a p a r deles: n ã o sabeis a h i s t ó r i a dos g r e g o s ? T i n h a m u m a idéia
n o b r e , a e r a q u e os talentos, e a s v i r t u d e s n ã o c a r e c i a m d e recompen-
s a ; m a s n ã o c o n h e c i a m as fraquezas do coração, nem as tramas da
i n v e j a : é preciso u m estímulo aos talentos, e u m apoio à v i r t u d e , e
n a G r é c i a t u d o foi recusado, ou c o n s t a n t e m e n t e disputado.
R e c e b o u m a coroa, eu a a c e i t o ; é o p r ê m i o de m i n h a s fadigas,
n ã o é u m a coroa de espinhos, é u m laurel de glória, é o p e n h o r desta
g e n e r o s i d a d e q u e t r a n s b o r d a d o c o r a ç ã o destes moços a q u e m sempre
amei, a quem s e m p r e d i r i g i pelo c a m i n h o da v e r d a d e . Recebo esta
c o r o a das m ã o s do anjo d a I g r e j a F l u m i n e n s e ! . . . Assim d e v i a ser,
p o r q u e vós, s e n h o r (voltando-se para o Exmo. Bispo), c o m o bispo, sois
o r e p r e s e n t a n t e do c r i s t i a n i s m o q u e revelou os v e r d a d e i r o s destinos do
gênero h u m a n o ; enobreceu o coração d o h o m e m ; elevou sua razão;
ilustrou o seu e s p í r i t o ; e m a r c h a r á s e m p r e a despeito de todos os pe-
rigos, a despeito de todos os reveses, à frente da civilização, porque
êle é o seu m a i s forte elemento, p o r q u e êle é o tipo n o b r e e s u b l i m e
d a g r a n d e z a , da glória, e do l i b e r d a d e d o h o m e m .
MONTE ALVERNE
Senhor (1):
Já n ã o é d a d o i g n o r a r a c a u s a deste í m p e t o d i v i n o q u e a r r e m e s -
sou a t r a v é s d e m i l azares esses h o m e n s , escolhidos p a r a m u d a r a face
da terra. É i n ú t i l fingir desconhecer a o r i g e m dessas f a ç a n h a s singu-
l a r e s , d e q u e j u s t a m e n t e se e n s o b e r b e c e a b e l a filha d o céu ( 2 ) . Ex-
p i a ç õ e s c r u e n t a s p r e l u d i a v a m esta r e g e n e r a ç ã o , q u e os séculos espera-
vam com extrema ansiedade. Holocaustos espontâneos e n s a i a v a m esta
r e n ú n c i a d e si m e s m o , estas q u e b r a s d o egoísmo, a q u e estava l i g a d a
a p u r i f i c a ç ã o d a espécie h u m a n a : m a s todos esses rasgos d e d e d i c a ç ã o ,
t o d o s esses b r i o s d a m a g n a n i m i d a d e f i c a r a m m u i t o longe d a s p r o v a s ,
a q u e e r a m c h a m a d o s os r e p r e s e n t a n t e s d o novo p r o g r e s s o nacional.
Repelidos p o r t a n t o s reveses, d e s a n i m a d o s com t a n t a s d e r r o t a s , os m a i s
e x p e r i m e n t a d o s c o n t e n d o r e s c e d e r a m a a r e n a , q u e eles h a v i a m coberto
de ruínas. C o n v i n h a m outros meios, e r a m m i s t e r e s e m p e n h a d o s d o u t r a
ordem. L o u r o s a i n d a n ã o estimados, u m a a u r é o l a , d e q u e n ã o h a v i a
T o d o s os a n a i s d e r a m c o n h e c i m e n t o deste a b a l o c o m q u e o m u n d o
foi sacudido, e pôs e m desuso as idéias r e c e b i d a s . As á g a p e s dos
confessores c o n d e n a v a m esses festins, m a r c a d o s como e s t i g m a d a atro-
c i d a d e , e com os excessos d a i n t e m p e r a n ç a ; b a t a l h õ e s d e v i r g e n s m a n -
d a d a s à m o r t e , p o r c o n s e r v a r s u a p u r e z a , c o b r i a m de confusão essas
m u l h e r e s , q u e n ã o t i n h a m pejo de assistir em completa n u d e z às ceias
voluptuosas de Tigelino n a s a l a m e d a s de seus jardins profusamente
iluminados ( 1 ) , e a m a t a n ç a d o l a g o F u c i n o p a r a satisfazer os c a p r i -
chos d u m déspota ( 2 ) , q u e r e c e b i a os últimos e m b o r a s d a majestade
d o povo-rei ( 3 ) , era c o n t r a t a d a p o r esses m i l h õ e s de h o m e n s amon-
toados nos anfiteatros, c o n s u m i d o s n a s fogueiras, e despedaçados nos
cavaletes a fim de justificar q u e a h o r a d a salvação t i n h a chegado,
e que a humanidade estava r e g e n e r a d a . C a d a século a p r e s e n t a v a pe-
ripécias ainda não apreciadas. A s flagelações rivalizavam as cenas
do m a r t í r i o ; a p e n i t ê n c i a v i n h a sentar-se n o l u g a r d a s perseguições,
e as v i r t u d e s pacíficas s u b s t i t u í a m os surtos d a h e r o i c i d a d e . Um só
h o m e m r e c o m p i l o u todos esses méritos, e obteve as m a i s a r d e n t e s ova-
ções. Os a r r o u b o s d a a b n e g a ç ã o evangélica, o espírito de reforma,
a ostentação da o n i p o t ê n c i a d i v i n a b a s t a m p a r a dá-lo a c o n h e c e r . Os
anjos o c h a m a r a m — P e d r o — o l u g a r d o seu n a s c i m e n t o acrescen-
tou-lhe o apelido de — Alcântara.
Os b a r d o s d o T a b o r , os c a n t o r e s do H e r m o n e do S i n a i , b a t i d o s
da t r i b u l a ç ã o , d e v o r a d o s de pesares, n ã o o u v i n d o m a i s os ecos repeti-
rem as estrofes dos seus cânticos n a s q u e b r a d a s de suas montanhas
pitorescas; não e s c u t a n d o a voz do deserto, q u e levava ao l o n g e a
m e l o d i a dos seus h i n o s , p e n d u r a v a m seus a l a ú d e s nos s a n g u e i r o s que
bordavam o rio da escravidão; e q u a n d o os h o m e n s apreciavam as
suas composições, q u a n d o aqueles q u e se d e l e i t a v a m c o m pedir-lhe a
repetição dessas epopéias, e m q u e p e r p e t u a v a m o p e r f u m e d o seu es-
tilo, e a beleza de s u a s i m a g e n s , v i n h a m as m e m ó r i a s de seus ante-
passados, e as m a r a v i l h a s d o T o d o - P o d e r o s o , eles c o b r i a m suas faces
u m e d e c i d a s d o p r a n t o , e a b a n d o n a v a m a s c o r d a s f r o u x a s e desafinada?
dos seus i n s t r u m e n t o s músicos ao v e n t o da t e m p e s t a d e (2).
* * *
É u m a indesculpável t e n a c i d a d e p r e t e n d e r v i c i a r a t e o r i a d a reli-
gião. É u m a b s u r d o c o m p a r a r o r e i n o indestrutível d o Cristo a essas
m o n a r q u i a s colossais, q u e se m o s t r a r a m sem filiação, sem genealogia,
e d e s a p a r e c e r a m sem d e i x a r a l g u m vestígio de sua p r i m e i r a grandeza.
Abramos este livro a d m i r á v e l , q u e t e m escapado aos m a i s temerosos
cataclismos e sobrevivido às revoluções d o globo; consideremos esta
a l e g o r i a m a g n í f i c a , de q u e o escritor h e b r e u serviu-se t ã o habilmente
para d e r i v a r d o p e n s a m e n t o p r i m o r d i a l d o h o m e m p r i m i t i v o as ten-
d ê n c i a s d a nossa n a t u r e z a ; e seremos forçados a c o n c o r d a r c o m o m a i s
s á b i o dos d o u t o r e s ( * ) , q u e o c r i s t i a n i s m o deu começo à s u a existên-
c i a , p r o t e g e n d o o h o m e m n o i n s t a n t e m e s m o d a s u a q u e d a : q u e o se-
g u i u n a sua i n f â n c i a envolto n a s o m b r a d o m i s t é r i o , e manifestou-se
e m t o d a a s u a i r r a d i a ç ã o , logo q u e a sociedade a s s u m i u as p r o p o r ç õ e s
mais gigantescas. A m u l h e r , tipo d o d e v a n e i o , e d a f a t u i d a d e , é sub-
j u g a d a pelo p r e s t í g i o d o m a r a v i l h o s o ; e a v e n t u r a - s e aos resultados d a
m a i s fatal desobediência, e n g a n a d a p e l a serpente, símbolo da fascina-
ção, e do encantamento. 0 homem escuta s u a e s p o s a ; deixa-se do-
b r a r de s u a s c a r í c i a s ; q u e b r a n t a u m preceito, q u e c o n t r a r i a s u a vai-
d a d e ; esquece p r o m e s s a s , q u e êle n ã o c o m p r e e n d e , a f a g a d o p o r deleites,
q u e êle conhece, q u e êle e x p e r i m e n t a , q u e êle sentia c a d a d i a ; e a r r a s t a
s u a p o s t e r i d a d e nos h o r r o r e s d a d e s v e n t u r a (1). 0 reparador esten-
d e n d o a m ã o aos filhos d o g r a n d e c u l p a d o , n a fase m a i s assustadora,
a c e i t a as condições de s u a f r a g i l i d a d e , satisfaz as necessidades d a r a z ã o ,
f r a n q u e a n d o - l h e os d o m í n i o s d a f é : a t e n u a os estímulos do desejo com
a e t e r n i d a d e d o r e m o r s o ( 2 ) ; e q u i l i b r a os sacrifícios d o a m o r p r ó p r i o
c o m a s u b l i m i d a d e das r e c o m p e n s a s , e abrilhanta suas ações com o
reflexo d a divindade.
q u e z a , e a d u l t e r a as m á x i m a s deste E v a n g e l h o , q u e e s c a r n e c e u a s a r g ú -
cias do erro, e z o m b o u d a s t r a m a s d a p e r f í d i a , D e u s suscitou a P e d r o
d e A l c â n t a r a , p a r a ser u m protesto vivo c o n t r a o p r e d o m í n i o d a s p a i -
x õ e s , e f i g u r a r a s resistências do dever c o n t r a a s invasões do interesse.
S u b a m o s a s s e r r a n i a s d a n o v a Castela, p e n e t r e m o s o convento d e
Manjarrez, atravessemos essas a r c a d a s silenciosas, esses vastos dormi-
tórios, e m q u e se p e r d e o r u í d o d o s é c u l o . . . Quem é este j o v e m
e s c a p a d o aos a b r a ç o s m a t e r n a i s , e q u e s a i n d o h á p o u c o d a u n i v e r s i d a -
d e , q u e e s p a n t a r a c o m seus talentos, d e i x a a c a r r e i r a d a s d i g n i d a d e s ,
e i m p õ e silêncio à l i n g u a g e m d a s e d u ç ã o ? O q u e v e m êle b u s c a r a o
m e i o destes h o m e n s , q u e estabeleceram o m a i s irreconciliável antago-
n i s m o a o regalo e à s d e l í c i a s ? O filho d o g o v e r n a d o r d e A l c â n t a r a
está vestido c o m o saial do p o b r e d e Assis. P e d r o está n a lista dos
penitentes.
U m h o m e m t ã o e x t r a o r d i n á r i o n ã o p o d i a s e r o l h a d o c o m indife-
r e n ç a : P e d r o d e A l c â n t a r a possuía todas as q u a l i d a d e s , q u e a f i a n ç a m
u m grande caráter. A solidez d o seu juízo, u m a p r u d ê n c i a consuma-
d a , u m a p e r í c i a r e c o n h e c i d a facilitam a Pedro de Alcântara os pri-
meiros cargos de sua ordem. Sua afabilidade conquistou a afeição
mais profunda, e assegurou-lhe os m a i s b r i l h a n t e s sucessos. Ardendo
e m zelo pela c a u s a d o S e n h o r , desejando i n s t i t u i r o u t r o s cooperadores,
q u e a t e r r a s s e m o vício, e removessem os escândalos q u e d e s l u s t r a v a m
a h e r a n ç a d o p a i d e f a m í l i a ; P e d r o d e A l c â n t a r a evade-se a o provin-
c i a d o , q u e p e l a s e g u n d a vez l h e fora proposto, e se r e t i r a p a r a o con-
v e n t o d e S a n t o Onofre, j u n t o d e S o r i a n o . E n t r e g u e c o m m a i s desabafo
aos t r a b a l h o s d a p e n i t ê n c i a , e aos gozos d a m e d i t a ç ã o , o reformador
l a n ç a os f u n d a m e n t o s d a p r o v í n c i a dos descalços, a q u e m d e u seu no-
m e , e q u e e n c h e u d e t a n t o lustre a E s p a n h a e toda a I t á l i a : ansioso
(*) J ó . c. 31. v. 1.
