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Cidades perdidas
Maria Desidério
Advogada
5 de Novembro de 2019, 8:51
A metrópole é formada pelo conjunto das suas gentes. Indivíduos com características únicas e que
ajudam a colorir os céus cinzentos no inverno e a poluir sonoramente os jardins e os passeios durante o
verão. A beleza e individualidade das diferentes cidades por esse mundo fora reside nas pequenas
diferenças na forma de ser, de falar, de vestir e de levar a vida do cidadão comum. O turismo e o
multiculturalismo — fruto da globalização — são uma mais-valia para países como o nosso, porém não
podemos desviar o olhar da crescente descaracterização das nossas cidades.
Ao caminharmos pelas cidades podemos observar monumentos históricos utilizados para eventos
culturais internacionais, os prédios de interesse nacional transformados em hotéis, os prédios devolutos
tornam-se alojamento local, as tascas são trocadas por “cafés in” e as famílias bairristas são desalojadas
para dar lugar a turistas de todo o mundo.
O jovem que quer viver sozinho tem duas soluções: ou é rico ou trabalha, única e exclusivamente,
para pagar a renda de um chão com quatro paredes e um teto de 60 metros quadrados. Deixando de parte
o paternalismo bacoco de que no antigamente também não dava para muito mais, temos que olhar e
analisar o panorama imobiliário das nossas cidades. Considerando que o ordenado médio em Lisboa se
situa nos 1000 euros, exigir a um jovem — e atenção que estendo este conceito até aos 32 anos —
uma renda de 700 euros é não só caricato como indecente. E a realidade nacional é proporcional aos
exemplos trazidos da capital.
A curiosidade está no legislador que diz defender o direito fundamental à habitação, contudo não
regula da forma correta. Carrega na tributação dos alojamentos locais, mas permite a proliferação desses
mesmos alojamentos como se fossem cogumelos. Reduz o imposto a pagar pelos proprietários que
celebram contratos de arrendamento de longa duração, mas aplica taxas camarárias sem fim. A política do
“toma-lá-dá-cá”, de impostos versus taxas, acaba sempre por conduzir ao mesmo resultado: asfixia do
proprietário, transferida para o arrendatário. Se a rima não fosse tão boa, seria caso para chorar (mas não
pedir por mais).
Despejamos as famílias dos centros das cidades, remetendo-as para a periferia. Não investimos em
redes de transporte funcionais. Percursos de meia hora multiplicam-se em duas. Conduzimos o cidadão
comum para ataques de nervos, depressões constantes e uma coabitação familiar fantasma. Trocamos a
família que vivia alegremente nos bairros históricos das nossas cidades pelo lucro fácil de quem nos vem
visitar.
Esquecemo-nos que a cultura que nos caracteriza depende, em grande medida, do cidadão comum
e das suas mais ínfimas particularidades. Abraçar políticas de realojamento urbano pode não ter uma mais-
-valia imediata, mas pelo menos é o caminho certo para devolver a alma portuguesa às nossas ruas.
Organizar uma cidade, devolvendo-a às suas gentes.
2) Transcreve do segundo parágrafo exemplos que comprovam a opinião negativa da autora acerca
das alterações observadas nas cidades.
3) Com base nas informações do texto, explica (com as tuas palavras) como o turismo numa cidade
pode influenciar a vida de um jovem.
Desenvolvimento -
- As famílias que moram há muitos anos no bairro são despejadas para dar
lugar aos turistas.
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