Você está na página 1de 25

o papel do governo na economia

Jabr H. D. Ornar*

A
i n d a q u e o a s s u n t o E s t a d o versus m e r c a d o n ã o s e j a n o v o , o p a p e l d o
E s t a d o n a e c o n o m i a é u m d o s t e m a s m a i s d i s c u t i d o s d a política p ú b l i -
c a nos países desenvolvidos e nos menos desenvolvidos.
D e s d e o início d o s a n o s 7 0 , o g o v e r n o t o r n o u - s e u m alvo fácil p a r a o s q u e
d e f e n d e m o " s i s t e m a d o livre m e r c a d o " c o m o a m e l h o r a l t e r n a t i v a p a r a lograr o
r e s u l t a d o ideal n a e c o n o m i a e p a r a m a x i m i z a r o b e m - e s t a r e c o n ô m i c o e s o c i a l
d a s o c i e d a d e . O g o v e r n o é r e s p o n s á v e l por t o d o s o s m a l e s d a s o c i e d a d e ; a l t a
inflação, déficit público, alta dívida pública, ineficiência, e m p r e s a s públicas o n e -
r o s a s , d e s p e r d í c i o d o dinheiro d o s c o n t r i b u i n t e s , c o r r u p ç ã o , etc. A l é m d i s s o , o
f r a c a s s o d a s e c o n o m i a s d o s e x - p a í s e s socialistas e a c r i s e d o E s t a d o e m paí-
s e s m e n o s d e s e n v o l v i d o s nos a n o s 80 o f e r e c e r a m u m a r g u m e n t o p e r s u a s i v o e
munições para os que defendem o mercado contra o Estado.
N e s t e e s t u d o , o o b j e t i v o principal é r e s p o n d e r a t r ê s q u e s t õ e s . P r i m e i r o :
q u a i s s ã o a s linhas principais d a intervenção d o g o v e r n o n a e c o n o m i a ? S e g u n -
d o : q u a i s s ã o a s b a s e s teóricas e práticas p a r a o a t a q u e c o n t r a o g o v e r n o ? E
t e r c e i r o : s e r á q u e e s s e a t a q u e t e v e s u c e s s o , o u n ã o , e por q u ê ?
B a s e a d o s n e s s a s q u e s t õ e s e f u n d a m e n t a d o s n a t e o r i a e n o s fatos, d i s c u -
tir-se-á q u e o p a p e l d o g o v e r n o n a e c o n o m i a é u m efeito ( c o n s e q ü ê n c i a ) d e u m a
c a u s a . A s s i m , s e a c a u s a é p e r m a n e n t e , e n t ã o , o efeito t a m b é m s e r á p e r m a -
n e n t e . S e g u n d o , a p e s a r d e t o d o o sofisticado a t a q u e p r á t i c o e t e ó r i c o c o n t r a o
g o v e r n o , a e v i d ê n c i a m o s t r a q u e o papel dele n a e c o n o m i a s e i n c r e m e n t o u e n ã o
diminuiu, h a v e n d o indicações d e q u e esse papel se d e s e n v o l v e r á ainda m a i s n o
futuro.
N a p r i m e i r a p a r t e , a n a l i s a m - s e os f u n d a m e n t o s d a i n t e r v e n ç ã o d o E s t a d o
n a e c o n o m i a . N e s s e sentido, os principais a r g u m e n t o s d a f a l h a d o m e r c a d o s ã o
e x a m i n a d o s e d i s c u t i d o s . Na s e g u n d a , t r a t a - s e do a t a q u e c o n t r a o g o v e r n o .
Este parte d e três principais e s c o l a s d e p e n s a m e n t o : o m o n e t a r i s m o , as e x p e c -
tativas r a c i o n a i s e a e s c o l h a p ú b l i c a . N a terceira p a r t e , f a z - s e u m e s t u d o d o s
principais indicadores d a intervenção do g o v e r n o nos últimos 3 0 a n o s para medir
o grau de sucesso e o de fracasso desse ataque. Finalmente, na quarta parte,
a p r e s e n t a - s e u m r e s u m o d a s principais c o n c l u s õ e s .
P o r é m h á d u a s c o n s i d e r a ç õ e s para destacar. Primeiro, e s p e r a - s e q u e e s t e

' Professor Titular da UCPel e da UFPel, Economista, Pti.D. pela McGiLL University, Canadá,
t r a b a l h o e s t a b e l e ç a as b a s e s p a r a a i n t e r v e n ç ã o d o g o v e r n o e n ã o p a r a a s u a
e f i c á c i a . E s t a s s ã o d u a s c o i s a s nnuito d i f e r e n t e s . S e g u n d o , e s t e t r a b a l h o trata-
rá d o a s s u n t o e x c l u s i v a m e n t e nos p a í s e s d e s e n v o l v i d o s , por ter sido neles q u e
as t e o r i a s e c o n ô m i c a s e as s u b s e q i j e n t e s i d e o l o g i a s s o b r e o p a p e l d o E s t a d o
f o r a m primordialmente desenvolvidas e i m p l e m e n t a d a s . O s países e m d e s e n v o l -
v i m e n t o s e m p r e f o r a m late-comerse, principalmente, c o p i a d o r e s . A experiência
d e s t e s s e r á t r a t a d a n u m t r a b a l h o futuro.

1 - Bases teóricas da intervenção do Estado


na economia
1.1-0 argumento das falhas do mercado e a fórmula
neoclássica

A t e o r i a n e o c l á s s i c a é definida c o m o as principais i d é i a s e t e o r i a s d e s e n -
v o l v i d a s p a r a a n a l i s a r e d e s c r e v e r o f u n c i o n a m e n t o do s i s t e m a e c o n ô m i c o , b a -
s e a d a s n o s e s c r i t o s d o s e c o n o m i s t a s c l á s s i c o s , p r i n c i p a l m e n t e S m i t h , Ricardo
e S a y ; d o s m a r g i n a l i s t a s , c o m o J e v o n s , M e n g e r e Clarck; e d e A l f r e d M a r s h a l l .
Hoje, e s s e c o n j u n t o d e p e n s a m e n t o s é c o m p l e m e n t a d o , d e u m a f o r m a o u d e
o u t r a , p e l o s m o n e t a r i s t a s , c o m o s e u principal p a t r o c i n a d o r , Milton F r i e d m a n ;
pela e s c o l a d a s e x p e c t a t i v a s racionais ( L u c a s ) ; e pela e s c o l a d a e s c o l h a p ú b l i -
c a ( B u c a n o n ) . T o d a s elas d e s e n v o l v e r a m m o d e l o s t e ó r i c o s a l t a m e n t e sofistica-
d o s p a r a justificar o perfeito f u n c i o n a m e n t o d a s f o r ç a s d o livre m e r c a d o e p a r a
s o l a p a r (diminuir) o papel d o g o v e r n o n a e c o n o m i a .
E s s e c o n j u n t o d e literatura normalmente invoca as palavras de A d a m Smith
no s e u c o n h e c i d o livro A n I n q u i r y I n t o T h e N a t u r e a n d C a u s e s o f t h e W e a l t h
of N a t i o n s , publicado e m 1776, para defender o mercado contra o governo.
Nele, Smith a r g u m e n t a v a que o Produto nacional de u m país e o bem-estar d a
s o c i e d a d e s e r i a m m e l h o r m a n e j a d o s s e c a d a indivíduo f o s s e livre p a r a escolher
a f o r m a e a a l o c a ç ã o d e s e u próprio c a p i t a l :

" O esforço natural de c a d a indivíduo d e melhorar s u a própria condição,


q u a n d o lhe é p e r m i t i d o e x e r c ê - l o c o m l i b e r d a d e e s e g u r a n ç a , é u m
princípio tão poderoso q u e , só por si, s e m qualquer outra contribuição,
é n ã o s ó c a p a z d e criar a riqueza e p r o s p e r i d a d e d e u m a s o c i e d a d e
c o m o ainda de vencer um grande número de obstáculos c o m que a
i n s e n s a t e z d a s leis h u m a n a s t a n t a s v e z e s c u m u l a a s s u a s a ç õ e s "
(Smith, 1993, v.2,p.68).
N u m a p a s s a g e m anterior, ele d e c l a r o u q u e :

"Cada indivíduo esforça-se continuamente por encontrar o emprego


m a i s vantajoso para qualquer que seja o capital q u e d e t é m . N a verdade,
aquilo q u e t e m e m vista é o seu próprio benefício e não o d a sociedade.
M a s o juízo d a s u a própria v a n t a g e m leva-o, n a t u r a l m e n t e , o u melhor,
n e c e s s a r i a m e n t e , a preferir o e m p r e g o mais vantajoso para a
s o c i e d a d e " ( S m i t h , 1 9 9 3 , v . 1 , p.755).^

Smith t a m b é m estabeleceu a superioridade dos mercados competitivos


s o b r e q u a l q u e r tipo d e r e g u l a ç ã o na e c o n o m i a . Ele viu a c o n c o r r ê n c i a c o m o u m
n ú m e r o g r a n d e d e v e n d e d o r e s e u m grupo d e d o n o s d e recursos (trabalhadores,
capitalistas e p r o p r i e t á r i o s d e terra) c o m p e t i n d o entre si c o m o o b j e t i v o final d e
o f e r e c e r a o s c o n s u m i d o r e s o p r e ç o mais baixo e garantir a t a x a m á x i m a d e
crescimento na economia.
J á e s t a b e l e c i d o s o s méritos d o s m e r c a d o s c o m p e t i t i v o s e a liberdade d e
e s c o l h a individual c o m o o motor p a r a maximizar o Produto e o bem-estar, S m i t h
(1983, livro 4) construiu s u a visão contra a intervenção d o g o v e r n o n a e c o n o m i a ,
f a v o r e c e n d o o laissez-faire. S e u posicionamento b a s e o u - s e e m dois a r g u m e n t o s :
primeiro, a interferência d o g o v e r n o n ã o é d e s e j á v e l , p o r q u e t r a n s g r i d e os direi-
tos e as l i b e r d a d e s naturais d o s indivíduos. S e g u n d o , a i n t e r v e n ç ã o d o g o v e r n o
por m e i o d e r e g u l a ç ã o e s u b s í d i o s só servirá aos g r u p o s d e i n t e r e s s e e restrin-
girá a c o n c o r r ê n c i a no m e r c a d o . A s s i m , o g o v e r n o f a r á m a i s m a l d o q u e b e m . ^
Smith reconheceu, p o r é m , três funções básicas para o Estado: prover justiça,
defesa e b e n s públicos necessários para a sociedade, m a s não lucrativos para o
setor privado, c o m o e d u c a ç ã o , pontes, rodovias e estradas. E s s e s b e n s s ã o

"(...) d e n a t u r e z a tal, q u e o lucro j a m a i s poderia r e p a g a r a d e s p e s a d e


q u a l q u e r indivíduo ou p e q u e n o n ú m e r o d e indivíduos, os quais n ã o s e
pode esperar que sejam levantados ou mantidos por indivíduo ou
p e q u e n o n ú m e r o de indivíduos quaisquer" ( S m i t h , 1 9 7 8 , p.77-78).