(1) G a l a t . c. 2. v. 19.
(2) Ibidem. v. 20.
DISCURSOS BRASILEIROS 51
Q u e m p o d e r á c o n t e r o v ô o desta á g u i a s o b e r b a , q u e a m e a ç a g a l g a r
o espaço, e t r a n s p o r a r e g i ã o d o s o l ? Q u e m o u s a r á r e f r e a r esta tor-
r e n t e i m p e t u o s a , q u e a r r e b a t a , q u e a n i q u i l a os d i q u e s , e as r e p r e s a s ,
q u e se o p õ e m à s u a p a s s a g e m ? P e d r o de A l c â n t a r a a c e d e às reite-
r a d a s instâncias do d u q u e d'Aveiro, e do infante D . Luiz; atravessa
a p é , e descalço, a E s t r e m a d u r a e s p a n h o l a , e todo o P o r t u g a l ; e vai
c o a d j u v a r n a s u a o u s a d a e m p r e s a esses d e n o d a d o s atletas, q u e h a v i a m
p r o j e t a d o a r e f o r m a d a p r o v í n c i a de A r r á b i d a . Sempre na vanguarda
dos c o m b a t e s e êmulo dos A n t ã o , e dos P a c ô m i o fortalece, com os
seus conselhos, e a i n d a m a i s c o m o seu e x e m p l o , os novos solitários,
que lembravam esses f a m i g e r a d o s anacoretas, que nos começos da
I g r e j a , e s p a n t a r a m com s u a s a u s t e r i d a d e s as solidões do alto Egito, e
os desertos d e S a í d e e d a T e b a i d a . D o c i m o desses r o c h e d o s alcan-
tilados, o infatigável c o n d u t o r d a s n o v a s t r i b o s c o n t e m p l a v a nos asso-
mos d'alegria esses destemidos arautos, que envergavam a mesma
c o u r a ç a , de q u e êle estava revestido, e q u e dos mesmos entrincheira-
mentos, com q u e se defendia, l e v a v a m e m suas m ã o s r o b u s t a s o a r c h o t e
da revelação, e i a m a c o r d a r os povos, q u e d o r m i a m n a s t r e v a s d a ido-
latria. Eles n ã o t e m e r a m afrontar i m p á v i d o s o c a b o das tormentas;
s u l e a r a m os m a r e s d ' a u r o r a , p a s s a r a m os H i n d u s , v i s i t a r a m os Corilis
o r i e n t a i s ; e sentados às p o r t a s de C a n t ã o , e d e N a n q u i m , aguardavam
o m o m e n t o de a r v o r a r em suas torres o estandarte do Crucificado.
Os lagos d o C a n a d á , a s i n u n d a ç õ e s d o Mississipi, e as alturas dos
A n d e s n ã o a s s u s t a r a m s u a i n t r e p i d e z apostólica. Nossos pais os con-
templaram comunicando com o Guaicuru, reprimindo a ferocidade do
Botocudo, c o n c i l i a n d o o implacável Aimoré. Eles d o m a r a m o indô-
mito 11) Goitacá, p o l i r a m o T a m o i o , e p r e n d e r a m ao c a r r o d e Jesus
Cristo o T u p i e o Caeté. P o v o a ç õ e s florentes s u r g i r a m , como p o r en-
canto, das m a r g e n s d o A m a z o n a s até às c a b e c e i r a s d o P r a t a ; e p a r a
c ú m u l o de sua g l ó r i a , f o r a m eles q u e s a u d a r a m p r i m e i r o a civilização
(1) Vieira.
52 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
(1) E s t . c. 14 v. 17. D a n . c. 2 v. 8.
(2) 3? Reg. c. 19 v. 7.
56 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
a I g r e j a te h a v i a r e c o n h e c i d o p o r p r i n c i p a l p a t r o n o do Brasil. Não
m e iludi q u a n d o preconizei t ã o acrisolado m e r e c i m e n t o ; n ã o fui en-
g a n a d o q u a n d o acreditei, q u e os Brasileiros e s t a v a m b e m r e s g u a r d a d o s
com o teu eficaz p a t r o c í n i o . V i n t e anos d e ilusão e desvios, vinte a n o s
de desares e c a l a m i d a d e s , q u a s e e s q u e c i d a s e dissipadas, d e v e m t e r
a l t a m e n t e c o m p r o v a d o q u e u m p o d e r invisível c o n t r a o q u a l e m v ã o
desenfreiam os tufões m a i s e m b r a v e c i d o s , a b r i g a e p r o t e g e o i m p é r i o
brasileiro. Todas essas q u i m e r a s d u m a p e r f e c t i b i l i d a d e social, q u e n ã o
é p e r m i t i d o p o s s u i r ; todas essas u t o p i a s falazes, q u e a i n d a n ã o a p r o -
v e i t a r a m a a l g u m povo, e s v a e c e r a m p a r a d a r ocasião d e m e l h o r a m e n t o s
aconselhados pela s a b e d o r i a , e r e f o r m a s a c r e d i t a d a s pela c i r c u n s p e c ç ã o .
U m p r í n c i p e , n o vigor d a m o c i d a d e , prossegue a v a n t e à testa deste m o -
v i m e n t o acelerado, que impele as nações p a r a a sua prosperidade.
M a i s notável pelos dotes d o seu c o r a ç ã o , do q u e pela transcendência
d e s u a s concepções, persiste c o m afinco n o intento glorioso d e l e v a n t a r
o seu p a í s a o g r a u d a i m p o r t â n c i a , q u e l h e r e s e r v a m seus destinos.
A n i m a n d o a s artes, favorecendo as ciências, d a n d o à i n s t r u ç ã o l i t e r á r i a
o desenvolvimento d e q u e é suscetível, r e s t a u r a n d o os costumes, s e n d o
êle m e s m o u m modelo d e h o n e s t i d a d e pública e doméstica, o nove*
A u g u s t o m a r c a r á u m a época nos fastos d o seu r e i n a d o ; e m a i s dis-
tinto, m a i s a d m i r á v e l p o r t e r a r r a n c a d o seu povo d a abjeção, e m q u e
o d e i x a r a m o descuido e a i n d i f e r e n ç a dos seus a n t i g o s dominadores,
g a n h a r á p a r a si u m r e n o m e , u m a c o n s i d e r a ç ã o , q u e o e s t r o n d o d a s
c o n q u i s t a s e o b r i l h o efêmero d a s a r m a s n ã o p o d e m a l c a n ç a r . Uma
d a s esposas m a i s d e d i c a d a s d e Jesus Cristo, vossa discípula querida,
S a n t a T e r e z a d e Jesus, deixou-nos dito, q u e o S e n h o r n ã o r e j e i t a r i a
a l g u m a súplica, a p o i a d a n a vossa m e d i a ç ã o . P o i s b e m : eu m e d i r i j o
a vós m e s m o neste m e s m o d i a g r a n d i o s o e m e m o r á v e l ; eu vos s u p l i c o
empenheis vossa poderosa intervenção e m favor do Imperador, em
favor desta n a ç ã o b r i o s a e m a g n â n i m a , d e q u e m vós sois o escudo, e
u m b a l u a r t e invencível e i n e x p u g n á v e l .
NILO PEÇANHA
V e n h o d e e x a m i n a r j u n t o d a s p o p u l a ç õ e s do N o r t e g r a n d e duas
vezes, n a " v i r t u d e d e h o s p i t a l i d a d e dos povos a n t i g o s " , e n a s p a i x õ e s
d a l i b e r d a d e , força e c o n d i ç ã o dos povos m o d e r n o s , — a s questões de
economia nacional, d e crédito público, d e v i a ç ã o férrea, de m a r i n h a
m e r c a n t e , de legislação o r ç a m e n t á r i a , d e i m i g r a ç ã o , d e defesa n a c i o n a l ,
de exploração das minas, d a fundação das indústrias, da expansão da
a g r i c u l t u r a , — m a s n e n h u m a delas sobreleva, n e m se i m p õ e t ã o im-
p e r i o s a m e n t e a o futuro governo, c o m o a o f u t u r o d a nossa p r ó p r i a r a ç a ,
como a questão da instrução popular. (Muito b e m ! Muito b e m ! )
N ã o só g r a t u i t a , m a s , e m d e t e r m i n a d a s c i r c u n s t â n c i a s , auxiliada
pelos p o d e r e s públicos, aos q u a i s d e v e r á i n c u m b i r , o f o r n e c i m e n t o d e
livros às c r i a n ç a s r e c o n h e c i d a m e n t e p o b r e s e o patrocínio de caixas
escolares q u e liberalizassem à q u e l a s os m e i o s q u e aos pais falecem p a r a
as fazerem instruir.
N ã o h á m u i t o a e s p e r a r dos E s t a d o s q u e estão o u o n e r a d í s s i m o s
de d í v i d a s n o e s t r a n g e i r o , ou se t ê m r e n d a s folgadas, c o m o M i n a s Ge-
rais, o g r a n d e E s t a d o d a l i b e r d a d e , o p r i m i d o neste m o m e n t o ; elas ja-
mais se d e s t i n a r i a m à instrução dessas 900.000 crianças mineiras,
q u e lá estão c l a m a n d o p o r escolas, t a n t o se p r e c i s a d e r e c u r s o s para
m a n t e r o "fogo s a g r a d o " dos t u b a r õ e s d o j o r n a l i s m o d o R i o d e Ja-
n e i r o , neste assalto à P r e s i d ê n c i a d a R e p ú b l i c a . (Palmas prolongadas)
É c e r t o q u e o A t o A d i c i o n a l e n t r e g o u o ensino p r i m á r i o às nossas
antigas províncias, m a s a Constituição d a República n ã o impede q u e
a U n i ã o colabore nessa o b r a d e salvação p ú b l i c a , j á f u n d a n d o as es-
colas n o r m a i s , d e o n d e s a i r i a m os professores d e a m a n h ã , j á interes-
s a n d o todos os ó r g ã o s d a o p i n i ã o , d o p e n s a m e n t o e d a f o r t u n a do Brasil
na realização da grande reforma social!
Senhores! E u t a m b é m t e n h o o d i r e i t o , p o r m u i t o s q u e sejam os
m e u s e r r o s , d e , neste assunto, falar alto aos nossos c o n c i d a d ã o s , por-
q u e nestes t r i n t a a n o s d e r e g i m e , foi o g o v e r n o a q u e tive a h o n r a d e
p r e s i d i r , q u e l a n ç o u a s bases d o ensino profissional, nessas dezenas d e
institutos q u e a í estão criados, n a s capitais do Brasil. (Aplausos)
N ã o s a í r a m d a s a c a d e m i a s os i n v e n t o r e s d a locomotiva, do n a v i o ,
d o telégrafo, do telefone e d e centenas d e o u t r a s invenções, e m q u e os
seus autores, h u m i l d e s r e p r e s e n t a n t e s d o t r a b a l h o m a n u a l e v e r d a d e i r o s
c r i a d o r e s d a civilização m o d e r n a , s a b i a m fazer u m a coisa q u e os sábios
d e hoje i g n o r a m , isto é, servirem-se d a s s u a s p r ó p r i a s m ã o s .
E justificando a s u a f u n d a ç ã o , e u n e l a v i a a r e a ç ã o c o n t r a a ex-
tensão do p r i n c í p i o d a divisão do t r a b a l h o , q u a n d o estabeleceu duas
classes distintas, a dos intelectuais e a dos t r a b a l h a d o r e s , o q u e vale
a dizer a e s c r a v i d ã o d e u m a pela o u t r a , e c o m o se esse desprezo pelo
trabalho manual que é a verdadeira disciplina do h o m e m e essa in-
justiça, m u i t a s vezes secular, q u e v e m p e r t u r b a n d o a consciência do
m a i o r n ú m e r o e c a r a c t e r i z a n d o a nossa civilização feita d e egoísmo e
de sensualidade ( a p l a u s o s ) , e q u e d e u a u n s o m o n o p ó l i o d o pensa-
m e n t o t ã o a b s u r d o e t ã o odioso, como s e r i a o d a luz, o d o a r , o d a
r e s p i r a ç ã o e a o s outros, isto é, aos o p e r á r i o s , a s e r v i d ã o , a i g n o r â n c i a
e os d u r o s e n c a r g o s d a v i d a ( p a l m a s ) , pudesse c o r r e s p o n d e r aos n o b r e s
destinos m o r a i s e intelectuais d o h o m e m .
Reconhecei-o de p r e f e r ê n c i a , n a a g u d a o b s e r v a ç ã o de A b d i a s Neves,
o b e d i e n t e ao p r i n c í p i o d a a u t o r i d a d e , incarne-se esta nos p a t r õ e s , no
governo, ou nos p o r t a d o r e s d a s funções públicas, — mas com um
melindre e um s e n t i m e n t o de altivez i n d o m á v e l . N ã o tolera q u e o
humilhem.
E a fisionomia a p á t i c a , s e n ã o a a t o n i a m u s c u l a r d a p r i m e i r a vista,
se t o r n a m flexibilidade e vivacidade nervosa.
