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10/8/2014 Doença Renal Crônica - Versão para Impressão

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Doença Renal Crônica
Autores:

Luís Sette

Médico Residente da Disciplina de Nefrologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
da USP (HC­FMUSP).

Sílvia Titan

Doutora em Nefrologia, Médica Assistente da Divisão de Nefrologia do Hospital das Clínicas (HC­
FMUSP).

Hugo Abensur

Professor  Livre­docente  da  Disciplina  de  Nefrologia  do  Hospital  das  Clínicas  da  Faculdade  de
Medicina da USP (HC­FMUSP).

INTRODUÇÃO E DEFINIÇÕES
O  termo  insuficiência  renal  crônica  (IRC)  foi  substituído  pelo  termo  doença  renal  crônica
(DRC),  que  designa  tanto  condições  nas  quais  há  perda  insidiosa  da  função  renal,  quanto
condições nas quais há lesão renal com função ainda preservada. Diversas doenças sistêmicas e
primárias renais culminam em agressão lenta do parênquima renal, o qual acaba sendo substituído
por tecido fibroso, lesão esta irreversível. Sua definição é apresentada na Tabela 1.
A  DRC  tornou­se  um  problema  de  Saúde  Pública,  com  um  aumento  significativo  em
prevalência e incidência. Diversos motivos contribuem para isso, sendo particularmente importante
o  aumento  na  prevalência  de  obesidade,  diabetes  melito,  hipertensão  arterial,  tabagismo  e
sedentarismo.
 
Tabela 1: Definição de DRC
Critérios
Lesão renal = 3 meses definida por anormalidades estruturais ou funcionais com ou sem
diminuição no RFG, manifestadas por:
• Anormalidades histopatológicas renais
•  Marcadores  de  lesão  renal,  como  anormalidades  urinárias  (proteinúria);  anormalidades
sanguíneas (síndromes tubulares renais); alterações em exames de imagem (hidronefrose)
OU
2
RFG < 60 mL/min/1,73 m  por = 3 meses
RFG = ritmo de filtração glomerular.
 
Medidas  de  prevenção  primária  e  secundária  são  urgentes  e  alvo  de  estudo  intenso.  Entre
elas,  a  criação  de  uma  classificação  pela  National  Kidney  Foundation  veio  de  encontro  à
necessidade de padronizar a nomenclatura internacional (Tabela 2).
Se  não  tratada,  a  DRC  progride  para  insuficiência  renal  terminal,  acarretando
morbimortalidade elevada, principalmente pelo alto risco cardiovascular, piora da qualidade de vida
e altos custos para o sistema de saúde. Por outro lado, o paciente que necessita de terapia renal
substitutiva (TRS) requer um acompanhamento rigoroso e especializado, de forma que a diálise (ou
transplante) seja iniciada com melhora da qualidade de vida.
 
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Tabela 2: Classificação da DRC
Depuração  da
creatinina Ação  (incluindo  as
Fases Descrição
precedentes)
(mL/min/1,73m2)
>  90  e  fatores  de Rastreamento e redução no risco
  Aumento de risco
risco para DRC de DRC
Diagnóstico  e  tratamento,
Lesão renal* com RFG tratamento  de  comorbidades,
1 > 90
normal ou aumentado redução  na  progressão,  redução
de risco cardiovascular
Redução  discreta  no
2 60 a 89 Estimativa de progressão
RFG
Redução moderada no Avaliação  e  tratamento  das
3 30 a 59
RFG complicações
Redução  grave  no Preparação  para  terapia
4 15 a 29
RFG substitutiva renal
5 Falência renal < 15 (ou diálise) Terapia substitutiva
*  Diagnóstico  por  história  clínica  e/ou  presença  de  hematúria  glomerular  e/ou  proteinúria
(microalbuminúria, proteinúria glomerular ou tubular).
 
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA
Diversas  doenças  podem  causar  DRC  (Tabela  3).  Estas  doenças  podem  ser  classificadas
em:
 
1.        Primárias (glomerulonefrites, doenças císticas renais, doenças tubulointersticiais etc.) ou
Secundárias (DM, HAS, lúpus eritematoso sistêmico, hepatite B, C, HIV etc.).
2.    Localização anatômica: patologias glomerulares, tubulointersticiais, vasculares, obstrutivas
ou tumorais.
3.    Adquiridas ou hereditárias.
 
Entre todas as causas, a nefropatia diabética, a nefropatia hipertensiva, as glomerulonefrites
crônicas e a doença renal policística são as etiologias mais frequentes.
 
Tabela 3: Causas de doença renal crônica
Diabetes melito Nefropatia diabética
Nefropatia  hipertensiva,  nefropatia  isquêmica,  hipertensão  maligna,
Vascular esclerodermia,  síndrome  hemolítico­urêmica  primária  ou  secundária,
toxemia gravídica
Glomerulonefrite  membranosa,  glomerulonefrite
Glomerulonefrites
membranoproliferativa,  nefropatia  de  IgA,  glomeruloesclerose
primárias
segmentar e focal, glomerulopatia fibrilar, pós­GNDA
Nefrite  lúpica,  crioglobulinemia  essencial  ou  secundária,  doença  de
Glomerulonefrites
cadeia leve, doença de cadeia pesada, amiloidose, hepatite B, hepatite
secundárias
C, HIV, esquistossomose
Nefrite  intersticial  crônica  secundária  a  drogas,  pielonefrite  de
Doenças
repetição  e  doença  de  refluxo,  rim  do  mieloma  múltiplo,  tuberculose
tubulointersticiais
renal
Granulomatose de Wegener, poliangeíte microscópica, Churg­Strauss,
Vasculites
vasculite por drogas, poliarterite nodosa, arterite de Takayasu
Doenças  císticas Doença  de  rins  policísticos,  doença  cística  medular  e  outras
hereditárias nefronoftises
Doenças Síndrome  de  Alport,  doença  de  Fabry,  esclerose  tuberosa  e  anemia
hereditárias falciforme
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Tumores Câncer renal, tumor de células transicionais, tumor de Wilms, linfomas
renais
Doenças
Cistinose, oxalose, nefrocalcinose, erros inatos do metabolismo
metabólicas
 
O diagnóstico de DRC requer primeiramente a confirmação da natureza crônica da doença,
descartando­se, portanto, a presença de qualquer componente agudo, potencialmente reversível. A
seguir,  é  fundamental  o  estabelecimento  da  etiologia  da  DRC,  passo  este  comumente
negligenciado.
 