A s s i m , o a r g u m e n t o d e laissez-faire 6e Smith d e v e ser qualificado e levado


d e volta à e s t r u t u r a política, histórica e institucional d e s e u t e m p o . Ele a d m i t i u o
f o r n e c i m e n t o d e b e n s q u e p r o d u z e m benefícios s o c i a i s , m a s n ã o s ã o p r o v i d o s

' Este é o famoso termo "Mão Invisíver' de Smitti, no sentido de que os indivíduos que
procuram o seu próprio interesse, em geral, acabam servindo ao bem público da sociedade
como um todo.
2 Isto estabeleceu as bases do que veio a se conhecer como a teoria m o d e r n a da e s c o l h a
p ú b l i c a , que será explicada a seguir.
pelo setor privado, porque eles poderiam não ser suficientemente lucrativos,
principalmente a educação. Smith era contra a regulação e os subsídios,
porque, naquele m o m e n t o , o governo era considerado c o m o u m instrumento
a s e r v i ç o d e u m p e q u e n o g r u p o c o n h e c i d o c o m o o s m e r c a d o r e s . ^ E, f i n a l -
mente, a condição básica para a sua defesa era a existência dos mercados
competitivos.''
O s economistas neoclássicos, J e v o n s (1871), M e n g e r (1871), W a i r a s (1874)
e Marshall ( 1 8 9 0 ) , d e s e n v o l v e r a m m o d e l o s m a t e m á t i c o s a l t a m e n t e sofistjcados
e o f e r e c e r a m u m a d e f e s a muito e l a b o r a d a d a n o ç ã o d e A d a m S m i t h d a liberda-
d e d e e s c o l h a , d a c o n c o r r ê n c i a no m e r c a d o e d a política e c o n ô m i c a d e laissez-
-faire. Eles d e s e n v o l v e r a m a ' l e o r i a d a produtividade m a r g i n a l " d o c o n s u m o , d a
p r o d u ç ã o e d a distribuição e m o s t r a r a m q u e , n u m a e c o n o m i a d e m e r c a d o c o m -
petitiva, f o r m a d a por u m g r a n d e n ú m e r o d e p e q u e n o s p r o d u t o r e s e c o n s u m i d o -
res, a s f o r ç a s d a oferta e d a d e m a n d a distribuiriam os r e c u r s o s d a s o c i e d a d e de
u m a f o r m a n a q u a l , d a d o s os g o s t o s e c o n s i d e r a n d o a s d o t a ç õ e s d e fatores, o s
c o n s u m i d o r e s a l c a n ç a r i a m a m á x i m a diversificação d e m e r c a d o r i a s . Fatores d e
p r o d u ç ã o s e r i a m u s a d o s n a m a n e i r a m a i s eficiente p a r a m a x i m i z a r o valor d a
p r o d u ç ã o d a s o c i e d a d e . ^ Isto é o q u e P i g o u d e f i n e c o m o o p r o d u t o i d e a l : " N e -
n h u m p r o d u t o alternativo q u e puder s e obter por m e i o d a r e a l o c a ç ã o d o s recur-
s o s d a e c o n o m i a e n t r e as v á r i a s indústrias d e i x a r i a a c o m u n i d a d e m e l h o r q u e
a n t e s " , c i t a d o e m O c o n n e r ( 1 9 7 3 , p.369). A s s i m , q u a l q u e r tipo d e i n t e r v e n ç ã o
d o g o v e r n o p a r a realocar os r e c u r s o s d a s o c i e d a d e d e i x a r i a a s o c i e d a d e pior.
P o r é m , p a r a a l c a n ç a r e s s e " p r o d u t o ideal", Graaf ( 1 9 5 7 , p . 2 2 - 2 6 ; 6 6 - 7 0 )
e n u m e r o u 17 s u p o s i ç õ e s , e n q u a n t o W i n c h ( 1 9 7 1 , p.84-91) e n u m e r o u 13 n e c e s -
s á r i a s , m a s i m p o s s í v e i s d e cumprir. A s s i m , o m e r c a d o n ã o c o n s e g u i r á o p r o -
d u t o i d e a l n a b a s e d a teoria d a produtividade m a r g i n a l e n a política e c o n ô m i c a
d e laissez-faire. E s s e f r a c a s s o leva o g o v e r n o a intervir n a e c o n o m i a p a r a m e -
lhorar o b e m - e s t a r d a s o c i e d a d e .
A teoria m i c r o e c o n ô m i c a n e o c l á s s i c a identificou q u a t r o f o n t e s pelas quais
o mercado não produzirá o r e s u l t a d o ideal: bens públicos, externalidades,
poder d o m o n o p ó l i o e informação imperfeita. B e n s públicos p o d e m ser definidos
c o m o um b e m ou um serviço:

2 Ver o ataque de Smitti ao mercantilismo, no Livro IV.


" Smith, no seu trabalho, dedicou centenas de páginas ao papel que um governo pode ter na
economia. Em nenhuma passagem ele disse que esse papel devia ser o mínimo. Spencer
descreveu a posição d e Smith sobre a intervenção do governo na economia como igual à
posição de u m democrata liberal americano no século 20. Citado em Gaibraith (1992, p.63),
^ Para mais detalhes sobre a teoria da produtividade marginal, ver Ferguson e Gould (1975) e
Georgescu-Roegen (1967).
"(...) O q u a l p o d e servir a u m p e q u e n o o u g r a n d e n ú m e r o d e p e s s o a s
e x a t a m e n t e a o m e s m o c u s t o total (o c u s t o m a r g i n a l d e u m u s u á r i o
a d i c i o n a l é z e r o ) . E s t a característica é c í i a m a d a suppiyjointness ou
undepletability. A l é m d i s s o , os bens p ú b l i c o s s ã o f r e q ü e n t e m e n t e
c o n s i d e r a d o s c o m o c a r a t e r i z a d o s pela i m p o s s i b i l i d a d e d a e x c l u s ã o
d e q u a l q u e r p e s s o a d e desfrutar os s e u s b e n e f í c i o s , u m a v e z q u e o
b e m t e n h a sido provido" ( B a u m o l , 1965, p.521).

A principal p r o p r i e d a d e d e s s e s b e n s é que eles s ã o "não-rivais", n o sentido


de o c o n s u m o por u m usuário não reduzir a oferta disponível no m e r c a d o , e "não-
-exclusivos", se p r e v ê e m u m indivíduo, d e v e m estar igualmente disponíveis p a r a
t o d o s . E x e m p l o s c o m u n s d e b e n s públicos s ã o a d e f e s a , a justiça e a s e g u r a n -
ç a n a c i o n a l . F r e q ü e n t e m e n t e , é difícil o u impossível p a r a o s i s t e m a d e m e r c a d o
prover l u c r a t i v a m e n t e u m b e m público, porque, a o n ã o p o d e r evitar q u e o indiví-
d u o u s e o b e m , i g u a l m e n t e n i n g u é m p o d e forçá-lo a p a g a r por ele. A s s i m , e s s e s
bens d e v e r i a m ser d e p r o p r i e d a d e pública.
U m a s e g u n d a área d e falha do m e r c a d o ocorre no c a s o d a s externalidades.
E x t e r n a l i d a d e s a p a r e c e m q u a n d o u m a atividade e c o n ô m i c a d e s e n v o l v i d a por
u m a p e s s o a o u u m a e m p r e s a g e r a u m efeito, positivo o u n e g a t i v o , s o b r e o u t r a
p e s s o a q u e n ã o é parte d a a t i v i d a d e . A s e x t e r n a l i d a d e s , positivas s ã o , g e r a l -
m e n t e , c h a m a d a s d e e c o n o m i a s e x t e r n a s , e as e x t e r n a l i d a d e s n e g a t i v a s , d e
d e s e c o n o m i a s e x t e r n a s ( W i n c h , 1 9 7 1 , p.123). A principal razão p a r a a e x i s -
t ê n c i a d e e x t e r n a l i d a d e s é a d i v e r g ê n c i a entre c u s t o p r i v a d o e b e n e f í c i o s o c i a l .
No d e s e n v o l v i m e n t o d a p r o d u ç ã o , os c u s t o s q u e u m a e m p r e s a c o n s i d e r a p a r a
m a x i m i z a r os lucros s ã o c u s t o s p r i v a d o s p a g o s pela e m p r e s a , m a s a p o l u i ç ã o
resultante d a p r o d u ç ã o é u m custo social e não é p a g o p e l a e m p r e s a . U m livre
m e r c a d o s e m restrições, e n t ã o , terá c o m o resultado u m a q u a n t i d a d e e x c e s s i v a
de p r o d u t o s c o m u m custo social maior do q u e o custo privado. A e d u c a ç ã o , por
e x e m p l o , é u m a externalidade positiva, porque m e l h o r a a s c a p a c i d a d e s dos q u e
t ê m a c e s s o a ela e, a o m e s m o t e m p o , beneficia o resto d a s o c i e d a d e , p o r q u e
u m a f o r ç a d e trabalho c a p a c i t a d a levará a u m a u m e n t o d e p r o d u ç ã o e d e cresci-
mento da economia.
A r e g u l a ç ã o d o m o n o p ó l i o é outra á r e a na qual o G o v e r n o s e m p r e d e v e r i a
intervir. U m a d a s principais c o n t r i b u i ç õ e s de A l f r e d M a r s h a l l (1890) à teoria
e c o n ô m i c a foi a d e m o n s t r a ç ã o d e q u e , n u m a indústria d e c u s t o s d e c r e s c e n t e s ,
o c u s t o por u n i d a d e p a r a f o r n e c e r u m a u n i d a d e extra d e p r o d u ç ã o d i m i n u i s e o
p r o d u t o a u m e n t a . N e s s a s i t u a ç ã o , a c o n c o r r ê n c i a no m e r c a d o s e r á r e d u z i d a e
p o d e s e r até e l i m i n a d a . Isto levará à f o r m a ç ã o d e m o n o p ó l i o s e o l i g o p ó l i o s , o s
q u a i s , a b u s a n d o d o s e u p o d e r no m e r c a d o , p o d e m p r o d u z i r p o u c o d e m a i s o u
cobrar muito p a r a elevar o s s e u s lucros. E m tal conjuntura, s e g u n d o F e r g u s o n e
G o u l d ( 1 9 7 5 ) , o g o v e r n o d e v e restringir as práticas m o n o p o l i s t a s e o f e r e c e r u m
ambiente mais sadio para a concorrência.
A p r e s e n ç a d è i n f o r m a ç ã o imperfeita e m e r c a d o s i n c o m p l e t o s é outra forte
r a z ã o q u e justifica a i n t e r v e n ç ã o d o g o v e r n o n a e c o n o m i a . Os trabalhos de
G r e e n w o o d e Stiglitz (1986) eStiglitz (1988) p r o v a m q u e , no c a s o d e informação
i n c o m p l e t a e f r a c a , o m e r c a d o n ã o p o d i a f o r n e c e r o s sinais c o r r e t o s p a r a os
a g e n t e s e c o n ô m i c o s distribuírem a p r o p r i a d a m e n t e o s r e c u r s o s . " O s m e r c a d o s
estão incompletos sempre-que-fracassaremem-oferecerum-bem-ou-ser-viço,
m e s m o q u e o c u s t o s e j a m e n o r d o q u e os indivíduos e s t ã o d i s p o s t o s a pagar".
Isto p o r q u e a i n f o r m a ç ã o é c a r a e n ã o é fácil de ser t r a n s f e r i d a d o s a g e n t e s
e c o n ô m i c o s i n f o r m a d o s aos d e s i n f o r m a d o s . A s s i m , a p r e s e n ç a d e i n f o r m a ç ã o
i n c o m p l e t a , n o s e n t i d o d e q u e os p r o d u t o r e s p o d e r i a m s a b e r m a i s d o q u e os
c o n s u m i d o r e s , o u v i c e - v e r s a , p o d e r i a levar a o f r a c a s s o d e d i f e r e n t e s m e r c a d o s
e, e s p e c i a l m e n t e , d o s m e r c a d o s d e capitais e f i n a n c e i r o s .
Stiglitz ( 1 9 9 3 , p.24-32) identificou s e t e falhas d e m e r c a d o s e m m e r c a d o s
f i n a n c e i r o s , n ã o s ó e m países e m d e s e n v o l v i m e n t o , m a s , t a m b é m , e m p a í s e s
d e s e n v o l v i d o s . Ele d e m o n s t r o u q u e , e m p a í s e s e m d e s e n v o l v i m e n t o e n a s pri-
m e i r a s e t a p a s do d e s e n v o l v i m e n t o , os m e r c a d o s n ã o f u n c i o n a m b e m . O m e s -
m o a c o n t e c e n o s p a í s e s d e s e n v o l v i d o s e m relação a o s m e r c a d o s d e c a p i t a i s .
C o m o "a i n f o r m a ç ã o j a m a i s é perfeita e o s m e r c a d o s j a m a i s s ã o c o m p l e t o s " , o
a r g u m e n t o n e o c l á s s i c o p a r a s e b a s e a r n o m e c a n i s m o d o m e r c a d o p a r a lograr o
r e s u l t a d o ó t i m o n ã o resiste à r e a l i d a d e . A s s i m , a i n t e r v e n ç ã o d o g o v e r n o p a r a
d e s e n v o l v e r a infra-estrutura institucional é n e c e s s á r i a p a r a a d o t a r a s políticas
a p r o p r i a d a s p a r a o b e m - e s t a r social d e t o d o s .
A p r e s e n ç a d e b e n s p ú b l i c o s , e x t e r n a l i d a d e s , m o n o p ó l i o , m e r c a d o s in-
c o m p l e t o s e i n f o r m a ç ã o imperfeita é r e c o n h e c i d a pela t e o r i a n e o c l á s s i c a d o
b e m - e s t a r c o m o a f o n t e do f r a c a s s o d o m e r c a d o p a r a atingir a e f i c i ê n c i a
a l o c a t i v a n a e c o n o m i a , para obter o resultado ideal. N e s s a s i t u a ç ã o , o g o v e r n o
é c h a m a d o a intervir p a r a corrigir e s s a s falhas, f o r n e c e n d o b e n s p ú b l i c o s , c o m o
s e g u r a n ç a e j u s t i ç a , p a r a p r o t e g e r o s direitos à p r o p r i e d a d e , a t e n d e n d o às
e x t e r n a l i d a d e s por m e i o d a e d u c a ç ã o e d a proteção a o m e i o a m b i e n t e , regulan-
d o o nnonopólio por m e i o de política "anti-trust" e s u p e r a n d o a i n f o r m a ç ã o imper-
feita por m e i o d a p r o t e ç ã o a o c o n s u m i d o r e d e r e g u l a m e n t a ç õ e s f i n a n c e i r a s . É
importante enfatizar q u e a intervenção d o g o v e r n o deveria ser e m f o r m a d e s u b -
sídios, t r i b u t a ç ã o e r e g u l a m e n t a ç õ e s . O f o r n e c i m e n t o d e b e n s s ó d e v e r i a ocor-
rer no c a s o d e b e n s p ú b l i c o s p u r o s .
1.2-Falha dó mercado: o argumento da distribuição
Foi c o l o c a d o que a principal preocupação d a teoria neoclássica é maximizar
a p r o d u ç ã o d a e c o n o m i a por m e i o d a eficiência d a a l o c a ç ã o , o b t i d a a t r a v é s d a s
f o r ç a s c o m p e t i t i v a s do m e r c a d o , da a u t o m o t i v a ç ã o e d a política d e laissez-faire.
O u t r o s e c o n o m i s t a s , p o r é m , v i a m os p r o b l e m a s d a e c o n o m i a n ã o na e f i c i ê n -
c i a a l o c a t i v a , m a s na distribuição d a s p a r t i c i p a ç õ e s n a r e n d a entre a s três
c l a s s e s d a s o c i e d a d e : capitalistas, trabalfiadores e p r o p r i e t á r i o s d e terras (fato-
res d e p r o d u ç ã o ) . A c o n c e n t r a ç ã o d a r e n d a resulta e m m e n o r g a s t o , o m e n o r
g a s t o resulta e m m e n o s p r o d u ç ã o e maior d e s e m p r e g o e, a s s i m , na instabilida-
d e d o sistema capitalista de mercado.
D a v i d Ricardo (1817), u m brilhante e c o n o m i s t a inglês, p o d e ser c o n s i d e r a -
d o o p r i m e i r o a c h a m a r a t e n ç ã o q u a n t o à d i s t r i b u i ç ã o d a r e n d a c o m o o fator
mais importante que governa o crescimento da economia.