Cético p o r t e m p e r a m e n t o e p o r e x p e r i ê n c i a p r ó p r i a , e e m b o r a o
I m p é r i o ou a R e p ú b l i c a , p o u c o i m p o r t a o r e g i m e , l h e t e n h a m negado
a i n s t r u ç ã o p a r a os filhos, assistência aos enfermos, polícia p a r a sua
DISCURSOS BRASILEIROS 63
L e d e esta p á g i n a q u e n t e e j u s t a de T i m a n d r o , o g r a n d e panfle-
t á r i o , q u a n d o a Sicília r o m p e o nexo q u e a p r e n d i a a N e r o n a p o l i t a n o
e p r o c l a m a u m a Constituição s u a e r e c o n q u i s t a o g o v e r n o de si m e s m a ;
q u a n d o N á p o l e s r e a g e e a d i g n i d a d e d o h o m e m j a z i a no o p r ó b r i o de
r e c o n h e c e r c o m o lei ú n i c a o alvitre de u m d é s p o t a ; q u a n d o Sardenha
abre a carreira por onde chega a firmar o i m p é r i o da liberdade;
q u a n d o Toscana, P a r m a e Módena arvoram o estandarte da revolta
c o n t r a os seus respectivos A u g ú s t u l o s ; q u a n d o o L e ã o de S. Marcos
e x p a n d e as asas e r e s t a u r a com a sua i n d e p e n d ê n c i a o esplendor do seu
c o m é r c i o ; e q u a n d o a L o m b a r d i a se i n s u r g e em peso c o n t r a a casa d a
Á u s t r i a e m a r c h a com o seu rei cavaleiro, — lede esta p á g i n a , de
v e r d a d e , de h e r o í s m o e de s e n t i m e n t o n a c i o n a l i t a l i a n o , — e vereis
q u e esse m o v i m e n t o brasileiro, q u e veio d a s cristas d a s á g u a s do C h u í ,
q u e envolveu o Paraíba, que tomou o S. F r a n c i s c o (bravos!), que
c h e g o u ao C a p i b e r i b e e q u e foi ao A m a z o n a s , é o Brasil de amanhã
e q u e v e n c e r e m o s ( b r a v o s ! ) p o r q u e somos a justiça, essa i m e n s a f i g u r a
e t e r n a de q u e falou o exilado de Jersey, com os pés no c o r a ç ã o do
h o m e m , m a s com as asas e o p e n s a m e n t o n o C r u z e i r o d o S u l ! (Pal-
mas prolongadas)
NILO PEÇANHA
A i n d a a g o r a , d a g r a n d e g u e r r a d a E u r o p a , d o p e r í o d o m a i s ator-
m e n t a d o d a H i s t ó r i a , n a d a saiu a i n d a n o t e a t r o , n o r o m a n c e , n a poesia,
n a legislação i n t e r n a c i o n a l , q u e possa p e r p e t u a r o sacrifício d o s a n g u e ,
d o e n t u s i a s m o e d a ilusão dos h o m e n s . (Apoiado)
E u lá estava e o q u e n o m o m e n t o a p a i x o n a v a a l i t e r a t u r a e ins-
pirava a derradeira tese de E . R o s t a n d , c o m o em seguida a Henri
Bataille e a outros, e r a a m e s m a tese q u e antes, e com t a n t o b r i l h o ,
havia inspirado Byron na Inglaterra, Hoffmann na Alemanha, Dumas
e A . Musset n a França.
A p e n a s o A u g u s t o P a i de V. M . L, o m a g n â n i m o F u n d a d o r do
I m p é r i o , soltou n a s m a r g e n s do I p i r a n g a o g r i t o s u b l i m e d a Indepen-
dência, a esse m á g i c o som e s t a l a r a m as c a d e i a s q u e já n ã o podiam
convir, sem desonra, a u m povo n u m e r o s o e i l u s t r a d o : confundiram-se
DISCURSOS BRASILEIROS 69
Senhores
A h ! só u m Deus, q u e é o m e s m o a m o r , p o d i a o p e r a r tão i n a u d i t a
m a r a v i l h a : só a Religião, e m a n a d a do seu m e s m o seio, p o d i a revelar
este s e g r e d o até e n t ã o desconhecido. Sim, foi o C r i s t i a n i s m o q u e reabi-
litou e r e s t i t u i u a d i g n i d a d e d a m u l h e r aviltada e n t r e as m a i s polidas
X a ç õ e s d a a n t i g ü i d a d e p a g a , c o n f i n a d a n o i n t e r i o r do Gineceu, e re-
d u z i d a à d u r a condição de escrava. Os seus P o e t a s , Filósofos e Legis-
ladores a rebaixaram até supô-la i n c a p a z de instrução, de v i r t u d e e
l i b e r d a d e , e sem o u t r o destino q u e a p e r p e t u i d a d e da espécie. Ainda
hoje, nos P a í s e s onde n ã o r a i o u a luz d o E v a n g e l h o , é tão miserável
a sua sorte q u e em u n s se lhe e n c u r t a m b a r b a r a m e n t e os pés desde
a infância, para impossibilitá-la de a n d a r , em outros, o b r i g a m - n a a
precipitar-se e p e r e c e r n a fogueira o n d e é l a n ç a d o o c a d á v e r do m a r i -
do, em outros, finalmente, a d e i x a m t r i s t e m e n t e v e g e t a r n a p r i s ã o do-
méstica de u m Harém. A civilização Cristã, S e n h o r e s , dissipou um
tão funesto e r r o . Ela n ã o só r e i n t e g r o u a m u l h e r nos seus naturais
direitos e a elevou a u m a o r d e m m a i s n o b r e e d i g n a da h o n r a inefável
de conceber em u m seio v i r g i n a l o F i l h o do Altíssimo revestido da
nossa n a t u r e z a , como t a m b é m a divinizou de a l g u m a sorte, escolhen-
do-a p a r a d e p o s i t á r i a d a t e r n u r a de Jesus Cristo p a r a com os p o b r e s ,
objetos da sua p r e d i l e ç ã o e nos q u a i s êle q u e r q u e se r e c o n h e ç a e se
ame a sua própria pessoa •— Quandiu fecisti ini ex his fratribus
Só resta a g o r a d e l i b e r a r m o s s o b r e a o r g a n i z a ç ã o da Irmandade
d e S ã o V i c e n t e de P a u l a , q u e hoje vimos instituir, e cujo fim, como
vos p o n d e r e i n a P a s t o r a l de 5 do c o r r e n t e , é o b t e r os meios de con-
s e g u i r a v i n d a das I r m ã s da C a r i d a d e , e realizar o seu estabelecimento
nesta Capital. A o ver em t o r n o do i n d i g n o P a s t o r desta Diocese tan-
tos conspícuos v a r õ e s a n i m a d o s de u m santo e n t u s i a s m o , eu m e acho
possuído de í n t i m o j ú b i l o e n ã o posso j á d u v i d a r d o feliz êxito desta
e m p r e s a , a o m e s m o t e m p o religiosa e e m i n e n t e m e n t e social. Senhores,
o P a i das M i s e r i c ó r d i a s vos delega hoje os seus p o d e r e s p a r a a defesa
e p r o t e ç ã o d o p o b r e , d o órfão e de todos os q u e sofrem. — Tibi dere-
lictu est pauper, orphano tu eris adjuter (1). F o i sob i g u a i s auspí-
cios e pelos valiosos auxílios de distintos C i d a d ã o s e respeitáveis Ma-
t r o n a s q u e Vicente de P a u l a dotou o U n i v e r s o com esta providentíssi-
m a Instituição. Ah! o doce prazer que produz em uma alma bem
formada a prática d a beneficência, os votos de reconhecimento do
p o b r e q u e se elevam até os ouvidos d o E t e r n o , e s o b r e t u d o as celestiais
r e c o m p e n s a s p r o m e t i d a s à simples esmola de u m copo d á g u a fria (2)
vos r e t r i b u i r ã o com u s u r a todos os sacrifícios q u e fizerdes p o r uma
t ã o bela causa.
9
Nesta f i r m e confiança p r o p o n h o : l ) Q u e se p r o c e d a à eleição de
u m a M e s a c o m p o s t a de 9 m e m b r o s , e n t r a n d o neste n ú m e r o o P r o v e d o r ,
Vice-Provedor, Escrivão e T e s o u r e i r o . Esta M e s a a p r e s e n t a r á com a
9
possível b r e v i d a d e u m p r o j e t o de C o m p r o m i s s o d a I r m a n d a d e . 2 ) Que
se elejam igualmente Agentes encarregados de p r o m o v e r , desde já,
subscrições p a r a o b t e r os socorros com q u e a p i e d a d e de c a d a u m q u i s e r
contribuir p a r a u m a obra tão salutar e meritória.
s u p e r a b u n d a n t e e e n t ã o f a r e m o s c o n s t r u i r a nossa m u r a l h a de 5 0 0 lé-
g u a s de c o m p r i m e n t o ; p u b l i c a r e m o s leis severas c o n t r a o e u r o p e u que
tiver a o u s a d i a de p i s a r o nosso t e r r i t ó r i o ; e a d o t a r e m o s as belas insti-
tuições d o povo c h i n ê s ; t e r e m o s os nossos l e t r a d o s , os nossos m a n d a -
rmos, e o muito p a t e r n a l despotismo d o seu I m p e r a d o r . Até que
c h e g u e essa época, v a m o s c o n t i n u a n d o as nossas relações com os euro-
peus, q u e têm sido os nossos mestres e g u i a s n a s artes, n a s ciências,
e n a s m e m a s instituições l i b e r a i s ; este c o m é r c i o é, de certo, m a i s v a n -
tajoso q u e o dos selvagens africanos.
R e s t a - m e só falar da p e n a de p i r a t a r i a i m p o s t a pelo t r a t a d o em
q u e s t ã o e sinto, n a v e r d a d e , depois de t e r p a g o à m a g n â n i m a nação
b r i t â n i c a o justo t r i b u t o de louvor q u e m e r e c e a s u a filantropia e os
seus esforços a b e m d a h u m a n i d a d e , q u e eu m e veja c o n s t r a n g i d o a
d e s a p r o v a r a sua i n g e r ê n c i a na imposição de semelhante pena. É
m u i t o doloroso p a r a u m b r a s i l e i r o a m a n t e d a d i g n i d a d e d o seu p a í s ,
que, e n q u a n t o os corpos legislativos das o u t r a s n a ç õ e s d e l i b e r a m livre-
m e n t e s o b r e u m a t ã o i m p o r t a n t e m a t é r i a , só o Brasil se veja privado
desta p r e r r o g a t i v a e d i r e i t o inauferível, fazendo o sacrifício de sujeitar
os c i d a d ã o s brasileiros às p e n a s infligidas p o r u m a n a ç ã o estrangeira!
Reconheço, Sr. P r e s i d e n t e , q u e a querer-se abolir de boa-fé o i n f a m e
tráfico de escravos, n ã o h á talvez u m a m e d i d a m a i s eficaz, pois de
o u t r a m a n e i r a , serão ilusórias t o d a s as p r e c a u ç õ e s c o n t r a a fecunda
e desenfreada cobiça dos a r m a d o r e s ; m a s n ã o e r a ao g o v e r n o b r i t â n i c o
q u e c u m p r i a classificar delitos e estabelecer p e n a s c o n t r a os súditos de
u m a nação independente. Todavia, a comissão p o n d e r a n d o t u d o com
a m a i s s i s u d a e m a d u r a reflexão e r e c o n h e c e n d o pela n o t a d o M i n i s t r o
a triste posição d o G o v e r n o e n t r e dois g r a n d e s m a l e s ; v e n d o , p o r ou-
tra parte, que o tratado se a c h a v a concluído e ratificado, faltando
a p e n a s a a s s i n a t u r a d o M i n i s t r o b r i t â n i c o , n ã o d u v i d o u f i r m a r o seu
p a r e c e r pela f o r m a q u e se a c h a concebido, p o r e n t e n d e r q u e tais cir-
c u n s t â n c i a s n a d a m a i s i n c u m b i a a esta C â m a r a , s e g u n d o o § do A r t i g o
102 d a C o n s t i t u i ç ã o .
E x m o . Sr. P r o v e d o r .
Minhas Senhoras.
Meus Senhores.
S a i a m o s d o m u n d o d a m a t é r i a , e v e r e m o s a í , c o m o e m toda a
p a r t e , o p o d e r o s o móvel. O santo m i s s i o n á r i o q u e esquece os cômo-
dos d a v i d a p a r a i r a o f u n d o d o s sertões c o n q u i s t a r a s a l m a s pagas
p a r a o r e i n o d o E v a n g e l h o , a f r o n t a n d o u r z e s e feras, t o r r e n t e s e tem-
pestades, rios caudalosos e p e n e d i a s b r a v a s , a fome, a sede, a s enfer-
midades e a própria morte, — q u e é que o alenta e conduz?