FISIOPATOLOGIA
A  função  primaria  do  rim  em  manter  constante  a  composição  do  meio  extracelular  é  bem
preservada até que haja perda significativa da massa renal. Quando isto acontece, seja por alguma
doença  ou  ablação  cirúrgica,  os  néfrons  remanescentes  apresentam  resposta  fisiológica  de
hipertrofia e hiperfluxo compensatórios. A redução de massa renal é acompanhada não apenas de
aumento  significativo  na  função  dos  néfrons  remanescentes,  mas  também  nos  túbulos,
responsáveis  pelo  ajuste  fino  da  excreção  de  água,  eletrólitos,  ácidos  e  produtos  do  catabolismo
proteico.  O  regime  de  hiperfluxo,  a  princípio  vantajoso,  acarreta  uma  série  de  alterações
patogênicas,  que  podem  resultar  em  glomeruloesclerose,  fibrose  tubulointersticial  e,  portanto,
perda progressiva da função renal.
Essa  lesão  de  natureza  hemodinâmica  é  ainda  hoje  considerada  o  principal  mecanismo
patogênico  nas  nefropatias  crônicas  em  geral.  A  lesão  hemodinâmica  não  atua  unicamente  por
meio  de  lesão  mecânica,  mas  também  por  ativação  contínua  de  uma  série  de  mediadores
inflamatórios.  A  lesão  à  célula  endotelial  é  acompanhada  por  lesão  da  célula  mesangial  e
podocitária,  resultando  em  ativação  de  vias  inflamatórias  e  aumento  na  expressão  de  citocinas,
fatores  de  crescimento,  lesão  por  estresse  oxidativo  e  recrutamento  de  células  inflamatórias.  Em
última  instância,  esse  processo  inflamatório  crônico  resulta  em  glomeruloesclerose  e  fibrose
tubulointersticial (Figura 1).
Há doenças nas quais a lesão hemodinâmica não é a principal forma de agressão. Em muitas
glomerulonefrites,  a  agressão  imunológica  é  predominante,  por  meio  de  vários  mecanismos:
deposição de imunocomplexos, formação destes in situ, ativação de complemento, por agressão de
resposta  imunocelula,  ou  mesmo  por  mecanismos  humorais  não  mediados  por  imunocomplexos.
No  entanto,  uma  vez  iniciado  o  insulto  e  ocorrendo  lesão  significativa  do  parênquima,  a  lesão
hemodinâmica  passa  a  ter  importância  pela  sobrecarga  e  hipertensão  intraglomerular  em  néfrons
remanescentes.
A proteinúria, anteriormente vista apenas como um marcador de nefropatia crônica, tem um
papel importante na fisiopatologia da DRC. Diversos estudos sugerem que a presença contínua de
proteína  em  quantidade  anormal  na  luz  tubular  ativa  as  vias  inflamatórias  peritubulares.  Essa
ativação  resulta  em  fibrose  tubulointersticial.  Assim,  nos  últimos  anos,  a  proteinúria  emergiu  não
apenas como um bom marcador de gravidade da doença, influenciando decisões terapêuticas, mas
também como um parâmetro clínico de resposta a tratamento.
 
Figura 1: Mecanismos patogênicos comuns às diversas causas de DRC.

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ACHADOS CLÍNICOS
A  doença  renal  crônica  se  manifesta  de  forma  insidiosa  e  seus  sinais  e  sintomas  se
apresentam de forma lenta e progressiva, tendo como seu marco final a DRC terminal, que pode se
manifestar  desde  sinais  e  sintomas  inespecíficos  como  náuseas  e  vômitos,  até  emergências
clínicas como edema pulmonar agudo.
Habitualmente,  a  falência  renal  se  apresenta  clinicamente  quando  o  RFG  cai  abaixo  de  30
mL/min/1,73m2,  ou  seja,  nos  estágios  4  e  5  da  DRC.  Nessa  fase,  as  alterações  hematológicas,
endócrinas,  neurológicas,  gastrintestinais,  dermatológicas  e  hidroeletrolíticas  são  mais  evidentes,
como mostra a Tabela 4.
Durante  a  anamnese  e  o  exame  físico,  o  médico  deve  estar  atento  a  sintomas  e  sinais  de
doenças  sistêmicas  possivelmente  envolvidas  na  perda  da  função  renal,  como  diabetes  melito,
hipertensão  arterial,  lúpus  eritematoso  sistêmico  e  outras  doenças  autoimunes,  infecções  virais,
hepatopatias, mieloma múltiplo e outras disproteinemias, entre outros. A avaliação de antecedentes
familiares também é extremamente útil, tanto para doenças poligênicas complexas, como diabetes
melito, hipertensão arterial, litíase e nefrocalcinose, como em doenças monogênicas, como doença
dos  rins  policísticos,  doenças  medulares  císticas  e  síndrome  de  Alport,  doença  de  Fabry,  Dent,
cistinose etc.
Com  a  progressão  do  distúrbio,  surgem  uma  série  de  sinais  e  sintomas  decorrentes  de
edema,  congestão,  alterações  hidroeletrolíticas,  distúrbios  do  equilíbrio  ácido­básico  e  toxicidade
de  produtos  de  catabolismo  proteico  e  lipoproteico,  como  ureia  e  amônia.  Os  sintomas  mais
comuns são fadiga, náuseas (principalmente pela manhã) e vômitos. É bastante comum o paciente
notar  alterações  em  memória,  padrão  de  sono  e  surgimento  de  lentificação.  Em  idosos,  estes
sintomas podem não ser valorizados, atrasando ainda mais o diagnóstico. A perda de peso pode
ser exuberante, obrigando o diagnóstico diferencial com outras síndromes de caquexia.
 
Tabela 4: Sintomas e sinais da DRC
  Sintomas e sinais
Noctúria  (perda  da  capacidade  de  concentração  urinária),  fadiga,
Geral perda  de  apetite,  soluços,  redução  na  massa  muscular,  caquexia,
edema, hipertensão arterial, cãibras
Distúrbios do sono, redução da atenção e de capacidade cognitiva,
Neurológico alterações  de  memória,  lentificação,  mioclonias,  convulsões,
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confusão mental e coma
Periférico Neuropatia sensitivo­motora, síndrome das pernas inquietas
Pericardite,  tamponamento  pericárdico,  miocardiopatia  urêmica,
Cardiovascular
aceleração da ateroesclerose
Pulmonar Pleurite, pneumonite, edema pulmonar, respiração de Kusmaull
Gastrintestinal Náuseas, vômitos, gastrite erosiva, pancreatite, ascite, parotidite
Anemia  por  deficiência  de  eritropoietina,  disfunção  plaquetária,
Hematológico
alteração de função neutrofílica
Hiperparatireoidismo  secundário,  alteração  no  metabolismo  ósseo
Endócrino­ (osteodistrofia  renal),  calcificações  vasculares  em  partes  moles  e
metabólico vasos, impotência e redução de libido, alteração de ciclo menstrual,
hiperprolactinemia, dislipidemias, intolerância à glicose
Dermatológico Hiperpigmentação, prurido, pele seca, pseudoporfiria cutânea
Hiponatremia,  hipercalemia,  hipocalcemia,  hiperfosfatemia,  acidose
Hidroeletrolítico
metabólica
 
Hipertensão
Cerca  de  50  a  70%  dos  pacientes  com  DRC  estágios  3  a  5  são  hipertensos.  O  controle
adequado  da  hipertensão  arterial  sistêmica  (HAS)  é  o  principal  fator  implicado  no  retardo  da
progressão da DRC em suas mais diversas etiologias, além de ser importante em diminuir o dano
causado a outros órgãos­alvo.
A retenção hídrica está mais pronunciada nos estágios 4 e 5 da DRC e uma droga diurética
deve  ser  incluída  no  tratamento  destes  pacientes.  Os  diuréticos  poupadores  de  potássio  e  os
inibidores da ECA devem ser usados com cautela neste grupo de pacientes.
 
Dislipidemia
Pacientes  com  DRC  a  partir  do  estádio  3  apresentam  alterações  no  metabolismo  das
lipoproteínas  e  triglicérides.  É  caracterizado  pelo  acúmulo  de  moléculas  de  VLDL­colesterol
parcialmente  metabolizadas  e  distúrbios  na  metabolização  do  HDL­colesterol,  ocasionando  altos
níveis sanguíneos de triglicérides e baixos de HDL­colesterol.
Assim  como  na  hipertensão,  o  tratamento  da  dislipidemia  pode  ter  benefício  no  retardo  da
progressão  da  DRC.  No  entanto,  não  há  evidências  clínicas  significativas  para  o  emprego  de
medidas  terapêuticas  diferentes  daquelas  utilizadas  nos  pacientes  não  portadores  de  DRC.  Em
breve,  o  estudo  Lipid  lowering  Onset  of  Renal  Disease  (LORD)  será  publicado  para  tentar
responder esta questão.
 
