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História para

vestibular medicina
5ª edição • São Paulo
2019

C H
4
CIÊNCIAS HUMANAS
HISTÓRIA
e suas tecnologias
Eduardo Antônio Dimas e Tiago Rozante
© Hexag Sistema de Ensino, 2018
Direitos desta edição: Hexag Sistema de Ensino, São Paulo, 2019
Todos os direitos reservados.

Autores
Eduardo Antônio Dimas
Tiago Rozante

Diretor geral
Herlan Fellini

Coordenador geral
Raphael de Souza Motta
Responsabilidade editorial, programação visual, revisão e pesquisa iconográfica
Hexag Sistema de Ensino

Diretor editorial
Pedro Tadeu Batista

Editoração eletrônica
Arthur Tahan Miguel Torres
Bruno Alves Oliveira Cruz
Claudio Guilherme da Silva Souza
Eder Carlos Bastos de Lima
Fernando Cruz Botelho de Souza
Matheus Franco da Silveira
Raphael de Souza Motta
Raphael Campos Silva

Projeto gráfico e capa


Raphael Campos Silva

Foto da capa
pixabay (http://pixabay.com)

Impressão e acabamento
Meta Solutions

ISBN: 978-85-9542-166-0

Todas as citações de textos contidas neste livro didático estão de acordo com a legislação, tendo por fim único e exclusivo o
ensino. Caso exista algum texto, a respeito do qual seja necessária a inclusão de informação adicional, ficamos à disposição
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as imagens publicadas e estamos à disposição para suprir eventual omissão de crédito em futuras edições.
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2019
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CARO ALUNO

O Hexag Medicina é referência em preparação pré-vestibular de candidatos à carreira de Medicina. Desde 2010, são centenas de aprovações nos
principais vestibulares de Medicina no Estado de São Paulo, Rio de Janeiro e em todo Brasil. O material didático foi, mais uma vez, aperfeiçoado e seu conteúdo
enriquecido, inclusive com questões recentes dos relevantes vestibulares de 2019.
Esteticamente, houve uma melhora em seu layout, na definição das imagens, criação de novas seções e também na utilização de cores.
No total, são 103 livros, 24 cadernos de Estudo Orientado e 6 cadernos de aula.
O conteúdo dos livros foi organizado por aulas. Cada assunto contém uma rica teoria, que contempla de forma objetiva e clara o que o aluno
realmente necessita assimilar para o seu êxito nos principais vestibulares do Brasil e Enem, dispensando qualquer tipo de material alternativo complementar.
Todo livro é iniciado por um infográfico. Esta seção, de forma simples, resumida e dinâmica, foi desenvolvida para indicação dos assuntos mais abordados nos
principais vestibulares, voltados para o curso de medicina em todo território nacional.
O conteúdo das aulas está dividido da seguinte forma:
TEORIA
Todo o desenvolvimento dos conteúdos teóricos, de cada coleção, tem como principal objetivo apoiar o estudante na resolução de questões propos-
tas. Os textos dos livros são de fácil compreensão, completos e organizados. Além disso, contam com imagens ilustrativas que complementam as explicações
dadas em sala de aula. Quadros, mapas e organogramas, em cores nítidas, também são usados, e compõem um conjunto abrangente de informações para o
estudante, que vai dedicar-se à rotina intensa de estudos.
TEORIA NA PRÁTICA (EXEMPLOS)
Desenvolvida pensando nas disciplinas que fazem parte das Ciências da Natureza e suas Tecnologias e Matemática e suas Tecnologias. Nesses
compilados nos deparamos com modelos de exercícios resolvidos e comentados, aquilo que parece abstrato e de difícil compreensão torna-se mais acessível
e de bom entendimento aos olhos do estudante.
Através dessas resoluções é possível rever a qualquer momento as explicações dadas em sala de aula.
INTERATIVIDADE
Trata-se do complemento às aulas abordadas. É desenvolvida uma seção que oferece uma cuidadosa seleção de conteúdos para complementar o
repertório do estudante. É dividido em boxes para facilitar a compreensão, com indicação de vídeos, sites, filmes, músicas e livros para o aprendizado do aluno.
Tudo isso é encontrado em subcategorias que facilitam o aprofundamento nos temas estudados. Há obras de arte, poemas, imagens, artigos e até sugestões
de aplicativos que facilitam os estudos, sendo conteúdos essenciais para ampliar as habilidades de análise e reflexão crítica. Tudo é selecionado com finos
critérios para apurar ainda mais o conhecimento do nosso estudante.
INTERDISCIPLINARIDADE
Atento às constantes mudanças dos grandes vestibulares, é elaborada, a cada aula, a seção interdisciplinaridade. As questões dos vestibulares de
hoje não exigem mais dos candidatos apenas o puro conhecimento dos conteúdos de cada área, de cada matéria.
Atualmente há muitas perguntas interdisciplinares que abrangem conteúdos de diferentes áreas em uma mesma questão, como biologia e química,
história e geografia, biologia e matemática, entre outros. Neste espaço, o estudante inicia o contato com essa realidade por meio de explicações que relacio-
nam a aula do dia com aulas de outras disciplinas e conteúdos de outros livros, sempre utilizando temas da atualidade. Assim, o estudante consegue entender
que cada disciplina não existe de forma isolada, mas sim, fazendo parte de uma grande engrenagem no mundo em que ele vive.
APLICAÇÃO NO COTIDIANO
Um dos grandes problemas do conhecimento acadêmico é o seu distanciamento da realidade cotidiana no desenvolver do dia a dia, dificultando o
contato daqueles que tentam apreender determinados conceitos e aprofundamento dos assuntos, para além da superficial memorização ou “decorebas” de
fórmulas ou regras. Para evitar bloqueios de aprendizagem com os conteúdos, foi desenvolvida a seção “Aplicação no Cotidiano”. Como o próprio nome já
aponta, há uma preocupação em levar aos nossos estudantes a clareza das relações entre aquilo que eles aprendem e aquilo que eles têm contato em seu
dia a dia.
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES
Elaborada pensando no Enem, e sabendo que a prova tem o objetivo de avaliar o desempenho ao fim da escolaridade básica, o estudante deve
conhecer as diversas habilidades e competências abordadas nas provas. Os livros da “Coleção vestibulares de Medicina” contêm, a cada aula, algumas dessas
habilidades. No compilado “Construção de Habilidades”, há o modelo de exercício que não é apenas resolvido, mas sim feito uma análise expositiva, descre-
vendo passo a passo e analisado à luz das habilidades estudadas no dia. Esse recurso constrói para o estudante um roteiro para ajudá-lo a apurá-las na sua
prática, identificá-las na prova e resolver cada questão com tranquilidade.
ESTRUTURA CONCEITUAL
Cada pessoa tem sua própria forma de aprendizado. Geramos aos estudantes o máximo de recursos para orientá-los em suas trajetórias. Um deles
é a estrutura conceitual, para aqueles que aprendem visualmente a entender os conteúdos e processos por meio de esquemas cognitivos, mapas mentais e
fluxogramas. Além disso, esse compilado é um resumo de todo o conteúdo da aula. Por meio dele, pode-se fazer uma rápida consulta aos principais conteúdos
ensinados no dia, o que facilita sua organização de estudos e até a resolução dos exercícios.
A edição 2019 foi elaborada com muito empenho e dedicação, oferecendo ao aluno um material moderno e completo, um grande aliado para o seu
sucesso nos vestibulares mais concorridos de Medicina.
Herlan Fellini
SUMÁRIO
HISTÓRIA
HISTÓRIA GERAL
Aulas 27 e 28: Revolução francesa 7
Aulas 29 e 30: Era Napoleônica e o Congresso de Viena 25
Aulas 31 e 32: Revoluções de 1830 - 1848 e Segunda Revolução Industrial 41
Aulas 33 e 34: Ideologias do século XIX e neocolonialismo 59

HISTÓRIA DO BRASIL
Aulas 27 e 28: República oligárquica: aspectos políticos e econômicos 81
Aulas 29 e 30: República oligárquica: movimentos sociais 103
Aulas 31 e 32: Crise da República oligárquica e Revolução de 1930 129
Aulas 33 e 34: Era Vargas: governos provisório e constitucional 151
Abordagem de REVOLUÇÃO FRANCESA, ERA NAPOLEÔNICA,
REVOLUÇÕES DE 1830/1848 e NEOCOLONIALISMOO nos
principais vestibulares.

FUVEST
A Revolução Francesa é abordada em suas repercussões políticas e econômicas. Sobre a era napoleônica,
o vestibular foca na perspectiva sociológica que a sustentou. As revoluções de 1830-1948 têm um
caráter eminentemente político, coligado ao tema posterior sobre ideologias do século XIX.

LD
ADE DE ME
D
UNESP
U

IC

O enfoque teórico desse vestibular é patente. É necessário dominar as transformações econômicas e


FAC

INA

1963

políticas originadas pela Segunda Revolução Industrial. Uma boa compreensão de causalidade política,
BO
T U C AT U

tanto da vida política francesa quanto da Santa Aliança, é imprescindível. O enfoque da Vunesp é
eminentemente político e econômico.

UNICAMP
Questões eminentemente interpretativas, relacionadas aos fatos cotidianos. O candidato deve ater--se
mormente aos embates políticos atuais e suas relações com os temas propostos pelo conteúdo do livro.

ENEM/UFMG/UFRJ
Aborda, por meio de textos, as principais transformações sociológicas e materiais oriundas da
Segunda Revolução Industrial, exigindo do candidato a capacidade de interpretação textual aliada a
conhecimentos prévios e pouco aprofundados sobre o assunto. É aconselhável manter-se atento aos
temas da atualidade.

UERJ
Utiliza-se de muitos textos e imagens em seus enunciados. Embora o conteúdo abordado neste livro não
seja recorrente nesse vestibular, as questões atuais tendem a cobrar uma perspectiva mais interdisciplinar
dos temas, cabendo ao aluno conectá-los à história brasileira.
27 28
Revolução Francesa

Competências Habilidades
1, 2, 3, 4, 5 e 6 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,
10, 13, 14, 16, 17,
18, 20, 22, 23, 24,
25, 26, 28 e 29

C H
HISTÓRIA
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-
H8
-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferen-
tes grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favo-
recendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.
Introdução
A Revolução Francesa estabeleceu-se como marco histórico do mundo ocidental e símbolo do término do
Antigo Regime. Foi a oportunidade em que os ideais burgueses iluministas fossem disseminados pela Europa e,
posteriormente, se difundissem as ideias e os movimentos liberais até alcançar o mundo. Nos séculos XVII e XVIII, a
burguesia já dava sinais de que não aceitava mais a continuidade do absolutismo, do mercantilismo e da sociedade
estamental, que lhe impunham limitações ao desenvolvimento do capitalismo e ao seu poder. A ideologia burguesa
já estava presente nas revoluções inglesas, Puritana Republicana, de 1640, e na Gloriosa, de 1688, e implantou a
monarquia constitucional. A independência dos Estados Unidos também fazia parte desse universo. Além de pro-
mover uma separação pioneira em relação à metrópole, passou a desenvolver-se com a República e da divisão dos
três poderes. A Revolução Industrial inglesa mostrou que as técnicas produtivas capitalistas e sua imposição à dis-
ciplinarização do trabalhador promoviam a aceleração da acumulação do capital, enquanto derrubavam barreiras
impostas pelo capitalismo comercial. Cabia, agora, à burguesia esculpir um mundo que fosse capaz de assegurar
suas conquistas e garantir a permanência da reprodução do capital, e que pudesse exercer o poder político deter-
minando as leis que lhe assegurasse a dominação econômica e os mecanismos de dominação.

A França pré-revolucionária e os fatores da revolução


A sociedade francesa
Na sociedade francesa se misturavam o absolutismo e as divisões feudais, que ainda separavam a popula-
ção segundo critérios feudais, estamentais em primeiro, segundo e terceiro Estados ou ordens, dos quais os dois
primeiros exploravam o terceiro Estado.
O primeiro Estado era constituído pelo clero, 120 mil religiosos; o alto clero representava os interesses do
absolutismo, enquanto membros do baixo clero tinham ideais iluministas, como o abade Sieyés.

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O segundo Estado era a nobreza, com 350 mil No meio rural, onde se concentrava a maioria
componentes. Era fracionada em nobreza cortesã (pala- esmagadora da população, havia muitíssimos campo-
ciana); nobreza tradicional, que ainda se mantinha em neses – cerca de 80% de toda a população. Em pri-
seus antigos latifúndios em plena decadência econô- meiro lugar estavam os camponeses proprietários de
pequenas áreas cultivadas com a ajuda de sua família,
mica, explorando os servos segundo as regras feudais,
e os grandes fazendeiros, que exploravam suas proprie-
como a talha, corveia e banalidades; a nobreza de toga
dades mediante trabalho assalariado. Além deles, havia
era composta de burgueses que ganharam ou compra-
trabalhadores assalariados em jornadas de trabalho de-
ram títulos nobiliárquicos e dedicava-se aos negócios
finidas. Uma pequena parcela – aproximadamente um
administrativos e judiciários.
milhão de pessoas – vivia na condição de servos.
Tanto o alto clero como a nobreza eram isentos
da maioria dos impostos, recebiam pensões, doações e
outros privilégios do poder real. Donas de seus próprios
tribunais, monopolizavam os postos de oficiais do exér-
cito e da marinha.

Quadro de um típico sans-culotte. Louis-Léopold Boilly

A crise econômica
Com a perda de territórios coloniais para a In-
O terceiro estado representado por um camponês carregando o primeiro
glaterra na Guerra dos Sete Anos (1756 - 1763) e as
e segundo Estados nas costas. despesas próprias de qualquer conflito, com a colabo-
ração decisiva para garantir a vitória estadunidense na
O terceiro Estado compreendia 98% da po- luta pela independência e com os custos elevados para
pulação1. Era quem sustentava o luxo abusivo dos es- manter a corte dos Bourbons no palácio de Versalhes, a
tamentos anteriores e financiava toda a estrutura para-
economia francesa enfrentava uma séria crise.
sitária do antigo regime francês, mediante pagamento
Fator agravante foi um grave problema climático
de inúmeros impostos. Sua composição era complexa.
em 1787, que provocou seca e consequente agrava-
As porções urbanas aproximavam-se das classes sociais
atuais. Havia a alta burguesia – banqueiros, financis- mento da fome. Para piorar a situação, surgiu uma pra-
tas e grandes empresários; a média burguesia – pro- ga de coelhos. Proibido para os camponeses, pois a caça
fissionais liberais, médicos, dentistas, professores, advo- era um privilégio da nobreza, os coelhos reproduziram-
gados; e a pequena burguesia – artesãos e pequenos -se tão rapidamente que consumiam o que não havia
comerciantes –, cujos ideais eram mais radicais do que sido destruído pela seca.
os da elite capitalista e que no futuro fortaleceria o go- A fome também chegou às cidades, onde a sub-
verno dos jacobinos. Finalmente havia os pobres urba- produção agrícola elevou violentamente os preços dos gê-
nos, os sans-culottes2 – camada social heterogênea de neros alimentícios. Gastando mais com a alimentação, a
artesãos, aprendizes e proletários. No processo revolu- população das cidades deixou de comprar manufaturados,
cionário saíram armados em defesa de um novo mundo. cujas fábricas dispensaram seus empregados. Multidões
de pedintes e famintos passaram a povoar as cidades fran-
1. A França, em 1789, possuía uma população de aproximadamente 25 mi- cesas. Em meio a essa crise e às condições deploráveis da
lhões de pessoas.
população, os hábitos dispendiosos da nobreza, particu-
2. A expressão sans-culotte (sem culote) refere-se aos populares, que não
vestiam as calças justas (culotte) da nobreza. larmente da nobreza palaciana, não recuaram.

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Em 1786, o governo do rei assinou o Tratado
A nobreza
Eden-Rayneval a fim de melhorar a exportação de pro-
dutos primários para a Inglaterra, que diminuiria as ta- Uma parte da nobreza, desejosa de reaver seus
xas alfandegárias sobre eles. Em contrapartida, a França antigos direitos feudais em plenitude, e outra parte, par-
diminuiria suas tarifas para as mercadorias industria-
ticularmente parentes próximos ao rei como seu primo, o
lizadas britânicas, principalmente têxteis. Com isso,
duque de Orleans, pleiteavam seu direito ao trono com
a burguesia francesa sofreu um forte abalo diante da
base em questões de linhagem familiar, e muitos nobres
concorrência inglesa. As manufaturas têxteis francesas
estavam descontentes por considerarem seus privilégios
não suportaram a concorrência e várias delas faliram,
insuficientes ou desejarem cargos palacianos. Essa no-
aumentando o desemprego e a miséria.
breza conspirava secreta ou abertamente contra o rei,
O rei Luis XVI iniciava assim uma série de tentati-
vas de reformas econômicas e sociais para salvar a França, utilizando-se, muitas vezes com demagogia, de legítimos
mas todas elas encontravam sempre forte resistência dos direitos e necessidades burguesas ou populares.
setores sociais, que deveriam contribuir como projeto do Aliados aos burgueses, havia membros de classe
rei de salvação nacional. média urbana, profissionais liberais e intelectuais, ressenti-
dos com o absolutismos por haverem tentado fazer parte da
estrutura de poder e terem tido frustradas suas pretensões.
A situação política Esse foi o caso, por exemplo, do advogado Ma-
xime Robespierre, do aventureiro Georges Danton e do
A França vivia a contingência de um Estado ab-
médico Jean Paul Marat.
solutista. Os reis franceses haviam difundido a crença Mais tarde, eles e muitos outros desses ressenti-
de que seu poder derivava de Deus e que só deveriam dos se tornariam os participantes e líderes mais radicais
prestar contas a Ele ou a sua própria consciência. Aos do processo revolucionário.
súditos só restava a obediência total. Contestar o rei
significava contestar o próprio Deus, que o havia esco- A influência do iluminismo
lhido para governar o país.
A arma ideológica da Revolução Francesa, me-
Não havia Constituição e a vontade real era a
diante a qual a burguesia conseguiu a hegemonia de
lei. Todos os poderes estavam nas mãos dele, que fazia pensamento e garantiu o apoio do terceiro Estado, foi a
a guerra e declarava a paz, nomeava e demitia funcio- filosofia iluminista.
nários, vendia monopólios e criava tributos. Não havia O contato direto com os filósofos da ilustração e
nenhuma das liberdades clássicas, como liberdade de com suas ideias permitiu à classe burguesa transformar
expressão e de religião. seus interesses particulares em interesses gerais de toda
Com a política econômica mercantilista, o Estado a sociedade francesa. A luta contra o absolutismo, o mer-
dirigia toda a economia do país, e os burgueses tinham cantilismo e os privilégios sociais do clero e da nobreza
limitada sua liberdade de exercer o comércio em razão das também interessava aos camponeses, artesãos e outras
condições impostas pelo Estado absolutista que tudo deci- camadas sociais.
dia: salários, preços, exportação, taxas de importação etc.

A insatisfação da burguesia Processo revolucionário


Em virtude da grave crise que se abateu sobre
No final do século XVIII, as restrições e regulamenta-
a França, Luis XVI criou a Assembleia dos Notáveis,
ções mercantilistas eram sentidas pela burguesia enriquecida apoiada por reformistas como Necker, Turgot e Breinne.
e ávida pelo estabelecimento das condições para o desenvol- Eles propuseram uma taxação sobre a nobreza e o clero no
vimento do capitalismo na França. Mas para isso era neces- intuito de cobrir o deficit do Estado e financiar projetos
sário derrubar o absolutismo e as restrições mercantilistas, que melhorassem a vida do terceiro Estado. Essa proposta,
criando condições para uma igualdade social jurídica. no entanto, foi recusada pela elite do antigo regime que

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não aceitava pagar esses impostos, recusa essa que foi chamada de Revolta Nobiliárquica. Pressionado pelo conjunto
da sociedade, o rei Luis XVI convocou, em 1789, a Assembleia dos Estados Gerais. Tratava-se de uma instituição
política formada por representantes dos três Estados para assessorar o monarca em momentos de crise, mas que não se
reunia desde 1614. Foi nesse ambiente que eclodiu a Revolução Francesa.
O terceiro Estado apoiou essa reunião porque acreditava que nas eleições internas, com seus 578 representantes,
teria a maioria dos votos. O clero teria 291 delegados e a nobreza, 270. Dos 291, 200 eram do baixo clero e 90, da
nobreza iluminada (influenciada pelas ideias iluministas), que votariam com o terceiro Estado. Entretanto, a votação era
por estado e não por “cabeça”, o que, obviamente, daria a vitória aos dois estamentos apoiadores do antigo regime.
Com a recusa do clero e da nobreza de estabelecerem um acordo na votação, o terceiro Estado reuniu-se
algumas semanas depois e declarou-se em Assembleia Nacional Constituinte. Os representantes juraram per-
manecer juntos até a elaboração e votação de uma Constituição para a França, atitude que ficou conhecida como
o Juramento da Sala do Jogo da Pela, em 20 de junho de 1789, e marcou o início da Revolução Francesa.

O juramento da pela. Jacques-Louis David.

Os partidários de Luis XVI tentaram dissolver a Assembleia Constituinte, noticiando a concentração das
tropas do rei em Versalhes e Paris. A reação popular foi imediata. Em 14 de julho de 1789, a população pobre de
Paris (sans-culotte) tomou de assalto a fortificação da Bastilha, antiga prisão do Estado e símbolo do absolutismo.
O rei recuou, numa demonstração de que o poder estava nas mãos do terceiro Estado liderado pela burguesia.
© Everett Historical/Shutterstock

A Bastilha, símbolo da opressão absolutista, foi tomada e destruída pelo povo em 14 de julho de 1789.

Nessa oportunidade, os servos promoveram uma profunda revolução camponesa chamada Grande Medo.
Inúmeros nobres fugiram (emigrados) para países bastiões do antigo regime, como a Áustria. Em 4 de agosto de
1789, os direitos feudais foram definitivamente extintos na França.

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As fases da Revolução
A Assembleia Nacional e a monarquia constitucional (1789–1792)

Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão

Para se aproximar mais ainda dos chamados ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, no dia 26 de agosto
de 1789, a Assembleia votou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, documento escrito com base
nas ideias do iluminismo em defesa do direito de todos à liberdade, à propriedade e à igualdade jurídica. Preocupada, a
elite do antigo regime buscou anular a declaração. Nas jornadas de outubro, no entanto, os sans-culottes expulsaram a
família real do palácio de Versalhes para o palácio das Tulherias, noutro claro sinal de que o rei perdia cada vez mais poder.
A bandeira francesa com as cores azul, branca e vermelha passou a se referir ao lema da Revolução e, paulatinamente,
tomou o lugar do Estado dos Bourbons. Outro símbolo da Revolução foi a canção de guerra da Marselhesa, cantada como
expressão da liberdade, igualdade e fraternidade e transformada no hino nacional da França.
© trucic/Shutterstock

A bandeira tricolor francesa nasceu durante a Revolução Francesa, com as cores do rei (branco) e da cidade de Paris (azul e vermelho).

Em 1790, o antigo regime levou outro golpe, com a criação da Constituição Civil do Clero, que nacionalizava
as propriedades da Igreja a favor do Estado. Com isso, constituiu-se um lastro que permitiu ao governo emitir
moeda e pagar o deficit público. Alguns membros do clero, como Sieyés, apoiaram a atitude. Uma parcela dele, no
entanto, não aceitou e fugiu para países ainda absolutistas.

13
Em 1791, a monarquia constitucional foi legal-
mente implantada pela promulgação da Constituição
Liberal, inspirada nos ideais iluministas da burguesia. Se
representava um avanço em relação ao absolutismo do
antigo regime, também deixava a desejar as aspirações
radicais dos sans-culottes, uma vez que o voto era cen-
sitário. As reivindicações das camadas pobres não foram
satisfeitas, notadamente a distribuição de riquezas e o
fim da escravidão nas colônias, como a do Haiti.
No parlamento francês, os deputados dividiram-se Detenção de Luis XVI e sua família, em Varennes, 1791.
em facções que identificavam os grupos políticos divididos
ideologicamente. À direita, na parte de baixo da Assembleia,
Convenção (1792–1794)
estavam os girondinos, representantes da alta burguesia e A guerra da França liberal contra a Áustria e a
influenciados pelas ideias de Montesquieu. Apoiavam a li- Prússia, defensoras do absolutismo, a tentativa de fuga
berdade econômica e a instauração da divisão social própria do rei Luis XVI, a indefinição do governo burguês e a
do capitalismo. À esquerda, estavam os jacobinos, também vitória do exército popular dos sans-culottes sobre as
chamados “montanha”, uma vez sentados no local mais forças do antigo regime provocaram a radicalização po-
alto. Liderados por Robespierre, foram fortalecidos pelos pular capitaneada pelos jacobinos.
cordeliers, mais radicais, Danton e Marat. Representavam Nesse ambiente de extremos foi realizada uma
eleição nacional em que as forças de esquerda ven-
a pequena burguesia e as camadas populares, defendiam
ceram com o voto universal masculino. Consequência:
a República, o voto masculino universal e o tabelamento
propagação das ideias de Rousseau e disseminação da
de preços. Posteriormente, quando representantes da direi-
agitação popular em todo território francês, o que tor-
ta girondina precisavam negociar assuntos políticos com os
nou peculiar a história das revoluções europeias bur-
jacobinos dirigiam-se ao centro, chamado “pântano”, para
guesas, uma vez que as revoluções inglesas, Puritana
gerar a falsa sensação de que eram neutros.
e Gloriosa, não foram populares. De maioria jacobina,
Com o poder político cada vez mais nas mãos do
o novo parlamento implantou na França a República,
parlamento, o rei Luis XVI tentou fugir para a Áustria, para se
em 22 de setembro de 1792, cujos novos mandatários
aliar militarmente ao imperador austríaco e retornar à França
foram os radicais Danton, Marat e Saint-Just, sob a lide-
reavendo seu poder absolutista. Foi descoberto em Varennes,
rança de Robespierre, o “incorruptível”.
preso e levado a Paris. Em razão desse fato, bem como da
Para confirmar a implantação da República, o rei
disseminação dos ideais liberais na Europa de 1792, os reis
Bourbon Luis XVI foi guilhotinado em 21 de janeiro de
absolutistas da Áustria e da Prússia formaram uma coliga-
1793. Mas sua morte não consolidou as mudanças ja-
ção para invadir a França, com o apoio da nobreza emigrada
cobinas, graças à formação de uma coligação de países
liderada pelo duque Brunswick. Em retaliação, a população
com o objetivo de invadir a França revolucionária. Essa
parisiense, liderada por Danton e Marat, promoveu o mas-
coligação era formada por países absolutistas podero-
sacre de setembro: invadiu o palácio das Tulherias e matou
sos, como Áustria, Prússia, Rússia, Espanha e Inglaterra
nobres, exigindo novas eleições por voto universal. Enfra-
e deixou os franceses apreensivos. Embora a Inglaterra
quecida, restou à família real francesa torcer pela vitória dos
já tivesse passado pela revolução burguesa liberal, sua
países adeptos do Antigo Regime, bem como pela burguesia
participação na coligação justificava-se apenas pelos
girondina, que temia a vitória eleitoral dos jacobinos, cada
interesses econômicos, que pretendiam evitar a concor-
vez mais próximos dos sans-culottes. O exército francês, no
rência com os possíveis produtos manufaturados que o
entanto, venceu as forças da Áustria e da Prússia, e o partido
novo sistema capitalista francês pudesse produzir.
jacobino assumiu o poder republicano, ao guilhotinar o rei
Luis XVI, após um julgamento forjado à portas fechadas e
cheio de arbitrariedades.

14
A ironia da guilhotinação do rei, e um ano mais tarde da rainha Maria Antonieta e de tantos milhares de franceses,
incluindo até muitos revolucionários que iniciaram o movimento, é que o governo revolucionário fazia isso em nome de ideais
iluministas como a igualdade jurídica, amplo direito de despesa legal e transparência total nos processos judiciais.
Nada disso, porém, ocorria nos “processos”, que levaram tantas pessoas à guilhotina, chamada na época por
seus adeptos de “a navalha nacional”.

Maximilien de Robespierre

Outra questão enfrentada pelos jacobinos foi uma grande revolta popular ocorrida em Vendeia, com a participação
dos camponeses, artesãos, nobres e clérigos, mostrando, com isso, que a revolução não era tão popular como queria parecer.
Esse movimento foi brutal e cruelmente reprimido pelo governo central e seus representantes regionais.
Os jacobinos criaram então o Comitê de Salvação Pública, órgão do governo radical encarregado de implan-
tar o tabelamento de preços pela lei do máximo, numa tentativa de conter a inflação. Mesmo contando com o apoio
dos sans-culottes, a lei foi criticada pela burguesia, mais uma vez contra os princípios do liberalismo de não intervenção
do Estado na economia, bem como, e principalmente, porque ela comprometia a margem de lucro dos comerciantes.
Esse comitê esboçou a implantação do ensino público, estimulou o aumento dos salários, legalizou e aumentou
a reforma agrária capitaneada pelos ex-servos na área rural e promoveu a abolição da escravidão nas colônias.
A Constituição de 1791, elaborada durante o domínio girondino, incluía o voto censitário, baseado na renda, que limi-
tava o direito de voto a uma parcela significativa da população. Aprovada pela convenção jacobina, criou a República baseada
no sufrágio universal: direito de voto a todos os cidadãos homens e maiores de 21 anos, independentemente da renda.
A radicalização de Robespierre também afetava a cultura e a religião. Tentou implantar o “culto” a uma
nova religião baseada no deísmo, que cultuaria o Ser Supremo mediante uma ética racional. Criou também o
Museu do Louvre, a Escola Politécnica e o Conservatório, bem com um novo calendário. Além de o ano em que foi
proclamada a República passar a ser considerado o ano I, os meses receberam novas denominações, segundo as
estações do ano, as condições climáticas e o período das colheitas agrícolas.
Calendário Revolucionário

Estação Ordem Mês Ocorrência Duração


1º vindimário colheita de uvas (vindima) 21/9 – 20/10
Outono 2º brumário brumas, névoa 21/10 – 20/11
3º frimário geada (do fr. frimas) 21/11 – 20/12
4º nivoso neve 21/12 – 20/1
Inverno 5º pluvioso chuva 21/1 – 20/2
6º ventoso vento 21/2 – 20/3
7º germinal germinação dos vegetais 21/3 – 20/4
Primavera 8º floreal flores 21/4 – 20/5
9º prairial pradarias 21/5 – 20/6
10º messidor colheita (do lat. messe) 21/6 – 20/7
Verão 11º temidor calor (do gr. therme) 21/7 – 20/8
12º frutidor frutas 21/8 – 20/9

15
O terror Girondinos sobreviventes do terror aliaram-se
aos deputados do “pântano” e articularam um gol-
pe. Robespierre apelou às massas populares de Paris.
Como as invasões estrangeiras, a Revolta da Ven-
Quem poderia mobilizá-las, os hebertistas, no entanto,
deia e a oposição burguesa estavam pondo em risco o
estavam mortos, e os sans-culottes não responderam ao
programa popular, os jacobinos, então, radicalizaram mais
seu chamado. Robespierre e os líderes jacobinos foram
ainda a Revolução e implantaram o Tribunal Revolucio- guilhotinados. Era o golpe do Nove Termidor, de 27 de
nário, que processou, julgou e condenou sumariamente à junho de 1794, também conhecido como Reação Termi-
guilhotina supostos inimigos do governo. Esse momento doriana, que marcou a queda da convenção jacobina e
de massacre, que contou com o apoio dos sans-culottes, foi a volta da alta burguesia girondina ao poder.
chamado de grande terror ou terror jacobino. Ele insuflava
o ódio popular ao guilhotinar representantes do antigo re-
Diretório (1794–1799)
gime e da burguesia. Enquanto os girondinos eram mortos,
a burguesia do “pântano” (centro) apoiava os jacobinos Com a alta burguesia no poder, representada
numa aliança tática, mas não ideológica, com o intuito de politicamente pelos girondinos, instaurou-se uma Re-
não ser guilhotinada. pública que destruiu os avanços sociais consolidados
Apesar da defesa dos ideais populares no interior pelos jacobinos, bem como as possibilidades de retor-
do governo e de o exército ter derrotado as forças da no das forças retrógradas do antigo regime.
coligação absolutista estrangeira e reprimido a Revolta Para consolidar os privilégios burgueses, foi criada
da Vendeia, divergências internas enfraqueceram-no. O uma nova Constituição: a Constituição do Ano III (1795),
grupo dos indulgentes, liderado por Danton, desejava a que extinguiu o tabelamento de preços e fez voltar a escra-
diminuição do terror, uma vez que a oposição já tinha vidão nas colônias, esvaziou o Comitê de Salvação Pública e
sido debelada; os hebertistas desejavam radicalizar mais desmoralizou o Tribunal Revolucionário. O voto universal foi
ainda o terror. Essas divergências acentuaram-se com a substituído pelo censitário, para revolta dos sans-culottes. O
morte do radical Marat, atribuída a Danton, quando se diretório extinguiu a lei do máximo e franqueou a volta da
disseminou uma perseguição abusiva liderada por Ro- elevação de preços das mercadorias populares, promovendo
bespierre às duas facções. Foram todos guilhotinados por o retorno da liberdade econômica própria do liberalismo e da
receio de que ambas pudessem sair do controle. Conse- lei da oferta e da procura do liberal Adam Smith.
quência: os sans-culottes, amedrontados com o aumento A estrutura política ficou nas mãos de cinco direto-
da violência, deixaram de apoiar os jacobinos, que fica- res, cujo papel era chefiar o Poder Executivo. O Legislativo
ram isolados no poder. era composto pelo Conselho de Anciãos e pelo Conselho
dos 500, modelo esse que criou condições para o enfraque-
cimento do governo. Os diretores brigavam entre si pela
defesa de seus interesses e pelo poder. Não conseguiam
barrar a corrupção nem eram eficientes na administração
pública e na construção das obras públicas.
O liberalismo econômico era total. Em virtude da
inflação crescente, os preços subiam descontroladamen-
te, penalizando as camadas mais pobres da sociedade.
Especulava-se com tudo, de alimentos populares à bolsa
de valores. A corrupção era generalizada. Comentava-se
que agentes do governo vendiam armas do exército fran-
cês para os países em guerra contra a França.
Cercado de agiotas, corruptos e especuladores, o
governo do Diretório não tinha a confiança de ninguém,
nem mesmo da alta burguesia a quem representava. Ela
Robespierre é conduzido à guilhotina. sabia que, através dele, não conseguiria manter o poder,

16
sem contar os inúmeros inimigos internos e externos. De início de uma pacificação interna e de confirmação dos
um lado, as camadas populares e os jacobinos desejavam interesses da burguesia francesa.
um governo popular; de outro, o clero e a nobreza tenta-
vam restaurar o absolutismo; e, externamente, os países
absolutistas, liderados pela Inglaterra, ameaçavam impe-
dir uma futura concorrência industrial francesa.
Em 1795, foi abortado um golpe realista em Pa-
ris. No ano seguinte, foi a vez de sufocar um movimen-
to popular de tendência socialista, a Conjuração dos
Iguais, cujo líder, Graco Babeuf, defendia a soberania
popular e a supressão da propriedade privada. Preso,
Babeuf foi guilhotinado em 1797.

O general Bonaparte no Conselho dos Quinhentos. Bouchot.

Conclusão
Nem de longe, a radicalização que caracterizou a
Revolução Francesa assemelhou-se à Revolução Glorio-
sa, de 1688, na Inglaterra, e à Independência dos EUA.
A participação popular dos sans-culottes, nas ruas de
Graco Babeuf
Paris, e a luta dos camponeses no Grande Medo, no
O Diretório percebeu seu profundo isolamento campo, criaram situações em que as propostas da es-
político das massas populares. A única instituição que querda jacobina puseram em risco tanto a continuida-
poderia proteger seus interesses seria a ala do exército, de do antigo regime quanto a vitória da burguesia. Ela
liderada pelo jovem e popular general Napoleão Bona- serviu sim de inspiração para que os ideais democráti-
parte. Quando da Revolução, ele era um simples tenente, cos, na concepção liberal ou popular e adequados aos
mas aos 24 anos tornou-se general de brigada. Após um avanços e à continuidade expansionista do capitalismo,
breve período de entusiasmo pelos jacobinos, afastou-se fossem desejados e reivindicados pelas populações dos
de sua paixão juvenil. Ajudou a Revolução a combater os países como uma possibilidade.
Em termos políticos e sociais, a Revolução Francesa
países absolutistas que haviam invadido a França e fora
criará um paradoxo que será repetido em outros movimentos
o responsável pelo fracasso do golpe realista de 1795, o
diretamente por ela inspirados, como as Revoluções Liberais
que o tornou confiável aos olhos da alta burguesia.
de 1830 e 1848, a Comuna de Paris de 1871, a Revolução
Enviado ao Egito para tentar interferir nos inte-
Russa de 1917 e a ascensão do fascismo e do nazismo.
resses do império inglês, o exército de Napoleão foi cer-
Esse paradoxo está ligado aos próprios ideias de
cado pela marinha inglesa. Enquanto isso, os exércitos democracia, liberdade e participação social popular.
franceses iam sendo derrotados na Europa. Tudo ocorre bem quando setores da sociedade
Napoleão deixou seu exército no Egito. Segui- concordam plenamente com o “grupo revolucionário” que
do de alguns generais fiéis, reembarcou para a França, assume o poder desse processo de mudança e se submete
onde, com o apoio de dois diretores, de toda a alta bur- a ele irrestritamente; tudo bem - em caso de divergência,
guesia e dos sans-culottes, que o viam como uma espé- discordância ou desobediência, os indivíduos e os grupos
cie de salvador da pátria, assumiu o poder no Golpe 18 sociais são duramente reprimidos e massacrados em nome
Brumário, em novembro de 1799. Esse fato gerou o da mesma liberdade que estão tentando utilizar.