"Determinar as leis q u e regulam esta distribuição é o principal problema


n a E c o n o m i a Política: b e m c o m o a c i ê n c i a t e m s i d o m e l h o r a d a pelos
e s c r i t o s d o T u r g o t , Stuart, Say, S i s m o n d i e o u t r o s , eles c o n s e g u e m
muito p o u c a i n f o r m a ç ã o satisfatória s o b r e o c u r s o natural d a r e n d a , o
l u c r o e o s salários." ( R i c a r d o , 1 9 7 3 , p r e f . ) .

P a r a p r o v a r e s s e a r g u m e n t o , Ricardo c o n s t r u i u u m m o d e l o b a s e a d o n a
Teoria d a R e n d a d a Terra. Ele c h e g o u à c o n c l u s ã o d e q u e o s p r o p r i e t á r i o s d e
terra o b t ê m a maior parte da p r o d u ç ã o nacional e m f o r m a d e r e n d a ; os trabalha-
d o r e s o b t ê m o s salários d e s u b s i s t ê n c i a ; e o capitalista, u m a b a i x a t a x a d e
lucro.

" N e s t e p o n t o , t o d a a d i n â m i c a d o s i s t e m a capitalista está p a r a l i s a d a ,


a t a x a d e lucro se a p r o x i m a de z e r o , n ã o h á a c u m u l a ç ã o d e c a p i t a l ,
e, p o r t a n t o , n ã o h á c r e s c i m e n t o e c o n ô m i c o ; o c r e s c i m e n t o d a
p o p u l a ç ã o p a r o u ; o s salários estão e m u m nível d e s u b s i s t ê n c i a ; e as
r e n d a s s ã o altas." ( L a n d r e t h , Colander, 1 9 9 4 , p . 1 2 6 ) .

A s s i m , a a n á l i s e r i c a r d i a n a leva o s i s t e m a c a p i t a l i s t a à q u i l o q u e é c o n h e -
c i d o n a a n á l i s e e c o n ô m i c a c o m o o "estado estacionário", u m a s i t u a ç ã o e m q u e
t u d o se p a r a l i s a : a a c u m u l a ç ã o , o c r e s c i m e n t o d a p o p u l a ç ã o e o c r e s c i m e n t o
d a e c o n o m i a . R i c a r d o , p o r é m , a c e i t a isso c o m o u m r e s u l t a d o n a t u r a l . Ele n ã o
p e d i u a i n t e r v e n ç ã o d o g o v e r n o p a r a modificar a s i t u a ç ã o e a c e i t o u o / a / s s e z -
-faire como u m a política ideal.
T h o m a s Malthus é outro e c o n o m i s t a inglês, m a s conservador, q u e d e f e n d e
o status quoeo mecanismo do mercado, principalmente conhecido e lembrado
p e l a s u a t e o r i a d a p o p u l a ç ã o ( 1 7 9 8 ) , pela s u a d e f e s a d a s m e d i d a s d r á s t i c a s
p a r a c o n t r o l a r a p o p u l a ç ã o e por ser c o n t r a q u a l q u e r política social d o g o v e r n o
p a r a a j u d a r o s p o b r e s , p o r q u e eles s ã o o s ú n i c o s c u l p a d o s . N a s u a t e o r i a d a
s u p e r p r o d u ç ã o ( 1 8 2 0 ) , q u a s e e s q u e c i d a entre o s a c a d ê m i c o s , ele a d m i t i u a
p o s s i b i l i d a d e d e a s c r i s e s n o s i s t e m a capitalista s e r e m d e c o r r e n t e s d e s e u
próprio f u n c i o n a m e n t o . E s s a s crises estão r e p r e s e n t a d a s pelo q u e ele c h a m o u
de superprodução e desemprego.
M a l t h u s r e c o n h e c e u q u e a m a n e i r a de distribuição d a r e n d a e n t r e a s três
c l a s s e s d a s o c i e d a d e — t r a b a l h a d o r e s , capitalistas e p r o p r i e t á r i o s d e terra —
hão garantira q ü è t u d o ó q u ê ép^^^^
ra é a m a i o r c l a s s e n a s o c i e d a d e , m a s o p o d e r aquisitivo d e l a é b a i x o , c o m o
r e s u l t a d o d o s b a i x o s salários e, p o r t a n t o , d a baixa p a r t i c i p a ç ã o na r e n d a . O s
capitalistas e os proprietários de terra d e t ê m u m a g r a n d e p a r t i c i p a ç ã o n a r e n d a
e t ê m u m alto p o d e r aquisitivo, m a s s ã o e m n ú m e r o reduzido p a r a g a s t a r tudo o
q u e g a n h a m . N e s s a situação, há a possibilidade de insuficiência d e g a s t o s para
c o m p r a r t o d a a produção.'' Isto é c o n h e c i d o e m terminologia k e y n e s i a n a c o m o a
falta d a d e m a n d a e f e t i v a . O resultado é s u p e r p r o d u ç ã o e d e s e m p r e g o , c o m o
c o n s e q ü ê n c i a d o s u b c o n s u m o . " ( . . . ) o q u e e u q u e r o dizer é q u e n e n h u m a n a ç ã o
t e m a p o s s i b i l i d a d e d e e n r i q u e c e r m e d i a n t e u m a a c u m u l a ç ã o d e capital decor-
rente d e u m a r e d u ç ã o p e r m a n e n t e d o c o n s u m o . " ( M a l t h u s , 1 9 8 3 , p . 1 9 8 ) .
P a r a corrigir a situação, Malthus questionava a intervenção d o g o v e r n o . Ele
v i a e s s a i n t e r v e n ç ã o na f o r m a de a u m e n t o d o s g a s t o s , o q u e e x i g e u m incre-
m e n t o n a s receitas d o g o v e r n o . I n c r e m e n t a r as receitas i m p l i c a u m a u m e n t o
n o s i m p o s t o s , a o q u e ele s e o p u n h a , pois p e n a l i z a a c l a s s e rica, o u imprimir
m a i s dinheiro, e isso n ã o é desejável, porque o resultado final s e r i a inflação, q u e
é prejudicial p a r a a c l a s s e p o b r e . Para tratar e s s e p r o b l e m a , M a l t h u s s u g e r i a
d u a s m a n e i r a s : primeiro, u m a u m e n t o no c o n s u m o i m p r o d u t i v o d o s proprietá-
rios d e t e r r a e, s e g u n d o , f a z e r g u e r r a s c o n t r a o u t r a s n a ç õ e s :

"A I n g l a t e r r a e a A m é r i c a s o f r e r a m o m í n i m o c o m a g u e r r a o u
e n r i q u e c e r a m c o m ela, e a g o r a e s t ã o s o f r e n d o m u i t o m a i s c o m a
p a z . C e r t a m e n t e , é u m a c i r c u n s t â n c i a muito infeliz q u e a l g u m a vez
t e n h a h a v i d o u m p e r í o d o e m q u e a paz t e n h a e s t a d o d e f o r m a t ã o
a c e n t u a d a ligada à d e s g r a ç a " (Oser, Blanchfield, 1 9 8 9 , p.112).