DRC e Risco Cardiovascular
A  DRC  confere  alto  risco  cardiovascular,  sendo  esta  principal  causa  de  óbito  tanto  nos
pacientes  pré­dialíticos  quantos  naqueles  já  em  terapia  renal  substitutiva.  Seja  pela  presença  de
fatores  de  risco  em  comum,  seja  pela  intensificação  da  aterosclerose  depois  do  surgimento  do
estado  urêmico,  esses  pacientes  apresentam  incidência  e  prevalência  elevadas  de  doença
coronariana e de insuficiência cardíaca (Figura 2).
 
Figura 2: Fatores de risco cardiovascular.

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Alterações Hematológicas
A  anemia  da  doença  renal  crônica  é  multifatorial  e  tem  como  fator  mais  importante  a
deficiência na produção de eritropoietina. Tem como característica ser normocítica e normocrômica
com redução da massa eritrocitária. Outros fatores que contribuem para anemia são deficiência de
ferro,  diminuição  do  tempo  de  meia­vida  das  hemácias  ocasionado  por  produtos  urêmicos,
hemólise e perda crônica ocasionados durante o procedimento dialítico, além de perdas insensíveis
no trato gastrintestinal.
O guia prático da National Kidney Fondation’s define anemia em adultos como níveis de Hb <
13,5 g/dL em homens e < 12 g/dL em mulheres. A prevalência dessa alteração varia de acordo com
o estádio em que a DRC se encontra, acometendo cerca de 15% dos pacientes no estádio 3 e 50 a
70% nos estádio 4 e 5. A anemia também é mais prevalente nos pacientes acometidos por DRC de
etiologia diabética macroalbuminúricos.
Relativamente incomum em pacientes nos estágios iniciais da DRC, a prevalência da anemia
aumenta significativamente quando o clearance de creatinina (ClCr ) está abaixo de 60 mL/min e
torna­se mais frequente e severa quando se aproxima de 30 mL/min, geralmente necessitando de
tratamento medicamentoso. Portanto, o screening deve ser iniciado em pacientes com DRC estádio
3.  Os  pacientes  apresentam  sintomas  como  fadiga,  dispneia,  diminuição  da  atividade  intelectual,
depressão, perda de libido, distúrbios do sono, anorexia, entre outros sintomas que levam a uma
perda importante da qualidade de vida.
A  anemia  confere  um  risco  cardiovascular  e  de  morte  importantes  (Figura  3).  A  hipertrofia
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ventricular esquerda está presente em 45% dos pacientes com ClCr < 25 mL/min e é diretamente
associada aos níveis de Hb em pacientes com DRC devido ao efeito compensatório de aumento do
débito  cardíaco.  A  queda  dos  níveis  de  Hb  em  1  g/dL  corresponde  a  um  risco  relativo  de  6%  no
desenvolvimento de hipertrofia ventricular esquerda.
 
Figura 3: Fisiopatologia da insuficiência cardíaca na anemia.

 
Num  estudo  em  aproximadamente  100.000  pacientes  em  hemodiálise,  os  níveis  de
hematócrito (Ht) correlacionaram­se significativamente com mortalidade. Pacientes com Ht entre 27
e  30%  tiveram  um  risco  relativo  de  1,12  (1,08  a  1,17);  pacientes  com  Ht  abaixo  de  27%  tiveram
risco relativo de 1,33 (1,26 a 1,40) e finalmente, pacientes com Ht entre 33 e 36% tiveram risco de
0,96  (0,91  a  1,01).  Locattelli  et  al.,  no  estudo  Dialysis  Outcomes  and  Practice  Patterns  Study
(DOPP,) envolvendo 4.951 pacientes, demonstrou que, para cada 1 g/dL de aumento nos níveis de
Hb,  há  uma  redução  no  risco  relativo  de  morte  em  4%.  Outras  complicações,  além  dos  efeitos
cardiovasculares, podem ser correlacionadas com a anemia, destacando­se a progressão da DRC
e o aumento no risco de bacteriemias.
 
Alterações Osteometabólicas
Apesar de não ser um sintoma inicial da DRC, o espectro de alterações ósseas associados à
DRC, denominado distúrbio mineral ósseo da doença renal crônica (DMO­DRC), também faz parte
de seu quadro clínico. O termo osteodistrofia renal fica reservado para as alterações na histologia
óssea avaliada por biópsia.
A  gênese  da  DMO­DRC  é  multifatorial,  destacando­se:  a  retenção  de  fósforo  e
hiperfosfatemia,  o  déficit  de  vitamina  D  (diminuição  da  produção  de  1,25­(OH)  vitamina  D3),  a
hipocalcemia,  as  alterações  funcionais  nos  receptores  de  cálcio  e  vitamina  D  das  paratireoides,
além da resistência óssea à ação do PTH e, mais recentemente, de outras fosfatoninas (FGF­23).
Outros fatores, como uso de corticoide, desnutrição, idade, intoxicação por alumínio, ferro e outras
toxinas urêmicas, também contribuem para o processo.
O  processo  tem  início  com  a  retenção  de  fósforo  devido  à  incapacidade  de  sua  excreção
ocasionada  pela  queda  no  RFG  (clearance  em  torno  de  60  mL/min).  Associado  a  isso,  há
diminuição da conversão da vitamina D em sua forma ativa pelo rim e consequente hipocalcemia.
Estas alterações iniciais acarretam elevação do paratormônio (PTH), que é o hormônio responsável
pela manutenção da calcemia numa estreita faixa dita fisiológica.
uOs  estados  de  hipocalcemia  e  hiperfosfatemia  crônicos  são  estímulos  para  o
desenvolvimento  de  hiperplasia  das  paratireoides,  que,  por  conseguinte,  diminuem  a  expressão
dos receptores de cálcio e calcitriol, tornando­se a glândula menos responsiva às elevações séricas
do cálcio e desta vitamina. Outros fatores que contribuem para patogênese do hiperparatireoidismo
são a resistência óssea à ação do PTH e a acidose metabólica.
A DMO­DRC pode ser classificada como de alta remodelação, baixa remodelação ou doença
mista.  O  padrão­ouro  para  o  diagnóstico  de  cada  tipo  de  acometimento  ósseo  é  a  biópsia  óssea

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com análise histomorfométrica e marcação com tetraciclina. No entanto, esse método é trabalhoso
e requer laboratório e pessoal habilitado em tais técnicas.
A DMO­DRC manifesta­se por meio de dores ósseas e articulares, miopatia, lesões e roturas
em  ligamentos  e  tendões,  perda  funcional  de  articulações  e,  mais  tardiamente,  risco  de  fraturas
patológicas.  Muitas  vezes,  a  doença  é  oligossintomática  ou  assintomática,  sendo  identificada
apenas  quando  a  agressão  ao  osso  já  é  exuberante.  Quadros  de  deformidades  graves,  como
fácies  leonina,  escolioses  e  cifoses,  alterações  em  caixa  torácica,  deformidades  em  quadril  e
tumores marrons são inaceitáveis atualmente, com a gama de recursos diagnósticos e terapêuticos
já disponíveis.
Além disso, a elevação do produto cálcio­fósforo pode causar calcificações metastáticas em
pele e partes moles, com risco de ulcerações, gangrenas e amputações. Ainda mais importante, a
presença  de  calcificação  metastática  em  vasos  (Figuras  4  e  5)  no  paciente  com  DRC  foi
recentemente associada à maior risco cardiovascular.
A  doença  de  alta  remodelação,  conhecida  como  osteíte  fibrosa,  é  secundária  ao
hiperparatireoidismo secundário. No osso, o PTH gera uma ativação na remodelação óssea e, em
longo prazo, substituição da medula óssea por tecido fibroso (daí o nome osteíte fibrosa – Figura
6).  Este  processo  está  comumente  associado  ao  agravamento  da  anemia  por  aumento  da
resistência à ação da eritropoietina.
A  doença  de  baixa  remodelação  compreende  a  osteomalácia  e  a  doença  adinâmica.  A
primeira  caracteriza­se  por  defeito  na  mineralização  óssea  com  acúmulo  de  osteoide  não
mineralizado,  enquanto  a  segunda  é  caracterizada  por  osteoide  normal,  porém  com  taxa  muito
baixa de remodelação óssea. Estão ambas associadas à intoxicação por alumínio e outros metais
pesados  (ferro,  estrôncio,  cádmio),  hipoparatireoidismo  relativo,  excesso  de  uso  de  calcitriol  e
cálcio, desnutrição, diabetes melito, idade e uso de diálise peritoneal contínua.
 