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INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo DOCUMENTÁRIO Revolução Francesa History Channel

Fonte: Youtube

Filme MARIA ANTONIETA (2006)

O filme conta a história da jovem rainha da França do século XVIII,


Maria Antonieta. A princesa austríaca Maria Antonieta (Kirsten Dunst) é
enviada ainda adolescente à França para se casar com o príncipe Luis
XVI (Jason Schwartzman), como parte de um acordo entre os países. Na
corte de Versalhes ela é envolvida em rígidas regras de etiqueta, ferrenhas
disputas familiares e fofocas insuportáveis, mundo em que nunca se
sentiu confortável. Praticamente exilada, decide criar um universo à parte
dentro daquela corte, no qual pode se divertir e aproveitar sua juventude.
Só que, fora das paredes do palácio, a revolução não pode mais esperar
para explodir. Passando por uma grande turbulência, Antonieta perdeu
um filho em plena Revolução Francesa.

18
LER

Livros
A Era das Revoluções – Eric J. Hobsbawm

Neste livro, Eric Hobsbawn mostra como a Revolução Francesa


e a Revolução Industrial inglesa abriram o caminho para a renascença
das ciências, da filosofia, da religião e das artes – mas não consegui-
ram resolver os impasses criados pelas fortes contradições sociais, que
transformaram o período numa conturbada fase de movimentos revo-
lucionários.

A Revolução Francesa – Carlos Guilherme Mota

A Revolução Francesa, um dos momentos mais críticos da His-


tória da humanidade, deu início a um novo período, inaugurando os
tempos modernos. A narrativa apresentada neste livro vai permitir
acompanhar todos os acontecimentos da Revolução Francesa junto ao
protagonista Joaquim – um estudante brasileiro que chega a Paris jus-
tamente nos momentos iniciais da Revolução Francesa e acaba aderin-
do à luta pela liberdade, igualdade e fraternidade.

19
INTERDISCIPLINARIDADE

A guilhotina era utilizada durante a Revolução Francesa para aplicar a pena de morte por decapitação. O
aparelho é constituído de uma grande armação reta (aproximadamente 4 m de altura), na qual é suspensa uma lâ-
mina losangular pesada (de cerca de 40 kg). As medidas e peso indicados são os das normas francesas. A lâmina é
guiada à parte superior da armação por uma corda, e fica mantida no alto até que a cabeça do condenado seja co-
locada sobre uma barra que a impede de se mover. A força aplicada sobre o pescoço do executado chega a 400 N,
considerando a aceleração gravitacional de 10 m/s². Certamente é um exagero, mas a guilhotina serviu para criar
punições exemplares à sociedade, embora tenha sido aplicada durante a Revolução Francesa aos nobres e clérigos.

20
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES

Habilidade 10 - Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importân-


cia da participação da coletividade na transformação da realidade histórico-geográfica.

Por meio de discursos, leis, documentos e imagens, a Habilidade 10 demanda a capa-


cidade do candidato em analisar a importância dos movimentos sociais e políticos na
transformação da realidade histórica. Trata-se de uma habilidade muito cobrada pelo
vestibular, principalmente em eventos históricos de grande ruptura, como a Revolução
Francesa (1789).
O candidato deve ser capaz de captar o teor ideológico e os principais intelectuais des-
ses movimentos para solucionar a questão. Quase sempre, os excertos apresentados são
fundamentais para a resolução, o que exige capacidade de interpretação de texto. Sendo
assim, diante desses grandes eventos históricos, o aluno não deverá simplesmente ater-se
à consecução dos fatos, mas também estudar os atores históricos e as suas respectivas
ideologias.

Modelo
(Enem) Em nosso país queremos substituir o egoísmo pela moral, a honra pela probidade, os
usos pelos princípios, as conveniências pelos deveres, a tirania da moda pelo império da razão, o
desprezo à desgraça pelo desprezo ao vício, a insolência pelo orgulho, a vaidade pela grandeza de
alma, o amor ao dinheiro pelo amor à glória, a boa companhia pelas boas pessoas, a intriga pelo
mérito, o espirituoso pelo gênio, o brilho pela verdade, o tédio da volúpia pelo encanto da felici-
dade, a mesquinharia dos grandes pela grandeza do homem.
HUNT, L. Revolução Francesa e vida privada. In: PERROT, M. (Org.) História da vida privada: da Revolução
Francesa à Primeira Guerra. Vol. 4. São Paulo: Companhia das Letras, 1991 (adaptado).

O discurso de Robespierre, de 5 de fevereiro de 1794, do qual o trecho transcrito é parte, relaciona-


-se a qual dos grupos político-sociais envolvidos na Revolução Francesa?
a) À alta burguesia, que desejava participar do poder legislativo francês como força política dominante.
b) Ao clero francês, que desejava justiça social e era ligado à alta burguesia.
c) A militares oriundos da pequena e média burguesia, que derrotaram as potências rivais e queriam
reorganizar a França internamente.
d) À nobreza esclarecida, que, em função do seu contato com os intelectuais iluministas, desejava extin-
guir o absolutismo francês.
e) Aos representantes da pequena e média burguesia e das camadas populares, que desejavam justiça
social e direitos políticos.

22
Análise Expositiva

Habilidade 10
Robespierre foi o principal líder jacobino e comandou o governo da França entre 1792 e
1794, durante a Revolução. Considerado um líder popular, era advogado e membro de uma
pequena burguesia arruinada financeiramente. Defendeu medidas de controle econômico e
de geração de empregos, assim como a ampliação dos direitos políticos a todos os homens,
independentemente da renda.
Alternativa E

23
Estrutura Conceitual
Ordem social
REVOLUÇÃO B do absolutismo
FRANCESA
1º Estado Clero
aristocracia
tradicional
2º Estado Nobreza burguesia que
detém títulos
3º Estado Servos (camponeses, pequena burguesia,
comeciantes, “sans cullotes”)

A CARACTERÍSTICAS C ESTOPIM
Financiamento da nobreza
Ruptura com a ordem social feudal Crise econômica Guerra dos 7 anos
Destruição do antigo regime (absolutismo) Crise agrícola
Revolução burguesa
Assembleia dos notáveis ou Estados gerais
Influência do iluminismo
Pautas: solução da crise econômica
Participação popular
Divergências
1º e 2º Estados 3º Estado
- Taxação da burguesia - Taxação da nobreza
- Voto por estamento - Voto por cabeça
3º Estado forma assembleia nacional
contituinte queda da Bastilha

D FASES DA REVOLUÇÃO
I Assembleia nacional e monarquia constitucional (1789-1792)
Formação de facções políticas
Declaração dos Direitos do Homem Jacobinos Pântano Girondinos
e do Cidadão
- Esquerda - Centro - Direita
Medidas Constituição civil do clero
- Radicais - Liberais
Constituição: liberal e voto censitário
- “Sans cullotes” - Alta burguesia
- Invasão da Áustria e da Prússia - derrotadas e pequenas
- Fuga do rei burguesia

II Convenção (1792-1794)
- República → Eleições gerais → Vitória dos jacobinos → MEDIDAS Decapitação do rei
Voto universal masculino
- Formação de coligação estrangeira contrarrevolucionária
Controle dos preços
ÓRGÃOS Comitê desaluação pública Reforma agrária
Novo calendário
Tribunal Revolucionário
Abolição da escravidão
nas colônias
O TERROR → Perda de apoio político → Golpe do 9 Termidor

III Diretório (1794-1799) - Governo da alta burguesia

MEDIDAS CARACTERÍSTICAS GOLPE DE 18 BRUMÁRIO (1799)


Nova constituição Corrupção Exército toma o poder
Revogação de medidas jacobinas Inflação Liderança de Napoleão Bonaparte
Preços regulados pelo mercado Tensões políticas
(liberalismo econômico) Invasões estrangeiras
Poder Executivo - 5 diretores

24
29 30
Era napoleônica e o
Congresso de Viena

Competências Habilidades
1, 2, 3, 4, 5 e 6 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,
13, 14, 16, 17, 18,
20, 22, 23, 24, 25,
26, 28 e 29

C H
HISTÓRIA
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-
H8
-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferen-
tes grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favo-
recendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.
O primeiro-cônsul Napoleão cruzando os Alpes no passo de Grande São Bernardo. Jacques-Louis David. 1800. Kunsthistorisches Museum.

Era napoleônica (1799–1815)


Introdução
Iniciada em 1799, a era napoleônica foi uma solução política que beneficiou a burguesia. Por intermédio do
exército foram anuladas as forças conservadoras que desejavam o retorno do antigo regime ao poder, bem como
foram enfraquecidos os grupos de esquerda, principalmente os jacobinos que ainda ambicionavam por uma França
segundo as ideias de Robespierre ou de Babeuf. Em razão disso, alguns historiadores consideram o governo de
Bonaparte a última fase da Revolução Francesa.
Esse período teve três momentos: Consulado, Império e Governo dos Cem Dias. O Consulado caracterizou-
-se pela implantação de propostas burguesas que confirmaram o liberalismo econômico e o Iluminismo como a
ideologia que coroava o capitalismo. O Império foi uma ditadura pessoal de Napoleão, baseada no poder do exér-
cito, quando se reafirmaram os ideais burgueses e a busca de mercado consumidor para as manufaturas francesas,
o que contrariou os interesses ingleses, que impuseram o Bloqueio Continental. Mesmo assim, a ditadura cumpriu
seu papel de propagandista dos ideais de liberdade igualdade e fraternidade da Revolução Francesa numa espécie
de “revolução de botas”.

Consulado (1799–1804)
O início do governo bonapartista baseou-se numa Constituição promulgada no ano de 1799 e mostrou cer-
to vínculo com várias camadas sociais da população francesa, cujo apoio a Bonaparte baseou-se na ideia popular
de que ele seria uma espécie de salvador da pátria, que retiraria a França da situação de miséria e ressuscitaria a
infraestrutura produtiva urbana e rural do país. A Constituição de 1799 dividiu o legislativo em quatro subparla-

27
mentos fracos. O poder de fato (Executivo) ficaria nas secundário foi organizado com a finalidade de instruir
mãos de três cônsules (Napoleão, Sieyès e Ducos ), dos
1 2
funcionários para o Estado.
quais Napoleão seria o primeiro cônsul e os outros dois, Para governar a França, Napoleão usou o ple-
subalternos seus com mandato de dez anos. biscito. Todas as decisões importantes tomadas por ele
Uma das primeiras tarefas de Bonaparte foi eli- eram posteriormente submetidas ao referendo popu-
lar pelo voto universal. Este mecanismo dava-lhe o
minar o perigo externo. Para isso, avançou sobre a Se-
apoio do homem comum. Para funcionar, no entanto,
gunda Coligação (Inglaterra, Áustria e Rússia), servindo-
era preciso garantir a boa imagem do governo diante
-se até mesmo de intrigas diplomáticas bem elaboradas, do povo e, principalmente, silenciar todos que discor-
que resultaram na saída da Rússia da Coligação. Em dassem do governo. Para isso, estabeleceu ferrenha
1800, a Áustria foi derrotada na Batalha de Marengo e, censura a todos os jornais que se opunham a sua po-
finalmente, em 1802, Napoleão buscou um acordo com lítica e criou um poderoso aparato policial destinado
a Inglaterra, assinando a Paz de Amiens (1802), que a reprimir qualquer oposição.
redefiniu fronteiras coloniais, como as do Egito e das Napoleão criou o Código Civil, considerado
Guianas, transmitindo a falsa sensação de que a França por ele mesmo sua mais importante obra. Garantia os
princípios de cidadania burgueses baseados na liberda-
tinha perdido o desejo de expansão intercontinental.
de individual, de trabalho e de consciência; reiterava o
Napoleão voltou sua atenção para os bur-
Estado laico e a igualdade jurídica já propostos pelo Ilu-
gueses. Anulou as oposições realista e jacobina e minismo. Inspirado no Direito Romano e ratificado em
conseguiu que o governo estabelecesse uma relativa 1804, esse código garantiu o direito de propriedade,
estabilidade graças à concessão de uma anistia aos proibiu as greves operárias e a organização sindical e
opositores do Consulado ao lado da repressão. regulamentou os procedimentos civis e criminais rela-
Preocupado em conseguir o apoio dos cam- cionados à família.
poneses que, durante o governo jacobino, haviam Outro fato político importante de Bonaparte foi
se tornado donos das terras em que trabalhavam, sua aproximação com a Igreja católica, apoiado pelo
Napoleão tomou várias medidas para legalizar es- papa Pio VII. Criou a Concordata (1801), que permitiu
o seu controle sobre o clero francês em troca de sua
sas propriedades, o que lhe rendeu imensa popula-
proteção e de sua inserção no Estado bonapartista.
ridade em todo o interior da França.
O papa aceitou o confisco dos bens eclesiásticos e o
A crise financeira foi controlada pela fundação Estado ficou proibido de interferir no culto; os bispos,
do Banco da França (1800), que passou a exercer o indicados pelo governo e investidos nas funções reli-
controle da emissão de papel-moeda (franco), redu- giosas pelo papa, prestariam juramento de fidelidade
zindo o processo inflacionário. Além disso, o banco fi- ao governo; as bulas só entrariam em vigor depois de
nanciou a estrutura administrativa do governo, as obras aprovadas por Napoleão.
públicas e, principalmente, as indústrias, que tornaram Em 1802, graças ao êxito da política interna e
a França um país capitalista eficiente e competitivo com externa de Napoleão, foi estabelecida a hereditariedade
a burguesia britânica. do Consulado: o primeiro cônsul recebeu do Senado o
direito de indicar seu sucessor. Tratava-se, na realidade,
A educação popular também ocupou a atenção
da implantação da monarquia hereditária.
de Napoleão. Ele sabia que o desenvolvimento indus-
trial da França dependia da formação de uma abun-
dante mão de obra minimamente preparada. O ensino

1. Esse abade Sieyès foi o mesmo que em 1789 insuflara a Revolu-


ção com o panfleto “O que é o Terceiro Estado”. Foi um dos raros
líderes revolucionários a atravessar vivo os dez anos de Revolução.
2. Roger Ducos, general francês, era também ex-membro do Dire-
tório.

28
Império (1804–1814) A ação política do império napoleônico foi ar-
bitrária: limitou as conquistas estabelecidas pela Revo-
lução, a liberdade individual e a de pensamento; jor-
nais e revistas foram censurados. Como nos tempos do
absolutismo, um cidadão poderia ser encarcerado por
qualquer motivo e sem explicação.
Mesmo com despotismo, o absolutismo não foi
restaurado, dadas as diferenças históricas das duas for-
mas de poder político: o império napoleônico era essen-
cialmente burguês, atendia às necessidades e interesses
da burguesia – a “paz social” e a liberdade de comércio
e desenvolvimento industrial. A nobreza do novo regi-
me provinha da burguesia – parentes do imperador, ge-
nerais, grandes comerciantes, banqueiros e industriais.
Seus títulos, no entanto, não lhes conferiam privilégios
como no Antigo Regime, uma vez que, perante a lei, os
novos nobres eram iguais aos demais cidadãos.

Política externa
Napoleão I em regalia. François Gérard. 1805. Palácio de Versalhes.
A paz com a Inglaterra foi efêmera. A França es-
Estabelecida a consolidação interna da Revolução tabelecera uma política protecionista que prejudicava
e vencida a resistência dos inimigos externos, Napoleão o comércio inglês. A Inglaterra, por sua vez, recusava-
assegurou-se do apoio da burguesia, do exército e dos -se a abandonar Malta e o Egito, como ficara decidido
camponeses. Assim fortalecido, não hesitou em dar mais na Paz de Amiens. Para ela, a luta contra os franceses
um passo para a exaltação de sua personalidade. Em tornava-se inevitável, dada a concorrência comercial e
1804, foi promulgada a Constituição do ano XII, apro- industrial nos mercados europeus. Além disso, o exem-
vada em plebiscito pela imensa maioria da população plo francês poderia instigar na Inglaterra o levante das
francesa, que substituía o regime de Consulado pelo de camadas pobres da população que, desde 1688, data
Império. Napoleão fez-se coroar na Catedral de Notre- da Revolução Gloriosa, mantinham-se sujeitas ao con-
-Dame, sob o título de Napoleão I, Imperador dos france- trole da burguesia. Para as monarquias absolutistas eu-
ses. Um imperador que defenderia os ideais da República. ropeias partidárias do Antigo Regime e defensoras dos
Legalizou a reforma agrária, o que contribuiu para privilégios aristocráticos e de reformas mais conserva-
a expansão agrícola, bem como para a melhoria do padrão doras, derrotar a França era uma questão de sobrevi-
de vida dos camponeses e pequenos proprietários rurais. vência, garantia de que os ideais da Revolução Francesa
Financiou mais generosamente as indústrias, que passa- não teriam sucesso no continente europeu.
ram a buscar um mercado consumidor fora de suas frontei- A suspeita de aparentes preparativos franceses para
ras, e as obras públicas, que revitalizaram a infraestrutura invadir a Inglaterra fez com que ela restabelecesse a aliança
– abertura de canais, reconstrução de portos, construção com a Rússia governada por Alexandre I. Com a adesão da
de estradas e embelezamento das cidades. Soma-se a isso Áustria, da Suécia e de Nápoles, estava formada a Terceira
a transformação do ensino de História e Filosofia, dirigido Coligação antifrancesa (1803). A França, por sua vez, ganhou
aos jovens, em doutrinação político-ideológica. Essa reali- a aliança da Espanha, cuja esquadra de guerra juntou-se aos
dade político-ideológica vigiada por uma eficiente censura navios franceses para enfrentar a Marinha inglesa. Mesmo
confirmou, na consciência dos sans-culottes, a sensação assim, a poderosa esquadra britânica, comandada pelo almi-
de que Napoleão Bonaparte era invencível, o “salvador da rante Nelson, saiu-se vitoriosa na famosa Batalha de Trafalgar
pátria”, uma Joana D’Arc de calças. (1805), que impediu a invasão da Inglaterra por Napoleão.

29
© Everett Historical/Shutterstock
1805 Napoleon at Austerlitz. 1908. Ernest Meissonier (1815–1891).
A grande linha da cavalaria e artilharia franceza durante batalha em Austerlitz.

Em terra, porém, a superioridade francesa era clara. Nas batalhas de Ulm, na Prússia, e em Austerlitz, do
Sacro Império Romano-Germânico, Napoleão derrotou as tropas austríacas e russas. Consequência da vitória na-
poleônica em Austerlitz: Napoleão suprimiu o que restava do Sacro Império Romano-Germânico e criou, em 1806,
a Confederação do Reno, que reunia a maioria dos Estados alemães dos quais se autodenominou “protetor”. Com
a Confederação do Reno manteve-se a fragmentação política dos alemães, agora controlados pelos franceses.
Em 1806, Napoleão decretou o Bloqueio Continental contra a Inglaterra, acreditando que, ao fechar-
-lhe os mercados europeus, poderia obrigá-la à paz, provocar uma crise em sua indústria e, consequentemente,
uma crise social sem tamanho. O decreto proibia os países europeus, sob domínio francês ou aliados da França, de
adquirirem produtos ingleses ou de receberem embarcações da Inglaterra em seus portos.
Em 1806 formou-se a Quarta Coligação – Inglaterra, Rússia e Prússia. A Prússia foi rapidamente derrotada na
Batalha de Iena (Prússia) e os russos caíram em 1807, nas Batalhas de Eylau e Friedland (Prússia). Pela Paz de Tilsit, a
Prússia foi desmembrada e a Rússia aliou-se à França.
Países aliados da Inglaterra tentaram resistir às pressões francesas para aderir ao Bloqueio Continental. Foi o
caso de Portugal que, por não aderir, foi invadido por Napoleão, cujo governo foi obrigado a fugir para o Brasil com o
apoio inglês, em 1807. Para a Inglaterra, a mudança da coroa portuguesa para o Brasil facilitou as atividades econô-
micas dela, uma vez que passou a negociar diretamente com Portugal. Mas isso não era absolutamente o suficiente.
A Espanha passava por uma grave crise política, fato que favoreceu a ocupação das tropas francesas. Em 1808
passou a ser governado, por José I, irmão de Napoleão.
O Império Napoleônico até 1811

30
Com a derrota da Quarta Coligação e a invasão plantações. Napoleão conseguiu invadir Moscou, mas
da Península Ibérica, Napoleão tornou-se o grande senhor encontrou a cidade incendiada pelos próprios russos. Na-
da Europa continental. Os territórios não diretamente do- poleão cedeu às dificuldades e resolveu retirar-se para
minados pelo imperador estavam entregues a aliados e sucumbir a um novo e poderoso inimigo: o inverno russo.
familiares, a seus irmãos José, Luís e Jerônimo, respectiva- Do gigantesco exército que invadira o território da Rússia,
mente, reis de Espanha e Nápoles, da Holanda e da Vestfá- apenas 10 mil homens retornaram com vida.
lia. Por onde seus exércitos passavam, a velha ordem era
destruída: implantavam-se constituições, divulgava-se o
Código Civil e modernizavam-se as estruturas econômicas.

A decadência do Império
Napoleão passou a enfrentar fortíssima resistên-
cia dos setores conservadores espanhóis. Lá teve gran-
des dificuldades de impor seu poder na pessoa de seu
irmão. O povo espanhol resistiu tenazmente ao domínio
estrangeiro. Lutou clandestinamente em guerrilhas, o que
tornou a vida do soldado invasor um verdadeiro inferno. Napoleão se retira de Moscou. Adolph Northern.

O Bloqueio Continental, que no início pareceu Incentivada pelo enfraquecimento do Império


ser uma estratégia extremamente eficaz, tornou-se Napoleônico, mais visível após o grande fracasso da
alguns anos depois altamente inconveniente. As es- campanha da Rússia, formou-se a Sexta Coligação –
quadras britânicas comerciavam com as colônias do Inglaterra, Áustria, Prússia e Rússia. Foi quando as
continente americano e impediam a França de obter derrotas e perdas sucederam-se. Em março de 1813,
matérias-primas do Novo Mundo. Napoleão foi derrotado na Batalha de Leipzig; um ano
A maioria das nações europeias, por sua depois, os exércitos da Sexta Coligação tomaram Paris
vez, ressentiam-se da falta do mercado inglês para e Napoleão foi obrigado a abdicar. Foi preso na ilha
o qual, antes, exportavam seus produtos primários mediterrânea de Elba, e o governo francês foi confiado
em troca das manufaturas inglesas. Passaram a co- ao rei absolutista Luis XVIII, da dinastia dos Bourbons,
merciar clandestinamente com os ingleses, burlan- irmão do guilhotinado Luis XVI.
do a vigilância francesa, ao mesmo tempo em que
tramavam seu rompimento com o Império.
Para agravar a situação, em 1809 formou-se a
Quinta Coligação – Inglaterra, Áustria, Prússia e Suécia,
mais uma vez derrotada por Napoleão. Mesmo vitorio-
so, as fissuras do Império cresciam cada vez mais.
O Bloqueio Continental destruiu a economia agrí-
cola da Rússia, que deixou de exportar gêneros primá-
rios para a Inglaterra e foi obrigada a comprar produtos
industrializados franceses mais caros que os britânicos.
Passou a contrabandear com a Inglaterra, o que enfra-
quecia o Bloqueio. Napoleão resolveu punir essa rebeldia
de forma exemplar: invadiu a Rússia com um exército de
600 mil homens. Os russos combateram o exército de Na-
poleão com a tática da “terra arrasada” – retiravam-se
sem enfrentar o inimigo, levando tudo o que podiam e
Napoleão abdicando em Fontainebleau. Paul Delaroche. 1855. Museu de
incendiando casas, envenenando a água, destruindo as Finas Artes, Leipzig.

31
O Governo dos Cem Dias (1815) no entanto, não conseguiu reconstruir seu exército com
a mesma eficácia anterior e foi destruído na Batalha
A restauração monárquica favoreceu a volta dos de Waterloo pela Áustria e pelo exército inglês, liderado
emigrados à França – nobres e membros do alto clero –, por Wellington, que o encarcerou até a morte natural,
despojados e exilados pela Revolução. Mas esse período na remota ilha de Santa Helena, no Atlântico sul.
foi marcado pela violência e arbitrariedade deles e passou O período napoleônico consolidou a Revolução
à história com a denominação de Terror Branco. Paralela- Francesa, à medida que firmou o poder da burguesia e
mente às perseguições e massacres, os emigrados exigiam criou as condições de desenvolvimento da propriedade
a devolução das terras confiscadas durante a Revolução, o privada burguesa, mesmo tendo limitado ou suprimido
que levou os camponeses à explosão de revoltas. certos princípios defendidos pela Revolução.
Em Elba, Napoleão acompanhava atentamente a Na Europa, Napoleão foi o responsável pela ex-
evolução dos acontecimentos. Em 1815, julgou que o mo- pansão dos ideais de modernização política e econô-
mento era propício para fugir da ilha e avançar em território mica da burguesia. Por onde seus exércitos passavam,
francês à frente de sua guarda pessoal de 1,2 mil homens. destruíam-se os últimos redutos do feudalismo e do
Na caminhada até Paris, era saudado por todos e absolutismo. Implantava-se a liberdade de comércio. As
aliava-se aos exércitos enviados para detê-lo, bem como sociedades privilegiadas desapareciam com a igualdade
aos antigos revolucionários. Tratava-se de defender a Re- jurídica e o absolutismo era desmoralizado. Desmoro-
volução, as liberdades burguesas e a propriedade cam- nava-se a balela do direito divino dos reis. Napoleão
ponesa contra os Bourbon, o clero e a nobreza emigrada. fazia e desfazia reis da mesma forma que nomeava ou
Após 20 dias de marcha sem disparar um só tiro, Napo- demitia funcionários.
leão estava em Paris, instalado nas Tulherias. Luís XVIII A prisão e a morte de Napoleão frearam os ide-
fugiu para a Bélgica e Napoleão conseguiu pela segunda ais burgueses, recuperados, no entanto, no século XIX,
vez o poder, em que se manteria por mais cem dias. quando das revoluções liberais e nacionais, que levaram
Organizou as tropas e avançou contra os aliados novamente a Europa a trilhar o caminho da ideologia e
que estabeleceram a Sétima Coligação, com o objetivo da economia capitalista e a distanciar-se definitivamen-
de enfrentá-lo antes que invadissem a França. Napoleão, te do Antigo Regime.

Congresso de Viena (1814–1815)

O Congresso de Viena. Jean-Baptiste Isabey. 1819.

32
Em 1814, após a derrota de Napoleão na Batalha de Leipzig, as potências vitoriosas realizaram na capital
do Império austríaco uma conferência internacional, conhecida como Congresso de Viena. Momentaneamente
interrompida durante o Governo dos Cem Dias, essa conferência foi concluída em 1815 após a derrota de Napo-
leão na Batalha de Waterloo e representou uma reação às ideias liberais e nacionalistas difundidas pela Revolução
Francesa. Seu principal objetivo era restabelecer o Antigo Regime.
Apesar da participação da França, então governada pelo Bourbon Luís XVIII, as decisões mais importantes
foram tomadas pelo Comitê dos Quatro, formado por Inglaterra, Áustria, Prússia e Rússia. Participaram do Con-
gresso de Viena os mais destacados representantes do conservadorismo europeu: o czar Alexandre I, da Rússia; o
lorde Castlereagh, secretário dos negócios estrangeiros da Inglaterra; Talleyrand, ministro dos negócios estrangeiros
da França; o príncipe Hardenberg, da Prússia; e o chanceler da Áustria, Metternich, figura dominante do Congresso.
As negociações entre os monarcas, diplomatas e embaixadores que participaram do Congresso basearam-
-se em três princípios políticos:
§§ Restauração do absolutismo monárquico ou Antigo Regime;
§§ Legitimidade das antigas dinastias depostas durante as guerras napoleônicas, merecedoras, portanto, da
retomada de seus respectivos tronos; e
§§ Equilíbrio Europeu, que visava manter a velha ordem restaurada e preservar a paz na Europa mediante a
equivalência de forças entre as grandes potências.

A Europa após o Congresso de Viena

O Congresso de Viena estabeleceu que as fronteiras da França deveriam retornar aos limites anteriores à Re-
volução. A Inglaterra assegurou sua supremacia naval, graças à anexação de pontos estratégicos, como as ilhas de
Malta e Ceilão, e a colônia do Cabo. A Áustria cedeu a Bélgica à Holanda em troca de parte da Polônia e das regiões
da Lombardia e Veneza, que lhe asseguraram a supremacia na Itália. A Prússia dobrou sua extensão territorial, ao
incorporar parte da Polônia, da Pomerânia e da Saxônia. A Rússia anexou outra parte da Polônia, da Finlândia e da
Bessarábia. A Alemanha e a Itália permaneceram divididas e submetidas à hegemonia austríaca.

33
Em consequência da aplicação do princípio de legitimidade, as antigas dinastias foram restauradas nos tro-
nos de diversos países europeus. Os Bourbon retornaram aos reinos da França, da Espanha e de Nápoles; os Saboia
voltaram ao Reino do Piemonte; os reis de Bragança, a Portugal; e os Orange, à Holanda. O papa foi restabelecido
nos Estados Pontifícios.

A Santa Aliança
O czar Alexandre I propôs aos demais príncipes cristãos reunidos em Viena a formação de um bloco de potên-
cias, cujas relações seriam reguladas pelas “elevadas verdades presentes na doutrina do Nosso Salvador”. Foi esco-
lhido o nome Santa Aliança para designar esse bloco militar, nascido em 1815 e atuante até as revoluções europeias
de 1848.
O objetivo desse pacto militar firmado por Áustria, Prússia, Rússia e França era reprimir os movimentos
liberais, separatistas, nacionalistas ou populares que pusessem em risco a política de restauração, o princípio da
legitimidade e o equilíbrio europeu, bem como restabelecer o pacto colonial nas recém-emancipadas colônias
ibéricas na América.
O apogeu dessa aliança foi marcado por intervenções militares que esmagaram os movimentos liberais ou
nacionalistas ocorridos em alguns países da Europa. Em 1819, a Santa Aliança reprimiu os nacionalistas que luta-
vam pela unificação da Alemanha; em 1821 e 1822 interveio em Nápoles e na Espanha para combater os liberais
que lutavam contra o absolutismo.
Nessas empreitadas, a Inglaterra absteve-se porque discordava dos planos da Santa Aliança de restaurar o
antigo colonialismo na América. Os novos países independentes no continente americano aderiram ao livre comér-
cio e abriram seus mercados aos produtos industriais ingleses. A restauração do pacto colonial nessas áreas seria
extremamente prejudicial aos interesses comerciais ingleses.
Além da ausência da Inglaterra, outro duro golpe na Santa Aliança foi a proclamação da Doutrina Monroe,
em 1823, pelo EUA. Baseando-se no lema “a América para os americanos”, essa doutrina tinha como princípio
fundamental que o Novo Mundo deveria solucionar seus problemas internos sem nenhuma intervenção das po-
tências europeias. À luz desse princípio, o governo dos EUA passou a considerar ato de guerra qualquer agressão
estrangeira a um país americano.
O golpe final à política da Santa Aliança veio com o triunfo de novas revoluções liberais na Europa a partir de 1830.

34
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo Construindo um Império: Napoleão (Dublado)

Fonte: Youtube

Filme Napoleão (1927)

Napoleão é um filme mudo francês do gênero épico, dirigido por Abel


Gance. Ele conta a história da ascensão de Napoleão Bonaparte. Foi
planejado para ser o primeiro de seis filmes sobre o imperador francês, no
entanto, os custos envolvidos tornaram isso impossível.
Seu primeiro lançamento foi em uma première de gala, na Ópera de Paris,
em abril de 1927. Napoleão havia sido exibido em apenas oito cidades
europeias quando a Metro-Goldwyn-Mayer comprou os direitos do filme.
Após uma exibição intacta em Londres, ele foi drasticamente cortado para
a exibição nos Estados Unidos.

36
LER

Livros
Napoleão - sua vida, suas batalhas, seu império – David
Chanteranne, Emmanuelle Popot

Napoleão Bonaparte é um dos maiores líderes da História. Fa-


moso por seu surpreendente sucesso no campo de batalha, contribuiu
para a França tornar-se o maior poder continental imperial desde Roma.
Sua influência duradoura estende-se além da esfera militar, moldando a
Europa que conhecemos hoje. Este livro dá uma ideia sem precedentes
da mente deste homem extraordinário que, com um início modesto na
Córsega, tornou-se imperador da França e de seu vasto império. O livro
examina as batalhas que fizeram dele uma lenda e analisa as reformas
políticas e sociais que realizou e que revolucionaram o mundo ociden-
tal, conturbada fase de movimentos revolucionários.

Napoleão – André Maurois

Em Napoleão, o biógrafo André Maurois apresenta a comple-


xidade do imperador apresentando sua personalidade, seus acertos
e erros. O texto de Maurois, mescla de relato jornalístico e narrativa
histórico-literária, conduz o leitor a participar dos questionamentos a
respeito das mudanças ocorridas a cada fase da vida de Napoleão. O
livro revela as lendas e os fatos, as forças e as limitações, os blefes e as
certezas, a idealização e o homem real, além de apresentar um caráter
de entretenimento por meio de uma série de curiosidades relacionadas
ao comportamento do imperador e acontecimentos em seu entorno.

37
INTERDISCIPLINARIDADE

A Rússia é atravessada por quatro climas: ártico, subártico, temperado e subtropical. As estações podem ser
caracterizadas assim: inverno longo e nevoso; primavera temperada; verão curto e quente; e outono chuvoso. Essas
características, entretanto, variam muito por região. A região mais a norte do país, chamada Sibéria, é a mais fria de
todo o país. Registram-se temperaturas no inverno da ordem dos –40 °C ou –50 °C, às vezes chegando aos –60 °C
ou até menos. Ao sul, o clima é mais quente, havendo campos e estepes onde as temperaturas chegam aos –8 °C.
Nesse duro clima, o exército de Napoleão foi brutalmente vencido, obrigado a recuar até a Europa central.
A obra Guerra e Paz, de Tolstoi, narra este evento com rara precisão e beleza.

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Estrutura Conceitual

A CONSULADO (1799-1804)

ERA NAPOLEÔNICA Golpe de 18 Brumário


(1799 - 1815) Governo de 3 cônsules

CARACTERÍSTICAS MEDIDAS
Reaproximação com a Igreja
Consolidação do poder da burguesia
Organização do sistema industrial e financeiro (Banco da França)
Apoio popular
Educação pública universal
Supressão dos princípios da revolução
Código Civil e Código Napoleônico)
Reorganização da economia
Eliminação do perigo externo Defesa da propriedade privada
Proibição de greves e sindicatos
Igualdade jurídica

B IMPÉRIO (1804-1814)
Apoio do exército, burguesia e camponeses
Plebiscito declara Napoleão imperador

CARACTERÍSTICAS MEDIDAS POLÍTICA EXTERNA


Manutenção da ordem interna Censura Vitória sobre as coligações até 1809
Expansão militar no continente europeu Reforma agrária Bloqueio continental (1806)
Destruição do antigo regime na Europa Obras públicas Controle sobre o território europeu
Expansão do liberalismo na Europa Expansão militar Enfraquecimento
Expansão do mercado interno 1812 - Derrota na Rússia
1813 - Derrota na Batalha de Leipzig
1814 - Ocupação de Paris e exílio
de Napoleão

Derrotas na Espanha
Boicote ao bloqueio continental

C GOVERNO DOS CEM DIAS (1815)


Retorno de Napoleão
Imagem de defensor da Revolução
Derrotado na Batalha de Waterloo por Inglaterra e Áustria
Exílio na ilha de Santa Helena

CONGRESSO DE VIENA
(1814 - 1815)

OBJETIVO PARTICIPANTES PRINCÍPIOS

Restabelecer antigo regime Inglaterra, Áustria, Prússia e Rússia Restauração


Legitimidade
Equilíbrio europeu
MEDIDAS
Redefinição de fronteiras
Santa Aliança Unidade militar
Luta contra grupos liberais
OPOSIÇÃO Recolonização da América
Inglaterra
Estados Unidos

39
31 32
Revoluções de 1830-1848
e Segunda Revolução
Industrial
Competências Habilidades
1, 2, 3, 4, 5 e 6 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,
13, 14, 16, 17, 18,
20, 22, 23, 24, 25,
26, 28 e 29

C H
HISTÓRIA
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-
H8
-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferen-
tes grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favo-
recendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.
Introdução
No início do século XIX, forças sob o comando da burguesia liberal, inspiradas pela Revolução Francesa e
lideradas por Napoleão Bonaparte, invadiram grande parte da Europa, enfraquecendo, com isso, o Antigo Regime.
Com a derrota de Napoleão em Waterloo, configurou-se um ambiente propício ao retorno das casas reais absolu-
tistas, cenário em que nasceu o conservador Congresso de Viena, que recusou os ideais revolucionários. Contudo,
as forças de oposição reagruparam-se e passaram a se rebelar contra o próprio regime absolutista. Foi o caso
da deflagração da Revolução Liberal do Porto (1820), em Portugal, que estabeleceu a monarquia constitucional
e subordinou o poder do rei João VI ao parlamento lusitano. Em outras áreas europeias, desenhava-se o mesmo
cenário de busca pela liberdade. No entanto, como o Congresso de Viena havia legitimado as invasões territoriais
da Áustria, Prússia e Rússia sobre algumas regiões da Europa, a luta pelo ideal de liberdade e pelo liberalismo
burguês passou a incluir também a luta pela independência daquelas regiões, acendendo a luz do nacionalismo.

