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O negócio jurídico
Paulo Pichel
2008
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
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TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Índice
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Exteriorização: ............................................................................................................................................................... 17
Expedição: ..................................................................................................................................................................... 17
Recepção: ....................................................................................................................................................................... 17
Conhecimento: ............................................................................................................................................................... 17
FASES DE EXISTÊNCIA DE DECLARAÇÕES NEGOCIAIS NÃO REPTÍCIAS: ................................................................................. 17
MOMENTO EM QUE A DECLARAÇÃO NEGOCIAL GANHA EFICÁCIA (VINCULA O DECLARANTE DE TAL FORMA QUE ESTE NÃO
SE PODE RETRACTAR) [TEORIAS]:......................................................................................................................................... 17
MOMENTO EM QUE A DECLARAÇÃO NEGOCIAL FICA PERFEITA DE ACORDO COM O CÓDIGO CIVIL: ...................................... 18
CONCLUSÃO DO CONTRATO ................................................................................................................................................. 19
A PROPOSTA CONTRATUAL E A SUA ACEITAÇÃO .................................................................................................................. 19
Distinção entre convite a contratar e proposta contratual ............................................................................................ 19
Convite a contratar: ....................................................................................................................................................... 19
Passos para a conclusão de um contrato ....................................................................................................................... 19
Modo de vinculação do proponente/ duração da proposta contratual (art.228º) .......................................................... 20
Aceitação eficaz da proposta ......................................................................................................................................... 20
DISSENSO MANIFESTO E OCULTO/LATENTE .......................................................................................................................... 21
OS EFEITOS REAIS DA CONCLUSÃO DO CONTRATO ............................................................................................................... 21
A CONCLUSÃO DO CONTRATO COM BASE EM CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS ................................................................ 22
As vantagens do recurso à contratação “standardizada” (cláusulas gerais) ................................................................ 22
Os problemas específicos das cláusulas contratuais gerais: ......................................................................................... 22
A CULPA IN CONTRAHENDO (ART. 227º)............................................................................................................................... 23
Comparação entre art. 227º e art. 229º,1 (2ª parte): ..................................................................................................... 24
AS RELAÇÕES CONTRATUAIS DE FACTO ; PROBLEMA DA SUA EXISTÊNCIA ........................................................................... 24
A REPRESENTAÇÃO NA CONCLUSÃO DO CONTRATO ............................................................................................................. 25
A REPRESENTAÇÃO: ............................................................................................................................................................. 25
OS INCAPAZES E A REPRESENTAÇÃO: ................................................................................................................................... 25
A REPRESENTAÇÃO NO CÓDIGO CIVIL: ................................................................................................................................. 25
PRINCÍPIOS GERAIS; DELIMITAÇÕES PARA COM FIGURAS SEMELHANTES.............................................................................. 25
DISTINÇÃO ENTRE REPRESENTAÇÃO OU DO REPRESENTANTE COM OUTRAS FIGURAS E INSTITUTOS: ................................... 26
Art. 259º - falta ou vícios da vontade e estados subjectivos relevantes ......................................................................... 26
Art. 260º - justificação dos poderes do representante .................................................................................................... 27
Art. 261º - negócio consigo mesmo ................................................................................................................................ 27
A PROCURAÇÃO E OS SEUS EFEITOS ..................................................................................................................................... 28
Art. 263º - capacidade do procurador ........................................................................................................................... 28
Art. 264º - substituição do procurador........................................................................................................................... 28
Art. 265º - extinção de procuração ................................................................................................................................ 28
Art. 266º - protecção de terceiros: ................................................................................................................................. 29
PROCURAÇÃO GERAL E PROCURAÇÃO ESPECIAL .................................................................................................................. 29
Art. 268º - representação sem poderes........................................................................................................................... 29
Art. 269º - abuso de representação ................................................................................................................................ 30
PARTE III - OS NEGÓCIOS JURÍDICOS COM EFICÁCIA LIMITADA ................................................................... 30
OS NEGÓCIOS JURÍDICOS COM EFEITOS SUBORDINADOS A CONDIÇÃO OU TERMO................................................................. 30
A CONDIÇÃO ........................................................................................................................................................................ 31
A condição suspensiva ................................................................................................................................................... 33
A condição resolutiva ..................................................................................................................................................... 34
O TERMO.............................................................................................................................................................................. 34
OS ENCARGOS OU CLÁUSULAS MODAIS................................................................................................................................ 34
OS NEGÓCIOS JURÍDICOS COM EFEITOS DEPENDENTES DE RATIFICAÇÃO .............................................................................. 35
OS NEGÓCIOS DOS INSOLVENTES E DOS FALIDOS CELEBRADOS SEM PODERES DE REPRESENTAÇÃO: .................................... 35
OS NEGÓCIOS CELEBRADOS SEM PODERES DE VINCULAÇÃO: ............................................................................................... 36
OS NEGÓCIOS JURÍDICOS COM EFICÁCIA RELATIVA .............................................................................................................. 36
PARTE IV - INTERPRETAÇÃO E A INTEGRAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL (ARTS. 236º, 237º,238º,
239º) ........................................................................................................................................................................................ 38
A INTERPRETAÇÃO............................................................................................................................................................... 38
A INTEGRAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL ....................................................................................................................... 40
PARTE V - A INVALIDADE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS ......................................................................................... 40
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Negócio Jurídico – “Declaração de vontade privada que visa a produção de um efeito jurídico que se
verifica conforme a ordem jurídica por ter sido querido pelas partes” 1
Referência histórica:
o Apenas no séc. XVIII foi introduzido na linguagem jurídica o conceito de negócio jurídico.
o Séc. XIX – contrapõe-se negócio jurídico a factos ilícitos (Heise).
o Savigny (doutrina clássica) – sublinha a importância da vontade no negócio jurídico, usando
quase exclusivamente o conceito de declaração de vontade.
Não existe o tipo legal “negócio jurídico”. O que existem são os mais diversos tipos legais de
negócios jurídicos que têm como característica transversal apresentarem uma finalidade no sentido da
produção de efeitos jurídicos e de visarem, de uma maneira volitiva, a criação de relações jurídicas.
1
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.417.
2
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.420.
3
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.420.
4
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.421.
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Nota: elementos essenciais e acidentais situam-se no mesmo plano pois resultam da vontade das partes.
Elementos naturais resultam da lei, sendo esta que estabelece o tipo negocial e suas características (e
não em atenção à vontade das partes, no entanto, normalmente a lei encontra soluções que as partes
teriam querido adoptar uma vez que é objectivo da lei contribuir para a auto-realização das partes).
Pressupostos essenciais para que se possam produzir os efeitos jurídicos pretendidos pelo negócio:
1. Em termos subjectivos, é necessária uma vontade dirigida aos efeitos e manifestada
numa declaração de vontade.
2. É necessária uma declaração de vontade – exteriorização da vontade, criando um
vínculo jurídico.
3. Em termos objectivos, é necessária a garantia da produção dos efeitos jurídicos pela
ordem jurídica (através do direito objectivo).
A declaração de vontade
Declaração de vontade – declaração negocial pela qual se manifesta a vontade que visa a produção de
negócios jurídicos.
Nota: a não existência de um negócio jurídico devido à inexistência de uma declaração negocial não
implica que não exista um outro facto jurídico ao qual a lei poderá ou não atribuir efeitos inclusive com
sanção. Têm uma natureza não negocial (Cf. art. 246º).
5
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.421.
6
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.421.
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Nota2: A falta de declaração de vontade não deve ser confundida com uma vontade invalidamente
formada ou manifestada. Aqui, já existe um negócio jurídico embora com os seus efeitos prejudicados
ou afectados pela invalidade, sendo estes efeitos, porém, sempre de natureza negocial.
Situações em que não basta a declaração de vontade para que se forme um negócio jurídico:
o São situações em que o próprio negócio é integrado não só pelas declarações como, para além
das mesmas, por outros actos que nele intervêm.
o “Assim, pode acontecer que o negócio jurídico inclua, alem das declarações de vontade,
determinados actos reais ou materiais.”7
o Exemplos: contratos reais (comodato-1129º; mútuo-1142º, depósito-1155º). Aqui, o acto
material de entrega faz parte, ao lado das declarações negociais, do próprio negócio jurídico.
7
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.420 e 421.
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“São intervenientes no negócio jurídico as partes que nele acordaram sendo, por isso, abrangidas
pelos seus efeitos”8
Por via de regra, os efeitos de um negócio jurídico produzem-se apenas entre as pessoas, pois são
estas que os querem, tendo acordado neles.
“Da necessidade de um acordo resulta, sem mais, que efeitos jurídicos negociais, normalmente não
procedem de um comportamento unilateral.”
Situações em que é possível um sujeito conformar relações jurídicas de uma maneira unilateral:
o Exercício de um direito já constituído – ex. direito potestativo e acção directa.
o Quando o acto afecta só o património próprio – ex. renúncia a um direito, testamento.
o Quando não são atingidos direitos de outrem – ex. ocupação de coisas sem dono.
o Quando o acto traz uma vantagem jurídica para o visado – ex. proposta da conclusão de um
contrato.