A filha h e r ó i c a d e S ã o V i c e n t e d e P a u l a q u e e n t r a s e r e n a n u m
c a m p o de b a t a l h a , o n d e g e m e m feridos e s o l u ç a m m o r i b u n d o s , — q u e
visita descuidosa a m a n s a r d a l ô b r e g a d o pestífero o u a s salas d o hos-
pital c o a l h a d o d e c h a g a s a s q u e r o s a s , — q u e d e b r u ç a d a s o b r e o leito
dos e n f e r m o s c u r a a s feridas d o m a i s grosseiro dos h o m e n s como se
t r a t a r a d e u m i r m ã o q u e r i d o , e l h e r e a n i m a a c o r a g e m c o m o sorriso
angélico d e m ã e , — q u e é q u e a robustece e i n f l a m a ?
A v i r g e m c â n d i d a e bela q u e a b n e g a o s p r a z e r e s do mundo e
sacrifica todas a s delícias d a v i d a social p a r a p r o c u r a r n a solidão d o
claustro, e j u n t o dos a l t a r e s d o S e n h o r , a consolação s u p r e m a d a u n i ã o
com D e u s e os gozos inefáveis d a a l m a piedosa e contemplativa, —
que é que a domina?
Só e s e m p r e o a m o r , d e b a i x o d e m i l formas, m a s p o r toda a p a r t e
o amor.
d e n ç ã o , sujeita-se a p a d e c e r as abjeções d o P r e t ó r i o e os t o r m e n t o s do
Calvário; e na hora suprema d a a g o n i a , n ã o satisfeito de tamanhas
p r o v a s , oferece-nos sua d i v i n a M ã e p a r a M ã e dos h o m e n s i n g r a t o s , q u e
o haviam desconhecido, n e g a d o e v i l i p e n d i a d o com b r u t a l e indizível
vilania. Q u e foi t o d o esse d r a m a s u b l i m e senão u m d r a m a d e a m o r ?
Q u e é t o d a a nossa consoladora Religião senão u m p o e m a d e amor?
A q u i está, S e n h o r e s , p o r q u e h á sete a n o s m e n ã o c a n s o d e a p r e -
goar com sincero entusiasmo a benemerência desse h o m e m extraordi-
n á r i o , q u e t ã o alto s o u b e elevar o n o m e p o r t u g u ê s , l e g a n d o todo o seu
copioso m e a l h e i r o p a r a a e d u c a ç ã o d a i n f â n c i a desvalida desta c i d a d e .
D e s c a n s a e m p a z , filho q u e r i d o d a b o a t e r r a p o r t u g u e s a , e b r i l h a
e t e r n a m e n t e n a constelação s i n g u l a r dos eleitos d o S e n h o r ! A tua obra
i m o r r e d o u r a está de p é e, m e r c ê d e D e u s , v i n g a r á n o t e m p o , p o r q u e
a n o b r e r a ç a q u e povoou esta t e r r a b e n d i t a , a q u e l a d e q u e tu próprio
nasceste, e o povo b r a s i l e i r o q u e é seu filho m a i s dileto, t ê m ambos
p o r divisa a C a r i d a d e , a c o m p a i x ã o pelos infelizes.
D e t o d a s estas c r i a t u r a s e d u c a d a s nos p r i n c í p i o s d a h o n r a e da
v i r t u d e , evolar-se-á um b r a d o de r e c o n h e c i m e n t o , a c o r d e e sonoroso,
que a posteridade ouvirá sempre, porque a cadeia mágica dos teus
benefícios n ã o se i n t e r r o m p e r á jamais. De milhares destes corações
h ã o de r o m p e r e m t o d o o t e m p o g r a t í s s i m a s l e m b r a n ç a s e amorosas
referências a o ato genial com q u e a b r i s t e c a m i n h o p a r a a m a i s feliz
das imortalidades, a imortalidade do Bem.
C o m o vedes, é u m a q u e s t ã o d e ritual e eu t e n h o o b r i g a ç ã o de m e
c i n g i r a êle.
de a n t i g a d a t a , e m u m a p a l a v r a , c o n d e n a d o s a r e p e t i r em estilo de
brinde, as m e s m a s frases c o n s a g r a d a s , p a r a a c e n t u a r a i m p o r t â n c i a d e
u m fato q u e n i n g u é m contesta, e o v e r d a d e i r o uso de u m título que
todo o m u n d o s a b e q u a l seja.
E u o creio f i r m e m e n t e .
E n t r e t a n t o , p e r m i t i - m e u m a leve o b s e r v a ç ã o .
H á n o e s p í r i t o científico, S r s . D o u t o r e s , u m a t e n d ê n c i a irresistível
p a r a d e s p i r os fenômenos, o q u e vale dizer, p a r a d e s p i r o m u n d o in-
teiro, q u e é u m g r a n d e f e n ô m e n o coletivo, d a q u e l a r o u p a g e m poética,
em q u e a i m a g i n a ç ã o costuma envolvê-los.
M a s n ã o é lícito r e a g i r c o n t r a essa t e n d ê n c i a , q u e é c a r a c t e r í s t i c a
d o espírito científico, e m cuja frente c a m i n h a m a d e v a s t a ç ã o e a m o r t e .
A q u i está, S r s . D o u t o r e s , o s e g r e d o d o fato q u e l a s t i m a m o s .
92 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
Q u a n d o o h o m e m da ciência a t u a l cessou de a f a g a r m a i s de u m a
ilusão de a n t i g o s t e m p o s ; quando o homem d a ciência atual cessou
de olhar, com os olhos d e p o e t a p a r a m u i t a cousa do céu, e p a r a m u i t a
cousa d a t e r r a , q u a n d o êle j á n ã o se d e m o r a n e m m e s m o , p o r exemplo,
e m c o n t e m p l a r a beleza d a lua, d i a n t e d a q u a l , com seus fulgores e
seus desmaios, sente-se t e n t a d o a d i z e r : deixa-te de coquetices, eu te
conheço, carcassa, e aos r e q u e b r o s e l a n g o r e s d a estrela m a t u t i n a , é
b e m capaz de r e d a r g u i r s i z u d o : n e m t a n t o , c o m o p a r e c e s , pois q u e fi-
cas p r e t a , p e q u e n i n a , insignificante, p a s s a n d o pelo disco do sol; em
uma palavra, quando o homem da ciência a t u a l só pisa e m terreno
firme, e t o d a v i a p o d e viver como diz T y n d a l l , n o meio de idéias, e m
p r e s e n ç a das q u a i s d e s a p a r e c e a fantasia de M i l t o n , o h o m e m d o di-
reito, o h o m e m d a ciência j u r í d i c a p a r e c e q u e n ã o sabe disso...
A despeito d e t o d a s as c o n q u i s t a s d a o b s e r v a ç ã o , a despeito de
todos os d e s m e n t i d o s , q u e a e x p e r i ê n c i a t e m d a d o a velhas hipóteses
e conjecturas fantásticas, p a r a a ciência j u r í d i c a é c o m o se n a d a exis-
tisse.
A í está, S r s . D o u t o r e s , o s e g r e d o do descrédito em q u e c a i u a
c i ê n c i a q u e cultivamos.
N ã o se c r a v a o ferro n o â m a g o d o m a d e i r o com u m a só p a n c a d a
do martelo.
Magnífica expressão!
H á r e a l m e n t e u m Cosmos d o d i r e i t o ; m a s este, n ã o m e n o s do q u e
o Cosmos físico, é u m p r o d u t o d a lei d o fieri, d a lei d o desenvolvi-
m e n t o c o n t í n u o ; e assim como n o m u n d o m a t e r i a l é p r e s u m í v e l q u e
exista a p e n a s u m a p e q u e n a p a r t e , e m q u e a m a t é r i a j á chegou a o seu
estado d e e q u i l í b r i o , assim t a m b é m n o Cosmos d o d i r e i t o só h á u m a
p a r t e d i m i n u t a , e m q u e as forças se a c h a m e q u i l i b r a d a s , e não têm
m a i s necessidade d e l u t a r .
Convençamo-nos d a n e c e s s i d a d e d e t o m a r o u t r o s c a m i n h o s . Para
isso é m i s t e r estudar, como p a r a isso é m i s t e r ensinar. .. N o v o sis-
t e m a d e estudos, novo sistema d e e n s i n o .
E a q u i , S r s . D o u t o r e s , n ã o posso o b s t a r a i n v a s ã o d a r e m i n i s c ê n -
c i a d o seguinte passus histórico:
l a ç ã o é u m a b o a q u a l i d a d e p o l í t i c a ; m a s e u n ã o posso d i s s i m u l a r : o
p r o j e t o q u e a p r e s e n t e i e q u e se discute, é u m daqueles q u e p a r e c e m
d e a n t e m ã o c o n d e n a d o s à m o r t e p r e m a t u r a , p o r q u e êle t e m p o r f i m
a. r e a l i z a ç ã o d e u m a n o v i d a d e , e n ó s n ã o estamos m u i t o habituados
a a c e i t a r d e b o m g r a d o , s o b r e t u d o n o s d o m í n i o s d a v i d a p ú b l i c a , os
t e n t a m e s d e c a r á t e r novo, q u e envolvem, s e m p r e , u m a ousadia, q u e
i m p o r t a m sempre u m a invasão arriscada no terreno d o desconhecido.
N ã o serei e u q u e m possa n e g a r q u e o p r o j e t o e m discussão está real-
m e n t e n o caso de p r o v o c a r m a i s d e u m a t a q u e , m a i s d e u m a contra-
d i ç ã o , a t é d a p a r t e daqueles q u e n ã o se d e i x a m s o m e n t e levar p o r
i d é i a s p r e c o n c e b i d a s , d a p a r t e dos poucos espíritos, q u e n ã o t r a z e m ,
c o m o d i r i a N a t h a n , o sábio, o s e u s a q u i n h o d e v e r d a d e s feitas e con-
t a d a s , a l é m d a s q u a i s , t u d o o q u e p a s s a é falsa m o e d a , é coisa n u n c a
vista, p a r a d o x a l o u a b s u r d a . D o l a d o desses mesmos, q u e assim n ã o
p e n s a m , o projeto está n o caso de suscitar i m p u g n a ç õ e s ; m a s isto só
p e l a c i r c u n s t â n c i a d e q u e êle, e m m a i s d e u m ponto, revela e t r a i a
inaptidão d a m ã o q u e o elaborou. Nesta única circunstância esgo-
tam-se os motivos razoáveis d a oposição, q u e p o r v e n t u r a êle possa des-
p e r t a r ; c o m o t a m b é m , i m p o r t a dizê-lo, é só p o r este l a d o q u e e u teria
justos receios de e m p e n h a r - m e e m q u a l q u e r luta, n a s u a sustentação,
se comigo n ã o estivessem, c o m o seus co-assinatários, alguns distintos
talentos, q u e m e l h o r d o q u e eu, p o d e r ã o m o s t r a r as v a n t a g e n s p o r êle
oferecidas. N ã o hesito, pois, e m a s s e g u r a r q u e , fazendo-se abstração
d a f o r m a , lacunosa e imperfeita, o projeto e n c e r r a n o seu fundo a sa-
98 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
E p a r a d e m o n s t r a r , S r . P r e s i d e n t e , a u t i l i d a d e d a coisa c o m o p r i -
m e i r o s i g n a t á r i o do projeto, eu n ã o t e n h o necessidade de altear o co-
turno, lançar m ã o da harpa romântico-revolucionária e entoar u m canto
ao belo sexo. N ã o hei m i s t e r de dizer com O l í m p i a de Gouges, u m a
célebre d e c a p i t a d a d e 9 3 : se a m u l h e r t e m o d i r e i t o de s u b i r ao cada-
falso, ela deve t e r i g u a l m e n t e o direito d e s u b i r à t r i b u n a ; o que é
d e certo u m a bonita aspiração, mas não deixa de ser também um
pedido exagerado. E t ã o p o u c o t e n h o necessidade de colocar-me no
p o n t o de vista d o emancipacionismo russo e a m e r i c a n o p a r a reclamar,
e m favor d a s m u l h e r e s , o exercício das funções, q u e elas a i n d a não
podem exercer; para fazer, em seu n o m e , exigências extravagantes,
q u e se c u l m i n a m n a p r e t e n s ã o e x t r e m a , n ã o só de u m a i g u a l d a d e de
direitos como até d e i g u a l d a d e n o t r a j e . Nem tomarei por norma ó
grito de a l a r m a d a s m a i s ilustres r e p r e s e n t a n t e s d o r a d i c a l i s m o femi-
n i n o , as P a u l i n a s Davis, as L u c r é c i a s Mott, Elisabetes S t a n t o n , e n ã o
r a r a s o u t r a s a g i t a d o r a s do t e m p o . N a d a disso é o q u e nós q u e r e m o s .