M a r x , n o s e u t r a b a l h o O C a p i t a l ( 1 8 9 4 , v.3), d e s e n v o l v e u a t e o r i a d o valor
t r a b a l h o , a teoria d a e x p l o r a ç ã o , a teoria d a t a x a d e lucros d e c l i n a n t e e a teoria
d o e x é r c i t o d e r e s e r v a . Ele inferiu a c e r t e z a d a s c r i s e s no s i s t e m a c a p i t a l i s t a e
a i m p o s s i b i l i d a d e d a s o b r e v i v ê n c i a d e s t e . Ele v i a o s i s t e m a c a p i t a l i s t a c o m o o

' Para maiores explicações sobre a teoria da superprodução de Malthus, ver Galbraith (p.71 -
-72).
eonjunto d e relações sociais e produtivas que c o n t é m as suas próprias fontes
d e c o n t r a d i ç õ e s . O c o l a p s o d o s i s t e m a capitalista é o r e s u l t a d o d a c o n c e n t r a -
ç ã o d a r e n d a n a s m ã o s d e u n s p o u c o s capitalistas via a c r e s c e n t e m i s é r i a d a s
m a s s a s c o m o o resultado d o uso intensivo d o capital e d a t e c n o l o g i a no p r o c e s -
s o p r o d u t i v o . O r e s u l t a d o final é o s u b c o n s u m o , d e v i d o à falta d e p o d e r a q u i s i t i -
vo, o que leva à crise capitalista.
M a r x n ã o a c h a v a q u e o g o v e r n o tivesse o p a p e l d e corrigir o s i s t e m a , por-
q u e ele o c o n s i d e r a v a c o m o parte d a s u p e r e s t r u t u r a f o r m a d a p e l a c l a s s e c a p i -
talista e a s e r v i ç o d e l a , q u e iria d e s a p a r e c e r c o m o p r ó p r i o s i s t e m a .
Keynes, na sua obra A Teoria Geral d o E m p r e g o , d o J u r o e da M o e d a
( 1 9 3 6 ) , identificou dois principais defeitos d o s i s t e m a capitalista q u e o i m p e d e m
d e a l c a n ç a r o nível d e p l e n o e m p r e g o : "distribuição ineqüitativa d a r e n d a " e " i n -
certezas sobre futuras decisões de investimento". C o m o resultado desses pro-
blemas, a d e m a n d a e f e t i v a (gasto em c o n s u m o e investimento) não será s u -
ficiente p a r a s u s t e n t a r o pleno e m p r e g o para as forças produtivas d a s o c i e d a d e .

" O s principais defeitos d a s o c i e d a d e e c o n ô m i c a e m q u e v i v e m o s s ã o


a s u a i n c a p a c i d a d e p a r a fornecer o p l e n o e m p r e g o e a s u a arbitrária e
d e s i g u a l distribuição d a riqueza e d a s r e n d a s (...). O n o s s o raciocínio
leva-nos, desse modo, à conclusão de que, nas condições
t e m p o r â n e a s , a a b s t i n ê n c i a d o s ricos m a i s p r o v a v e l m e n t e t o l h e d o
q u e f a v o r e c e o c r e s c i m e n t o da riqueza." ( K e y n e s , 1 9 8 3 , p . 2 5 3 - 2 5 4 ) .

A a n á l i s e d e K e y n e s d o c o n s u m o , d o multiplicador, d a p o u p a n ç a e d o s
fatores que determinam o investimento a curto e longo prazos levou-o a apelar
para a intervenção do g o v e r n o n a e c o n o m i a por meio d e políticas fiscais e m o n e -
tárias p a r a o f e r e c e r u m a m b i e n t e s a u d á v e l p a r a a e c o n o m i a c a p i t a l i s t a c o n t i -
nuar crescendo.

" O Estado deverá exercer u m a influência orientadora sobre a proporção


a c o n s u m i r , e m parte a t r a v é s d e s e u s i s t e m a d e t r i b u t a ç ã o , e m p a r t e
p o r m e i o d a f i x a ç ã o d a t a x a d e j u r o s e, e m parte, talvez, r e c o r r e n d o a
o u t r a s m e d i d a s . " (Ibid., p.256).

K e y n e s , p o r é m , e m a l g u m a s s i t u a ç õ e s , d u v i d o u d a e f i c i ê n c i a d a política
m o n e t á r i a e solicitou a i n t e r v e n ç ã o direta d o g o v e r n o por m e i o d o i n v e s t i m e n t o
público e m c o o p e r a ç ã o c o m o setor p r i v a d o :

"Eu entendo, portanto, que uma socialização algo ampla dos


investimentos será o único meio de assegurar u m a situação aproximada
d e pleno e m p r e g o , e m b o r a isso n ã o implique a n e c e s s i d a d e d e excluir
ajustes e fórmulas de toda a espécie que permitam ao E s t a d o c o o p e r a r
c o m a iniciativa p r i v a d a " (Ibid., p.256).
Defendendo a s o c i a l i z a ç ã o do investimento, Keynes não promovia, d e forma
a l g u m a , o estado socialista e m termos de propriedade e controle total dos fatores
d e p r o d u ç ã o " { . . . ) m a s , fora disso, n ã o s e v e n e n h u m a razão e v i d e n t e q u e justifi-
q u e u m s o c i a l i s m o d o E s t a d o a b r a n g e n d o a m a i o r parte d a vida e c o n ô m i c a d a
n a ç ã o " . A o contrário, ele d e f e n d i a a propriedade privada e o s i s t e m a capitalista.

"Porém, acima de tudo, o individualismo, se puder ser purgado de


s e u s defeitos e a b u s o s , é a melhor s a l v a g u a r d a d a liberdade p e s s o a l ,
no sentido d e q u e amplia mais do q u e qualquer outro sistema o c a m p o
para o exercício das liberdades c o m p a r a d o c o m qualquer outro
s i s t e m a , a c r e s c e a m p l a m e n t e o c a m p o p a r a o exercício d a s e s c o l h a s
p e s s o a i s . " (Ibid., p.257).

K e y n e s d e f e n d e u a i n t e r v e n ç ã o d o g o v e r n o por d u a s r a z õ e s principais:
p r i m e i r o , p a r a o f e r e c e r u m a m b i e n t e s ã o p a r a q u e o " j o g o livre d a s f o r ç a s
e c o n ô m i c a s realize t o d a s a s p o t e n c i a l i d a d e s d e s u a p r o d u ç ã o " e, d e p o i s , p a r a
tratar c o m o s d e f e i t o s d o s i s t e m a capitalista e evitar a s u a d e s t r u i ç ã o .

"Por isso, e n q u a n t o a a m p l i a ç ã o d a s f u n ç õ e s d o g o v e r n o , q u e s u p õ e
a tarefa de ajustar a propensão a consumir c o m o incentivo para investir,
p o d e r i a p a r e c e r a u m populista d o s é c u l o X I X o u a u m f i n a n c i s t a
americano contemporâneo u m a terrível transgressão do individualismo,
e u a d e f e n d o , a o contrário, c o m o o único m e i o e x e q ü í v e l d e evitar a
d e s t r u i ç ã o total d a s instituições e c o n ô m i c a s a t u a i s e c o m o c o n d i ç ã o
d e u m b e m - s u c e d i d o exercício d a iniciativa individual." (Ibid., p.257).

Dessa análise, as seguintes observações podem ser deduzidas:


a) o c r e s c i m e n t o e a estabilidade d a e c o n o m i a capitalista estão f o r t e m e n t e
relacionados c o m a distribuição d a r e n d a entre os fatores d a produção;''

b) a c o n c e n t r a ç ã o d a r e n d a é u m resultado natural d o f u n c i o n a m e n t o d a s
f o r ç a s d o livre m e r c a d o no s i s t e m a capitalista d e m e r c a d o ;

c) n a a n á l i s e ricardiana, e s s a c o n c e n t r a ç ã o levará a o E s t a d o e s t a c i o n á -
rio; e m Malthus, ao desemprego e à superprodução; e m Marx, à des-

' Uma das principais causas estabelecidas por Gaibraith para explicar o Great Crash de 1929
foi a má distribuição da renda nos EUA. Em 1929, os 5% mais ricos da população recebiam
quase um terço de toda a renda pessoal (Gaibraith, 1972, p 182-183). De fato, desde a
publicação do livro de Smith, a concentração, e não a competição, tornou-se a regra na
economia capitalista. No estudo de Berle e Means (1932), T h e M o d e r n C o r p o r a t i o n and
Private Property, eles constataram que as 200 maiores corporações não-bancárias nos
EUA tinham perto da metade da riqueza corporativa não-bancária do pais, quase um quarto
do total da riqueza nacional. Citado em Gaibraith (1987, p. 198).
t r u i ç ã o d o s i s t e m a capitalista; e, e m K e y n e s , e s t e s e r á o p r i n c i p a t d e -
feito d o s i s t e m a capitalista, e v i t a n d o q u e o s i s t e m a f u n c i o n e a p r o p r i a -
damente ou m e s m o que funcione;

d) e n q u a n t o R i c a r d o aceitou o resultado c o m o natural, n ã o d e m a n d a n d o ,


a s s i m , q u e o g o v e r n o corrigisse a s i t u a ç ã o , M a l t h u s s u g e r i u g u e r r a s
c o m o instrumento para tratar c o m esse problema e para evitar recessões
n a e c o n o m i a . M a r x , p o r é m , n ã o tinha fé no g o v e r n o , e n q u a n t o K e y n e s
f o i o p r i m e i r o e c o n o m i s t a c a p i t a l i s t a q u e o c h a m o u p a r a intervir
d i r e t a m e n t e e, d e s s e m o d o , p r o p o r c i o n a r o m e l h o r f u n c i o n a m e n t o d o
sistema de mercado.
A principal conclusão desta parte é que a intervenção d o Estado n a economia,
no sentido neoclássico o u n o sentido keynesiano, é efeito d e u m a c a u s a : o sistema
d e livre m e r c a d o n ã o obterá o melhor resultado possível p a r a a s o c i e d a d e . N e s s a
situação, o g o v e r n o não p o d e escolher intervir, o u não, m a s d e v e intervir.

2 - Ataque ao Estado
o a t a q u e a o E s t a d o n ã o é n o v o , v e m d e s d e os e s c r i t o s d e F r i e d m a n , e m
1956, no seu trabalho C a p i t a l i s m o e L i b e r d a d e , e m que ele descreve as des-
v a n t a g e n s d e q u a l q u e r p a p e l alocativo o u distributivo d o g o v e r n o n a e c o n o m i a .
Esse ataque, p o r é m , foi m a i s forte no início dos a n o s 70, oriundo de d u a s direções
d i f e r e n t e s : t e ó r i c a e p r á t i c a . E m nível t e ó r i c o , o a t a q u e v e i o d e três e s c o l a s d e
p e n s a m e n t o : o m o n e t a r i s m o , as e x p e c t a t i v a s racionais e a e s c o l a d a e s c o l h a
pública. E m nível prático, a c o n t e c e u c o m o resultado do f r a c a s s o d a e x p e r i ê n c i a
s o c i a l i s t a , d a r e c e s s ã o e d a c r e s c e n t e d í v i d a p ú b l i c a n o s p a í s e s industrializa-
dos e das crises do Estado nos países em desenvolvimento.^
E m t e r m o s i d e o l ó g i c o s , o conjunto d o p e n s a m e n t o d e s e n v o l v i d o pelas e s -
colas mencionadas é conhecido como n e o l i b e r a l i s m o . O elemento c o m u m
e n t r e e l a s é d e s m a n t e l a r a política e a teoria k e y n e s i a n a e d e f e n d e r a s f o r ç a s
d e livre m e r c a d o como instrumento para organizar a sociedade. Elas s ã o
uma versão mais sofisticada das escolas clássica e neoclássica.
F r i e d m a n , o pai d o m o n e t a r i s m o , r e s u m i u o e n f o q u e d e C h i c a g o p a r a a
política e c o n ô m i c a d a s e g u i n t e f o r m a :

" N a d i s c u s s ã o d a política e c o n ô m i c a , C h i c a g o e s t a b e l e c e a c r e n ç a
n a e f i c i ê n c i a d o m e r c a d o livre c o m o m e i o p a r a o r g a n i z a r r e c u r s o s

Para maiores detalhes sobre as crises do Estado, ver Pereira (1992).


para o ceticismo sobre os assuntos do governo e para a ênfase na
q u a n t i d a d e d e d i n h e i r o c o m o o f a t o - c h a v e n a c a u s a d a inflação"
( L a n d r e t h , Colander, 1994. p.343).