Revoluções de 1830
A França pós-Napoleão

Luís XVIII Carlos X

Em 1814, com a volta dos Bourbon e a coroação de Luis XVIII, após a derrota de Napoleão na Batalha de
Leipzig (1813), inaugurou-se o período de restauração na França. Bruscamente interrompida em 1815 pelo gover-
no dos Cem Dias, a restauração foi retomada após a derrota definitiva de Napoleão em Waterloo.
A restauração na França não significou a volta à política absolutista. A partir de 1815, Luis XVIII adotou
uma política de meio termo, procurando conciliar a restauração do absolutismo com a manutenção de algumas
conquistas da Revolução de 1789, como a igualdade jurídica dos cidadãos franceses. Outorgou uma constituição
instaurando uma assembleia que seria eleita pelo voto censitário.
Luis XVIII governou com o apoio dos ultrarrealistas – adeptos ferrenhos do Antigo Regime –, que queriam
restabelecer o absolutismo de origem divina dos reis. Inspirados pelo chamado “terror branco”, passaram a perse-
guir os liberais, partidários da Revolução Francesa, e os bonapartistas, mediante ações que se caracterizaram como
verdadeiros massacres. Os excessos cometidos pelos ultrarrealistas obrigaram Luis XVIII a dissolver a Câmara e
convocar novas eleições, vencidas pelos constitucionalistas, partidários da plena aplicação da Constituição.

43
Após a morte de Luis XVIII, em 1824, ascendeu ao domínio do parlamento liberal e do próprio monarca Luís
trono seu irmão Carlos X, chefe do partido ultrarrealista, Filipe, que também representava os interesses do capital
que, em 1830, apoiado pela nobreza, desfechou um golpe financeiro, o que lhe valeu o apelido de “rei banqueiro”.
de Estado, com a intenção de aniquilar a oposição liberal
burguesa e restaurar o absolutismo no país. Em julho da- A revolução liberal em outros países
quele ano, decretou a dissolução da Assembleia, a abolição
Essa revolução repercutiu na Europa e a burgue-
da liberdade de imprensa, o aumento do censo eleitoral e
sia passou a propagandear seus ideais, que foram sen-
uma lei que previa a indenização dos nobres, cujos bens
do assumidos pela maioria da população das pequenas
houvessem sido confiscados durante a revolução.
nações na luta pela liberdade política (liberalismo), pelo
Essas medidas de caráter absolutista foram criti-
nacionalismo e crítica às decisões do Congresso de Viena.
cadas pelo povo parisiense nas barricadas nas ruas du-
Foi nesse contexto que os belgas separaram-se da
rante os “Três dias gloriosos”. Nas barricadas erguidas
Holanda, criando uma nova monarquia constitucional e en-
pelos populares, lutou-se contra as tropas fiéis ao rei.
fraquecendo mais ainda a ordem estabelecida pelo Congres-
Na madrugada do dia 29 de julho de 1830, a revolução
so de Viena. Nos estados italianos, a fragmentação política
mais uma vez triunfou na França. Carlos X, temendo o
manteve-se, uma vez que, apesar da luta incansável dos
mesmo fim de Luis XVI, fugiu para a Inglaterra, deixan-
progressistas Carbonários, a oposição à unificação por parte
do o trono para seu neto menor de idade.
do papa e da Áustria derrotou as forças liberais nacionalis-
tas. Nos estados alemães, a descentralização manteve-se,
pois a unificação alemã significava a perda de uma parte
do território austríaco. Sobrou-lhe apenas a união aduaneira,
a zollverein, conseguida por intermédio do prussiano Bis-
marck, representante dos junkers alemães – nobreza grande
proprietária de terra. Ocorreram também revoltas liberais na
Espanha e em Portugal. Na Polônia, uma revolta nacionalista
foi abafada pelos russos. Apesar da intervenção das tropas
da Santa Aliança e da derrota das revoltas, o fermento revo-
lucionário, no entanto, continuou por toda a Europa, tornan-
do a restauração uma obra falida: o liberalismo e, mais tarde,
o nacionalismo triunfariam.
A Liberdade guiando o povo. 1830. Delacroix retrata os “três dias
gloriosos”.

Naquele momento, a burguesia francesa, ao Revoluções de 1848:


contrário de parte da população de Paris, não queria
um governo republicano. Queria um rei ligado aos seus a “primavera dos povos”
interesses e que elaborasse leis que ajudassem seus
negócios; desejava de fato instaurar uma monarquia
constitucional. Por isso, os burgueses nomearam rei da
França o duque de Orleans, Luís Filipe, cuja família man-
tinha estreita relações com os grandes banqueiros.
A burguesia temia o fim da dinastia dos Bourbon
e a instauração de um governo republicano radical nos
moldes do antigo governo jacobino. Numa jogada po-
lítica em busca de moderação, recorreu à dinastia dos
Orleans, instaurando uma monarquia constitucional,
semelhante à implantada na Inglaterra, em 1688, com
a Revolução Gloriosa. Esse novo governo estava sob o Barricadas nas ruas de Paris durante a Revolução de junho de 1848. Horace Vernet.

44
Fatores Os oposicionistas ao governo de Luís Filipe
organizaram-se em vários partidos: legitimista, consti-
De modo geral, foram três os fatores das revo- tuído pela nobreza, desejosa de restaurar o poder dos
luções de 1848: o liberalismo, contrário às limitações Bourbon, depostos em 1830; bonapartista, formado
impostas pelo absolutismo; o nacionalismo, que pro- pela pequena burguesia e liderado por Luis Bonaparte,
curou unir politicamente os povos de mesma origem e sobrinho de Napoleão; socialista, composto por diver-
cultura; e o socialismo, força nova, nascida nos movi- sas facções que procuravam organizar a classe operária;
mentos de 1830, que pregou a igualdade social e eco- republicano, de tendência nacionalista, que encontrava
nômica mediante reformas radicais. apoio entre a classe média e os profissionais liberais.
Além desses, podem ser mencionados também O povo francês não se sentia satisfeito com o
como fatores das revoluções de 1848: elitismo liberal do governo de Luís Filipe e passou a ten-
§§ as péssimas colheitas na Europa, entre 1846 e tar derrubá-lo. Como a burguesia percebeu a impossi-
1848, fazendo com que os preços dos produtos bilidade da permanência do rei, passou a discutir sua
agrícolas subissem muito, agravando a situação substituição, que ocorreu após o líder do governo ter
das camadas mais pobres; reprimido um “banquete” da oposição.
§§ a crise na indústria – notadamente a têxtil – e
agrícola, que desencadeou o empobrecimento
dos camponeses e diminuiu ainda mais o con-
sumo de tecidos, gerando superprodução e de-
semprego.
A crise variou de país para país. Na Itália e na
Irlanda, foi principalmente agrária; na Inglaterra e na
Prússia, foi mais industrial.

A revolução na França
Quando Luís Filipe assumiu o poder, um político
francês comentou: “De hoje em diante governarão os
banqueiros”. Ele tinha razão. Todas as frações da bur-
guesia – pequenos burgueses, industriais, comerciantes
etc. – haviam participado da luta contra o poder absolu-
tista e a velha aristocracia, mas quem assumiu o poder Luís Filipe, o “rei burguês”
foi apenas uma parte da burguesia ligada ao capital
Seguido pela população da cidade e por alguns se-
financeiro.
tores da Guarda Nacional, o proletariado parisiense rebe-
Em relação ao governo anterior, houve pequenos
lou-se. Foram três dias de luta nas barricadas. No dia 24 de
progressos sociais: direito de voto muito pouco amplia-
fevereiro, Luís Filipe abdicou, quando então estabeleceu-se
do, imprensa censurada e oposição reprimida. Mesmo
um governo provisório que proclamou a República.
assim, a França conseguira um desenvolvimento indus-
O governo provisório constituído por republi-
trial acelerado, que fortaleceu a burguesia industrial e
canos, socialistas e bonapartistas assinalou o início da
comercial. Por outro lado, a situação dos operários era
Segunda República Francesa. O novo governo era presi-
de extrema miséria, de baixos salários e de jornada de
dido pelo poeta Lamartine, republicano liberal, ao lado
trabalho com mais de 14 horas diárias.
de Louis Blanc, ministro do Trabalho e porta-voz da cor-
rente socialista.

45
Sob pressão dos trabalhadores, foram criadas estradas de ferro, portos, canais e estradas. O prefeito
as oficinas nacionais, empresas dirigidas e sustentadas Haussmann mudou a fisionomia de Paris, ampliando
pelo Estado. Para pagar os salários dos trabalhadores suas avenidas e reurbanizando a cidade.
dessas oficinas, os impostos foram elevados, o que pro-
vocou uma crise ainda maior na economia francesa. As
oficinas foram fechadas.
Nesse ambiente de radicalização, a II República
foi implantada; o voto universal foi instituído, para temor
da burguesia, mas imprescindível para que ela obtivesse
o apoio da população e não se mantivesse isolada, per-
mitindo o crescimento político dos grupos radicais. Um
governo híbrido formado de liberais e radicais foi cria- O Arco do Triunfo iniciado durante o governo de Napoleão III (1853–1870)
e a Paris dos bulevares (avenidas)
do, mas, em virtude das divergências internas, sua ação foi implantada pelo barão Haussmann, prefeito de Paris.
ficou impossível. A burguesia aproveitou-se da situação
A burguesia passou a desfrutar de um governo
para indicar o sobrinho de Napoleão Bonaparte para a
estável e moderado, que incentivou o desenvolvimento
presidência do país, graças à sua popularidade, herda-
fabril e das ciências, período em que vingou o Positivis-
da do tio, e às suas ligações com o pensamento liberal.
mo e a Segunda Revolução Industrial.
Luís Bonaparte venceu a eleição pelo voto universal e a
burguesia continuou a controlar a administração pública.
A expansão da revolução
para a Europa
Revolução de fevereiro de 1848 na França pode
ser considerada o estopim para o início de um período
revolucionário no resto da Europa. A Itália viu-se sacu-
dida por movimentos que se estenderam do Sul ao Nor-
te. Na Alemanha, a Prússia viveu um grande movimento
popular. O mesmo ocorreu no Império austríaco, quando
a capital foi totalmente tomada pelos revolucionários.
Da mesma forma que, na França, os ideais do
liberalismo contra a autocracia dos governos absolutis-
tas, as necessidades da burguesia, juntamente com o
crescimento da classe operária e do socialismo, devem
Napoleão III
ser vistos como provocadores dessa onda revolucioná-
Em 1851, a burguesia notou que o governo de ria. Mas há um dado diferenciador entre a revolução na
Luis Napoleão tinha possibilidade de acabar com a radi- França e nas demais regiões europeias: o nacionalismo.
calização da República, uma facção da burguesia apoiou- A Itália e a Alemanha tiveram de lutar por sua
-o numa espécie de segundo golpe de 18 de brumário unificação. A Hungria foi obrigada a lutar contra o
que implantou um plebiscito e tornou-o “imperador” domínio austríaco.
com o título de Napoleão III no Segundo Império. As repercussões das revoluções de 1848 foram
Eram os mesmos passos do tio com o apoio do povo. tão amplas que atingiram o Brasil, na chamada Revolu-
Politicamente, o Segundo Império caracterizou- ção Praieira, em Pernambuco.
-se pelo cesarismo de Napoleão III, que governou dita-
torialmente por meio de vários plebiscitos.
No âmbito social, empreendeu vigoroso pro-
grama de modernização do país, com a construção de

46
Segunda Revolução Industrial §§ o motor a combustão interna, inventado por
Nikolaus Otto e aperfeiçoado por Rudolf Diesel,
que abriu caminho para a utilização do petró-
leo em larga escala. Ele passou a ser utilizado
como força motriz em navios e locomotivas,
criando também condições para o aparecimento
do automóvel e do avião.
Enquanto a primeira fase da Revolução Indus-
trial concentrou-se na produção de bens de consumo,
particularmente de têxteis de algodão, na segunda fase,
a indústria pesada passou a ser o centro do sistema
produtivo. A produção de aço superou a de ferro e os
Processo Bessemer de transformação do ferro em aço.
preços caíram consideravelmente. O descobrimento dos
No século XIX, ocorreu na Europa a Segunda processos eletrolíticos estimulou a produção de alumínio.
Revolução Industrial, de início na Inglaterra, França, Na indústria química, o grande avanço foi
Bélgica e Holanda; em seguida expandiu-se por outros representado pela obtenção de métodos mais baratos
países da Europa, Estados Unidos e Japão. Em virtude para produção de soda e ácido sulfúrico, particularmen-
das inovações e do incremento da produção dos produ- te importantes para a fabricação de papel e explosivos
tos industrializados, ocorreu uma superprodução, e as e para a vulcanização da borracha.
burguesias monopolistas passaram a buscar novos mer- O desenvolvimento acelerado dos meios de
cados consumidores na África e na Ásia, mediante um transporte também representou uma verdadeira revo-
novo movimento expansionista europeu denominado lução. A construção e expansão das ferrovias exigiram
neocolonialismo. Paralelamente, havia a necessidade de que os bancos e as companhias de ações mobilizassem
encontrar novas fontes de matéria-prima e de energia, os capitais. Efeitos multiplicadores desse processo fo-
como carvão mineral, minério de ferro, petróleo e algo- ram a dinamização da produção de ferro, dormentes,
dão. Como os lucros eram vultosos e havia excedente cimento, locomotivas e vagões. A invenção do barco a
de capital, o capitalismo passou a investir capitais em vapor por Robert Fulton, em 1808, transformou a nave-
novas regiões conquistadas na África e na Ásia, proces- gação marítima. As ligações transoceânicas ganharam
so denominado imperialismo. impulso após 1838, com a invenção da hélice.
A agricultura adaptou-se às novas condições im-
Características postas pela sociedade de massa, que incorporou novos
produtos e novos instrumentos de trabalho e intensifi-
Entre as invenções que assinalaram o começo da cou os rendimentos, adequando a produção ao merca-
Segunda Revolução Industrial, três merecem especial do consumidor.
destaque:
§§ o processo Bessemer de transformação do A expansão da Revolução Industrial
ferro em aço, descoberto por Henry Bessemer,
que possibilitou a produção do aço em grande A Bélgica foi o primeiro país da Europa Con-
escala, transformando-o no elemento básico tinental a industrializar-se rapidamente no século XIX,
dessa nova fase do processo de industrialização; industrialização essa facilitada graças ao carvão e ao
§§ o dínamo, cuja invenção criou condições para ferro, resultado do investimento de capitais ingleses e
a substituição do vapor – energia mecânica – da proximidade do grande mercado europeu.
como força motriz da maquinaria industrial pela A revolução industrial na Alemanha foi im-
eletricidade; pulsionada pela unificação. A integração do mercado
interno, o ferro da Alsácia-Lorena, a indenização de
guerra (franco-prussiana) paga pela França levaram a

47
Alemanha a um acelerado desenvolvimento econômico: em menos de meio século ela ascendeu à condição de
primeira potência industrial da Europa Continental.
Na Itália, a unificação política realizada em 1870, à semelhança da alemã, impulsionou, embora tardia-
mente, a industrialização do país, que se limitou ao Norte, enquanto o Sul continuou essencialmente agrário.
Na França, houve uma lenta transformação, acelerada a partir de 1848. A falta de carvão, a estagnação
demográfica e o investimento de seus capitais no exterior limitaram o avanço industrial. Lá se criou uma cultura
burguesa que unia à industrialização um estilo de vida alegre e luxuoso chamado de Belle Èpoque, particularmente
no que se referia à moda no cotidiano – vestimenta e etiquetas. A burguesia francesa financiou feiras científicas e
festas. A construção da Torre Eiffel foi de fato uma propaganda para a qualidade do aço de siderurgia do próprio
Eiffel. A potência imperialista francesa explorou as regiões africanas da Tunísia, Argélia, Somália e Madagascar, e
na Ásia, da península coreana e a da Indochina.

Abril de 1888 Julho de 1888 Dezembro de 1888 Maio de 1889


Etapas da construção da Torre Eiffel

A Rússia foi o último país da Europa a industrializar-se no século XIX, graças à intensa participação do
Estado e dos capitais estrangeiros que dominavam a indústria russa.
Nos EUA, a revolução industrial foi impulsionada depois do fim da Guerra de Secessão, em 1865, em que
os estados do Sul e do Norte defrontaram-se numa guerra civil. Findo o conflito e a escravatura, a incorporação dos
mercados sulinos, a política aduaneira protecionista e a riqueza dos recursos naturais permitiram que a expansão
industrial estadunidense acontecesse.
Na Ásia, a industrialização mais importante foi a do Japão, cujo ponto de partida foi com a Revolução
Meiji (luzes), em 1868. Até então, o Japão era um país fechado, dominado por uma aristocracia feudal que
explorava a enorme massa de camponeses. O governo era exercido pelo Shogun (supremo comandante militar)
desde 1192, cujo imperador tinha apenas poder simbólico. Com o apoio dos estrangeiros, o imperador Mutsuhito
derrotou os exércitos do antigo Shogun e passou a incorporar a tecnologia ocidental com vistas à modernização
do Japão. O feudalismo foi superado com a centralização da autoridade política e a intervenção governamental
na economia. Desenvolvidas as indústrias, o Estado transferia-as a particulares em condições vantajosas de pa-
gamento. Formaram-se, assim, poderosas concentrações industriais (zaiabatsu). Quatro famílias apenas – Mitsui,
Sumitomo, Mitsubishi e Yasuda – controlavam 40% de todos os depósitos bancários, 60% da indústria têxtil, 60%
da indústria militar e a maior parte da energia elétrica. A necessidade de matérias-primas e de mercados externos
levou o Japão a praticar uma política de expansão imperialista na região, que provocou, em 1894, a Guerra Sino-
-japonesa, assim como a Guerra Russo-japonesa, em 1904, ambas vencidas pelo Japão, o que o transformou na
grande potência do Extremo Oriente.
48
ção da livre concorrência pelo monopolismo. Com a Segun-
da Revolução Industrial no final do século XIX, surgiram
grandes conglomerados econômicos e subprodutos típicos
desse novo sistema: trustes, cartéis e holdings.

§§ Trustes: formam-se graças à eliminação


ou absorção de pequenos concorrentes por
grandes empresas, produtoras de determi-
nadas mercadorias, que passam a monopo-
lizar a produção, o preço e o mercado. São
regularmente resultado da fusão de empre-
sas do mesmo ramo.
§§ Cartéis: são formados mediante acordo en-
Rainha Vitória tre grandes empresas que, para evitarem os
A Inglaterra era governada pelo liberal parlamento desgastes da concorrência, convencionam
burguês; contudo, a rainha Vitória (1837 - 1901), da casa entre si formas de manutenção dos preços e
de divisão dos mercados, deixando sempre a
real dos Hannover, era extremamente ligada à burguesia que
salvo a autonomia de cada uma delas.
a escolheu como porta-voz de seus valores industriais, angli-
§§ Holding: consiste na assunção do controle
canos e calvinistas. A Grã-Bretanha já exercia o predomínio
de uma grande companhia sobre inúmeras
na navegação internacional, produtora que era de 80% da
outras mediante a compra da maior parte
produção mundial de navios. Controlava áreas africanas –
de suas ações, o que lhe permite passar a
Egito, Sudão, Nigéria, Serra Leoa, Costa do Ouro – e, poste- atuar de forma coordenada.
riormente, comprou a África do Sul da Holanda. Na Ásia, o
Reino Unido invadiu grande parte da China e da Índia. Na Segunda Revolução Industrial, a substituição
do vapor pela eletricidade e pelo petróleo como forças
Consequências da Segunda motrizes na produção, aliada à extrema divisão e es-
Revolução Industrial pecialização do trabalho, abriram caminho para o pro-
cesso de produção em série. As mercadorias passaram
A partir da Segunda Revolução Industrial, o ca- a ser produzidas uniforme e padronizadamente e em
pitalismo industrial foi gradualmente cedendo lugar ao quantidades até então desconhecidas, o que causou o
capitalismo financeiro e passando para os grandes fenômeno da superprodução, causa principal da Grande
bancos o controle das empresas industriais e comer- Depressão de 1873 a 1896.
ciais. As finanças conquistaram a supremacia sobre a Outra consequência importante da Segunda Re-
produção e a circulação de mercadorias. Nessa etapa, volução Industrial e da era do capitalismo financeiro ou
os grandes bancos investiram na compra de ações e fo- monopolista foi o desenvolvimento do imperialismo. O
ram assumindo o controle acionário das empresas. Por processo de industrialização criou para os países capita-
outro lado, os empréstimos e financiamentos também listas uma série de problemas de cuja solução dependia
a manutenção do ritmo de desenvolvimento industrial. As
contribuíram para submeter as empresas à inteira de-
potências capitalistas necessitavam de mercados externos
pendência das instituições financeiras.
que servissem de escoadouro para o excedente de merca-
Na Primeira Revolução Industrial, ocorreu o desen-
dorias. Precisavam também de minérios e matérias-primas,
volvimento do liberalismo econômico, que se baseava na
essenciais à produção dos produtos industriais, que, muitas
livre concorrência, sistema esse que criou condições para vezes, não existiam em seu próprio território e necessita-
que as grandes empresas eliminassem ou absorvessem as vam de, além de mão de obra barata, áreas favoráveis ao
pequenas mediante processo cujo resultado foi a substitui- investimento seguro e lucrativo de seus capitais.

49
Essas necessidades levaram os países capitalistas a desenvolver, na segunda metade do século XIX, uma política
de expansão externa, o neocolonialismo, que ficou conhecido como imperialismo. Na passagem do século XIX para o
XX, o expansionismo imperialista provocou uma série de rivalidades entre as grandes potências em razão da divisão do
mercado mundial – notadamente da África e da Ásia –, que desencadearam, em 1914, a Primeira Guerra Mundial.
O avanço tecnológico acelerou a passagem de uma economia essencialmente agrária e artesanal para uma
economia industrial, o que transformou a vida das pessoas no decorrer do século XIX.
Com a Revolução Industrial, as pessoas passaram a viajar em trens à vapor à velocidade de 150 km por hora
e em navios também movidos a vapor.
A Revolução Industrial introduziu o conceito de progresso, inúmeros benefícios materiais e conforto às pessoas.
A máquina diminuiu o esforço físico dos homens, bem como lhes provocou novos transtornos físicos. No século XIX, a
burguesia inglesa já contava com iluminação a gás, cortinas e tapetes adquiridos nos grandes magazines que surgiram
em Londres e em Paris a partir de 1840. As percepções e os hábitos da vida cotidiana foram afetados pela máquina
fotográfica, o gramofone, a máquina de escrever, as porcelanas inglesas, entre outros.
Antonio S. G. Meucci criou um protótipo do telefone e vendeu sua criação a Alexander Graham Bell, que
o aperfeiçoou e, em 1876, patenteou-o como invenção sua. Somente em 2002, o Congresso dos Estados Unidos
aprovou uma resolução reconhecendo Meucci como o inventor verdadeiro do telefone.

Alexander Graham Bell


Em 1900, a maior parte do mundo estava interligada pelos cabos do telégrafo elétrico.
Com os avanços, as noticias difundiam-se com mais rapidez.
Mas os benefícios do progresso não eram para todos. As cidades do século XIX, como Londres e Paris, cres-
ceram sem planejamento. Operários e burgueses já não dividiam a mesma vizinhança; aqueles moravam perto das
fábricas enquanto os patrões, nos subúrbios mais distantes e arborizados.
As cidades foram surgindo em torno das fábricas com ruas estreitas e labirintos; as casas dos operários eram
pequenas e miseráveis, grudadas umas às outras e eram compostas por cômodos nem sempre tinham janelas.

Siderúrgica em Barrow, Inglaterra, 1874

50
O ar era impregnado dos gases das chaminés. Não havia serviços públicos básicos, como água limpa e rede
de esgotos. Essas cidades industriais eram feias, sujas e tristes; os rios, imundos. Essa situação favorecia a dissemi-
nação de epidemias e doenças; cólera, varíola, escarlatina e tifo eram frequentes entre os trabalhadores. O trabalho
nas fábricas consumia cerca de 15 horas por dia homens, mulheres e crianças – algumas com apenas cinco anos.
Os salários eram baixíssimos e não permitiram aos trabalhadores usufruírem as maravilhas da sociedade industrial.
As aldeias transformaram-se em grandes cidades e parte da população rural foi obrigada a se deslocar para
os centros urbanos em busca de trabalho nas fábricas. Aliado ao aumento da produção e da produtividade, houve
sensível aumento populacional entre 1750 e 1850. Na Inglaterra, a população urbana quase triplicou.

Operários em Londres, no século XIX

Graças ao progresso nos métodos agrícolas – caso da máquina semeadora –, o preço dos alimentos foi
reduzido, e graças também às importações de mercadorias estadunidenses e ao barateamento nos transportes
pelas estradas de ferro.
A invenção da comida enlatada mudou hábitos alimentares. Se até o século XIX o alimento sempre vinha
das hortas e plantações locais, passou a vir também de qualquer canto do mundo.
Com a introdução das máquinas, a força muscular deixou de ser necessária ao trabalhador das indústrias
têxteis. Aproveitou-se, com isso, o trabalho de mulheres e crianças, cujos salários não chegavam à metade do que
se pagava a um homem adulto. Os dedos finos das crianças eram úteis na manutenção das máquinas e seu porte
físico adequado ao espaço apertado entre as instalações.
A disciplina era rigorosa e os acidentes de trabalho, muito frequentes, reflexos de má alimentação e da
fadiga. Crianças trabalhavam sobre pernas de pau para alcançarem os teares. Se adormecessem, podiam ter seus
dedos quebrados nas engrenagens.
A literatura dessa época registra personagens pálidos, quase sem vida. A partir de meados do século XIX,
houve melhoras nas condições de trabalho graças às reações e pressões dos próprios trabalhadores organizados
em associações e sindicatos.

51
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo II Revolução Industrial

Fonte: Youtube

Filme Os Miseráveis (2012)

Os Miseráveis é um filme britânico dos gêneros drama, musical e roman-


ce. O longa-metragem é baseado no musical de mesmo nome, de Alain Boublil,
Claude-Michel Schönberg e Herbert Kretzmer – que por sua vez é baseado em
Os Miseráveis, o romance francês de 1862 escrito por Victor Hugo.
A história passa-se na França do século XIX entre duas grandes ba-
talhas: a Batalha de Waterloo (1815) e os motins de junho de 1832. Daqui
resulta, por cinco volumes, a vida de Jean Valjean, um condenado posto em
liberdade, até sua morte. Em torno dele giram algumas pessoas que vão dar
seus nomes para os diferentes volumes do romance, testemunhando a miséria
deste século, a pobreza miserável de: Fantine, Cosette, Marius, mas também
Thénardier (incluindo Éponine e Gavroche) e o inspetor Javert. O livro retrata
a sociedade francesa do sec. XIX e mostra o panorama socioeconômico da
população mais pobre.

52
LER

Livros
Tocqueville, Burke, Paine - Revolução, democracia
e tradição – Ricardo Luiz de Souza

A obra “Tocqueville, Burke, Paine – Revolução, democracia e tradi-


ção” apresenta uma análise comparativa do pensamento de Alex de Toc-
queville, Edmund Burke e Thomas Paine, três clássicos do pensamento
político que escreveram a partir de uma mesma temática, qual seja, o
processo de surgimento da democracia contemporânea nos movimen-
tos revolucionários da Revolução Francesa, a independência dos Estados
Unidos e as revoluções de 1830 e 1848.

Lembranças de 1848 - As Jornadas Revolucionárias em


Paris – Alexis de Tocqueville

O ano é 1848. Ao longo de um inverno rigoroso, agitações po-


líticas e sociais espalham-se pela França. A população de Paris, centro
da monarquia, subleva-se no final de fevereiro, forçando a abdicação
e a fuga do rei Luís Filipe. Contudo, uma reação conservadora logo se
impõe no governo republicano e na Assembleia Constituinte. No mês de
junho, operários levantam barricadas em uma revolução socialista, cuja
repressão resulta na morte de quase 5 mil pessoas. Em ‘Lembranças de
1848’, Alexis de Tocqueville oferece seu testemunho daquele momento
da história da França e de toda a Europa, reconstituindo os fatos e per-
sonagens da revolução, desde seu ponto de vista de cidadão, deputado e
ministro do ‘partido da ordem’. O autor retrata o emaranhado de facções
em luta pelo poder durante a Segunda República sem se deixar iludir
pelo olhar enviesado de membro de uma aristocrática família, e denuncia
o artificialismo e a teatralidade da política.

53
INTERDISCIPLINARIDADE

Embora não seja muito aparente, desde o século XIX houve um processo profundo e sistemático de consoli-
dação de trustes e holdings na economia mundial. Os trustes são a fusão de várias empresas, de modo a formar um
monopólio com o intuito de dominar determinada oferta de produtos e/ou serviços. Pode-se definir truste também
como uma organização empresarial de grande poder de pressão no mercado.
A existência desses conglomerados leva à confusão dos consumidores, uma vez que muitas das marcas dis-
poníveis nas prateleiras dos supermercados aparentam ser concorrentes, embora sejam de uma mesma empresa.
A imagem a seguir demonstra claramente como funciona a concentração de marcas em torno desses poderosos
grupos empresariais.

54
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES

Habilidade 28 - Relacionar o uso das tecnologias com os impactos socioambientais em dife-


rentes contextos histórico-geográficos.

A Habilidade 28 possui caráter interdisciplinar entre História e Geografia, visto que seu
escopo é de estudar impactos socioambientais causados pelas tecnologias. No caso espe-
cífico de nossa disciplina, a História, a habilidade requer a interpretação de como as gran-
des revoluções tecnológicas implicaram novos padrões de consumo e de uso de recursos.
No caso específico desse capítulo, sobre a Segunda Revolução Industrial, sabe-se que
ela foi fundamentalmente feita a partir das inovações no campo da energia elétrica, da
indústria petroquímica e da siderurgia. Sendo assim, o candidato deverá ser capaz de
relacionar tais informações com a análise de gráficos, textos ou imagens expostas no
enunciado.

Modelo
(Enem) O consumo diário de energia pelo ser humano vem crescendo e se diversificando ao longo
da História, de acordo com as formas de organização da vida social. O esquema apresenta o consu-
mo típico de energia de um habitante de diferentes lugares e em diferentes épocas.

Segundo esse esquema, do estágio primitivo ao tecnológico, o consumo de energia per capita no
mundo cresceu mais de 100 vezes, variando muito as taxas de crescimento, ou seja, a razão entre o
aumento do consumo e o intervalo de tempo em que esse aumento ocorreu. O período em que essa
taxa de crescimento foi mais acentuada está associado à passagem:
a) do habitante das cavernas ao homem caçador.
b) do homem caçador à utilização do transporte por tração animal.
c) da introdução da agricultura ao crescimento das cidades.
d) da Idade Média à máquina a vapor.
e) da Segunda Revolução Industrial aos dias atuais.

56
Análise Expositiva

Habilidade 28
Observando o gráfico, conclui-se que o menor intervalo de tempo decorrido entre quaisquer
dois intervalos de tempo tomados é o que tem início no final do século XIX e vai até os dias
atuais. Nesse intervalo também ocorreu o maior aumento de consumo diário de energia per
capita. Na segunda metade do século XIX, iniciou-se a Segunda Revolução Industrial, deter-
minando grande urbanização, revolução dos transportes e a formação de uma sociedade de
consumo.
Alternativa E

57
Estrutura Conceitual

B
FRANÇA (1830)
1815: restauração - Luis XVIII
REVOLUÇÕES (constitucionalista)
DE 1830 - 1848 1824: assume Carlos X
A (ultrarrealista)
1830: “Três Dias Gloriosos”
CARACTERÍSTICAS
Vitória do povo nas barricadas
Revolução contra a reforma do absolutismo Assume Luís Felipe de Orleans
Oposição à Santa Aliança Monarquia constitucional
Ideal de liberdade e liberalismo Apoio dos banqueiros
Caráter nacionalista Desenvolvimento industrial e comercial

C 1830 NA EUROPA 1830 NA EUROPA


Itália Alemanha
Carbonários (progressistas) derrotados Mantém-se a descentralização
Mantém-se a descentralização União aduaneira organizada pelos “junkers”
(nobreza ligada à terra)

D E
1848 - A “PRIMAVERA DOS POVOS” FRANÇA REVOLTA OPERÁRIA
(1848)
Fatores II República
Estopim
Crise agrícola Governo instável
Crise industrial Exploração dos Burguesia apoia
to ddo
Fortalecimento operários Luís Bonaparte
socialismo Partidos
1851 - Golpe
Bonapartista (O 18 Brumário de Luís Bonaparte)


Socialista
Republicano

REVOLUÇÃO
A INDUSTRIAL C
CARACTERÍSTICAS CONSEQUÊNCIAS
Melhora técnica e aumento produtivo Fortalecimento do capital financeiro
Desenvolvimento da indústria pesada Concorrência elimina pequenas empresas
Desenvolvimento da indústria química Formação de: Trustes
Novas técnicas agrícolas Cartéis
Concentração de capital Holdings
Necessidade de novos mercados
B Necessidade de matérias-primas
Imperalismo/neocolonialismo
INVENÇÕES Crise de superprodução
Exploração do trabalho
Transformação de ferro em aço
Cidades insalubres
Eletricidade
Motor a combustão interna
Vulcanização da borracha

58
33 34
Ideologias do século XIX e
neocolonialismo

Competências Habilidades
1, 2, 3, 4, 5 e 6 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,
13, 14, 16, 17, 18,
20, 22, 23, 24, 25,
26, 28 e 29

C H
HISTÓRIA
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-
H8
-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferen-
tes grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favo-
recendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.
Ideologias do século XIX
Introdução
O processo de industrialização e urbanização ocorrido na Europa ocidental na primeira metade do século XIX
estruturou as duas classes fundamentais da moderna sociedade capitalista: a burguesia e o proletariado. Paralelamen-
te, condicionou o surgimento de duas novas formas de pensamento econômico e social: o liberalismo e o socialismo.
Com a Revolução Industrial, a burguesia tornou-se a classe economicamente dominante da sociedade euro-
peia. A partir da Revolução Francesa, foi também conquistando poder político nos diversos países desse continente.
Ao proletariado, coube a condição de classe subalterna submetida a longas e extenuantes jornadas de trabalho,
salários aviltantes e fome crônica.
O operariado vivia confinado em cortiços e era marginalizado politicamente, pois o voto era censitário
e suas reivindicações eram reprimidas sumariamente pelo Estado. Essa realidade inspirou obras literárias
do francês Victor Hugo e do inglês Charles Dickens, que ainda hoje deixam atônitos seus leitores. É leitura
obrigatória também o livro de Frederich Engels, A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, em que o
autor, a partir de farta documentação e da sua observação, constrói um impressionante relato da vida dos
trabalhadores ingleses. Essas condições configuravam uma vida miserável e faziam do proletariado industrial
uma classe economicamente explorada, socialmente marginalizada, sem acesso ou participação nas institui-
ções políticas governamentais.
Nesse contexto característico da primeira metade do século XIX, inúmeros pensadores e intelectuais ligados
à burguesia e ao proletariado elaboraram novas doutrinas econômicas e sociais profundamente vinculadas ao
processo de industrialização: o liberalismo e o socialismo.

Liberalismo
Durante a Revolução Industrial, os interesses dos burgueses foram defendidos pelos economistas liberais
(também chamados clássicos), que produziram uma série de teorias justificadoras do capitalismo e da não inter-
venção do Estado.
Dentre os princípios do liberalismo destacam-se:
§§ não intervenção do Estado na economia -– obediência às leis naturais da economia. Da mesma forma que
o universo físico, a economia é governada por um conjunto de “leis naturais”, que determina e condiciona
os negócios. A economia se autorregula e se autogoverna naturalmente sem a necessidade de qualquer
interferência do Estado;
§§ liberdade de contrato – o montante do salário e a extensão da jornada de trabalho, segundo os economistas
clássicos, devem ser fixados livremente por meio da negociação direta entre empregador e empregado, sem
nenhuma interferência do Estado, da legislação ou dos sindicatos;
§§ liberdade de comércio e produção – a função principal do Estado deve ser a manutenção da ordem, a pre-
servação da paz e a proteção da propriedade privada; é intolerável, portanto, sua interferência no mundo
privado dos negócios;
§§ inviolabilidade da propriedade privada e individualismo econômico – a propriedade privada é um di-
reito natural do ser humano, sagrado e inviolável; o que é herdado ou adquirido confere ao indivíduo
o direito de usá-lo em seu proveito com o objetivo de ampliar seus bens e aumentar sua riqueza. Para
os economistas clássicos, não há conflito entre os interesses particulares do indivíduo e os interesses
gerais da sociedade. Toda atividade econômica que resulte em benefício pessoal, beneficia, por exten-
são, a sociedade em seu conjunto.

