Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1
Beatriz Coimbra Romano. Bacharel em Nutrição pelo Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <biiaromano@gmail.com>.
2
Márcio Henrique Gomes de Méllo. Mestre em Biotecnologia pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Bacharel em Química Industrial pela mesma
instituição. Docente do curso de Nutrição do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <marciomello@claretiano.edu.br>.
3
Fabíola Rainato Gabriel de Melo. Doutora e Mestre em Investigação Biomédica pela Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto (SP).
Bacharel em Nutrição pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Coordenadora e docente do curso de Nutrição no Claretiano – Centro Universitário.
E-mail: <nutricao@claretiano.edu.br>.
4
Erika da Silva Bronzi. Doutora em Ciências Nutricionais pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP), campus Araraquara (SP).
Mestre em Saúde na Comunidade pela Universidade de São Paulo (USP), campus Ribeirão Preto (SP). Licenciada em Biologia pelo Claretiano – Centro
Universitário. Docente do curso de Nutrição do Claretiano – Centro Universitário. E-mail: <esbronzi@yahoo.com.br>.
5
Cyntia Aparecida Montagneri Arevabini. Mestre em Biotecnologia pela Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP). Bacharel em
Nutrição pela Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). Docente do curso de Nutrição do Claretiano – Centro Universitário.
E-mail: <cyntiaarevabini@claretiano.edu.br>.
1. INTRODUÇÃO
No decorrer dos últimos anos, o Brasil atravessou diversas mudanças políticas, econômicas, sociais
e culturais que originaram novas adaptações e transformações no modo de vida da sociedade (BRASIL,
2014). Um dos processos ocasionados por essas mudanças é denominado de transição alimentar e nutri-
cional, derivado da transição demográfica provocada por alterações na pirâmide etária brasileira e pelo
envelhecimento da população. Tal fato pode ser explicado pela redução nos coeficientes de fecundidade
e mortalidade, o que reflete no aumento da expectativa de vida, em razão da melhoria da qualidade de
vida em comparação a outras décadas. Outro processo a ser destacado é o de transição epidemiológica,
caracterizado pela diminuição da prevalência de doenças associadas à desnutrição, à fome, à falta de
saneamento básico e à pobreza. Em contrapartida, devido ao padrão de vida mais industrializado, as
doenças crônicas não transmissíveis foram aparecendo com mais frequência. Com o passar do tempo, a
sociedade urbana modificou sua dieta, em virtude da vasta disponibilidade e do acesso a alimentos ricos
em açúcar, sódio e gordura e pobres em fibras, vitaminas e minerais, elementos que são provenientes de
hortaliças e frutas. Tais modificações contribuíram para o aumento da ocorrência do excesso de peso e,
consequentemente, uma maior frequência de doenças crônicas não transmissíveis, relacionadas à obesi-
dade (BRASIL, 2009).
Com as alterações no comportamento alimentar, o consumo de hortaliças e frutas passou a decli-
nar nos últimos anos, com redução na expressão econômica e social, perdendo mercado para os produtos
industrializados. De acordo com o levantamento de dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar –
PeNSE (2009), realizada com alunos do 9° ano do Ensino Fundamental, com recorte geográfico para o
conjunto dos municípios das capitais e Distrito Federal, foram selecionados os tipos de alimentos que a
maioria dos estudantes consumia regularmente. Como resultado, os alimentos mais mencionados foram
o feijão (62,6%), leite (53,6%) e guloseimas – doces, balas, chocolates, chicletes, bombons ou pirulitos
(50,9%). No que se refere à frequência de consumo de cinco dias ou mais na semana anterior à da pes-
quisa, os dados da PeNSE (2012) apontaram que 69,9% dos escolares consumiram feijão; 43,4%, hor-
taliças; 30,2%, frutas frescas; e 51,5%, leite. Quanto ao consumo de hortaliças, também considerando a
