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Eficácia das Normas Constitucionais

Bem vindo ao Espaço dos Concursos,


Analisarei hoje o tema eficácia e aplicabilidade das normas constitucionais. Ressalto
que o tema é usualmente explorado tanto pelas provas da ESAF, do CESPE e da FCC.

Existem diversas classificações que tratam da aplicabilidade das normas constitucionais,


entretanto, a classificação mais exigida nos concursos foi consagrada por JOSÉ
AFONSO DA SILVA que divide a aplicabilidade em normas de eficácia plena,
contida e limitada.

Antes de comentar, entretanto, a classificação de José Afonso da Silva, cabe registrar,


apenas para compreender a evolução histórica, que a doutrina tradicional dividia a
eficácia jurídica das normas constitucionais em normas auto-executáveis (self-
executing) e normas não auto-executáveis. As normas auto-executáveis, como o
próprio nome revela, seriam aquelas normas completas e prontas para produzirem todos
os seus efeitos de forma imediata. Não dependeriam, portanto, de nenhuma norma ou
circunstância ulterior. As normas não-executáveis, ao contrário das auto-executáveis,
ficariam aguardando uma normatividade posterior para ficarem aptas a produzirem os
seus efeitos.

Essa vertente tradicional é bastante criticada e não é mais aceita pelas bancas
examinadoras.

A principal crítica consiste no fato de que essa corrente esteriliza em grandes parte os
efeitos de uma nova Constituição. De fato, se grande parte das normas constitucionais
fossem não auto-executáveis e se as normas assim rotuladas não tivessem aptidão para
produzirem efeitos, significaria que a nova constituição teria seus efeitos bastante
restringidos.

Calha lembrar a lapidar frase de Luís Roberto Barroso “O Direito existe para realizar-se
e o Direito Constitucional não foge a esse desígnio.”

A corrente moderna parte do seguinte pressuposto lógico: Todas as normas


constitucionais devem em maior ou menor grau apresentar alguma eficácia. Não existe,
portanto, de acordo com essa nova vertente, normas constitucionais completamente
desprovidas de eficácia. Dessa forma, não se dividem as normas constitucionais em
norma de eficácia imediata e normas sem eficácia, mas sim em normas com maior
eficácia e normas com menor eficácia.

A classificação de José Afonso da Silva se enquadra dentro dessa nova perspectiva.

RESUMO DA CLASSIFICAÇÃO TRICOTÔMICA DE JOSÉ AFONSO DA


SILVA

A) Normas Constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade imediata;


B) Normas Constitucionais de eficácia contida e aplicabilidade imediata, mas
suscetíveis a restrições.

C) Normas Constitucionais de eficácia limitada ou reduzida

- - - - - C1) de princípio organizativo ou institutivo

- - - - - C2) de princípio programático

Assim de acordo com o doutrinador paulista as normas constitucionais podem


apresentar eficácia plena, contida ou limitada.

Normas de eficácia plena são aquelas que, com a entrada em vigor da Constituição,
apresentam eficácia plena e integral, independentemente de legislação ulterior. São
normas que bastam a si mesmas e não precisam do legislador infra-constitucional para
alcançarem sua plena eficácia. Constituem exemplos de norma de eficácia plena: a
forma federativa de estado, a separação de poderes, a inviolabilidade do domicílio, a
duração semanal de 44 horas, os bens da União, a competência privativa da União, a
competência concorrente, o princípio da legalidade, os remédios constitucionais etc. A
Fundação Carlos Chagas (FCC), em 2002, no concurso para Promotor de Justiça de
Pernambuco designou como escorreita a seguinte assertiva:

“Quanto à aplicabilidade das normas de um novo texto constitucional promulgado,


pode-se dizer que uma norma tem eficácia plena quando produz todos os seus efeitos
tão logo esteja em vigor, independentemente de sua regulamentação.” A afirmativa
está correta.

Em 2006, a FCC no concurso para Procurador de Contas do Amazonas, explorou o


assunto:

“Considerando a classificação doutrinária predominante no tocante à aplicabilidade


das normas constitucionais, a norma constitucional que estabelece que “ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”, e que
expressa o princípio da legalidade, é norma de eficácia plena e de aplicabilidade
imediata.”

Naturalmente a afirmativa está correta, uma vez que o princípio da legalidade produz
todos os seus efeitos independentemente de sua regulamentação posterior.