61
Economistas clássicos são geométrica, enquanto os meios de subsistência crescem
em progressão aritmética. Desse modo, qualquer melhoria
no padrão de vida das populações pobres seria impossível,
pois geraria escassez e conflitos sociais.

Cartismo e ludismo

Adam Smith David Ricardo

Um motim cartista em Londres

Thomas Malthus

O filósofo e pensador dos temas referentes à


economia, o escocês Adam Smith (1723 - 1790), é
considerado o criador da teoria econômica. Seus prin-
cípios estão sistematizados na obra A riqueza das na-
ções (1776), que destaca a liberdade econômica como Desenho de dois ludistas destruindo uma máquina de tear em 1812.
pressuposto da iniciativa privada; a livre concorrência
como reguladora do mercado; o crescimento econômico O ludismo ocorreu na Inglaterra entre os anos de
e a divisão do trabalho como propulsores do desenvol- 1811 e 1812 e consistiu na responsabilização da má-
vimento e do bem-estar da Nação; a livre concorrência quina, pelos trabalhadores, pela perda do emprego e
e a acumulação do capital como fonte do desenvolvi- redução do preço das mercadorias. Em razão disso, eles
mento econômico. passaram a destruí-las, pelo que ficaram conhecidos
David Ricardo (1772 - 1823) foi um es- como “quebradores de máquinas”. Rapidamente foram
tudioso e defensor da economia liberal clássica, derrotados. Conscientizaram-se, no entanto, da necessi-
contribuindo de modo fundamental para a cons- dade de buscar outras alternativas reivindicatórias, tra-
tituição da ciência econômica. Sua principal obra, çando caminhos que os levassem a ganhos trabalhistas
Princípios de economia política e tributação (1817) efetivos. Após várias constatações de que os governos e
destaca a teoria do valor-trabalho, as relações en- o Parlamento não demonstravam interesse algum pela
tre o lucro e os salários – teoria da distribuição –, defesa de seus interesses, passaram a reivindicar o direi-
comércio internacional, temas monetários. to ao voto para que pudessem eleger os legisladores e,
Thomas Malthus (1766 - 1834) é considerado o assim, influir na elaboração de uma legislação que favo-
“pai” da demografia e responsável por uma teoria a respeito recesse também os trabalhadores e não só os patrões.
do controle populacional, o malthusianismo. Sua principal hi- Para conseguirem eleger seus representantes no
pótese, publicada no Ensaio sobre o princípio da população Parlamento, no entanto, necessitavam fortalecer seus
(1798), diz respeito às populações que crescem em progres- sindicatos, à época apenas uma evolução das antigas

62
associações de jornaleiros. Para isso, organizaram-se Origens do socialismo
até conseguirem formar as chamadas Trade Unions.
Foram muitos os abaixo-assinados enviados ao A ideia de uma distribuição equitativa de bens na
Parlamento até que, em 1838, a classe dos trabalhado- sociedade foi defendida por Thomas Morus, o autor renas-
res, representada pela Associação Geral dos Operários centista de Utopia (1516). Durante a Revolução Francesa,
de Londres, remeteu ao Parlamento seu programa sinte- certos ideais socialistas tomaram forma – como o de que
tizado na Carta do Povo. As principais reivindicações os bens deveriam ser coletivos – com as propostas de
do Movimento Cartista eram: Rousseau, Marat, Hebert e, sobretudo, de Graco Babeuf.
A propriedade privada era a origem de todos os
“1. Sufrágio universal para os homens; 2. Paga- desacertos sociais, afirmava Babeuf. A Conspiração dos
mento aos membros eleitos da Câmara dos Comuns (o Iguais (1796), liderada por ele, representou uma busca
que tornaria possível aos pobres candidatarem-se ao desesperada de fazer uma revolução igualitarista dentro
posto); 3. Parlamentos anuais; 4. Nenhuma restrição cen- da Revolução Francesa.
sitária para os candidatos; 5. Sufrágio secreto, para evitar Mas as origens mais claras do socialismo estão
intimidações; 6. Igualdade dos distritos eleitorais.” nas críticas às condições subumanas a que foram sub-
(Leo Huberman. Historia da riqueza do homem. 15. ed., Trad.Rio de
Janeiro: Zahar, 1979, p. 201).
metidos os trabalhadores no processo de consolidação
do capitalismo, como sistema econômico, político e so-
Ao longo do tempo, as reivindicações cartistas fo- cial, pela Revolução Industrial.
ram sendo aceitas, com exceção do Parlamento anual. Nes-
se processo, o apoio que o movimento operário, em parti- Socialismo utópico
cular o cartista, recebeu dos ideólogos liberais foi decisivo.
Nos primórdios da industrialização na França,
quando havia apenas o germe da classe operária, o so-
Socialismo cialismo pregava reformas que em vez de representar
programas reais de transformação da sociedade, pro-
O pensamento socialista é produto das transfor- punham projetos ideais para a construção de uma so-
mações operadas pela Revolução Industrial: o nascimen- ciedade futura. Em razão disso, seus seguidores foram
to da grande indústria, da classe operária e da exploração denominados socialistas utópicos, cujas idealizações,
do trabalho assalariado criada pelo capitalismo. embora diferentes de autor para autor, viam a transfor-
Para resolver os problemas criados pela indus- mação social como um produto da livre iniciativa e da
trialização, os pensadores socialistas buscavam solu- transformação da consciência dos homens.
ções econômicas e sociais diferentes das apresentadas O socialismo utópico caracterizou-se, ainda, por
pelos economistas liberais. Enquanto esses acreditavam tentativas de criar uma nova sociedade baseada na har-
no progresso contínuo da humanidade impulsionado monia entre os homens. Seus idealizadores, contudo,
pela livre concorrência, sob o ponto de vista da miséria desconheciam a estrutura da própria sociedade capita-
da classe operária, os pensadores socialistas criticavam lista, razão pela qual suas ideias tornaram-se ineficazes.
sistematicamente o capitalismo, apontando suas falhas
e procurando corrigi-las. A doutrina liberal do individu-
alismo degenera em egoísmo, prejudica a vida em so-
ciedade; a criação de uma nova sociedade baseada na
cooperação e não na competição centrava as reivindica-
ções dos socialistas.
Entenda-se socialismo como o conjunto de dou-
trinas que se propunham a promover o bem comum
como resultado de transformações da sociedade capi-
talista, quer mediante reformas nessa sociedade, quer
pela superação delas por meio uma revolução social. Saint-Simon Robert Owen

63
O industrial britânico Robert Owen (1771 - Essa ideia foi posta em prática na Revolução de 1848,
1858) acreditava na ideia de que se fosse construída na França, quando houve uma coligação de liberais e
uma indústria fraterna, as outras também seguiriam seus socialistas para derrubar a Monarquia. Com o deficit
passos. Tentou pôr em prática suas ideias em sua fábrica criado pelas oficinas nacionais e o rompimento da co-
na Escócia e na comunidade de New Harmony, nos EUA: ligação entre liberais e socialistas, o Estado fechou as
reduziu a jornada de trabalho, aumentou os salários e oficinas e passou a perseguir os socialistas.
melhorou as condições de vida dos trabalhadores, experi-
ências que fracassaram em face dos obstáculos impostos
Socialismo científico
pelo capitalismo.
O francês Saint-Simon (1760 - 1825) projetou
as bases de uma nova sociedade, fundada na associa-
ção dos produtores (cooperativas) e na soberania do
trabalho. Nessa sociedade, todos produziriam e o gover-
no de alguns homens sobre os outros seria substituído
pela administração conjunta de todos sobre a produção.

Karl Marx

Charles Fourier
O outro francês Charles Fourier (1772 - 1837)
idealizou a criação de uma nova ordem social baseada na
organização de falanstérios – comunidades em que seria
abolida a divisão do trabalho e seus membros desenvol-
veriam ao máximo seu talento e suas aptidões. Para Fou-
rier, somente a reorganização da sociedade com vistas ao
atendimento dos desejos de prazer e satisfação das pes-
soas poria fim à miséria. Com cerca de 1,6 mil pessoas,
esses falanstérios seriam organizadas de acordo com as
necessidades humanas. Dedicadas às tarefas de que gos- Friedrich Engels

tassem, produziriam o que lhes trouxesse prazer a elas e


aos outros. As experiências de criação de falanstérios na À luz de seus estudos filosóficos, os alemães
França e nos EUA fracassaram inteiramente. Karl Marx (1818 - 1883) e Friedrich Engels (1820
O socialista francês Louis Blanc (1811-1882) - 1895) definiram o proletariado como classe revolucio-
defendeu a criação de oficinas nacionais, associações nária para a derrubada do Estado capitalista. Se a socie-
profissionais de trabalhadores de um mesmo ramo, fi- dade capitalista detinha suas próprias regras, elas deve-
nanciadas pelo Estado para controlar a produção indus- riam ser conhecidas e analisadas cientificamente sob o
trial. O lucro resultante seria dividido em três partes: a crivo da história e da economia política. Conhecidos a
primeira pagaria o Estado; a segunda, distribuída aos natureza e o funcionamento da sociedade capitalista,
associados; e a terceira, usada para fins assistenciais. seria possível pensar em uma maneira de superá-la.

64
Em fevereiro de 1848, publicaram o Manifesto Regime durante a Revolução Francesa. A ela cabe-
Comunista, no qual defendem a luta de classes como ria protagonizar uma revolução social que criaria
causa para a evolução dos sistemas econômicos, estabe- condições para a transformação da sociedade ca-
lecem a crítica ao socialismo utópico e traçam um progra- pitalista e burguesa em um novo tipo de socieda-
ma político conclamando as classes trabalhadoras a uma de. Segundo Marx, a libertação da classe traba-
revolução para a derrubada do sistema capitalista. lhadora é uma obra dos próprios trabalhadores.
Em 1867, é publicado O capital – Análise crítica §§ Socialismo é uma fase de transição para o
da produção capitalista (primeiro volume). Os volumes comunismo – da luta entre as classes operária e
dois e três foram publicados por Engels depois da morte burguesa, surge a sociedade socialista, mediante
de Marx. O quarto foi publicado por Karl Kaustsky. a qual o proletariado apodera-se do poder polí-
Nessa obra, Marx e Engels dedicam-se ao estudo tico – ditadura do proletariado – e converte
e à análise da origem, desenvolvimento e funcionamen- em propriedade coletiva os meios de produção
to do capitalismo, detalhando a complexidade desse pertencentes à burguesia. Nessa sociedade so-
sistema; das instituições econômicas do passado e do cialista, ainda há o Estado e a diferença entre o
presente, com o objetivo de descobrir o que ordenava e trabalho manual e intelectual. O socialismo seria
movimentava a sociedade capitalista. a fase intermediária de transição, da passagem
do capitalismo para o comunismo – baseado
Princípios do socialismo na propriedade social dos meios de produção –
fábricas, terras, bancos –, no fim da exploração
científico (marxismo) do homem pelo homem, na construção de uma
§§ Materialismo histórico – a economia – (condi- sociedade sem classes e no desaparecimento
ções materiais de existência) – formava a base, a gradual do Estado.
infraestrutura da sociedade, sobre a qual se erguia §§ Mais-valia – diferença entre o volume da rique-
uma superestrutura política, jurídica, filosófica, za produzida pelo trabalhador e o montante do
religiosa, moral etc. Em razão disso, as transfor- salário recebido pelo trabalho realizado. Como o
mações ocorridas nessa superestrutura eram de- salário é sempre inferior à riqueza produzida, essa
terminadas, em última instância, pelas mudanças diferença, correspondente ao trabalho não pago,
ocorridas nas forças econômicas da sociedade. dá origem ao lucro obtido pelos capitalistas. O
§§ A luta de classes é o motor da história – a processo de acumulação de riquezas pela burgue-
divisão da sociedade em classes seria determina- sia tem por base a exploração do trabalho.
da por fatores de ordem econômica, sobretudo
pela existência da propriedade privada (capita- Social-democracia
lismo). Os interesses econômicos antagônicos
dão origem e sustentam o conflito entre as clas- No Congresso de Gotha, realizado entre os dias
ses sociais e essa luta entre dominantes – donos 22 e 27 de maio de 1875, na cidade alemã homônima,
dos meios de produção e do capital – e domi- foi feita a junção dos dois maiores partidos operários
nados – proprietários tão somente da sua força alemães: o Partido Operário Social-Democrata e a União
de trabalho, que é vendida parceladamente ao Geral dos Operários Alemães, que, após a unificação,
capitalista e constitui a força motriz das grandes passaram a chamar Partido Operário Socialista da Ale-
transformações históricas. manha. Alguns socialistas defenderam a proposta de
§§ O proletariado é o agente revolucionário que o parlamento seria eficaz na expansão do socialis-
de transformação da sociedade capitalista mo, desde que o proletariado fosse vencendo paulati-
– como classe subalterna, deve assumir o papel namente as eleições de tal modo que as leis e o Estado
de agente transformador assim como fizera a fossem controlados pelo proletariado sem o derrama-
burguesia contra a nobreza ao derrubar o Antigo mento de sangue, próprio de uma revolução.

65
Segundo Karl Kautsky (1854 - 1938), teórico po-
As Internacionais
lítico alemão e um dos fundadores da ideologia social-
-democrata, “social-democracia é um partido revolu-
cionário e não um partido que faz revolução”, o que
transmite a sensação de legalidade e de reformas.

Cartaz da III Internacional

Karl Kautsky
No transcorrer do século XIX, o movimento ope-
Anarquismo rário amadureceu, aprofundou seu conhecimento da
estrutura do capitalismo e percebeu que sua luta pre-
Pierre-Joseph Proudhon (1808 - 1865), cisava se integrar sob uma perspectiva continental, o
Mikhail Bakunin (1814-1876) e Piotr Kropotkin que resultou na criação da I Internacional, em 1864,
(1842 - 1921) encaravam a autoridade, fosse burgue- cujo objetivo era promover a integração dos sindicatos
sa ou proletária, como nociva para a implantação da da Europa, principalmente os ingleses e franceses, o que
verdadeira liberdade. Em razão disso passaram a de- desagradou à burguesia, contrariada em seus interes-
fender a ideologia de que qualquer tipo de governo ses. A I Internacional foi palco de um ferrenho debate
ou poder, parlamentar ou sindical, deveria ser extinto,
entre a corrente anarquista capitaneada por Proudhon
bem como a propriedade capitalista (privada) ou so-
e Bakunin, de um lado, e a corrente socialista liderada
cialista (coletiva). A vida humana deveria organizar-se
por Marx, por outro.
em comunidades autônomas e autogeridas. O anar-
Em 1889, nasceu a II Internacional também
cossindicalismo italiano pregava a revolução operária
conhecida como Internacional Socialista ou Inter-
voltada para a estrutura sindical que seria extinta pos-
nacional Operária, liderada por Engels, sem a pre-
teriormente.
sença dos anarquistas, e durou até 1916, quando foi
dissolvida. Caracterizou-se pelo debate entre os socia-
listas radicais, defensores da revolução proletária, e os
reformistas, defensores da via parlamentar como forma
pacífica de chegar ao poder. A I Guerra Mundial en-
fraqueceu o movimento operário, uma vez que os tra-
balhadores foram obrigados a se engajar nos exércitos
nacionais para a defesa da pátria. A III Internacional,
em 1919, ocorreu em Moscou e representou o controle
soviético sobre grande parte da esquerda mundial.

Mikhail Bakunin

66
O neocolonialismo tícios de que não dispunham. Precisavam também de
mercados consumidores para os excedentes industriais,
além de novas regiões onde pudessem investir com
lucros significativos seus capitais disponíveis, como a
construção de ferrovias e a exploração de minas.
Esse mecanismo era indispensável para aliviar a
Europa dos capitais excedentes, capitais esses que, se
fossem investidos na Europa, agravariam a Grande De-
pressão e intensificariam a tendência de os países in-
dustrializados na Europa continental adotarem medidas
protecionistas, fechando seus mercados e tornando a
situação ainda pior.
Outro fator tornava a política colonialista atraente
para os governos europeus: a possibilidade de transferir
um número significativo de sua população como colonos
para as novas regiões conquistadas, resolvendo, assim,
o problema do excedente populacional europeu, que
crescia em ritmo acelerado. Além disso, o operariado eu-
ropeu, insatisfeito com suas precárias condições de vida
e de trabalho, agitava a Europa ao comandar inúmeros
The Rhodes Colossus Striding from Cape Town to Cairo.10 dezembro de movimentos sociais. Os governos europeus perceberam
1892. Punch.
A caricatura revela as intenções do político e empresário britânico Cecil que a exploração colonial poderia possibilitar melhoria
no padrão de vida da classe operária do velho continente,
Rhodes, defensor ferrenho do imperialismo inglês.
enfraquecendo, assim, os levantes populares.
A segunda metade do século XIX foi marcada No plano político, os Estados europeus estavam
por um novo e vigoroso movimento do capitalismo, ca- preocupados em aumentar seus contingentes militares
racterizado pelo imperialismo, que submeteu a maior a fim de fortalecerem suas respectivas posições frente
parte dos territórios da África e da Ásia à condição de às demais potências. Com as colônias, contariam com
colônia das potências europeias, notadamente as que maior disponibilidade de recursos e aumento dos con-
passaram pela transformação industrial. Deram início a tingentes militares.
uma verdadeira corrida colonial países como Inglaterra,
Bélgica, França, Alemanha e Itália. Teorias do neocolonialismo
O novo colonialismo – neocolonialismo –
pode ser entendido como fruto da política industrial e A propaganda em favor dos interesses imperia-
da expansão do capital financeiro, sem desprezar, con- listas, vitais para o desenvolvimento do capitalismo, deu
tudo, as rivalidades políticas europeias, que aguçaram o origem a uma série de teorias pseudocientíficas, muito
nacionalismo e transformaram a conquista colonial em populares a partir da segunda metade do século XIX,
prestígio político. que buscavam justificar a conquista e a colonização de
outros povos pelos europeus.
Fatores do neocolonialismo Em geral, essas teorias tendiam a estabelecer uma
hierarquia rígida entre os diferentes povos, classificados
Durante o século XIX, vários países europeus como “mais” ou “menos” civilizados ou evoluídos. Nessa
viviam o processo da Revolução Industrial, razão pela hierarquia, o primeiro lugar era ocupado pela sociedade
qual precisavam encontrar uma fonte de matéria-prima europeia, cujo funcionamento deveria servir de modelo
industrial – carvão, ferro, petróleo – e produtos alimen- ideal para o resto do mundo – eurocentrismo.

67
Em 1899, o poeta Rudyard Kipling, de volta à Inglaterra depois de uma demorada estada nos Estados Uni-
dos, publicou um poema cujo impacto até hoje repercute. The white man burden (O fardo do homem branco) ficou
na história como um chamamento à conquista imperialista do mundo pelos estadunidenses e europeus. O domínio
do Planeta é uma missão que deve ser assumida como um fardo por todos os homens brancos, uma obrigação dos
civilizados, em contraposição aos selvagens e bárbaros.

The white man’s burden (Apologies to kipling). 1899. Victor Gillam. Revista Judge.

Dentre essas teorias, talvez a mais conhecida seja o darwinismo social, que explica as conquistas dos
homens de acordo com seus ganhos econômicos, sociais etc., como resultado da “sobrevivência do mais apto”, à
luz dos estudos de Charles Darwin sobre a evolução das espécies e da sobrevivência delas.
Não raramente, os “desígnios divinos” e a defesa do cristianismo confundiam-se com os interesses dos capi-
talistas, de tal forma que “salvar as almas” dos nativos das colônias era sinônimo da necessidade de transformá-los
em empregados das grandes plantações administradas pelos europeus.

Características do neocolonialismo

Imperialismo na Ásia

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Com exceção de alguns portos comerciais, até o fim do século XVIII, a Ásia não tinha sofrido influências ociden-
tais. No transcorrer do século XIX, essa situação modificou-se radicalmente: os países ocidentais passaram do simples
comércio feito nos portos à política de zonas de influência, promovendo uma verdadeira partilha do Oriente.
Em 1763, os ingleses tomaram a Índia aos franceses e encarregaram uma companhia de explorá-la. Em
1858, os cipaios (nativos que serviam nos exércitos coloniais) revoltaram-se, em consequência de a Índia ter sido
integrada ao Império Britânico.

Na China, a Guerra do Ópio (1840 - 1842), provocada pela destruição de carregamentos ingleses desse
entorpecente, permitiu a conquista de Hong Kong e de outros portos, principalmente os de Xangai e Namquim.
Outras expedições militares foram organizadas a pretexto de punir os chineses pela morte de missionários, e novos
portos foram abertos.
Depois de vencida pela Inglaterra, a China foi obrigada por muitas outras potências capitalistas a um tra-
tamento privilegiado para seus negócios. No final do século XIX, nada menos que sete países dividiam entre si os
fabulosos lucros da dominação imperialista chinesa: Inglaterra, Alemanha, Japão, Estados Unidos, França e Itália.
A reação contra a invasão da China partiu de uma associação secreta – Sociedade dos Punhos Harmoniosos
e Justiceiros –, que lutava contra a intervenção imperialista com atentados contra os estrangeiros residentes em
terras chinesas. As nações europeias organizaram uma expedição conjunta para punir essa sociedade e o governo
chinês que a apoiava. Nasceu disso a Guerra dos Boxers (1899 - 1900), movimento assim conhecido porque
seus integrantes utilizavam-se de velhas lutas chinesas (artes marciais) para atacar os europeus. Depois de mais
essa derrota, a China foi inteiramente dominada pelas potências ocidentais.
Na segunda metade do século XIX, o Sudeste asiático (Indochina) foi reduzido à condição de colônia fran-
cesa. Em 1863, a França estendeu seus domínios na região e converteu o Camboja em seu protetorado.

A partilha colonial da África


Apesar de alguns territórios africanos já pertencerem a europeus antes de 1870, foi só a partir de então
que o imperialismo reinou naquele continente. Em 1876, apenas 10,8% do território africano estava dominado por
Estados colonialistas. Em 1900, chegou a incríveis 90,4%.
Um dos pioneiros da dominação sobre a África foi o rei belga, Leopoldo II, que em 1876 tomou posse de
todo o território do rio Congo. Essa região, aproximadamente dez vezes maior que a Bélgica, foi conservada sob
domínio pessoal do rei, que a vendeu, em 1908, ao próprio governo belga por uma vultuosa quantia.
Vários países europeus lançaram-se à aventura africana. A França conquistou, rapidamente, depois da Argé-
lia, a Tunísia, a África Ocidental Francesa, a África Equatorial Francesa, a Costa Francesa dos Somalis e Madagascar.

69
Os ingleses dominaram o Egito, o Sudão anglo-egípcio, a África Oriental Inglesa, a Rodésia, a União Sul-Africana, a
Nigéria, a Costa do Ouro e Serra Leoa. A Alemanha, que entrou tardiamente na corrida colonial, tomou Camarões,
o Sudoeste Africano e a África Oriental Alemã. A Itália conquistou o litoral da Líbia, a Eritreia e a Somália Italiana.
Os antigos países colonizadores da Europa, Portugal e Espanha, ficaram com porções reduzidas: a Espanha, com o
Marrocos espanhol, o rio de Ouro e a Guiné Espanhola; Portugal, com Moçambique, Angola e a Guiné Portuguesa.

A colonização africana

O ponto de partida para a corrida colonial no século XIX foi dado pela Conferência de Berlim (1884–1885),
da qual participaram todos os países colonialistas, que estipularam entre si os princípios reguladores do que se con-
vencionou chamar “partilha da África”. A Conferência impunha às potências colonizadoras a necessidade de ocupa-
ção efetiva, demarcação e notificação de suas posses aos participantes da partilha.

Consequências do neocolonialismo
À Conferência de Berlim seguiu-se a ocupação e exploração do imenso território africano, que foi palco de uma
das mais sangrentas páginas da história do colonialismo europeu. A população local foi escravizada e obrigada a trabalhar
nas explorações organizadas pelas companhias europeias. Milhares de pessoas morreram vítimas da fome, do trabalho
forçado, das doenças trazidas pelos brancos e dos massacres coletivos promovidos contra as aldeias que se rebelavam.
Na medida em que representou a ocidentalização do mundo, a colonização destruiu estruturas sociais tradi-
cionais – que muitas vezes não puderam ser recompostas – sem nada ter sido construído em seu lugar. No Sudeste
asiático, milhares de alqueires, antes dedicados à plantação de arroz para a autossuficiência dos povos locais, foram
transformados em imensas fazendas produtoras de borracha para exportação. Na Índia, o artesanato foi destruído.
Pela primeira vez na história, o mundo encontrava-se inteiramente partilhado, direta ou indiretamente,
submisso às grandes potências europeias e aos Estados Unidos. Em 1905, estavam conquistados: 90,4% da África,
56,6% da Ásia, 100% da Austrália, 27,2% da América e 98,9% da Polinésia. A partir de então, não haveria novas
apropriações, uma vez que já não existiam territórios sem dono. As grandes potências passaram a viver uma situ-
ação de choque permanente entre si na tentativa de expandir suas áreas de dominação econômica e política. Esse
choque de imperialismos terminaria por deflagrar a Primeira Guerra Mundial.

70
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo Estados de Independência: a partilha da África.

Fonte: Youtube

Filme
Zulu é um filme épico de guerra, baseado em fatos reais, que retrata
a batalha de Rorke’s Drift, ocorrida entre o exército britânico e os Zulus em
janeiro de 1879 - período em que o neocolonialismo estava a todo o vapor.
O filme retrata a epopeia de um pequeno regimento britânico, com-
posto por cerca de 150 soldados – muitos dos quais doentes e feridos em um
hospital de campo – que, com sucesso, consegue deter uma força de cerca de
4000 guerreiros Zulu. É protagonizado por Stanley Baker e apresenta Michael
Caine em seu primeiro papel principal – com um elenco de apoio que in-
clui Jack Hawkins, Ulla Jacobsson, James Booth, Nigel Green, Paul Daneman,
Glynn Edwards, Ivor Emmanuel e Patrick Magee.

72
LER

Livros
A Riqueza Das Nações - Col. Clássicos de Ouro – Adam
Smith

A riqueza das nações é considerada a obra fundadora da ciência


econômica. Escrito no século XVIII, o clássico de Adam Smith gerou uma
série de mudanças nas políticas econômicas. O livro aborda temas como
o acúmulo de riqueza, a divisão do trabalho, sistemas de economia, e até
hoje é grande referência entre os estudiosos de todo o mundo. A edição
integral impressiona pelo conteúdo e principalmente por sua extensão.
Esta versão condensada traz uma criteriosa seleção dos cinco livros ori-
ginais e mantém a essência da obra-prima de Smith.

O Capital - Edição Condensada - 3ª Edição 2008 – Karl


Marx

O ano é 1848. Ao longo de um inverno rigoroso, agitações po-


líticas e sociais espalham-se pela França. A população de Paris, centro
da monarquia, subleva-se no final de fevereiro, forçando a abdicação
e a fuga do rei Luís Filipe. Contudo, uma reação conservadora logo se
impõe no governo republicano e na Assembleia Constituinte. No mês de
junho, operários levantam barricadas em uma revolução socialista, cuja
repressão resulta na morte de quase 5 mil pessoas. Em ‘Lembranças de
1848’, Alexis de Tocqueville oferece seu testemunho daquele momento
da história da França e de toda a Europa, reconstituindo os fatos e per-
sonagens da revolução, desde seu ponto de vista de cidadão, deputado e
ministro do ‘partido da ordem’. O autor retrata o emaranhado de facções
em luta pelo poder durante a Segunda República sem se deixar iludir
pelo olhar enviesado de membro de uma aristocrática família, e denuncia
o artificialismo e a teatralidade da política.

73
INTERDISCIPLINARIDADE

A divisão política da África não reflete os limites territoriais das etnias africanas, visto que é fruto da divisão
realizada pelas potências coloniais europeias na Conferência de Berlim, do ano de 1885.
Atualmente, a África é o continente mais fragmentado do mundo, composta por 54 países. A maioria dos
países africanos alcançou sua independência somente depois do processo de descolonização, iniciado após a Se-
gunda Guerra Mundial. As lutas anticolonização africanas, as rivalidades étnicas, frequentemente atiçadas pelos
antigos colonizadores, e o jogo político do período da Guerra Fria, fizeram do continente um palco de conflitos
sangrentos durante toda a segunda metade do século XX.
O continente, por ter sido considerado mero território colonial, foi fragmentado sem levar em conta os valo-
res, religiões e tradições de seus povos. A divisão artificial criada trouxe problemas para administrar os instáveis e
nada coesos novos territórios, gerando graves distúrbios socioeconômicos enraizados na economia exportadora de
matéria-prima, com uma grande população miserável, alto índice de mortalidade, abandono, violência, corrupção,
fome, desorganização, guerras civis tribais, golpes de Estado, além de conflitos étnicos e religiosos.

74
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES

Habilidade 8 - Analisar a ação dos Estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos
populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-social.

A Habilidade 8 tem um escopo vasto, pois versa sobre a ação dos Estados nacionais,
tanto sobre as dinâmicas populacionais quanto em problemas econômicos e sociais. No
específico caso da questão a seguir, trata-se de questões econômicas.
A ação militar, combinada a estratégias diplomáticas, reorganizam fronteiras e zonas de
interesses geopolíticos, transformando dramaticamente a vida de grandes contingentes
populacionais. A habilidade em destaque requer esse tipo de percepção do candidato,
sendo-lhe imposta a necessidade de compreender os principais interesses econômicos e
políticos das nações europeias no período tratado.
Como de praxe no Enem, textos são apresentados como suporte à resolução das ques-
tões.

Modelo
(Enem) O continente africano em seu conjunto apresenta 44% de suas fronteiras apoiadas em me-
ridianos e paralelos; 30% por linhas retas e arqueadas, e apenas 26% se referem a limites naturais
que geralmente coincidem com os de locais de habitação dos grupos étnicos.
(MARTIN, A.R. Fronteiras e nações. São Paulo: Contexto, 1998.)

Diferente do continente americano, onde quase que a totalidade das fronteiras obedecem a limites
naturais, a África apresenta as características citadas em virtude, principalmente:
a) da sua recente demarcação, que contou com térmicas cartográficas antes desconhecidas.
b) dos interesses de países europeus preocupados com a partilha dos seus recursos naturais.
c) das extensas áreas desérticas que dificultam a demarcação dos “limites naturais”.
d) da natureza nômade das populações africanas, especialmente aquelas oriundas da África subsaariana.
e) da grande extensão longitudinal, o que demandaria enormes gastos para demarcação.

75
Análise Expositiva

Habilidade 8
A maior parte das fronteiras políticas da África atual foi definida no processo de “partilha”,
no Congresso de Berlim, em 1884/1885, convocado por Bismark, em que as grandes potên-
cias europeias definiram seus domínios sem levar em conta os limites naturais ou as divisões
étnicas presentes nesses territórios.
Alternativa B

76
Estrutura Conceitual
A PRECEDENTES
Revolução Industrial

IDEOLOGIAS
Formação do proletariado
Revolução Francesa
DO SÉC. XIX Consolidação do poder burguês na Europa
Exploração do trabalho

B LIBERALISMO Princípios
Adam Smith Não intervenção do Estado na economia
David Ricardo Liberdade de contrato
Thomas Malthus Liberdade de comércio e produção
Defesa da propriedade privada
Individualismo econômico

C SOCIALISMO Socialismo utópico Características


Crítica ao liberalismo Robert Owen Socialismo por meio de reformas
Crítica ao capitalismo Charles Fourier Desconhecimento do funcionamento
Defesa da superação Saint-Simon do capitalismo
do capitalismo Louis Blanc
Socialismo científico
(marxismo) Características

Karl Marx Conhecimento do funcionamento do capitalismo


Friederich Engels Defesa de mudança social radical

Princípios

Materialismo histórico
Luta de classes é o motor da história
O proletariado é o agente revolucionário
O socialismo é uma fase de transição para o comunismo
Ditadura do proletariado
Mais-valia

D SOCIAL-DEMOCRACIA Princípios
Karl Kautsky
Socialismo via reformas do capitalismo
Atuação parlamentar como estratégia

E ANARQUISMO Princípios
Pierre Proudhon Revolução social radical
Mikhail Bakunin O proletariado é agente revolucionário
Piotr Kropotkin Destruição do Estado
Formação de comunidades autogeridas

E INTERNACIONAIS
Organização de trabalhadores europeus I Internacional (1864)
Propostas de atuação em comum
II Internacional (1889-1916)

III Internacional (1919)


77
NEOCOLONIALISMO A FATORES
Segunda Revolução Industrial
Necessidade de novos mercados
Necessidade de matérias-primas
Busca de locais para investimentos de capital
Conter reivindicação de trabalhadores na Europa

B TEORIAS DO COLONIALISMO C CARACTERÍSTICAS


O “fardo do homem branco” Disputa territorial na África e na Ásia
Civilizar povos não brancos Controle territorial
Darwinismo social Ocupação do território
Racismo científico Imposição cultural
Cristianização dos povos

D CONFERÊNCIA DE BERLIM (1884-1885)

PARTICIPANTES EFEITOS CONDIÇÕES

Potências europeias Partilha da África Ocupação do território


Império otomano Demarcação de fronteiras
Estados Unidos Notificação aos países participantes

E CONSEQUÊNCIAS
Disputas territoriais entre países europeus
Escravização da população original
Destruição de culturas originais
Formação de fronteiras artificiais
Perpetuação do racismo

78
História para
vestibular medicina
5ª edição • São Paulo
2019

C H
4
CIÊNCIAS HUMANAS
HISTÓRIA
e suas tecnologias
Eduardo Antônio Dimas e Tiago Rozante
Abordagem de HISTÓRIA DO BRASIL nos principais vestibulares.

FUVEST
Aborda aspectos das inúmeras revoltas que eclodiram no Brasil durante o período regencial
(1831-40). Também costuma realizar abordagens sobre o café no Segundo Reinado e a crise que
derrubou o regime imperial brasileiro, com certa predileção pela questão servil (abolição). Utiliza
inúmeras fontes para elaborar suas questões, entre as quais textos introdutórios, mapas, charges,
fotografias, tabelas e gráficos.

LD
ADE DE ME
D
UNESP
U

IC

Aborda aspectos sociais, como os conflitos existentes no período regencial (1831-40) e as


FAC

INA

1963

manifestações sociais a favor da abolição no Brasil. Também faz uma abordagem do ciclo
BO
T U C AT U

econômico cafeeiro e a sua relação com os imigrantes no país nessa época. Normalmente,
elabora questões com uso de textos médios ou grandes como auxílio para a pergunta, propondo
alternativas concisas.

UNICAMP
Aborda temas referentes à exploração econômica no período imperial (1822-89), no qual o
destaque fica para a cultura cafeeira no Sudeste do país. Aborda também os aspectos que
levaram à derrocada de D. Pedro II e ao advento da República, em 1889. Utiliza textos breves
ou pequenas introduções, além de algumas imagens na elaboração de suas questões, e coloca
alternativas relativamente longas.

ENEM/UFMG/UFRJ
Aborda, com enorme constância, a luta por direitos sociais, dando grande ênfase à questão
abolicionista. Também costuma discutir o conceito de cidadania e as relações políticas na
República Velha (1889-1930). Utiliza textos, mapas, gráficos e imagens de forma mesclada na
elaboração de suas questões.

UERJ
Realiza abordagens históricas em suas questões, que propõem aos candidatos uma reflexão
sobre temas com pertinência contemporânea, como o preconceito e a desigualdade social,
temáticas muito ricas nessa época da história brasileira. Utiliza textos, mapas, gráficos e imagens
de forma mesclada na elaboração de suas questões.
27 28
República oligárquica: aspectos
políticos e econômicos

Competências Habilidades
1, 2, 3, 4 e 5 1, 7, 8, 12, 13, 14,
15, 16, 17, 18, 19,
21, 22 e 24

C H
HISTÓRIA
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-
H8
-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferen-
tes grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favo-
recendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.
“Coronéis” e grandes cafeicultores: típicos representantes das elites durante a República Oligárquica.