Figuras  4  e  5:  Calcificações  metastáticas  em  paciente  com  DRC  e  hiperparartireoidismo
secundário.

 
Figura  6:  Biópsia  óssea  em  paciente  com  DRC  e  hiperparatireoidismo  secundário.  Note  o
aumento  no  número  de  osteoclastos  e  osteoblastos,  causando  aumento  na  remodelação
óssea, redução no osso trabecular e formação de fibrose peritrabecular.

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Cortesia da Dra. Vanda Jorgetti – HC­FMUSP.
 
Alterações Endócrinas e Neurológicas
As anormalidades endócrinas na DRC têm patogênese complexa e se dá por diminuição no
clearance renal dos hormônios (p.ex., insulina, glucagon, PTH, calcitonina e prolactina); diminuição
da secreção renal (eritropoietina, renina e 1,25 (OH)2 vitamina D3), redução da atividade de outras
glândulas  (p.ex.,  testosterona,  estrogênio  e  progesterona)  e  alteração  no  tecido  alvo  de  ação
hormonal (p.ex., PTH e eritropoietina).
As alterações dos níveis hormonais são descritas na Tabela 5.
 
Tabela 5: Alterações hormonais
Glândulas Hormônios
Hipotálamo­hipófise GH (?) Prolactina (?)
T4 (? ?) TSH (?)
Tireoide T4L (? ?) T3 (?)
T3r (?) T3L (?)
Testosterona (?) Estrogênio (? ?)
Gônadas LH (? ?) FSH (?)
Progesterona (?)
Pâncreas Insulina (?) Glucagon (?)
Aldosterona (? ?) Cortisol (? ?)
Adrenais
ACTH (? ?) Catecolaminas (? ?)
Eritropoietina (?) Renina (?)
Rins 1,25 (OH)2 vitamina D3 (?)
 
As alterações neurológicas são comumente observadas nos pacientes com DRC. O espectro
destas  alterações  inclui  anormalidades  no  sensório,  disfunção  cognitiva,  fraqueza  generalizada  e
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neuropatia periférica.
A encefalopatia urêmica se refere a sinais e sintomas decorrentes da perda da função renal
que se inicia geralmente quando o RFG está abaixo de 10 mL/min. O paciente apresenta­se com
alteração  de  memória,  retardo  cognitivo,  lentificação  de  fala  e  raciocínio,  além  de  distúrbio  na
percepção e humor. Apesar de vários fatores influenciarem o surgimento da encefalopatia, não há
correlação  entre  o  grau  de  acometimento  do  sistema  nervoso  central  com  nenhum  marcador
bioquímico associado à disfunção renal.
A neuropatia periférica, acomete cerca de 65% dos pacientes com DRC no estágio 5. Podem
variar  desde  alterações  oligossintomáticas  detectadas  por  eletroneuromiografia  até  disfunção
sexual, parestesias e pré­síncope. A neuropatia é distal e simétrica (bota e luva), e está associada
à desmielinização secundária da porção posterior da medula espinhal. O exame físico revela perda
do reflexo tendíneo profundo, além de diminuição de sensibilidade a dor, vibração e pressão.
 
Acidose Metabólica
A acidose metabólica se deve sobretudo à incapacidade renal de excretar íons hidrogênio e
pode  ser  composta  ainda  de  bicarbonatúria  nos  casos  de  doenças  em  que  há  acometimento
intersticial.  O  desenvolvimento  da  acidose  metabólica  agrava  a  hipercalemia,  inibe  o  anabolismo
proteico e acelera a perda óssea de cálcio, acentuando a DMO­DRC.
 
Desnutrição
A  desnutrição  é  frequente  nos  pacientes  com  DRC  e  está  associada  a  aumento  na
mortalidade.  Vários  fatores  influenciam  seu  desenvolvimento,  incluindo  anorexia,  acidose,
resistência  a  insulina,  estado  pró­inflamatório  e  proteinúria.  Os  marcadores  bioquímicos  são
albumina  sérica,  transferrina  e  colesterol.  Nos  estágios  4  e  5  da  DRC,  os  níveis  de  creatinina
podem permanecer estáveis, a despeito da perda progressiva da função renal em decorrência da
diminuição da massa muscular.
 
Alterações Imunológicas
As infecções são a segunda maior causa de óbito nos pacientes com DRC. Há deficiência na
resposta antigênica dos linfócitos T, causada parcialmente pela incapacidade de apresentação dos
antígenos  pelos  monócitos.  A  ativação  neutrofílica  é  deficiente  e,  apesar  dos  níveis  séricos  de
imunoglobulinas serem normais, a resposta vacinal é pobre.
As  manifestações  clínicas  destas  anormalidades  incluem  aumento  da  suscetibilidade  a
infecções bacterianas, aumento do risco de reativação da tuberculose e incapacidade de eliminar
os vírus das hepatites B e C.
 
EXAMES COMPLEMENTARES
Medidas Laboratoriais de Função Renal
A  principal  forma  de  medição  da  função  do  rim  é  a  medida  do  ritmo  de  filtração  glomerular
(RFG).  Obviamente,  medidas  de  avaliação  de  função  tubular,  capacidade  de  concentração  e
acidificação urinárias, metabolismo hormonal etc. também refletem a função do órgão, mas o RFG
consagrou­se como o principal parâmetro clínico e experimental. Uma vez que o RFG não pode ser
medido diretamente, a taxa de depuração de algumas substâncias pode ser usada como estimativa
da filtração glomerular.
O  padrão­ouro  para  medida  do  RFG  até  hoje  é  a  taxa  de  depuração  da  inulina,  mas  sua
realização  é  extremamente trabalhosa e  inviável  na  prática  clínica.  Outros  métodos  de  estimativa
de RFG são precisos (125I­iotalamato, 51Cr­EDTA, iotalamato e iohexol), mas ainda caros e pouco
disponíveis.
Apresenta  boa  correlação  com  a  depuração  de  inulina,  mas  pode  estar  superestimada
quando  a  redução  no  RFG  é  grave  (conforme  há  redução  no  RFG,  a  creatinina  passa  a  ser
secretada  pelos  túbulos).  É  feita  habitualmente  em  coleta  de  24  horas,  outra  fonte  de  erro  por
coleta inadequada e por esvaziamento incompleto da bexiga, principalmente em crianças e idosos.
Diversas equações de estimativa do RFG foram criadas, levando em consideração a variabilidade
no  RFG  determinado  por  sexo,  idade,  peso  e  raça.  As  equações  mais  utilizadas  são  as  de
Cockcroft­Gault  e  do MDRD  (Tabela 6).  Outra  forma  de  estimar  o  RFG  é  fazer  a  média  entre  as
taxas  de  depuração  de  creatinina  e  ureia,  uma  vez  que  a  primeira  superestima  e  a  segunda
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subestima o RFG nas fases mais adiantadas da DRC.
 
Tabela 6: Equações de estimativa do RFG
(140 – kk idade) x peso / 72 x creatinina sérica
Cockroft­Gault
* x 0,85 se sexo feminino
170 x Cr sérica­0,999 x idade­0,176 x SUN#­0,170 x albumina 0,318
MDRD *x 0,762 se sexo feminino
** x 1,18 se raça negra
# SUN = ureia (mg/dL) / 2,14.
 