Limitações:
Limitação de auto-vinculações:
o De acordo com o art. 457º, as auto-vinculações estão circunscrita àquilo que é
legalmente admitido.
o “Não é possível atribuir, por via interpretativa, um sentido “objectivo” a uma conduta
com vista à criação de uma obrigação da parte do agente que se teria “auto-vinculado”
com semelhante conduta.”9 Tal implica uma limitação do princípio da autonomia
privada (não significando que não possa haver condutas criadoras de confiança como é o
“venire contra factum próprio” em que o agente cria a confiança ou saberá que o outro
confia).
Impossibilidade de estabelecer, por acto unilateral, relações jurídicas que favoreçam outras pessoas:
o “A ordem jurídica exige o consentimento prévio do outro ou, faltando este
consentimento, a aceitação ou a ratificação. Não querendo o outro aceitar ou ratificar o
acto, ele recusa a relação jurídica favorável”10. Exemplos: remissão de uma dívida
(863º), doação (940º,1), testamento (2179º; 2062º).
o “Também por via contratual não é possível favorecer terceiros contra a sua vontade”11.
Exemplos: contratos a favor de terceiros (447º e 443º), contrato com efeitos protectores
para terceiros. Aqui, os terceiros são favorecidos ou protegidos se o quiserem.
Impossibilidade de negócios que produzam efeitos em desfavor de um terceiro alheio ao negócio:
8
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.422.
9
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.423.
10
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.423.
11
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.423.
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o Duas partes celebram um contrato de compra e venda a respeito de um objecto que não
lhes pertence.
o Os parceiros sociais acordam um contrato colectivo de trabalho que ultrapassa os limites
funcionais da contratação colectiva e as suas razões justificativas.
o (São negócios INEFICAZES em relação aos visados que não intervieram e NULOS para
em relação às partes que o celebraram.
o NOTA: “há situações em que alguém age em vez de outrem como parte-outorgante do
negócio. É este o caso da representação, tanto voluntária como legal. Aqui, os negócios
celebrados pelo representante produzem os seus efeitos na esfera e na pessoa do
representado. Agir em nome ou em vez de outrem significa, por isso, agir dentro de
vinculações, determinadas pela autonomia do representado no caso da representação
voluntária, ou decorrentes dos interesses de um incapaz no caso da representação legal.
Daí que o agir em nome do representado não se verifica em função da autonomia e da
auto-realização do agente (representante), mas em atenção à autonomia ou interesse
daquele que suporta os efeitos (representado).”12
Negócio jurídicos que para além de declarações negociais exigem a intervenção de autoridades
públicas:
o Casamento civil – presença de um funcionário do registo civil (1628º e 1630º).
o Contrato de compra e venda de bens imóveis – necessidade de escritura pública (875º).
o Negócios jurídicos celebrados pelos pais como representantes dos filhos menores sem
autorização do tribunal são anuláveis (1893º/1894º).
o As intervenções das várias autoridades públicas têm graus de intensidade diferentes, pelo que a
sua falta terá efeitos diferentes:
o Casamento – a presença do funcionário faz parte do tipo negocial, a sua ausência torna o
casamento juridicamente inexistente.
o Notário/ tribunal – a sua intervenção no processo prende-se com pressupostos de
validade, assim, a sua ausência torna o negócio jurídico inválido.
Negócios jurídicos que exigem a intervenção de outros particulares afectados pelo negócio para alem
de uma declaração de vontade:
o Consentimento pessoal de outros familiares.
o Consentimento do representado no caso do conflito de interesses.
o Negócios do inabilitado que estão sujeitos à autorização do curador (art.153º).
12
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.424.
10
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13
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.427.
14
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.428.
15
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.428.
16
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.428.
11
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Critério da forma:
o Negócios não solenes/ não formais – celebram-se de acordo com a vontade das
partes não sendo necessária qualquer formalidade especial. (Princípio da liberdade
de forma + princípio da liberdade declarativa 217º realização do princípio da
autonomia privada).
o Negócio solenes/ formais – negócios jurídicos que para serem concluídos exigem o
preenchimento de certa formalidade.
Critério do modo de formação:
o Negócio consensuais – “o contrato fica perfeito com o simples acordo das partes.”18
o Real – é necessário, para alem do acordo, um acto material (ex. depósito 1155º,
mútuo 1142º, comodato 1129º). No entanto, nestes casos, deve ser possível
considerar o contrato concluído com efeitos obrigacionais já no momento do acordo
e sem qualquer entrega, se tal corresponder à vontade das partes.
o Nota: negócio consensual pode também ser oposto a negócio formal.
Critério da natureza da relação jurídica constituída:
o Negócios obrigacionais – vale o princípio da liberdade contratual.
o Negócio reais – o princípio da liberdade contratual está afastado quanto à liberdade
de fixação do conteúdo (numerus clausus).
o Negócios familiares:
Pessoais – exclusão do princípio da liberdade de fixação do contrato.
Patrimoniais – o princípio da liberdade de fixação de conteúdo depende da
natureza obrigacional ou real.
Negócios entre vivos e mortis causa:
Entre vivos – produzem os seus efeitos em vida das partes.
Mortis causa – produzem os seus efeitos depois da morte das partes ou de uma delas. É comum
serem negócio jurídicos livremente revogáveis exceptuando certas convenções antenupciais.
17
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.429.
18
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.430.
12
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19
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.435.
20
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.437.
21
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.437.
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legais, a declaração negocial é atingida por esse facto e, conforme os casos, não existente ou inválida,
repercutindo-se a invalidade sobre os seus efeitos ou simplesmente irregular (podendo ser rectificado).
Teoria da declaração – o elemento decisivo é o elemento externo, objectivo; A declaração tal como o
declaratário, dentro dos limites da boa fé, da confiança e da segurança no tráfico jurídico, podia e devia
entender o comportamento no qual ela se traduz.
Definição de Manuel de Andrade – “todo o comportamento de uma pessoa que, segundo os usos da
vida, convenção dos interessados ou por disposição legal aparece como destinado a exteriorizar um
certo conteúdo de vontade negocial, ou em todo o caso o revela e traduz.” [visão objectivista].
Código civil – não toma uma posição clara mas estabelece determinadas directrizes que impedem uma
solução subjectivista e que fornecem soluções objectivistas. A vontade como elemento subjectivo não é
negada, mas o significado da vontade pode estar condicionado pelas opções do código e pela
concepção social do direito privado que não olha o indivíduo de forma isolada mas num determinado
contexto social.
Existem situações em que a lei afasta o princípio da liberdade declarativa, exigindo que a declaração
negocial seja expressa. (ex. 590º,2;595º,2;731º,1;957º,1;)
Em sintonia como o princípio da liberdade declarativa (art. 217º,1) o CCiv estabelece o princípio da
liberdade de forma (219º). Assim, por princípio, a forma das declarações é escolhida livremente pelos
declarantes.
Forma convencional:
é a forma estipulada pelos declarantes no âmbito do princípio da liberdade declarativa e da
liberdade de forma.
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As partes tendem a adoptar uma determinada forma voluntária por razões de clareza quanto à
conclusão do negócio e seu conteúdo, a segurança e a facilitação da prova, ou a melhor
ponderação da decisão a tomar no negócio em causa.
As partes podem abandonar a forma apesar da convenção. A exigência de forma feita
voluntariamente pode ser afastada pelas partes através de uma determinação posterior ou
sucessiva em sentido contrário:
o Forma voluntária - Art.222º (forma escrita) o facto de os declarantes adoptarem a forma
escrita não invalida eventuais estipulações acessórias verbais, desde que correspondam à
vontade do declarante. Permite a validade de convenções adicionais ao documento
escrito, mas para se permitir a prova esta tem que ser feita por confissão ou por
documentos que o comprovem (394º).
o Forma convencional - Art.223º (não há uma forma específica) prevê em atenção à altura
em que a estipulação foi feita, dois tipos de efeitos:
1. Estipulação anterior ao negócio que se quer celebrar em seguida – “estabelece
uma presunção relativa no sentido de, as partes, tendo primeiro convencionado a
forma, apenas se querem vincular, no futuro, por meio dela. Sem a observância
da forma convencionada, não haverá vinculação entre elas, a não ser que
diversamente seja provada.”22
2. Estipulação da forma no momento da conclusão ou posterior à conclusão do
negócio – o negócio já está validamente celebrado, mas estabelece-se a
presunção de que as partes querem, mediante a forma convencionada, facilitar a
prova, consolidar o acto ou ter as suas clausulas mais perceptíveis. As partes não
querem ver o negócio substituído. (forma “ad probationem”).
o NOTA: de acordo com o art. 394º, a prova testemunhal não é admitida se tiver por
objecto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento
autêntico ou dos documentos particulares, quer as convenções sejam anteriores,
contemporâneas ou posteriores à formação do documento.
Assim, verifica-se que a lei atribui uma força reduzida à forma convencional.
O não cumprimento da forma convencional não leva à invalidade do negócio jurídico. Presume-se é
que este não se concluiu.
Ao contrário do que acontece com a forma convencional, a lei é muito rígida no que respeita à
observância da forma legal imposta, sendo esta um pressuposto de validade23. (Princípio da ordem
pública + transparência e publicidade)
Existe também a hipótese da forma legal apresentar a forma “ad probationem” não tendo relevância
para a validade do negócio jurídico (obras realizadas por acordo das partes no arrendamento).
