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QU ESTOES & DEBATES
ANO 10 NÚMEROS 18 E 19 JUNHO E DEZEMBRO DE 1989
ISSN 0100-6932
D É C IO R O B E R T O S Z V A R Ç A
M A R IA L Ú C IA C ID A D E
E s tu d a n te s do M e s tr a d o em H is t ó r ia do B r a s il,
UFPR.
RESUMO
* U m a p r im e ir a v e r s ã o d e s te t e x t o f o i a p r e s e n t a d a à d is c ip lin a de M é to d o s e
T é c n ic a s d e P e sq u is a H is t ó r ic a IV , d o c u r s o d e H is t ó r ia d a U F P R , c o m o t r a b a lh o d e
c o n c lu s ã o d o b a c h a r e la d o , s o b o r ie n t a ç ã o d a s p r o fe s s o r a s M a r ia I g n ê s M a n c in i d e B o n i,
re s p o n s á v e l p e la d is c ip lin a e A n a M a r ia B u rm e s te r , c u jo e n tu s ia s m o e e n v o lv im e n to
c o m o te m a m u ito n o s m o tiv a ra m .
E stá em a n d a m e n t o p e s q u is a s o b r e o m e sm o t e m a à n ív e l d e m e s tra d o , r e a liz a d a
p o r M a r ia L ú cia C id a d e . F o i lo c a liz a d a n o v a e a b u n d a n te d o c u m e n t ç ã o s o b r e P lín io
S a lg a d o , à q u a l n ã o tiv e m o s a c e s s o d u r a n te a e la b o r a ç ã o d e s te t e x t o , o a u e p e r m it ir á
o e n r iq u e c im e n to d a s r e fle x õ e s aq u i d e s e n v o lv id a s .
A g ra d e c e m o s p a r ticu la r m e n te a F r a n c is c o M o r a e s P a z, co o rd e n a d o r d o p r o je t o d e
H is t ó r ia P o lít ic a d o IP A R D E S , p e la le it u r a c r ít ic a d a p r im e ir a v e r s ã o e s u g e s tõ e s ,
c u ja i n c o r p o r a ç ã o ou n ã o a o p r e s e n te t r a b a lh o , d e s n e c e s s á r io d iz e r, é de n o s s a in te ir a
r e s p o n s a b ilid a d e .
de grande parcela da população, podendo significar uma
reação ao estado de coisas vigentes no país, a confirmação
deste, apenas a manifestação de uma simpatia pessoal ou
mesmo um deboche, negação ao próprio processo político
instituído... As mais diferentes tendências estão presentes
neste ato.
1 S o b re a e s tr u tu r a , o r g a n iz a ç ã o e o r ig e m d a m ilit â n c ia d a A ç ã o I n t e g r a lis t a
B r a s ile ir a ver, T R IN D A D E , H é lg io . Integralismo ; o fa s c is m o b r a s ile ir o n a d é c a d a de
30. S ã o P a u lo : D if e l/U P R Q S , 1974.
Para esta análise utilizou-se o Manifesto Integralista de
32 e o Programa do Partido de Representação Popular de 46,2
onde procurou-se dar no seu tratamento a oportunidade para
que este expressasse por si mesmo a renovação desse pensa
mento autoritário. Também é discutida a participação da
imprensa e a produção de um outro discürso.
4 LE N H A R O , A lc ir . S a c r a liz a ç ã o d a p o ít ic a . C a m p in a s : P a p ir u s , 1986. 2 1 6 p.
5 Os a r g u m e n to s d e s e n v o lv id o s n e ste p a r á g r a fo são a n a lis a d o s na obra de
L E N H A R O , # . p.44.
organização política, substituindo-a por uma organização
profissional, acaba por propor o “Partido Único que é a con
cretização de todas as classes profissionais” (p. 334). Assim,
com a cooperação de todos, a nação, corpo uno e indivisível,
dirigido pelo cérebro de suas elites, deverá ser forte, podero
sa, rica, próspera e feliz...
A construção da nacionalidade brasileira, nesse pensar
autoritário passa também pelo enfoque eugênico, pois como
negador da diversidade impõe-se ao totalitarismo a afir
mação de uma só raça.
3. CONSTRUÇÃO DO CENÁRIO
7 V e r , IN S T IT U T O P A R A N A E N S E D E D E S E N V O L V IM E N T O E C O N Ô M IC O E SO C IA L
— IP A R D E S . H istó ria política do Paraná. V e r s ã o p r e lim in a r . C u ritib a , 1987. p.85.
