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Das acções emergentes do crime-Por Jurista, Carlitos Carlos CC

Ideado por: Jurista, Carlitos Carlos CC


15 de Março de 2020
Das acções emergentes do crime

LEGALIDADE DE ACÇÃO PENAL: Interpretação e integração da lei processual penal

A todo o crime ou contravenção corresponde uma acção pena, que será exercida nos termos do
Código de Processo Penal moçambicano.

Nos casos omissos, quando as suas disposições não possam aplicar-se por analogia, observar-se-
ão as regras do processo civil que se harmonizam com o processo penal e, na falta delas, aplicar-
se-ão os princípios gerais do processo penal.

1. O princípio da legalidade da acção penal

O jus puniendi, de que é titular privativo o Estado, concretizam-se através do processo penal;
não pode ser exercido sem este processo, nem a pena pode ser aplicada pela só aceitação do
delinquente. Aqui reside um nítido traço diferenciador das relações jurídicas de direito privado,
que tantas vezes se realizam sem intervenção do processo civil.

O Direito Penal substantivo e o direito processual criminal constituem, assim, uma unidade,
pois o primeiro não é susceptível de aplicação de aplicação voluntária, nem pode ter aplicação
sem o segundo. É que o direito criminal substantivo encontra-se distanciado da vida real; não
passa de valorações esquemáticas e abstractas.

Pressupõe, por isso, uma tarefa de indagação e de processamento; uma actividade humana
complementar, para indagação das coordenadas da pena e das demais reacções criminais. Esta
actividade constitui o processo penal ou criminal.

Segundo a lição do Professor Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, I, página 7, o


direito penal realiza-se através do processo penal, concretizando-se pela actividade jurisdicional
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dos tribunais. Afirmar que o direito penal se realiza através do processo penal equivale dizer que
se realiza jurisdicionalmente. Através do processo exerce-se uma função específica do Estado, a
função jurisdicional.

Todos os processos em que não actua esta função jurisdicional podem corresponder, no seu rito
ou na forma exterior, ao processo judicial, mas não são processos, no significado técnico próprio;
são antes a realização de uma actividade de natureza administrativa.

O Professor Eduardo Correia expõe o princípio da legalidade e mostra como o processo


criminal aparece como necessário complemento de direito substantivo, a págs. 3 e segs. do
Processo Criminal, lic. dact. ao curso do 5o ano, 1955-1956.

Tendo o direito penal que realiza-se, necessariamente, por via do processo penal, e devendo um
Estado de direito regulamentar, com regras precisas, o se e o como da actividade a tanto
destinada, de modo a excluir, nomeadamente, a arbitrariedade e o oportunismo, e a precisar a
admissibilidade e a pertinência dos actos de procedimentos, decorre daí a imposição do
princípio da legalidade da acção penal, que se opõe ao principio da oportunidade.

Expende-se o Professor Cavaleiro de Ferreira, Curso, I, pág. 44, que a legalidade da acção
penal significa o dever de acusação em relação a qualquer infracção. O princípio da oportunidade
concederia ao Ministério Público a apreciação, no caso concreto, da conveniência, em função do
interesse público, do dever de exercer a acção penal.

Assim, considera o mesmo Mestre ser o princípio da legalidade, aquele que corresponde à
natureza do processo penal, pois a aplicação do direito penal não pode ficar discricionariamente
na dependência da apreciação do Ministério Público.

2. Interpretação e integração da lei processual penal


a) Comando fundamental, no domínio da interpretação e da integração da lei processual
penal, é o do único do artigo 1, estabelecendo que, nos casos omissos quando não possam
aplicar-se por analogia as disposições do processo penal, observar-se-ão as regras do
processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, os princípios
gerais do processo penal.

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Nos casos omissos, aplicam-se portanto, primeiramente os preceitos da legislação processual


penal; na falta de disposição análoga em processo penal, terá o intérprete que se socorrer de
preceitos do processo civil harmónicos com o processo penal.

Só na falta de preceito que possa ser aplicado analogicamente em qualquer desses dois ramos
de direito, deverá o intérprete socorrer-se de princípios gerais de direito.

Segundo a lição do Professor Cavaleiro de Ferreira, Curso, I, pág. 61, no único do art. 1
mostra-se a interferência entre analogia legis e analogia júris; a lógica da distinção não é
absoluta, não sendo possível considerar na analogia legis qualquer preceito como referente a
casos análogos. A analogia legis baseia-se por isso já numa ilação dos princípios gerais;
somente a referência a estes princípios é feita mediatamente, através dum preceito positivo,
ao passo que, a analogia júris se faz a aplicação directa destes princípios aos caos omissos.

De salientar que os princípios gerais de direito são, em primeiro lugar, os do processo penal e
os da doutrina geral do processo. Cremos que, como se expressa hoje o Código Civil, art. 10,
no 3, a situação será resolvida segundo a norma que o intérprete criaria, dentro do espírito do
sistema.

Contrariamente ao que sucede no direito penal substantivo quanto à incriminação, a analogia


não é proibida no processo penal (a não ser, evidentemente, nos casos em que, em geral, é
proibida, quanto às normas, excepcionais).

Sobre interpretação de lacunas da lei processual penal, ver ainda Professores Eduardo
Correia, Processo Criminal, págs. 76 e segs. e Castanheira Neves, Sumários, págs. 65 e segs.
e B.M.J., 4, 212.

b) Jurisprudência:
▪ A eliminação de expressões ofensivas é admissível em processo penal (ac.do
S.T.J. de 14 de Novembro de 1956; B.M.J.,61, 504)
▪ Em processo penal, é mataria de facto, da exclusiva competência dos tribunais de
instância, determinar se um facto é ou não notório e do conhecimento geral, e, se
o for, não tem o mesmo que ser objecto de produção de prova.

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O Professor Cavaleiro de Ferreira, Curso, II, pág. 296 ensina que a notoriedade dispensa
a prova, mas não a alegação na audiência de discussão e julgamento. Os factos que não
são objecto de discussão na audiência não podem ser apreciados em julgamento, embora
com pretexto de serem notórios. Tais factos devem ser incluídos na acusação e na
pronúncia, nos moldes gerais;
▪ As regras do Código de Processo Civil, quanto à indivisibilidade da confissão,
não são aplicáveis em processo penal (ac.do S.T.J. de 24 de Julho de 1963;
B.M.J., 129, 233);
▪ Não são aplicáveis em processo penal as regras do processo civil sobre limitação
dos recursos. Interposto recurso, domina o princípio do conhecimento amplo, sem
restrições, das questões ventiladas no processo, só existindo as restrições
expressamente previstas. É hoje uniforme a jurisprudência do Supremo neste
sentido, assim ensinando também a doutrina autorizada.
▪ Em processo penal há lugar ao recurso subordinado;
▪ Em processo penal, não há lugar à especificação dos fundamentos dos factos que
o tribunal considera provados, exigida pelo no2 do art. 653 do Código de Processo
Civil;
▪ Em processo penal, vigora o princípio da verdade material, que deve ser
oficiosamente indagada pelo juiz até à sentença final, isto é, até à decisão que
contenha todos os elementos apontados no art. 450 do Código de Processo Penal
(ac.do S.T.J. de 22 de Janeiro de 1969; B.M.J., 183, 171).

FIM

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