A exigência da forma legal visa determinados fins de interesse público ou ordem pública que o
legislador considera superiores ao princípio da autonomia privada e, consequentemente, ao princípio da
liberdade de forma. As finalidades e razões justificativas para a imposição de forma legal são as
seguintes:
1. A ponderação da decisão em ordem a evitar soluções precipitadas ou irreflectidas, como meio
de protecção das partes.
22
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.441.
23
Nota: nulidade – está em causa um elemento essencial do negócio jurídico ou está em causa a ordem pública.
Anulabilidade – estão em causa interesses privados.
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Nota: as exigências legais devem estar de acordo com as características da sociedade (ex. índice de
alfabetização e a exigência de escritura pública).
A importância da determinação do momento em que a declaração negocial está perfeita (tem eficácia/
está apta a produzir os seus efeitos):
Esclarece se uma declaração foi feita tempestivamente ou não.
24
Nota: um cheque é um documento escrito – ordem pagamento dada pelo sacador ao banco a favor da pessoa que está
inscrito como beneficiário ou o portador do cheque.
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Determina a parte que arca com o risco de uma transmissão errada da declaração, ao separar, no
decurso temporal, as esferas de poder do declarante e do declaratário (declarações negociais
receptícias).
Determina o momento a partir do qual o declarante fica vinculado à sua declaração. Tal
importa:
o Conclusão do contrato e da consequente transferência de direitos reais e risco de
perecimento ou deterioração da coisa.
o Data a partir da qual correm os prazos para a anulação da declaração negocial.
Exteriorização:
Corresponde ao momento em que o declarante exprime a sua vontade. A declaração é
formulada ou manifestada.
É neste momento que são analisados os pressupostos de validade da declaração.
A invalidade do negócio jurídico é uma consequência da invalidade da declaração que compõe
o negócio jurídico. (253º, 257º, 255º, 220º).
É neste momento que a declaração ganha existência, o momento em que formulada,
abandonando a esfera interna do declarante.
Expedição:
Corresponde ao momento em que a declaração é expedida pelo declarante.
Nota: “tanto a exteriorização como a expedição verificam-se do lado do declarante, podendo conduzir
ou coincidir com emissão da declaração”25 Ver art. 226º.
Recepção:
É o momento em que a declaração chega ao poder do destinatário de forma a que este possa
tomar conhecimento do seu conteúdo. (entrada na esfera de poder do declaratário).
Conhecimento:
É o momento em que o destinatário toma conhecimento da declaração que lhe foi dirigida.
Nota: embora seja possível separar as quatro fases, tal não implica que elas não possam coincidir no
tempo.
Momento em que a declaração negocial ganha eficácia (vincula o declarante de tal forma que este não
se pode retractar) [teorias]:
25
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.447.
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Para que uma declaração seja eficaz é necessário que esteja de acordo com os arts.224º/225º+226º.
Conclusão do contrato
“As declarações negociais mais importantes são aquelas que conduzem à conclusão de um
contrato.”26
Da leitura do art.232º “podemos deduzir que estamos em face da conclusão de um contrato quando
as partes tiverem chegado a um acordo entre elas sobre todas as cláusulas julgadas necessárias.”27
(enquanto houver dissenso o contrato não se conclui).
Cláusulas objectivamente essenciais – relacionadas com o conteúdo do contrato.
Cláusulas subjectivamente essenciais – são cláusulas que cada uma das partes considera
essencial para a celebração do acordo.
Convite a contratar:
“Sinaliza apenas o interesse ou disponibilidade para entrar em negociações com vista à
posterior conclusão de um contrato (...) constitui um incentivo para que alguém dirija uma
proposta contratual.”28
Não é uma declaração negocial.
Exemplos: pedido de reserva de mesa de um restaurante, exposição de mercadorias nas
montras, envio de catálogos.
No entanto, por exemplo máquinas automáticas nos parques ou com sandes já são propostas
contratuais.
1. Proposta Contratual:
“Constitui elemento imprescindível da certa proposta contratual a sua susceptibilidade
de ser aceite”29
Características:
i. Traduzir uma vontade firme de contratar:
1. Declaração inequívoca do declarante a vincular-se de forma directa e
imediata.
2. Tem de incluir na proposta os elementos objectivamente e
subjectivamente essenciais.
ii. Traduzir uma vontade precisa de contratar:
26
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.454.
27
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.455.
28
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.457.
29
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.457.
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A partir do momento em que a declaração negocial (proposta) se torna eficaz (arts. 224º a 226º), o
declarante fica vinculado à proposta, não podendo retratar-se dos seus efeitos. A Irrevogabilidade30 da
proposta resulta do art. 230º e 231º:
230º,1 – salvo declaração em contrário (na própria proposta ou por outro meio
declarativo idóneo), a proposta do contrato é irrevogável depois de ser recebida pelo
destinatário ou de ser conhecida por ele (nos termos do art. 224º,1.
230º,2 – se o destinatário receber a retratação do proponente antes do recebimento da
proposta ou no momento do recebimento, esta fica sem efeito.
230º,3 – “a revogação da proposta, quando dirigida ao público, é eficaz desde que seja
deita na forma de oferta ou em forma equivalente.”
231º,2 + 224º,2 – proposta não é eficaz.
231º,2 + 234º - possibilidade de “lege ferenda”.
“A caducidade da proposta tem como efeito que o proponente foi completamente desvinculado e
desobrigado da mesma (art.228º).”31
30
Irrevogabilidade da proposta – relaciona-se com questões de segurança no tráfico jurídico e de proteger as legítimas
expectativas do lado do destinatário.
31
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.462.
20
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Enquanto as partes não houverem acordado em todas as cláusulas sobre as quais uma delas julga
necessário o acordo, não há consenso entre elas de modo que o contrato não fica concluído (art.232º).
Está-se perante uma situação de dissenso.
Dissenso oculto/ latente – as partes julgam (erroneamente) ter-se posto de acordo, o contrato não se
conclui (por falta de consenso), a menos que seja de admitir que as partes teriam contratado mesmo
sem acordo acerca do ponto acessório. Neste caso, o contrato não fica celebrado.
Os casos em que o silêncio conduz à formação do contrato, estão expressamente tipificados na lei.
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“A negociação de um contrato nem sempre é feita de uma maneira individual, com cláusulas
ponderadas e acordadas uma por uma … este modo de contratar não é adequado em inúmeras
situações, à vida económica de hoje”.32
“Assim, no tráfico jurídico actual desempenha uma função cada vez mais importante as chamadas
cláusulas contratuais gerais, elaboradas de antemão por uma das partes e destinadas a serem aceites,
sem mais, pela outra”33 (existe uma limitação da possibilidade de negociação de uma das partes).
“Em todo o caso, também as declarações feitas por meio de cláusulas contratuais gerais … são
declarações negociais nos termos dos arts. 217º,219º e ss, 224º e ss, 228º e ss”.34
“Apenas o modo de travar negociações é diferente e racionalizado”.35
“O efeito de racionalização pretendido com recurso a cláusulas gerais pode ser desvirtuado, porém,
e muitas vezes assim sucede, para afastar a liberdade contratual, na medida exacta em que aparecem
cláusulas concebidas unilateralmente no interesse do contratante determinado, que as formulou, sem
hipótese de alteração por parte do aderente que ficou sujeito a elas”.36
Para evitar os efeitos indesejados das CCG, o DL 446/85 de 25 de Outubro, estabelece o regime a que
estas estão sujeitas:
32
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.468.
33
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.468.
34
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.469.
35
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.469.
36
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.469.
22
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Artigo 1º,1 (âmbito de aplicação) – “as cláusulas contratuais gerais sem prévia negociação
individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a
subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma” [note-se que tanto vale para o
proponente como para o destinatário. Tal deve-se ao facto de muitas vezes se assinar “propostas
de adesão” em que é a entidade que recebe a proposta que a pré-elabora].
Artigo 4º - as cláusulas contratuais inseridas em propostas contratuais ficam incluídas nos
contratos pela aceitação, mas apenas desde que sejam observados determinadas disposições
legais.
Artigo 5º,1 – as cláusulas devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes sob pena de não
serem incluídas no contrato e o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao
contraente que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais (art. 5º,3).
Artigo 6º - dever de informação por parte do contraente que usa CCG (ónus).
Artigo 7º - caso haja cláusulas especificamente acordadas elas prevalecem sobre as CCG.
Artigo 8º/9º - as cláusulas não comunicadas ficam excluídas dos contratos individuais.
Artigo 15º - são proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias à boa fé (novidade face ao
CCiv, art, 280º).
Artigo 16º a 19º - concretização do art. 15º.
Artigo 20º a 22º - proibição de cláusulas que possam prejudicar consumidores finais.
Artigo 25º (acção inibitória) – as cláusulas contratuais gerais, elaboradas para utilização futura,
quando contrariem o disposto nos arts. 15, 16, 18, 19, 21 e 22 podem ser proibidas por decisão
judicial, independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares.
