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Introdução
“A interface história oral e história dos movimentos sociais apresenta aspectos sobre as
dimensões dos públicos na história. As práticas de história pública são expressas nas
construções dialógicas da memória social – produzidas e difundidas – entre os saberes
acadêmicos e não acadêmicos. Os capítulos que seguem apresentam experiências de
historiadores brasileiros com a metodologia da história oral, sem perder de vista o
trabalho de memória realizado pelos próprios sujeitos históricos envolvidos nos
movimentos sociais.” (p. 7)
- A história oral mobiliza o entrecruzamento das noções de memória, narrativa, tempo e
identidade. (p. 7)
“Os autores, sensíveis aos procedimentos da história oral, discutiram o processo de
construção das entrevistas a partir da negociação de significados entre entrevistador e
entrevistado. As fontes orais expressaram as dimensões subjetivas dos integrantes dos
movimentos sociais, bem como as oportunidades políticas para as ações coletivas e
dimensões estratégicas para a legitimação de diferentes sistemas de valores
sociopolíticos dentro de cada grupo. As narrativas públicas, resultantes do trabalho de
memória no tempo presente, expressaram lembranças, esquecimentos e silêncios em
múltiplas dimensões.” (p. 8)
“Em diferentes oportunidades, essas mulheres usaram seu corpo para se apresentarem
como mães fragilizadas, mulheres sedutoras ou ‘boas moças’. Também fizeram dele o
portador da esperança de muitas famílias e de organizações políticas de resistência ao
regime. Aos poucos, suas ações espontâneas e dispersas passaram a se aliar a outras
experiências, com as quais se identificavam. A percepção de que suas histórias eram a
compartilhado, transformou suas realizações em atos políticos, inscrevendo-se numa
rede de solidariedade e apoio. Tornaram-se mediadoras quando, por sua invisibilidade
política, podiam circular, usando a única arma que não eram impedidas de portar: sua
corporeidade. Corpo sexuado, (in)disciplinado e sensualizado, ao mesmo tempo
imposição social e arma de subversão.” (pp. 25-26)
Bricolagem (Beatriz Sarlo): “As mulheres adotaram o que pode ser entendido como
uma estratégia de bricolage, produzindo novos assuntos públicos a partir de antigos
papeis e funções tradicionais. Se a sociedade definiu o privado como a quintessência da
esfera feminina, as mulheres transformaram os assuntos privados em debates públicos e
em intervenções.” (p. 27)
As mulheres repetiram a frase “eu vivi”, enfatizando que fizeram escolhas que mudaram
suas vidas, de seus companheiros e muitas outras pessoas. Significa também um
fortalecimento, a partir do “aprendi a luta”, fortalecimento individual e coletivo,
representando a sociedade traumatizada pela ditadura. (pp. 34-35)
“Para finalizar, é preciso lembrar, no entanto, que não é só o fato de saber sobre os
acontecimentos que nos torna menos indiferentes às dores dos outros. As narrativas
femininas não são capazes, por si só, de nos fazerem mais sensíveis ou de enxergarmos
o protagonismo dos esquecidos na luta por memórias. O que nos atinge, de fato, ao
publicizarmos histórias e memórias como as relatadas por essas mulheres deve ser a
oportunidade de ouvi-las em toda plenitude de emoções, tendo tempo para entender a
complexidade que envolve os movimentos sociais e seus sujeitos. Seus relatos são
possibilidades históricas em aberto, desafios ao nosso próprio presente a partir de nosso
passado sempre inacabado. O trabalho com história oral não trata apenas de divulgação
de informação, mas de conhecimento sensível, o que implica compromisso com uma
história pública, que dê aos mortos e aos vivos o direito à sua história.” (pp. 35-36)
A autora resgata a trajetória pessoal e política de Helena Greco, conectando sua história
de vida com os acontecimentos políticos do Brasil, principalmente a luta pela anistia em
Belo Horizonte. “A Lei da Anistia acabou por não atender à demanda integral da
campanha, pois restringiu o ‘perdão’ em algumas de suas cláusulas e ainda trouxe no
seu corpo a expressão ‘anistia conexa’, que favoreceu aos responsáveis pela tortura.” (p.
50)
“Na narrativa sobre a campanha pela anistia, Helena Greco destacou duas vertentes: a
do alcance do movimento e a do retorno dos exilados. Quanto à primeira, lembrou o
apoio dos jornais alternativos e a participação de políticos como Teotônio Vilela e de
outras mulheres como Terezinha Zerbini. Registrou também o envolvimento de diversas
organizações da sociedade civil, como Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
Associação Brasileira de Imprensa (ABI), União Nacional dos Estudantes (UNE) e
Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo.” (pp. 50-51)
“Justiça de transição é um conceito que se desenvolveu nos últimos anos e que se refere
a um conjunto de procedimentos jurídicos e políticos implementados pelo Estado com
vistas à criação de uma nova situação política e moral após a transição de um regime
discriminatório e violento para um regime democrático. Inúmeros procedimentos
permeiam esta justiça transicional: a revelação dos crimes cometidos, a reparação das
vítimas, a responsabilização dos perpetradores de violência, sobretudo os agentes do
Estado. Memória, verdade e justiça são os seus pilares. Mas cada país desenvolve uma
justiça de transição própria; não existe um modelo único. Em cada país a situação
política específica, a correlação de forças, a cultura política e as demandas da sociedade
vão interferir neste processo e configurar um modelo específico de justiça de transição.
No caso do Brasil este modelo deu ênfase ao aspecto da reparação das vítimas. Um dos
elementos chaves desta ênfase foi a Anistia.” (p. 120)
Foram, assim, criados 2 projetos: Memória Reveladas – criado em 2009 pela Casa Civil,
seu objetivo era a constituição de um Centro de Referência das Lutas Políticas no
Brasil, foi implantado no Arquivo Nacional. (pp. 122-123)
Frente a primeira questão que a equipe enfrentou, sobre quem deveriam ser as pessoas
entrevistas, a orientação inicial da Comissão de Anistia voltava-se para a perspectiva
das “vítimas” – pessoas que tivessem sido vítimas da ditadura e, por conta disso,
tivessem pedido anistia e reparação. A ênfase nas vítimas deriva da abordagem
prioritariamente jurídica, que coloca em relevo os conflitos que são sempre abordados
pela perspectiva de vítimas e perpetradores. (p. 125)