mesma frequência semanal, os escolares da região Centro-Oeste apresentaram o mais elevado percentual
(51,2%). O consumo de guloseimas (doces, balas, chocolates, chicletes, bombons ou pirulitos) em cinco
dias ou mais na semana foi referido por 41,3% dos escolares. Em conjunto com o consumo de biscoitos
salgados (35,1%) e de refrigerantes (33,2%), foram os marcadores de alimentação não saudável mais
referenciados pelos escolares, reafirmando as previsões da PeNSE (2009) acerca do padrão alimentar,
com presença constante de consumo de alimentos não saudáveis por parcela significativa dos estudantes
brasileiros (BRASIL, 2012). De acordo com os estudos de Dias et al. (2005), o consumo de hortaliças é
mais frequente entre adultos e idosos, não havendo diferença significante entre essas médias. O fato de
o maior consumo se destacar nessas faixas etárias pode ser esclarecido pela formação dos hábitos ali-
mentares ao longo dos anos, adotados por gerações em que existia a constante presença de hortaliças nas
refeições, muitas vezes, por estarem acessíveis em suas próprias residências. Outra razão possível seria
a menor influência sofrida pela cultura fast-food, mídia e tecnologias, fatores que atuam diretamente
sobre as escolhas alimentares das crianças e adolescentes atualmente. A conduta alimentar dos adultos
exerce influência fundamental na formação dos hábitos alimentares familiares, vista sua responsabilida-
de na aquisição, no preparo e na oferta de alimentos, processos que influenciam as práticas alimentares
de toda família. Direcionando o olhar para a faixa etária infantil, nota-se que as mudanças nos hábitos
alimentares das crianças estão direcionadas para uma alimentação titulada como “mais saborosa” com
teores acentuados de açúcares e gorduras, apresentando maior densidade energética por porção. Assim,
os alimentos in natura, que são ricos em nutrientes e fibras, foram gradativamente substituídos por ver-
sões mais práticas e processadas dos alimentos industrializados (RODRIGUES; FIATES, 2012). Diante
dessa situação, torna-se necessária a reflexão sobre alternativas, dentro da realidade do país, que esti-
mulem a utilização dos recursos naturais disponíveis para a melhoria dos componentes que fazem parte
da alimentação da humana. Diante da ampla diversidade climática do Brasil e sua extensão territorial
considerável, o país possui condições favoráveis para a produção de uma grande variedade de alimentos,
como frutas, vegetais, legumes, hortaliças, entre outros. Diversas espécies desconhecidas e ainda pouco
exploradas da flora brasileira podem ser uma ferramenta importante para a complementação da alimen-
Ling. Acadêmica, Batatais, v. 7, n. 5, p. 57-66, jul./dez. 2017
60
tação, em virtude dos seus benefícios nutricionais. Nesse contexto, a ampliação do conhecimento sobre
as diversas variedades e hortaliças existentes no território brasileiro pode contribuir com a promoção e
manutenção de saúde da população. Hortaliças que possuem distribuição limitada, e muitas vezes, res-
trita a determinados locais ou regiões, são classificadas, segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento, como hortaliças não convencionais e exercem grande influência na alimentação e na
cultura de populações tradicionais. Essas espécies não estão organizadas em uma cadeia produtiva, dife-
rentemente das outras hortaliças convencionais, como batata, tomate, repolho, alface, entre outras. Essas
hortaliças não despertam o interesse comercial de empresas de sementes, fertilizantes ou agroquímicos,
fazendo com que o acesso sobre forma de cultivo, valor nutricional e utilização na alimentação seja
restrito e não transmitido às demais populações (BRASIL, 2010). Entre a vasta diversidade de espé-
cies encontradas no Brasil, merece destaque a Pereskia aculeata Mill., popularmente conhecida como
ora-pro-nóbis ou por outros nomes populares, como carne-de-pobre, carne-de-negro, lobrobó, lobrodo,
guaiapá, groselha-da-américa, cereja-de-barbados, cipó-santo, mata-velha, trepadeira-limão, espinho-