O  uso  da  creatinina  sérica  como  marcador  isolado  de  função  renal  é  usual  pela  sua
simplicidade,  mas  deve  ser  feito  com  muito  critério.  A  creatinina  sérica  tem  relação  exponencial
com  o  RFG  (Figura  7)  e  seus  valores  apenas  se  alteram  significativamente  quando  a  perda  na
função  do  órgão  já  é  de  aproximadamente  50%.  Além  disso,  a  creatinina  é  produzida
endogenamente  a  partir  de  catabolismo  muscular  e  varia  imensamente  de  acordo  com  a  massa
muscular  (dependente  do  sexo  do  indivíduo,  idade,  grau  de  atividade  física,  estado  nutricional  e
eventual  presença  de  amputações).  Assim,  o  mesmo  valor  de  creatinina  sérica  de  1  mg/dL  pode
refletir um RFG de 120 mL/min num jovem do sexo masculino, como de 40 mL/min numa senhora
de 80 anos desnutrida ou até mesmo um RFG de 10 mL/min num neonato.
Recentemente,  a  medida  da  proteína  de  baixo  peso  molecular  cistatina  C,  sintetizada  em
ritmo constante e catabolizada por filtração glomerular, foi proposta como uma alternativa à medida
de creatinina para a avaliação do RFG. No entanto, o custo mais elevado, a pouca disponibilidade
de sua determinação em rotina, além da necessidade de uma melhor avaliação na prática clínica,
ainda inviabiliza seu uso no lugar da creatinina.
 
Figura 7: Relação entre creatinina sérica e RFG.

 
Exames Complementares Diagnósticos
São exames úteis na avaliação etiológica da DRC:
 
1.        Exame  de  urina:  pode  revelar  a  presença  de  proteinúria,  hematúria  com  ou  sem
dismorfismo  eritrocitário,  leucocitúria,  cilindrúria,  glicosúria,  entre  outras  alterações.  É  de
fundamental  importância  no  decorrer  da  investigação  da  doença  renal  crônica,  podendo
direcionar  a  suspeita  clínica  para  doenças  específicas,  assim  como  o  seguimento  do
tratamento (controle de cura e recidivas).
2.    Proteinúria de 24 horas.

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3.        Microalbuminúria.  Exame  bastante  sensível,  mas  pouco  específico  no  diagnóstico
etiológico  da  DRC,  é  o  marcador  mais  precoce  da  nefropatia  diabética.  Nesta  doença,
deve ser avaliada anualmente. Vale lembrar que é redundante a solicitação de exame de
microalbuminúria  em  pacientes  que  já  apresentem  proteinúria  em  fase  de
macroalbuminúria. Emergiu também como um marcador importante de risco cardiovascular
e mortalidade geral, provavelmente por sinalizar a presença de lesão endotelial difusa.
4.        Fundoscopia.  Exame  simples  que  sugere  o  diagnóstico  nos  casos  de  retinopatias
diabética,  hipertensiva  e  estigmas  de  nefroesclerose  maligna.  É  bastante  útil  no
diagnóstico diferencial de DRC e aguda à beira do leito.
5.     Eletrocardiograma, radiografia torácica e ecodopplercardiograma para avaliação de lesão
em órgãos­alvo (HAS, DM e doenças de depósito, como amiloidose).
6.     Ultrassonografia de rins e vias urinárias, que permite identificar sinais de: (a) cronicidade
(alteração  em  ecogenicidade,  diferenciação  corticomedular  e  tamanho  renal);  (b)
assimetria  renal  (compatível  com  nefropatia  isquêmica,  rim  hipoplásico  ou  pielonefrite
crônica, doença renovascular); (c) aumento no tamanho renal (compatível com nefropatia
diabética,  doença  policística,  infiltração  neoplásica  e  doenças  de  depósito,  como
amiloidose);  e  (d)  presença  de  cistos,  tumores,  malformações,  prostatismo,  obstrução  de
via  urinária  por  cálculos  e  hidronefrose.  É  mandatório  na  investigação  das  mais  diversas
causas de DRC.
7.        Exames  específicos  frente  a  suspeita  de  nefrites  e  vasculites,  como:  eletroforese  de
proteínas séricas, imunoeletroforese de proteínas no sangue e na urina (paraproteinemia),
sorologias  para  hepatite  B,  C  e  HIV,  complemento  sérico,  pesquisa  de  autoanticorpos
(FAN,  ANCA),  pesquisa  de  crioglobulina,  Coombs  direto  e  indireto,  sinais  de
microangiopatia (plaquetopenia, anemia hemolítica, esquizócitos) etc.
8.        Doppler  renal,  angiorressonância  de  artérias  renais,  cintilografia  com  captopril  e
arteriografia, quando houver assimetria renal ou sinais clínicos sugestivos de estenose de
artéria  renal.  Vale  lembrar  que  o  Doppler  só  é  útil  em  mãos  de  radiologista  experiente  e
que  a  angiorressonância  apresenta  um  índice  de  falso­positivo  não  desprezível,  sendo  a
arteriografia renal o padrão­ouro. O Doppler renal também é útil na suspeita de trombose
de veia renal e, mais recentemente, na avaliação de síndrome hepatorrenal.
9.        Uretrocistografia  miccional,  estudo  urodinâmico  e  cintilografia  renal  morfológica,  quando
houver suspeita de refluxo, bexiga neurogênica e pielonefrite crônica.
 
Exames Complementares Úteis na Avaliação de Distúrbios Secundários à DRC
1.        Dosagem  de  sódio  e  potássio,  para avaliar presença  de  hiponatremia e  hipercalemia.  A
primeira pode intensificar a presença de sintomas neuropsiquiátricos, principalmente se em
valores  inferiores  a  125  mEq/L.  A  segunda,  assintomática,  ocorre  tanto  pela  redução  na
excreção do potássio, como por redistribuição entre os compartimentos intra e extracelular
frente  à  acidose  metabólica.  Está  associada  a  risco  de  arritmias  e  parada
cardiorrespiratória.  As  alterações  eletrocardiográficas  que  podem  ser  encontradas  são:
onda T apiculada, redução na amplitude da onda P e alargamento do complexo QRS, até
que este adquira a forma sinusoidal (risco iminente de parada cardíaca, habitualmente em
atividade elétrica sem pulso ou assistolia).
2.        Dosagem  de  cálcio,  fósforo,  vitamina  D  e  PTH.  A  partir  de  60  mL/min/1,73  m2  de  RFG,
alguns  pacientes  já  começam  a  apresentar  distúrbios  no  metabolismo  de  cálcio,  fósforo,
vitamina  D  e  PTH.  Esses  distúrbios  tendem  a  agravar­se  em  fases  mais  avançadas  da
DRC, principalmente na fase pré­dialítica e no período dialítico. Assim, nas fases 3 e 4 da
DRC, estão recomendados monitoração dos valores de cálcio e fósforo, dosagem de 25­
hidroxivitamina D anualmente e dosagem de PTH 1 a 2 vezes por ano (Tabela 7).
 
Tabela 7: Valores esperados de PTH nas diferentes fases da DRC
Fase RFG (mL/min/1,73 m2) PTH intacto (pg/mL)
3 30 a 59 35 a 70
4 15 a 29 70 a 110
5 < 15 ou diálise 150 a 300
 
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3.        Gasometria  venosa  para  verificação  de  acidose  metabólica.  Resultante  da  perda  de
capacidade  de  excreção  de  ácidos  fixos,  causa  náuseas,  perda  de  apetite,
desmineralização óssea e agravamento da hipercalemia e hipercalcemia. A solicitação do
ânion  gap  é  útil  no  diagnóstico  diferencial  com  outros  tipos  de  acidose.  Na  insuficiência
renal, este mostra­se elevado por acúmulo de ânions não medidos (fosfatos, uratos etc.).
4.    Avaliação da anemia secundária à deficiência na produção de eritropoietina e ao aumento
na resistência à ação desse hormônio. Atualmente, sabe­se que, além de trazer um grande
prejuízo na qualidade de vida dos pacientes, a anemia também é frequentemente um fator
de descompensação cardíaca, agravando a miocardiopatia urêmica. Sua avaliação inclui a
monitoração  constante  do  perfil  de  ferro,  bem  como  a  exclusão  de  outras  causas  de
anemia, como deficiência de ácido fólico, anemia falciforme, mieloma múltiplo etc.
 