Artigo 26º - legitimidade de acção inibitória.
Em princípio, a exclusão ou nulidade de uma CCG não arrasta consigo todo o negócio, mas leva
apenas à não aplicação da respectiva cláusula (art. 9º, 13º, 14º).
Em vez de cláusulas contratuais gerais aplicam-se as normas dispositivas comuns, com recurso, se
necessário às regras de integração dos negócios jurídicos (art. 239º).
“Quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na
formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que
culposamente causar à outra parte”.
A lei estipula, deste modo, uma obrigação de indemnizar por culpa in contrahendo.
A obrigação de indemnizar existe independentemente da formação posterior do contrato ou não (o
art. 227º visa proteger o próprio processo de formação do contrato em todas as suas fases). A
celebração do contrato ou a sua posterior anulação ou declaração de nulidade não afectam a aplicação
do preceito em causa.
A aplicação do art. 227º pressupõe culpa (não basta a simples rotura de negociações), pois não é
lícito a uma das partes romper arbitrariamente as negociações depois destas terem alcançado um tal
desenvolvimento que a outra parte podia julgar-se autorizada a confiar na realização do contrato e,
assim, a fazer despesas, a abster-se de outros negócios, etc...
Mas, por outro lado, pode observar-se que as negociações se destinam precisamente a dar às partes
oportunidades de apreciarem se o contrato deve ser feito e em que termos, portanto, enquanto o
contrato não é celebrado, devem elas ter a liberdade de romper as negociações.
O comportamento adoptado deve coincidir com:
23
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
O dever de cada um dos contraentes se exprimir claramente, a fim de evitar falsas interpretações
do seu comportamento.
Dever de não começar negociações que se saiba de antemão condenadas ao malogro ou à
celebração de um negócio inválido.
Dever de não abandonar arbitrariamente as negociações.
Dever de comunicar à outra parte algum motivo da nulidade do negócio.
Necessidade de sigilo quando se justifica.
O art. 227º deve ser enquadrado no âmbito da responsabilidade civil extracontratual (obrigação
resultante da lei e não da autonomia privada).
Há uma certa doutrina que defende a existência de obrigações contratuais sem a formação de
um contrato por meio das respectivas declarações negociais, unicamente com base num
comportamento de facto/ comportamento social.
Tal doutrina conduz à não aplicação das regras das incapacidades negociais bem como das
disposições referentes às invalidades do negócio a fenómenos e negócio de massa da vida
diária.
São situações em que aparece uma entidade pública (de forma directa ou indirecta) como
fornecedor de um serviço (transportes públicos, gás, electricidade).
São situações em que há uma hipótese de aquele que tem um comportamento social típico
entrar em contacto com uma entidade pública que presta um serviço.
Nestes casos, a conclusão do contrato seria dispensável, seria sempre devida a contraprestação
quando a prestação fosse de facto aceite ou utilizada.
Esta doutrina deve ser rejeitada:
o Ela é supérflua visto o comportamento social-típico coincidir, na grande maioria dos
casos, com a declaração negocial tácita e na vontade correspondente.
o Se o comportamento não traduzir uma vontade subjacente, será possível recorrer ao
disposto no art. 244º, 2, (1ª alternativa) – a reserva mental não conhecida do declaratário
não prejudica a validade da declaração, inclusive da declaração tácita.
o Quando o comportamento observado for contrariado por declarações de protesto
recorre-se ao princípio acolhido nas regras da boa fé e do abuso de direito.
o No caso de menores ou incapazes, será aplicável o art. 127º,1,b) e subsidiariamente o
regime de enriquecimento sem causa.
o Nos casos de relações obrigacionais duradouras originadas por contratos inválidos, as
relações contratuais de facto não servem. O que importa é uma regulamentação
específica em relação ao regime geral do art. 289º.
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TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
o Nos casos do dever jurídico de contratar a figura das relações contratuais de facto é
supérflua e dispensável. Quem está obrigado a contratar deve aceitar as propostas
contratuais que sejam feitas.
O código civil não aceita a doutrina das relações obrigacionais de facto:
Têm raízes colectivizantes.
Rompe o sistema do negócio jurídico e do contrato alicerçado na autonomia privada.
Conduz à inobservância da lei mesmo em casos inequívocos.
Não é compatível com a doutrina da transferência de direitos reais por mero efeito do contrato.
A representação:
Há um representante que participa no tráfico jurídico negocial ou em nome de outrem
(representado).
Os efeitos dos negócios concluídos pelo representado, produzem-se directa e imediatamente, na
esfera do representado.
Os poderes de representação podem resultar:
o Da lei – representação legal.
o Negócio jurídico – representação voluntária.
A figura da representação não põe em causa o princípio da autonomia privada, pelo contrário, é
uma forma da sua efectivação.
Os incapazes e a representação:
Os incapazes não estão em condições para poderem participar no tráfico jurídico negocial.
Assim, compreende-se que não se reconheça aos incapazes capacidade para nomear um
representante voluntário, pois carece de capacidade de exercício para o fazer (123º, 139º, 156º).
[Poderá haver uma excepção à sua incapacidade 127º, 139º, 156º).
Ao ficarem excluídos do tráfico jurídico negocial, os incapazes não poderiam fazer uso da sua
capacidade de serem titulares de direitos e obrigações. Para evitar esta situação, serve a figura
da representação legal:
o Não se trata da realização do princípio da autonomia privada, mas da integração dos
incapazes no tráfico jurídico negocia, muito embora sem actuação própria.
o É uma representação conferida por lei: o representante age dentro de vinculações e
limitações impostas pela função do instituto e pelo facto da sua actuação produzir
efeitos na esfera jurídica de quem não possui capacidade para agir.
A representação no código civil:
Art. 258º a 261º - contem os princípios gerais, aplicáveis a representação voluntária legal.
Art. 262º a 269º - representação voluntária – focam o carácter negocial do instituto.
Nota: não é elemento legal essencial que o representante aja no interesse do representado, embora isso
seja sempre o caso em relação à representação legal.
26
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Nota: compreende-se o relevo dado pela lei à vontade do representante, apesar de o negócio reproduzir
imediatamente os seus efeitos na esfera do representado, visto o papel activo que o representante tem
na celebração do negócio.
Nota 2: o art. 259º aplica-se à representação voluntária e, ainda que indirectamente, à representação
orgânica. O nº1 não faz sentido no caso da representação legal.
27
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Procuração:
Representação voluntária (arts. 262º a 269º).
É um acto jurídico unilateral por meio do qual uma pessoa é nomeada procurador.
Normalmente consta de uma declaração receptícia.
É a posição de poder de representação, resultante de um acto de atribuição.
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outra parte para que ratifique (ou não) ou negócio. Caso tal ratificação não se
verifique no prazo estabelecido, então a outra parte já se pode desvincular.
Ratificação – negócio jurídico unilateral, não necessariamente receptício, destinado a atribuir efeitos a
outro negócios que deles carecem. Os efeitos do negócio jurídico ratificado produzem-se desde o
momento da sua celebração entre as partes, ou seja, entre quem o representante originariamente sem
poderes, tinha concluído o negócio.
Situação diferente é quando alguém age sob nome falso. Caso o agente pretenda concluir o negócio
com efeitos para ele próprio, utilizando falso nome para dissimular a sua identidade, e a outra parte não
se interessa pela identidade mas sim pelo negócio em si, os seus efeitos produzem-se entre quem se
apresenta sobre um falso nome e a outra parte.
Nota: não se trata de abuso de representação quando o procurador, agindo formalmente dentro dos
seus poderes funcionais, e a outra parte colaboram conscientemente para prejudicar o representado –
COLUSÃO – o negócio é nulo pois é ofensivo dos bons costumes nos termos do art. 281º.
“Em certos condicionalismos os efeitos, muito embora o negócio seja perfeitamente válido, não se
produzem desde logo... não se produzem de forma estável…ou não se produzem na íntegra.”37
Os condicionalismos podem encontrar a sua origem na vontade das partes, na lei ou na lei com o
concurso da vontade das partes.
A aplicação de condicionalismos traz alguma instabilidade ao tráfico jurídico uma vez que a
vontade das partes ou o comanda da lei fazem com que os efeitos de um negócio válido não se
desenvolvam plenamente.
“As partes de um negócio jurídico podem subordinar o início ou a cessação da produção dos
seus efeitos à verificação de uma condição ou de um termo”38
Não é necessário que a lei o permita para que seja possível às partes imporem determinadas
condições ou termos a um negócio jurídico. Tal é compreensível à luz dos princípios da
37
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.490.
38
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.490.
30
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
autonomia privada (no entanto, existem situações em que a lei vem expressamente permitir no
de modo a evitar dúvidas – ex. convenções antenupciais art. 1713º,1).
Tanto a condição como o termo têm em comum o facto de serem exteriores ao negócio
(elementos acidentais), estando, no entanto, incidivelmente ligados a eles, uma vez que
determinam a produção dos seus efeitos.
Tanto o termo como a condição são acontecimentos futuros, no entanto, no caso da condição, a
verificação do acontecimento futuro é incerta, no caso do termo, a verificação do acontecimento
futuro é certa.