Friedman também elaborou modelos econométricos (Friedman, 1963b;


1 9 6 8 ) , e m q u e m o s t r o u q u e a política m o n e t á r i a é o principal i n s t r u m e n t o d a
política e c o n ô m i c a , e a estabilidade monetária deveria s e r o principal objetivo d a
política m o n e t á r i a . N e s s a s i t u a ç ã o , a i n t e r v e n ç ã o d o g o v e r n o n a e c o n o m i a por
r r i e i õ d à pôríticáfiscál h ã o t è f á ê f é i t ó real sobre á è c ô h ô r r i i â , ã hão ser incrementar
a d í v i d a pública.
A p r e s e n ç a d o q u e c h e g o u a ser c o n h e c i d o c o m o e s t a g f l a ç ã o (a e x i s t ê n -
cia d a inflação j u n t o a o d e s e m p r e g o ) p r e s t o u a p o i o às p o s i ç õ e s m o n e t a r i s t a s e
o f e r e c e u u m a terra fértil p a r a c o l o c a r na prática e s s a s políticas n a Inglaterra e
n o s E U A . O m o n e t a r i s m o , p o r é m , foi s e v e r a m e n t e d e s a f i a d o , ao final d o s a n o s
8 0 ( D o w , Saville, 1 9 8 8 ) , s o b r e diferentes b a s e s , e s p e c i a l m e n t e p o r n ã o s e r c a -
p a z d e explicar a instabilidade d a v e l o c i d a d e d a m o e d a (Blinder, 1 9 8 9 ) .
A escola das e x p e c t a t i v a s racionais, também conhecida como a n o v a
e s c o l a c l á s s i c a , é u m a continuação do monetarismo, mas n u m a forma mais
r a d i c a l . A principal filosofia é q u e q u a l q u e r política e c o n ô m i c a d e l i b e r a d a pelo
g o v e r n o , d e s e n h a d a p a r a influir na alocação d o s r e c u r s o s , n ã o afetará a s variá-
veis reais n a e c o n o m i a , n e m a curto n e m a longo prazo. Robert L u c a s , g a n h a d o r
do Prêmio Nobel de Economia e m 1996, e outros desenvolveram modelos
e c o n o m é t r i c o s a l t a m e n t e sofisticados, implicando q u e t a n t o a realidade c o m o o
futuro são conhecidos e estão predeterminados. Assim, o Governo deveria abs-
t e r - s e d e q u a l q u e r política ativa n a e c o n o m i a . D a v i d s o n ( 1 9 9 7 , p.1) d e s c r e v e u
esses modelos da seguinte maneira:

"(...) os teóricos das expectativas racionais aceitam c o m o u m a v e r d a d e


universal a existência d e u m a realidade p r e d e t e r m i n a d a q u e p o d e s e r
totalmente descrita por funções de probabilidade condicional d e objetivo
imutável. A realidade, então, é imutável, e o caminho futuro d a economia
e a s futuras conseqüências condicionais de todas as escolhas possíveis
e s t ã o p r e d e t e r m i n a d o s (...) e n ã o p o d e m s e r m u d a d o s por a ç õ e s
humanas".

Contrastando esses modelos c o m fatos e experiências c o m o as crises


f i n a n c e i r a s n o S u d e s t e A s i á t i c o , na Rússia e no Brasil entre 1 9 9 7 e 1 9 9 9 , p a r e -
c e q u e o s m e s m o s , t e n t a n d o definir t o d a s a s p o s s í v e i s e s c o l h a s d o futuro d e s -
conhecido, pertencem mais à fantasia do que à realidade.
A e s c o l a d a e s c o l h a pública, c r i a d a por J a m e s B u c h a n a n , P r ê m i o N o b e l
d e 1 9 8 6 , d e s e n v o l v e u a c h a m a d a teoria d a Procura d e R e n d a , q u e significa"(...)
o u s o d e r e c u r s o s e c o n ô m i c o s p a r a obter lucros s e m a c r i a ç ã o d e q u a l q u e r tipo
d e a t i v i d a d e s p r o d u t i v a s " ( T i i e Economist, 1 9 9 1 , p.1). Essa teoria implica q u e á
intervenção do g o v e r n o p o d e contribuir para a a l o c a ç ã o ineficiente d o s recursos
e pode não melhorar a situação. Enfatiza que a intervenção d o Estado, a o contrário
d e promover, t e m distorcido e limitado o bem-estar e c o n ô m i c o d a s o c i e d a d e . A p e -
sar d a s p o s s í v e i s b o a s i n t e n ç õ e s d a s a u t o r i d a d e s políticas, a s a t i v i d a d e s
d i r e t a m e n t e i m p r o d u t i v a s q u e p r o c u r a m r e n d a , tais c o m o o c o m p o r t a m e n t o
dos e m p r e g a d o s estatais, a corrupção e o nepotismo, pioram tudo pela realocação
dos recursos das atividades produtivas para atividades improdutivas (Bhagwati, 1982).
E s s a e s c o l a r e c o n h e c e q u e , j u n t o c o m as f a l h a s d o m e r c a d o , t a m b é m
e x i s t e m as falhas d o g o v e r n o . A s falhas do m e r c a d o , p o r é m , s ã o insignificantes
e m c o m p a r a ç ã o c o m as c o n s e q ü ê n c i a s d a s f a l h a s d o g o v e r n o ( B u c h a n a n ,
Toliison, T u l l o c k , 1 9 8 0 ) . A s c a u s a s d e s t a s últimas s ã o i d e n t i f i c a d a s c o m o : a
f o r m a ç ã o d e g r u p o s d e interesse entre os políticos p a r a controlar a a l o c a ç ã o d e
recursos e c o n ô m i c o s c o n f o r m e os seus interesses, a c o r r u p ç ã o entre r e p r e s e n -
t a n t e s d o g o v e r n o e, f i n a l m e n t e , a falta de políticos c o m p e t e n t e s c o m o n e c e s -
sário c o n h e c i m e n t o e m assuntos econômicos e de negócios e das necessida-
d e s d o setor privado.^
P a r a tratar c o m a s atividades da procura d a r e n d a do g o v e r n o , a e s c o l a d a
escolha pública recomendou o seguinte:

"(...) abolir t o d a i n t e r v e n ç ã o distorcida d o g o v e r n o n o m e c a n i s m o d o


m e r c a d o ; liberalização do c o m é r c i o internacionaP°: e, f i n a l m e n t e ,
r e d u z i r o t a m a n h o do setor público por m e i o d e u m p r o c e s s o d e
privatização" (Martinussen, 1997, p.262-263).

E s s a s r e c o m e n d a ç õ e s t ê m levado a u m a m u d a n ç a n a o p i n i ã o p ú b l i c a e m
favor d e reduzir a s a t i v i d a d e s d o g o v e r n o n u m a série d e p a í s e s .

3 - O fracasso do ataque
o a t a q u e prático e intelectual ao Estado parecia atrativo p a r a a m a i o r i a dos
e c o n o m i s t a s e d o s f o r m u l a d o r e s d e políticas. Refletia-se, p r i m e i r o , n o P r ê m i o
N o b e l d e E c o n o m i a d a d o a o s f u n d a d o r e s d e s s a s e s c o l a s e, s e g u n d o , n a c h e -
g a d a a o p o d e r d e g o v e r n o s c o n s e r v a d o r e s , tais c o m o o d e Margaret T h a t c h e r na

" As atividades de procura de renda não se limitam só ao setor público. Foi demonstrado que
também podia acontecer nas organizações privadas. Em relação a isso, ver Schiiefer e
Vishny (1989), Elding e Stiglitz (1995) e Stem (1991).
'° Krueger (1974, p. 291 -303) foi o primeiro em demonstrar as distorções da competição induzidas
pelo Estado no comércio internacional, através do uso de medidas restritivas, como as quotas.
Inglaterra, e m 1979, e o d e R o n a l d R e a g a n nos E U A , e m 1 9 8 1 , o n d e eles lidera-
ram o ataque contra o estado do bem-estar como ineficiente, oneroso e insus-
t e n t á v e l , p o r t a n t o , h a v i a n e c e s s i d a d e d e reduzir o s e u t a m a n h o .
Para julgar o t a m a n h o d o g o v e r n o na e c o n o m i a , o indicador m a i s u s a d o é a
relação entre os g a s t o s d o g o v e r n o e o Produto Interno Bruto ( P I B ) . O u t r o s dois
indicadores — o percentual d a dívida pública e m relação a o PIB e a participação
d o e m p r e g o público d o g o v e r n o e m relação a o e m p r e g o total — s e r ã o u s a d o s c o m
a m e s m a finalidade. C o m o e s t a análise s e limita a o s países industrializados,
esses i h d í c M õ r é s s e T ã õ l j s ã d õ s p W a l ^ ^
d e 1 9 9 0 n o s sete p a í s e s principais (G7), na União E u r o p é i a (UE) e n a O r g a n i z a -
ção para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Analisahdo-
-se o c o m p o r t a m e n t o d e s s e s indicadores n e s s e s g r u p o s d u r a n t e o m e n c i o n a d o
p e r í o d o , a i m a g e m f a l a por si m e s m a : é o b v i o q u e o t a m a n h o d o g o v e r n o t e m
a u m e n t a d o e que todo o ataque ao Estado não t e m tido resultados lógicos.
A T a b e l a 1 i n f o r m a s o b r e a p a r t i c i p a ç ã o d o g a s t o público e m r e l a ç ã o a o
PIB no G 7 , n a U E e na O C D E no período 1970-95. P o d e m - s e fazer as s e g u i n t e s
o b s e r v a ç õ e s : e m primeiro lugar, e m todo o p e r í o d o , o g a s t o público t e m a u m e n -
t a d o s i g n i f i c a t i v a m e n t e . E s s e a u m e n t o foi d e , a p r o x i m a d a m e n t e , 6 5 % n o G 7 e
7 6 % n a E U ; e m n e n h u m E s t a d o o u g r u p o , e s s a c i f r a foi m e n o r d o q u e o s e u
nível e m 1 9 7 0 . E m s e g u n d o , o t a m a n h o do g o v e r n o r e p r e s e n t a m a i s d e 4 0 % d o
P I B e, e m a l g u n s p a í s e s c o m o a F r a n ç a e a Itália, a l c a n ç a q u a s e 5 4 % e 5 2 %
r e s p e c t i v a m e n t e . Isso significa q u e , e m c a d a d ó l a r p r o d u z i d o n a F r a n ç a , por
e x e m p l o , 5 4 c e n t a v o s v ã o p a r a o g o v e r n o . A t é n a Inglaterra, n o p e r í o d o d o
g o v e r n o c o n s e r v a d o r , e s s a cifra c h e g o u perto d e 4 3 % d o P I B .