A ascensão das oligarquias


A retomada do poder pelas oligarquias rurais iniciada no governo Prudente de Morais, primeiro presidente
civil eleito diretamente, consolidou-se no governo de Campos Salles, quando se estruturou um vigoroso sistema
político de colaboração em instâncias municipais, estaduais e federal, com a finalidade de garantir o predomínio
do grupo hegemônico no poder.
Houve franco favorecimento aos grupos oligárquicos, notadamente aos cafeicultores, com inúmeros proble-
mas sociais e econômicos marcantes naquela fase da República. A política econômica promovia a defesa do setor
agroexportador especialmente com a valorização artificial do café, prática constante naquele período, desencora-
java investimentos em outras áreas e contribuía para o agravamento de problemas econômicos, como a recessão,
a inflação e o crescimento da dívida externa.
No início do século passado, o espaço urbano do Rio de Janeiro, notadamente, vivenciava problemas bem
conhecidos já no final do século XIX e início do XX. Nas cidades do Sudeste, onde o surto industrial tornava-as
polos atrativos, não faltaram problemas resultantes da urbanização acelerada sem que os governos fossem capazes
de resolver a falta de saneamento e de políticas eficientes no combate a problemas de saúde pública, aumento da
violência urbana, favelização, entre outros. O crescimento populacional, proveniente em grande parte do campo
(êxodo rural) resultou em uma macrocefalia urbana e favoreceu a formação de um grande exército de reserva de
mão-de-obra, que resultou em aviltamento dos salários.
Nesse ambiente de aviltamento das condições de vida da população pobre somado à falta de regulamen-
tação dos salários pelo Estado e de leis que regulamentassem as ralações entre capital e trabalho, nasceram as
contestações sob a influência dos movimentos anarquistas e socialistas trazidos da Europa pelos imigrantes euro-
peus. Reivindicavam melhores condições de vida e de trabalho para o proletariado que se formava, o que contribuiu
para a formação de uma pauta de reivindicações e de ações da classe operária no Brasil. Naquele período também
ocorreram movimentos sociais, que, procuraram resistir e enfrentar a ação arbitrária e o descaso das autoridades.
Foi o caso da Guerra de Canudos, da Revolta da Vacina, da Revolta da Chibata e da Guerra do Contestado.
Estava claro mesmo que talvez de maneira inconsciente para boa parte da população, que o Estado Repu-
blicano não havia sido constituído para todos os brasileiros.

83
Governo de Prudente de
Morais (1894-1898)
O cafeicultor paulista Prudente de Morais foi o
primeiro presidente civil do Brasil eleito pelo voto dire-
to. Conhecido como “pacificador”, foi responsável pela
pacificação do Rio Grande do Sul, onde ainda havia fo-
cos de tensão entre republicanos e federalistas. Anistiou
os participantes da Revolta da Armada, encerrando em
definitivo a questão. Sufocou com bastante violência o
movimento messiânico de Canudos. Governo de Campos
Salles (1898-1902)
Antes da posse, o presidente eleito Campos Salles
viajou à Europa, acompanhado de Joaquim Murtinho, seu
futuro Ministro da Fazenda, com os objetivos de renego-
ciar a dívida externa brasileira e obter um novo emprésti-
mo para sanar as dificuldades econômicas que enfrentaria
ao assumir o governo.

Prudente de Morais

Na política externa, o governo caracterizou-se


pela restauração das relações diplomáticas com Portu- Campos Salles
gal, rompidas no governo Floriano Peixoto em virtude
da concessão de asilo aos participantes da Revolta da A alta inflação e a crise das finanças públicas
Armada. Mediados por Portugal, os ingleses devolve- enfrentadas pelo Brasil tiveram origem nas constantes
ram a Ilha de Trindade, no litoral capixaba, ocupada em emissões e gastos dos governos anteriores, especial-
1895. Com a Argentina foi solucionada a Questão de
mente para reprimir revoltas, como a Revolução Fede-
Palmas, território localizado entre os estados do Pa-
ralista e a Revolta da Armada, enfrentadas por Floriano
raná e de Santa Catarina, cuja definição de fronteiras
Peixoto, e a Guerra de Canudos, ocorrida no governo de
causara litígio entre os dois países. Levada a questão à
Prudente de Morais.
arbitragem internacional do presidente estadunidense
Grover Cleveland, a decisão foi favorável ao Brasil, re-
presentado pelo Barão do Rio Branco. Foi estabelecido
que os rios Pepiry-Guaçu e Santo Antônio seriam limites
do território de Palmas.

84
O Funding loan Política do “café com leite”
A negociação com banqueiros e credores ingle- Após a consolidação do regime republicano no
ses levou à assinatura do Funding Loan. Tratava-se da Governo de Floriano Peixoto, os republicanos, históricos
concessão de um novo empréstimo ao Brasil e da fixa- representantes dos cafeicultores paulistas, ascenderam
ção de novos prazos para a quitação do montante da ao poder a partir do governo Campos Salles (1898–
dívida. O Brasil teria: 3 anos sem pagar parcelas sem ju- 1902), que passou a ser exercido em prol dos interesses
ros; mais 50 anos para terminar de pagar o empréstimo das oligarquias agrárias paulista e mineira.
com juros. Num total de 63 anos, o Brasil deveria passar Na Primeira República, a estrutura de poder in-
os 13 anos iniciais sem contrair novos empréstimos. cluía com relativa consonância “coronéis” (latifundiá-
Além disso deveria cortar gastos públicos, de combater rios regionais influentes e poderosos), oligarquias esta-
duais e governo federal. Os cafeicultores de São Paulo e
a inflação mediante contenção da emissão monetária
Minas Gerais alternavam-se na presidência da Repúbli-
e da retirada de dinheiro de circulação e de oferecer as
ca, fase política chamada “café com leite”. Mais ricos e
rendas da alfândega do Rio de Janeiro como garantia
maiores produtores e exportadores de café, os dois es-
para o pagamento da dívida. Caso isso não fosse sufi-
tados reuniam mais de um terço da população brasileira
ciente, a Companhia de Abastecimento de Água do Rio
e o maior colégio eleitoral do país. Sempre atraíam um
de Janeiro seria entregue ao Banco Rothschild.
estado médio para entregar a vice-presidência e manter
seu domínio no plano federal.

Charge de Raul. Revista da Semana, 3 mar. 1917


Sátira de Campos Salles com sacos de dinheiro oferecidos pelos ban- (Disponível em: <portaldoprofessor.mec.gov.br>).
queiros ingleses.
O domínio das oligarquias paulista e mineira em âm-
Ao pôr em prática tais medidas, Campos Salles bito federal foi apoiado pelas oligarquias dos demais esta-
tornou-se altamente impopular. O corte nos gastos pú- dos, graças ao fisiologismo na “política dos governadores”.
blicos, realizados pelo seu ministro das finanças, Joa-
quim Murtinho, no plano de “Sanitarismo financeiro”,
levou à paralisação de obras em execução e a suspen- “Política dos governadores”
são de novos projetos, ao desemprego, agravado pela ou “Política dos Estados”
demissão de funcionários públicos. Aumento de impos-
tos e suspensão de créditos bancários, prejudicaram as Tratava-se de um pacto oligárquico, entre as
iniciativas industriais e impediram a geração de mais frações e facções da elite dominante, cujo objetivo era
empregos. Um novo imposto, o do Selo, acabou renden- assegurar o domínio político das oligarquias estaduais e
do a ele um apelido: “Campos Selos”. garantir ao poder central o governo do país acima dos
Apesar da impopularidade, das constantes mani- interesses das demais classes sociais, particularmente
festações contra seu governo e da recessão generaliza- os interesses dos trabalhadores.
da, Campos Salles conseguiu atingir várias metas eco- O governo de Campos Salles estabeleceu as ba-
nômicas e melhorou a imagem internacional do Brasil. ses desse pacto político. Apoiou, com todos os meios

85
a seu alcance, a oligarquia dominante de cada estado,
Coronelismo
a fração ou facção da elite dominante local no poder
naquele momento. Em troca desse apoio, essa mesma Uma das bases fundamentais de sustentação do
oligarquia apoiaria irrestritamente as decisões do go- domínio oligárquico na Primeira República, ou República
verno federal no Legislativo, garantindo a eleição dos Velha, foi o coronelismo. O mesmo que mandonismo
candidatos oficiais para o Congresso. local, poder e controle políticos exercidos pelos grandes
O instrumento “legal” usado por Campos Sales proprietários rurais (“coronéis”) em suas regiões. Cor-
e seus sucessores para executar esta estratégia política responde ainda ao papel exercido pelos grandes pro-
foi o controle severo da “Comissão Verificadora de prietários rurais, políticos influentes, patrões, padrinhos
de casamento ou batismo a quem todos deviam favores
Poderes”, órgão do Poder Legislativo encarregado de
e obediência, que não hesitavam em usar a força para
verificar os resultados das eleições contidos nos livros
conseguir seus objetivos.
de registro dos votos e legitimar a posse dos eleitos.
Em sua região, cada “coronel” arranjava empre-
Candidatos da oposição que conseguissem ser eleitos
gos e os mais variados benefícios para elementos de
eram “degolados”, tinham seus mandatos cassados
sua clientela (daí a política de “clientelismo”), tornan-
pela Comissão que regularmente alegava fraudes elei- do-se compadre de uma infinidade de pessoas. Nessa
torais, que sempre ocorriam, se bem fossem permitidas estrutura do favor e do compadrio, os protegidos de um
apenas a favor dos candidatos da situação. “coronel” a ele deviam principalmente fidelidade políti-
ca, manifestada, em especial, no momento das eleições.
Essa conjugação entre o “coronelismo”, o “clientelis-
mo” e o “compadrio” estabelece uma intricada trama
de favores entre as pessoas, o que marca de modo ím-
par as relações entre elas e as práticas políticas.
Apesar de o mandonismo dos grandes proprie-
tários rurais vir do Período Colonial, o termo coronel
passou a ser utilizado de maneira frequente no Período
Regencial, em virtude da criação da Guarda Nacional.
Os latifundiários compravam a patente de coronel para
organizar, armar e comandar sua milícia. Passado de pai
para filho, posteriormente o título popularizou-se como
referência aos grandes fazendeiros.
Charge. Storni Revista Careta. O monte representa a exclusão política. A
cadeira presidencial sob vigilância dos “café com leite”. Estados tentam,
sem sucesso, alcançá-la (Disponível em: <portaldoprofessor.mec.gov.br>). “Voto de cabresto”
A “política dos governadores” foi criada para
realizar as promessas feitas durante a propaganda re-
publicana ao defender o federalismo: garantir o poder
local e os interesses das chamadas “oligarquias”, das
frações e facções da elite dominante, com o objetivo de
obter o apoio das oligarquias dos estados ao governo
federal, nas mãos das oligarquias paulista e mineira.
Se apoiado pelas oligarquias estaduais, o presidente se
preocuparia apenas em governar e implementar pro-
jetos de interesse das elites e dos seus vários setores. Ela – É o Zé Besta?
Ele – Não, é o Zé Burro!
Força política e policial-militar para reprimir os que a
“Na charge de Storni para a revista Careta (1927), uma das mais famosas
eles se opusessem é o que não lhe faltava. O projeto fraudes eleitorais da Primeira República, o voto de cabresto,
recebe a devida crítica. O eleitor recebia um papel com o nome do candi-
político republicano brasileiro de liberdade, igualdade e
dato escolhido pelo coronel da região e apenas o depositava na urna”
fraternidade seletivas tornava-se plenamente vitorioso. (Disponível em: <revistadehistoria.com.br>. Acesso em: 8 mar. 2015).

86
A área de influência e controle político dos “coronéis” era chamada de “curral eleitoral”. Nele, todos
acompanhavam as determinações políticas do “coronel” e eram obrigados a votar nele ou no seu candidato. Era
o chamado “voto de cabresto”, favorecido pela Constituição de 1891, que estabelecera o voto aberto: o eleitor
manifestava publicamente seu voto. Não era possível nem permitido contrariar a vontade do “coronel”, principal-
mente em seus domínios. A força dos “coronéis” foi fundamental para explicar as fraudes no processo eleitoral da
República Velha.

Eleições “a bico de pena”

Detalhe da charge Como se faz uma eleição. Amaro. Revista da Semana, n° 495, 1909. Rio de Janeiro. Biblioteca Nacional.

Nesse paraíso das oligarquias, predominavam as práticas eleitorais fraudulentas. Nenhum coronel aceitava per-
der uma eleição. Os eleitores eram coagidos, comprados, aliciados ou excluídos. Não havia eleição limpa. O voto
podia ser fraudado antes da eleição, na hora da votação ou no momento da apuração.
É dessa época a chamada “eleição a bico de pena”, pela qual os mesários é que escolhiam os eleitos,
atestando o resultado da eleição mediante a elaboração de atas fraudulentas. Era comum o voto de pessoas
mortas e de eleitores fictícios.
Nessa época, o coronel retinha os títulos eleitorais e o eleitor não sabia em quem votava. Se alguém se
atrevesse a perguntar ao coronel em quem tinha votado, o coronel respondia que não podia revelar porque o
voto era “secreto”.
Disponível em: <blogsoestado.com/flaviobraga>. Acesso em: 8 mar. 2015.

Todas essas características do sistema eleitoral desse período tornam evidente o estrito controle político do
Estado brasileiro em todas as suas instâncias pelos grandes proprietários rurais.

votos
Política do café c/ leite (federal)
e apoio verbas e autonomia
político
Política dos governadores (estadual)
votos verbas e poder

Coronelismo (poder local/municipal

Governo Rodrigues Alves (1902–1906)


A reforma urbana: o “bota abaixo”
O novo presidente havia sido ministro da Fazenda de Prudente de Morais e foi eleito pela coligação dos
partidos Republicano Paulista e Republicano Mineiro, que venceram sem dificuldades. Já na campanha eleitoral
deixou claro que seu governo se limitaria basicamente ao saneamento e urbanização da cidade do Rio de Janeiro.
Os recursos foram obtidos junto a credores internacionais sem grandes dificuldades, uma vez que o país vinha
cumprindo o acordo feito pelo presidente Campos Salles.
O presidente entregou ao prefeito do Rio de Janeiro, Pereira Passos, o comando da execução do projeto de sanea-
mento e urbanização da cidade, que alargou ruas e avenidas e abriu outras tantas. Os cortiços do centro da cidade foram
demolidos (“bota abaixo”) e deram lugar a ruas e praças, e seus moradores, despejados e deslocados para a periferia.

87
A reforma urbana (“bota abaixo”) do Rio de Janeiro
Rodrigues Alves (Disponível em: <revistadehistoria.com.br>).

A demolição dos cortiços fez subir os aluguéis e desagradou as camadas populares urbanas, segmento no
qual o presidente cada vez mais perdia popularidade.

O Convênio de Taubaté (1906)


No final do mandato de Rodrigues Alves, com o apoio dos presidentes de São Paulo, Minas Gerais e Rio de
Janeiro para a aprovação do Convênio de Taubaté, os cafeicultores forçaram uma política de valorização do
café, em face das constantes quedas de preço do produto, em grande produção, superior à demanda internacional.
Com essa medida, foi fixado um preço mínimo para a saca de café, e os governos dos três Estados compro-
meteram-se a realizar empréstimos no exterior, com vistas a comprar e estocar o excedente de café não vendido.
Calculava-se com isso a baixa de preços no mercado internacional e garantia do lucro dos cafeicultores. Resolveu-
-se também limitar o plantio de novos pés de café e estimular o consumo interno do produto.

Flutuações (%) da participação do café na pauta de exportações do Brasil, 1889-1929


100

75
% 50
25
0
1889 1898 1911 1914 1919 1924
1897 1910 1913 1918 1923 1929
FREIRE, Américo. História em curso – o Brasil e suas relações com o mundo ocidental.
Rio de Janeiro, Brasil: FGV/CPFOC, 2004, p.257.

Os banqueiros ingleses, da Casa Rothschild em especial, num primeiro momento recusaram-se a conceder
empréstimos para a valorização do café. No entanto, voltaram atrás assim que bancos estadunidenses e alemães
começaram a fazê-lo. Entre 1905 e 1910 foram retiradas do mercado 8,5 milhões de sacas, graças aos financia-
mentos oficiais e do capital internacional.
As consequências da política de valorização do café foram amplas. Algumas delas apareceram já nos primeiros
momentos de sua aplicação. A nação como um todo continuou a pagar os prejuízos do café (“socialização das perdas”),
sob a alegação de manter o nível de renda nacional. No entanto, no longo prazo, essa política revelou-se desastrosa. As
compras do produto acabaram por gerar um aumento da dívida externa e uma persistente inflação. A manutenção de
preços artificiais no mercado internacional estimulou a produção cafeeira por países concorrentes do Brasil.

88
A Questão do Acre (1901–1903)

Barão do Rio Branco

O território acreano pertencia à Bolívia, mas o látex de suas florestas vinha sendo explorado por brasileiros,
especialmente por nordestinos retirantes da seca e do desemprego.
Em 1901, as tensões agitaram a região. O governo boliviano concedeu a exploração dos seringais acreanos a uma
empresa estadunidense, a Bolivian Sindicate of New York, passou a expulsar os brasileiros e a defender a região. Brasileiros
e bolivianos entraram em conflito. Sob a liderança de Plácido de Castro, os bolivianos declararam a independência do Acre.
O Brasil passou a negociar com
a Bolívia a compra do território, negocia-
ções essas feitas pelo ministro das Rela-
ções Exteriores, o Barão do Rio Branco,
que levaram em 1903 à assinatura de um
acordo entre os dois países: o Tratado
de Petrópolis. A Bolívia cederia o terri-
tório do Acre ao Brasil em troca de uma
indenização de dois milhões de libras
esterlinas e do compromisso brasileiro
de construir a estrada de ferro Madeira-
-Marmoré, que permitiria o escoamento
da produção boliviana em direção ao
oceano Atlântico.
No governo Rodrigues Alves
foram definidas ainda questões terri-
toriais e fronteiriças com a Inglaterra
(Guiana), Holanda (Suriname) e Peru,
também com a decisiva atuação do Ba-
rão do Rio Branco na defesa dos inte-
resses brasileiros.

89
Governo Afonso Pena Governo Nilo Peçanha
(1906-1909) (1909-1910)
O mineiro Afonso Pena assumiu a presidência Seu governo foi marcado pela criação do Serviço
com o intuito de favorecer os cafeicultores, o que de de Proteção ao Índio, SPI, cujo comando foi entregue
fato aconteceu. Apoiou o Convênio de Taubaté e criou ao marechal Cândido Mariano da Silva Rondon. Mais
a Caixa de Conversão, cujo objetivo era manter o câm- marcante, no entanto, foi a cisão da “política do café
com leite”. Fez com que o PRP e o PRM apoiassem can-
bio em baixas cotações a fim de beneficiar as expor-
didatos diferentes.
tações de café. Para atender à crescente necessidade
O senador Pinheiro Machado, então vice-presi-
de mão-de-obra nos cafezais, o presidente incrementou
dente do Senado e considerado o político mais influente
a política imigratória europeia sob o lema “governar é
do país, articulou a candidatura de Hermes da Fonseca,
povoar”. Para favorecer o escoamento da produção de
sobrinho do ex-presidente Deodoro da Fonseca, que rece-
café, foram construídos, ampliados e modernizados por- beu apoio do PRM. O PRP decidiu apoiar Rui Barbosa, ex-
tos e ferrovias. -ministro da Fazenda do Governo Provisório, que batizou
O governo adquiriu dois novos navios para forta- a campanha de civilista e recebeu apoio de intelectuais.
lecer a Marinha, batizados de São Paulo e Minas Gerais, Sua principal proposta foi a adoção do voto secreto.
e o Exército foi beneficiado com a construção de novos Pressionado por Pinheiro Machado, o presiden-
quartéis e a compra de armamentos. te Nilo Peçanha deu apoio a Hermes da Fonseca, o que
Em 1907, o Brasil participou da Conferência de praticamente garantiu sua vitória, graças às fraudes
Paz na cidade de Haia, na Holanda, para a qual o Bra- eleitorais.
sil foi representado pelo jurista Rui Barbosa.
Em 1908, uma exposição no Rio de Janeiro co-
memorou o centenário da Abertura dos Portos, com o
objetivo da apresentar a nova cidade do Rio de Janeiro
depois das obras de modernização e saneamento.
Afonso Pena morreu em 1909, antes de concluir
seu mandato e, uma vez cumprido mais da metade de seu
mandato, foi sucedido pelo vice-presidente Nilo Peçanha.

Nilo Peçanha

Governo Hermes da
Fonseca (1910-1914)
Logo no início do seu Governo, o gaúcho ma-
rechal Hermes da Fonseca enfrentou dificuldades em
virtude da Revolta do Batalhão Naval e da Revolta da
Chibata, no Rio de Janeiro, além do movimento chama-
do Contestado, semelhante ao de Canudos, na região
Afonso Pena

90
fronteiriça dos estados do Paraná e de Santa Catarina. tentativa de intervenção em São Paulo; o governador
Sob a liderança de um beato conhecido por João Ma- Albuquerque Lins, no entanto, mobilizou a Força Públi-
ria, milhares de sertanejos miseráveis organizaram-se ca e a Missão Militar Francesa, ao PRP que organizou
naquela região em busca de uma alternativa contra o batalhões patrióticos em todo o estado. Resultado: de-
desemprego e a exploração dos latifundiários e as dis- sistência da intervenção. Em Pernambuco, o Exército
putas por terras. Para pôr fim à comunidade, enviaram- interveio, não sem contar com confrontos armados. Há
muito tempo os militares queriam confrontar o general
-se expedições militares que só conseguiram debelá-la
Dantas Barreto com Rosa e Silva, que dominava a polí-
no próximo governo.
tica regional desde 1896.
Além dessas, ocorreram movimentos sediciosos
no Ceará, Bahia e Pernambuco como resultado da Po-
lítica das Salvações. Os problemas enfrentados foram
A borracha
responsáveis pela instabilidade que marcou o governo
de Hermes da Fonseca. Durante o maior período de seu
quadriênio, manteve o país sob estado de sítio.

© jcsmilly/Shutterstock
Extração de látex, produto de seringueiras (Hevea brasiliensis) espalha-
das pela selva amazônica, foi intensamente explorado no
final do Império graças aos avanços da indústria mundial.

A partir de 1877, a Amazônia supriu a procura


crescente de borracha, graças à mão-de-obra de nor-
destinos expulsos de seus estados pelas secas. Em cres-
cimento contínuo da produção até os primeiros anos do
século XX, a borracha aproximou-se do café no quadro
das exportações brasileiras, se bem que tenha resultado
Hermes da Fonseca em admirável desenvolvimento da economia do Centro-
-Sul. A borracha, por sua vez, não alterou a estrutura so-

“Política das salvações” cioeconômica do Norte. O aumento da riqueza foi pas-


sageiro. Nas palavras de Caio Prado, ela apenas criou na
Consistiu na intervenção do governo federal nos Amazônia “um acampamento de luxo”.
As técnicas de produção eram extremamente
estados para derrubar as velhas oligarquias e favorecer
primitivas com emprego de mão-de-obra barata. O pro-
a ascensão de novas, ligadas diretamente ao Presidente
duto continuou a ser obtido em árvores procuradas ale-
da República, dispostas a fortalecer o poder central e
atoriamente no meio da floresta. Nas cidades, no entan-
a reduzir a influência política do senador Pinheiro Ma-
to, a riqueza concentrada financiava grandes e luxuosas
chado. Intervenções e conflitos em vários Estados não construções, ostentação de aventureiros de toda espé-
faltaram em favor de militares, familiares e políticos de cie. Símbolo dessa época foram os célebres espetáculos
sua confiança. de ópera europeus. Atravessavam o Atlântico e a selva
Em Alagoas, Euclides Malta foi deposto e subs- para se apresentarem no Teatro Amazonas, construído
tituído por Clodoaldo da Fonseca, primo do presidente; com mármore italiano pelos “barões da borracha”.
na Bahia, depois que Salvador foi bombardeada, Aurélio Entre os anos de 1910 e 1912, as exportações
Viana cedeu o governo para J. J. Seabra; no Ceará, o chegaram ao apogeu. Depois veio a concorrência das
oligarca Nogueira Acióli foi substituído pelo tenente-
eficientes plantações no Ceilão e na Malásia pelos in-
-coronel Franco Rabelo, fato que provocou a revolta dos
gleses e na Indonésia pelos holandeses. Rapidamente a
coronéis liderados pelo padre Cícero; em 1911, houve
produção brasileira passou a ter um papel insignificante.

91
Em 1919, com 423 mil toneladas produzidas no mun- 1917, mas não enviou tropas para o conflito; limitou-se
do, o Brasil participou com apenas 34 mil toneladas. A ao envio de alimentos e ajuda médica à França. Naquele
produção mundial de borracha passou a ser dominada período ocorreram mais fatos marcantes, como o assas-
pelas colônias europeias na Ásia, e o marasmo econô- sinato de Pinheiro Machado, em 1915, o que fortaleceu
mico voltou a tomar conta da Amazônia. o Governo Federal; foi promulgado o Código Civil Bra-
sileiro, obra do jurista Clóvis Beviláqua, e a Guerra do

© guentermanaus/Shutterstock
Contestado chegou ao fim.

Teatro Amazonas

A sucessão de Hermes da Fonseca


O senador Pinheiro Machado tentou lançar sua
candidatura a presidente pelo Partido Republicano Venceslau Brás

Conservador, que havia fundado. Todavia, reconciliadas,


graças ao Pacto de Ouro Fino, as oligarquias paulista
e mineira decidiram lançar candidato único, o mineiro
Venceslau Brás Pereira Gomes, vice-presidente de Her-
mes da Fonseca.
Sem chances, Pinheiro Machado desistiu da can-
didatura em apoio ao candidato da aliança PRP/PRM.
Mesmo sem chances de vitória, Rui Barbosa decidiu
concorrer novamente como candidato de oposição.
Venceslau Brás foi eleito sem dificuldades, o que
representou a volta da “política do café com leite” ao Venceslau Brás

controle do poder público federal.


O surto industrial
Governo Venceslau A Primeira Guerra Mundial trouxe consequências

Brás (1914-1918) econômicas altamente positivas para o Brasil: cresceram


as exportações de produtos primários – café, borracha e
carne; ganhou estímulo um processo de substituição de
O governo de Venceslau Brás, que coincidiu com importações; o Brasil passou a produzir vultosa quanti-
a Primeira Guerra Mundial, sofreu forte influência para dade de produtos industriais que antes eram importados.
o desenvolvimento econômico do país. O torpedeamen-
to de navios brasileiros em 26 de outubro de 1917 por
submarinos alemães levou o Brasil a entrar na Guerra
Mundial. Chegou a declarar guerra à Alemanha, em

92
Relação entre os lucros da exportação do café e
a evolução da produção industrial brasileira.
O surto de gripe espanhola e
1913 a 1919 as eleições presidenciais
No final do governo de Venceslau Brás, o Bra-
sil foi atingido por uma epidemia de gripe espanhola,
que vitimou cerca de 1,7 milhão de pessoas no Rio de
Janeiro e propagou-se rapidamente por vários estados
brasileiros. De origem europeia, a doença estava asso-
BRASIL, IBGE. Anuário estatístico do Brasil. ano V (1930/40). Rio de Janei-
ro: IBGE, 1941; SIMONSEN, Roberto. Evolução industrial do Brasil. 1939.
ciada à imensa quantidade de cadáveres insepultos nas
trincheiras da Primeira Guerra Mundial.
Na época, foram favorecidas as indústrias têxtil Entre as vítimas,constara o ex-presidente Rodri-
– líder –, de alimentação, bebidas e roupas. A indústria gues Alves, que acabara de ser eleito novamente para
têxtil, sobretudo a de tecidos de algodão, foi a verda- suceder Venceslau Brás. Morreu pouco antes de tomar
deiramente fabril graças à concentração de capital in- posse. Substituiu-o o vice-presidente eleito Delfim Mo-
vestido e ao número de operários. Houve fábricas com reira como novo Presidente da República.
mais de mil deles. Quando do início da Grande Guerra, De acordo com as regras constitucionais vigen-
80% dos tecidos consumidos no país eram nacionais, tes, o vice deveria assumir interinamente e convocar no-
comprovação da melhora da qualidade deles. vas eleições, uma vez que o presidente eleito não havia
cumprido mais da metade de seu mandato.
Para as novas eleições, as oligarquias paulista
e mineira indicaram o paraibano Epitácio Pessoa como
candidato pela coligação PRP/PRM. Ele venceu Rui Bar-
bosa e assumiu o poder em 1919.
Resumindo a atuação desses governos com con-
textos, características e peculiaridades de cada um –
em comum todos viam a sociedade exclusivamente do
ponto de vista do principal grupo social ao qual vários
Operários de tecelagem paulistana. início do século XX. Disponível em : faziam parte e representavam: os grandes plantadores
<portaldoprofessor.mec.gov.br>.
e criadores rurais e de produtos exportáveis de alto ren-
Junto com o desenvolvimento industrial veio a dimento como café, leite, carne, cacau, açucar, algodão,
não se esquecendo daqueles que comandaram a extra-
valorização da burguesia industrial, das camadas médias
ção da borracha e dos banqueiros e proprietários das
urbanas e do operariado, até então sem significativa pro-
grandes casas comerciais exportadoras e importadoras
jeção nacional.
dos grandes centros urbanos.
Mas a industrialização não veio acompanhada
de leis trabalhistas, como regulamentação da carga
horária de trabalho, descanso semanal, férias remune-
radas, aposentadoria... O operariado foi bastante explo-
rado pelas longas jornadas de trabalho – chegavam a
15 horas diárias –, baixos salários, precárias condições
de trabalho. Exploraram-se muito e também os traba-
lhos feminino e infantil, cujos salários eram inferiores
aos dos homens.

93
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo Chapeleiros (1983)

Fonte: Youtube

Vídeo Colônia Cecília - Uma História de Amor e Utopia _ Episódio 1

Fonte: Youtube

Vídeo AMAZONIA #1

Fonte: Youtube

Vídeo Surgimento do Estado do Acre (01/02)

Fonte: Youtube

94
ASSISTIR

Vídeo Comércio Exterior Brasileiro - 1901 a 1930

Fonte: Youtube

Vídeo Coronelismo e voto de cabresto

Fonte: Youtube

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 03: Prudente de Morais

Fonte: Youtube

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 04: Campos Sales

Fonte: Youtube

95
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 05: Rodrigues Alves

Fonte: Youtube

Filme Fitzcarraldo

Início do século XX. Brian Sweeney Fitzgerald, mais conhecido como


Fitzcarraldo (Klaus Kinski), é um homem extremamente determinado que
possui a louca ideia de construir uma casa de ópera no meio da floresta
amazônica. Para conseguir o dinheiro necessário, ele decide explorar
borracha. O problema é que, para transportar o produto, ele terá que
atravessar morros e matas com um barco.

96
LER

Livros
Coronelismo, enxada e voto – Victor Nunes Leal

Um dos marcos inaugurais da moderna ciência política no Brasil, Coronelis-


mo, enxada e voto continua pleno de validade mais de sessenta anos após
sua primeira publicação – a despeito do desaparecimento quase completo do
país agrário que o inspirou. O rigor demonstrado por Victor Nunes Leal em sua
interpretação de documentos históricos, legislações e dados estatísticos (en-
tão novidade nos trabalhos de ciências humanas realizados no país); a escrita
fluente, livre de empáfia bacharelesca e torneada segundo a melhor tradição do
ensaísmo de interpretação nacional; os insights inéditos sobre a estrutura sistêmica do coronelismo, que
transcendia o âmbito do mandonismo local para entranhar-se nos mais elevados escalões da República:
diversos são os méritos deste livro, concebido como tese de concurso para a cátedra de política da antiga
Universidade do Brasil (atual UFRJ), onde Nunes Leal ensinou entre 1943 e 1969.

O Teatro das Oligarquias – Cláudia Maria Ribeiro Viscardi

Cláudia Viscardi, por meio de uma leitura inovadora sobre a Primeira Repú-
blica no Brasil, propõe uma revisão da chamada “política do café-com-leite”,
expressão inspirada na hegemonia política dos dois estados cafeeiros: Minas
e São Paulo. Partindo de uma vasta pesquisa histórica em arquivos públicos
e privados e utilizando-se de material de imprensa da época, a autora visou
demonstrar que ao longo da Primeira República as alianças entre os dois
estados brasileiros foram marcadas por mudanças e recorrentes momentos
de instabilidade e tensão.

A Invenção Republicana – Renato Lessa

Esta terceira edição revista e ampliada, que sai 15 anos após a anterior, tam-
bém publicada pela Topbooks, ganhou mais 100 páginas. Além de nova nota
introdutória, o autor pôs em anexo dois textos: um sobre os sentidos de oligar-
quia, o outro com uma análise retórica das plataformas políticas de 1930. No
prefácio, o jurista e acadêmico Celso Lafer, ex-ministro das Relações Exteriores,
exalta a “abrangente e arguta elaboração de Renato Lessa, que deu, no seu
livro, o devido alcance à invenção institucional de Campos Sales, valendo-se, ao
mesmo tempo, do repertório teórico das categorias da Teoria Política, dos dados
da História e da análise dos atores políticos do período, de seus interesses e de
suas paixões”.

97
INTERATIVI
A DADE

LER

tt
Livros
O Brasil na Primeira Guerra Mundial – Carlos Daróz

Poucos conhecem a participação brasileira no primeiro grande


conflito do século passado. A Primeira Guerra Mundial chegou ao
Brasil pelo mar, quando navios mercantes brasileiros começaram
a ser afundados por submarinos alemães, que desenvolviam uma
campanha de bloqueio naval contra a navegação Aliada. Diante
dos ataques, o Brasil reconheceu estar em estado de guerra contra
a aliança liderada pela Alemanha e uniu-se ao esforço internacio-
nal contra os germânicos.

ACESSAR

Sites Políticas Governamentais e Coronelismo

brasilescola.uol.com.br/historiab/politica-cafe-com-leite.htm
mundoeducacao.bol.uol.com.br/historiadobrasil/politica-dos-governadores.htm
www.resumoescolar.com.br/historia-do-brasil/resumo-do-coronelismo/
www.historiabrasileira.com/brasil-republica/funding-loan/

OUVIR
Músicas
Cabala Eleitoral – Bahiano & Cadete9
Café com Leite – Fernando
Com que Roupa – Noel Rosa

98
INTERDISCIPLINARIDADE

Por conta dos avanços tecnológicos da Segunda Revolução Industrial e da descoberta do processo de vul-
canização por Charles Goodyear em 1838, a borracha passou a ser mais cobiçada, pois após esse novo processo
de transformação, no qual a borracha é misturada ao enxofre e queimada, ela passa a ter maior resistência, sendo
muito mais útil em diversos setores industriais. Deste modo, o látex, seiva extraída do tronco da seringueira, passa
a ser um ótimo produto de exportação, muito desejado pelos países em franco desenvolvimento industrial. Diante
disso, a região amazônica na fronteira entre o Brasil e a Bolívia, repleta de seringueiras, passa a ser zona de litígio
entre essas duas nações. Após alguns anos de conflitos e intervenções diplomáticas, o Brasil comprou o Acre da Bo-
lívia por meio do Tratado de Petrópolis (1903), pagando aos bolivianos 2 milhões de libras esterlinas. Isso conferiu
ao Brasil a sua delimitação territorial atual.

Látex extraído do tronco da seringueira, técnica rudimentar até os dias de hoje.

99
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES

Habilidade 14 - Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e in-


terpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca das instituições
sociais, políticas e econômicas.

O aluno do Hexag deve ter percebido a recorrência com que a Habilidade 14 é exigida pelo Enem.
Muitas questões trazem excertos escritos por intelectuais ou figuras proeminentes da história
brasileira sobre os mais variados assuntos sobre os quais se posicionaram.
É imprescindível, principalmente em História do Brasil, que o aluno compreenda os principais
embates intelectuais sobre aspectos da cultura e da política brasileira, como prerrogativas cons-
titucionais, institucionais e ideológicas. Compreender a dinâmica política dos principais períodos
de nossa história é, também, fundamental.
Capacidade de leitura, aliada aos conhecimentos acima descritos, são suficientes para assinalar
a alternativa correta.

Modelo
(Enem) Nos Estados, entretanto, se instalavam as oligarquias, de cujo perigo já nos advertia Saint-
-Hilaire, e sob o disfarce do que se chamou “a política dos governadores”. Em círculos concêntricos,
esse sistema vem cumular no próprio poder central que é o sol do nosso sistema.
PRADO, P. Retrato do Brasil. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972.

A crítica presente no texto remete ao acordo que fundamentou o regime republicano brasileiro
durante as três primeiras décadas do século XX e fortaleceu o(a):
a) poder militar, enquanto fiador da ordem econômica.
b) presidencialismo, com o objetivo de limitar o poder dos coronéis.
c) domínio de grupos regionais sobre a ordem federativa.
d) intervenção nos Estados, autorizada pelas normas constitucionais.
e) isonomia do governo federal no tratamento das disputas locais.