A condição
“É um elemento querido pelas partes, acrescentado ao negócio. Por ser voluntária, ela distingue-
se das “condições legais” (conditio iuris) que não são condições verdadeiras, mas exigências da
lei como pressupostos para a verificação de determinados efeitos jurídicos (ex. arts. 687º e
1669º). Assim, as condições legais de eficácia,, não são condições no sentido próprio.
Art. 270º,1:
o Condição (própria) – um acontecimento FUTURO e INCERTO ao qual as partes
subordinam a produção ou a resolução dos efeitos do negócio jurídico (as cláusulas
apostas a um negócio jurídico para condicionar a produção dos seus efeitos, que não se
refiram a um acontecimento simultaneamente futuro e incerto são CONDIÇÕES
IMPRÓPRIAS).
Acontecimento futuro – mostra que não são condições neste sentido as reservas
relacionadas com factos presentes ou passados, ou seja, acontecimentos já
verificados, mas que as partes ainda não conhecem (incerteza subjectiva). O
acontecimento em si tem de verificar-se objectivamente no futuro.
Acontecimento incerto – tem como consequência que não são condições neste
sentido, as que se referem a acontecimentos impossíveis ou acontecimentos que
se verificam necessariamente (falta o elemento da certeza).
o A condição pode ser suspensiva ou resolutiva:
Suspensiva – a produção de efeitos de um negócio jurídico fica subordinada a
um acontecimento futuro e incerto.
Resolutiva – a resolução do negócio jurídico fica sujeita à verificação de um
determinado acontecimento futuro e incerto.
271º (condições ilícitas ou impossíveis)
o Art. 271º,1 – Condições próprias mas ilícitas - condições contrárias à lei, à ordem
pública ou ofensiva dos bons costumes:
Não há impossibilidade. “O facto de que fica a depender o efeito ou a resolução
do efeito é possível. O que é contrário à lei (à ordem pública ou ofensivo dos
bons costumes) é a imposição do facto”39. (Ex. o declarante exigir como
condição da eficácia, não sair o destinatário de sua casa).
O negócio jurídico subordinado a uma destas condições é nulo.
“Para saber se a cláusula é ilícita, não é a licitude ou ilicitude do problema, mas a
ilicitude ou licitude do nexo criado entre o facto e a eficácia do negócio, ou seja,
a subordinação querida pelas partes. Um facto lícito pode assim constituir
objecto de uma condição ilícita e uma condição ilícita pode ter por objecto um
facto lícito.”40
39
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.251.
40
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.251.
31
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
41
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.252.
42
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.252.
32
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
A condição suspensiva
O negócio jurídico, embora validamente concluído, não transferiu ainda, ou pelo menos, de
modo definitivo, os direitos ou obrigações que tem por objecto.
O a situação mais importante da condição suspensiva é a reserva de propriedade (art.409º):
o A transferência de direitos reais dá-se por mero efeito do contrato (art. 408º,1 e 879º,a +
954º,a) e 939º). É possível, que nos contratos de alienação o alienante reservar para si a
propriedade da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da outra parte
ou até à verificação de qualquer outro evento.
o A estipulação de uma condição pelas partes conduz, desta forma a um estado de
pendência:
Não existe um direito pleno na pessoa do adquirente.
Há uma EXPECTATIVA JURÍDICA – um direito à aquisição plena.
43
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.253.
33
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
A condição resolutiva
Embora validamente concluído o negócio jurídico não transferiu ainda de modo definitivo os
definitivo os direitos ou obrigações que tem por objecto.
O termo
Momento a partir do qual o negócio jurídico deve começar a produzir os seus efeitos, ou a
deixar de os produzir.
Negócio a termo é aquele em que as partes querem que os seus efeitos só se produzam depois
que se dê um acontecimento FUTURO e CERTO, ou até que este se verifique.
o Acontecimento certo – há a certeza da sua verificação independentemente da incerteza
do momento em que tal acontecerá.
Tipos de termo:
o Termo certo e determinado (dies certus an et certus quando) – aquele que se sabe de
certeza que chegará e quando. (ex. data de um calendário).
o Termo certo e indeterminado (dies certus an et incertus quando) – aquele que se sabe
que chegará, mas sem se saber quando. (ex. morte).
o Termo suspensivo (inicial/ dies quo) – marca o momento a partir do qual o negócio
começa a produzir os seus efeitos.
o Termo extintivo ou final (dies ad quem) – quando assinala o momento em que o negócio
deixa de produzir efeitos.
O contrato decorre, antes da verificação do termo, como se não estivesse sujeito
àquela estipulação.
Verificado o termo, os efeitos do negócio cessam, mas somente para o futuro,
SEM QUALQUER ESPÉCIE DE RETROACTIVIDADE.
Pode ser estipulado no interesse do devedor, do credor ou no interesse comum das partes.
Aquele a favor de quem o termo foi estabelecido pode renunciar a ele, pelo que a renúncia
também é causa da sua extinção.
Aos negócios a termo, aplicam-se com as necessárias adaptações as disposições dos arts. 272º e
273º.
Art. 279º - cômputo do termo.
34
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
44
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.498.
45
Massa insolvente ou falida: destina-se a satisfazer os credores, em condições iguais, até à sua distribuição ou liquidação
total. Trata-se de uma execução global de todo o património penhorável do devedor no interesse de todos os credores.
(Assim, explica-se a razão da perda de disposição dos bens penhoráveis do falido ou insolvente, pois, caso contrário, este
poderia celebrar negócios que prejudicassem esta mesma massa patrimonial).
35
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
46
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.500.
36
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
37
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
A interpretação
Serve para captar o sentido, o próprio conteúdo da declaração, mas não para avaliar o conteúdo
sob o aspecto da sua razoabilidade ou da sua conformidade ou não com a lei.
O objecto da interpretação é a manifestação da vontade, o elemento externo, a própria
declaração negocial.
O fim da interpretação é o sentido da mesma. Este sentido tem de estar de acordo com a função
do negócio jurídico – a autodeterminação da pessoa dentro da sua autonomia privada conforme
a sua vontade.
“A interpretação parte, metodologicamente, de elementos objectivos para obter, através deles,
como finalidade, o elemento subjectivo, na medida em que isto é possível”47
Art. 236º:
o Aplica-se a declarações negociais expressas e tácitas desde que sejam receptícias.
o “O sentido decisivo da declaração negocial é aquele que seria apreendido por um
declaratário normal, ou seja, medianamente instruído ou diligente, colocado na posição
do declaratário real, em face do comportamento do declarante.”48
o Exceptuam-se os casos:
47
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.490.
48
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.222.
38
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
49
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.223.
50
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.510.
51
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.224
52
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.512.
39
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
o Art. 238º,2 Um sentido que não tenha correspondência com o texto sempre pode
valer se corresponder à vontade real das partes do negócio E as razões determinantes da
forma se não opuserem a essa validade (caso em que se aplica art. 220º).
Art. 247º (erro na declaração):
o Erro obstáculo formou-se, sem erro, certa vontade, mas declarou-se outra.
o O acto é anulável a anulabilidade depende de o destinatário da declaração conhecer
ou dever conhecer a essencialidade para o declarante do elemento sobre que incidiu o
erro.
o Nota: distinta do caso do erro na declaração é a figura do dissenso (art. 232º) em que o
sentido válido da declaração nem coincide com a vontade real do declarante, nem com a
vontade do declaratário.
Estão em causa negócios jurídicos com uma anomalia genética que se vai repercutir sobre a
validade do negócio jurídico (e, consequentemente, sobre a sua eficácia).
“O regime geral da nulidade e da anulabilidade encontra-se nos arts. 285º, 286º a 294º. Estes
preceitos contemplam, por assim dizer, as suas configurações típicas. Mas qualquer delas
admite, devido à especificidade de determinados negócios inválido, cambiantes atípicas... é
apenas na falta de um regime especial que se aplicam à nulidade e à anulabilidade do negócio
jurídico os arts. 286º a 294º.” 53
A lei exige certos pressupostos na tentativa de proteger certos valores:
o Conformidade – assegurar uma efectiva autonomia privada e produção dos efeitos
pretendidos.
o Exigência que a declaração coincida com a vontade – realização do princípio da
autonomia privada.
o Exigência de determinabilidade – a lei não pode proteger um negócio que não se
percebe.
o Protecção de valores fundamentais do sistema jurídico – normas imperativas, bons
costumes, ordem pública.
o Possibilidade física legal:
Física – não se pode proteger um negócio impossível à partida.
Legal – coerência normativa.
53
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.517.
40
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
54
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.516.
41
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
RESTRITO (uma espécie de ineficácia directa e imediata) – como pode aparecer também
em consequência de um factor situado a nível interno, isto é, por virtude de uma invalidade
(sendo então uma espécie de ineficácia indirecta, mediata) – INEFICÁCIA EM SENTIDO
AMPLO.55
“A ineficácia em sentido restrito e a ineficácia provocada por uma invalidade não são,
porém, categorias dogmáticas que se impõem como tais, mas o resultado de decisões
técnico-normativas (p. ex., no caso previsto no art. 877º [venda a filhos ou netos], a lei, em
vez de sancionar com a anulabilidade a venda feita sem os necessários consentimentos,
podia também ter decretado uma ineficácia relativa).”56
“A distinção entre as duas formas de ineficácia – ineficácia em sentido estrito, por um lado,
ineficácia provocada por invalidade, por outro – tem, no entanto, uma grande relevância
prática quando se trata de atender às consequências da respectiva falta dos efeitos,
UNICAMENTE nos casos da ineficácia provocada por uma invalidade são aplicáveis as
disposições dos arts. 285º a 294º.”57
As causas da nulidade
42
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
63
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.317.