Já é t e m p o , m e u s senhores, d e i r m o s c o m p r e e n d e n d o q u e o belo
í ç x o em P e r n a m b u c o , b e m como n o Brasil inteiro, t e m d i r e i t o à m a i o r
100 ANTOLOGIA D E FAMOSOS
A o N o r d e s t e , e a o S u l , a l v e j a m os algodoais, e n q u a n t o q u a s e p o r
toda p a r t e os c a n a v i a i s r e v e r d e c e m e entregam ao trabalhador bron-
zeado a matéria p r i m a do açúcar. E , a doia passos d a m e t r ó p o l e , a
t e n a c i d a d e b a n d e i r a n t e p r e s e r v a , c o m u m esforço b e n e d i t i n o , a d e r r o -
cada do ouro verde. M a s olhai a c i m a d e vossas c a b e ç a s e v e r e i s d u a s
g r a n d e s a s a s , c o r t a n d o o c é u , a o TUIDOT àe motores imensos. S ã o eles,
os fíomens-pássaros d o Brasil, m a t e r i a l i z a n d o , n o d i a d e hoje, o s o n h o
do P a d r e visionário, trilhando as estradas etéreas, a p r o x i m a n d o dis-
t â n c i a s a s t r o n ô m i c a s , c o n d u z i n d o , d e s d e a l i n h a e q u i n o c i a l a t é à s fron-
t e i r a s d o h e m i s f é r i o , os h o m e n s e a s c a r t a s , c o m o l a n ç a d e i r a s d o e s p a ç o ,
q u e apertam a i n d a mais os vínculos sagrados d a unidade nacional.
A p i t a m a s f á b r i c a s , a b r e m - s e os p o r t õ e s a u m a m u l t i d ã o compe-
netrada do sentimento d o dever. Bancos, comércios, tribunais, ofici-
n a s povoam-se d e a b e l h a s i n c a n s á v e i s . N ã o faltam, a o p o n t o , j o r n a l i s -
tas, intelectuais, professores — d a cátedra superior à pobre mestra-
-escola — e s t u d a n t e s e a u t o d i d a t a s , e a t é a s c i g a r r a s d a poesia, cada
u m p a g a n d o o seu i m p o s t o a o t e s o u r o d o esforço coletivo.
D i r e i s q u e t o d o s c o r r e m s o b os i m p e r a t i v o s d o g a n h a - p ã o , q u e a
f e b r e d a a m b i ç ã o i n d i v i d u a l a g i t a os s u b t e r r â n e o s d e c a d a alma.
P o r q u e e n t ã o , senhores, d i s s i m u l a r m o s a r a z ã o f u n d a m e n t a l que
nos r e ú n e esta noite?
A h u m a n i d a d e t o d a desliza s o b r e u m solo n a p o l i t a n o , s e g u n d o a
velha imagem.
e n c h e n d o a atmosfera c o m o c l a m o r de r e i v i n d i c a ç õ e s i m p r e v i s t a s OL
longamente sufocadas?
Q u a n d o os q u e b r a m a r e s d a disciplina s u c u m b e m ao peso d a s a r -
m a s , a s á g u a s t r a n s b o r d a m o leito, i n u n d a m as c e r c a n i a s e só o espí-
rito realiza o m i l a g r e , n ã o d e repô-las e n t r e as m e s m a s m a r g e n s —
t a r e f a a c i m a d o h o m e m — m a s d e contê-las e m o u t r a s direções e s o b
outros signos.
A h o r a é de n o v a s c r u z a d a s , as c r u z a d a s do espírito c o n t r a o
m a t e r i a l i s m o d e s t r u i d o r e dissolvente. Se o Brasil j á n ã o é u m vasto
hospital, de q u e falava Miguel P e r e i r a , o q u e êle n ã o p o d e ser é u m
s a n t u á r i o de pessimistas a m a r g o s ou conformistas apáticos, m a s uma
arena de g l a d i a d o r e s tenazes, c o n s t r u i n d o n a luta e n a alegria, que
c o n s e r v a m o corpo e rejuvenescem a alma. O p r o b l e m a é, antes de
t u d o , de o r g a n i z a ç ã o em todos os setores d a nossa v i d a p ú b l i c a , aca-
b a n d o com as i m p r o v i s a ç õ e s a r e t a l h o e com os exclusivismos gregá-
rios, i n d i v i d u a i s ou r e g i o n a i s .
é o céu q u e g a r a n t e séculos d e b o n a n ç a , a o u t r a é a t e r r a d a p r ó p r i a
dignidade humana.
Eis, a í , o g i g a n t e a d o r m e c i d o . Despertai-o p a r a a luta e p a r a a
vida.
Olhai-lhe o c o r p o m a r a v i l h o s o . A c a b e l e i r a é v e r d e , n o deslum-
b r a n t e t o m d a s selvas a m a z ô n i c a s . O dorso está, às vezes, ressequido
pelas soalheiras do N o r d e s t e aflitivo. Os pés a s s e n t a m , i m e n s o s e fir-
mes, s o b r e as á g u a s azuis d a q u e l e rio U r u g u a i , c a n t a d o pelo vate de
Lindóia. Um dos b r a ç o s , com o bíceps retezado, espalma os cinco
dedos s o b r e a c a d e i r a d e g r a n i t o e f e r r o d a t e r r a dos Inconfidentes,
e n q u a n t o o o u t r o m o l h a a p a l m a n a s á g u a s do O c e a n o Atlântico.
H o m e n a g e m à m e m ó r i a do A l m i r a n t e T a m a n -
d a r é . Discurso p r o f e r i d o em 9-12-1941, em no-
m e da M a r i n h a de G u e r r a do B r a s i l .
A esta h o r a da m a n h ã , à b e i r a d o fim d e u m a n o t o r m e n t o s o e
g r a v e , a q u i está o Brasil, com o seu chefe s u p r e m o , os seus h o m e n s
d e G o v e r n o , os seus m a r i n h e i r o s , os seus soldados, os seus c i d a d ã o s ,
p a r a c e l e b r a r ao p é deste m o n u m e n t o , e m frente d o m a r , q u e foi o
palco d a s u a v i d a , a v i d a e a g l ó r i a d o A l m i r a n t e T a m a n d a r é .
M a s , e m v e r d a d e , c o m e m o r a ç õ e s , c o m o esta, t r a n s c e n d e m sempre
os limites d e u m a simples existência h u m a n a , p o r m a i s longa e bene-
mérita que fosse.
T a m a n d a r é é u m dos h e r ó i s brasileiros e, t e n d o a t r a v e s s a d o q u a s e
todo o século X I X , desfruta o p r i v i l é g i o d e q u e as nossas lutas funda-
m e n t a i s , d o fim d a Colônia aos p r i m ó r d i o s da R e p ú b l i c a , estão s i t u a d a s
e n t r e o seu b e r ç o e o seu t ú m u l o .
108 ANTOLOGIA D E FAMOSOS
T a m a n d a r é é, p o r é m , u m dos construtores d a N a ç ã o .
A f o r t u n a d a m e n t e , n ã o estamos, a q u i , a p e n a s p r a t i c a n d o u m r i t o de
r e v e r ê n c i a p l a t ô n i c a a u m dos a r q u i t e t o s d o Brasil, indiferentes à lição
do p r e s e n t e ou com os olhos v e n d a d o s às aflitivas interrogações do
futuro.
O Sr. P r e s i d e n t e — T e m a p a l a v r a o n o b r e Deputado.
E s t á n a m e m ó r i a d a C â m a r a o episódio d o C ó d i g o Civil.
A polêmica, S r . P r e s i d e n t e , a q u e m e estou r e p o r t a n d o , n ã o só
pelo b r i l h a n t i s m o , senão t a m b é m pela s u p e r i o r i d a d e com q u e se des-
dobrou, marca u m a página de o u r o n a h i s t ó r i a intelectual d a nossa
Pátria. Dela, os dois g r a n d e s b a h i a n o s , q u e nela se e n f r e n t a r a m com
t a n t o o r g u l h o p a r a todos n ó s , s a í r a m talvez m a i s a m i g o s q u e nela ha-
viam entrado, um proclamando e reconhecendo no outro aquilo que,
e m u m e o u t r o , a o p i n i ã o c o n s a g r a r a — a m e s t r i a n a ciência do as-
sunto q u e d e b a t e r a m . (Apoiado)
N ã o faz a i n d a dois anos, tive a f o r t u n a d e a c o m p a n h a r à Bahia
o S e n a d o r R u i B a r b o s a , q u e ali i a e m p r o p a g a n d a de s u a candidatura
n o ú l t i m o pleito p r e s i d e n c i a l . C h e g a m o s à noite. E r a cerca de oito
horas, quando o navio atracava. R u i B a r b o s a se d i r i g e ao portaló,
p a r a r e c e b e r as h o m e n a g e n s d a m u l t i d ã o d e l i r a n t e , q u e m a r u l h a v a p o r
t o d a a l i n h a do cais. É q u a n d o , d o seio do povo, p a r a festejar, em
seu n o m e , o excelso b r a s i l e i r o , se descobre a f i g u r a imponente, larga
fronte bronzeada e longas b a r b a s b r a n c a s , do Dr. Carneiro Ribeiro,
que, j á octogenário, f r e m i a d e entusiasmo, p a r a c a n t a r o h i n o d a B a h i a
112 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
E u a g r a d e ç o à g a r b o s a m o c i d a d e da Escola de M e d i c i n a as de-
m o n s t r a ç õ e s de s i m p a t i a e de estima de q u e m e c u m u l a : elas desper-
t a r ã o em m i n h a a l m a novos estímulos, elas a c o r d a r ã o e m m e u espírito
novas e n e r g i a s p a r a levar p o r d i a n t e essa tarefa, q u e eu sinto muito
s u p e r i o r às m i n h a s forças, m a s q u e é, eu vos a s s e g u r o , m u i t o inferior
ao m e u a m o r pelo Brasil.
EPITÁCIO PESSOA
na mocidade (e n ã o s u p o n h a m q u e h á n a s m i n h a s p a l a v r a s u m a sim-
ples f i g u r a de r e t ó r i c a ) , é q u e eu vejo n a m o c i d a d e a p r i n c i p a l , a
m a i s poderosa, a m a i s b r i l h a n t e d e n t r e as forças p r o p u l s o r a s d o pro-
gresso d a N a ç ã o ; é q u e eu ouço b o r b u l h a r n o seu seio o m a i s acen-
d r a d o espírito de d e v o t a m e n t o e de s a c r i f í c i o ; é q u e eu sinto p a l p i t a r
n o seu peito o c o r a ç ã o m e s m o d a p á t r i a , o n d e esta vem b e b e r alento
e v i d a , e h a u r i r , a l a r g o s sorvos, os santos entusiasmos, feitos de a b n e -
g a ç ã o e d e c o r a g e m , q u e , n a s épocas m a i s c u l m i n a n t e s d a nossa his-
t ó r i a , nos t ê m c o n d u z i d o , vitoriosos, às c o n q u i s t a s d a l i b e r d a d e e da
democracia.
Ao p e n e t r a r a q u i , a i n d a o u t r o s e n t i m e n t o m e d o m i n o u , e este m e
n c h e u de d e s v a n e c i m e n t o e de o r g u l h o o de q u e n ã o são s o m e n t e as
lasses c o n s e r v a d o r a s de São Paulo, as pessoas mais representativas
118 ANTOLOGIA DE FAMOSOS
do p r i m e i r o E s t a d o da F e d e r a ç ã o , q u e m e vêm t r a z e r o t e s t e m u n h o do
seu a p o i o ; é t a m b é m a m o c i d a d e da sua culta capital, q u e v e m fazer
justiça ao esforço, ao desinteresse e ao p a t r i o t i s m o com q u e t e n h o p r o -
c u r a d o servir ao m e u p a í s . N e m a m o c i d a d e m e acolheria com estas
manifestações de c o r d i a l i d a d e e de estima, se a l g u m d i a eu houvesse
m e n t i d o aos m e u s deveres d e c i d a d ã o ou fugido às r e s p o n s a b i l i d a d e s do
meu cargo.
H o m e n a g e m à m e m ó r i a de S a d i - C a r n o t , P r e s i -
dente da República F r a n c e s a ; discurso p r o f e r i -
do n a sessão de 26-6-1894, n a C â m a r a dos Depu-
t a d o s de São P a u l o .
"Sr. Presidente:
D i a n t e , senhores, da g r a n d e z a da d o r q u e o p r i m e a gloriosíssima
n a ç ã o , a C â m a r a dos D e p u t a d o s paulistas, q u e veio de u m a revolução
e sintetiza as a s p i r a ç õ e s do p a r t i d o r e p u b l i c a n o , n ã o p o d e permanecer
indiferente. (Apoiado)
— " C i d a d ã o s de u m a d e m o c r a c i a l i v r e ! Se a m a i s v e r d a d e i r a m e n t e
a F r a n ç a , l u t a i , lutai s e m p r e , a despeito de todos os sofrimentos, por
essa c a u s a , q u e d u a s p a l a v r a s r e s u m e m : PÁTRIA E REPÚBLICA".
ARMANDO DE SALLES OLIVEIRA
M e u s senhores,
N o q u a d r o d a v i d a n a c i o n a l , f o r m a d o de vinte e u m a paisagens
diferentes, nós, paulistas, n e m s e m p r e somos j u l g a d o s c o m justiça pelos
q u e nos c o n h e c e m de longe. A nossa fisionomia g r a v e e r e s e r v a d a , a
s e r i e d a d e q u e p o m o s n a e x e c u ç ã o d a m e n o r de nossas tarefas, a h a b i -
tual a u s ê n c i a d o sorriso, a o b s t i n a ç ã o com q u e t e n t a m o s c o n q u i s t a r a
i n d e p e n d ê n c i a i n d i v i d u a l e a a p a r e n t e p r e d o m i n â n c i a dos interesses de
o r d e m m a t e r i a l , n ã o são feitas p a r a d e s p e r t a r u m a a t r a ç ã o i n s t a n t â n e a .