-preto, jumbeba, espinho-de-santo-antônio e rosa-madeira ou ainda trepadeira-limão (QUEIROZ et al.,
2015). Essa planta pertence à família Cactacea, uma das únicas com folhas desenvolvidas. É originária
das Américas, sendo nativa desde a Flórida até o Brasil, pode ser encontrada com mais facilidade no
Brasil em algumas regiões dos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo (BRASIL,
2010). Possui forma arbustiva ou trepadeira, com muitos espinhos, e se caracteriza pela presença de
nítidas folhas suculentas, com flores de cor rosa ou branca e cujos frutos são pequenas bagas amarelas e
insípidas. O nome ora-pro-nóbis deriva do latim, tendo como significando “rogai por nós”. A inspiração
desse nome deve-se a uma história popular local. Como a planta nascia principalmente sobre os muros
de uma igreja católica, enquanto o padre rezava o “rogai por nós” durante as missas, a população se
arriscava a uma penitência para experimentar o sabor da planta. A partir disso, a planta ficou conhecida
como a “hora do ora-pro-nóbis”. O ora-pro-nóbis é muito utilizado como cerca viva, por apresentar
muitos espinhos e é pouco explorada comercialmente, embora o seu plantio seja de fácil adaptação na
maioria dos solos. Quando se desenvolve, a planta pode ser utilizada tanto na forma de proteção quanto
na alimentação (MERGAREJO NETTO, 2014).
A planta também possui outras finalidades, como no cultivo para fins de produção de mel pelos
apicultores, por apresentar floração rica em pólen e néctar, que ocorre nos meses de janeiro a abril e
possibilita a utilização na forma ornamental (BRASIL, 2010). Quando as hortaliças não convencionais
são utilizadas, a dieta pode adquirir maior valor nutricional em relação a vitaminas e minerais. Segundo
Kinupp e Barros (2008), as frutas e hortaliças não convencionais apresentam mais vantagens em relação
a plantas domesticadas, pois apresentam teores de minerais e proteínas, além de serem mais ricas em fi-
bras e compostos com funções antioxidantes. Por possuir folhas suculentas e comestíveis, essa hortaliça
pode ser utilizada em diversos modos de preparo, como, por exemplo, inclusão em farinhas, saladas, re-
fogados, tortas e massas alimentícias como o macarrão (ROCHA et al, 2008). Em estudos com amostra
seca de 100 g de ora-pro-nóbis, foi possível encontrar 39,27% (± 0,54) de fibras. Esse resultado indicou
um valor superior ao encontrado por Rocha et al. (2008), que contabilizou apenas 12,64% (± 1,38) de
fibras em uma amostra de 100 g desidratada da planta. Assim como a maioria dos vegetais, o ora-pro-
-nóbis apresenta pequenas quantidades de lipídios, que correspondem a 2,07% (± 0,05) da composição
em base seca. Desse modo, essas hortaliças, com pequenos índices de lipídeos e fontes de fibras, favo-
recem a elaboração de dietas hipocalóricas e hipocolesterolêmicas. Quanto ao teor de macronutrientes,
o ora-pro-nóbis apresentou 24,80% de carboidratos e 20,10% (± 0,93) de teor de proteína em amostra
seca de 100 g. É importante frisar que as proteínas de origem animal apresentam maior valor biológico
em comparação com as de origem vegetal.
Considerando a desigualdade econômica presente no país, alguns grupos populacionais têm aces-
so limitado a alimentos que são fonte de proteína animal, devido à precária situação financeira; sendo
assim, a identificação de espécies vegetais que sejam fontes de proteínas e o incentivo ao cultivo e
consumo dessas espécies podem ser uma forma de contribuir para a redução das deficiências nutricio-
nais dessas populações e colaborar com alternativas nutricionais para populações com hábitos e dietas
alimentares seletivos, como os vegetarianos (MARTINEVSKI et al., 2013).
3. RESULTADOS
Com base nos ingredientes constituintes da bala de ora-pro-nóbis, foi realizado o cálculo de com-
posição nutricional dos alimentos para a elaboração das informações nutricionais do produto finalizado.
As balas apresentaram um aspecto firme e macio, com uma coloração verde-escura (devido à coloração
característica da planta).
