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RESUMO 1 TEXTURA MUSICAL

Tradução e Comentários sobre Fragmentos do Livro


“Structural Functions in Music”- Wallace Berry

A Textura musical, como definida por Berry (1987: 184), é um dos parâmetros
da estrutura de uma composição musical e está constituída pelos “componentes sonoros
que soam simultaneamente ou em concorrência” (imbricação de componentes). A análise
de textura implica ao menos dois aspectos: um quantitativo configurado pela densidade
do tecido musical e outro, qualitativo, que se relaciona ao modo de interação e inter-
relacionamento entre os componentes. Enquanto a densidade de um determinado trecho
musical é algo mensurável, a natureza das interações e inter-relações dentro da textura
musical necessita de uma análise que indique como os componentes se relacionam, ou
mesmo se há de fato alguma forma de relacionamento entre eles.
Para ampliar o sentido da definição de textura Berry expõe o seguinte exemplo:
“quando uma altura soa sozinha fica estabelecida uma textura, neste caso com grau
máximo de simplicidade. Se uma segunda altura soa em simultaneidade, a textura é
alterada e a densidade aumenta. Mas quando as duas alturas formarem um intervalo de
segunda e forem sucedidas por duas outras num intervalo de sexta (a superior movendo-
se um quarta acima e a mais grave descendo uma segunda) surgira, então, um evento
textural que não é mais puramente quantitativo”. Afirma-se neste exemplo, ainda que de
modo muito incipiente, certo grau de independência (aspecto qualitativo) entre as linhas
em função da “oposição de direção de movimento - uma qualidade que pode ser
incrementada se diferenciações rítmicas forem introduzidas” (Berry, 1987:186).
Ex.1

O conceito de densidade se refere a um “parâmetro textural, quantitativo e


mensurável, condicionado pelo número de componentes concorrentes ou simultâneos e
pela extensão do ‘espaço’ vertical compreendido por eles, respectivamente densidade-
número e densidade compressão”. Enquanto a densidade-número se refere estritamente
à quantidade de componentes sobrepostos a densidade-compressão é definida pela razão
entre a quantidade de componentes e o espaço total. Também merece um esclarecimento
o termo concorrente utilizado por Berry (1987: 184) definido como um modo de
coexistência dos componentes da textura que se imbricam e se interseccionam ao longo
de uma determinada progressão temporal. O autor conclui que duas linhas são
concorrentes em algum grau, e em “algum nível específico, se elas se imbricam em
alguma parte.” O conceito de simultaneidade é muito mais abrangente e pode implicar
no surgimento de componentes que soam juntos, mas que não interagem entre si (não
concorrentes).
Outro aspecto importante no texto de Berry se refere à diferenciação entre os
termos fator textural e componente textural. Para tanto o autor traz o seguinte
exemplo: “duas linhas movendo-se em terças paralelas produzem uma textura de dois
componentes, mas apenas um único fator textural real”. Quando alguma diferenciação
surge nas vozes, seja de ritmo, direção ou distancia do movimento ou de qualquer outro
tipo, “a textura, inicialmente constituída por um fator real simples (de dois componentes
sonoros), torna-se uma textura de dois fatores texturais reais (ou ao menos que progride
em direção a essa diferenciação)”. O texto de Berry deixa bem estabelecido que
mudanças como as que são citadas no exemplo ao configurarem progressões e recessões
nos fatores texturais, “são decisivas para a construção de uma estrutura musical” (Berry,
1987: 186).
Para se avaliar as qualidades texturais é preciso levar em consideração as várias
possibilidades de inter-relações e interações entre os componentes da textura. “Numa
determinada textura musical podem ocorrer mudanças quanto à relativa independência e
interdependência entre os componentes que terão papel decisivo (e sutil) no
delineamento expressivo da estrutura da música.” (Berry,1987: 185)
Algumas propostas de terminologia sugeridas por Berry para classificação mais
detalhada de texturas musicais utilizam os prefixos homo-, contra-, hetero-, aplicados aos
parâmetros do ritmo, direcionalidade e conteúdo intervalar linear (melódico):
Quanto ao ritmo – homorítmico, heterorítmico e contrarítmico
Quanto a direção do movimento – homodirecional (movimento direto),
heterodirecional e contradirecional (movimento contrário)
Quanto ao conteúdo intervalar – homointerválico, heterointerválico e
contrainterválico.

Os dois exemplos seguintes são interessantes quanto às diferenciações entre


fatores quantitativos e qualitativos na criação de uma textura musical “ambos fatores
sujeitos a uma vasta gama de aspectos sutis e em constante mutação”.

Analisar os dois exemplos seguintes para aplicar os conceitos de densidade, componentes,


independência e interdependência e fatores quantitativos e qualitativos.
Exemplo 1:

Exemplo 2
COMENTÁRIOS SOBRE OS DOIS EXEMPLOS ANTERIORES

Exemplo 1 “Depois de um desenvolvimento progressivo da complexidade


textural até o compasso 4 há um declínio recessivo daquela complexidade quando a
música se aproxima do compasso 7. As mudanças de graus de densidade e diversidade
textural – a sucessão até a independência interlinear máxima e daí até a homogeneidade
textural - podem ser observadas pelo número de componentes sonoros reais em cada
ponto de mudança significativa” (Berry,1987:186.). É importante notar que nos
compassos 4 e 5 as linhas do soprano e contralto caminham quase em paralelo quanto ao
ritmo e direção e, portanto não mais dois componentes reais, mas sim dois componentes
com um único fator textural. A mesma coisa ocorre nas duas linhas inferiores a partir da
metade do quinto compasso quando evoluem em terças paralelas. Nos dois últimos
compassos as quatro vozes mantêm rigoroso paralelismo rítmico e de direção do
movimento melódico.

Berry sugere para definir a textura deste trecho musical o seguinte gráfico:

C.1 C. 2 C.3 C.4 C.5 C. 6 C.7


1 1 1 1 2 2 4
1 1 1 1 2
1 1 1
1

Exemplo 2:
Segundo o texto de Berry o “exemplo é uma ilustração belíssima” de uma
variação gradual (“sloping”) de estruturas texturais. “O trecho está caracterizado, em sua
textura, pela significativa interdependência das duas linhas mais graves no início e pelas
duas vozes superiores no final e por uma notável independência na parte central”. Pode-
se notar que as duas vozes agudas iniciam com um alto grau de interdependência que
progressivamente vai se alterando para um grau máximo de independência no compasso
4 quanto surgem diferenciações rítmicas (figura pontuada e deslocamento de acentos) e
melódicas (saltos e alterações de direção do movimento melódico). A diversificação de
textura ocorre para criar o clímax da frase Si iniquitates observaveris (se iniqüidades
observais) ressaltando a palavra observaveris. Ambas as passagens que apresentam
interdependência, no início e no fim deste trecho, ocorrem sobre a palavra Domine. No
entanto a interdependência notada por Berry apresenta diferenças sutis, mas importantes.
No primeiro Domine o motivo do tenor surge no baixo transposto quinta abaixo e
defasado ritmicamente por uma mínima algo que resulta numa “identidade “oblíqua”. O
procedimento confere à palavra uma ressonância muito especial ao mesmo tempo
profunda e humilde. No Domine final, por sua vez, a interdependência faz coincidir o
ritmo e parcialmente a direção do movimento melódico de cada uma das vozes que
finalizam numa cadência em que resolução se dá no uníssono. Os dois componentes desta
frase alcançam ao final o quase vazio textural que confere um sentido à palavra Domine
bem diferente daquele inicial.

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