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As diversas Histórias da Umbanda

A Umbanda, em especial a Umbanda Paulista se fundamentou muito dentro da corrente de


Zélio Fernandino de Morais, em especial através de pai Ronaldo Linares, o “divulgador” de sua
história. Essa Umbanda, que hoje ganha projeção virtual e por isso mundial, esqueceu de levar
em conta os traços regionais das diversas Umbandas espalhadas pelo Brasil à fora. Esqueceu
das diversas histórias das Umbandas nas mais diversas regiões brasileiras. Pois, pasmem para
uma realidade, a maioria das Umbandas praticadas em todo o Brasil, se manteve viva e
funcional até 19701 sem nunca ter ouvido falar de Zélio Fernandino de Morais, e dos
fundamentos de “sua” Umbanda passada pelo caboclo das Sete Encruzilhadas.

Eu mesmo, que me iniciei na Umbanda em 1985, só escutei falar de Zélio pela primeira vez por
volta de 1995/1996, pois a minha primeira dirigente de Umbanda, nunca, em nenhum
momento falou de Zélio e do Caboclo das Sete encruzilhadas e já tinha mais de 30 anos de
trabalho, de casa aberta de Umbanda. Mas falava, ensinava de como a Umbanda foi
disseminada pelos espíritos no Brasil inteiro.

Assim sendo, e não desmerecendo a importância de Zélio como o maior propagador da


Umbanda e talvez, o primeiro organizador de uma vertente, o mais correto seria falar das
histórias das Umbandas e não da história da Umbanda. Por que a Umbanda de Zélio é apenas
mais uma vertente de Umbanda e a “história da Umbanda” é o legado do mesmo e do caboclo
das Sete Encruzilhadas, e não a “História da Umbanda.”

Acontece que quando uma história, independentemente de ser verdade ou não, ao ser
contada e recontada milhares de vezes ao longo do tempo, vira realidade. Porém no caso da
Umbanda que é, na minha visão, uma religião que se formou espontaneamente através de um
grande movimento astral que foi propagada naturalmente por diversos Guias (espíritos)
dentro de diversos cultos, se manifestando sempre respeitando as linhagens ancestrais e
características regionais dos mesmo.

Apesar de a Umbanda parecer um caos, à primeira vista, de interpretação religiosa, cultural e


espiritual, ela é um movimento organizado e seguro no astral que visa o crescimento
consciencial e espiritual do médium, assim como o seu despertar espiritual. Respeitando
sempre uma visão aberta, universalista e não dogmática, onde cada casa, cada dirigente, tem
sua raiz, a sua história e que deve ser respeitada, honrada e cultuada, respeitando claro os
processos evolutivos culturais, sociais e espirituais. Assim falar do que é ou não Umbanda e
apontar como erro visões e procedimentos que divergem de uma corrente para outra é no
mínimo arrogância.

Uma vez escutei um ensinamento que dizia mais ou menos assim: “na minha casa isso é o
certo! Na outra é apenas diferente”.

Para dar apenas um exemplo do que falo, Leal de Souza, outro grande sustentáculo da religião
formado por Zélio e dirigente da casa N.s. da Conceição, em uma entrevista concedida ao
Jornal de Umbanda, em outubro de 1952 ele relata que antes mesmo do advento do caboclo
da Sete Encruzilhadas, já existia registos históricos do ano de 1889 (antes mesmo do
nascimento de Zélio que nasceu em 1891) um caboclo chamado Guruguçu já se manifestava

1
Ano em que pai Ronaldo encontra a história de Zélio na revista Espírita de Umbanda, e busca conhecê-
lo e difundir a sua história.
conjuntamente com pretos-velhos, exus, pombagiras, boiadeiros2, etc em nome da Umbanda
como fica bem notório em seu ponto cantado.

Eu vim lá da Aruanda
Trazendo a luz, a luz da Umbanda
Eu venho com o clarim de Ogum
Anunciar que a Umbanda vai chegar
Eu sou caboclo de Umbanda
Eu venho do Cruzeiro do Sul
Eu sou caboclo Curuguçu
Meu grito já ecoou
É a Umbanda que chegou
Meu grito ecoou
Pai Oxalá quem me mandou
Eu sou Curuguçu
Da corrente de Ogum
Que aqui chegou

Na visão de Leal de Souza, o caboclo Guruguçu coordenava os trabalhos através da irradiação


do Orixá Ogum e que tinha como missão preparar o terreno para a manifestação do caboclo
das Sete Encruzilhadas que por sua vez teve como propósito a organização e expansão da
Umbanda. Sendo assim, Zélio não pode ser considerado o pai da Umbanda, mas como aquele
que primeiro tentou organizar e estruturar à espiritualidade de Umbanda, gerando mais tarde,
a primeira corrente organizada da Umbanda, a Umbanda Branca ou da Umbanda de Zélio. Que
acabou por se popularizar devido a “desafricanização”3 da umbanda e as implementações das
influências espíritas e católicas que, por sua vez ganharam força e veio facilitar a aceitação de
um grande número de adeptos educados dentro da corrente católica.