8 V er a M e n s a g e m d o g o v e r n a d o r M o y s é s L u p io n de 1948, In : IP A R D E S . H is
t ó r ia 1988. p .55. ))
9 C O L N A G H I, M . C r is tin a , C o lo n o s e P o d e r , a luta pela terra no Sudoeste do
Paraná. C u ritib a , 1984. D is s e r t a ç ã o , M e s tra d o , U F P R .
expulsar, dali a influência comunista que intentava uma
experiência de conquista de áreas rurais; (e, ao provocar)
o fracasso dessa tentativa, conseguiu a polícia restabele
cer, em toda a sua extensão, o princípio de autoridade,
sem o uso da força, sem o emprego de violência desneces
sária, readquirindo assim a confiança na solução justa que
aos interessados, ofereceu o Governo.10
10 V er a m en sa g e m d o g o v e r n a d o r B e n to M u n h o z d a R o c h a N e tt o d e 1952, In :
IP A R D E S . H is t ó r ia 1988. p.89.
11 B A L H A N Á , À. e t a lii. H is tó r ia d o P a ra n á . C u ritib a : G r a fip a r , 1969. p .248.
período, a população da capital tem um aumento percentual
de 98,78%, passando de 180.575 almas em 1950 para 356.830
no ano de 1960.12
A Curitiba da década de 50 altera sua trajetória de pa
cata capital de província. Centro do “Paraná Tradicional”,
com tradições campeiras e extrativistas, defronta-se com
um novo ritmo de vida, que interfere no seu mundo tido
como conhecido e seguro.
Esse novo elemento, o migrante, passa a simbolizar os
problemas decorrentes ou não dessas transformações. Nele
são identificados os males da sociedade: ele é o aventureiro,
o desordeiro, o subversivo, o doente, o preguiçoso... Para a
população da tradicional Curitiba o trabalhador disciplinado
e higienizado quase sempre esfuma-se diante da realidade.
Este novo que surge no cotidiano de Curitiba acaba por
interagir com elementos já presentes nesta sociedade, o que
nos permite localizar alguns exemplos dessas relações con
traditórias.
Esse clima de tensão verifica-se em outros movimentos.
Em estudos monográficos sobre o período encontramos, de
um lado, segmentos sociais femininos organizando-se princi
palmente em tomo de instituições de caridade e obras assis-
tenciais vinculadas, em geral, à Igreja, neste momento carac
teristicamente conservadora e elitista.13 Por outro lado, ao
movimento contra o preço da carne organizado por donas-
de-casa em 1953, agregam-se outros setores da sociedade,
representados por suas entidades: sindicatos, centros aca
dêmicos, partidos políticos... Como o custo de vida, a cares
tia e os baixos salários são constantes da vida econômica
do país, o movimento estende-se a outras capitais, chegando
ao clímax, em Curitiba, no terceiro dia de manifestações,
com o fechamento de vários açougues e “quebra-quebra”
generalizado no centro da cidade, “obrigando” à intervenção
do Exército.
14 S e g u n d o M a r ile n a C h a u í: « m e d ia d o r a e n tr e E s ta d o e as d e m a is cla s se s a tr a v é s
d a f u n ç ã o d e g o v e r n o , d a a d m in is tr a ç ã o e d a ju s tiç a q u e p r o t e g e a s p e s s o a s e a p r o
p r ie d a d e p r iv a d a ” p.58.
15 M A R T IN S , R . T e r ra e gente do **araná. p.75.
16 M A R T IN S , W . Um Brasil diferente, p .9.
“novo”, para que este se integre à ela, para que haja a “acul
turação" desses novos elementos. Para Wilson Martins, autor
de Um Brasil Diferente,
Um Simples Equívoco
O sr. Gustavo Corção, em artigo estampado domingo
na imprensa do Rio e de São Paulo, comentando o último
pleito nacional lamentou o que classifica de "epidemia de
estupidez” verificada em nosso Estado, com a chocante
votação aqui obtida pelo sr. Plínio Salgado.
Segundo o conhecido e acatado jornalista e escritor
católico durante longos anos estaremos cobertos de ridí
culo, por termos sido a unidade brasileira "onde o inte-
gralismo obteve a melhor colocação”.
Não há dúvida de que, de fato, nós paranaenses nos
estamos sentindo paradoxalmente bastante "esquerdos”,
desde que os cômputos das urnas nos revelaram que o sr.