Normas de eficácia contida (ou normas de eficácia restringível na linguagem de Maria


Helena Diniz) são aquelas normas que, com a entrada em vigor da Constituição, estão
aptas a produzir todos os seus efeitos, mas podem ter sua eficácia restringida pela
legislação infraconstitucional. O exemplo sempre lembrado de normas de eficácia
contida é o comando do art. 5º, inc XIII, da Constituição Federal, que dispõe:

“é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações


profissionais que a lei estabelecer”

Assim, a princípio, se inexistisse lei regulamentando o exercício de qualquer trabalho,


ofício ou profissão, valeria a regra da inteira liberdade na escolha e exercício de
qualquer trabalho, ofício, ou profissão (obviamente essas leis existem e regulamentam o
exercício de variadas profissões, tais como a profissão de advogado, médico, dentista
etc).

Outros exemplos ilustrativos de normas de eficácia contida estão nos incisos XV e XVI,
do mesmo artigo, que estipulam:

XV “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer


pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”

XVI “todos podem reunir-se pacificamente sem armas, em locais abertos ao público,
independentemente de autorização, desde que não frustem outra reunião anteriormente
convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso a autoridade
competente”.

O direito de reunião, consagrando no inciso XVI, pode ser restringido no estado de


defesa e no estado de sítio, como prescrevem o art. 136 e 139 da CF.

Assim, a norma de eficácia contida além de ser restringível por norma


infraconstitucional, pode ser reduzida por outro comando da própria Constituição
Federal.

Cabe registrar, por derradeiro, que a normas de eficácia contida também podem ser
restringidas por conceitos jurídicos vagos, cuja redução se operacionaliza pelo Poder
Público. Assim, podemos concluir que as normas de eficácia contida são de
aplicabilidade direta e imediata, no entanto, podem ter seu âmbito de aplicação
restringido por uma legislação futura, por outras normas constitucionais ou por
conceitos ético-jurídicos.

A ESAF, em 2003, explorou a norma de eficácia contida:

“ Segundo a melhor doutrina, as normas de eficácia contida são de aplicabilidade


direta e imediata, no entanto, podem ter seu âmbito de aplicação restringido por uma
legislação futura, por outras normas constitucionais ou por conceitos ético-jurídicos”
Correta.

Na prova da OAB/SP 117

“São normas constitucionais de eficácia contida aquelas:


a) em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a
determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva do legislador
infraconstitucional.” Correta

Já analisamos as normas de eficácia plena e contida e agora vamos nos debruçar sobre
as normas de eficácia limitada.

Normas constitucionais de eficácia limitada são aquelas que apresentam “aplicabilidade


indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses
após uma normatividade ulterior que lhe desenvolva a aplicabildiade” José Afonso da
Silva. Em 2005, a ESAF cobrou o tema na prova de AFC:
“ Uma norma constitucional de eficácia limitada não produz seus efeitos essenciais
com a sua simples entrada em vigor, porque o legislador constituinte não estabeleceu
sobre a matéria, objeto de seu conteúdo, uma normatividade suficiente, deixando essa
tarefa para o legislador ordinário ou para outro órgão do Estado.” Correta

Em janeiro de 2007, na prova de Auditor Fiscal do Ceará, a ESAF indagou novamente:

“As normas constitucionais de eficácia limitada estreitam-se com o princípio da


reserva legal, haja vista regularem interesses relativos à determinada matéria,
possibilitando a restrição por parte do legislador derivado.”

A afirmativa é falsa. A lei, na norma de eficácia limitada, vem para potencializar a


eficácia da norma e não para restringir. Ademais, não existe esse vínculo necessário
entre norma de eficácia limitada e princípio da reserva legal. A norma de eficácia
limitada pode depender também da ação dos administradores para seu cumprimento
integral. A norma programática, por exemplo, que constitui uma modalidade de norma
de eficácia limitada, estabelece um programa para serem cumpridos por todos os órgãos
do estado (legislativos, executivos, jurisdicionais e administrativos).

Vários alunos já me confidenciaram que às vezes esquecem, na hora da prova, a


diferença entre norma de eficácia contida e norma de eficácia limitada. A primeira dica
para evitar o branco se encontra na própria leitura da palavra. Norma de eficácia
limitada é a mais limitada das três. Ou seja, é aquela que, ao ingressar no ordenamento
jurídico, apresenta a menor eficácia. Essa é apenas uma pista contra o esquecimento
imprevisível que costuma aparecer nas horas mais inoportunas.