Se o advento do caboclo das Sete Encruzilhadas foi um marco para a umbanda?

Não há dúvida que sim. Pois a partir daí à Umbanda cresceu e se firmou em solo brasileiro.
Mas nem Zélio, nem o caboclo das Sete Encruzilhadas podem ser considerados o marco inicial
da Umbanda, mas sim, talvez, um marco histórico do primeiro movimento de organização, de
legalização da Umbanda, e que logicamente, não foi e não é até hoje ponto de concordância
geral em relação às várias vertentes da Umbanda. Visto que muitas são as vertentes que não
aceitam a “história oficial” da Umbanda, assim como, não aceitam as diretrizes passadas pelo
Caboclo das sete encruzilhadas e não comemoram o 15 de Novembro como o dia da
Umbanda.

Heldney Cals

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2
Recordando que muitas dessas linhas não fizeram e não fazem parte até hoje da Umbanda original de
Zélio na tenda Espírita N.S. da Piedade.
3
Como vemos nos documentos do primeiro Congresso Brasileiro de espiritismos de Umbanda realizado
em 1941.
Segundo Leal de Souza, um dos dirigentes de Umbanda formado por Zélio e dirigente da casa
N.S. da Conceição, em uma entrevista concedida ao Jornal de Umbanda, em outubro de 1952 e
e Diamantino Trindade, no livro: , a primeira entidade a anunciar à umbanda foi o Caboclo.
Sendo esse, e não o caboclo das Sete Encruzilhadas o verdadeiro precursor da Umbanda.

Segundos os mesmos, há registos históricos do ano de 1889 onde comprova a existência de


manifestações de caboclo, preto-velho, exu e pombagira em nome da Umbanda.

Sendo a principal fonte de comprovação o próprio ponto cantado do caboclo.

Eu vim lá da Aruanda
Trazendo a luz, a luz da Umbanda
Eu venho com o clarim de Ogum
Anunciar que a Umbanda vai chegar
Eu sou caboclo de Umbanda
Eu venho do Cruzeiro do Sul
Eu sou caboclo Curuguçu
Meu grito já ecoou
É a Umbanda que chegou
Meu grito ecoou
Pai Oxalá quem me mandou
Eu sou Curuguçu
Da corrente de Ogum
Que aqui chegou

Na visão de Leal de Souza, o caboclo Guruguçu coordenava os trabalhos através da irradiação


do Orixá Ogum e que tinha como missão preparar o terreno para a manifestação do caboclo
das Sete Encruzilhadas que teve como propósito a organização e expansão da Umbanda. Já
Diamantino Trindade coloca Zélio não como fundador da Umbanda, mas sim, como aquele que
primeiro tentou organizar e estruturar à espiritualidade de Umbanda, gerando mais tarde, a
primeira corrente organizada da Umbanda, a Umbanda Branca ou da Umbanda de Zélio. Que
acabou por se popularizar devido a “desafricanização4” da umbanda e as implementações das
influências espíritas e católicas que, por sua vez ganharam força e veio facilitar a aceitação de
um grande número de adeptos educados dentro da corrente católica.

Se o advento do caboclo das Sete Encruzilhadas foi um marco para a umbanda? Não há dúvida
que sim. Pois a partir daí à Umbanda cresceu e se firmou em solo brasileiro. Mas nem Zélio,
nem o caboclo das Sete Encruzilhadas são o marco originário da Umbanda, mas sim um marco
histórico do primeiro movimento de organização, de legalização da Umbanda, e que
logicamente, não foi e não é ponto de concordância geral em relação às várias vertentes da
Umbanda. Sendo muitas as que não aceitam a “história oficial” da Umbanda, assim como as
diretrizes passadas pelo Caboclo das sete encruzilhadas e não comemoram o 15 de Novembro
como o marco inicial da religião.

4
Recordando que Zélio retirou um dos elementos principais da Umbanda que é a manifestação de exu,
assim como excluiu o orixá primordial Exu. Talvez por desconhecimento ou por preconceito, visto que
nessa altura Exu era sincretizado com o Diabo cristão. Uma total deformação das características
originais do Orixá Exu.
Sendo, para essas correntes o 15 de novembro um marco histórico na disseminação da
Umbanda e não da implantação e fundamentação da Umbanda em solo brasileiro.

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