100
Análise Expositiva

Habilidade 14
A “política dos governadores” foi uma aliança formada entre os presidentes da república,
os governadores e os coronéis no Brasil durante a República Velha. Tal política, baseada no
apoio mútuo entre as partes envolvidas, garantia o aumento do poder de influência dos líde-
res regionais, ou seja, dos coronéis.
Alternativa C

Estrutura Conceitual

REPÚBLICA OLIGÁRQUICA
ASPECTOS ECONÔMICOS E SOCIAIS

Domínio das oligarquias (grandes proprietários rurais)


Pacto entre elites locais e governo federal
A Características
Partidos estaduais
Repressão a movimentos sociais

Instrumentos
B de domínio
C Economia
◊ Política do “café com leite” (nível federal) ◊ Agrícola
◊ Política dos governadores (nível estadual) ◊ Exportação
◊ Coronelismo (nível municipal) ◊ Empréstimos estrangeiros
◊ Voto de cabresto ◊ Início da industrialização

D Presidentes

Primeiro Presidente civil Funding loan


(reprime Canudos) (empréstimo inglês)

PRUDENTE DE MORAIS CAMPOS SALLES


1894-1898 1898-1902

101
Reforma urbana na capital
Convênio de Taubaté (1906) Estimula a imigração
Questão do Acre (1901-1903) Modernização do Exército
Revolta da Vacina
RODRIGUES ALVES AFONSO PENA
1902-1906 1906-1909

Vice de Afonso Pena


Cisão da política do café com leite
(Divisão entre PRP e PRM)
NILO PEÇANHA
1909-1910

Revoltas sociais
(Contestado e Revolta da Chibata)
Estado de sítio
“política das salvações”
Reorganização das elites estaduais
MARECHAL Exportação de borracha
HERMES DA FONSECA Retomada da política do café com leite
1910-1914

Primeira Guerra Mundial


“Substituição das importações”
(industrialização)
Ausência de leis trabalhistas
Fortalecimento da burguesia industrial e dos setores médios
VENCESLAU BRÁS Greve geral de 1917
1914-1918

102
29 30
República oligárquica:
movimentos sociais

Competências Habilidades
1, 2, 3, 4 e 5 2, 4, 8, 9, 10, 12,
13, 14, 15, 18, 22,
23 e 24

C H
HISTÓRIA
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-
H8
-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferen-
tes grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favo-
recendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.
Mulheres e crianças prisioneiros da Guerra de Canudos.

Os movimentos sociais rurais


Canudos
§§ Bahia (1893-1897)
§§ Governo Prudente de Morais

Antônio Conselheiro e a criação de Belo Monte


Os nordestinos sofriam com a seca e a concentração fundiária, principais
responsáveis pela fome e miséria reinantes. Os latifundiários abusavam constan-
temente da força de seus jagunços para impor sua autoridade e os sertanejos não
tinham a quem recorrer, especialmente porque os latifundiários eram as próprias
autoridades locais. Matava-se e morria-se por quaisquer motivos, dos mais banais,
cujos culpados não recebiam punição, a não ser a vingança da família ou dos
amigos da vítima. O ambiente hostil do campo forçava os sertanejos a procurar
formas alternativas de sobrevivência: êxodo rural; busca de melhores condições de
vida nas grandes cidades nordestinas; banditismo social ao qual aderiam grupos
de cangaceiros; fé em figuras carismáticas e messiânicas – Padre Cícero e Beato
Conselheiro –, que atraíam seguidores de toda a região Nordeste.
Beato Antônio Conselheiro era a alcunha de Antônio Vicente Mendes
Maciel. Nascido na pequena vila cearense de Quixeramobim, em 1830, ficou órfão
de mãe aos seis anos; o pai foi um pequeno comerciante de quem herdou o nome.
Sonhava que o filho fosse padre. Desde cedo propiciou-lhe educação abastada
para a época em colégio de padres, onde o menino aprendeu latim e francês. Antônio Conselheiro

105
Morto o pai, Antônio Vicente assumiu o pequeno comércio da
família, mas enfrentou sérias dificuldades: dívidas e um casamento
mal sucedido. Chegou a trabalhar como professor primário e caixeiro
antes de ser abandonado pela mulher. Mudou-se de Ipu, CE, para
o interior da Bahia, onde passou a viver como beato, vagando pelo
sertão e pregando o Evangelho de Jesus Cristo.
Conselheiro pregava a salvação das almas e estimulava a popu-
lação a construir igrejas e cemitérios; criticava as autoridades constitui-
das e os altos impostos cobrados pelo governo. Cada vez mais popular,
passou a ser preocupação para as autoridades. Foi preso e mandado
para Fortaleza. Depois de libertado, voltou ao interior baiano onde con-
tinuou com suas pregações.
O crescente prestígio do Beato Conselheiro desagradava os re-
presentantes da Igreja católica, incapazes de controlar seus seguidores.
O bispo de Salvador passou a pressionar as autoridades baianas para que tomassem providências rígidas contra o be-
ato, acusando-o de conspirar contra a religião. Os latifundiários também se sentiam incomodados com sua pregação
contra o latifúndio e com o crescente número de sertanejos que abandonavam as fazendas para seguir o Conselheiro.
Ao percorrer o sertão baiano, Conselheiro e seus seguidores provocavam alarde. As cidades paravam para
ouvir suas pregações que atacavam as autoridades constituídas e o regime republicano. Os conflitos entre os se-
guidores do beato e as forças policiais e capatazes das fazendas tornavam-se cada vez mais frequentes e violentos.
Um dos mais conhecidos ocorreu em 1893 no povoado baiano de Bom Conselho. Chamadas para conter o inciden-
te, as tropas policiais foram derrotadas.
Os conselheiristas resolveram então fixar-se numa fazenda abandonada às margens do rio Vaza-Barris, onde
começou a florescer o Arraial de Belo Monte. Organizados de acordo com rígidas regras religiosas, todos traba-
lhavam e tinham direito ao que produziam. Eram proibidas bebidas alcoólicas, prostituição e jogo. O grupo mais
próximo de Conselheiro, conhecidos como Apóstolos, era responsável pela administração do arraial. A segurança
ficava a cargo dos membros da Companhia do Bom Jesus.

Belo Monte
A fama da comunidade espalhava-se e o número de habitantes crescia. Estatísticas oficiais dão conta de
que havia aproximadamente trinta mil habitantes e cinco mil casas. Até mesmo fazendeiros da vizinhança iam ao
arraial ouvir as pregações de Conselheiro, que considerava o governo da República ilegítimo, sem garantia divina.
Com ele, a Igreja perdia espaço.

106
O messianismo
O movimento social de Canudos caracterizou-se pela intensa religiosidade. Cientistas sociais explicam-no
como tendo sido um fenômeno que, em situações de miséria e crise, é comum o crescimento da religiosidade junto
à massa popular, que gera movimentos messiânicos: prometem mudanças radicais na terra e a salvação eterna
no céu.

A repressão
Cada vez mais incomodados, latifundiários e autoridades eclesiásticas e civis desejavam acabar com aquela
comunidade, que passaram a chamar de Canudos. Conselheiro e seus seguidores foram acusados e estigmatizados
de monarquistas e fanáticos, assassinos e ladrões, hereges e criminosos. Estavam criadas as justificativas para a
repressão e a extinção de Canudos.
A primeira razão para a repressão resultou de um incidente relacionado à compra de madeiras na cidade de
Juazeiro da Bahia. Para a construção da nova igreja do arraial, a madeira necessária foi comprada e paga adianta-
damente, na cidade de Juazeiro. Como o comerciante demorou a entregá-la, homens da comunidade propuseram-
-se a buscá-la à força, se preciso. As autoridades locais supervalorizaram o incidente e pediram proteção ao gover-
no de estado, que enviou uma tropa com cem homens da Polícia Militar, com o objetivo de intimidar os moradores.
A tropa foi humilhada e derrotada.

Na caricatura de Angelo Agostini, veículo de propaganda republicana durante o Império, retra-


ta Conselheiro com um séquito de bufões armados com velhos bacamartes tentando “barrar”
a República. Revista Ilustrada.

Nova expedição foi enviada, composta por 600 homens da Polícia Militar e do Exército, armada com metra-
lhadoras e dois canhões. Foram facilmente derrotados pelos conselheiristas.
A derrota repercutiu em todo o país. Tropas federais então foram mandadas à Bahia para combater os
sertanejos de Canudos. Eram 1,2 mil homens sob o comando do coronel Moreira César, o “corta-cabeças”, assim
conhecido graças à violência com que reprimiu os rebeldes da Revolução Federalista em Santa Catarina. Arrogante
e vaidoso, Moreira César subestimou as forças rebeldes e cometeu erros táticos infantis. Resultado: sua tropa e ele
próprio foram dizimados pelos sertanejos, cujas armas e munições fortaleceram mais ainda os rebeldes.

107
O agravamento da situação no interior baiano refletia diretamente no poder público federal. Políticos floria-
nistas acusavam o presidente Prudente de Morais de incompetência e fraqueza. Invadiram e depredaram sedes de
jornais considerados monarquistas em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Uma nova expedição militar foi enviada a Canudos, com mais de 7 mil homens, comandados pelo general
Arthur Oscar e o próprio Ministro da Guerra, marechal Carlos Machado Bitencourt.
O arraial de Canudos contava com artilharia pesada e canhões. O cerco ao arraial foi seguido de intenso
bombardeio que foi consumido pelo fogo. Depois de resistir por quase um mês, a comunidade inteira foi morta.
Seus últimos momentos foram relatados em Os Sertões, do jornalista e escritor Euclides da Cunha, correspondente
do Jornal O Estado de São Paulo, designado à época para cobrir a guerra.

Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a


história, resistiu até ao esgotamento completo. Ex-
pugnado palmo, na precisão integral do termo, caiu
no dia 5, ao entardecer, quando caíram os seus úl-
timos defensores, e todos morreram. Eram quatro
apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança,
na frente dos quais rugiam raivosamente 5 mil sol-
dados. Forremo-nos à tarefa de descrever os seus
últimos momentos. Nem poderíamos fazê-lo. Esta
página imaginamo-la sempre profundamente emo-
cionante e trágica; mas cerramo-la vacilante e sem
brilhos...” (São Paulo: Ediouro, 2003. p. 544).

O corpo de Antônio Conselheiro (foto), morto há alguns dias, provavelmente de disenteria, foi encontrado
insepulto, uma vez que os seguidores acreditavam na sua ressurreição.

Única foto de Antônio Conselheiro – tomada duas semanas após sua morte –, místico, rebelde e líder espiritual do arraial de Canudos (1893–1897),
Bahia, Brasil. Flávio de Barros. Exército brasileiro.

108
Contestado
§§ Paraná e Santa Catarina (1912-1916)
§§ Governos de Hermes da Fonseca e Venceslau Brás

Região do Contestado

A Guerra do Contestado resultou de um processo semelhante ao de Canudos. Ocorreu na divisa do Paraná


com Santa Catarina durante os governos de Hermes da Fonseca e de Venceslau Brás.
A área onde se formou a comunidade era disputada pelos governos dos dois estados. Ambos não escon-
diam os interesses pela exploração da madeira e da erva mate.
A concessão da construção pelo governo de uma estrada de ferro ligando São Paulo ao Rio Grande do Sul
contribuiu para o aquecimento das tensões na região. Tal medida desapropriou uma larga faixa de terra e atraiu
um contingente significativo de gente para suprir a necessidade de mão-de-obra. Posseiros e pequenos fazendeiros
que viviam da exploração da terra e da madeira na região acabaram sendo expulsos.
Com o fim das obras da estrada de ferro, o contingente de desempregados em condições precárias, criou
um cenário ideal para difusão de ideais messiânicos. Foi quando apareceu o líder José Maria – nome falso, mais
tarde descoberto pelas autoridades.
Aproveitando-se da presença de mon-
ges missionários na região, José Maria tomou
o nome de um deles e apresentava-se e como
de sua obra aposentou-se.
Camponeses expropriados de suas
terras e desempregados dispuseram-se a se-
guir José Maria e a formar uma comunidade,
àquela altura única alternativa de vida para
eles. Dia a dia, a população crescia não sem
a preocupação das lideranças políticas e reli-
giosas locais e as associações com Canudos.
A reação do governo federal, das elites e da
própria Igreja não tardou. Urgia uma inter-
Grupo de caboclos mostra-se disposto a se defender. venção imediata no local.

109
Várias campanhas de combate foram organizadas pelas autoridades contra o “antro de fanáticos”. Exército
e polícias estaduais foram derrotados. Temia-se a repetição de Canudos. No início de 1914, sob o comando do
general Setembrino de Carvalho, seis mil soldados que contavam com artilharia atacaram os crentes. A resistência
deles só foi debelada em 1916.

Revolta de Juazeiro
§§ Ceará (1914)
§§ Governo Hermes da Fonseca

A política salvacionista foi a principal razão da Revolta de


Juazeiro. O marechal Hermes da Fonseca decidiu intervir no estado
do Ceará com o objetivo de neutralizar o poder das oligarquias mais
poderosas da região sob controle do senador Pinheiro Machado,
político com bastante influência sobre os “coronéis” do Norte e
Nordeste brasileiros.
A ascensão do novo Presidente do Ceará, tenente-coronel
Franco Rabelo, no contexto da “Política das Salvações”, resultou
na derrubada da oligarquia comandada pela família Acioly. Uma
das vítimas do intervencionismo hermista foi o padre Cícero Romão
Batista, aliado da família Acioly, que ocupava o cargo de prefeito
de Juazeiro do Norte. O padre começou reunindo fiéis para rezar
e fazer promessas nos desastrosos períodos de seca. Logo ganhou
fama de milagreiro e passou a reunir adeptos em número crescen-
te, que passaram a residir em Juazeiro ou a visitá-lo em grandes
romarias.
Com bastante influência junto ao senador Pinheiro Macha-
do, padre Cícero começou a armar a deposição de Rabelo. Nessa
intriga, o presidente cearense Franco Rabelo armou e mandou um
batalhão da polícia a Juazeiro para prender padre Cícero. Grande
número de seguidores do padre pegou em armas para enfrentar os
policias com o apoio de vários “coronéis” aciolistas.
Houve combates violentos em todo o estado com desvan-
tagem para as forças rabelistas. O levante foi tão violento que o
governo federal cedeu, retirando o interventor Franco Rabelo e de-
volvendo o governo do Estado aos Acioly.
Padre Cícero

O Cangaço
Nordeste (1870 – 1940)
O cangaço foi uma forma de banditismo social que se espalhou no Nordeste brasileiro entre 1870 e
1940.
Nos fins do século XIX, a sociedade nordestina passava por uma grave crise, motivada por inúmeros con-

110
flitos: imprecisão dos limites geográficos entre as fazendas; rivalidades pelos pastos de melhor qualidade; desen-
tendimentos sobre heranças, cuja único herdeiro, conforme o morgadio, era seu filho mais velho do proprietário.
Nesses confrontos, todos os parentes eram chamados e armados para auxiliar a vítima perseguida.
Até o último quartel do século XIX, o sertão foi dominado pela luta entre famílias, o que impedia a ação de
grupos armados independentes. No final do século, no entanto, essa dinâmica sertaneja mudou. A grande seca de
1877 - 1879 levou à diminuição do contingente populacional, vítima de doenças e fome. Aos pobres restava migrar
ou submeter-se aos assaltos. Foi nessa oportunidade que, oprimidos pelos “coronéis”, abandonados pelas autori-
dades governamentais e castigados pela seca, os bandos de cangaceiros, até então controlados pelos proprietários,
começaram a agir autonomamente.
Percorriam o interior nordestino saqueando fazendas, povoados e pequenas cidades. Em grupos (bandos),
liderados por um chefe, mantinham-se errantes, sem endereço fixo, vivendo de assaltos, saques e não se ligando
permanentemente a nenhum chefe político ou de família. Esses bandos viviam em luta constante com a polícia até
serem presos ou mortos.
Vários bandos passaram a ser conhecidos e temidos. De 1920 a 1938, o cangaceiro mais famoso foi sem
dúvida Virgulino Ferreira da Silva, o “Lampião”. Com sua morte, em 1938, morreu também o cangaço.
O fim do cangaço como modo de vida foi decorrente dos efeitos da Revolução de 1930. O Estado passou a
assumir de forma centralizadora o controle político regional, através do desarme dos “coronéis” e da adesão dos
grandes proprietários.

Lampião e Maria Bonita

Lampião e seu bando

111
Nada a ver com Robin Hood
Não são poucos os que veem em Lampião um Robin Hood nordestino. “Ele foi bandido, mas também teve atitu-
des de distribuir o que tomava”, diz o pesquisador Antônio Amaury C. de Araújo, de São Paulo, que escreveu seis
livros sobre o cangaço. Houve passagens assim. Em 1927, o bando entrou em Limoeiro do Norte, CE, jogando
moedas para as crianças. Cena semelhante acontecera em Juazeiro, quando, num dos mais absurdos episódios da
história brasileira, o bandido foi convocado para combater a Coluna Prestes (infográfico).
“Mas Lampião nunca escolheu aliados em função da classe social”, diz o antropólogo Villela. “Pobres e ricos,
oprimidos e opressores, todos eram bons desde que satisfizessem suas exigências. Todos eram inimigos desde que
se opusessem a seus propósitos.”
O historiador inglês Eric Hobsbawm chegou a classificá-lo como um “bandido social” – não exatamente um Robin
Hood, mas um tipo vingador. “Sua justiça social consiste na destruição”, diz Hobsbawm, que foi criticado pela
avaliação. Billy Chandler, por exemplo, acha que Lampião só poderia ser considerado um bandido social por ter
raízes em um ambiente injusto, nunca por se preocupar com a justiça social.
Villela concorda. Para ele, Lampião resistiu a um tipo de migração vergonhosa, a migração do medo, que empur-
rava para longe gente ameaçada por inimigos ou pela polícia. Para não passar por covarde, assumiu o nomadismo
e a violência. As boas ações seriam um “escudo ético”, na opinião de Frederico Pernambucano de Mello, supe-
rintendente de Documentação da Fundação Joaquim Nabuco, de Recife. Lampião, apesar de perverso, queria ser
visto como um homem bom.
Disponível em: <iar.unicamp.br>. Acesso em: 7 mar. 2015

Os movimentos sociais urbanos


Revolta da Vacina
§§ Rio de Janeiro (1904)
§§ Governo Rodrigues Alves

As precárias condições de higiene e a falta de saneamento não eram os únicos problemas do Rio de Janeiro
no início do século XX. Mas eram responsáveis pela grande quantidade de ratos, baratas, mosquitos e outros inse-
tos, bem como por agentes transmissores de várias enfermidades. As maravilhas naturais da capital da República
contrastavam com o lixo e as condições precárias de sobrevivência da maioria da população, especialmente das
camadas pobres que mais sofriam com a proliferação de doenças.
Não adiantava apenas promover o saneamento e a urbanização da cidade. Eram necessárias ações de com-
bate a epidemias, como varíola, febre amarela e leptospirose, entre outras. A situação do Rio de Janeiro manchava
a imagem da cidade no exterior, a ponto de navios vindos da Europa evitarem o porto carioca para preservar a
saúde de tripulantes e passageiros.
O presidente Rodrigues Alves encarregou
o sanitarista Oswaldo Cruz de zelar pela saúde
pública e combater as epidemias que assolavam
a cidade, complementando as ações urbanísticas.
Lembre-se que a população, especialmente a de
baixa renda, moradora dos cortiços demolidos ou
não, ou nos prédios que deviam dar lugar a ruas

Oswaldo Cruz

112
mais largas e praças, estava revoltada com o governo e consequentemente não aceitaria suas medidas. Além disso,
a oposição fazia campanhas abertas contra as medidas governamentais. O poder público, por sua vez, cometeu a
grande falha de não esclarecer a população, preferindo usar a força para aplicar as medidas sanitaristas.
Para combater a febre amarela, era necessário eliminar os focos de mosquitos nas casas. Com esse objetivo
formou-se uma brigada composta por funcionários do Departamento de Saúde conhecida como “mata-mosquitos”
que visitava as casas e, muito frequentemente, invadia-as sob o pretexto de que as pessoas não lhe facilitavam o
acesso, revoltando assim mais ainda a população. Não se ignore a sistemática política de arbitrariedades realizada
pela gestão Pereira Passos contra a população pobre, que desconfiava das políticas governamentais e de seus agentes.
O combate à varíola seria realizado graças à vacinação em massa da população contra a doença. Já revolta-
da com as ações do governo e amedrontada pela oposição, que mais a desinformava do que esclarecia, afirmando,
por exemplo, que a vacina sim causaria a doença, a população passou a se recusar a receber as brigadas sanitárias,
bem como a vacina. Em virtude desse impasse, o governo conseguiu a aprovação no Congresso de uma lei que
tornava a vacinação obrigatória e permitia que as brigadas sanitárias invadissem as casas para efetuá-la, desres-
peitando direitos individuais e a propriedade privada.

Capa da revista O Malho, 1904. A população revolta-se contra Oswaldo Cruz, de bigodes e montado em uma seringa
(Disponível em: <portaldoprofessor.mec.gov.br>).

Em novembro de 1904 eclodiu a Revolta da Vacina ou do “Quebra-Lampião”, que tomou conta das ruas do
Rio de Janeiro com apoio de militares positivistas, intelectuais e opositores do governo. Foram erguidas barricadas
em várias ruas, atacados prédios públicos, depredados postes de iluminação pública. Houve mortes e ferimentos
graves de ambos os lados e várias prisões foram efetuadas.
A reação popular levou o governo a suspender a obrigatoriedade da vacina e a declarar estado de sítio para
controlar a situação, o que enfim aconteceu, em virtude de outras ações governamentais, como a compra de ratos
da população por agentes de saúde como forma de conter a proliferação de doenças transmitidas por eles.

113
Revolta da Chibata
§§ Rio de Janeiro (1910)
§§ Governo Hermes da Fonseca

O movimento ocorreu pouco tempo depois da


posse de Hermes da Fonseca, resultado da reação dos
marinheiros aos castigos infligidos a eles na marinha,
no início do século XX. Revoltados com a punição im-
posta ao marinheiro Marcelino Rodrigues Menezes, que
servia no encouraçado Minas Gerais – morto depois
de açoitado na frente da tropa –, os marinheiros toma-
ram o controle do navio, liderados por João Cândido,
o Almirante Negro.
Os marinheiros amotinados tomaram ainda o na-
vio São Paulo e receberam o apoio de outros navios an-
corados na Baía de Guanabara: o Bahia e o Deodoro. Os
amotinados assassinaram o capitão Batista das Neves,
responsável pela punição ao marinheiro morto, e apon-
taram os canhões dos navios para a cidade do Rio de
Janeiro, ameaçando bombardeá-la caso o governo Her-
mes da Fonseca não atendesse suas exigências, enviadas
mediante um manifesto. Entre elas constavam fim dos
João Cândido lê o manifesto da Revolta: fim dos castigos corporais. castigos corporais na Marinha, aumento do soldo (remu-
neração) dos marinheiros e melhorias da alimentação nas
embarcações, consideradas de péssima qualidade.
O presidente aceitou as exigências e enviou oficiais para assumir o controle dos navios, o que encerrou a
revolta. Mas em seguida ordenou a prisão de marinheiros envolvidos na revolta na Ilha das Cobras ou em campos
de trabalhos forçados no Norte.
Pouco depois do fim da Revolta da Chibata ocorreu uma revolta entre os fuzileiros navais, aquartelados
na Ilha das Cobras, conhecido como Revolta do Batalhão Naval. O governo agiu com energia e rapidez: sufocou o
movimento e ordenou a prisão dos revoltosos. Muitos deles morreram em virtude dos maus tratos e da violência
com que foram tratados.

Disponível em: <chibatas.blogspot.com>.

114
Greve Geral de 1917
§§ São Paulo (origem)
§§ Governo Venceslau Brás

No cenário nacional, o desenvolvimento industrial trouxe o crescimento da importância da burguesia indus-


trial, das camadas médias urbanas e do operariado, até então sem grande projeção nacional.
A industrialização não foi acompanhada de leis trabalhistas, como a regulamentação das horas de trabalho
diário, da obrigatoriedade do descanso semanal, das férias remuneradas e da aposentadoria. A exploração dos
trabalhadores manifestava-se pelas longas jornadas de trabalho, que chegavam a 15 horas diárias, baixos salários
e precárias condições de trabalho. Não poupava o trabalho feminino e infantil, submetidos a salários mais baixos
que os dos homens.
Os operários moravam em casebres nos cortiços, pagando altos aluguéis para o valor dos salários que re-
cebiam. Grandes famílias amontoavam-se em cômodos pequenos e apertados, próximos às fábricas e expostas à
fuligem e à fumaça frequentes. As precárias condições de moradia associadas à péssima alimentação provocavam
doenças nos operários e em seus familiares, causando elevados índices de mortalidade.

Custo de vida, salários e produção industrial no Brasil


Ano Custo de vida Salários Produção industrial
1914 100 100 100

1915 108 100 118

1916 116 101 140

1917 128 107 197

1918 144 117 171

1919 148 123 209

1920 163 146 188


SIMONSEN, R. C. A evolução industrial do Brasil. 1939.

A maioria dos operários daquele período eram estrangeiros e tinham conhecimento dos ideários socialista e
anarquista, base da prática sindical e anarcossindicalista, voltados para a pressão sobre os patrões com o objetivo
de obterem melhores salários e condições de trabalho, bem como leis trabalhistas que assegurassem, entre outras
reivindicações, a diminuição da carga horária das jornadas de trabalho, a regulamentação do trabalho feminino e
a proibição do trabalho infantil.
A situação dos operários, a falta
de uma legislação trabalhista e a eclosão
da Revolução Russa de 1917 podem ser
apontadas como principais causas da
eclosão de uma greve geral dos operários
paulistas.
A greve começou com um gru-
po de operários de uma tecelagem que
decidiu paralisar o trabalho para pro-
testar contra o aumento da jornada de
trabalho na fábrica. Entre vários distúr-
Operários e anarquistas marcham portando bandeiras negras pela cidade de São Paulo,
bios, um sapateiro anarquista chamado na greve de 1917.

115
Antônio Martinez foi assassinado pela polícia. O fato provocou a paralisação de outras fábricas e o enterro do
sapateiro foi acompanhado por cerca de dez mil pessoas.

Trabalhadores cruzam os braços em uma fábrica em São Paulo.

Em sinal de protesto, operários de outras fábricas aderiram ao movimento e a paralisação transformou-se


em greve geral, que levou os operários a fazerem várias exigências:
§§ libertação de todas as pessoas detidas devido à greve;
§§ respeito ao direito de associação dos trabalhadores;
§§ proibição do trabalho de menores de 14 anos nas fábricas e oficinas;
§§ abolição do trabalho noturno para mulheres;
§§ aumento de 35% nos salários inferiores a $5000 e de 25% para os mais elevados; e
§§ jornada diária de oito horas.
O movimento grevista espalhou-se pelo estado de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio de Janeiro, Minas
Gerais, Bahia e Rio Grande do Sul.
Após violenta repressão policial e complexas negociações, foi selado um acordo que pôs fim à greve: os
salários seriam aumentados em 20% e os grevistas presos seriam libertados sem sofrer retaliação.
Assim, mesmo que a República Militar e Oligárquica constituiu-se como um golpe político, criando um Es-
tado dissociado dos interesses de grande parte da sociedade, não significou que segmentos rurais e urbanos dessa
sociedade ficassem passivos e deixassem de lutar para viver em um País mais justo, que contemplasse seus anseios.

116
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo O Arraial - animação de Otto Guerra

Fonte: Youtube

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 06: Afonso Pena

Fonte: Youtube

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 07: Nilo Peçanha

Fonte: Youtube

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 08: Hermes da Fonseca

Fonte: Youtube

118
ASSISTIR

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 09: Venceslau Brás

Fonte: Youtube

Filme Abril despedaçado

Em 1910, Tonho vive com sua família no sertão brasileiro. O seu pai
tenta convencê-lo a vingar a morte do irmão mais velho, assassina-
do por uma família rival, mas sabe que caso se vingue será perse-
guido e terá pouco tempo de vida. Angustiado pela perspectiva da
morte, Tonho passa a questionar a lógica da violência e da tradição.

Filme Deus e o Diabo na Terra do Sol

Manuel (Geraldo Del Rey) é um vaqueiro que se revolta contra a


exploração imposta pelo coronel Moraes (Mílton Roda) e acaba ma-
tando-o numa briga. Ele passa a ser perseguido por jagunços, o que
faz com que fuja com sua esposa Rosa (Yoná Magalhães). O casal se
junta aos seguidores do beato Sebastião (Lídio Silva), que promete o
fim do sofrimento através do retorno a um catolicismo místico e ritu-
al. Porém ao presenciar a morte de uma criança Rosa mata o beato.

Filme Baile Perfumado

Amigo íntimo do Padre Cícero (Jofre Soares), o mascate libanês Ben-


jamin Abrahão (Duda Mamberti) decide filmar Lampião (Luís Carlos
Vasconcelos) e todo seu bando, pois acredita que este filme o deixa-
rá muito rico. Após alguns contatos iniciais ele conversa diretamente
com o famoso cangaceiro e expõe sua ideia, mas os sonhos do mas-
cate são prejudicados pela ditadura do Estado Novo.

119
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Filme Corisco e Dadá

Para se vingar de um homem que ele pensa tê-lo traído, o cangaceiro


Corisco (Chico Díaz), conhecido como “Diabo Loiro”, se vinga raptando
a filha dele, Dadá (Dira Paes), de 12 anos. Com o tempo, ela se integra
ao bando de Corisco e se afeiçoando a ele, tornando-se sua mulher. O
grupo vai percorrendo os sertões, tentando se livrar das armadilhas de
Zé Rufino, chefe da polícia.

Filme Paixão e Guerra no Sertão de Canudos

Documentário que resgata um dos mais belos, chocantes e desconhe-


cidos episódios da história brasileira. Com depoimentos de pesquisa-
dores e, sobretudo, dos parentes dos combatentes, o filme oferece ao
público uma verdadeira aula sobre a luta pela terra e pela liberdade.

Filme Guerra de canudos

Em 1893, Antônio Conselheiro (José Wilker) e seus seguidores come-


çam a tornar um simples movimento em algo grande demais para a
República, que acabara de ser proclamada e decidira por enviar vários
destacamentos militares para destruí-los. Os seguidores de Antônio
Conselheiro apenas defendiam seus lares, mas a nova ordem não po-
dia aceitar que humildes moradores do sertão da Bahia desafiassem a
República. Assim, em 1897, esforços são reunidos para destruir os ser-
tanejos. Estes fatos são vistos pela ótica de uma família com opiniões
conflitantes sobre Conselheiro.

120
LER

Livros
A Revolta Da Chibata - Edmar Morel

A nova edição do livro que cunhou o termo “Revolta da Chibata” reúne


documentos, entrevistas, artigos e fotos sobre a história da rebelião na Ma-
rinha de Guerra, em 1910, liderada por João Cândido, o Almirante Negro,
que tinha o objetivo de acabar com os castigos corporais aos marinheiros e,
num plano mais elevado, instaurar justiça social e dignidade na sociedade
brasileira da época.

Cangaços – Graciliano Ramos

Reunindo todos os textos de Graciliano Ramos sobre o banditismo ser-


tanejo, escritos entre 1931 e 1941, Thiago Mio Salla e Ieda Lebensztayn
mostram a influência do cangaço na obra do artista. Além de textos res-
tabelecidos à redação original do autor, são pela primeira vez publicados
em livro, dois inéditos: uma entrevista ficcional com Lampião, escrita para a
revista Novidade, e a crônica “Dois irmãos”.

O Cortiço – Aluísio Azevedo

“O cortiço”, publicado em 1890, é considerado uma obra-prima do Natu-


ralismo brasileiro. Apesar da influência notável de Émile Zola, o vigor e a
originalidade da narrativa que abordou os problemas sociais de fins do sé-
culo XIX, possuindo como “cenário” principal um cortiço, são perceptíveis.
Pintor de variada galeria de tipos e da representação do cotidiano, Aluísio
Azevedo ficou conhecido por seu traço forte e principalmente por personi-
ficar a fase naturalista brasileira.

A Revolta da Vacina – Nicolau Sevcenko

O autor reconstitui os episódios da maior convulsão social da cidade do


Rio de Janeiro, durante a campanha de vacinação contra a varíola (1904).
Por trás da reforma urbana, percebe-se a profunda situação de exclusão
social. A saúde pública caminha junto ao uso autoritário da ciência. Com
posfácio inédito de Sevcenko, mapas, fotos de Augusto Malta e Marc Ferrez
e charges da época.

121
INTERATIVI
A DADE

LER

tt
Livros
Os Sertões – Euclides da Cunha

Os Sertões é um livro brasileiro, escrito por Euclides da Cunha e


publicado em 1902.
Trata da Guerra de Canudos (1896-1897), no interior da Bahia. Eucli-
des da Cunha presenciou uma parte da guerra como correspondente
do jornal O Estado de S. Paulo. Pertence, ao mesmo tempo, à prosa
científica e à prosa artística. Pode ser entendido como uma obra de
Sociologia, Geografia, História ou crítica humana, mas não é errado
lê-lo como uma epopeia da vida sertaneja em sua luta diária contra a
paisagem e a incompreensão das elites.

Padre Cícero ( Poder, guerra e fé no sertão) - Lira Neto

‘Padre Cícero’ é o resultado de dez anos de pesquisa de Lira Neto, autor de


livros como O Inimigo do Rei: Uma biografia de José de Alencar e Maysa: só
numa multidão de amores, que deu origem à minissérie da TV Globo. Nesta
biografia, uma das mais aguardadas do ano, o autor se debruça sobre a vida
do mais amado e controvertido líder religioso que o Brasil já teve: Cícero
Romão Batista, o Padim Ciço dos romeiros e fiéis.
Baseado em documentos raros e inéditos, o autor reconta, com ri-
queza de detalhes, os noventa anos de vida do sacerdote, desde seu
nascimento no sertão cearense até a consagração como líder popular.
Santo para alguns, impostor para outros, nesta biografia o padre Cíce-
ro é alvo de um olhar preciso, que desfaz equívocos históricos e ajuda
a enxergar o homem por trás do mito.

122
ACESSAR

Sites Revoltas: Vacina; Chibata | Guerra dos contestados, e de Canudos

www.sohistoria.com.br/ef2/canudos/
www.infoescola.com/historia/guerra-do-contestado/
brasilescola.uol.com.br/historiab/revolta-chibata.htm
portal.fiocruz.br/pt-br/node/473

OUVIR
Músicas
Rato, Rato – Casemiro Rocha & Claudino Costa
A Vacina Obrigatória – Mário Pinheiro
Os Reclamantes – Eduardo das Neves
Viva Meu Padim – Luis Gonzaga
Eu Vou Pegá o Lampião – J. Thomaz

123
INTERDISCIPLINARIDADE

O quadro de atraso nas políticas de saneamento brasileiras, no final do século XIX e início do XX, fizeram
com que o Brasil fosse muito desprestigiado no cenário de atração de turistas internacionais, pois doenças como
febre amarela, dengue, leptospirose e varíola eram corriqueiras em todo o país, mas, principalmente, na capital
federal, o Rio de Janeiro. Somado a esse problema de saúde pública a necessidade de reurbanizar as principais
cidades brasileiras, conferindo a elas ares de modernidade, o prefeito do Rio de Janeiro, Pereira Passos, inspirou-se
na reforma urbana de Paris e decidiu modernizar a capital.
A reforma do “Bota Abaixo”, como ficou conhecida, tentou criar uma falsa impressão de um Rio de Janeiro
moderno e sem pobreza, pois os moradores dos cortiços derrubados seriam realocados para os morros (origem das
favelas). Nesse mesmo momento, o Brasil passava por uma reforma sanitarista, chefiada pelo médico sanitarista
Oswaldo Cruz, que decidiu erradicar doenças cotidianas da realidade nacional, obrigando agentes a borrifarem
veneno nas casas das pessoas para matar os mosquitos, além de instituir a vacinação obrigatória. Todas essas
transformações simultâneas no cenário fluminense levaram à eclosão da Revolta da Vacina (1904).

Charge ironizando o exército da vacina de Oswaldo Cruz

124
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES

Habilidade 12 - Recorrer aos conhecimentos sobre as linguagens dos sistemas de comunica-


ção e informação para resolver problemas sociais.

A justiça tem como um de seus componentes o conjunto de leis de uma determinada


nação. O código penal, no caso brasileiro, exprime e tipifica um conjunto de ações inde-
sejáveis e suas respectivas punições. Contudo, o conjunto de valores expressos na lei não
é completamente neutro, isto é, pode representar a visão de certo grupo social.
A Habilidade 12 exige esse tipo de compreensão dos alunos. Requer a capacidade de não
somente compreender o teor das constituições brasileiras, mas a de reconhecer ideologias
impostas no ordenamento jurídico. No caso específico dessa aula, a questão a seguir de-
monstra o preconceito das elites brasileiras em relação às práticas culturais da população
de origem africana, que acabavam de ser libertas do jugo da escravidão. Vê-se que o
código penal em questão é de 1890, ou seja, dois anos após a Lei Áurea.

Modelo
(Enem) O artigo 402 do Código Penal Brasileiro de 1890 dizia:
Fazer nas ruas e praças públicas exercícios de agilidade e destreza corporal, conhecidos pela de-
nominação de capoeiragem: andar em correrias, com armas ou instrumentos capazes de produzir
uma lesão corporal, provocando tumulto ou desordens.
Pena: prisão de dois a seis meses.
SOARES, C.E.L. A negregada instituição – os capoeiras no Rio de Janeiro:
1850-1890. Rio de Janeiro: Secretaria Municipal de Cultura, 1994 (adaptado).

