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Histamina
A histamina é indubitavelmente importante no organismo, visto que tal
substância desempenha e auxilia funções fisiológicas essenciais, como no
apetite, no controle do sistema cardiovascular, termorregulação, entre outras.
Tal composto é sintetizado a partir do aminoácido histidina, é armazenado em
grânulos ou vesículas e é liberado por diversas células do organismo
consoante a estímulos de natureza mecânica, física, química ou imunológica.
Ademais, os efeitos advindos da histamina são mediados pela sua ligação com
quatro subtipos de receptores de histamina (H1, H2, H3 e H4), cada um com
sua particularidade.

Agonistas e Agentes Liberadores de Histamina


No âmbito da Medicina Humana, a histamina auxilia no diagnóstico da
acloridria, do feocromocitoma e na avaliação sensorial e circulatória cutânea,
por meio da resposta tríplice de Lewis.
Existem agentes capazes de induzir a liberação de histamina e também
com susceptibilidade ao bloqueio realizado pelos anti-histamínicos. Outrossim,
é possível promover a liberação de histamina como efeito colateral à
administração de altas doses de determinados medicamentos, como a morfina,
a polimixina, a atropina, entre outros.
Ainda, é válido elucidar que alguns tipos de peixes apresentam altas
concentrações do aminoácido histidina em sua musculatura. Destarte,
condições inadequadas de refrigeração desse pescado inferem que bactérias
contaminantes promovam a descarboxilação da histidina, formando histamina.
Dessa forma, o consumo da carne do peixe que apresenta níveis elevados de
histamina pode acarretar em um quadro tóxico denominado escombrotoxicose
– nesse caso a histamina é chamada de escombrotoxina.

Antagonistas da Histamina
Os antagonistas de receptores da histamina, também conhecidos como
anti-histamínicos, são agentes capazes de interagir de maneira reversível com
receptores da histamina, impedindo a sua ação, sem estimular esses
receptores. Tal antagonismo é do tipo competitivo, ou seja, o bloqueio pode ser
revertido quando aumentada a concentração da histamina ou de outro agonista
desses receptores.
Nesse sentido, esses antagonistas podem ser classificados de acordo
com o seu local de ação em quatro categorias: antagonistas de receptores H1,
antagonistas de receptores H2, antagonistas de receptores H3, antagonistas de
receptores H4 e de inibidores da liberação da histamina. Atualmente, apenas
os antagonistas de receptores H1 e H2 têm alguma aplicação clínica em
Medicina Veterinária.