Os resultados obtidos revelaram que uma porção de 25 g (5 unidades pequenas) de bala de ora-
-pro-nóbis apresenta um alto valor de proteínas (3%), fibras (5%), ferro (7%), cálcio (6%) e vitamina C
(9%); os percentuais foram calculados com base nos valores de diários de referência para uma dieta de
2 000 kcal (Tabela 1).
Tabela 1. Informação nutricional da bala de ora-pro-nóbis.
Informação Nutricional
Porção de 25 g (5 unidades)
Quantidade por porção % VD (*)
Valor energético 117 kcal e 491 kJ 6%
Carboidratos 26 g 9%
Proteínas 2g 3%
Gorduras totais 0,2 g 0%
Fibra alimentar 1,32 g 5%
Sódio 0,2 mg 0%
Ferro 1 mg 7%
Cálcio 62 mg 6%
Vitamina C 4 mg 9%
Não contém quantidades significativas de gorduras saturadas e gorduras trans.
(*) % Valores diários de referência com base em uma dieta de 2 000 kcal ou 8 400 kJ.
Seus valores diários podem ser maiores ou menores dependendo de suas necessidades
energéticas.
De acordo com os dados apresentados pela tabela nutricional da bala de ora-pro-nóbis, o produto
possui quantidades significativas de macro e micronutrientes que podem aumentar o aporte de nutrientes
das refeições, contribuindo para o alcance das recomendações estabelecidas.
4. DISCUSSÃO
Os problemas de saúde apresentados pela população brasileira ao longo do tempo levaram à re-
flexão sobre a necessidade da criação de programas, medidas e intervenções governamentais que pro-
movessem a melhoria da segurança e a qualidade dos alimentos industrializados. Para isso, era preciso
a normatização dos procedimentos para a fabricação de alimentos e o estabelecimento de padrões de
identidade e qualidade diferentes do que era oferecido. O acesso à informação por meio da rotulagem
dos alimentos atende às exigências da legislação e incentiva o investimento, por parte da indústria, na
melhoria do perfil nutricional da composição do produto, que influencia diretamente a escolha do con-
sumidor quanto à sua aquisição. É importante ressaltar que as informações contidas no rótulo nutricional
devem ser verdadeiras para que essa ferramenta cumpra o seu objetivo de auxiliar os consumidores e
profissionais de saúde em suas escolhas alimentares e sobre quais alimentos irão compor a sua dieta
(FERREIRA; LANFER-MARQUEZ, 2007).
Em relação aos nutrientes presentes no produto, o consumo da bala de ora-pro-nóbis aliado a uma
alimentação saudável podem aumentar as propriedades nutricionais da dieta do indivíduo, ajudando-o a
ter acesso a nutrientes essenciais. A recomendação diária de proteínas estimada pela IOM, 2002/2005 é
Ling. Acadêmica, Batatais, v. 7, n. 5, p. 57-66, jul./dez. 2017
63
de 19,0 g/d para crianças de 4 a 8 anos e de 56,0 g/d para adultos acima de 18 anos. Sendo assim, o con-
sumo de cinco unidades de bala de ora-pro-nóbis aliado a uma alimentação saudável e adequada à faixa
etária contribuem com cerca de 11% das necessidades diárias de proteína para crianças e, em média, 4%
das necessidades diárias para adultos. Segundo Cambraia (1980), o teor proteico do ora-pro-nóbis é de
boa qualidade, apresenta 85% de digestibilidade e elevados teores de aminoácidos essenciais, destacan-
do-se a lisina. Em relação à ingestão de fibras, de acordo com a OMS, a recomendação desse nutriente
é de 20 a 30 g diárias. Desse modo, o consumo de 25 g de bala de ora-pro-nóbis supre essa recomenda-
ção em 5%. Sabe-se que as fibras promovem efeitos fisiológicos benéficos ao organismo, aumentando
a saciedade na ingestão de alimentos, o peso e o volume do bolo fecal e regulando o metabolismo e a
excreção de colesterol (CUPPARI, 2005).