Tabela 1
Despesa total do governo, em percentual do PIB, em alguns
países selecionados — 1970-1995

PAÍSES 1970 1975 1980 1985 1990 1991 1992 1993 1994 1995

Canadá 33,5 38,5 38,8 45,3 46,0 49,2 50,2 49,4 47,2 46,5
França 38,5 43,4 46,1 52,1 49,8 50,4 52,0 54,6 54,0 53,9
Alemanha 38,3 48,4 47,9 47,0 45,1 47,9 48,5 49,5 48,9 49,5
Itália 33,0 41,5 42,1 51.2 53,4 53,7 56,3 57,1 54,8 52,1
Japão 19,0 26,8 32,0 31,6 31,3 30,9 31,7 33,7 34,4 35,7
Reino Unido .... 36,7 44,4 43,0 44,0 39,9 40,7 43,1 43,5 43,1 43,2
Estados Unidos 30,0 32,8 31,4 32,9 32,8 33,4 34,4 33,9 33,0 33,2
G7 27,2 33,2 40,2 43,4 42,6 43,7 45,2 46,0 45,1 44,9
Países europeus... 32,1 39,3 43,0 48,1 45,8 46,5 47,6 49,2 48,5 47,9
OCDE 36,5 38,9 38,4 39,3 40,5 41,1 40,3 40,3
FONTE DOS DADOS BRUTOS: PUBLIC MANAGEMENT REFORM AND ECONOMIC AND
SOCIAL DEVELOPMENT (1998). Paris: O E C D ; Minis-
terial Symposium on the Future of Public Services, p.66.
A m e s m a t e n d ê n c i a aplica-se à p r o p o r ç ã o d a dívida pública e m relação a o
PIB. O s d a d o s d i s p o n í v e i s (Tabela 2) m o s t r a m q u e , n o s países d o G 7 , n a U E e
na O C D E , a dívida pública cresceu drasticamente, quase dobrou e m todas as
c a t e g o r i a s . E m p a í s e s c o m o o C a n a d á e a Itália, a dívida p ú b l i c a e l e v o u - s e
n u m a f o r m a tal q u e c h e g o u a m a i s de 1 0 0 % d o P I B . Na Itália, p o r e x e m p l o , o u
a c r e s c e u d e 38,1 % e m 1970 p a r a 1 2 4 , 7 % e m 1995, u m a u m e n t o d e 2 7 3 % . Nos
E s t a d o s U n i d o s , a u m e n t o u d e 4 1 , 5 % até 6 3 , 4 % , u m c r e s c i m e n t o d e a p r o x i m a -
d a m e n t e , 5 3 % . S ó n o R e i n o U n i d o , e s s e n ú m e r o foi m e n o r d o q u e o s e u nível
e m 1 9 7 0 . D i m i n u i u d e 77,1 % p a r a 6 0 % . E s s a baixa ( 2 8 % ) , p o r é m , t e v e m a i s a
ver c o m o período p r é - c o n s e r v a d o r (1970-80) do q u e c o m as políticas e as práti-
cas neoliberais após 1980.

Tabela 2
Divida pública bruta do governo, em percentual do PIB, em alguns
paises selecionados — 1970-1995

PAlSES 1970 1975 1980 1985 1990 1991 1992 1993 1994 1995

Canadá 52,8 43,3 44,0 64,1 72,5 79,4 87,2 94,4 97,5 100,5
França 30,9 38,6 40,2 41,0 45,8 53,0 56,4 60,7
Alemanha 18,1 23,8 31,1 42,8 45,5 44,4 45,8 51,9 51,7 62,2
Itália 38,1 57,6 58,1 82,3 104,5 108,4 117,3 118,9 125,5 124,7
Japão 11,5 22,4 51,2 67,0 65,1 62,4 63,6 67,4 73,1 80,6
Reino Unido 77,1 61,6 54,0 58,9 39,3 40,6 47,6 56,6 54,3 60,0
Estados Unidos 41,5 39,9 37,0 49,5 55,5 59,5 61,8 63,3 62,8 63,4
G7 39,9 41,4 43,8 57,6 60,4 62,2 67,0 72,2 74,5 78,9
UE 40,7 49,6 45,6 69,3 71,5 73,2 78,0 84,7 84,7 86,6
OCDE 40,2 54,4 57,1 58,9 62,2 66,1 67,5 70,6

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PUBLIC MANAGEMENT REFORM AND ECONOMIC AND
SOCIAL DEVELOPMENT (1998). Paris: OECD; Minis-
terial Symposium on the Future of Public Services, p.65.

A p a r t i c i p a ç ã o d o e m p r e g o público e m r e l a ç ã o a o e m p r e g o total é o u t r o
indicador possível d e ser u s a d o para medir o t a m a n h o d o g o v e r n o n a e c o n o m i a .
A Tabela 3 m o s t r a q u e a participação do e m p r e g o no g o v e r n o foi maior e m 1995
d o q u e e m 1 9 7 0 , a p e s a r d e t o d o s os p r o c e s s o s d e p r i v a t i z a ç ã o o c o r r i d o s n o s
p a í s e s d e s e n v o l v i d o s . E x c e t o no R e i n o U n i d o , o n d e o g o v e r n o foi c a p a z d e
reduzir o e m p r e g o p ú b l i c o e m 2 4 % , e n o s E U A , e m 3 % , e m t o d o s o s o u t r o s
p a í s e s , o e m p r e g o público e r a m a i s alto d o q u e o s e u nível e m 1970. N a m é d i a ,
a u m e n t o u 2 0 % no G 7 e 3 2 % n a U E (Tabela 3 ) .
Emprego público, em percentual do emprego total, em alguns -
países selecionados — 1970-1995

PAÍSES 1970 1975 1980 1985 1990 1991 1992 1993 1994 1995

Canadá 19,20 20,90 19,50 20,70 20,50 21,40 21,90 21,80 21,50 20,70
França.. 18,00 19,20 20,20 22,80 22,60 22,90 23,50 24,30 24,60 24,70

Alemanha... 11,20 13,80 14,60 15,50 15,10 15,90 16,10 16,00 15,80 15,60
Itália.... 12,20 14,40 15,40 16,70 17,30 17,20 17,40 17,70 17,90 17,80
Japão 7,70 8,70 8,80 8,70 8,10 8,10 8,10 8,20 8,40 8,30
Reino Unido 18,10 20,80 21,20 21,50 19,40 19,50 19,20 17,00 14,90 14,30

Estados Unidos 16,00 17,10 16,40 15,30 15,40 15,60 15,70 15,70 15,50 15,50

G7 14,60 16,40 16,60 17,30 16,90 17,20 17,40 17,20 16,90 16,70

UE 11,90 13,90 15,60 17,10 16,90 17,10 14,40 17,50 17,30 17,70

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PUBLIC MANAGEMENT REFORM A N D ECONOMIC AND


SOCIAL DEVELOPMENT (1998). Paris: OECD; Minis-
terial Symposium on the Future of Public Services, p.71.

A p e r g u n t a q u e surge é: por q u e , apesar d a política e d a filosofia neoliberal,


na t e o r i a e n a p r á t i c a , o s g o v e r n o s n ã o c o n s e g u i r a m reduzir o s e u t a m a n h o n a
e c o n o m i a e n ã o c o n s e g u i r a m deter o s e u c r e s c i m e n t o ? H á três r a z õ e s p a r a
isso, q u e s e r ã o vistas a seguir.

3.1 - Política social


O p a p e l d a política social é reduzir a d e s i g u a l d a d e d e r e n d a na s o c i e d a d e ,
a t r a v é s d e p r o g r a m a s de s a ú d e , e d u c a ç ã o e s e g u r i d a d e social. O s e u principal
objetivo é distributivo. A evidência mostra que os g o v e r n o s n ã o f o r a m c a p a z e s de
reduzir o u d e t e r o s s e u s g a s t o s p a r a p r o p ó s i t o s s o c i a i s , q u e c o n t i n u a r a m s e
e l e v a n d o e m r e l a ç ã o a o PIB e f o r m a m o principal c o m p o n e n t e d o s g a s t o s d o
governo.
Gasto social do governo, em percentual do PIB, em alguns paises selecionados — 1980-93

PAlSES 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986

Canadá 5,7 5,9 7,4 7,2 7,2 7,2 7,4


França 15,7 16,8 17,6 17,9 18,0 18,1 17,8
Alemanha 0,0 18,0 18,4 17,8 17,2 16,9 16,5
Itália 12,4 14,1 14,5 15,5 15,2 15,4 15,4
Japão 5,1 5,5 5,8 5,9 5,9 6,3 6,3
Reino Unido 11,3 12,4 12,7 12,8 12,9 12,5 12,5
EUA 8,2 8,8 8,9 8,7 8,2 8,1 8,1
G7 9,7 11,6 12,2 12,3 12,1 12,1 12,0
UE 13,7 13,4 15,4 15,6 15,4 15,3 15,1

PAÍSES 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993

Canadá 7,2 7,0 7,1 7,8 8,6 8,8


França 17,5 17,5 16,5 16,6 16,9 17,3 18,0
Alemanha 16,7 16,5 16,0 15,3 16,6 17,2 18,4
Itália 15,2 15,1 15,4 15,7 15,8 17,0 17,5
Japão 6,1 6,0 5,9 5,9 5,9 6,3 6,6
Reino Unido 11,8 10,9 10,5 11,0 11,8 12,6 12,8
EUA 7,9 7,7 7,7 8,1 8,5 8,6 8,6
G7 11,8 11,5 11,3 11,5 12,0 12,5 13,7
UE 15,0 14,7 14,4 14,6 15,1 15,5 15,9

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PUBLIC MANAGEMENT REFORM A N D ECONOMIC AND


SOCIAL DEVELOPMENT (1998). Paris: OECD;
Ministerial Symposium on the Future of Public
Services, p.68.

A Tabela 4 m o s t r a a e v o l u ç ã o d o s gastos sociais d o g o v e r n o e m relação a o


P I B no G 7 e n a U E . É i m p o r t a n t e o b s e r v a r q u e o s g a s t o s sociais e m f o r m a d e
s e g u r i d a d e social e o u t r a s t r a n s f e r ê n c i a s e subsi'dios a u m e n t a r a m q u a s e 4 0 %
n o período 1980-93 no G 7 e 1 6 % n a U E . C o m p a r a n d o - s e a s Tabelas 4 e 1 , pode-
-se verificar q u e o p e s o d e s s e s g a s t o s e m r e l a ç ã o a o g a s t o total d o g o v e r n o
t a m b é m a u m e n t o u n e s s e m e s m o p e r í o d o . O a r g u m e n t o e c o n ô m i c o p a r a expli-
car o f r a c a s s o d o g o v e r n o e m reduzir e s s e s g a s t o s é e s t a r e m as d e s p e s a s c o m
s a ú d e , e d u c a ç ã o e s e g u r i d a d e social dirigidas à r e d u ç ã o d a d e s i g u a l d a d e e a o
melhoramento d a distribuição da renda na sociedade e por esses bens serem
c o n s i d e r a d o s d e luxo, p o i s , à m e d i d a q u e a r e n d a d a s o c i e d a d e a u m e n t a , a
d e m a n d a p o r eles t a m b é m s e a m p l i a . A s s i m , n a p r o p o r ç ã o e m q u e a s o c i e d a d e
s e t o r n a m a i s rica, m a i s r e c u r s o s d e v e r i a m s e r a l o c a d o s p a r a e d u c a ç ã o , s a ú -
de, aposentadoria e desemprego.
O u t r o a s p e c t o r e l a c i o n a d o c o m a política s o c i a l é a f u t u r a e s t r u t u r a
demográfica das populações. As projeções da estrutura de idade dos cinco
p a í s e s m a i o r e s m o s t r a m q u e as p o p u l a ç õ e s s e tornarão p r o g r e s s i v a m e n t e m a i s
velhas. N u m prazo de 2 0 anos, mais de 2 0 % da sua população terá mais de 65
anos. Ainda mais, o grau de dependência calculada entre a população c o m
i d a d e inferior a 14 a n o s e c o m m a i s d e 6 5 a n o s d e i d a d e e m r e l a ç ã o à P o p u l a -
ç ã o E c o n o m i c a m e n t e A t i v a (16-64 a n o s ) a u m e n t a r á . A s s i m , e n q u a n t o a m é d i a
d e s s e g r a u d e d e p e n d ê n c i a , n e s s e s p a í s e s , foi d e 5 1 % e m 1 9 8 0 , é e s t i m a d a
que seja de 6 5 , 2 % e m 2050, um aumento aproximado de 2 8 % . Esses números
d e v e r i a m ter u m efeito significativo e u m g r a n d e p e s o n a política s o c i a l .