Antagonistas de Receptores H1
Os antagonistas de receptores H1 são classificados de acordo com sua
estrutura química como etalonaminas, etilenodiaminas, alquilaminas,
piperazinas, fenotiazinas e piperidinas. Ainda, são bem absorvidos pela via oral
em animais monogástricos, com período de latência para seus efeitos de 30
min e com pico de ação ocorrendo entre 1 e 6 h. Enquanto em poligástricos, a
latência para o início da ação é de 20 a 45 min após a administração pela
mesma via, com duração de efeitos de 3 a 12 h.
Não obstante, apresentam alta lipossolubilidade e alguns deles podem
penetrar na barreira hematoencefálica, causando sedação. Por isso, a via
intravenosa deve ser evitada em alguns casos, devido à possibilidade da
ocorrência de efeitos centrais. Ademais, a biotransformação desses compostos
é hepática, sendo capazes de ativar o sistema microssomal hepático,
facilitando esse processo. As principais propriedades farmacológicas desses
antihistamínicos que podem ter utilidade na prática clínica veterinária incluem o
controle de alguns tipos de reações inflamatórias e alérgicas, como as
promovidas pela picada de insetos (formigas, abelhas), rinites alérgicas e
urticária; da cinetose, isto é, náuseas promovidas pelo movimento; e nos casos
em que a sedação e a indução do sono sejam indicadas. Esses agentes
também podem controlar outras ações da histamina na musculatura lisa (dos
brônquios, intestino, útero e vasos). No entanto, é válido salientar que na
alergia ou na anafilaxia, outros mediadores também são liberados e, por isso, o
uso de outros medicamentos pode ser fundamental para a reversão do quadro
clínico ou mesmo para impedir o óbito do animal. Os antagonistas de
receptores H1 são capazes de antagonizar a vasodilatação ou a
vasoconstrição mediada pela histamina, além do aumento da permeabilidade
vascular e do prurido promovidos por esta amina. Também impedem a
estimulação da adrenal e dos gânglios autonômicos, bem como a secreção de
diversas glândulas, com exceção da secreção gástrica, onde estão envolvidos
receptores H2. Outro efeito que pode ser de utilidade clínica é a redução da
cinetose, mas este efeito pode se dar em virtude da ação anticolinérgica destes
agentes nos receptores muscarínicos. O dimenidrinato e a prometazina são
exemplos de agentes com ação potente anticinetose. Entretanto, alguns
antagonistas de receptores H1 são capazes de atravessar a barreira
hematoencefálica, promovendo efeitos depressores, como sonolência, redução
do estado de alerta e dos reflexos. Podem ocorrer também incoordenação
motora e prostração e, em doses elevadas, alucinações, excitação, ataxia,
convulsões, hipertermia, colapso cardiorrespiratório e morte. A gravidade
desses sinais inclui medidas de descontaminação do sistema gastrintestinal,
sintomáticas e de suporte, pois não há antídoto específico.
Antagonistas de Receptores H2
Os antagonistas de receptores H2 são compostos com estrutura química
formada pela porção imidazol da molécula de histamina e modificação de sua
cadeia lateral. Apresentam pouca ou nenhuma afinidade pelos receptores H1 .
Os primeiros antagonistas destes receptores sintetizados foram a burimamida e
a metiamida; porém, a cimetidina foi o primeiro fármaco de importância clínica,
sendo obtida da modificação da molécula da metiamida, que, apesar de possuir
ação potente sobre receptores H2 , apresenta alta nefrotoxicidade e promove
agranulocitose em seres humanos. A redução desta toxicidade foi obtida pela
adição de um grupo ciano no lugar do grupamento tiol existente na molécula da
metiamida.
Embora estes antagonistas bloqueiem a ação da histamina em todos
os receptores H2 , seu principal uso terapêutico é a redução da secreção
gástrica (por reduzirem as concentrações intracelulares de cAMP) no
tratamento de gastrites e úlceras, diminuindo a acidez e acelerando a
cicatrização (para detalhes, veja Capítulo 33). Cabe ressaltar que estes
agentes inibem a secreção do ácido gástrico estimulada pela histamina, mas
têm pouco ou nenhum efeito inibidor contra a secreção induzida pela
acetilcolina e a gastrina. A cimetidina é muito empregada nestes casos. Além
desta, foram desenvolvidos outros antagonistas de H2 , como a ranitidina (ação
5 a 10 vezes superior à da cimetidina), a nizatidina (ação semelhante à da
ranitidina) e a famotidina (ação 20 a 50 vezes superior à da cimetidina e 3 a 20
vezes a da ranitidina). Estes agentes também podem ser divididos em agentes
de primeira (cimetidina e metiamida), segunda (ranitidina) ou terceira geração
(nizatidina e famotidina). A biotransformação de cimetidina, ranitidina e
famotidina é hepática. A cimetidina tem baixa meiavida sérica, estando esta
aumentada nos pacientes com insuficiência renal. A nizatidina é eliminada
principalmente pelos rins e sua biodisponibilidade é próxima a 100%, (ocorre
pouca biotransformação de primeira passagem). Apesar da ampla distribuição
dos receptores H2 no organismo, os antagonistas destes receptores
praticamente não interferem com outras funções do organismo. Apresentam
especificidade por este tipo de receptor, sendo capazes de impedir as ações da
histamina por ele mediadas, como, por exemplo, na estimulação da secreção
gástrica, contração da musculatura uterina e efeitos no sistema cardiovascular.
No entanto, o uso destes agentes pode interferir na absorção de medicamentos
pHdependentes. Além disso, a ranitidina e a nizatidina possuem efeito
procinético por apresentarem também efeito anticolinesterásico, aumentando a
motilidade gastrintestinal e podendo agravar os quadros em que há obstrução
do sistema digestório. Entre os efeitos colaterais destes medicamentos estão
náuseas, diarreia ou constipação intestinal, prurido e perda da libido. Efeitos no
SNC, como alucinações, podem ocorrem em pacientes idosos ou após a
administração pela via intravenosa. Por inibir o sistema oxigenase de função
mista do fígado, a cimetidina pode interferir na biotransformação de inúmeros
fármacos (como diazepam, varfarina, fenitoína, quinidina, carbamazepina,
teofilina, imipramina), causando aumento da concentração sérica destas
substâncias; além disso, a dosagem da cimetidina deve ser reduzida nos
indivíduos com insuficiência renal e hepática. Foi descrita a ocorrência de efeito
antiandrogênico e estimulante da prolactina e diminuição da contagem
espermática com o uso da cimetidina. Fármacos que dependem de meio ácido
para a absorção, como o cetoconazol, podem ter sua eficácia reduzida quando
da administração concomitante com os antagonistas H2 .

H3
Os receptores H3 são expressos primariamente nos neurónios pré-
sinápticos apresentando-se, portanto, com maior densidade no sistema
nervoso central onde, além de modularem a libertação da histamina, exercem
efeitos sobre a libertação de outros neurotransmissores como a acetilcolina,
dopamina, serotonina, noradrenalina e ácido γ-aminobutírico.
Então, os anti-histamínicos H3 se apresentam como uma nova classe
terapêutica para o tratamento de patologias como a doença de Alzheimer,
esquizofrenia, obesidade e narcolepsia. Embora os antagonistas H3 ainda não
sejam usados na prática clínica, o conhecimento desses receptores e
consequente desenvolvimento de compostos que atuem nos mesmos tem
revelado interessantes aplicações terapêuticas desses agentes em várias
patologias consideradas até o momento incurável.