O artigo do primeiro Código Penal Republicano naturaliza medidas socialmente excludentes. Nesse
contexto, tal regulamento expressava:
a) a manutenção de parte da legislação do império com vistas ao controle da criminalidade urbana.
b) a defesa do retorno do cativeiro e escravidão pelos primeiros governos do período republicano.
c) o caráter disciplinador de uma sociedade industrializada, desejosa de um equilíbrio entre progresso e
civilização.
d) a criminalização de práticas culturais e a persistência de valores que vinculavam certos grupos ao
passado de escravidão.
e) o poder do regime escravista, que mantinha os negros como categoria social inferior, discriminada e
segregada.

126
Análise Expositiva

Habilidade 12
Ao observar os artigos citados, percebe-se a preocupação em criminalizar atitudes comuns a
uma parcela da população negra, como a capoeira, vista pela elite branca como uma ameaça.
É interessante notar que o código foi elaborado apenas dois anos depois do fim da escravidão
e reflete a necessidade da criação de novos mecanismos, teoricamente democráticos, que
mantivessem a população negra, assim como suas expressões culturais, marginalizada.
Alternativa D

Estrutura Conceitual
REPÚBLICA OLIGÁRQUICA
MOVIMENTOS SOCIAIS

I MOVIMENTOS
SOCIAIS RURAIS
Canudos
(Bahia: 1893-1897)
Liderança: Antõnio Conselheiro
Contexto: pobreza no campo, secas, arbítrios das elites
Características: messianismo, movimento religioso e camponês
Reivindicação: formação de arraial independente
Finalização: derrotado pelas tropas federais após resistência

Contestado
(Paraná e Santa Catarina: 1912-1916)
Liderança: José Maria
Contexto: pobreza no campo, construção de estrada de ferro
Características: messianismo, movimento religioso e camponês
Reivindicação: formação de comunidade na região
Finalização: derrotado pelas tropas federais

Cangaço
(Nordeste: 1870-1940)
Liderança: grupos diversos, principal grupo liderado por Lampião
Contexto: pobreza rural, secas
Características: movimentos dispersos, banditismo social
Finalização: derrota de cangaceiros locais, fim do cangaço após a
derrota de Lampião, em 1938

127
II MOVIMENTOS
SOCIAIS URBANOS

Revolta da Vacina
(Rio de Janeiro: 1904)
Contexto: pobreza urbana, proliferação de doenças,
repressão social, vacinação obrigatória
Reivindicação: fim da vacinação obrigatória
Finalização: estado de sítio e fim da vacinação obrigatória

Revolta da Chibata
(Rio de Janeiro: 1910)
Liderança: João Cândido, o almirante negro
Contexto: punições físicas na Marinha, racismo estrutural
Características: conflitos racial e social, baixa patente militar
Reivindicação: fim dos castigos corporais, aumento do soldo,
melhor alimentação
Finalização: derrotada pelas tropas federais

Greve Geral de 1917


(São Paulo)
Liderança: sindicatos e militantes anarquistas
Contexto: crescimento industrial, formação do
proletariado, trabalhadores estrangeiros, ausência de
direitos, alto custo de vida, influência anarquista
Características: movimento de trabalhadores,
sindicalismo, anarquismo
Reivindicações: aumento salarial, liberdade aos grevistas,
reconhecimento dos sindicatos, jornada de 8 h de trabalho
Finalização: aumento salarial e liberdade aos grevistas

128
31 32
Crise da República oligárquica
e Revolução de 1930

Competências Habilidades
1, 2, 3 e 5 2, 3, 5, 9,10, 11,
13, 15, 22 e 25

C H
HISTÓRIA
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-
H8
-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferen-
tes grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favo-
recendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.
Introdução
A historiografia tradicional considera a Revolução de 1930 um divisor de águas na história do Brasil. Trata-se,
pois, de entender o processo político que resultou no que se convencionou chamar de “Revolução de 1930”. Qual a
importância da atuação dos movimentos sociais naquele momento da história do Brasil? De que maneira eles contri-
buíram para mudanças ou rupturas no processo de disputa pelo poder? Reconhecer a dinâmica da organização desses
movimentos é, portanto, reconhecer sua importância na transformação da realidade histórica.
Em relação ao poder político, como as autoridades se comportavam e quais suas ações para o enfrentamento de
problemas sociais e econômicos naquele período? A resposta para essas perguntas exige uma breve contextualização.
Desde o final do século XIX, o Brasil vivia um processo de transformações econômicas, sociais, políticas e cultu-
rais, que se acentuaram na década de 1910 e propiciaram a organização de grupos sociais questionadores e de opo-
sição ao poder das oligarquias tradicionais (grupos sociais dominantes). Em face disso, estes também se enfraqueciam
à medida que não conseguiam atender aos interesses das frações e facções da classe dominante que os sustentavam
no poder, da ascendente classe média e de um movimento operário crescente.
O fortalecimento da burguesia urbana, o movimento tenentista e a mobilização do operariado urbano mina-
ram de tal forma o poder das elites agrárias, que o desfecho desse processo foi a chamada Revolução de 1930.
Historiadores e sociólogos questionam se revolução é o termo correto a ser empregado para o movimento
que se deu em 1930. De fato, o que houve foi um golpe de Estado comandado por grupos da classe dominante que
se encontravam desalojados do poder político. Uma vez no controle do Estado e do governo do Brasil, construíram a
memória da tomada do poder como um ato revolucionário, nomearam seus agentes e apagaram dessa memória as
propostas verdadeiramente revolucionárias.
Esse foi um longo processo tecido no exercício do poder político que se transfigurou na história da “Revolução
de 1930” e continua sendo reiterado nas inúmeras revisões historiográficas, que não são capazes de fazer valer a leitura
daquele período como de contribuição e voz de outras propostas políticas que existiam, mas foram sufocadas e posterior-
mente apagadas do discurso oficial, da memória histórica e da história. As práticas econômicas e políticas continuaram
as mesmas e o que era novo, a classe operária, foi aos poucos sendo reconhecida e os objetos das suas lutas, como os
direitos trabalhistas incorporados à legislação como uma “dádiva” do governo, aparecendo como uma nova fase da
trajetória histórica brasileira a partir da década de 1930, especialmente com a ascensão de Vargas ao poder.

Governo Epitácio Pessoa (1919–1922)


Ao assumir a presidência da República, Epitácio Pessoa contraiu um empréstimo, junto aos EUA, para
promover a remodelação do centro do Rio de Janeiro e, posteriormente, recorreu a novo empréstimo destinado à
construção de ferrovias, açudes e barragens no Nordeste como forma de
combater a seca na região.
O decreto de banimento da Família Imperial, assinado no Governo
Provisório do Marechal Deodoro da Fonseca, foi revogado em 1920 e os
restos mortais do imperador D. Pedro II e da imperatriz Tereza Cristina
foram transferidos para Petrópolis. No mesmo ano, foi criada a primeira
universidade brasileira, atual Universidade Federal do Rio de janeiro, UFRJ.
Para comemorar o centenário da independência, em 1922 realizou-
-se a Exposição Internacional do Rio de Janeiro, que, além de contar com
a participação de vários países, procurou apresentar as principais riquezas
do Brasil e estimular a relação de vários negócios com o objetivo de atrair
investimentos estrangeiros.
Epitácio Pessoa
131
A década de 1920 foi marcada pelo processo de Ocorreu entre os dias 11 e 18 de fevereiro de
declínio do domínio oligárquico, tal como fora organizado 1922, no Teatro Municipal de São Paulo, a Semana de
e herdado do Império, que passou a ser contestado pela Arte Moderna. Foi o ponto culminante do movimento
burguesia industrial em desenvolvimento, uma fração da modernista em franco desenvolvimento, particular-
mente em São Paulo. Figuraram entre seus promotores
própria classe dominante, mas com novos interesses e
e participantes, os pintores Anita Malfatti, Tarsila do
com ambições e necessidades que as facções e frações
Amaral e Di Cavalcante; os escritores Mario de Andra-
da antiga classe dominante não conseguiam atender. O
de, Menotti Del Pichia, Graça Aranha, Manuel Bandeira
operariado e as camadas médias urbanas apresentavam e Oswald de Andrade; o músico Heitor Villa-Lobos; e o
suas reivindicações e organizavam-se politicamente. O escultor Victor Brecheret.
movimento tenentista e a Semana de Arte Moderna são O movimento modernista foi a resposta dos artis-
exemplos das inquietações daquele período. tas brasileiros às mudanças de pensamento e nas artes,
O desenvolvimento industrial brasileiro durante desde o fim da Primeira Guerra Mundial, marcadas pelo
e após a Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918) pro- surgimento dos movimentos de vanguarda – futurismo,
piciou o crescimento econômico da burguesia industrial expressionismo, cubismo e dadaísmo; o cinema passou
e da classe operária e um processo de urbanização que a ser feito para as massas; cresceu a popularidade do
viabilizou o crescimento das camadas médias urbanas. rádio, das máquinas e dos automóveis, cada vez mais
Esses segmentos sociais contestavam o domínio oligár- presentes no cotidiano das pessoas.
quico de várias maneiras. Os artistas brasileiros viam o movimento modernista

§§ A burguesia industrial, contrária às constantes como uma forma de representar, na cultura e nas artes, todas
as transformações observadas na realidade, bem como criar
políticas de valorização do café, exigia mais par-
padrões culturais genuinamente nacionais, rompendo par-
ticipação política.
cialmente com os padrões europeus. O movimento também
§§ O movimento operário exigia leis trabalhistas e
foi porta voz de crítica à sociedade burguesa e um protesto
contestava as medidas de valorização do café, que
contra a situação política do País.
promoviam o aumento de impostos e a inflação de-
Os intelectuais e artistas modernistas valorizavam
senfreada, causadora da corrosão dos salários.
temas e aspectos nacionais, redimensionando o naciona-
§§ As camadas urbanas se revoltavam com as fraudes
lismo brasileiro relacionado ao cotidiano, na tentativa de
eleitorais, contra a inflação e contra os altos impos-
promoverem a aproximação das artes de um público maior.
tos, reflexos das políticas de valorização do café.
Sinal evidente disso foi a linguagem coloquial utilizada por
escritores e poetas, sem “macaquear a sintaxe lusíada”,
Semana de Arte Moderna (1922) conforme afirmou Manuel Bandeira; na literatura, os índios
foram valorizados de modo mais realista e menos romântico;
em Macunaíma, Mario de Andrade construiu seu “herói sem
caráter”, baseado em mitos de várias regiões do país.
O movimento sofreu duras críticas da imprensa,
como a publicada pelo conservador jornal A Gazeta, no dia
22 de fevereiro de 1922: “Este movimento, pois, é uma ma-
nifestação da mais desabusada improbidade artística de que
há memória, um verdadeiro estelionato, praticado por sujei-
tos que, simples aprendizes desastrados, reles imitadores ou
plagiadores, pretendem intrujar o público dizendo-se gênios
Capa do catálogo da exposição da Semana de 22. Di Cavalcanti. autênticos, originais, livres e pessoais. Como se tem visto, a

132
senhorita Malfatti desconhece por completo harmonia, cor e
perspectiva, consequências lógicas do desenho, cujos enig-
mas só agora está tentando decifrar”.

A fundação do Partido
Comunista do Brasil (PCB)
A partir de 1922, uma nova corrente estabele-
ceu-se no movimento operário com a criação do Partido
Comunista do Brasil.
No início da década de 1920, o país contava
com aproximadamente 14 mil fábricas e 300 mil ope-
rários concentrados especialmente no Rio de Janeiro e
em São Paulo. Desde o século XIX, a classe operária,
em meio a grandes dificuldades, formava sociedades
de ajuda mútua, sindicatos e partidos. Foram realizados
congressos com representantes operários de diversos
estados nos anos de 1906, 1913, 1915 e 1920. Em
1908, foi fundada a Confederação Operária Brasileira,
que reunia organizações de todo o país. Mesmo com a
fundação de várias ligas e pequenos partidos socialistas
em algumas cidades, as ideias anarquistas trazidas pe-
los imigrantes europeus predominavam. Anarquistas e
Mário de Andrade (primeiro, à esquerda, no alto), Rubens Borba de anarcossindicalistas tiveram seu grande momento com
Moraes (segundo sentado, da esquerda para a direita) e outros moder-
nistas não identificados: Tácito, Baby, Mário de Almeida e Guilherme de
as greves e agitações de 1917 e dos anos seguintes,
Almeida e Yan de Almeida Prado. mas suas lideranças começaram a declinar na década
de vinte, em razão da rejeição anarquista às organiza-
ções centralizadas – com o crescimento da classe ope-
rária, elas se tornavam praticamente obrigatórias para a
atividade sindical e política.

Em 1928, Tarsila do Amaral trouxe a público o Abaporu, que passou a ser repre- Astrogildo Pereira, um dos fundadores do PCB.
sentativa do Manifesto Antropofágico que propunha a “deglutição” da cultura
europeia remodelada e enraizada à terra brasileira, sintetizada na conhecida
frase “Tupi or nor tupi, that’s the question”.

133
Num primeiro momento, acreditava-se que a Re- guiriam eliminar os vícios das instituições republicanas,
volução Russa de 1917 fosse anarquista. À medida que pregavam a intervenção do Exército para salvar o país,
chegavam notícias mais precisas, o movimento operário afirmando que as reformas do Estado e da sociedade
passou a debater a necessidade de organizar ou não um somente se tornariam possíveis através de um extremo
partido semelhante ao soviético. Dessas discussões, sur- autoritarismo governamental” (MEIRA, Antônio Carlos.
giu o Partido Comunista do Brasil. Depois de inúmeras Brasil recuperando a nossa história. São Paulo: FTD,
reuniões preparatórias, realizou-se o congresso de sua 1998. p 183).
fundação, em julho de 1922. Representando 73 filiados, O movimento tenentista era nacionalista e ca-
reuniram-se nove delegados sob as lideranças de Astro- racterizava-se pela falta de uma ideologia definida, uma
gildo Pereira, Leônidas de Resende e Cristiano Cordeiro. vez que constituído de várias correntes ideológicas. Os
Durante três dias foram discutidos e aprovados os prin- principais levantes tenentistas foram a Revolta do Forte
cípios do Comintern1 e foi eleito um comitê central.
de Copacabana – 18 do Forte, 5 jul. 1922 –, a Revol-
ta Paulista – 5 ago. 1924 – e a Coluna Prestes (1924
Tenentismo – 1927).

O movimento tenentista nasceu na baixa oficiali- A Reação Republicana e o


dade do Exército, congregando especialmente tenentes episódio das cartas falsas
recém-saídos da Escola Militar do Realengo, no Rio de
Janeiro, e capitães recém-promovidos ao posto, insatis- O processo de sucessão do presidente Epitácio
feitos com a realidade política, econômica e social do Pessoa foi bastante conturbado e serviu de prenúncio
país, com a situação dos militares e a demora das pro- das dificuldades enfrentadas por seu sucessor, Artur
moções no Exército. Bernardes, eleito como candidato da situação e apoiado
A renovação iniciada no Exército tendeu a agra-
pelo Presidente e pela coligação PRP/PRM.
var as divisões entre “velhos” e “novos” oficiais. Os
A indicação do mineiro filiado ao PRM, Artur
“velhos”, geralmente de patente superior, apresenta-
Bernardes, não agradou as oligarquias do Rio Grande
vam-se acomodados ao sistema oligárquico e ao pa-
do Sul, Bahia, Rio de Janeiro e Pernambuco, que se alia-
pel pouco importante nele desempenhado pelas Forças
ram e lançaram a candidatura de Nilo Peçanha (Reação
Armadas. Os “novos” culpavam a organização política
pela situação de atraso do país e reivindicavam, para a Republicana), representando a oposição ao candidato
corporação militar, um papel de relevo na condução dos “café com leite”.
negócios públicos. Com o intuito de tumultuar o processo eleitoral
O tenentismo contestava os vícios políticos, a e conquistar o apoio do exército ao candidato Nilo Pe-
corrupção, as fraudes eleitorais, o voto de cabresto e o çanha, o jornal carioca Correio da Manhã publicou car-
domínio oligárquico que marcavam a República Velha. O tas atribuídas a Artur Bernardes, nas quais ele tecia uma
movimento apresentava-se com uma missão salvadora, série de ofensas aos militares e ao presidente do Clube
defendendo o voto secreto, a reforma do ensino – que Militar e ex-presidente da República, o Marechal Hermes
deveria tornar-se gratuito – e o fim da socialização das da Fonseca.
perdas, reivindicações que coincidiam com os interesses Artur Bernardes negou a autoria das cartas, que
das camadas médias urbanas. Defendiam, também, a foram submetidas a criteriosas análises e declaradas fal-
autonomia do Poder Judiciário e a defesa dos recursos sas. Mesmo assim, os militares exigiram que Bernardes
naturais do país. renunciasse à sua candidatura. Não atendidos, assumi-
“Os tenentes advogavam a necessidade de ram a oposição, declarando que não aceitariam a posse
uma centralização política e administrativa, com uma de Artur Bernardes na Presidência da República.
total subordinação dos estados ao governo central e, Mas as eleições foram vencidas por ele. Ao final,
como não acreditassem que as eleições diretas conse- as frustrações longamente acumuladas eclodiram em
1922 com a Revolta do Forte de Copacabana.
1. É o termo com que se designa a Terceira Internacional Comunista
(1919-1943), isto é, organização internacional fundada por Lenin e
pelo Partido Comunista Soviético para reunir os partidos comunistas
de diferentes países.

134
Revolta do Forte de Copacabana (1922)
Em meio às agitações no cenário político nacional, no contexto das eleições para a escolha do sucessor de
Epitácio Pessoa, ocorreu um levante militar em Pernambuco realizado por militares que se opunham às oligarquias
locais. O presidente do Clube Militar, Marechal Hermes da Fonseca, foi preso por seis meses pelo seu apoio e clube
militar fechado por vinte e quatro horas.

Da esquerda para direita, Tenentes Eduardo Gomes, Siqueira Campos, Newton Prado e o civil Otávio Correia.

Em reação aos fatos, em 5 de julho de 1922, ocorreu o primeiro levante tenentista no Forte de Copacabana,
sob comando de Euclides da Fonseca, filho do Marechal Hermes da Fonseca, imediatamente apoiado por outras
guarnições militares do Rio de Janeiro e do Mato Grosso.
A reação governamental foi imediata e o levante foi rapidamente controlado nos outros quartéis, à exceção
do Forte de Copacabana, onde estavam as principais lideranças do movimento, o tenente Siqueira Campos e o
capitão Euclides da Fonseca. Ao permitirem livre adesão, restavam apenas 29 rebeldes.
Contudo, sem poder de barganha, Euclides da Fonseca foi preso. Alguns de seus companheiros decidiram
deixar o Forte de Copacabana e enfrentar as forças governamentais. Eram 17 homens liderados pelo tenente Si-
queira Campos, que marcharam pela Avenida Atlântica, onde receberam a adesão do civil Otávio Corrêa.
Os 18 do forte de Copacabana marcharam para se encontrar com as tropas federais designadas para conter
o movimento. Houve troca de tiros e os rebeldes foram mortos. Sobreviveram apenas os tenentes Siqueira Campos
e Eduardo Gomes.

Governo Artur Bernardes


(1922–1926)
O governo do mineiro Artur Bernardes foi um
dos mais tumultuados da história republicana brasileira.
Durante o período, o país esteve constantemente em
estado de sítio, devido à instabilidade política e cons-
tantes ameaças de golpe, além de levantes militares
em São Paulo e no Rio Grande do Sul e a oposição do
Exército, desde o processo eleitoral.

Arthur Bernardes

135
Revolução de 1923 (Rio do café. O custo de vida subia cada vez mais à custa da
impopularidade do governo cada vez mais repressivo.
Grande do Sul) O estado de sítio durou quase todo o quadriênio e aos
opositores do governo foi negada qualquer forma de
No Rio Grande do Sul, ocorreu a Revolução Li-
trégua ou anistia.
bertadora de 1923, liderada por Assis Brasil – funda-
Nos quartéis, as conspirações continuaram e re-
dor da Aliança Libertadora –, em oposição ao oligarca
sultaram em um novo levante armado. Em São Paulo,
Borges de Medeiros, velho patriarca do Partido Republi-
em 5 de julho de 1924, várias guarnições rebelaram-
cano Gaúcho. Ele controlou o poder político no estado e
-se sob o comando dos generais Isidoro Dias Lopes e
se beneficiou da Constituição gaúcha, que permitia re-
Miguel Costa e dos tenentes Joaquim e Juarez Távora e
eleições ilimitadas para a presidência do estado. Depois
Eduardo Gomes. Os rebeldes forçaram a fuga do gover-
de intensos combates foi firmado o Pacto de Pedras Al-
nador Carlos de Campos e ocuparam a cidade durante
tas, que confirmou Borges de Medeiros na presidência
22 dias, exigindo a derrubada de Bernardes, uma Cons-
do estado sem direito a nova reeleição, que foi retirada
tituinte e mudanças políticas, como o voto secreto.
da constituição do estado.
Porém, não conseguindo suportar as pressões
das tropas legalistas, munidas de aviões de combate,
foram obrigados a fugir para o Sul, onde se encontraram
com revoltosos do Rio Grande do Sul.

Coluna Prestes (1924–1927)


A Coluna Prestes formou-se no interior do Pa-
raná, resultado da fusão entre as fugitivas tropas dos
revoltosos paulistas, liderados pelo general Isidoro Dias
Lopes, e dos gaúchos, comandados pelo capitão Luís
Carlos Prestes.

Borges de Medeiros

Revolução de 1924 (São Paulo)

Luís Carlos Prestes é o terceiro, sentado, da esquerda para a direita.

O comando da coluna foi assumido pelo major


Miguel Costa. A divisão paulista, pelo tenente Juarez
Casa destruída na Rua 21 de Abril, no Belenzinho, São Paulo, um dos
bairros mais bombardeados durante a Revolução de 1924 Távora e a gaúcha, pelo capitão Luís Carlos Prestes,
(Fundação Instituto de Energia e Saneamento).
aclamado chefe do estado-maior da coluna que rece-
beu seu nome.
O governo de Artur Bernardes começou em meio
Percorrendo o interior do país e combatendo as
a uma crise econômica internacional e sob exigências
forças governamentais e oligárquicas, a Coluna deslo-
dos cafeicultores por uma nova valorização dos preços

136
cou-se aproximadamente 25 mil quilômetros pelo território de nove estados, ao longo de pouco mais de dois anos.
Além de combater as tropas designadas para destruí-las, a Coluna Prestes tentava conscientizar a população rural
dos vícios e males do domínio oligárquico e derrubar o presidente Artur Bernardes.
Marcha da Coluna Prestes

Batalhas mais importantes


Coluna Prestes (ida)
Coluna Prestes (volta)
Périplo de Siqueira Campos
Marcha da Coluna Paulista

Apesar de não perder nenhuma batalha e de lhe render o mito de invencibilidade, a Coluna sofreu várias
perdas e ganhou outras tantas adesões por onde passava, o que variou muito o número de seus combatentes. Ao
tentar levantar o povo contra seus governantes, muitas vezes, os membros da Coluna foram mal recebidos por onde
passavam, graças à manipulação da opinião pública exercida por coronéis, autoridades e políticos locais.
Em fevereiro de 1927, já no Governo de Washington Luís, a Coluna Prestes retirou-se para a Bolívia, onde se
dissolveu. Restavam dela aproximadamente 600 homens esfarrapados, famintos e atingidos pela cólera.

Governo Washington Luís (1926–1930)


Carioca de nascimento, com carreira política construída no estado de
São Paulo, Washington Luís assumiu a presidência em novembro de 1926,
levado pelo lema “Governar é abrir estradas”. Procurou concentrar poderes
políticos em suas mãos e promover a pacificação interna. Para isso, logo
suspendeu o estado de sítio quando assumiu.
Em contrapartida, adotou uma série de medidas repressivas. Famoso
pela frase, “A questão social é um caso de polícia”, a ele atribuída, mas nun-
ca provada como sua, seu governo aprovou a Lei Celerada, que estabelecia
repressão às atividades políticas e sindicais operárias, particularmente às liga-
das aos comunistas, por considerá-las nocivas à ordem social e econômica.
O presidente Washington Luís desejava realizar uma reforma mone-
tária no Brasil baseada na adoção do padrão-ouro, com a substituição do
inflacionado mil-réis, por uma nova moeda, o cruzeiro, mas sua iniciativa
foi frustrada em razão da crise de 1929. A quebra da Bolsa de Valores de
Nova Iorque mergulhou o mundo capitalista numa grave crise econômica. O
Brasil foi diretamente atingido e as exportações de café foram terrivelmente
afetadas, uma vez que os EUA eram o maior consumidor do produto. Washington Luís

137
A sucessão presidencial dentre eles os civis Antônio Carlos de Andrada, Oswaldo
Aranha e Lindolfo Collor, e os militares, tenentes Siqueira
Profundamente marcado pela crise mundial ca- Campos, Miguel Costa e Juarez Távora. Exilado na Argen-
pitalista, o ano de 1929 também foi agitado no Brasil tina, Luís Carlos Prestes foi convidado para participar da
pelo início do processo eleitoral para a escolha do novo conspiração, mas não aceitou. Já adepto do comunismo,
presidente da República. Segundo o acordo da política defendia a insurreição popular das camadas trabalhadoras.
do “Café com leite”, o presidente Washington Luís, que No dia 26 de julho de 1930, João Pessoa foi as-
pertencia ao PRP, deveria indicar um candidato do PRM, sassinado por João Dantas, em Recife, por questões de
o presidente de Minas Gerais, Antônio Carlos de Andrada. ordem pessoal. O crime somou-se às acusações de fraude
Inesperadamente, no entanto, Washington Luis nas eleições presidenciais, à “degola” arbitrária de deputa-
rompeu com o acordo e indicou para sua sucessão o dos mineiros e de toda a bancada paraibana que apoiara a
presidente de São Paulo, do PRP, Júlio Prestes. Revolta- Aliança Liberal, ao descontentamento popular com a crise
do, Antônio Carlos de Andrada procurou apoio político econômica causada pela Grande Depressão de 1929, e ser-
em outros estados e aliou-se às oligarquias da Paraíba
viram como justificativa para a mobilização armada contra o
e do Rio Grande do Sul. Insatisfeitos com o alijamento
governo federal.
do poder, formaram a Aliança Liberal, que apresentou
O movimento teve início no Rio Grande do Sul,
como candidatos Getúlio Vargas e João Pessoa.
no dia 3 de outubro de 1930, sob a chefia de Getúlio
Em seu programa político, a Aliança Liberal pro-
Vargas e Oswaldo Aranha. Juarez Távora mobilizou o
punha a adoção do voto secreto e do voto feminino,
anistia política e reforma agrária. Contava com o apoio apoio ao movimento no Nordeste e Antônio Carlos de
de membros do movimento tenentista, de oligarquias Andrada liderou-o em Minas Gerais. O comando geral
dissidentes e de camadas médias urbanas. do movimento revoltoso foi assumido pelo general Góes
Monteiro. Vários presidentes estaduais foram depostos.
No dia 24 de outubro, o presidente Washington Luís foi
deposto por militares do Exército e da Marinha, pouco
menos de um mês antes de terminar seu mandato.
O poder federal foi assumido por uma junta militar
composta pelo almirante Isaías Noronha e pelos generais
Mena Barreto e Tasso Fragoso. Um mês depois do golpe,
a chefia do governo foi entregue a Getúlio Vargas, que
tomou posse como chefe do Governo Provisório. Estava
  consumada a chamada Revolução de 1930, que coroava
Cartazes da campanha eleitoral de 1930 a derrota das forças representadas pelos PRP e PRM e a
política do “café com leite”. Tinha início a Era Vargas, que
As eleições ocorreram no dia 1o de março de se estendeu até 1945, representando outras frações e fac-
1930 em meio a um clima bastante tenso, em que os ções políticas da classe dominante e inaugurando um novo
dois lados denunciavam fraudes de seus opositores. diálogo com o operariado e com as classes médias.
Após a contagem dos votos, o candidato Julio Prestes,
do PRP, foi declarado vencedor e deveria assumir a pre-
sidência da República, em novembro daquele ano.

Revolução de 1930
Dentre alguns políticos de oposição, Getúlio Vagas
e João Pessoa aceitaram a derrota eleitoral da Aliança Li-
beral. Mas a maioria dos opositores, inconformados com o
Getúlio Vargas e sua comitiva em Itararé, SP.
resultado eleitoral, passaram a planejar uma conspiração,

138
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 10: Delfim Moreira

Fonte: Youtube

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 11: Epitácio Pessoa

Fonte: Youtube

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 12: Artur Bernardes

Fonte: Youtube

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 13: Washington Luís

Fonte: Youtube

140
ASSISTIR

Vídeo Conhecendo os Presidentes - Ep. 14: Júlio Prestes

Fonte: Youtube

Filme Eternamente Pagú

Fins dos anos vinte, Pagú ainda não tem vinte anos e já encanta os meios
intelectuais avançados de São Paulo, da mesma forma que escandaliza
os conservadores. É apresentada aos membros da ala radical do mo-
vimento modernista, liderada por Oswald de Andrade, brilhando entre
estrelas não menos cintilantes, como a pintora Tarsila do Amaral. Pagú e
Oswald se aman. Têm um filho, militam no Partido Comunista, fundam
um jornal. Pagú vai à Argentina, onde encontra Luiz Carlos Prestes. Par-
ticipa de uma greve em Santos e é presa pela primeira vez. Em seguida,
parte numa viagem pelo mundo, deixando Oswald e o garoto e sempre
convivendo com artistas e militantes de esquerda.

Filme Um Só Coração ( minissérie)

A história se passa entre as décadas de 1920 e 1950, na grande São


Paulo. Percorrendo momentos históricos, como a Semana de Arte Mo-
derna, a Revolução de 1924, a crise econômica de 1929 e a Era Vargas,
há a história de Yolanda Penteado (Ana Paula Arósio), uma jovem de
família tradicional da alta sociedade paulista, que desperta admirações
por onde passar. Ela nunca tinha se envolvido facilmente com nenhum
outro admirador, até que conhece Martim (Erik Marmo), um jovem estu-
dante de medicina que chama sua atenção. Contudo, ele era defensor do
movimento anarquista, causando a desaprovação da mãe de Yolanda,
Guiomar (Cássia Kiss). Contudo, os dois irão lutar para conseguir ficar
juntos, mesmo com a desaprovação da família.

141
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Filme O País dos Tenentes

Um general da reserva, no dia em que é homenageado por uma multi-


nacional, entra em uma crise pessoal e começa a rememorar suas par-
ticipações nas revoluções de inspiração tenentista. Uma trajetória que
coincide com os 60 anos de vida política brasileira. Isolado em sua casa
de campo, já cercada pelo avanço da zona periférica, vive com suas
lembranças, momentos dramáticos decorrentes da violência e da crise
social atual. Aparecem as traições, os ideais frustrados e as divergências
políticas entre os tenentes.

Filme A Chacina dos Coronéis - O Tronco


O coletor de impostos Vicente Lemos (Ângelo Antônio) é enviado
para um pequeno município da região norte de Goiás (Dianopolis/To)
- atual estado do Tocantins. Lá, entra em conflito com o coronel Pedro
Melo (Rolando Boldrin), seu próprio tio, por discordar dos métodos que
este utiliza para manter o domínio absoluto das terras da região. O fi-
lho de Pedro, Artur (Henrique Rovira), é ex-deputado e ex-aliado dos
coronéis sulistas. A discordância acaba fazendo com que os Melo e seus
aliados coloquem fogo na coletoria de Vicente, o que faz com que este
denuncie a família para a sede do governo.

LER
tt
Livros
Tenentes – Guerra Civil Brasileira – Pedro Doria

A história da crise política que desencadeou uma guerra civil no


Brasil. É com maestria de estilo, unindo o rigor da investigação histórica
minuciosa à experiência de repórter tarimbado, que Pedro Doria recria
o cenário que deflagrou o movimento tenentista na década de 1920 e
retrata personagens, apresentando por meio de sua caracterização o es-
pírito de outro tempo. Narrado em forma de thriller, Tenentes apresenta
a história da crise política que desencadeou uma guerra civil sem prece-
dentes no país, em um tempo nem tão distante em que essas crises se
resolviam de outro jeito.

142
LER

Livros
São Paulo deve ser destruída – Moacir Assunção

Este livro trata do bombardeio impiedoso da segunda maior cidade do país


para conter o levante da antiga Força Pública de São Paulo. Os desdobra-
mentos dessa revolta, iniciada em 5 de julho de 1924, foram dramáticos
para a população civil. O governo do presidente Arthur Bernardes cercou a
capital paulista com um anel de ferro e fogo. A artilharia pesada do Exército
atirava de hora em hora contra fábricas e bairros proletários, na tentativa de
jogar o povo e os operários contra as tropas amotinadas. Centenas de edifi-
cações foram destruídas ou gravemente danificadas pelos canhões enviados
de trem, do Rio de Janeiro.

Trabalho Urbano e Conflito Social - 1890-1920 – Boris Fausto

“Trabalho urbano e conflito social”, do historiador Boris Fausto, foi publi-


cado pela primeira vez em 1976. O livro trata da história da formação da
classe trabalhadora e do movimento operário no Rio de Janeiro e em São
Paulo, entre 1890 e 1920. O surgimento de uma classe trabalhadora urbana
e industrial no Brasil é acompanhado de perto pela reconstituição de suas
formas de organização e mobilização política.

A Revolução de 1930 - Historiografia e História – Boris Fausto

Um episódio histórico de profundas consequências na configuração do Brasil


contemporâneo, destrinchado pelo maior especialista no período. Um clás-
sico da historiografia brasileira em nova edição, revista e com novo prefácio
do autor.

O Avesso da Lenda – Coluna Prestes

A Autora refaz, 70 anos depois, os 25 mil quilômetros da Coluna Prestes. Faz


uma viagem no tempo para recosturar a colcha de lembranças dos verda-
deiros derrotados e arranca da penumbra a face escura da Coluna Prestes.

143
INTERATIVI
A DADE

LER
tt
Livros
22 por 22 a semana da Arte Moderna – Maria Eugenia Boa Ventura
22 por 22 é uma coletânea de artigos na versão original, traz à tona
a polêmica artística travada em 1922, em torno da implantação do moder-
nismo no Brasil. Divulgados na imprensa durante aquele ano, sobretudo em
São Paulo, eles apresentam um debate acirrado, intensificado pela realização
da Semana de Arte Moderna e prolongado pelo ‘ano do Centenário’, com
a publicação de Paulicéia Desvairada, de Mário de Andrade, O Homem e a
Morte, de Menotte del Picchia, e da revista Klaxon.

Octavio, O civil dos 18 do forte de Copacabana – Afonso Licks

Octavio, O Civil dos 18 do Forte de Copacabana conta uma história surpre-


endente da primeira revolta do Tenentismo. Um episódio da História do Brasil
que nunca foi contado é agora elucidado no livro Octavio, O Civil dos 18
do Forte de Copacabana. Octavio Corrêa, ginete brasileiro muito rico e que
fazia sucesso em Paris, estava à frente dos rebeldes militares da Revolta do
Forte de Copacabana. Trajando chapéu, terno e gravata levava o fuzil na mão
quando apenas 18 heróis enfrentaram oito mil militares, em 1922. O mais
longo estado de sítio que o país sofreu, com perseguições, censura e prisões
de jornalistas promovidas pela República Velha, impedia que se falasse sobre
ele. Depois, com a Revolução de 30, o marketing da nova ordem idealizava
o único civil dos 18 do Forte, mas nem o nome de Octavio era escrito corre-
tamente. O personagem real e suas aventuras desapareceram nas sombras
da História.

As Noites das Grandes Fogueiras – Domingos Meirelles

Com base em testemunhos, relatórios oficiais e copiosa documentação


americana, ‘As Noites das Grandes Fogueiras’ reconstitui o cenário político,
econômico e social em que se desenrolaram as contestações militares que
formaram o ciclo do tenentismo. O livro disseca as raízes da rebelião de 5
de julho de 1924, quando um grupo de jovens tenentes do Exército que
participara do frustrado levante do Forte de Copacabana, em 1922, toma de
assalto os quartéis da Força Pública de São Paulo. Imigrantes europeus que
vivem na cidade aderem ao levante e formam batalhões para lutar contra o
Governo. Durante 22 dias os revoltosos resistem ao maior bombardeio da
história de São Paulo.