Tabela 8: Exames importantes no diagnóstico e seguimento da DRC
Seguimento  geral  da
Avaliação etiológica
DRC
Urinálise FAN, anti­DNA, ANCA Sódio e potássio
Sorologia  para PTH,  cálcio,  fósforo  e
Microalbuminúria
hepatites C e B e HIV vitamina D
Pesquisa  de
Fundoscopia Gasometria venosa
crioglobulina
Hemograma,  ferro,
ECG,  radiografia  de  tórax, Eletroforese  de
ferritina  e  saturação  de
ecocardiograma proteínas
transferrina
USG de rins e vias urinárias Complemento sérico Ureia e creatinina
Doppler  renal,  angiorressonância, Pesquisa  de
angiotomografia,  cintilografia, esquizócitos,  
arteriografia haptoglobina e Coombs
Imunoeletroforese  de
Uretrocistografia miccional  
sangue e urina
 
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Como  já  visto,  o  diagnóstico  diferencial  é  feito  com  dados  de  anamnese,  exame  físico  e
poucos exames complementares. A realização de biópsia renal, padrão­ouro para o diagnóstico, só
é feita em suspeitas de glomerulonefrites ou quando a etiologia não está clara.
Uma  doença  que  merece  particular  menção  em  relação  ao  seu  curso  clínico  é  a  nefropatia
diabética.  Líder entre  as causas  de  nefropatia  terminal  em  vários  países,  a nefropatia  diabética  é
antecedida em muitos anos pela presença de hiperfiltração glomerular (que pode ser detectada em
exames  laboratoriais),  alteração  ainda  reversível,  mas  que  anuncia  o  risco  de  instalação  da
nefropatia crônica propriamente dita. Esta, por sua vez, é didaticamente dividida em três fases: a
primeira, denominada nefropatia incipiente, corresponde a uma fase assintomática, na qual se nota
apenas a presença de microalbuminúria, com proteinúria de 24 horas inferior a 300 mg. A segunda,
denominada  nefropatia  clínica  ou  instalada,  cursa  com  proteinúria  de  24  horas  já  superior  a  300
mg/dia  e  perda  progressiva  da  função  renal.  Por  último,  ocorre  a  DRC  terminal,  que  pode  ser
antecedida ou não por síndrome nefrótica franca.
 
Algoritmo 1: Fluxo diagnóstico entre as causas mais comuns de DRC.

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TRATAMENTO
Anteriormente,  a  nefropatia  crônica  era  compreendida  como  uma  doença  inexorável,  sem
nenhuma  possibilidade  de  reversão  ou  estabilização.  No  entanto,  sabe­se  atualmente  que  uma
melhora  significativa  na  sobrevida  e  na  qualidade  de  vida  do  paciente  pode  ser  obtida  com  o
emprego de algumas drogas, controle clínico rigoroso, tratamento de comorbidades, prevenção de
novas  agressões  nefrotóxicas,  identificação  de  causas  potencialmente  tratáveis  e  preparação  do
paciente para diálise e transplante renal em momento oportuno.
Entre as medidas de tratamento e prevenção secundária da DRC (tratamento conservador),
recomenda­se universalmente as descritas a seguir.
 
Controle da Hipertensão Arterial
É a medida nefroprotetora mais importante e eficaz. Atualmente, recomenda­se a redução da
pressão  arterial  a  valores  inferiores  a  130  x  80  mmHg.  Todas  as  classes  de  anti­hipertensivos
podem  ser  utilizadas  na  DRC.  Há  certa  polêmica  em  relação  ao  uso  de  bloqueador  de  canal  de
cálcio di­hidropiridínico, uma vez que essa droga dilata preferencialmente a arteríola aferente, com
risco  potencial  de  aumentar  a  pressão  intraglomerular.  No  entanto,  vale  enfatizar  que  o  mais
importante é o controle rigoroso da pressão arterial.
 
Uso de Drogas Inibidoras da ECA (IECA) e dos Antagonistas do Receptor AT1
(BRA)
Vários  estudos  clínicos  e  experimentais  mostraram  o  papel  nefroprotetor  dessas  drogas  em
nefropatias  crônicas  proteinúricas.  Esse  efeito  não  ocorre  apenas  pela  ação  anti­hipertensiva  das
drogas, mas sim por uma combinação de efeitos sobre a hemodinâmica arteriolar (lembrar que a
atuação  vasodilatadora  dessas  drogas  é  predominante  na  arteríola  eferente,  ocorrendo  queda  na
pressão  capilar  glomerular)  e  sobre  vias  inflamatórias  e  fibrogênicas.  Há  trabalhos  clínicos  que
demonstram  claramente  os  efeitos  benéficos  da  inibição  do  sistema  renina­angiotensina­
aldosterona  (SRAA)  na  nefropatia  diabética  nos  pacientes  com  DM  tipo  1,  tipo  2  e  em  outras
nefropatias proteinúricas.
O  uso  dos  IECA  requer  alguns  cuidados,  como  monitoração  da  concentração  sérica  de
potássio,  pelo  risco  de  hipercalemia,  e  atenção  à  piora  súbita  de  função  renal.  Estes  episódios
podem  ser  precipitados  pelo  uso  de  diuréticos  ou  estados  hipovolêmicos,  mas  também  podem
ocorrer em função do efeito hemodinâmico próprio da droga.
Elevações discretas, em até 30% do valor inicial da função, podem ser tratadas com correção
da  hipovolemia  relativa  (suspensão  de  diurético,  compensação  de  ICC),  mantendo­se  a  droga
inibidora  do  SRAA.  Se  a  piora  de  função  for  mais  exuberante,  o  remédio  deverá  ser  suspenso
temporariamente  e  reiniciado  em  dose  mais  baixa.  Nessa  circunstância,  é  interessante  avaliar  a
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presença de estenose em artérias renais. O uso de IECA e BRA é contraindicado quando houver
estenose  bilateral  de  artérias  renais.  Outros  efeitos  colaterais  comuns  são  tosse  e  angioedema,
principalmente com IECA. Pacientes com intolerância à IECA costumam tolerar bem o uso de BRA.
O  uso  combinado  dessas  duas  classes  de  drogas  vem  sendo  estudado  como  medida
nefroprotetora,  mas  os  estudos  apresentam  resultados  bem  diversos  até  o  momento,  sugerindo
inclusive que a combinação possa ter um efeito deletério sobre a função renal. Novos estudos são
necessários,  principalmente  em  pacientes  com  nefropatia  diabética  e  naqueles  com  perda  de
função  renal  mais  avançada.  Por  ora,  o  uso  sistemático  do  tratamento  combinado  em  DRC  não
está recomendado.
 
Controle Glicêmico Rigoroso em Pacientes Diabéticos
Apesar  de  a  evidência  de  que  controle  glicêmico  melhora  a  sobrevida  renal  na  prevenção
secundária  (pacientes  com  DRC)  ser  muito  menor  do  que  na  prevenção  primária  (pacientes
diabéticos sem DRC), esta medida faz parte da estratégia nefroprotetora. Além disso, é necessária
na prevenção primária e secundária das outras complicações micro e macrovasculares associadas
ao  DM.  O  manuseio  das  drogas  hipoglicemiantes  é  habitual  até  RFG  de  aproximadamente  30
mL/min, quando o risco de hipoglicemias graves aumenta. Nessa situação, é necessário suspender
o  uso  de  biguanidas  e  inibidores  da  alfaglucosidase  e  ajustar  a  dose  de  sulfonilureias,  dando
preferências às drogas de meia­vida mais curta. A insulina é a opção mais segura para pacientes
na fase pré­dialítica imediata e em diálise. O uso de tiazolidinedionas e glinases parece ser seguro
mesmo em pacientes dialíticos, mas ainda não há experiência clínica suficiente com essas drogas.
Os  objetivos  de  controle  glicêmico  são  iguais  aos  desejáveis  para  pacientes  diabéticos  não
portadores de nefropatia crônica.
 