Plínio obtivera a maioria simples dos sufrágios em nossa
Capital e em umas poucas outras cidades, tendo, inclusive,
conseguido em todo o território estadual disputar o pleito
em condições de igualdade com seus competidores, embora
batido por dois deles. Nossos sentimentos democráticos
efetivamente não se coadunam com os quase cem mil votos
dados ao sr. Plínio em nossa terra, esse sr. Plínio que,
seja qual for a nova pele em que tenha se metido, será
sempre para nós o que é para o Brasil — o chefe do fas
cismo indígena. Mas daí a afirmar que por longos anos
ficaremos "cobertos de ridículo” por força desse eventual
sucesso eleitoral entre nós do candidato repudiado pela
esmagadora maioria do povo brasileiro, vai um passo
muito grande. Afinal, não é justo que todo o Paraná seja
condenado por culpa do pronunciamento equivocado de
escassos 24% dos seus eleitores que foram às urnas em 3
de outubro. Mesmo, porque, nem mesmo os sufrágios des
ses 24% podem confirmar sequer a afirmativa de que o
integralismo foi muito votado no Paraná.
Com efeito, se é verdade que o sr. Plínio inesperada
mente chegou em 1.° em Curitiba, Ponta Grossa e outras
cidades nossas, não menos certo é que os candidatos mu
nicipais de seu Partido foram unanimemente repelidos em
todos os nossos municípios, mesmo na Capital, onde a
agremiação registrada pelos antigos integralistas não con
seguiu fazer sequer um Vereador. Quer isso dizer que, de
certo modo, a votação dada ao sr. Plínio não foi de fato
votação dada ao integralismo. Seria, antes, fruto de um
equívoco de grupos pouco politizados, descontentes com a
situação político-econômica do País, uma espécie de votos
“do contra”, que, somados aos poucos milhares de sufrá
gios efetivamente político-partidários dos remanescentes
do integralismo e de filhos de estrangeiros simpatizantes
de outros fascismos, deram em consequência aquêle volu
me de cédulas que tão desagradavelmente nos impressio
nou, a nós e ao sr. Corção.
Um equívoco, sem dúvida, mas, afinal, um simples equí
voco num País de ainda escassa experiência democrática
e dentro de uma conjuntura econômico-política de fato des-
norteante e propícia a tais enganos. Aliás, o sr. Corção não
precisaria andar muito para descobrir equívocos de tal sor
te: ainda no ano passado, e justamente num 3 de outubro
o eleitorado carioca — o eleitorado da Metrópole do País
— não deu 150 mil votos batidos ao sr. Carlos Lacerda, o
mais anti-democrático dos políticos nacionais? (grifo
nosso).
(Editorial d’0 Estado do Paraná — 18/10/55).
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2 .aCuritiba .. 7.284 4.591 2.580 2.504 329 248 17.536
3.a Curitiba . 6.203 4.494 2.304 2.766 259 155 16.048
4.a Curitiba ... 8.617 5.535 3.644 3.916 397 120 22.229
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1.a 6.617 3.705 4.021 1.595 70 473 93 16.938
2.a 6.099 4.939 3.597 2.147 42 528 184 17.536
3.a 5.730 3.654 3.204 2.912 40 427 81 16.048
4.a 8.508 5.591 4.376 3.018 61 610 65 22.229
TOTAL ........... 26.954 17.889 15.198 10.036 213 2.038 423 72.751
* V er M a p a anexo.
Contudo, pode-se ponderar esta afirmativa observando-se
o quadro abaixo (*), onde aparecem 17 municípios do Estado,
excluída a capital, com mais de cinco mil votantes e a posi
ção conquistada por Salgado em cada um.
PLÍNIO SALGADO
N.° Município Votantes
Colocação N.° Votos
01 Ponta Grossa 17.769 1.° lugar 5.937
* O s d a d o s d o q u a d r o , a s s im c o m o os d o m a p a d o E s ta d o r e fe r e m -s e a o M A P A
T O T A L IZ A D O R — E le iç ã o m a jo r it á r ia p a r a P R E S ID E N T E D A R E P Ú B L IC A — C ir c u n s
c r iç ã o P a r a n á ; lo c a liz a d o n o p e r ío d o P a r a n á e le it o r a l, 3 0 /1 0 /5 5 , p .6-9.
Nestes municípios, de considerável representatividade
eleitoral, o candidato perrepista obtém quatro primeiros
lugares, somando 11.123 votos. Repare-se que este fato ocorre
também em Ponta Grossa, maior colégio eleitoral do interior.
Em seis destes municípios Plínio alcança o segundo lugar,
com um total de 11.040 votos. Aqui é Londrina, segundo
maior colégio eleitoral do interior, o exemplo a ser ressal
tado.
4. CONCLUSÃO