64
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.317.
65
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.520.
66
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.521.
43
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
o “Os negócios jurídicos com que as partes defraudam uma lei imperativa são nulos, como
contrários à lei, não sendo necessária nem a intenção nem mesmo a consciência de
defraudar a lei.”67
67
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.522.
68
Varia conforme a natureza deste e compreende os efeitos a que o negócio tende bem como aquilo sobre que aqueles
efeitos incidem.
69
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.525.
70
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.325.
44
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
71
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.210.
72
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.211.
73
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.211.
74
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.530.
45
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
o No caso de inobservância da forma legal, em que uma das partes induziu a outra em
erro, de forma deliberada, haverá duas soluções:
Art. 227º - o negócio é considerado nulo, mas há direito a indemnização da
parte lesada. (Considera-se que o interesse público tem supremacia).
Art. 334º (abuso de direito75) – venire contra factum próprio - é adoptado um
comportamento positivo por parte do titular do direito subjectivo,
comportamento este que vai no sentido de não querer exercer o seu direito,
criando esta atitude como consequência a correspondente disposição da outra
parte (aumento da renda sem respeitar a forma legal e o inquilino paga
durante o tempo e só depois alega a nulidade do aumento). Chega-se a uma
situação de confiança em que a outra parte faz fé, devido à estabilidade da
conduta da outra parte durante um certo período, que o titular não fará uso do
seu direito, perdendo assim, esse mesmo direito.
75
O abuso de direito poderá aparecer sob duas formas básicas:
o Abuso institucional:
É o abuso que o artigo refere quando se fala do “fim social ou económico” do direito.
O direito subjectivo é invocado para fins que estão fora dos objectivos ou funções para os quais
ele foi atribuído pela norma.
Contraria a ordem pública ou contradiz os princípios fundamentais da ordem jurídica, económica
ou social ou desvirtua os objectivos do instituto jurídico.
Este tipo de abuso tem de ser apreciado oficiosamente pelo tribunal.
o Abuso individual:
Neste caso, o exercício do direito estaria, em princípio, a coberto da norma.
No caso concreto, existem circunstâncias ou relações especiais em virtude das quais o exercício
do direito incorre em contradição coma ideia de justiça.
76
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.532.
46
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
77
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.539.
47
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
negócio simulado, e como tal, sempre nulo, visto estarem em causa duas realidades
negociais diferentes.
o Simulação subjectiva (interposição fictícia de pessoas):
Distinção entre interposição fictícia de pessoas, interposição real de pessoas
e representação:
Interposição fictícia a pessoa interposta é um sujeito simulado. Só
neste caso existe simulação. Existe um conluio entre as verdadeiras
partes do negócio e a pessoa interposta por elas. Todos os
intervenientes sabem da operação fictícia.
Interposição real é o caso do mandato sem representação, em que
alguém actua em nome próprio mas por conta de outrem. A pessoa é
parte verdadeira no negócio. Não existe conluio: há um acordo
interno entre uma das partes do negócio e a pessoa por ela interposta
que realiza o negócio com quem desconhece a situação.
Representação alguém age em nome de outrem. Alguém age em
nome de uma das partes, em vez dela, conhecendo a outra esta
posição representativa.
Os negócio simulados são nulos por essa razão. A validade do negócio
dissimulado vai depender de outras razões legais (incapacidade, proibição do
negócio, conteúdo ou fim desaprovados, falta de forma, etc).
o Simulação relativa objectiva:
Simulação sobre o conteúdo do negócio:
Simulação sobre a natureza do negócio mediante a qual se
pretende, em primeira linha, afastar ou ilegitimidades ou
indisponibilidades.
Simulação sobre o valor do negócio prentedem-se vantagens
económicas que não seriam possíveis caso não exista simulação.
O negócio dissimulado é válido desde que o regime legal que lhe diz respeito
tenha sido integralmente observado.
Simulação em negócios formais ou em prejuízo da Fazenda Pública
o “Se o negócio dissimulado estiver sujeito á forma legal é preciso observar o disposto
no art. 241º,2. Segundo este preceito, o negócio dissimulado de natureza formal
apenas é válido se tiver sido cumprida a forma exigida por lei. A exigência do nº2 do
art. 241º decorre logicamente do seu nº1 bem como do art. 220º.”78
o No que diz respeito ao cumprimento da forma legal, são admissíveis as seguintes
posições:
A forma exigida na lei foi observada apenas para o negócio celebrado –
invalidade no negócio dissimulado.
A forma legal apenas foi observada em relação ao negócio dissimulado –
validade do negócio dissimulado.
A forma observada na conclusão do negócio simulado corresponde tanto à
forma legal do negócio simulado como à do negócio dissimulado.
Horster o negócio dissimulado deve ser considerado nulo sempre
que não conste CLARA e INTEGRALMENTE do documente que a
ele próprio disser respeito. A exigência de forma legal, implica que,
no documento, estejam todas as cláusulas sobre as quais as partes
78
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.544.
48
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
79
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.547.
80
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.533.
49
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
NOTA: “nas três figuras referidas até agora a posição do declarante face à sua declaração é sempre a
mesma: não quer o declarado. A posição ou a atitude do declaratário, porém, varia e é em sintonia com
ela que se diferenciam e definem as três figuras.”82
81
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.534.
82
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.534.
50
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
o “Se a falta de consciência foi devida à culpa do declarante, bastando a mera culpa,
foca este obrigado a indemnizar o declaratário que confiou na declaração, visto que,
da perspectiva deste, se trata de uma verdadeira declaração negocial”83
Indemnização pelo dano de confiança, tendo por base um comportamento imputável
ao declarante.
A falta de consciência da declaração ou a coacção física conduzem à nulidade do negócio.
As causas da anulabilidade
83
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.553.
84
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.317.
85
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.319.
51
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
A menoridade:
Art. 122º é menor quem não tiver completado 18 anos de idade.
Art. 123º
o Estabelece uma incapacidade geral – os menores não estão habilitados a reger a sua
pessoa e a dispor dos seus bens e eles não têm capacidade para adquirir direitos ou
assumir obrigações por acto próprio (ou por meio de um representante voluntário),
por via negocial.
o A menos que a lei abra excepções, a incapacidade só termina com a maioridade ou a
emancipação pelo casamento (129º + 132º).
Art. 124º (suprimento da incapacidade dos menores):
o Pelo poder paternal (art. 1877º e ss) – representação legal do menor em relação à sua
pessoa e aos seus bens (1885ºe ss.).
o Pela tutela, subsidiariamente (art. 1921º e ss.) – representação legal do menor em
relação à sua pessoa e aos seus bens (art. 1935º). [Vd. 1901º a 1912º]
o Administração de bens (art. 1971º) – existe ao lado do poder paternal e da tutela,
tendo lugar nos casos previstos no art. 1922º e 1888º,1, a)-c). [Vd. 1927º e 1967º].
o NOTA:
Em alguns casos especialmente previstos, os representantes legais precisam
de autorização do tribunal para poderem validamente celebrar determinados
actos quanto aos bens do menor (arts. 1889º, 1892º, 1938º, 1971º,1).
Os tutores e administradores de bens estão proibidos de realizar certos actos
(1937º,1971º,1).
52
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
86
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.331.
87
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.140.
53
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
menor quanto à administração dos bens que leve para o casal ou que posteriormente
lhe advenham por título gratuito até à maioridade (art. 1649º,1).
As interdições
Art. 138º - pessoas sujeitas a interdições – maiores, que por anomalia psíquica, surdez-
mudez ou cegueira se mostrem incapazes de governar suas pessoas e bens.
Art. 139º - o regime da interdição é equiparado ao da menoridade. Daqui resulta que o
interdito tem uma incapacidade geral.
Art. 140º:
o Os tribunais comuns por onde corre o processo de interdição têm a mesma
competência atribuída aos tribunais de menores nas disposições que regulam o
suprimento do poder paternal.
o No respectivo processo, são dadas ao interditando todas as garantias processuais e
materiais correspondentes à gravidade do acto de interdição (arts. 950 e ss. CPC)
o O tribunal decide não em função do pedido da acção mas no interesse do
interditando, dispondo de uma margem de decisão apreciável (art. 953º,2; 954º
CPC).
o O tribunal pode decretar a interdição mesmo que inicialmente tenha sido pedida a
inabilitação (art. 954º CPC).
o O interditando dispõe sempre de um defensor que o representa no processo (arts.
946º, 947º,2 CPC).
Art. 141º (legitimidade)
o A interdição pode ser requerida:
Pelo cônjuge do interditando.
Pelo seu tutor ou curador (aqui o interditando já está inabilitado).
Qualquer parente sucessível.