Diagnóstico e Tratamento de Dislipidemias
Ainda  é  polêmica  a  questão  sobre  o  uso  de  estatinas  ser  eficiente  como  estratégia
nefroprotetora. Apesar das recomendações do NCEP não incluírem a insuficiência renal crônica no
grupo de doenças de risco elevado, nas quais está indicada a manutenção do LDL­colesterol em
níveis  inferiores  a  100  mg/dL,  diversos  autores  e  a  National  Kidney  Foundation  sugerem  que  o
paciente renal crônico deve, sim, ser incluído nesse grupo, dado seu risco cardiovascular. O uso de
estatinas  é  seguro  na  DRC  e  recomenda­se  apenas  evitar  a  associação  de  estatinas  e  fibratos,
pelo risco maior de rabdomiólise.
 
Perda de Peso
Medida de grande eficácia, não apenas por melhorar o controle da pressão arterial e do DM,
mas também por reduzir a agressão que a obesidade causa em razão da hiperfiltração glomerular
que impõe.
 
Controle  de  Outros  Fatores  de  Risco  (Sedentarismo,  Tabagismo  e
Hiperuricemia)
A  relação  entre  hiperuricemia  e  progressão  de  nefropatia  crônica  é  polêmica.  De  qualquer
forma,  a  maior  parte  dos  autores  inclui  o  controle  da  hiperuricemia  como  parte  do  tratamento
conservador.
 
Orientação Nutricional
É  recomendada  a  redução  na  ingestão  de  sódio  e,  nas  fases  mais  adiantadas  da  DRC,
restrições de potássio e fósforo. Sabidamente, a redução do aporte de proteínas da dieta reduz a
pressão  intraglomerular  e,  há  muitos  anos,  recomenda­se  o  uso  de  dieta  hipoproteica  para
desacelerar  a  progressão  da  nefropatia  crônica.  Entretanto,  salienta­se  que  tal  medida  deve  ser
usada  com  critério,  levando  em  consideração  o  nível  socioeconômico  dos  pacientes.  Naqueles
pacientes  que  estão  habituados  a  ingerir  proteína  em  quantidade  superior  a  0,8  a  1  mg/kg/dia,  a
restrição  da  ingestão  de  carnes  é  certamente  benéfica,  mas  naqueles  pacientes  que  já  têm  um
aporte baixo de proteína e que comumente tornam­se inapetentes pela própria síndrome urêmica, a
aplicação  de  dieta  hipoproteica  pode  gerar  desnutrição.  Assim,  a  presença  de  uma  equipe
multidisciplinar  é  sempre  aconselhável  e  assegura  uma  melhor  orientação  e  adesão  do  paciente.
Vale lembrar que a desnutrição é conhecidamente um fator de gravidade em pacientes que iniciam
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tratamento substitutivo renal, associada à morbimortalidade muito mais elevada.
 
Tratamento dos Distúrbios de Cálcio, Fósforo, Vitamina D e PTH
A  hipocalcemia  deve  ser  tratada  com  a  reposição  de  cálcio,  habitualmente  feita  com
carbonato ou acetato de cálcio. Em caso de hiperfosforemia, deve­se instituir restrição dietética de
fósfororeduzindo­se alimentos como carne, leite e seus derivados, ovo, refrigerantes, grãos (feijão,
grão  de  bico,  ervilha),  nozes  e  cereais.  Caso  o  fósforo  sérico  mantenha­se  superior  a  5,5  mg/dL,
deve­se iniciar o uso de quelantes. Há três tipos de quelantes atualmente disponíveis (Figura 8): à
base  de  cálcio,  carbonato  e  acetato  de  cálcio;  aqueles  com  alumínio  e  aqueles  sem  cálcio  ou
alumínio (sevelamer ou carbonato de lantano, o último não disponível no Brasil). Os quelantes com
cálcio estão indicados para pacientes que apresentam hipocalcemia concomitante, mas tornam­se
prejudiciais  em  pacientes  hipercalcêmicos  (comum  em  fases  mais  adiantadas  de
hiperparatireoidismo secundário) ou quando usados em doses superiores a 2 g/dia. Os quelantes
com  alumínio  são  eficazes,  mas  não  devem  ser  usados  por  mais  de  15  dias,  dado  o  risco  de
toxicidade óssea. O sevelamer deve ser usado em indivíduos com calcemia elevada ou naqueles
que necessitam de doses muito elevadas de quelantes com cálcio, mas é uma droga de custo mais
elevado e não está indicado em pacientes pré­dialíticos, pelo risco de acidose metabólica.
 
Figura 8: Uso de quelantes de fósforo.

 
Nas  fases  3  e  4  da  DRC,  a  forma  precursora  de  vitamina  D  (25(OH)  vitamina  D)  deve  ser
reposta se insuficiente, habitualmente com ergocalciferol oral ou intramuscular. A elevação de PTH
(valores  dependentes  da  fase  da  DRC  –  Tabela  4)  deve  ser  tratada  com  pulso  (oral  ou
endovenoso)  de  vitamina  D  ativa  (calcitriol  ou  análogos  sintéticos),  desde  que  o  produto  cálcio­
fósforo esteja controlado (a administração de vitamina D aumenta a reabsorção intestinal de cálcio
e  fósforo,  podendo  gerar  valores  proibitivos  de  fosforemia  e  calcemia).  Se  não  houver  resposta
clínica, está indicado o tratamento cirúrgico, com a realização de paratireoidectomia subtotal, total
ou total com autoimplante.
 
Correção da Acidose Metabólica
Apesar  de  necessária  para  evitar  náusea,  hipercalemia  e  desmineralização  óssea,  a
administração  de  bicarbonato  de  sódio  por  via  oral  apresenta  a  desvantagem  de  aumentar  a
ingestão de sódio e a consequente elevação na pressão arterial. Deve­se tentar obter um nível de
bicarbonato  em  torno  de  22  mEq/L.  Para  tal,  pode  ser  administrado  bicarbonato  de  sódio
inicialmente 1 g 4 vezes/dia.
 