Os minerais desempenham diversos papéis essenciais nos fluidos corporais, como constituição
dos tecidos do organismo, regulação do metabolismo de diversas enzimas e equilíbrio acidobásico, e a
deficiência de um ou mais componentes pode resultar em grandes distúrbios orgânicos, tais como oste-
oporose, bócio e anemia (CUPPARI, 2005). De acordo com os dados obtidos, observou-se que a bala de
ora-pro-nóbis apresentou teores significantes de ferro, cálcio e vitamina C. A respeito do cálcio, o nu-
triente desempenha outras funções importantes além da formação e manutenção dos ossos de dentes. O
cálcio é responsável pela transmissão de íons através das membranas das organelas celulares, liberação
de neurotransmissores nas junções sinápticas, auxilia na função dos hormônios, na liberação ou ativação
de enzimas extra ou intracelulares e também é necessário para a transmissão nervosa e a regulação do
músculo cardíaco (GALLAGHER, 2012). A dose recomendada de ingestão para crianças entre 4 e 8
anos de idade e adultos entre 19 e 70 anos de idade é de 1 000 mg/d; já para adolescentes entre 9 e 13
anos de idade, é maior, chegando a 1 300 mg/d (IOM, 1997). Assim, a bala de ora-pro-nóbis colabora
com cerca de 6% e 5% para o atingimento das recomendações diárias, respectivamente. A vitamina C,
ou ácido ascórbico, está envolvida em diversas reações de transporte de elétrons, inclusive nas relacio-
nadas à síntese de colágeno e carnitina, e outras reações metabólicas. Na síntese de colágeno e de car-
nitina, a vitamina C auxilia a manter o ferro em seu estado ferroso, inviabilizando sua absorção, e atua
como antioxidante. A vitamina C promove resistência à infecção por seu envolvimento com a atividade
imunológica dos leucócitos. A deficiência desse mineral pode levar ao estresse oxidativo nas células,
contribuindo para um aumento do risco de doença isquêmica cardíaca. (GALLAGHER, 2012). A dose
recomendada de ingestão para crianças de 4 a 8 anos é de 25 mg/d e para adultos de 19 a 50 é de 75 mg/d
(IOM, 2000). A ingestão de cinco unidades da bala supre essa recomendação em 16% para crianças e
6% em adultos. Em relação ao ferro constituído na bala, ele se apresenta na forma de ferro não heme,
sendo encontrado principalmente em alimentos de origem vegetal, como o ora-pro-nóbis. De 2% a 10%
do ferro não heme nos vegetais é absorvido; de 10 a 30% do ferro heme e não heme das fontes animais é
tipicamente absorvido. A ingestão adequada de ferro é fundamental para o funcionamento adequado do
sistema imunológico. O excesso ou a falta de ferro resultam em alterações na resposta imunológica. O
ferro é necessário para as bactérias, portanto uma sobrecarga desse mineral (especialmente intravenoso)
pode resultar no aumento de infecções (GALLAGHER, 2012). Considerando que, segundo dados dos
relatórios de 2004 do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) (UNICEF, 2004) e do Ministé-
rio da Saúde (2004), 45% a 50% das crianças brasileiras apresentavam anemia por deficiência de ferro,
o consumo de alimentos que são fontes desse mineral (de origem animal e vegetal) é importante para
prevenir e/ou tratar tal patologia (BRAGA; VITALLE, 2010). A dose diária de ingestão para crianças de
4 a 8 anos é de 10 mg e para adultos de 19 a 70 anos é de 8 mg/d. (IOM, 2001). A bala de ora-pro-nóbis
contribui com cerca de 10% e 12%, respectivamente, para o atingimento dessas recomendações diárias,
de acordo com as faixas etárias para crianças e adultos.