144
ACESSAR

Sites Resumo de documentos da História do Brasil

www.historiadobrasil.net/
mundoestranho.abril.com.br/
semana-arte-moderna.info/

OUVIR
Músicas

- A Moda da Revolução – Cornélio Pires & Arlindo Santana


- Já Quebrou – Frederico Rocha
- Seu Julinho Vem – Francisco Alves
- Comendo Bola – Jaime Redondo
- Rebentô a Revolução – Mandi
- O Barbado foi-se – Almirante

145
INTERDISCIPLINARIDADE

A Semana de Arte Moderna, ocorrida em fevereiro de 1922, trouxe um novo paradigma para a literatura
e as artes brasileiras. O Modernismo rompeu com as artes puras europeias, as quais simplesmente eram copiadas
pelos artistas brasileiros antes de 1922. A partir desse momento, estabeleceu-se o que Oswald de Andrade (um dos
idealizadores da Semana) chamou de “antropofagia cultural”, ou seja, o Brasil precisava “devorar” as influências
externas, mas criar nessa “digestão” uma arte com elementos de valorização do nacional, exaltando cenários e
realidades brasileiras. A Semana de Arte Moderna, apesar de ter ocorrido em 1922, teve seus efeitos e agitos man-
tidos por toda a conturbada década de 1920 no Brasil.

Cartazes da Semana de Arte Moderna de 1922

146
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES

Habilidade 15 - Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou am-


bientais ao longo da história.

A Habilidade 15 contempla diversos objetos de conflitos históricos. No caso da História,


destacam-se os sociais, políticos e econômicos. O candidato deve ter uma compreensão
histórica para além da memorização de datas e eventos. A prova exige a capacidade de
analisar diferentes propostas, ideologias e concepções políticas de movimentos sociais,
partidos políticos ou líderes em geral.
Principalmente em momentos de transição histórica, a Habilidade 18 é exigida, pois neles
há maior relevância quanto à posição política e ideológica dos agentes políticos. No caso
da questão a seguir, vemos um discurso de Vargas logo quando de sua posse como chefe
do governo provisório, em 1930, fato que pôs fim à chamada República oligárquica
(1894-1930).

Modelo
(Enem) O trabalho de recomposição que nos espera não admite medidas contemporizadoras. Im-
plica o reajustamento social e econômico de todos os rumos até aqui seguidos. Comecemos por
desmontar a máquina do favoritismo parasitário, com toda sua descendência espúria.
(Discurso de posse de Getúlio Vargas como chefe do governo provisório, pronunciado em 3 de no-
vembro de 1930.)
FILHO, I.A. Brasil, 500 anos em documento. Rio de Janeiro: Mauad, 1999 (adaptado).

Em seu discurso de posse, como forma de legitimar o regime político implantado em 1930, Getúlio
Vargas estabelece uma crítica ao:
a) funcionamento regular dos partidos políticos.
b) controle político exercido pelas oligarquias estaduais.
c) centralismo presente na constituição então em vigor.
d) mecanismo jurídico que impedia as fraudes eleitorais.
e) imobilismo popular nos processos político-eleitorais.

148
Análise Expositiva

Habilidade 15
Na fala “desmontar a máquina do favoritismo parasitário, com toda a sua descendência espú-
ria”, Getúlio faz uma crítica direta à política dos governadores e ao coronelismo, que, através
da manipulação eleitoral, favorecia as oligarquias estaduais a ficarem no poder.
Alternativa B

Estrutura Conceitual

CRISE DA REPÚBLICA OLIGÁRQUICA


E REVOLUÇÃO DE 1930

Mudanças sociais Burguesia industrial


A CONTEXTO Novas classes sociais Trabalhadores
Enfraquecimento do poder oligárquico Classe média urbana

Empréstimos estrangeiros
Semana de Arte
B Oposição às oligarquias C Moderna (1922)
Florescimento cultural
◊ Movimento modernista
GOVERNO ◊ Influência das vanguardas europeias
EPITÁCIO PESSOA ◊ Estimula a cultura nacional
1919-1922 ◊ Antropofagia (cultura nacional e internacional)

Fundação do Os 18 do Forte de
D PCB (1922)
E Tenentismo F Copacabana (1922)
◊ Reorganização dos trabalhadores ◊ Baixa patente do Exército
◊ Influência dos bolcheviques ◊ Insatisfação com a realidade do país ◊ Reação tenentista às eleições
◊ Orientação da III Internacional ◊ Crítica às fraudes eleitorais
◊ Crítica às oligarquias
◊ Nacionalismo
◊ Defesa de intervenção militar

149
Instabilidade política
H Estado de sítio
GOVERNO
ARTUR BERNARDES
1922-1926

Revolução de Revolução de Coluna Prestes


1923 (RS) 1924 (SP) (1923-1927)
◊ Defesa de novas eleições ◊ Coluna cruza o Brasil ◊ Invencibilidade
◊ Oposição às oligarquias locais
◊ Defesa de nova constituição ◊ Conscientização Social ◊ Desintegração
◊ Derrotada
◊ Derrotada ◊ Embates armados

Repressão a movimentos sindicais


I Crise de 1929
Quebra de acordo com MG
GOVERNO
WASHINGTON LUÍS
1926-1930

SP - Júlio Prestes Aliança Liberal (MG, RS, PB)


ELEIÇÕES
J DE 1930
oligarquias locais X Getúlio Vargas e João Pessoa
(vitória) camadas médias urbanas | tenentes | oligarquias dissidentes

REVOLUÇÃO - Reação da Aliança Liberal à derrota


K Estopim
DE 1930 - Assassinato de João Pessoa

- Insurreição depõe Washington Luís


- Getúlio Vargas proclamado Presidente

150
33 34
Era Vargas: governos provisório
e constitucional

Competências Habilidades
1, 2, 3 e 5 4, 10, 13, 15, 21,
22 e 25

C H
HISTÓRIA
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-
H8
-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferen-
tes grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, favo-
recendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.
Introdução
Nestas duas próximas aulas vamos analisar o período do governo de Getúlio Dornelles Vargas, personagem
político controverso, que exerceu certo controle sobre a construção de sua memória histórica, passando a denomi-
nar o longo período que esteve no poder, conhecido como Era Vargas.
Entre outros fatos importantes, vão ser analisados a atuação dos movimentos sociais do período, as dispu-
tas de poder entre os grupos no interior da classe dominante, como foi o caso da Revolução Constitucionalista de
1932, em São Paulo, o significado e a representação social da Intentona Comunista, em 1935.
A partir da formação e atuação da Ação Integralista Brasileira, AIB, e da Aliança Nacional Libertadora, ANL, é
possível comparar diferentes pontos de vista sobre a situação ou fatos de natureza histórica acerca das instituições
sociais, políticas e econômicas brasileiras.
Ao final, analisamos as lutas sociais, as mudanças constitucionais e nas políticas públicas que se manifes-
taram na carta de 1934, em que se destacam a formação de uma legislação trabalhista e o reconhecimento do
direito de voto às mulheres.

A periodização da era Vargas (1930 - 1945)

Getúlio Vargas. 1930. Rio de Janeiro.

A vitória da chamada Revolução de 1930, de fato, foi um golpe de Estado, que depôs Washington Luís e
impediu a posse do candidato vitorioso, Júlio Prestes, e permitiu a ascensão de Getúlio Vargas à chefia do Governo
Provisório. O golpe de Estado transfigurado de ato revolucionário, como foi construído pela memória e sua rea-
limentação no tempo, transformou-se na história inquestionável desse período, ou seja, estava inaugurada a Era
Vargas. A frase, atribuída a Antônio Carlos de Andrada, “Façamos a revolução antes que o povo a faça”, contribuiu
para o movimento das oligarquias dissidentes – das frações e facções da classe dominante –, em especial mineiros,
gaúchos e paraibanos, apoiados por novos setores sociais, como a burguesia industrial e a classe média urbana,
além do Movimento Tenentista.
Após assumir a chefia do Governo Provisório, Getúlio permaneceu no poder até 1945, período que pode
ser dividido em três fases:
§§ Governo Provisório (1930 - 1934)
§§ Governo Constitucional (1934 - 1937)
§§ Estado Novo (1937 - 1945)

153
O período todo foi caracterizado por grandes mudanças na estrutura econômica, social e política do país.
O Brasil se industrializou e a burguesia nacional passou a ter força política crescente assim como as camadas
urbanas, que ganharam maior peso eleitoral. Foram criadas as primeiras leis trabalhistas e as mulheres puderam
participar da vida política nacional.

Governo provisório (1930–1934)


Em 3 de novembro de 1930, um mês depois da Revolução, a junta militar que assumira o poder transferiu
a chefia do Governo Provisório a Getúlio Vargas, que imediatamente decretou:
§§ a suspensão parcial da Constituição de 1891;
§§ o fechamento do Congresso Nacional, das assembleias legislativas e das câmaras municipais;
§§ a destituição dos presidentes de todos os estados e a indicação de interventores ligados ao movimento te-
nentista para os respectivos governos, exceto para Minas Gerais, uma vez que o governador Olegário Maciel
havia apoiado a Revolução de 1930;
§§ a formação de um ministério por representantes dos grupos políticos vencedores – Afrânio de Melo Franco,
Exterior; Oswaldo Aranha, Justiça; Assis Brasil, Agricultura; José Maria Whitaker, Fazenda; general Leite de
Castro, Exército; e almirante Isaías Noronha, Marinha;
§§ a criação dos ministérios do Trabalho, Indústria e Comércio, cuja chefia foi entregue ao gaúcho Lindolfo
Collor, e da Educação e Saúde, sob a chefia de Francisco Campos.
Outra medida importante do novo governo foi a criação do Conselho Nacional do Café, CNC, que passaria
a controlar a produção e o comércio do principal produto de exportação brasileiro no período, o que denotou certo
acordo com os representantes da oligarquia cafeeira.
Em razão da crise de 1929, os preços internacionais e as exportações de café sofreram quedas constantes e
acentuadas, o que levou o Governo Provisório a intervir na economia, reduzindo a oferta do produto para manter
os preços. Entre 1931 e 1944, foram queimadas e jogadas no mar aproximadamente 30 milhões de sacas de café.
Com a diminuição da oferta do produto, os preços mantiveram-se. Foram criados ainda tributos sobre a exportação
do produto, que ajudariam a financiar as políticas de sua valorização.

Queima de sacas de café em Santos, SP. 1930.

154
O CNC atuou ainda contra a plantação de no- lador dessa atividade e determinando aos funcionários do
vos pés de café, bem como a favor do pagamento dos ministério que assistissem às assembleias dos sindicatos.
prejuízos pelos próprios cafeicultores. Com vistas à di- A legalidade de um sindicato dependia do reconhecimen-
versificação da economia nacional, o governo procurou to do Ministério do Trabalho, que poderia cassá-lo caso se
estimular outros setores, como a indústria, que passou verificasse o descumprimento de uma série de normas. Du-
a receber incentivos governamentais. Foram criados o rante o governo Vargas, o Estado absorveu as organizações
Instituto do Açúcar e do Álcool, o Instituto do Cacau, na trabalhistas, principalmente os sindicatos recém-criados. Os
Bahia, e os institutos do Pinho e do Mate. combativos sindicatos urbanos das duas primeiras décadas
Em fevereiro de 1932, houve a publicação do do século XX tiveram seus espaços de luta ocupados pas-
Código Eleitoral, que criou a Justiça Eleitoral e instituiu so a passo por uma estrutura sindical corporativista, que
o voto secreto e o voto feminino – reivindicado pelos passou a controlar e a desmobilizar o movimento operário.
movimentos feministas desde o final do século XIX.
Revolução Constitucionalista
A política trabalhista de São Paulo (1932)
O Governo Provisório foi marcado pela criação As medidas governamentais e a publicação do
das primeiras leis trabalhistas, estratégia política com a Código Eleitoral, em 1932, não foram suficientes para
finalidade de atender as reivindicações dos movimentos acalmar os ânimos dos opositores paulistas ao Governo
operários, ao mesmo tempo em que os neutralizava, re- Provisório, oligarquias afastadas do poder e do controle
tirando suas bandeiras de luta e fazendo parecer uma político federal e estadual, uma vez que o estado pas-
“doação” do governo ao operariado. Em 1930, foi cria- sou a ser governado por um interventor nomeado pelo
do o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Em governo “revolucionário”, o tenente João Alberto.
1931, o trabalho feminino, o trabalho infantil e o traba- Getúlio Vargas o havia nomeado interventor de
lho noturno foram regulamentados. A carteira profissio- São Paulo logo que assumiu a chefia do Governo Pro-
nal é de 1932. A jornada de trabalho foi limitada a oito visório, para substituir o general Hastinfilo de Moura,
horas diárias, com obrigatoriedade de descanso sema- ligado ao Partido Democrático, PD, que havia apoiado a
nal remunerado e direito à férias anuais de quinze dias Revolução de 30. Essa medida afastou o PD de Vargas e
úteis, sem prejuízo dos vencimentos. Todos esses itens definiu sua aliança com o PRP em oposição ao Governo
constavam nas pautas de reivindicações dos operários. Provisório. Juntos, passaram a exigir a convocação de
eleições e a imediata reconstitucionalização do Brasil.

Carteira profissional de Getúlio Vargas. 1952.

Houve também o enquadramento dos sindicatos


com a promulgação do Decreto 19.770, de 19 de março
de 1931. Paralelamente à transformação das reivindica-
ções trabalhistas em leis, o governo cerceava a liberdade
sindical, concentrando em suas mãos o papel de contro- Cartas do movimento contra a ditadura getulista

155
A coalizão entre o Partido Republicano Paulista, Kliger e pelos presidentes de Minas Gerais e do Rio
PRP, e o Partido Democrático, PD, sustentou a formação Grande do Sul, Olegário Maciel e Flores da Cunha.
da Frente Única Paulista, FUP, que se tornou porta-voz Nos poucos meses de conflito, São Paulo viveu
das reivindicações de reconstitucionalização e de auto- um verdadeiro esforço de guerra. As indústrias mobi-
nomia administrava para o estado de São Paulo. Além lizaram-se para produzir armamentos, estimuladas
disso, a FUP passou a articular junto aos meios militares pela Federação das Indústrias de São Paulo, Fiesp. A
e entidades de classe paulistas a preparação de um mo- população civil, notadamente as mulheres, engajou-se
vimento armado contra o Governo Provisório. na Campanha “Ouro para o bem de São Paulo”, que
Na tentativa de contornar a situação, Vargas op- arrecadava joias para levantar recursos necessários ao
tou pela nomeação de um civil paulista, o diplomata esforço de guerra. Também elas formavam grupos de
Pedro de Toledo, para interventor do estado, atendendo voluntários que costuravam fardas e agasalhos, arreca-
a uma das reivindicações da FUP, que queria um inter- davam alimentos e medicamentos e cuidavam dos sol-
ventor civil e paulista para governar o Estado. dados feridos.
Em fevereiro de 1932, foi apresentado o novo
Código Eleitoral e marcadas as eleições para maio de
1933.
O recuo de Vargas não foi suficiente para apla-
car a exaltação da FUP e dos paulistas, que promoviam
grandes manifestações contra o Governo Provisório,
reivindicando a imediata volta do país à normalidade
constitucional. Em uma dessas manifestações, no dia 23
de maio de 1932, soldados fiéis a Vargas atiraram con-
tra a multidão reunida na Praça da República e mata-
ram quatro estudantes secundaristas: Mário Martins de
Almeida, Euclides Bueno Miragaia, Dráusio Marcondes Cartazes MMDC convocam o povo paulista às armas     
de Souza e Antônio Américo Camargo de Andrade.

Cartaz da campanha “Ouro para o


bem de São Paulo”

Multidão protesta contra o assassinato dos estudantes MMDC. São


Paulo. 1932. Apesar disso, o movimento paulista ficou isola-
do. A esperada adesão das forças mineiras e gaúchas
As iniciais dos nomes dos estudantes assassina- não se consolidou. Embora afirmassem apoiar a luta
dos pelas forças governamentais formaram a sigla do pela constitucionalização, os governos mineiro e gaú-
movimento: MMDC. Em julho, o comando das forças cho decidiram manter-se leais ao Governo Provisório.
paulistas foi assumido pelo general Isidoro Dias Lopes, As forças legalistas de Getúlio partiram de Minas
que desencadeou a Revolução Constitucionalista de Gerais e bloquearam o porto de Santos, facilitando a
1932, apoiada pelo general mato-grossense Bertoldo repressão. Em 1o de outubro, os paulistas renderam-se.

156
Apesar da derrota militar, seus objetivos políticos foram §§ Criação da Lei de Segurança Nacional e institui-
atendidos: em 1933, houve eleições para a formação ção do mandato de segurança.
de uma Assembleia Nacional Constituinte, responsável §§ Incorporação das leis trabalhistas – limitação da
pela promulgação, em 1934, de uma nova Constituição jornada de trabalho para oito horas diárias, salá-
para o Brasil. rio mínimo, descanso semanal obrigatório, férias
remuneradas, indenização para demissão sem
justa causa e licença-maternidade de sessenta
Constituição de 1934 dias para as mulheres.
Nas disposições transitórias da Constituição de
1934, ficou determinado que o primeiro presidente
após a promulgação da Carta deveria ser eleito de ma-
neira indireta pela própria Assembleia Nacional Consti-
tuinte. Getúlio Vargas foi o escolhido e assumiu o cargo
de Presidente Constituinte do Brasil, com direito a go-
vernar até 1938. Desse modo, Getúlio Vargas passou da
ilegitimidade à legitimidade eleitoral como presidente
da República!
Getúlio Vargas e políticos na instalação da Assembleia Nacional Consti-
tuinte. 1934. Rio de Janeiro, RJ.
Governo constitucional
Eleita em 1933, a Assembleia Nacional Consti-
tuinte foi presidida pelo deputado mineiro Antônio Car-
(1934–1937)
los de Andrada e promulgou a nova Constituição em
NOVO REGIME... NOVA ROUPA
julho de 1934. - A nova roupa, Excelência.
A terceira Constituição brasileira, a segunda da -Um pouquinho apertada...
Os movimentos...
Era Republicana, era baseada na Constituição alemã da compreende?
República de Weimar e tinha como características: Nássara. Suplemento de
Bom Humor (1934)
§§ Regime presidencialista, com mandato presiden-
cial de quatro anos sem direito à reeleição.
§§ Extinção do cargo de vice-presidente.
§§ Representação estadual no Congresso por dois
senadores, com mandato de oito anos, e por um
O início da década de 1930 no Brasil foi marca-
número de deputados proporcional à população
do pela polarização ideológica entre esquerda e direita,
do estado, com mandato de quatro anos.
que defendiam respectivamente o comunismo e o fas-
§§ Voto secreto e universal para ambos os sexos,
cismo, reflexo interno da situação internacional notada-
alfabetizados e maiores de 18 anos.
mente europeia. A polarização provocou intensos con-
§§ Voto profissional (deputados classistas) escolhi-
flitos e disputas ideológicas em âmbito nacional entre
dos pelos sindicatos.
a Ação Integralista Brasileira, AIB, e a Aliança Nacional
§§ Criação da Justiça Eleitoral.
Libertadora, ANL.
§§ Ensino primário obrigatório e gratuito.
§§ Obrigatoriedade de as empresas estrangeiras
empregarem no mínimo 2/3 de brasileiros. Ação Integralista Brasileira, AIB
§§ Monopólio do Estado dos recursos hidrominerais.
Fundada em 1932 por Plínio Salgado, a Ação
§§ Nacionalização das companhias de seguro es-
Integralista Brasileira pregava o combate brutal ao co-
trangeiras.
munismo, o nacionalismo extremado e a formação de

157
um Estado totalitário. Extremamente conservadores e §  nacionalização de empresas estrangeiras;
intolerantes, os integralistas defendiam a disciplina e a §  suspensão do pagamento da dívida externa;
hierarquia social, a censura, particularmente às ativida- §  realização de reforma agrária;
des artísticas. Tinham como lema: “Deus, pátria e famí- §  extensão dos direitos trabalhistas ao campo;
lia”. Os integrantes vestiam camisas verdes que exibiam §  criação de um governo popular.
a letra grega ∑ (sigma, correspondente ao nosso S) e Além de antifascista, a ANL opunha-se ao go-
cumprimentavam-se com a saudação “anauê” (salve). verno autoritário de Vargas, que, baseado na Lei de
Inspirados pelo fascismo europeu, defendiam o mono- Segurança Nacional, determinou em julho de 1935 o
partidarismo e o regime totalitário de governo. fechamento da ANL e a prisão de vários de seus líderes,
após discurso de Prestes com críticas ao governo.

Capa da revista Anauê!, órgão oficial


da AIB.

Cartaz alusivo às comemorações dos 70 anos da ANIL. 2005.

Intentona Comunista de 1935


Em reação ao fechamento da ANL, seus mem-
bros passaram a atuar na clandestinidade e a organizar,
com o apoio do Partido Comunista, um golpe para der-
Plínio Salgado (centro). rubar Getúlio Vargas da presidência e preparar a im-
plantação do comunismo no Brasil.
Essa organização constituiu a chamada Intento-
Aliança Nacional Libertadora, ANL na Comunista, com início em novembro de 1935, quan-
do ocorreram levantes nas cidades de Natal, Recife e
A ANL era uma frente ampla antifascista que
Rio de Janeiro. Contudo, nunca conseguiram antecipar-
reunia várias tendências: sociais democratas, socialistas,
-se dos órgãos de inteligência do governo, que manti-
anarquistas, comunistas, sindicalistas e antigos mem- nha informantes infiltrados no Partido Comunista e na
bros do tenentismo. Liderada por Luís Carlos Prestes, a clandestina ANL. Desorganizados, sem armas e sem o
ANL tinha como lemas: “Pão, terra e liberdade” e “Todo apoio esperado, os revoltosos foram sufocados sem re-
poder à ANL”. Seu programa político defendia a: sistência e vários lideres comunistas presos, como Agil-

158
do Barata e Álvaro de Souza, além de lideranças operá- Aparentemente, Vargas respeitaria a Constitui-
rias, sindicalistas e políticos. ção e tomava as medidas necessárias para a escolha
O governo Vargas usou a Intentona para jus- de seu sucessor. Todavia, não tinha intenção de deixar o
tificar a implantação do Estado de Sítio e recorrer a cargo. No Palácio do Catete, sede da presidência, come-
instrumentos repressivos – torturas, prisões arbitrárias çou a preparar sua continuidade no poder.
de comunistas ou acusados de esquerda, até a iden- Autoridades militares teriam descoberto e divul-
tificação e total desarticulação deles. Prestes foi preso gado um suposto plano comunista para tomar o poder
em 1936 e sua mulher, a judia comunista alemã Olga no Brasil, derrubar Getúlio e assassinar políticos – o
Benário Prestes, depois de presa, foi extraditada para a Plano Cohen. Segundo o general Góes Monteiro, chefe
Alemanha, apesar de amparada pela lei, uma vez que do Estado Maior do Exército, tratava-se de um plano
estava grávida de um brasileiro, e de as autoridades bra- comunista que visava à tomada do poder por meio de
sileiras terem conhecimento das perseguições e mortes assassinatos, luta armada, invasão de lares e outras
a que estavam sujeitos os judeus na Alemanha nazista. tantas violências. Constituído em pretexto para o golpe,
A criança nasceu na Alemanha, recebeu o nome esse plano era uma farsa forjada pelo capitão Olímpio
de Anita Leocádia Benário Prestes e foi entregue à avó Mourão Filho, membro do movimento integralista.
paterna por autoridades nazistas. Olga Benário conti- No entanto, a mentira cumpriu seu propósito.
nuou presa e morreu assassinada na câmara de gás, em Os parlamentares aceitaram o pedido de implantação
1942, no campo de extermínio de Bernburg. do Estado de Sítio solicitado por Vargas, que fechou o
Congresso Nacional no dia 10 de novembro de 1937
e outorgou uma nova Constituição para o Brasil, que
consumou o golpe de Estado e inaugurou a ditadura
do Estado Novo até 1945. Os partidos políticos foram
proibidos, inclusive a AIB, que havia apoiado o golpe;
instalou-se a censura, avançaram as perseguições políti-
cas e a tortura. Iniciava o flerte de Vargas com a Alema-
nha nazista, observado de perto pelos Estados Unidos.

Fac-símile do jornal A Manhã, da ANL.


27 nov. 1935.

(NOVAES, Carlos Eduardo; LOBO, César. História de Brasil para


O Plano Cohen principiantes. São Paulo: Ática, 2003, p. 228.)

Em 1937, foram marcadas eleições presidenciais


para a escolha de um sucessor para Getúlio Vargas. Seu
mandato de quatro anos aproximava-se do final e, de
acordo com a Constituição de 1934, não havia possi-
bilidade de ele ser reeleito. Vargas chegou a indicar o
candidato que apoiaria: o paraibano José Américo de
Almeida. Plínio Salgado e Armando Salles de Oliveira
também lançaram candidatura à presidência.

159
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Filme Lutero

Após quase ser atingido por um raio, Martim Lutero (Joseph Fiennes) acredita ter
recebido um chamado. Ele se junta ao monastério, mas logo fica atormentado
com as práticas adotadas pela Igreja Católica na época. Após pregar em uma
igreja suas 95 teses, Lutero passa a ser perseguido. Pressionado para que se
redima publicamente, Lutero se recusa a negar suas teses e desafia a Igreja
Católica a provar que elas estejam erradas e contradigam o que prega a Bíblia.
Excomungado, Lutero foge e inicia sua batalha para mostrar que seus ideais
estão corretos e que eles permitem o acesso de todas as pessoas a Deus.

Filme A outra

Anne (Natalie Portman) e Mary (Scarlett Johansson) são irmãs que foram
convencidas por seu pai e tio ambiciosos a aumentar o status da família
tentando conquistar o coração de Henry Tudor (Eric Bana), o rei da Inglaterra.
Elas são levadas à corte e logo Mary conquista o rei, dando-lhe um filho
ilegítimo. Porém, isto não faz com que Anne desista de seu intento, buscando
de todas as formas passar para trás tanto sua irmã quanto a rainha Catarina
de Aragão (Ana Torrent).

Filme Elizabeth – A era de ouro

Inglaterra, 1585. Elizabeth I (Cate Blanchett) está quase há três décadas no


comando da Inglaterra, mas ainda precisa lidar com a possibilidade de traição
em sua própria família. Simultaneamente, a Europa passa por uma fase de
catolicismo fundamentalista, que tem como testa-de-ferro o rei Felipe II (Jordi
Mollá), da Espanha. Apoiado pelo Vaticano e armado com a Inquisição, Felipe
II planeja destronar a “herege” Elizabeth I, que é protestante, e restaurar o
catolicismo na Inglaterra. Preparando-se para entrar em guerra, Elizabeth busca
equilibrar as tarefas da realeza com uma inesperada vulneabilidade, causada por
seu amor proibido com o aventureiro Sir Walter Raleigh (Clive Owen).

160
LER

Livros
A Reforma Protestante - Coleção O Cotidiano da
História - Luiz Maria Veiga

Durante a Idade Média, os povos europeus cristãos


reconheciam a Igreja Católica como a única autoridade
espiritual existente. No entanto, o alto clero havia
acumulado tanto poder que passou a se preocupar mais
com as questões terrenas do que com as espirituais. Era
comum encontrar religiosos envolvidos com nepotismo,
corrupção, luxúria, o que deixava a Igreja cada vez mais desacreditada perante
a população. Em 1517, no entanto, o Catolicismo sofreu um grande abalo.
Naquele ano, o monge alemão Martinho Lutero criticou duramente essas práticas
vergonhosas e desencadeou um processo de reforma religiosa que provocou
um verdadeiro cisma na Igreja Católica. Estava nascendo o Protestantismo,
uma religião que obrigou os católicos a mudarem sua postura para recuperar o
prestígio junto a seus fiéis. Conteúdo histórico:
§§ Panorama socioeconômico e político da Alemanha no século XVI;
§§ Relações entre religião, sociedade, política e economia alemãs;
§§ Lutero e o estopim da Reforma religiosa;
§§ Müntzer e a repressão às revoltas camponesas;
§§ Abalo na unidade e na autoridade da Igreja Católica;
§§ Limites da Reforma Luterana.

161
INTERATIVI
A DADE

ASSISTIR

Filme A Revolução de 30

Uma reconstituição dos fatos que antecederam a Revolução de 30 em


São Paulo e os acontecimentos durante o movimento através da mon-
tagem de imagens de arquivo da época e outros recursos audiovisuais,
como cinejornais, filmes do período, canções célebres daqueles anos,
além de comentários de alguns historiadores.

LER
tt
Livros
São Paulo 1932 – Marco Cabral dos Santos, André Mota

A cidade de São Paulo ostenta múltiplos signos de celebração


da “guerra civil” de 1932. Duas de suas maiores avenidas foram ba-
tizadas com datas que fazem alusão ao conflito: 9 de julho e 23 de
maio. Naquilo que diz respeito diretamente à revolução e seus desdo-
bramentos simbólicos, a construção do evento acabou se tornando o
grande mito da história estadual, cuja memória começou a ser cons-
truída imediatamente após a deflagração da guerra. Este livro procura
estudar e refletir sobre esse período através da análise minuciosa dos
historiadores Marco Cabral dos Santos e André Mota.

Memórias do Cárcere – Graciliano Ramos

Memórias do Cárcere é o testemunho de Graciliano Ramos so-


bre a prisão a que foi submetido durante o Estado Novo. Uma narra-
tiva amarga de alguém que foi torturado, viveu em porões imundos e
sofreu privações provocadas por um regime ditatorial.

162
LER

Livros
A tentação Fascista no Brasil – Hélgio Trindade

Este novo livro de Hélgio Trindade (professor emérito da UFRGS),


cumpre a promessa de trazer a público a análise de um conjunto
de entrevistas inéditas feitas pelo autor, entre maio de 1969 e
setembro de 1970, com dirigentes nacionais, regionais, locais e
militantes, pouco mais de quatro décadas após a publicação, em
1974, do primeiro livro – Integralismo: o fascismo brasileiro da
década de 30.

Vidas Secas – Graciliano Ramos

Em ´Vidas Secas´, o autor se mostra mais humano, sentimental e


compreensivo, acompanhando o pobre vaqueiro Fabiano e sua
família com simpatia e uma compaixão indisfarçáveis. Além de
ser o mais humano e comovente dos livros de ficção de Graciliano
Ramos, ´Vida Secas´ é o que contém maior sentimento da terra
nordestina, daquela parte que é áspera, dura e cruel, sem deixar
de ser amada pelos que a ela estão ligados teluricamente. O que
impulsiona os seres desta novela, o que lhes marca a fisionomia e
os caracteres, é o fenômeno da seca. ´Vida Secas´ representa ainda
uma evolução na obra de Graciliano Ramos quanto ao estilo e à
qualidade estritamente literária.

A Insurreição da Anl Em 1935 – Relatório Bellens Porto


- Marly Vianna

A insurreição armada de militares integrantes da Aliança Nacional


Libertadora (coalizão apartidária, formada pelas mais diversas
lideranças, a favor da democracia e pela emancipação do povo
brasileiro de forças fascistas e do jugo estrangeiro), em novembro
de 1935, passou à história do Brasil como um dos principais fatos
políticos do século XX.

163
INTERATIVI
A DADE

ACESSAR

Sites Revolução de 1932, Simbologia do Integralismo

acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/voto-feminino-conquistado-nos-anos-30-mas-
-direito-do-analfabeto-sai-so-em-1985-14128281
oglobo.globo.com/cultura/livros/a-insurreicao-de-1935-nem-intentona-muito-menos-
-comunista-18436022
historiadomundo.uol.com.br/idade-contemporanea/a-simbologia-do-integralismo.htm
acervo.estadao.com.br/noticias/topicos,revolucao-de-1932,892,0.htm

OUVIR
Músicas
O Meu Viva eu Quero Dar – Cornélio Pires, Mariano
& Caçula
G-e-Gê (Seu Getúlio) – Almirante
Gegê – Jaime Vogeler
Para a frente Paulistas – Arnaldo Pescuma
Paulistinha querida – Januario de Oliveira e Arnaldo Pescuma
Avante! Avante! - Hino da Ação Integralista Brasileira
Galinha Verde – Marilú
A Menina Presidência – Silvio Caldas

164
INTERDISCIPLINARIDADE

A promulgação da Constituição de 1934, a segunda da República, estabelecia importantes mudanças no


sistema eleitoral. A partir dessa carta magna, o voto passou a ser secreto (ou fechado), pondo fim ao voto aberto,
que foi marca da República Velha e que possibilitava a prática do “voto de cabresto”. Outra grande mudança
presente em 1934 foi a ratificação do direito de voto às mulheres, direito esse já concedido pelo Código Eleitoral
aprovado em 1932. Deste modo, ficavam igualados os direitos políticos entre homens e mulheres no país, o que,
com tudo, não derrubou a dominação masculina no cenário político da época.

Mulher exercendo o seu direito de voto, pela


primeira vez, em pleito realizado, em 1933

165
CONSTRUÇÃO DE HABILIDADES

Habilidade 25 - Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.

Em relação aos direitos conquistados, há aqueles que se identificam como civis, políticos
ou sociais, sendo os direitos trabalhistas enquadrados como os últimos. A questão da in-
clusão de diretos sociais ganhou relevância no Brasil a partir do século XX, principalmente
após a Revolução de 1930, período muito cobrado pelo Enem. O candidato deve ser
capaz de reconhecer avanços e retrocessos, bem como o teor dessas mudanças jurídicas.
A questão em destaque trata especificamente do período supracitado, reiterando que
nele houve uma série de avanços no que tange à proteção ao trabalhador.
O candidato, na maioria das vezes, vai se deparar com excertos acadêmicos, charges, leis
e artigos de jornal como suporte às questões, sendo imprescindível leitura atenta ao que
for apresentado.

Modelo
(Enem) De março de 1931 a fevereiro de 1940, foram decretadas mais de 150 leis novas de prote-
ção social e de regulamentação do trabalho em todos os seus setores.
Todas elas têm sido simplesmente uma dádiva do governo. Desde aí, o trabalhador brasileiro en-
contra nos quadros gerais do regime o seu verdadeiro lugar.
DANTAS, M. A força nacionalizadora do Estado Novo. Rio de Janeiro: DIP, 1942. Apud BERCITO, S.R.
Nos Tempos de Getulio: da Revolução de 30 ao fim do Estado Novo. São Paulo: Atual, 1990.

A adoção de novas políticas públicas e as mudanças jurídico-institucionais ocorridas no Brasil,


com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, evidenciam o papel histórico de certas lideranças e a
importância das lutas sociais na conquista da cidadania. Desse processo resultou a:
a) criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, que garantiu ao operariado autonomia para o
exercício de atividades sindicais.
b) legislação previdenciária, que proibiu migrantes de ocuparem cargos de direção nos sindicatos.
c) criação da Justiça do Trabalho, para coibir ideologias consideradas perturbadoras da “harmonia social”.
d) legislação trabalhista que atendeu reivindicações dos operários, garantindo-lhes vários direitos e for-
mas de proteção.
e) decretação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que impediu o controle estatal sobre as ativi-
dades políticas da classe operária.

166
Análise Expositiva

Habilidade 25
A questão apresenta uma delimitação cronológica, até 1940, que exclui a CLT, elaborada em
1943 e ampliou a ingerência do Estado nas questões trabalhistas, prática adotada pelo Go-
verno Vargas, desde seu início.
A política trabalhista de Vargas é um dos aspectos mais lembrados desse período e se, de
um lado, garantiu direitos aos trabalhadores, de outro, teve como objetivo manter o controle
sobre a organização operária. A repressão as “ideologias perturbadoras” ficou a cargo da re-
pressão policial e não do Ministério do Trabalho.
Alternativa D

Estrutura Conceitual

ERA VARGAS
GOVERNO PROVISÓRIO E CONSTITUCIONAL
governo centralizador | nacionalista | corporativista

1930 1934 1937 1945

Governo provisório Governo constitucional Ditadura do Estado Novo


I Governo provisório (1930-1934)

A Medidas imediatas B Política trabalhista


◊ Suspensão da Constituição de 1891 ◊ Criação do Ministério do Trabalho
◊ Interventores nos Estados ◊ Legalização dos sindicatos
◊ Política de valorização do café ◊ Controle dos sindicatos
C Revolução Constitucionalista de
D Constituição de 1934
São Paulo (1932)
◊ Presidencialista
◊ Liderança: Frente Única Paulista (FUP) ◊ Três poderes
[oligarquia paulista] ◊ Voto universal (masculino e feminino
◊ Reivindicações: nova constituição federal para alfabetizados)
◊ Consequências: derrota militar ◊ Voto profissional
  promulgação de nova constituição ◊ Criação da Lei de Segurança Nacional
◊ Nacionalização de setores
◊ Eleições indiretas naquele ano

167
II Governo constitucional (1934-1937)
Eleições indiretas

A Polarização ideológica
Aliança Nacional Libertadora (ANL) vs Ação Integralista Brasileira (AIB)
◊ Esquerda ◊ Direita
◊ Antifascista ◊ Fascista
◊ Frente popular (comunistas e progressistas) ◊ Estado totalitário
◊ Reforma agrária ◊ Hierarquia social
◊ Nacionalização de empresas ◊ Censura
◊ Líder: Luís Carlos Prestes ◊ Líder: Plínio Salgado

B Intentona Comunista (1935) C Plano Cohen


◊ Levante e tentativa de golpe ◊ 1937: proximidade das eleições
◊ Natal, Recife e Rio de Janeiro ◊ Conspiração comunista inventada pelo governo
◊ Prisão dos envolvidos ◊ Estado de sítio
◊ Estado de sítio ◊ Justificativa para o golpe do Estado Novo

168

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