Entretanto, obviamente, as distinções não param por aí. A norma de eficácia limitada,
ao ingressar no ordenamento jurídico, fica dependendo de uma normatividade para
potencializar toda a sua eficácia. A regulamentação vai permitir à norma de eficácia
limitada produzir seus principais efeitos, ampliando, obviamente, a eficácia da norma.

No caso da norma de eficácia contida ela produz todos os seus efeitos e pode ser
restringida por outras normas. Ou seja, como regra, a regulamentação amplia os efeitos
norma de eficácia limitada e restringe os efeitos da norma de eficácia contida.

Isso ocorre porque a norma de eficácia limitada ingressa no ordenamento jurídico com
uma eficácia mínima, desprovida, dessa forma, de seus principais efeitos até a sua
devida regulamentação. Não se pode afirmar, entretanto, que a norma de eficácia
limitada não produzirá efeito jurídico algum, enquanto não for regulamentada,
uma vez que ela produzirá pelo menos o efeito negativo, quando afastar a
aplicação de normas infra-constitucionais que com ela sejam incompatíveis. Isto é,
a norma de eficácia limitada produz pelo menos o efeito de impedir a continuidade
ou o surgimento de preceitos antagônicos ao seu conteúdo.

CESPE-PROCURADOR-2004

“ No caso das normas constitucionais conhecidas como programáticas, assim como


no das classificadas como de eficácia limitada, é juridicamente válido o advento de
norma infraconstitucional que lhes seja contrária, justamente porque a eficácia delas
é deficiente.’
COMENTÁRIOS

Alternativa evidentemente errada. Não se pode afirmar que a norma de eficácia limitada
não produzirá efeito jurídico algum, enquanto não for regulamentada, uma vez que ela
produzirá pelo menos o efeito negativo, quando afastar a aplicação de normas
infraconstitucionais que com ela sejam incompatíveis. Isto é, a norma de eficácia
limitada produz pelo menos o efeito de impedir a continuidade ou o surgimento de
preceitos antagônicos ao seu conteúdo. E, portanto, seria juridicamente inválido o
advento de uma norma infra-constitucional que lhes seja contrária.

O exemplo clássico sempre lembrado pelos doutrinadores é o da fixação da taxa de


juros reais em 12% ao ano pelo poder constituinte originário (o art. 192 da CF fixava o
teto de 12% para a taxa de juros reais, entretanto esse artigo foi revogado pela Emenda
Constitucional nº 45.) Essa limitação, na prática, nunca foi respeitada. Sustentou-se na
época que essa limitação era uma norma de eficácia limitada.

Cabe destacar, que José Afonso da Silva, classificava as normas de eficácia limitada
em duas modalidades: normas de princípio institutivo (ou organizativo) e normas
de princípio programático.

As normas de princípio institutivo são aquelas, nas palavras de José Afonso da Silva,
que contêm esquemas gerais de estruturação das instituições, órgãos ou entidades, pelo
que poderiam chamar-se normas de princípio orgânico ou organizativo. Assim, essas
normas contêm esquemas gerais que vão ganhar contorno com a lei. A lei, com base nas
diretrizes fixadas pelas normas de princípio institutivo, estruturará as instituições.

O art. 224, da CF (situado no capítulo V- Da comunicação Social, do Título XVII- Da


ordem social) é um exemplo de norma de princípio institutivo: “Art. 224. Para os efeitos
do disposto neste Capítulo, o Congresso Nacional instituirá, como seu órgão auxiliar, o
Conselho de Comunicação Social, na forma da lei”.

As normas de princípio programático “são normas constitucionais através das quais o


constituinte limitou-se a traçar-lhes os princípios para serem cumpridos pelos seus
órgãos (legislativos, executivos, jurisdicionais e administrativos), como programas das
respectivas atividades, visando à realização dos fins sociais do Estado” (José Afonso da
Silva). Constituem, na verdade, verdadeiros programas de Estado (projetos políticos) a
serem cumpridos e operacionalizados pela legislação hierarquicamente inferior e pelos
órgãos públicos.

Existe atualmente um seguro consenso que as norma programáticas não são meras
exortações morais, destituídas de eficácia jurídica.

São exemplos ilustrativos de normas programáticas: o art. 205 da CF que fixa: “Art.
225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.”;

e o art. 227 da CF que prescreve:” É dever da família, da sociedade e do Estado


assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo
de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.”

Por hoje é só,

O espaço dos concursos estará sempre buscando satisfazê-lo

Um abraço

Luís de Gonzaga
luis@espacodosconcursos.com.br

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