Tabela 5

Estruturas de idade das populações em alguns países selecionados — 1980-2050

{%)

PAÍSES 1980 2000 2020 2040 2050

EUA 15 a 64 66 67 65 61 62
65 e mais 11 12 16 19 19
Reino Unido 15 a 64 64 65 64 62 62
65 e mais 15 14 16 20 19
Canadá 15 a 64 68 68 64 59 60
65 e mais 10 13 16 22 21
Japão 15 a 64 67 67 62 60 60
65 e mais 9 15 21 23 23
Alemanha 15 a 64 66 67 65 57 59
65 e mais 16 18 22 28 24

F O N T E : BALL, James (1994). T h e w o r l d e c o n o m y : trends a n d prospects for the next


decade. Londres : Needhams Design. p.57.
Tãbèlae - -

Gtau de dependência da população inativa em relação à PEA em alguns


paises selecionados — 1980-2050

PAÍSES 1980 2000 2020 2040 2050

EUA 51,1 51,6 49,8 62,4 62,5

Reino Unido 56,2 51,9 53,8 61,9 60,2

Canadá 48,1 47,4 47,9 66,5 67,7

Japão 48,4 42,2 48,6 59,5 65,7

Alemanhia 50,8 44^0 48^3 687 69,9

FONTE: BALL, James (1994). T h e w o r l d e c o n o m y ; trends and prospects for the next
decade. Londres ; Needhams Design. p.57.

NOTA; O grau de dependência é calculado como segue;

(população de O a 14 anos + população de 65 anos e mais / população de 15 a 64 anos) x 100.

3.2 - A privatização de empresas públicas

E m p r e s a s públicas f o r a m estabelecidas para alcançar o u c u m p r i r objetivos


sociais, c o m o f o r m a de socialização do investimento, para usar a terminologia
d e K e y n e s . Elas f o r a m e s t a b e l e c i d a s o n d e s e p e n s a q u e o m e r c a d o constitui
u m m o n o p ó l i o n a t u r a l — p r o d u ç ã o d e á g u a , d e g á s , d e eletricidade, d e transpor-
te e de c o m u n i c a ç õ e s — e o n d e se p e n s a v a q u e o serviço e r a u m a n e c e s s i d a d e
social e e c o n ô m i c a — e s t a b e l e c i m e n t o d e u m s i s t e m a b a n c á r i o p ú b l i c o , o u
p r o d u ç ã o direta d e b e n s n o s quais o capital p r i v a d o não e s t á i n v e s t i n d o . E s s a s
e m p r e s a s s e r v i r a m corno u m instrumento na inten/enção direta d o g o v e r n o c o m o
f o r m a d e corrigir a s f a l h a s d o m e r c a d o "ou para m e l h o r a r o r e s u l t a d o d o m e r c a -
do". O s p a í s e s i n d u s t r i a l i z a d o s d e r a m - s e c o n t a d e s e u s limites n o p r o c e s s o d e
p r i v a t i z a ç ã o . E l e s r e c o n h e c e r a m q u e trocar o m o n o p ó l i o p ú b l i c o por u m m o n o -
pólio p r i v a d o n ã o serviria a o b e m - e s t a r social, pois o p r o b l e m a n ã o é d e proprie-
d a d e pública, m a s d e concorrência.
N u m e s t u d o feito por Kikeri, Nellis e Shirly ( 1 9 9 4 , p . 2 4 7 ) , foi d e m o n s t r a d o
q u e , n o p e r í o d o 1 9 8 0 - 9 2 , m a i s d e 15.000 e m p r e s a s f o r a m p r i v a t i z a d a s n o m u n -
d o : 71 % n a e x - A l e m a n h a O c i d e n t a l , 1 8 % na E u r o p a O r i e n t a l e n a Á s i a C e n t r a l
e 6 % na América Latina e no Caribe. É interessante notar que, e m todos os
países d a O C D E ( c o m e x c e ç ã o d a A l e m a n h a ) , a privatização n ã o c o r r e s p o n d e u
a mais d e 1 % . Foi n e s s e s países q u e a filosofia e a ideologia neoliberal a c h a r a m
raízes. O u t r o s e s t u d o s f o r a m realizados e m países d e s e n v o l v i d o s e e m d e s e n -
v o l v i m e n t o p a r a verificar a relação entre p r o p r i e d a d e e eficiência. D e m o n s t r o u -
-se q u e a c o n c o r r ê n c i a r e g u l a d a é m u i t o m a i s i m p o r t a n t e d o q u e a p r o p r i e d a d e
e m relação à eficiência econômica:

"(...) n ã o é t a n t a a d i f e r e n ç a n a (...) p r o p r i e d a d e , m a s a falta d e


c o n c o r r ê n c i a q u e leva à f r e q ü e n t e m e n t e o b s e r v a d a p r o d u ç ã o m e n o s
eficiente n a p r o p r i e d a d e pública, (se há) suficiente c o n c o r r ê n c i a entre
p r o d u t o r e s públicos e privados, as diferenças no c u s t o por u n i d a d e sé
t o r n a m insignificantes" ( B o r c h e r r d i n g , P o m m e r e h n e , Scheider, a p u d
Kikeri, Nellis, Shirly, 1 9 9 4 , p . 2 4 9 - 2 5 0 ) .

3.3 - Regulações
O principal p a p e l d a r e g u l a ç ã o é tratar c o m o s p r o b l e m a s d a s f a l h a s d o
m e r c a d o . N ã o h á d ú v i d a de q u e a f u n ç ã o d o E s t a d o c o m o r e g u l a d o r está c r e s -
c e n d o c o m o t e m p o . A incerteza, o c o n h e c i m e n t o i m p e r f e i t o , o m o n o p ó l i o e as
externalidades são razões para implementar regulações a fim de melhorar o
bem-estar social. A i n d a q u e governos, hoje, na E u r o p a f a l e m s o b r e flexibilização
d a política d e s a l á r i o s e m m u i t o s p a í s e s , n ã o h á d ú v i d a d e q u e a g l o b a l i z a ç ã o ,
a tecnologia e a concorrência terão um impacto dramático nas rendas da mão-
- d e - o b r a n ã o e s p e c i a l i z a d a ( M u n d o . . . , 1 9 9 5 ) . Isso j á v e m a c o n t e c e n d o n o s paí-
s e s i n d u s t r i a l i z a d o s , p r i n c i p a l m e n t e n o s E U A , no J a p ã o e n a E u r o p a , o n d e a
desigualdade, a insegurança no e m p r e g o e a política salarial p e r m a n e c e r ã o c o m o
á r e a s i m p o r t a n t e s p a r a o g o v e r n o regular o m e r c a d o .
O e s t a b e l e c i m e n t o , pelo g o v e r n o , d e p r e ç o s p a r a o s m o n o p ó l i o s c o n t i -
n u a r á t e n d o a m a i o r i m p o r t â n c i a p a r a o b e m - e s t a r social. De m a n e i r a a l g u m a , o
e s t a b e l e c i m e n t o d e p r e ç o s p a r a á g u a s , eletricidade e t e l e c o m u n i c a ç õ e s s e r á
d e i x a d o à d e t e r m i n a ç ã o d o m e r c a d o . O m e r c a d o d o s i s t e m a c a p i t a l i s t a virtual-
m e n t e d e s a p a r e c e u . Está-se a s s i s t i n d o a u m s i s t e m a c a p i t a l i s t a s e m m e r c a -
do. A formação dos mercados monopolistas e oligopolistas não é nova, mas
e s t á a u m e n t a n d o d r a m a t i c a m e n t e d e v i d o à s t e n d ê n c i a s d e f u s ã o e n t r e as e m -
presas. O Q u a d r o 1 mostra alguns indicadores da concentração mundial para
oito i n d ú s t r i a s .
Quadro 1

Indicadores de concentração mundial em algumas indústrias — 1984-1989

Automóveis 1984 12 empresas respondem por 7 8 % da produção


mundial

Peças 1988 3 empresas respondem por 5 3 % da produção


mundial
7 empresas respondem por 8 8 % da produção
mundial

Pneus 1988 6 empresas respondem por 8 5 % da produção


mundial

Processamento de dados/DRAM 1987 5 empresas respondem por 6 5 % da produção


mundial
10 empresas respondem por 100% da produção
mundial

Processamento de dados/ASIC 1988 12 empresas respondem por 100% da produção


mundial
7 empresas respondem por 9 0 % da produção
mundial

Produtos petroquímicos 1989 4 empresas respondem por 3 4 % da produção


mundial

Polipropileno 1980 8 empresas respondem por 5 0 % da produção


mundial

Poliestireno 1980 4 empresas respondem por 51 % da produção


mundial
8 empresas respondem por 6 9 % da produção
mundial
FONTE: CHESNAIS, François (1996). A m u n d i a l i z a ç ã o d o capital. S ã o Pauto : Xamã.
p. 95.