Diante da busca por alternativas que viabilizem os nutrientes necessários à manutenção e à melhora
da qualidade de vida humana, alguns estudiosos realizaram trabalhos sobre a inclusão do ora-pro-nóbis
na elaboração de produtos alimentícios como forma de agregar propriedades nutricionais advindas da
planta. Em estudo de Rocha et al., 2008, foi elaborada uma massa de macarrão tipo talharim adicionada
de ora-pro-nóbis. Os resultados mostraram que a massa apresentou melhores teores de proteínas, fibras
e cinzas que a massa de macarrão convencional em função da adição de 2,0% dessa hortaliça, desidra-
tada. O teor de proteína do macarrão formulado com ora-pro-nóbis (17,21%) é superior ao do macarrão
convencional (16,43%), conforme resultados obtidos em 100 g. Considerando que as duas formulações
Ling. Acadêmica, Batatais, v. 7, n. 5, p. 57-66, jul./dez. 2017
64
foram obtidas a partir de ingredientes adicionados em quantidades iguais, o aumento deve-se à adição do
ora-pro-nóbis à massa. O teor de fibra bruta do macarrão com ora-pro-nóbis aumentou significativamen-
te, apresentando 0,46%, em comparação com 0,21% encontrado em 100 g do macarrão convencional.
Observou-se que o macarrão com ora-pro-nóbis apresentou teores de cinzas significativamente superio-
res aos do macarrão convencional, 5,84% e 2,88% em 100 g, respectivamente, comprovando o estudo
de Silva e Pinto (2006) sobre a caracterização mineral de hortaliças não convencionais, o qual destacou
a presença de teores consideráveis de magnésio, ferro, cálcio e manganês no ora-pro-nóbis. Em estudo
com bolo adicionado de ora-pro-nóbis, foi relacionado o teor de proteína presente nas folhas verdes e
nos bolos preparados com a Pereskia aculeata. Observaram-se resultados significativos em relação ao
teor de proteína encontrado nesses produtos quando comparado com o teor das folhas verdes da planta.
Foram utilizadas quatro amostras – amostra 1: bolo controle; amostra 2: bolo com 50 g de Pereskia
aculeata; amostra 3: bolo com 100 g de Pereskia aculeata os resultados demonstraram que o bolo con-
trole apresentou 2% de proteína, sendo este percentual originado dos ingredientes-bases da formulação
do bolo. O bolo contendo 50 g de Pereskia aculeata apresentou teor de proteína superior (6,2%) ao do
bolo controle (2%), considerando que a formulação foi obtida a partir de ingredientes adicionados em
quantidades iguais, o aumento ocorreu devido à adição de Pereskia aculeata à massa. Enquanto isso,
no bolo contendo 100 g de Pereskia aculeata (11,2%), não houve redução do teor de proteínas quando
comparado com o valor obtido em 100% de folhas verdes (11,17%). Diante dos resultados obtidos,
pode-se concluir que a planta Pereskia aculeata Mill. apresenta um teor de proteína significativo e man-
tém seu teor proteico mesmo em temperatura alta (PAULA, et al., 2016). Outro trabalho, com bolo de
cenoura e quinoa, obteve em torno de 5,2% de proteína, resultado bem inferior ao obtido no estudo com
ora-pro-nóbis (CONSENSO, 2010). A planta também foi testada na elaboração de pães, em um estudo
intitulado “Utilização de bertalha (Andredera cordifolia (Ten.) Steenis) e ora-pro-nóbis (Pereskia acule-
ata Mill.) na elaboração de pães”. O estudo demonstrou que em relação ao teor de proteína, em amostra
seca, a bertalha apresentou 21,66% (± 1,26) e o ora-pro-nóbis, 20,10% (± 0,93). Em amostra seca, a
bertalha apresentou 27,55% (± 0,45) de fibras e o ora-pro-nóbis, 39,27% (± 0,54). Ambos os resultados
foram superiores aos encontrados por Rocha et al (2008), que encontrou 12,64% (± 1,38) de fibras em
amostra desidratada de ora-pro-nóbis. A partir das análises realizadas, constatou-se que bertalha e ora-
-pro-nóbis são boas fontes de proteínas e fibras. Além disso, são viáveis na preparação pães, os quais
possuem bom índice de aceitação global (MARTINEVSKI et al., 2013).