O c a r á t e r p a u l i s t a é como essas casas florentinas, de altas f a c h a d a s de
p e d r a , s o m b r i a s , espessas e fortes, n a s q u a i s u m a ou o u t r a abertura
é p o r acaso t a l h a d a . Para quem as olha com a vista b a i x a , essas
casas p a r e c e m i m p e n e t r á v e i s e r e s p i r a m desconfiança e orgulho. Se,
p o r é m , o olhar sobe, t e m u m a s u r p r e s a : o q u e se via com aparência
de p r i s ã o t e r m i n a n o alto em l a r g a s j a n e l a s , o r n a d a s de colunas es-
g u i a s e h a r m o n i o s a s e de u m p u r o r e n d i l h a d o de p e d r a . Quem e n t r a r
DISCURSOS BRASILEIROS 125
i m p o r ao m u n d o u m a o u t r a o r d e m de civilização. M a s só a v o n t a d e
dos m o r t a i s e a t r a m a d a r a z ã o n ã o b a s t a m p a r a a s s e g u r a r a existên-
cia de u m sistema político. Os resultados, q u e temos d i a n t e dos olhos,
são concludentes e n ã o p o d e m ser sofismados.
E n t r e t a n t o , p o u c a s consciências haverá em q u e n ã o se t e n h a m
r a d i c a d o as noções de s o l i d a r i e d a d e , de c o o p e r a ç ã o e de dever social.
Transformou-se a a n t i g a e espessa m e n t a l i d a d e d o p a t r ã o . O patrão
d e i x o u de c o n s i d e r a r c o m o p r i n c i p a l função do E s t a d o a de a s s e g u r a r
a t r a n q ü i l a posse dos seus privilégios. E s a b e q u e , s e m concessões aos
direitos do t r a b a l h a d o r , o p o d e r e c o n ô m i c o l h e e s c a p a r á d a s m ã o s .
C u m p r e - n o s , p o r é m , n ã o p e r d e r d e vista as r e a l i d a d e s e evitar o
p e r i g o t a n t a s vezes d e n u n c i a d o e a n a l i s a d o p o r publicistas e h o m e n s
128 ANTOLOGIA DE FAMOSOS
Os a d v e r s á r i o s e x t r e m i s t a s d a d e m o c r a c i a , n a i m p o s s i b i l i d a d e de
d o m i n a r pela a ç ã o d i r e t a e fulminante, empregam outra tática. Dão
t e m p o ao t e m p o e e m p r e e n d e m a realização p a c i e n t e e g r a d u a l do seu
objetivo máximo, promovendo através das medidas orçamentárias a
transferência sistemática d a r i q u e z a p r i v a d a p a r a o E s t a d o . As des-
pesas n a c i o n a i s t o m a m p r o p o r ç õ e s i m e n s a s e as m ã o s do E s t a d o alcan-
ç a m c a d a vez m a i s longe. N ã o resistindo à p r e s s ã o das clientelas elei-
t o r a i s , os r e p r e s e n t a n t e s do povo, p r e o c u p a d o s a p e n a s com o próprio
futuro, p r o d i g a l i z a m , sem m e d i r , as g e n e r o s i d a d e s do Estado.
Se se c o n s i d e r a p o r o u t r o l a d o q u e o g o v e r n o moscovita se dispõe
a r e n u n c i a r à o r t o d o x i a de a l g u n s de seus preceitos, n ã o s e r i a de es-
p a n t a r q u e chegasse o d i a em q u e nos e n c o n t r á s s e m o s todos n a m e s m a
estrada. P o r ela c o m e ç a r i a o m u n d o u m a n o v a j o r n a d a , n a q u a l se
c a r r e g a r i a m c o m o m e r o s troféus todos os gloriosos e s t a n d a r t e s de nossa
civilização.
D o r e g i m e político d o Brasil, p o r c u l p a d e S ã o P a u l o , n ã o se d i r á ,
c o m o de outros, q u e pereceu, n ã o pela força dos q u e o a t a c a r a m , m a s
pela f r a q u e z a dos q u e o d e f e n d e r a m . D e São P a u l o n ã o p a r t i r á um
gesto q u e incentive a confusão e a i n s t a b i l i d a d e , m a s a p a l a v r a e a
a ç ã o q u e d e f e n d a m u m r e g i m e como o nosso, e m i n e n t e m e n t e adequado
p a r a p r e s e r v a r a o r d e m social e a i n t e g r i d a d e d a n a ç ã o .
0 r e g i m e p r e s i d e n c i a l é a r o b u s t a a r m a d u r a com q u e defendere-
mos as instituições republicanas. Não a trocaremos por outra, per
mais b r i l h a n t e q u e seja a s u a a p a r ê n c i a . A lição d o q u e se passa
com os povos q u e q u e r e m vencer as suas crises s e m a p e l a r para o
s u p r e m o r e c u r s o de u m a d i t a d u r a d a d i r e i t a , traça-nos o c a m i n h o . Po-
d e r e m o s , se q u i s e r e m , ajustar m e l h o r a c o u r a ç a do sistema p r e s i d e n c i a l
ao c o r p o do Brasil, m a s com o objetivo de lhe d a r u m p o d e r executivo
forte, capaz de a s s e g u r a r a o r d e m p ú b l i c a , de r e p a r a r as finanças e
d e a n i q u i l a r as investidas bolchevistas.
A q u i estão a F o r ç a P ú b l i c a de S ã o P a u l o e as o u t r a s c o r p o r a ç õ e s
e s t a d u a i s , q u e r e s p o n d e m d i r e t a m e n t e pela s e g u r a n ç a d e nossas casas
e pela t r a n q ü i l i d a d e do t r a b a l h o coletivo- S ã o fiéis a m i g o s e servido-
res, e estão i n t e g r a d o s n a e s t i m a d o povo paulista p e l a disciplina e pela
eficácia d e suas u n i d a d e s .
Senhores,
B e m se d e i x a v e r q u e n ã o lhes h a v e m o s p e d i r m a i s do q u e po-
d e m d a r , l e v a n d o d e m a s i a d o longe os seus p r o p ó s i t o s . Servem à di-
fusão d a s idéias, e m b o r a m u i t a s vezes os fatos q u e aí se assentam,
v e n h a m a ficar, c o m o a n d a r do t e m p o e à luz do estudo, nulos, írritos,
nenhuns.
A delegação de q u e m e vejo i n c u m b i d o é h o n r a d a s q u e se n ã o
r e q u e s t a m , e m u i t o m e n o s se r e c u s a m . M a s t o m a r a eu l i v r a r - m e hoje
deste e n c a r g o , de falar a u m a assembléia t ã o i l u m i n a d a , q u e está a
p e d i r - m e a a u t o r i d a d e , q u e m e falece, dos cabelos b r a n c o s .
D e i x a i a i n d a q u e vos d i g a , q u e a A c a d e m i a m e m a n d o u receber-
-vos c o m p r i m o r e s de a m i g o . Ela e m p e n h a o m e l h o r dos seus votos
pela vossa felicidade e pela p r o s p e r i d a d e incessante d a vossa v i d a pro-
fissional, concitando-vos a p r o s s e g u i r s e m descrer das maravilhas da
ciência, e s e m n u n c a arrefecer o primeiro fervor.
P r e p a r a n d o - n o s p a r a o t r a b a l h o , sentiremos, n a p r o m e s s a d e suas
bênçãos, a s alegrias secretas, q u e a f u g e n t a m p o r instantes a s e t e r n a s
tristezas d o nosso destino melancólico, e v i b r a m nos nossos corações
c o m o u m eflúvio celeste.
ALOYSIO DE CASTRO
Se o l h a r p a r a t r á s , de q u a n d o em q u a n d o , é o m e l h o r meio de
caminhar à frente, seja-me concedido, nestas p r i m e i r a s p a l a v r a s , re-
volver-me ao a d m i r á v e l p a s s a d o q u e é a vossa glória e a vossa força,
o fecundo estímulo dos mestres, q u e nos dias do presente perpetuem
luzidamente a fama que herdaram.
P r o v e m o s a g o r a , nesta evocação a R u i B a r b o s a , q u e as p a l a v r a s
d o fim de s u a v i d a n ã o e r a m , q u a l a m a r g a m e n t e supôs, p a l a v r a s de
u m dia, " f o l h a s de á r v o r e m o r t a q u e talvez n ã o v i n g u e m os de a m a -
nhã". É êle q u e vos está a concitar n u m a e x o r t a ç ã o q u e se d i r i a feita
p a r a o m o m e n t o a t u a l : " M ã o s à o b r a de r e c o n c i l i a r m o s a v i d a n a c i o n a l
c o m as instituições nacionais".
DISCURSOS BRASILEIROS 139
N u m p a í s o n d e é t ã o r a r o o s e n t i m e n t o das justas a d m i r a ç õ e s e
o n d e n ã o existe o culto dos g r a n d e s h o m e n s , o n d e se d i r i a q u e a todos
se q u e r nivelar, o p i n t o r de liso e o q u e d e b u x a os p a i n é i s o p i m o s , o
q u e lasca a p e d r a e o q u e l a v r a as estátuas, o q u e g a r a t u j a o abece-
d á r i o e o q u e sobe pelo estilo às formas impecáveis d a beleza s u p r e m a ,
o gesto d a S u a Excelência o P r e s i d e n t e W a s h i n g t o n Luís, c r i a n d o o
M u s e u R u i B a r b o s a , é u m a alta, n o b r e e expressiva lição.
As três r a ç a s q u e a constituem, e tu r e p r e s e n t a s , e se c a s a r a m
n a t r a n q ü i l i d a d e do a b r i g o d o teu p a l i o .
A R e p ú b l i c a de P r u d e n t e , de C a m p o s Sales e de R o d r i g u e s Alves,
o escrúpulo n a Constituição, a mística u n ç ã o pelo p a t r i o t i s m o de todos.
Sê bendito, P a v i l h ã o Brasileiro!
ALCÂNTARA MACHADO
A f i g u r a n ã o se l i m i t a a r e p o u s a r n a esteia d o g r a n i t o : conjuga-se
com ela, c o m o q u e a i n d i c a r a í n t i m a c o n s u b s t a n c i a ç ã o d o h o m e m c o m
os postulados f u n d a m e n t a i s d a h o n r a , do t r a b a l h o e d a c a r i d a d e , em
q u e s e m p r e assentou a sua v i d a i n t e r i o r e a s u a a t i v i d a d e social.
A b o n d a d e i r r a d i a n t e , a s e d u ç ã o envolvente q u e c a p t u r a v a todos
q u a n t o s se lhe a p r o x i m a v a m , e a tal p o n t o q u e se a l g u é m n ã o quisesse
amá-lo p r e c i s a v a fugi-lo, as q u a l i d a d e s de fascinação e d o m í n i o q u e lhe
p e r m i t i r a m vencer a i n é r c i a d a s massas e f o r m a r u m partido que o
a c o m p a n h o u e m todos os c o m b a t e s e (coisa e s t r a n h a p a r a n ó s ! ) sobre-
viveu a t o d a s as d e r r o t a s , os acidentes do i n d i v í d u o n ã o b a s t a m para
explicar u m prestígio que se p r o l o n g a p a r a além das fronteiras da
morte.
S ã o P a u l o n ã o é a p e n a s u m a t e r r a de f a r t u r a e de p r o s p e r i d a d e :
é p a r a todos aqueles q u e t r a b a l h a m conosco pela g r a n d e z a d o B r a s i l ,
u m a t e r r a de h o s p i t a l i d a d e e de j u s t i ç a .
ALCÂNTARA MACHADO
"Soldado da liberdade
. . . não renegaste a bandeira
nas horas de tempestade. .."
Fagundes Varela:
"Basta de humilhações!...
A terra de Cabral está cansada
148 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
U m moço f r a n z i n o , p e q u e n i n o , m o f i n o se a p r o x i m a da tribuna;
e d e s ú b i t o se t r a n s f o r m a n u m g i g a n t e . É R u i B a r b o s a , é o v e r b o do
direito, é o condestável d a l i b e r d a d e , é a voz a u g u s t a do semeador
d a s p a l a v r a s e t e r n a s : " D e b a i x o deste teto d u a s evidências h á q u e nos
consolam, nos d e s i m a g i n a m , e c h e g a m a desconvencer-nos d a m o r t e : a
continuidade da tradição e a continuidade da j u s t i ç a . . . Bolonha, fa-
m o s a o u t r o r a e n t r e as c i d a d e s l e t r a d a s . . . se c h a m a v a p o r a n t o n o m á -
sia, a u m t e m p o , a d o u t a e a livre, a s s o c i a n d o n a s suas a n t i g a s moedas"
à l e g e n d a solene d e seus direitos, " l i b e r t a s " , o foro p o r excelência d e
mestra: "Bononia docet". A São Paulo, indisputàvelmente, lhe cabem
os dois títulos n o m e s m o b r a s ã o : professa a l i b e r d a d e e ensina a jus-
tiça".