Ministério Público.
o O campo de aplicação do nº2 do art. 141º deve ser regularmente o caso em que a
interdição é requerida já antes de o menor ter atingido a maioridade (art. 131º,
125º,1,a), 124º).
o Art. 1901º,2 – os pais deve agir de comum acordo. Havendo desacordo, será
suficiente o requerimento de apenas um deles, sem a necessidade de recorrer
previamente ao tribunal para sanar o desacordo entre eles, visto a interdição servir,
em primeiro lugar, os interesses do interditando e tendo processo de interdição.
Art. 142º (providências provisórias)
o Nomeação de um tutor provisório ou interdição provisória.
o Durante o decurso da acção há ainda um outro meio de proteger o interditando,
através do art. 149º.
Art. 143º (a quem incumbe a tutela)
o Formas de representação legal.
o Caindo a tutela nos pais, estes continuam investidos no poder paternal tal como o
exercem em relação a filhos menores, sem as limitações que caracterizam o uso da
tutela (art. 1935º,1).
o Quando a tutela não recair nos pais aplicam-se-lhe em tudo o que não seja regulado
de uma maneira especial pelos arts. 139º a 151º, bem como as regras respeitantes aos
outros meios previstos para este fim (art. 1921º a 1972º).
54
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Art. 145º (dever especial do tutor) – saúde deve ser entendida num sentido amplo: a
finalidade em vista é que o interdito recupere a sua capacidade, da qual é privado por razões
de saúde.
Art. 147º (publicidade da interdição) – a sentença que decreta a interdição DEFINITIVA
está sujeita a registo civil obrigatório. A partir do registo, o regime da interdição funciona
plenamente.
o Enquanto a sentença não constar do registo, a interdição, embora produzindo os seus
efeitos, não pode ser invocada contra terceiro de boa fé (1920º-C).
o Está de boa fé quem não conhece a sentença nem razoavelmente deve conhecê-la.
Art. 149º (actos praticados no decurso da acção)
o O regime estabelecido neste artigo difere do regime estabelecido no art. 148º. Exige-
se que:
O negócio celebrado tenha causado prejuízo ao incapaz para que possa ser
anulado – critério objectivo: prejuízo causado pelo acto e não nos termos em
que agiria uma pessoa normal e sensata.
A interdição venha a ser definitivamente decretada.
o O prazo da proposição da acção conta-se a partir do registo da sentença (1 ano – art.
287º,1).
Art. 150º - no que diz respeito aos negócio celebrados antes de anunciada a propositura da
acção, não há regime especial para eles: são anuláveis ao abrigo do disposto acerca da
incapacidade acidental (257º).
o Nota: mas o art. 257º também protege o interditando depois de anunciada a
propositura da acção:
Quando a interdição não veio a ser decretada.
Não foi decretada nenhuma medida ao abrigo do art. 142º.
Art. 151º (levantamento da interdição) - ver artigo.
São aplicáveis ao interdito as disposições que regulam as excepções à incapacidade por
menoridade (art. 139º 123º a 128º).
o Os negócios do interdito que não forem praticados ao abrigo do art. 127º são
anuláveis nos termos do art. 125º.
Nota: A tutela, como instituto da representação legal destinado a suprir incapacidades de exercício,
aparece em duas situações diferentes:
Meio de suprir o poder paternal aplica-se a menores (1921º e ss, 1927º a 1962).
Meio de suprir uma incapacidade do interdito aplica-se a interditos (art. 139º a 151º).
Ao lado da tutela pode surgir, conforme as necessidades do caso concreto, a administração
de bens (1967º a 1972º).
As inabilitações
88
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.339.
55
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Tal como a interdição, a inabilitação destina-se a maiores, mas constitui uma intervenção
mais fraca e menos ampla que esta.
Art.152º (pessoas sujeitas a inabilitação):
o Podem ser inabilitados:
Indivíduos cuja anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira, embora
permanente, não seja de tal modo grave que justifique a sua interdição.
Indivíduos que pela habitual prodigalidade se mostrem incapazes de reger
convenientemente o seu património. Prodigalidade – é um comportamento,
originado por um defeito da vontade ou do carácter, que se define por gastos
desproporcionados em relação à situação patrimonial do inabilitado, sendo os
gastos improdutíveis e injustificáveis.
Indivíduos que pelo uso de bebidas alcoólicas ou uso de estupefacientes se
mostrem incapazes de reger convenientemente o seu património. Abuso de
bebidas alcoólicas ou estupefacientes – significa que é preciso a existência de
um vício ou de um estado duradouro que já apresente sinais de carácter
patológico.
o A inabilitação aplica-se apenas no caso das pessoas que não sejam capazes de reger
o seu património e ainda que não sejam incapazes de todo de governar a sua pessoa e
bens (1º grupo do art. 152º).
o “Trata-se, portanto, de casos em que uma pessoa se encontra com uma capacidade
diminuída, sem a necessidade ou sem a possibilidade de uma interdição.”89
o A inabilitação existe em primeiro lugar para proteger os interesses do inabilitado
“mas ela pode beneficiar, sobretudo no caso das pessoas abrangidas pelo 2º grupo do
art. 152º, também outros interessados na administração conveniente do património
do inabilitado que serão o cônjuge, os herdeiros e até a própria comunidade que de
outra maneira podia vir a ter de assegurar o mínimo de existência ao incapaz.”90
Art. 153º (suprimento da inabilidade):
o “O curador é uma entidade a quem cabe apenas, em princípio, autorizar o inabilitado
a alienar bens por acto entre vivos, a celebrar convenções antenupciais ou quaisquer
outros negócios jurídicos que tenham sido especificados na sentença de
inabilitação.”91
o “Os actos são pois celebrados pelo inabilitado, querendo celebrá-los, e não pelo
curador, que carece de legitimidade para esse efeito. Assim se explica também a
possibilidade de suprimento judicial de autorização do curador.”92
o É esta a característica da inabilitação que a distingue profundamente da interdição.
Aqui, não existe uma representação legal, existe um assistente, através do qual é
suprida a incapacidade.
o Tem uma importância fundamental para a interpretação deste artigo a distinção entre
actos de mera administração e actos de disposição de bens:
Actos de mera administração (não alteram a raiz do património) – não estão
sujeitos a autorização do curador.
Actos de disposição (alteram a raiz do património) – estão sujeitos a
autorização do curador.
89
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.544.
90
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.344 e 345.
91
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.159.
92
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.159.
56
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
93
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.160.
57
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Figuras afins
A incapacidade acidental
Ao contrário das incapacidades de exercício referidas anteriormente, a incapacidade
acidental não afecta o estado da pessoa. Quem se encontra acidentalmente incapacitado
possui, em geral, capacidade de exercício normal como, aliás, resulta da lei.
Art. 257º (incapacidade acidental)
o “O regime do art. 257º aplica-se a pessoas que, em princípio, possuem plena
capacidade de exercício, portanto, a maiores ou menores emancipados (ou também a
menores, interditos ou inabilitados quando e na medida em que possuem
excepcionalmente a capacidade de exercício ao abrigo do art. 127º).”95
o Quando os menores, interditos ou inabilitados não possuem capacidade, ou seja, na
situação regular da sua incapacidade, o regime do art. 257º nunca se sobrepõe ao
regime da respectiva incapacidade (salvo os actos de mera administração dos
inabilitados). Aplica-se então, o regime desta última.
o Para conseguir a anulação de uma declaração negocial, com base neste preceito, é
necessário provar:
Que o autor da declaração, no momento em que a fez, se encontrava, ou por
anomalia psíquica ou por qualquer outra causa (embriaguez, estado
hipnótico, droga, etc...) em condições psíquicas tais que não lhe permitiam o
entendimento do acto que praticou ou o livre exercício da sua vontade.
Esse estado psíquico era notório – uma pessoa de normal diligência o teria
podido notar.
O prazo para invocar a nulidade é de um ano (art. 287º).
o Ao contrário da menoridade e da interdição e, frequentemente, da inabilitação, a
incapacidade acidental nunca é geral, mas sempre relacionada com um acto
específico, embora possa abranger todos os singulares actos específicos de uma
pessoa, praticados sucessivamente.
o Se o demente tiver sido interdito ou inabilitado, os seus actos são anuláveis em
virtude do regime de interdição ou inabilitação, inclusive os actos praticados durante
os intervalos lúcidos, por mais duradouros que fossem esses intervalos, até a
interdição ou inabilitação tiver sido levantada.
94
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.344.
95
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.346.
58
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
As ilegitimidades
“A diferença fundamental entre as ilegitimidades e as incapacidades reside no seguinte: toda
e qualquer incapacidades resulta sempre de uma “qualidade minguante” da própria pessoa,
isto é, de um modo de ser do sujeito em si; os casos das ilegitimidades, pelo contrário,
resultam de uma posição, isto é, de um modo de se ser para com os outros. Por outras
palavras, a incapacidade tem em vista o próprio incapaz; as ilegitimidades têm em vista o
relacionamento de uma pessoa com os outros.”96
As ilegitimidades implicam que uma pessoa que goza de plena capacidade, seja legalmente
impedida de celebrar determinados negócios com determinadas pessoas. Uma vez que se
tratam de negócio estritamente pessoais, as ilegitimidades não são supríveis.