A i n d a m a i s , a instabilidade d o s m e r c a d o s financeiros e a q u e s t ã o a m b i e n t a l
são outros casos clássicos e m que o governo tem de desenvolver um papel
principal p a r a p r o m o v e r o c o n t r o l e a m b i e n t a l e estabilizar o s m e r c a d o s f i n a n c e i -
ros p o r m e i o d a r e g u l a ç ã o .
Olhados e m conjunto, essas observações representam uma implicação
empiVica i n t e r e s s a n t e p a r a o s q u e e x i g e m a r e d u ç ã o d o p a p e l d o g o v e r n o n a
e c o n o m i a , isto é, n a m é d i a , o s g o v e r n o s e m p a í s e s d e s e n v o l v i d o s e s t ã o - s e
tornando maiores e há indicações de que o seu t a m a n h o a u m e n t a r á ainda mais
no f u t u r o .
4 - Conclusões
Neste trabalho, mostrou-se que a intervenção do governo na economia é
efeito d e u m a c a u s a . É u m a c o n s e q ü ê n c i a d a f a l h a d o m e r c a d o e m a l c a n ç a r a
a l o c a ç ã o eficiente d e recursos e redistribuir a r e n d a d e m a n e i r a m a i s equitativa
entre o s fatores de p r o d u ç ã o p a r a garantir o f u n c i o n a m e n t o d o s i s t e m a capitalis-
t a . N e s s e c a s o , o g o v e r n o d e v e tratar e s s e s p r o b l e m a s p o r m e i o d a r e g u l a ç ã o
e d e políticas d e redistribuição. A s s i m s e n d o , o p a p e l do g o v e r n o na e c o n o m i a é
indispensável.
A p e s a r d e t o d o s os sofisticados a t a q u e s teóricos a o g o v e r n o e d o f r a c a s s o
dos ex-países socialistas, a evidência mostra que os países do G 7 , d a União
E u r o p é i a e d a O C D E n ã o f o r a m c a p a z e s d e reduzir o u s e q u e r d e restringir o
t a m a n h o d o g o v e r n o n a e c o n o m i a . A o c o n t r á r i o , ele c r e s c e u c o m o t e m p o até
c h e g a r a, a p r o x i m a d a m e n t e , 4 5 % d o P I B , h a v e n d o sinais d e q u e e s s e papel
crescerá ainda m a i s no futuro. Essas observações, d e fato, d e s t r o e m exatamente
a s b a s e s intelectuais s o b r e a s q u a i s s e a s s e n t a m as e s c o l a s q u e a t a c a m a
intervenção d o E s t a d o na e c o n o m i a .
S e o p a p e l d o g o v e r n o na e c o n o m i a é a s s i m i n d i s p e n s á v e l , o g o v e r n o n ã o
p o d e e s c o l h e r s e d e v e intervir o u n ã o , s ó p o d e e s c o l h e r c o m o intervir. N ã o h á
d ú v i d a de q u e o s g o v e r n o s e r r a m e, às v e z e s , n ã o d e s e m p e n h a m s u a s f u n ç õ e s
eficientemente e m algumas áreas, mas a questão é se a situação da sociedade
está m e l h o r c o m o u s e m o g o v e r n o . T a m b é m p o d e ser d i s c u t i d o se o s instru-
m e n t o s u s a d o s p e l o g o v e r n o s ã o eficientes p a r a c u m p r i r a s u a f u n ç ã o ; p o d e m
ser r e f o r ç a d o s , a u m e n t a n d o a s u a eficiência e n ã o o s d e s t r u i n d o e, a s s i m , d e s -
truindo o setor público.
F i n a l m e n t e , a s c o n c l u s õ e s d e s t e t r a b a l h o s e r v e m c o m o u m a b o a lição
p a r a os países e m d e s e n v o l v i m e n t o q u e t e n t a m copiar m o d e l o s e l a b o r a d o s nos
p a í s e s d e s e n v o l v i d o s . Eles t ê m q u e estar c o n s c i e n t e s d a d i f e r e n ç a e n t r e as
teorias e os fatos.

Bibliografia
B A L L , J a m e s . ( 1 9 9 4 ) . T h e w o r l d e c o n o m y : t r e n d s a n d p r o s p e c t s for t h e next
decade. L o n d r e s : Needhams Design.

B A U M O L , W. J . (1965). Economic theory and operational analysis.


E n g l e w o o d Cliffs : Printice Hall.

B H A G W A T I , J . ( 1 9 8 2 ) . Directiy U n p r o d u c t i v e P r o f i t - S e e k i n g Activities ( D U P ) .
J o u r n a l o f P o l i t i c a l E c o n o m y , v.90, n.5, p . 9 8 8 - 1 0 0 2 .
B L I N D E R , A l a n (1989). T h e e c o n o m i c m y t h s t h a t the 1980sexplodeGl. B u s i n e s s
Weel<, 2 7 nov. 2 7 , p.15.

B R E S S E R P E R E I R A , Luiz C a r l o s v e r P E R E I R A , Luiz C a r l o s Bresser.

B U C H A N O N , J . , R O B E R T T o l i i s o n , G O R D O N Tullock, eds. (1980). T o w a r d a


t l i e o r y o f t h e r e n t - s e e k i n g s o c i e t y . Collage Station : Texas A & M University
Press.

C H E S N A I S , Francois ( 1 9 9 6 ) . A m u n d i a l i z a ç ã o d o c a p i t a l . S ã o P a u l o : X a m ã .

D A V I D S O N , P a u l ( 1 9 9 7 ) . Reality a n d e c o n o m i c theory. J P K E .

D O W , J . C . R., S A V I L L E , I. D. ( 1 9 8 8 ) . A c r i t i q u e o f m o n e t a r y p o l i c y : t h e o r y
a n d british e x p e r i e n c e . L o n d r e s : O x f o r d University.

E D L I N , A a r o n , S T I G L I T Z , J o s e p h E. ( 1 9 9 5 ) . D i s c o u r a g i n g rivais: managerial
rent-seeking a n d economic inefficiencies. A m e r i c a n E c o n o m i c R e v i e w ,
v.85,n.5,p.1301-1312.

F E R G U S O N , C . a n d J . G o u l d ( 1 9 7 5 ) . M i c r o e c o n o m i c t h e o r y . Illinois: R i c h a r d
D. In/vin.

F R I E D M A N , Milton. (1963b). A m o n e t a r y h i s t o r y o f t h e U n i t e d States, 1867-


- 1 9 6 0 . P r i n c e t o n : Princeton U n i v e r s i t y

F R I E D M A N , Milton. ( 1 9 6 8 ) . T h e role of monetary policy. A m e r i c a n E c o n o m i c


R e v i e w , p.1-17, M a r .

G A L B R A I T H , J . K. ( 1 9 7 2 ) . T h e g r e a t c r a s h , 1 9 2 9 . B o s t o n : H o u g h t o n Mifflin
Company.

G A L B R A I T H , J . K. ( 1 9 8 9 ) . O p e n s a m e n t o e c o n ô m i c o e m p e r s p e c t i v a : u m a
história crítica. S ã o P a u l o : E d i t o r a d a USP.

G A L B R A I T H , J . K. ( 1 9 9 2 ) . A c u l t u r a d o c o n t e n t a m e n t o . S ã o P a u l o : E d i t o r a
Pioneira.

G E O R G E S C U - R O E G E N , N. ( 1 9 6 7 ) . Analytical e c o n o m i c s . Cambridge :
H a r v a r d University Press.

G R A A F F , J . d e V. ( 1 9 5 7 ) . Theoretical welfare economics. N e w York :


C a m b r i d g e University.

G R E E N W A L D , B r u c e , S T I G L I T Z , J o s e p h E. (1986). Externalities in e c o n o m i c s
w i t h i m p e r f e c t i n f o r m a t i o n a n d i n c o m p l e t o markets. Q u a r t e r l y J o u r n a l o f
E c o n o m i c s , v , 1 0 1 , n.3, p.229-264.
K E Y N E S , J . M. (1983). Teoria g e r a l d o e m p r e g o , d o j u r o e d o d i n h e i r o .
S ã o P a u l o : Abril C u l t u r a l .

K I K E R I , S., N E L L I S , J . , S H I R L E Y , M. (1994). Privatization: l e s s o n s f r o m m a r k e t


economies. W o r l d B a n k Research Observer, Washington, D.C.: Banco
M u n d i a l , V.9, n.2.

K R U E G E R , A n n e ( 1 9 7 4 ) . T h e political e c o n o m y of t h e r e n - s e e k i n g society.
A m e n c a n E c o n o m i c R e v i e w , v^64^ n^.3, p.291 - 3 0 3 .

L A N D R E T H , Harry, C O L A N D E R , D a v i d (1994). H i s t o r y o f e c o n o m i c t h o u g h t .
B o s t o n : H o u g h t o n Mifflin C o m p a n y .

M A L T H U S , T h o m a s ( 1 7 9 8 ) . A n e s s a y o n t h e p r i n c i p i e o f p o p u l a t i o n : reprints
of e c o n o m i c c l a s s i c s . N e w York : A. M. Kelley. 1 9 6 5 .

MALTHUS, T h o m a s (1820). P r i n c i p i e s o f p o l i t i c a l e c o n o m y : reprints of


e c o n o m i c c l a s s i c s . N e w York : A. M. Kelley. 1 9 5 1 .

M A L T H U S , T h o m a s (1983). P r i n c í p i o s d e e c o n o m i a p o l í t i c a . S ã o Paulo :
N o v a Cultural.

M A R S H A L L , Alfred (1920). P r i n c i p i e s of e c o n o m i c s . London : Macmilian.

M A R T I N U S S E N , J o h n . (1997). S o c i e t y , S t a t e & M a r k e t . Atlantic Highiands :


Zed Books.

M A R X , Karl. ( 1 9 7 4 ) . C a p i t a l : a critique of political e c o n o m y . M o s c o w : Progress


P u b l i s h e r s . v.3.

M U N D O dei t r a b a j o e n u n a e c o n o m i a i n t e g r a d a , El ( 1 9 9 5 ) . W a s h i n g t o n , D . C . :
Banco Mundial.

0 ' C O N N E R , J a m e s ( 1 9 7 3 ) . Scientific a n d ideological e l e m e n t s in t h e e c o n o m i c


t h e o r y of g o v e r n m e n t policy. In: H U N T E. K., S C H W A R T T Z , J . G., e d s . A
c r i t i q u e o f e c o n o m i c t h e o r y . Baltimore : Penguin Books.

O S E R , Jacob, B L A N C H F I E L D William (1989). História do Pensamento


E c o n ô m i c o . S ã o P a u l o : Editora A t l a s .

P E R E I R A , Luiz C a r l o s B r e s s e r ( 1 9 9 2 ) . A c r i s e d o e s t a d o . S ã o P a u l o : N o b e l .

P U B L I C M a n a g e m e n t Reform and Economic and Social Development (1998).


Paris : O E C D Ministerial S y m p o s i u m o n t h e Future of P u b l i c S e r v i c e s .

R I C A R D O , David (1988). P r i n c í p i o s d e e c o n o m i a política e t r i b u t a ç ã o . São


P a u l o : N o v a Cultural.
S H L E I F E R . A n d r e i , VISHNY, Robert (1989). M a n a g e m e n t entrenehment: the
c a s e of m a n a g e r - s p e c i f i c i n v e s t m e n t s . J o u r n a l o f F i n a n c i a l E c o n o m i c s ,
v.25,n.1,p.567-82.

S M I T H , A d a m (1978). T h e w e a l t h of n a t i o n s . New York : Penguin Books.

SMITH, A d a m (1993). R i q u e z a d a s n a ç õ e s . Lisboa : Fundação Calouste


Guibenkian. v.1,2.

S T E R N , Nicholas (1991). Public policy a n d t h e e c o n o m i c s of d e v e l o p m e n t .


E u r o p e a n E c o n o m i c R e v i e w , v.35, n.2/3, p.241 - 2 7 1 .

STIGLITZ, J o s e p h E. (1988). Techonological change, s u n k costs, a n d cornpetition.


In: BAILY, Marttin N e a l , W I N S T O N , Glifford, e d s . B r o o k i n g s p a p e r s a c t i v i t y .
W a s h i n g t o n , D C : B r o o k i n g s Institution. p . 8 8 3 - 9 4 7 .

S T I G L I T Z , J o s e p h E. ( 1 9 9 6 ) . T h e role of g o v e r n m e n t in e c o n o m i c d e v e l o p m e n t .
in: A N N U A L W O R L D BANK CONFERENCE ON DEVELOPMENT
E C O N O M I C S 1996. Washington, D.C.: Banco Mundial.

S T I G L I T Z . J o s e p h E. ( 1 9 9 6 ) . S o m e l e s s o n s f r o m t h e east a s i a n m i r a c l e .
R e s e a r c h O b s e r v e r , B a n c o M u n d i a l , v i 1, p.151 - 1 7 7 , A u g .

VIKERS, J., Y A R R O W G. (1988). Privatization: an economic analysis.


C a m b r i d g e , M A : MIT Press.

W I N C H , D. M. ( 1 9 7 1 ) . A n a l y t i c a l w e l f a r e e c o n o m i c s . Baltimore : Penguin
Books.

Você também pode gostar