Diante deste estudo, pode-se concluir que a incorporação da planta na elaboração de alimentos
ou a adição dela em alimentos convencionais viabilizam a ingestão de nutrientes essenciais à manuten-
ção da saúde do indivíduo. O consumo desse tipo de produto torna possível o acesso a alimentos com
maior propriedade nutricional em relação aos produtos disponíveis no mercado, de modo a contribuir
para o alcance ou proximidade das recomendações de nutrientes diários estabelecidos que auxiliam na
prevenção de doenças e possíveis carências nutricionais. A desvalorização de hortaliças não convencio-
nais pelo êxodo rural contribui para o aumento do consumo de alimentos industrializados, que levam
ao surgimento de doenças crônicas não transmissíveis. Por isso, deve-se incentivar o resgate cultural
do consumo desse tipo de hortaliça pela população brasileira, por meio do plantio e cultivo, tornando-a
uma alternativa alimentar para populações rurais e urbanas a fim de melhorar a condição nutricional
encontrada.
Sendo assim, é necessário o desenvolvimento de ações, programas e condutas que incentivem o
acesso a essa espécie, evitando sua extinção e preservando seus benefícios nutricionais.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, M. E. F. et al. Caracterização química das hortaliças não convencionais conhecidas como ora-pro-nóbis.
Bioscience Journal, Uberlândia, v. 30, n. 1, supl. 1, p. 431-439, jun. 2014. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.
php/biosciencejournal/article/view/17555/14557>. Acesso em: 17 out. 2015.
BRAGA, J. A. P.; VITALLE, M. S. S. Deficiência de ferro na criança. Revista Brasileira de Hematologia e Hemoterapia,
Rio de Janeiro, v. 32, n. 2, supl. 2, p. 38-44, maio, 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rbhh/v32s2/aop54010.
pdf>. Acesso em: 12 out. 2016.
BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Manual de hortaliças não convencionais. Brasília: MAPA/
ACS, 2010. Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/arq_editor/file/vegetal/Qualidade/Qualidade%20dos%20
Alimentos/manual%20hortali%C3%A7as_WEB_F.pdf>. Acesso em: 12 out. 2015.
______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia alimentar para a
população brasileira. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/
guia_alimentar_populacao_brasileira_2ed.pdf>. Acesso em: 10 out. 2015.
______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Indicadores de Vigilância
Alimentar e Nutricional: Brasil 2006. In: ______. Transição alimentar e nutricional. Brasília: Ministério da Saúde, 2009.
p. 25-46. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/indicadores_vigilancia_alimentar_nutricional.pdf>.
Acesso em: 10 out. 2015.
______. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional
de Saúde do Escolar 2012. Rio de Janeiro: IBGE; 2012. Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/
liv64436.pdf>. Acesso em: 3 nov. 2015.
______. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa
de Orçamentos Familiares 2008–2009: Análise do Consumo Alimentar Pessoal no Brasil. Rio de janeiro: IBGE; 2011.
Disponível em: <http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv50063.pdf>. Acesso em: 3 nov. 2015.
CONSENSO, T. Análise da composição centesimal de produtos preparados com quinoa (Chenopodium quinoa Willd).
2010. 38f. Monografia (Graduação em Farmácia) – Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC), Criciúma. 2010.
Disponível em: <http://www.bib.unesc.net/biblioteca/sumario/000051/00005139.pdf>. Acesso em: 12 out. 2016.
DIAS, A. C. P. et al. Avaliação do consumo de hortaliças não convencionais pelos usuários das unidades do programa saúde
da família (PSF) de Diamantina/MG. Alimentos e Nutrição, Araraquara, v. 16, n. 3, p. 279-284, jul./set. 2005. Disponível em:
<http://serv-bib.fcfar.unesp.br/seer/index.php/alimentos/article/view/481/447>. Acesso em: 12 out. 2015.
FERREIRA, A. B.; LANFER-MARQUEZ, U. M. Legislação brasileira frente à rotulagem nutricional de alimentos. Revista
de Nutrição, Campinas, v. 20, n. 1, p. 83-93, 2007. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/rn/v20n1/a09v20n1.pdf>.