Situações que podem ser consideradas ilegitimidades:
o Art. 1602º + 1631º o casamento celebrado com impedimento dirimente relativo é
anulável.
Indisponibilidade relativa
“As limitações estabelecidas na lei não resultam de uma qualidades que é própria do
respectivo disponente, mas apenas operam no sentido de contemplar determinadas pessoas,
sendo nestas outras pessoas que reside a causa da indisponibilidade relativa. Em princípio, o
disponente tem capacidade, pode dispor, mas a lei proíbe-lhe de o fazer relativamente a
determinadas pessoas.”97
Vêm reguladas nos arts. 2192º a 2198º - disposições testamentárias a favor de determinadas
pessoas.
Art. 953º - doações que beneficiam determinadas pessoas.
As disposições feitas em infracção às indisponibilidades são NULAS (art. 2192º 1 e 2) e não
podem ser realizadas por meio de interposição de outra pessoa (2198º + 579º,2).
96
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.348.
97
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.349.
59
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Os negócios usurários
“Pertencem aos negócios jurídicos com conteúdo desaprovado pela ordem jurídica – e isto
em virtude do desequilíbrio das prestações neles acordadas devido à inferioridade de uma
das partes”98
Ao contrário do que acontece nos negócios abrangidos pelo 280º e 281º, a sanção é a
anulabilidade.
“A lei civil actual, por meio do art. 282º, reintroduziu a figura do negócio usurário e a
limitação da liberdade contratual daí resultante em atenção a considerações sociais, de
acordo com o princípio da protecção dos mais fracos”99
“A finalidade dos arts. 282º e ss é, por conseguinte, a protecção de pessoas caracterizadas
ou afectadas por certas situações de inferioridade contra quem pretenda daí tirar benefícios
excessivos e injustificados.” 100 Trata-se de um correctivo material de índole social.
Art. 282º:
o É anulável, por usura, o negócio jurídico quando alguém, explorando a situação de:
Necessidade “existe quando necessidades avultadas de uma pessoa
provocam a necessidade imperiosa para ela de obter uma prestação para se
libertar daquelas dificuldades”101 Pode ser: dificuldades económicas muito
sérias (desemprego), graves inconveniências de natureza política, social
habitacional ou estritamente pessoal...
Inexperiência “existe nos casos em que o discernimento necessário e
adequado ainda não foi adquirido ou voltou a perder-se, podendo ser várias
as causas que levam a tal situação.”102 Pode ser: juventude, idade avançada,
mentalidades não adaptadas, penas de privação da liberdade por bastante
tempo...
Ligeireza “significa um comportamento irreflectido, imaturo e
imponderado, sendo a maneira leviana e irresponsável de actuar um traço
característico da pessoa e não uma falha esporádica ou acidental.”103
Dependência “existe quando a autonomia de decisão está limitada de
facto.”104 Pode ser: relações de subordinação no âmbito laboral,
consequência de relações de situação de instruendo...
Situação de estado mental “deve abranger limitações das faculdades
mentais ou estados de emoção e descontrolo que restringem o discernimento
do interessado e afectam as suas capacidades decisórias.”105
Fraqueza de carácter “verifica-se quando uma pessoa não está em
condições morais ou não tem força anímica para se comportar devidamente,
apesar de poder possuir perfeita lucidez a respeito da sua situação e do seu
comportamento”106 Pode ser: virtude de doença, toxicodependência, vício do
jogo...
98
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.555.
99
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.556.
100
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.349.
101
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.349.
102
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.558.
103
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.558.
104
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.558.
105
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.558.
106
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.558/559.
60
TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
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TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
o Erro sobre o conteúdo da declaração o declarante usou as palavras que queria mas
atribui um sentido diferente que teria no contexto.
o Erro de cálculo ou escrita (art. 249º) deve tratar-se de um lapso ostensivo sob pena de
o caso ficar sob alçada do art. 247º.
o Erro na transmissão da declaração (art. 250º):
Mensageiro comete um lapso de forma involuntária – aplica-se o art. 247º,
podendo o declarante anular desde que demonstre que a outra parte conhecia ou
devia conhecer o erro.
Alteração intencional – o negócio é sempre anulável (dolo do mensageiro).
Distinção entre erro na declaração e dissenso:
o “Distinta do caso do erro na declaração, é a figura do chamado dissenso (oculto), em
que o sentido válido da declaração nem coincide com a vontade real do declarante, nem
com a vontade do declaratário... Para alguns destes casos deve valer, directamente ou
por analogia o regime prescrito para o erro na declaração; para outros, porém, a
anulabilidade impõe-se, sem necessidade dos requisitos a que alude o art. 247º, por não
haver nenhuma expectativa legítima do declaratário, baseada no sentido válido da
declaração, que à lei incumbe tutelar.”110
o “Há situações, porém, em que é possível atribuir a ambas as declarações (a ambas as
manifestações), de acordo com as circunstâncias, um sentido ou conteúdo objectivo
comum. É evidente que este conteúdo objectivo, comum a ambas as declarações, não
está em sintonia com ambas as vontades (caso contrário não haveria dissenso). A este
tipo de casos de dissenso oculto deve aplicar-se, quanto às declarações, o regime do erro
na declaração: o contrato considera-se concluído, mas o declarante cuja vontade real
difere do conteúdo objectivo comum que foi atribuído à sua declaração pode anular com
base em erro.”111
o “Em todo o caso, o próprio facto da divergência entre a vontade real e a declaração
(manifestação) pode ser constatado, sempre e apenas, depois do recurso às regras sobre
a interpretação e integração da declaração negocial. O disposto no art. 247º só se aplica
quando a divergência se mantém, mesmo depois da interpretação. A interpretação é um
pressuposto lógico da decisão sobre a existência ou não do erro causador da
divergência”112
110
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.233.
111
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.558.
112
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.558.
113
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.568.
62
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TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
O declaratário ou terceiro haja recorrido ilicitamente a qualquer artifício,
sugestão, embuste, etc.
Art. 254º (efeitos do dolo):
o Estabelece duas hipóteses:
Dolo proveniente do destinatário da declaração – o acto é sempre anulável
mesmo que haja dolo de ambas as partes. O dolo de um não inutiliza o vício
proveniente do dolo do outro.
Dolo proveniente de terceiro – o acto é, em princípio, válido. Todavia, se o
declaratário conhecia o dolo do terceiro ou devia conhecer, já o acto pode ser
anulado.
Ex.: “Se A (terceiro) induziu em erro B e o levou a doar bens a C, a
doação não é anulável por dolo, se C ignorava e não tinha obrigação
de conhecer o dolo de terceiro. Mas imaginemos que A, o terceiro
que induziu B a fazer a doação, beneficiou de um encargo imposto ao
donatário C. Este benefício já é anulável nos termos da 2ª parte do
nº2.”116
A coacção moral
“É prestada sob coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de
que o declarante foi ilicitamente ameaçado pelo declaratário ou por terceiro com o fim de
obter dele por este meio a declaração pretendida pelos ameaçadores.”117
“Consiste numa pressão psicológica que determina a vontade, de modo que falta ao coagido,
à semelhança da vítima do dolo, liberdade exterior. A vítima da ameaça ainda pode optar
entre a sujeição ao mal ou a oposição a ele. Se emite a declaração cedendo à ameaça, ela
baseia-se numa vontade, mas numa vontade formada em condições limitativas da liberdade
de decisão, causadoras de uma vontade viciada.”118
Art. 255º (coacção moral):
o “A ameaça, para que constitua coacção, deve ilícita. Isto é, a ameaça do exercício de
um direito não constitui coacção”119
Art. 256º (efeitos da coacção) e pressupostos:
o Efeitos – anulabilidade.
o Pressupostos:
Quando a coacção provém do declaratário – declaração negocial determinada
pelo receio de um mal (não se depreende que a gravidade do mal e o
fundamento do receio sejam requisitos essenciais).
Quando a coacção provém de terceiro:
É necessário que o mal seja grave e que seja fundado o receio
(questões avaliadas pelo tribunal).
Efeitos da invalidade:
Invocação da invalidade – pode ser reconhecida por um acordo entre as partes, invocada por
acção judicial e pode ainda ser feita valer (no caso da nulidade) por via de excepção ou
oficiosamente pelo tribunal.
116
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.233.
117
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.585.
118
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.585/586.
119
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.238.
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TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
Art. 289º.
Pessoas legitimadas para arguir a invalidade:
o Nulidade – 286º.
o Anulabilidade – 287º.
Princípio da abstracção
120
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.268.
121
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.268.
122
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.269.
123
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.269.
124
Cit. ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, 4ª ed, Coimbra Editora, Limitada, Vol I, pp.269.
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TGRJ – 2º SEMESTRE | Paulo Pichel
“Faz parte de todo um sistema legal, devidamente construído, que tem a ver com a
existência de uma Parte Geral, com os fundamentos e formas da anulação do negócio
jurídico, com a aquisição de boa fé a um não titular e com a segurança e celeridade do
tráfico jurídico.”125
125
Cit. HEINRICH HÖRSTER, A parte geral do Código Civil Português, Ed. Almedina, Coimbra, pp.585/586.
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