Anti-histamínicos
Os anti-histamínicos do H3R podem ser divididos em dois grandes
grupos de acordo com a sua estrutura: anti-histamínicos imidazólicos e anti-
histamínicos não imidazólicos. As modificações na estrutura base conduziram à
obtenção de novos compostos que diferem dos iniciais principalmente a nível
de potência, afinidade e ação terapêutica. O local de ligação para os
antagonistas H3R foi determinado por estudos mutagênicos, concluindo-se que
este se localiza na região entre o aspartato 114 (Asp 114) e glutamato 206 (Glu
206). Os receptores H3 são caracterizados pela presença de um resíduo de
ácido aspártico altamente conservado na hélice 3. Este resíduo mostrou ser
importante para a ligação de ligandos contendo o grupo amina básico. Ambos
os resíduos localizados nas extremidades opostas do local de ligação, Asp 114
e Glu 206, podem estabelecer fortes interações eletrostáticas ou ligações de
hidrogénio com os grupos complementares nos ligantes.
Existem fortes indicações de que os ligados destes receptores podem
ser utilizados para corrigir várias desordens do SNC apresentando especial
interesse para correção de distúrbios cognitivos e está comprovado também
que interferem nos processos de memória. Na realidade, estudos em ratos têm
demonstrado que os antagonistas de H3R melhoram a taxa de aprendizagem.
Existem algumas sugestões de que a memória é reforçada como resultado dos
efeitos de antagonistas dos receptores H3 e, deste modo, estas moléculas
podem também ser úteis, em particular, no tratamento da doença de Alzheimer.

H4
O receptor H4 foi recentemente descoberto e pensa-se que desempenhe
um papel na regulação da resposta inflamatória.
Esses encontram-se acoplados à proteína Gi/0 e apresentam uma
sequência proteica semelhante aos receptores H3.
Os receptores H4 são principalmente expressos nas células do sistema
imunológico, como os eosinófilos, linfócitos T, células dendríticas, mastócitos e
basófilos. Recentemente, também foi detectada a expressão de receptores H4
no SNC.
A ativação dos receptores H4 ainda não é muito bem compreendida,
contudo, sabe-se que a ativação destes receptores induz a quimiotaxia dos
eosinófilos e mastócitos e desencadeia a mobilização de cálcio nos mastócitos,
monócitos e eosinófilos. Além disso, os receptores H4 modulam a libertação de
vários mediadores inflamatórios.
Os receptores H4 quando cativados regulam negativamente a
Adenilciclase inibindo a produção de cAMP (Monofosfato de adenosina cíclico)
e, consequentemente a inibição do fator CREB (Proteína de ligação ao
elemento de resposta ao cAMP) que é responsável pela transcrição de vários
genes. A subunidade βγ está envolvida na ativação da fosfolipase Cβ (PLC-β)
que hidroliza outros mensageiros que levam ao aumento das concentrações de
cálcio intracelular. A ativação da Gi/oα estimula o MAPK que atua na regulação
genética.
A presença de receptores H4 em células imunológicas sugere que este
novo receptor da histamina desempenha um papel importante na modulação
do sistema imunológico. Esta hipótese é apoiada pelo fato destes receptores
serem modulados pela interleucina 10 (IL-10) e pela interleucina 13 (IL-13) e
pelos sítios de ligação de fatores de transcrição regulados por citoquinas, tais
como o elemento de resposta estimulado pelo interferon, o NFκB (Factor
nuclear kappa B) e o fator nuclear-IL6 (NF-IL6) estarem presentes a montante
do gene do receptor H4.
As funções fisiológicas dos receptores H4 incluem a libertação de
interleucina 16 (IL-16) por CD8+ mediada pelas células T, respostas
quimiotácticas e alterações do citoesqueleto dos eosinófilos, quimiotaxia e
mobilização de cálcio intracelular em mastócitos e controlo da produção de
leucotrieno B4 pelos mastócitos que, posteriormente, leva a um recrutamento
neutrofílico.

Anti-histamínicos
Como referido, os receptores H4 apresentam uma grande semelhança
proteica com os receptores H3. Estudos demonstraram que a maioria dos
ligantes dos receptores H3 contendo imidazol, apresentam uma afinidade
significativa para os receptores H4.
O receptor H4 pode então ser ativado pelos agonistas H3R como
immepit, imetit e (R)-α-metilhistamina.
Além disso, o receptor H4 é ativado pela burimamida, antagonista H2R-
H3R e o antagonista H3R, clobenpropit.
Em relação ao local de ligação do ligando ao receptor H4 ainda pouco se
sabe. Contudo, a bolsa de ligação da histamina tem sido identificada como
contendo três domínios transmembranares: TM3, TM5 e TM6.

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