Acesso em: 12 out. 2016.
GALLAGHER, M. L. Os nutrientes e seu metabolismo. In: MAHAN, L. K.; ESCOTT-STUMP, S. K. Alimentos, nutrição e
dietoterapia. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012., p. 33-128.
INSTITUTE OF MEDICINE. Dietary reference intakes for energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein,
and amino acids. Washington, DC: National Academy Press, 2002/2005.
______. Dietary reference intakes for vitamin A, vitamin K, arsenic, boron, chromium, copper, iodine, iron, manganese,
molybdenium, nickel, silicon, vanadium and zinc. Washington, DC: National Academy Press, 2001.
______. Dietary reference intakes for vitamin C, vitamin E, selenium and carotenoids. Washington, DC: National Academy
Press, 2000.
______. Dietary reference intakes for calcium, phosphorus, magnesium, vitamin D and fluoride. Washington, DC: National
Academy Press, 1997.
KINUPP, V. F.; BARROS, I. B. I. Teores de proteína e minerais de espécies nativas, potenciais hortaliças e frutas. Ciência
e Tecnologia de Alimentos, Campinas, v. 28, n. 4, p. 846-857, out./dez. 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/cta/
v28n4/a13v28n4.pdf>. Acesso em: 17 out. 2015.
MARTINEVSKI, C. S. et al. Utilização de bertalha (Andredera cordifolia (Ten.) Steenis) e ora-pro-nóbis (Pereskia aculeata
Mill.) na elaboração de pães. Alimentos e Nutrição, Araraquara, v. 24, n. 3, p. 1-6, jul./set. 2013. Disponível em: <http://serv-
bib.fcfar.unesp.br/seer/index.php/alimentos/article/view/267/2251>. Acesso em: 17 out. 2015.
PAULA, M. C. et al. Processamento de bolo com a planta Pereskia aculeata Mill (ora-pro-nóbis). Revista Brasileira de
Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v. 18, n. 2, p. 167-174, 2016. Disponível em: <http://www.deag.ufcg.edu.br/
rbpa/rev182/rev1827.pdf>. Acesso em: 15 out. 2016.
QUEIROZ, R. A. A et al. Ora-pro-nóbis em uso alimentar humano: percepção sensorial. Revista Verde de Agroecologia e
Desenvolvimento Sustentável, Pombal, v. 10, n. 3, p. 1-5, jul./set. 2015. Disponível em: <http://www.gvaa.com.br/revista/
index.php/RVADS/article/view/3393/pdf-45>. Acesso em: 14 out. 2015.
ROCHA, D. R. C. et al. Macarrão adicionado de ora-pro-nóbis (Pereskia aculeata Miller) desidratado. Alimentos e Nutrição,
Araraquara, v. 19, n. 4, p. 459-465, out./dez. 2008. Disponível em: <http://serv-bib.fcfar.unesp.br/seer/index.php/alimentos/
article/viewFile/656/552>. Acesso em: 14 out. 2015.
RODRIGUES, V. M.; FIATES, G. M. R. Hábitos alimentares e comportamento de consumo infantil: influência da renda
familiar e do hábito de assistir à televisão. Revista de Nutrição, Campinas, v. 25, n. 3, p. 353-362, maio/jun. 2012. Disponível
em: <http://www.scielo.br/pdf/rn/v25n3/05.pdf>. Acesso em: 12 out. 2015.
SILVA, M.C.; PINTO, N. A.V. D. Teores de nutrientes nas folhas de taioba, ora-pro-nóbis, serralha e mostarda coletadas
no município de Diamantina. In: Fundação Educacional Científica e Tecnologia da UFVJA, 8., 2006, Diamantina. Anais...
Diamantina: UFVJA, 2006. p. 124.
UNICEF. Vitamin & mineral deficiency: a global progress report. New York: UNICEF/MI, 2004. Disponível em: <https://
www.unicef.org/media/files/vmd.pdf>. Acesso em: 12 out. 2016.