Correção dos Distúrbios Hematológicos
Antes  do  início  do  tratamento,  é  de  fundamental  importância  a  exclusão  de  outros  tipos  de
anemia  não  ocasionados  diretamente  pela  deficiência  de  eritropoietina.  Exames  propostos  são
hemograma  com  índices  eritrocitários  (VCM,  HCM  e  CHCM),  contagem  de  reticulócitos,  perfil
férrico (saturação de transferrina, ferritina e ferro sérico), e proteína C reativa. Qualquer indício de
anemia  ferropriva  deve  ser  investigado  criteriosamente.  A  depender  da  suspeita  clínica  e  da
falência  de  resposta  ao  tratamento  inicial  instituído,  deve­se  atentar  para  outras  causas
superpostas  como  deficiência  de  vitaminas  hidrossolúveis,  contagem  diferencial  de  leucócitos,
exclusão  de  hemólise,  presença  de  paraproteínas,  intoxicação  por  alumínio  (causa  rara  com
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advento  de  novos  quelantes  de  fósforo)  e  doença  óssea  de  alto  turnover.  Deve­se  usar  ferro
endovenoso  (preferencial  nas  fases  4  e  5  da  DRC)  ou  via  oral  para  manter  a  saturação  de
transferrina entre 20 e 40% e a ferritina entre 100 e 500.O alvo da hemoglobina é de 11 a 12 g/dL,
como demonstrado no estudo realizado onde alvos mais altos de Hb (13,5) foram relacionados com
aumento  do  risco  cardiovascular  sem  melhora  dos  índices  de  qualidade  de  vida.  Depois  de
corrigida a ferropenia, deve­se iniciar eritropoietina recombinante humana na dose 80 a 100 UI/kg
dividido  em  2  a  3  doses/semana,  preferencialmente  por  via  subcutânea  (ou  120  a  180  UI/kg,  se
administração  endovenosa).  Os  índices  hematimétricos  devem  ser  reavaliados  periodicamente,
com reajuste da dose de eritropoietina e ferro.
Seu mecanismo não está totalmente estabelecido, no entanto, há indícios de que a disfunção
endotelial produzida pela uremia aumente a produção de óxido nítrico, que é um potente inibidor da
função plaquetária. Além disso, os níveis intraplaquetários de serotonina e ADP são reduzidos nos
grânulos  intraplaquetários.  A  hemodiálise  corrige  parcialmente  esta  disfunção  e  o  uso  de
eritropoietina  para  tratamento  da  anemia  talvez  seja  a  medida  mais  efetiva  no  tratamento  da
disfunção  plaquetária,  já  que,  nos  indivíduos  não  anêmicos,  os  eritrócitos  forçam  o  fluxo  de
plaquetas  para  a  periferia  do  vaso,  ou  seja,  radialmente,  de  encontro  à  superfície  endotelial,
aumentando sua adesão e consequente agregação. A desmopressina (DDAVP), forma sintética da
vasopressina,  é  frequentemente  utilizada  no  tratamento  do  sangramento  em  pacientes  urêmicos.
Esta droga leva a uma maior expressão dos multímetros do fator de Von Willebrand aumentando a
adesão  e  a  agregação  das  plaquetas.  A  infusão  de  0,3  mcg/kg  diminui  o  tempo  de  sangramento
durante 4 a 8 horas. Outras medidas podem ser o uso de crioprecipitado e estrogênios conjugados
(premarim 25 mg), que inibem a produção endotelial de óxido nítrico.
Evitar agentes e drogas potencialmente nefrotóxicos, como o uso de exames com contraste
iodado, drogas anti­inflamatórias, antibióticos em doses não ajustadas etc.
Frente  a  uma  piora  súbita  de  função,  deve­se  sempre  afastar  fatores  relacionados  a  um
componente agudo, portanto reversível (Figura 9).
 
Figura 9: Causas de insuficiência renal aguda superajuntada à nefropatia crônica.

 
Encaminhamento  para  o  Nefrologista  e  Preparo  para  a  Terapia  Renal
Substitutiva
O diagnóstico e o acompanhamento das fases iniciais da DRC são feitos habitualmente pelo
clínico  geral,  dada  a  prevalência  da  doença.  Assim,  este  deve  estar  familiarizado  com  a
investigação, o diagnóstico e o manejo clínico desse tipo de paciente. No entanto, nas fases 3 e 4
da DRC, o paciente deve ser encaminhado para avaliação nefrológica. Casos com risco menor de
progressão podem continuar o acompanhamento com o clínico geral, com a utilização eventual de
consultas de referência e contrarreferência. Casos de risco mais elevado para progressão, aqueles
com  glomerulonefrites  e  vasculites,  portadores  de  estenose  de  artéria  renal  e  aqueles  com
depuração de creatinina inferior a 20 mL/min devem ser acompanhados pela especialidade.
A  TRS  é  iniciada  quando  o  RFG  encontra­se  entre  10  e  15  mL/min/1,73  m2  e/ou  quando
surgem sinais e sintomas de uremia. O início da diálise não deve ser feito em caráter de urgência,
mas sim de forma programada, sem prejuízo da qualidade de vida do paciente.
Assim,  todas  as  medidas  do  tratamento  conservador  devem  ser  otimizadas  no  período  pré­
dialítico imediato (controle de pressão arterial, congestão, anemia, produto cálcio­fósforo, PTH) e a
forma e o acesso para a diálise devem ser discutidas com o paciente. A construção da FAV deve
ser  feita  entre  3  e  6  meses  antes  do  início  da  hemodiálise  e  o  cateter  de  Tenckhoff  deve  ser
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passado  entre  3  e  4  semanas  antes  do  início  da  diálise  peritoneal.  Os  pacientes  devem  ser
avaliados e indagados quanto à possibilidade de transplante renal, permitindo a inscrição mesmo já
na fase pré­dialítica (no Brasil, o Ministério da Saúde autoriza a inscrição na lista de transplante a
partir de 20 mL/min de depuração de creatinina).
 
Algoritmo 2. Esquema de medidas terapêuticas do tratamento conservador da DRC.

 
 
TÓPICOS IMPORTANTES
       A evolução desfavorável da doença renal crônica pode frequentemente ser prevenida ou
retardada por meio da detecção e do tratamento precoce. Os estágios precoces da doença
renal crônica podem ser detectados por meio de dosagens laboratoriais simples de rotina.
            O  reconhecimento  da  etiologia  é  fundamental  na  abordagem  terapêutica,  uma  vez  que
muitas causas de nefropatia crônica têm tratamento específico.
            O  sinal  mais  precoce  da  DRC  é  o  surgimento  de  noctúria,  em  função  da  perda  de
capacidade de concentração urinária, intensificada pela presença de edema.
      A principal causa de óbito em pacientes dialíticos é cardiovascular.
      A ação do PTH se faz em dois sítios principais: 1) nos rins: estimulando a alfa­1­hidroxilase
no  túbulo  contorcido  proximal  elevando  a  produção  de  calcitriol  e  consequente  absorção
gastrintestinal deste íon; aumenta a excreção de fósforo e a reabsorção de cálcio iônico; 2)
no tecido ósseo: aumenta o efluxo de cálcio, portanto, aumentando a calcemia.
       As infecções são a segunda maior causa de óbito nos pacientes com DRC. Há deficiência
na  resposta  antigênica  dos  linfócitos  T,  causada  parcialmente  pela  incapacidade  de
apresentação dos antígenos pelos monócitos. A ativação neutrofílica é deficiente e, apesar
dos níveis séricos de imunoglobulinas serem normais, a resposta vacinal é pobre.
            A taxa de depuração de creatinina tornou­se a forma mais usual de estimativa do RFG e

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provou ser a mais prática e custo­efetiva.
            O  uso  dos  IECA  requer  alguns  cuidados,  como  monitoração  da  concentração  sérica  de
potássio,  pelo  risco  de  hipercalemia,  e  atenção  à  piora  súbita  de  função  renal.  Estes
episódios  podem  ser  precipitados  pelo  uso  de  diuréticos  ou  estados  hipovolêmicos,  mas
também podem ocorrer em função do efeito hemodinâmico próprio da droga.
            Pacientes  com  DRC  apresentam  tendência  a  sangramento,  mesmo  com  plaquetas  e
fatores  de  coagulação  em  níveis  normais.  Há  uma  deficiência  na  adesão  e  agregação
plaquetária.
            A preservação da função renal residual é importante mesmo após o início do tratamento
dialítico e confere maior sobrevida aos pacientes anúricos.
            A TRS é iniciada quando o RFG encontra­se entre 10 e 15 mL/min/1,73 m e/ou quando

surgem sinais e sintomas de uremia. O início da diálise não deve ser feito em caráter de
urgência, mas sim de forma programada, sem prejuízo da qualidade de vida do paciente.
 
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4.    http://www.sbn.org.br

http://assinantes.medicinanet.com.br/conteudos/revisoes/2518/imprimir.aspm?codConteudo=2518 19/19

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