D e p o i s de R u i n i n g u é m t e m m a i s o q u e dizer. E a assembléia
se dissolve, enquanto Bittencourt Sampaio entoa acompanhado por
Carlos Gomes, u m a d a s estrofes d o h i n o a c a d ê m i c o , estrofe que vai
de q u e b r a d a e m q u e b r a d a a f i r m a r à nossa t e r r a , a i n d a e s e m p r e , q u e
hoje c o m o m a i s d o q u e o n t e m e m e n o s d o q u e a m a n h ã
A F a c u l d a d e de D i r e i t o de São P a u l o , a q u i r e p r e s e n t a d a p o r mes-
t r e s e discípulos, e m t o d a a s u a p o d e r o s a u n i d a d e de i n s t i t u i ç ã o social,
veio c o m e m o r a r n o m e i o de vós a lei de s u a c r i a ç ã o .
S a u d e m o - l a , a i n d a assim, s u s p e n d e n d o a i n s í g n i a de nossa c a i r e i
r a : d u a s conchas, q u e a justiça enche, p a r a q u e a e s p a d a simbólica
q u e as sustenta se a p r u m e c o m o a consciência e se f i r m e como o dever.
S a u d e m o - l a , a i n d a assim, p o r q u e o direito n ã o se m u t i l a , q u a n d o a lei
seja u m retalho, a justiça n ã o se e s m a g a nos t r i b u n a i s q u e se e s b o r o a m .
S a u d e m o - l a a i n d a a s s i m ; e recordemo-nos de q u e n u m a das cenas de
sua estupenda trilogia, conta Esquilo, pela b o c a de Clitenestra, que
Hefoistos p a r a e n v i a r à m o r a d a das Á t r i d a s a notícia a i n d a fumegante
d o s f u n e r a i s de T r ó i a , ateou, como fora de a n t e m ã o c o m b i n a d o , ateou
sobre o Ida um imenso clarão.
Desse m o n t e a o fronteiro H e r m a i o s , e, p o r s o b r e o m a r , de H e r -
m a i o s ao Atos, de c u m i a d a e m c u m i a d a , enfim, clarões e clarões se
i a m r e p r o d u z i n d o , em veloz c o r r e s p o n d ê n c i a , c o m o se pelo cabeço d a s
m o n t a n h a s m ã o s fantásticas a n d a s s e m a s e m e a r as faíscas l u m i n o s a s d e
u m incêndio. E assim, a luz p r o l o n g a n d o a luz, e s t r a n h a mensagem
lá se foi, l e v a n d o à t e r r a dos helenos a nova triunfal.
É d a s F a c u l d a d e s s u p e r i o r e s q u e sai o o r a d o r p a r a , n a tribuna,
cheia d a m a j e s t a d e de seu talento, d o m e s t i c a r pelo impulso irresistível
de s u a p a l a v r a as i r r e q u i e t a s m u l t i d õ e s , e subjugá-las, envoltas n a s
c a d e i a s sonoras d a eloqüência. É n a s F a c u l d a d e s s u p e r i o r e s q u e o le-
gislador a p r e n d e a c i ê n c i a q u a s e d i v i n a d o refrear, pela coerção do
direito, essa m o v i m e n t a ç ã o incessante e s e m p r e nova d a l i b e r d a d e hu-
mana, presa d e n t r o do o r g a n i s m o social. É nas Faculdades superio-
r e s q u e o m e s t r e sobe a t é às regiões m a i s á r d u a s d a ciência, para
a r r a n c a r o segredo d a s leis q u e g o v e r n a m a n a t u r e z a i n t e i r a e os m u n -
dos s i d e r a i s , como d o m i n a o m a i s sutil dos m o v i m e n t o s d a s células.
É nas Faculdades superiores que palpita a grande alma nacional, a
m o c i d a d e , e m cujos lábios c a n t a m t o d a s as e s p e r a n ç a s , e m cujas espe-
r a n ç a s floresce todo o f u t u r o d a p á t r i a !
esboça, c o n d e n s a n d o e c o n d e n s a n d o , se t r a n s f o r m a em n e b u l o s a . . . e
é assim q u e n a s c e m as estrelas. L e n t a e silenciosa é a coralígena, q u e
p e l a secreção d o calcáreo, vem desde o fundo dos m a r e s até à super-
fície d a s o n d a s , v e m e r g u e n d o , de átomo em átomo, montanhas de
a r r e c i f e s . . . e é assim q u e n a s c e m os continentes.
Antítese de p r o d í g i o s !
A m ã o d e v a s t a d o r a de M a o m é l e v a n t a v a n o oriente u m a muralha
de túmulos, s u p e r p o n d o c a d á v e r e s e cadáveres.
E a Europa... recuou!
A p r o a d a s n a u s p o r t u g u e s a s r a s g a v a os m u r o s de o n d a s q u e o
oceano l e v a n t a r a , superpondo descobrimentos a descobrimentos.
E a Europa... avançou!
0 t u r c o t e n t a v a c e r r a r as p o r t a s d o o r i e n t e à civilização q u e ca-
m i n h a ; e, em t o r n o , c a v a n d o l a r g o s fossos, alagou-os d e s a n g u e .
O p o r t u g u ê s , s o b r e a v a g a , r a s g a o c a m i n h o d o oriente à civiliza-
ção q u e d o i d a o a c o m p a n h a r a ; e q u a s e até ao infinito, a b r i u o sulco
d a s descobertas, e alagou-os de luz.
Ainda a l é m . . . na A m é r i c a . . . a floresta t r a v a a r a m a g e m de
suas f r o n d e s . . . e a c ú p u l a se e n c u r v a ; o vento b a l a n ç a os c o r i m b o s
da l i a n a . . . e os t u r í b u l o s f u m e g a m ; as aves soltam harmonias na
e s p e s s u r a . . . e a l i r a de D a v i r o m p e em acordes d i v i n o s . . . e de pé,
tranqüilo, o olhar mergulhado nos esplendores d o infinito e os pés
e n r e d a d o s n a s serpentes d o e s p i n h e i r o , o m i s s i o n á r i o p l a n t a n a floresta
mais uma árvore: — a cruz!
T u d o isto fizeram os p o r t u g u e s e s .
E m t e r r a , a t r a i ç ã o , a calúnia, a g u e r r a , o e x t e r m í n i o ; no mar,
a o n d a e o c i c l o n e ; n o horizonte, o n a u f r á g i o n a s asas da t e m p e s t a d e ,
a t e m p e s t a d e n a s asas d o d e s c o n h e c i d o !
A t r e v i d o b a n d e i r a , d a e s p a d a e d a idéia, c a d a m a r i n h e i r o e r a u m
patriota, cada patriota u m descobridor; e cada descobridor alargava
os d o m í n i o s d e s u a p á t r i a ; r e c u a v a os limites d o m u n d o ; e s t e n d i a a
r e d e d o c o m é r c i o ; d i s t e n d i a novas a r t é r i a s à c i r c u l a ç ã o d o p e n s a m e n t o
h u m a n o ; dava mundos ao mundo e homens à humanidade, preparando
a s s i m a c o n f r a t e r n i z a ç ã o dos povos, e r a s d e a s p i r a ç ã o s u p r e m a e m q u e
as fronteiras d e todas a s p á t r i a s c a i r i a m às p l a n t a s d a h u m a n i d a d e !
E Portugal declinava.
Depois d e u m r e i s o m b r i o , a s e n i l i d a d e ; e depois d a i m b e c i l i d a d e ,
a l o u c u r a d e u m a a m b i ç ã o cavalheiresca se r e v e z a v a m n a q u e l e trono
t ã o s u b l i m a d o , e d e o n d e o ú l t i m o r e i , a o c a i r , a r r a s t a r i a p a r a a der-
rota e para a escravidão a nacionalidade augusta.
A o d e s a b a r a m o n a r q u i a , m u i t o a n t e s q u e a o r e t i n i r d o alfange
mouro, na jornada d e Alcácer, se r o m p e s s e e m estilhaços o escudo
s e m p r e vitorioso d e Alfonso H e n r i q u e s , a o t e m p o , p o r é m , e m q u e con-
f u s a m e n t e , n a s fronteiras o r i e n t a i s j á se o u v i a r a n g e r n a s p e d r a s d a
a m b i ç ã o a g a r r a d a E s p a n h a , a a l m a i m e n s a d a q u e l e povo d e g i g a n t e s
concluía toda i n t e i r a p a r a u m h o m e m .
t i s m o , e r g u e r u m m o n u m e n t o t ã o l a r g o q u e p u d e s s e conter o c a d á v e r
da grande nação.
P o r t u g u ê s , n ã o p o d i a m a i s ser c o m p r e e n d i d o p o r a q u e l a r a ç a q u e
se c o r r o m p e r a .
P o e t a , a D e j a n i r a d a f a t a l i d a d e p r e g a r a - l h e aos o m b r o s a t ú n i c a
e n s a n g ü e n t a d a d o i n f o r t ú n i o e d a fome, d o desespero e d a m o r t e .
P o r isso r e p u d i a r a m - n o .
P o r t u g a l recusou-lhe f o r t u n a e a m o r , a l i m e n t o e mortalha.
Partiu.
A t r a v e s s a os oceanos a i n d a a s s o m b r a d o s pelos p r o d í g i o s do G a m a ;
a f i n a as c o r d a s d a s u a l i r a ao d i a p a s ã o d a s t e m p e s t a d e s ; c r i a Ada-
160 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
C o m o s u s p e n d e r a q u e l a s e n o r m e s proezas q u e f e r i a m de e s p a n t o
os povos do m u n d o , senão l e v a n t a n d o - a s n a s asas potentes d a epopéia,
DISCURSOS BRASILEIROS 161
Eis p o r q u e as c o n q u i s t a s da í n d i a se i n s c r e v e r a m na História,
m e n o s fundo do q u e n a s p e d r a s g r a n í t i c a s do m o n u m e n t o épico de
Camões.
Maestro!
N ã o posso r e s u m i r , no molde d a p a l a v r a , a o n d a s o n o r a q u e os
aplausos l e v a n t a m d o seio desta m u l t i d ã o , q u e ao teu e n c o n t r o c o r r e ;
n e m sei c o m o d e s d o b r a r essa p ú r p u r a de ovações em q u e se envolve
a realeza d o talento.
Querias a I t á l i a . . . essa I t á l i a o n d e a p a l a v r a t e m as m o d u l a ç õ e s
de u m c a n t o . . . essa Itália q u e até hoje e m p u n h a a r e g ê n c i a n a or-
questra do m u n d o . . . essa Itália que p a r a o artista é o Tabor das
transfigurações.
Rasgou-se o r u m o do futuro.
F a l e c i m e n t o do M a r e c h a l Deodoro — Discurso
p r o n u n c i a d o no S e n a d o F e d e r a l , em 23-8-1892.
C o m p a n h e i r o do g r a n d e brasileiro n o G o v e r n o P r o v i s ó r i o , acom-
panhando-o d e p e r t o d u r a n t e essa fase a c i d e n t a d a da vida nacional,
posso felizmente dizer desta t r i b u n a , d e onde se fala à n a ç ã o , q u e n ã o
lhe faltavam os elevados sentimentos, n e m a l e a l d a d e de c a r á t e r , q u e
c r i a m as e s t a t u r a s dos g r a n d e s p a t r i o t a s .
Acredito q u e o S e n a d o q u e r e r á b e m i n t e r p r e t a r os sentimentos d a
itidão nacional.
COELHO NETO
Meus Senhores:
O m u n d o vai-se t o r n a n d o a c a n h a d o p a r a o ser q u e o h a b i t a . A
t e r r a é t i d a p o r estreita n a superfície e rasa n a espessura p a r a a insa-
ciável a m b i ç ã o do seu e x p l o r a d o r ; os m a r e s entulham-se de n a v e s ; os
r i o s n ã o b a s t a m p a r a a r e g a de l a v o u r a s , p a r a o t r a b a l h o das u s i n a s
e p a r a a sede dos a n i m a i s ; as á r v o r e s são p o u c a s p a r a d a r sombra,
f r u t o e l e n h o ; exigem-se m a i s r e b a n h o s e m a i s t r i g o p a r a os m e r c a d o s
e n a vida, c a d a vez m a i s facilitada com a i n d ú s t r i a , s e m p r e espera e m
inventos e aplicações, q u e m u l t i p l i c a m o t r a b a l h o e a b r e v i a m a ativi-
DISCURSOS BRASILEIROS 169
É r o m p e n d o p o r u m m a r V e r m e l h o de s a n g u e q u e os novos israe-
litas c a m i n h a m p a r a Canaã.
C a i m e sua p r o g ê n i e a b r e m a m a r c h a b r a n d i n d o a r m a s e agitan-
d o fachos i n c e n d i á r i o s , e se d e r r u b a m cidades, se d e v a s t a m florestas
e searas, se a r r a s a m igrejas e m o n u m e n t o s de a r t e se d e p r e d a m , se
c o n s p u r c a m , se p r o f a n a m , c o n t a n t o q u e a v i t ó r i a os ressalve e absolva,
mundificando-os, como u m b a n h o lustrai l a v a as n ó d o a s do c r i m e .
d i z e r : a c u r i o s i d a d e h u m a n a ; c u r i o s i d a d e , seiva da á r v o r e do P a r a í s o ,
seiva com a q u a l fizeste o licor s a g r a d o q u e foi, ao m e s m o t e m p o , o
óleo da t u a l â m p a d a de estudo e o e s t i m u l a n t e do teu gênio altivo.
I a s p o r m a r e s n u n c a d a n t e s n a v e g a d o s em d i r e i t u r a ao sol, q u e
era a t u a t r a m o n t a n a , levando p a r a a r e g i ã o das n u v e n s u m a signa
da t e r r a . A t u a flâmula de a l m i r a n t e elíseo e r a a b a n d e i r a a u r i v e r d e ,
o n d e refulgia o Cruzeiro, como p r e n u n c i o da v i t ó r i a q u e lhe estava
r e s e r v a d a no céu.
A i n d a m e n i n o , q u a n d o os d a t u a i d a d e c o r r i a m pela t e r r a , tu se-
g u i a s o vôo dos p á s s a r o s . Crescestes como Hermes: com asas na
cabeça.
A c u l p a n ã o é tua, c r i a d o r m a r a v i l h o s o , a culpa é de S a t a n , o
E s p í r i t o d o Mal, q u e d e f o r m a e d e n i g r e t o d a s as boas o b r a s .
Teve a m e s m a sorte o p á s s a r o d a f á b u l a :
P a í s do a b s u r d o : f u n d a d o e m m i n a s opulentas, é p o b r e ; emoldu-
r a d o e m o u r o e e m p r a t a como os dias de r a d i o s o sol e as noites d e
DISCURSOS BRASILEIROS 175
Q u e m t i r a r á o Brasil d o t o r p o r e m q u e j a z ?
P a r t i s t e n a m a n h ã d a v i d a , conquistaste a glória, q u e é o a l i m e n t o
dos h e r ó i s , e, ao e n t a r d e c e r , regressas ao p o u s o n a t i v o . Bem-vindo
sejas com os lauréis q u e trazes e m a i s a i n d a com a p r o m e s s a com q u e
nos a c e n a s .
São os h e r ó i s q u e c o n d u z e m os povos. D e s p e r t a os q u e d o r m e m ,
tu q u e vieste dos astros e atravessaste o p ó r t i c o de ouro de o n d e s a e m
as m a d r u g a d a s .
C l a r i d a d e s d e a l v o r a d a a u r e o l a r a m esse n a t a l í c i o . A s nações n ã o
conheciam fato s e m e l h a n t e : uma revolução q u e n ã o tocou nem n a
consciência, n e m n a família, nem na propriedade, nem na vida, que
182 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
Recapitulai u m a u m os a g r a v o s c a r r e g a d o s à conta do r e g i m e
r e p u b l i c a n o , o u d o sistema p r e s i d e n c i a l ; a l u t a geral c o n t r a a l e i ; a
d e p r a v a ç ã o d o senso j u r í d i c o nos ó r g ã o s d a a u t o r i d a d e ; a irresponsa-
b i l i d a d e h a b i t u a l dos agentes d a a d m i n i s t r a ç ã o ; a desnaturação das
DISCURSOS BRASILEIROS 185
Os a d o c i c a d o s emissários d a s e d u ç ã o i m p e r i a l i s t a h ã o d e conven-
cer-se de q u e nascestes v a r o n i l pela n a t u r e z a ; d e q u e a sujeição feminil
i m p o s t a ao vosso t e m p e r a m e n t o vos d e s s e x u a v a , d e q u e , depois de be-
b e r d e s a v i r i l i d a d e n a t a ç a d a federação, f o r j a d a p a r a os continentes
novos pelos T i t ã s anglo-saxônios d a A m é r i c a d o N o r t e (aplausos), não
condescenderei em esposar os casquilhos grisalhos do I m p é r i o desen-
t e r r a d o , e r e c e b e r deles p o r enxoval de b o d a s e s e r v i d ã o d e saias, q u i -
nhoada às províncias na domesticidade dos interesses imperiais.
(Aplausos prolongados)
I m a g i n a i a g o r a a distância a q u e n ã o t e r í a m o s c h e g a d o além, se
a política, a m á política, a política antipolítica, a política dos violentos
e dos incapazes, n ã o nos tivesse o b s t r u í d o pertinazmente o caminho.
Os fatos n ã o estão m o s t r a n d o p o r todos os m o d o s q u e o p a í s n ã o ne-
cessita senão d e ser escutado n a s suas asp ir açõ es d e paz e d e t r a b a l h o ,
e n t e n d i d o nos seus interesses econômicos e sociais, a u x i l i a d o , e m p r o -
veito destes, p o r leis q u e facilitem a administração, promovam a in-
dústria, liberalizem o comércio, beneficiem as relações civis, animem
e fortaleçam a iniciativa p a r t i c u l a r e o espírito de associação. Em
190 ANTOLOGIA D E F A M O S O S
N o p e r í o d o o r g a n i z a d o r , q u e a R e p ú b l i c a atravessa, a B a h i a n ã o
tem s o m e n t e o papel, q u e n a t u r a l m e n t e lhe devia a t r i b u i r o seu valor
relativo e n t r e os outros Estados, a sua i m p o r t â n c i a tradicional. Seu
p r o c e d i m e n t o , sob as novas instituições, constituí-a e m e x e m p l o : exem-
plo n a r e o r g a n i z a ç ã o m u n i c i p a l , e m cuja iniciativa, m e u s ilustres a m i g o s ,
vos pertence parte heróica, fundamental, decisiva; exemplo n o vigor
d a repulsa à invasão d a s deposições, q u e d e i x a r a m n a m ó r p a r t e dos
outros Estados feridas q u a s e i n c u r á v e i s ; exemplo n a a t i v i d a d e d e mo-
v i m e n t o eleitoral, q u e tem sobressaído a q u i p o r u m a e n e r g i a crescente
s e m p r e ; exemplo n a gestação do P a r t i d o Federalista, a m a i s c o m p a c t a ,
a m a i s extensa, a m a i s p o d e r o s a o r g a n i z a ç ã o política q u e a B a h i a já
conheceu, vasta aglomeração dos elementos constitucionais, de quase
todos os elementos políticos aproveitáveis, e m t o r n o d o p r i n c í p i o vito-
rioso n a revolução e a m e a ç a d o hoje s i m u l t a n e a m e n t e pelos dois inimi-
gos d a o r d e m r e p u b l i c a n a : o militarismo e o parlamentarismo. Ora,
a honra desse exemplo está confiada particularmente à representação
da B a h i a , à sua r e p r e s e n t a ç ã o n o Congresso do Estado, à sua repre-
DISCURSOS BRASILEIROS 191
0 p r o g r a m a d o P a r t i d o F e d e r a l i s t a foi n i t i d a m e n t e f o r m u l a d o no
p a c t o d a s u a Constituição. M a s esse p r o g r a m a j á se t r a n s f u n d i u vigo-
r o s a m e n t e d a s s u a s p a l a v r a s nos seus atos, e, h o j e está completo n o seu
procedimento. Se o ominoso m o v i m e n t o de 2 4 d e n o v e m b r o tivesse
p r e p o n d e r a d o , a B a h i a , d a í e m d i a n t e , n ã o seria m a i s q u e u m a p r e s a
desprezível, alternativamente disputada entre os a v e n t u r e i r o s de fora
e os a v e n t u r e i r o s d e casa. A B a h i a , a t e r r a s a g r a d a pelas coragens
h e r ó i c a s e pelos entusiasmos sublimes, viu-se a m e a ç a d a n a sua existên-
cia constitucional pela i m p e r t i n ê n c i a de u m soldado t r a n s v i a d o d a s u a
s e n d a , q u e julgou p o d e r estender p a r a ela a m ã o d e c o n q u i s t a d o r , com
a s e m - c e r i m ô n i a d e u m estroina, c o n f u n d i n d o , nas ruas, u m a senhora
com uma perdida. (Aplausos). Se essa familiaridade odiosa não
fosse c a s t i g a d a , f u l m i n a d a , c o m o foi, pela altivez d a ofendida, facili-
t a n d o o p r i m e i r o passo n a p e r d a d a h o n r a , a h o n r a e s t a r i a p e r d i d a , e,
com a h o n r a , a tranqüilidade, a prosperidade, a conservação mesma
dos interesses e l e m e n t a r e s d a v i d a . D a s m i s é r i a s desse a b i s m o , misé-
r i a s incalculáveis como as da p r o stitu ição , preservou-nos o culto do
p r i n c í p i o federalista, representado nos patriotas, que compõem hoje
esse p a r t i d o , cuja política tem sido a expressão leal do seu nome, e cujos
chefes m e r e c e m a g r a t i d ã o irresgatável d a B a h i a . (Aplausos)
N ã o se t r a t a t a n t o de r e n d e r u m culto de a g r a d e c i m e n t o a um
brasileiro ilustre, q u a n t o de servirmo-nos dele como exemplo, de ser-
virmo-nos dele c o m o e n s i n a m e n t o , pelo seu critério, pela s u a m o d e r a -
ção, pelo seu doce e p r o f u n d o a m o r a esta t e r r a , e, sobretudo, pela
s u a significativa c o l a b o r a ç ã o n a R e p ú b l i c a .
R a r a m e n t e , e m todos os t e m p o s e a t é n a s fases m a i s a g i t a d a s de
vossa v i d a política, a l i n g u a g e m d a oposição, n ã o só jornalística como
parlamentar, m a i s a i n d a a q u e l a d o q u e essa, t e m c h e g a d o a u m t ã o
a g u d o g r a u de aspereza n o a t a q u e dos h o m e n s e n a crítica dos fatos.
N ã o é disto q u e p r e c i s a a R e p ú b l i c a . A R e p ú b l i c a precisa m a s
é d a c e n s u r a q u e a d v e r t e , d a crítica q u e ensina, m a s s e m p r e ao l a d o
do conselho que encaminha e da colaboração q u e au x i l i a a tarefa
comum.
N ã o é assim, p o r é m , e n t r e i n d i v í d u o s do m e s m o credo, do m e s m o
sistema, d a m e s m a d o u t r i n a p o l í t i c a ; pois e m tal caso, o papel d a
oposição, p a r a ser útil, p a r a p r o d u z i r benefícios à N a ç ã o , é a p e n a s o
de p r e v e n i r ou c o r r i g i r e r r o s e j a m a i s o d e a l u i r o r e g i m e , d e i t a r p o r
terra a própria forma governamental.
É o q u e n ã o q u e r e m c o m p r e e n d e r todos aqueles q u e a t i r a m c o n t r a
os governos d a R e p ú b l i c a toda a casta d e d i a t r i b e s , sem se l e m b r a r e m
q u e destarte a u m e n t a m e tendem sempre a aumentar cada vez m a i s
o j á crescido n ú m e r o d e suas dificuldades, a mor parte das quais é
e x a t a m e n t e o r i u n d a desse n e f a n d o sistema de t u d o e n t o r p e c e r e difi-
cultar, m u i d a índole dos nossos d e s o r i e n t a d o s p o l i t i c a n t e s . . .
A E u r o p a c o n t i n u o u cheia d e m o n a r q u i a s , a l g u m a s c a d a vez m a i s
firmes, e a t é novos i m p é r i o s a u t o r i t á r i o s ali m e s m o v i e r a m à luz. . .
DISCURSOS BRASILEIROS 199
F i l h o de c o n s e r v a d o r e m o n a r q u i s t a , m a s u m desses q u e o s a b i a
ser m i s s i o n a n d o a p a z e a l i b e r d a d e , b e m diferente, b e m d i s t a n c i a d o
de tantos outros q u e , a q u i m e s m o neste recinto, faziam a o i m p é r i o a
g u e r r a i m p i e d o s a q u e hoje a l g u n s r e p u b l i c a n o s fazem à República, e
a q u i m e s m o neste r e c i n t o i n j u r i a v a m o I m p e r a d o r , aos b r a d o s descom-
pa s sa d os e i r r i t a n t e s de — César caricato!!! Príncipe nefasto e cons-
piradorü... ou c h e g a v a m a t é a c h i c a n a r a respeito d a legalidade do
dote de suas filhas!... (Prolongados aplausos cobrem as palavras do
orador. . . ) , filho de c o n s e r v a d o r , titular da monarquia, deixa todos
os seus ressentimentos e v e m p ô r a serviço d a R e p ú b l i c a os dotes i n a -
p r e c i á v e i s d e s e u espírito, e x e m p l o igual a o q u e n o s está d a n d o esse
o u t r o p e r e g r i n o talento q u e se c h a m a Joaquim Nabuco.
RUI BARBOSA
ALOYSIO D E CASTRO
JOÃO N E V E S DA FONTOURA
BRASÍLIO MACHADO
OCTÁVIO MANGABEIRA
NILO PEÇANHA
M A N U E L F E R R A Z D E CAMPOS SALLES
Morreu em 1913.
D. ROMUALDO A N T Ô N I O DE SEIXAS