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Evolução da indústria moçambicana

Na República de Moçambique a indústria é o factor impulsionador da economia


nacional” -
Artigo 104 da Constituição da República de 2005.

Indústria é uma actividade económica que surgiu na Primeira Revolução Industrial, no


fim do século XVIII e início do século XIX, na Inglaterra, e que tem por finalidade
transformar matéria-prima em produtos comercializáveis, utilizando força humana,
máquinas e energia.

1. O PERÍODO COLONIAL
A indústria existente em Moçambique não surgiu em consequência da evolução da
estrutura económica global do país, mas como uma actividade subsidiária da
exportação, isto é, imposta pela necessidade de transformar produtos primários até à
fase exportável. Tendo em conta a aptidão ecológica do país para as culturas de cana-
de-açúcar, do sisal, do coqueiro, do algodoeiro, do chá, entre outros, são as indústrias do
início do ciclo de transformações industriais destes produtos que primeiro apareceram
em Moçambique.
Os complexos agro-industriais do açúcar e do sisal são anteriores à guerra de 1914. São
também antigas e correspondem igualmente à objectivos de exportação as indústrias de
extracção de óleos vegetais, do descaroçamento e prensagem de algodão, da preparação
do chá e da serração de madeira.
Nos finais da década de “40”, embora lentamente, assistiu-se à expansão do mercado
interno (25.000 europeus) que tornou viáveis algumas indústrias que respondiam à sua
procura. Assim surgiram as indústrias do sabão e do tabaco; depois, as da cerveja, do
cimento e do vestuário; mais tarde e já na década de “50”, a moagem de trigo e a fiação
e tecelagem de algodão e juta; e por fim, já nos anos “60”, a refinação de petróleos, a
laminagem de ferro e aço, a construção e montagem de material de caminho-de-ferro, e
o descasque da castanha de cajú.

A indústria existente, basicamente de transformação primária de produtos agrícolas


estava equipada com maquinaria importada, frequentemente em segunda mão ou
mesmo obsoleta. Sendo assim, só era capaz de efectuar pequenas transformações finais,
de acabamento ou de embalagem de produtos importados.
Por outro lado, assistia-se à localização desigual das indústrias, estando mais de metade
localizadas na cidade capital de Lourenço Marques.

1.1. Objectivos da Indústria Transformadora


A industrialização no período colonial obedeceu à objectivos específicos,
nomeadamente:
1. A oferta de matérias-primas semi-processadas para exportação e/ou para
aprovisionamento da indústria portuguesa. Ex: descasque da castanha de cajú;
descaroçamento do algodão; sisal; copra; açúcar; etc.
2. Satisfazer a crescente procura (formada por cerca de 250.000 colonos em 1974) de
bens terminais de consumo.
3. Criar oportunidades de investimento para o pequeno empresário português.
4. Oferecer um mercado para recolocação dos equipamentos e máquinas
tecnologicamente ultrapassados e fisicamente depreciados que a indústria portuguesa
teria de substituir no processo da sua modernização; diminuir o custo de oportunidade
tecnológico para a indústria de Portugal.
5. Tentar melhorar a face do regime colonial de modo a aliviar a crescente pressão
política doméstica e internacional, intensificada com a luta armada de libertação
nacional.

1.2. Estrutura da Indústria


A estrutura da indústria transformadora moçambicana herdada do colonialismo era
subdesenvolvida e desequilibrada, débil e dependente, vulnerável e ineficiente.
A produção do ramo de téxteis e vestuário era dependente da importação de fibras
sintéticas, apesar de Moçambique ser produtor e exportador de algodão. Aliás, o
algodão foi a matéria-prima que permitiu lançar a indústria téxtil portuguesa no
mercado internacional. Contudo, Moçambique nunca beneficiou de tal situação. Nos
finais dos anos 60, por exemplo, o preço de algodão no mercado mundial era 14 vezes
superior ao praticado pelo produtor em Moçambique.
Os principais produtos da indústria de bebidas (cervejas e refrigerantes) eram
produzidos sob patente e completamente dependentes de importação dos compostos
principais, embora Moçambique fosse um produtor e exportador de frutas tropicais,
especialmente citrinos.
Os ramos básicos da indústria transformadora (Metalo-mecânica; Metalurgia; Químicos
industriais; Materiais de construção; Material e equipamento eléctrico e electrónico)
eram relativamente pouco importantes.
A indústria transformadora era um consumidor líquido de moeda externa, pois as
Receitas com a Exportação dos produtos primários semi-processados eram inferiores
aos Gastos Totais com a Importação de factores de produção para o sector.
A indústria herdada em 1975, era já Distorcida e Incapaz de enfrentar mercados
competitivos e desafios tecnológicos.
Por causa da debilidade tecnológica, da disponibilidade organizada da força de trabalho
abundante e barata, e da natureza das relações sociais de produção no período colonial,
o crescimento da indústria não foi acompanhado do desenvolvimento de uma Força de
Trabalho estável, organizada e qualificada.
Durante o colonialismo e apesar da existência dos Planos de Fomento, não se adoptou
nenhuma política de industrialização coerente. Aliás, o processo artificial de
industrialização efectuou-se à custa de um endividamento e desequilíbrio financeiro
crescentes, financiado através do mecanismo de “pagamentos diferidos” que
caracterizou o “regime de pagamentos interterritoriais” no quadro de um fundo
monetário da zona do escudo, instituído para garantir a continuidade das exportações de
Portugal para as suas colónias e assegurar a regularidade da remessa de capitais para
aquele país.
Em 1975, a estrutura industrial de Moçambique era típica dos PVD, com a
particularidade de o produto industrial ser praticamente idêntico ao produto agrário e
ainda o sector terciário ser o mais importante de todos.

2. TRANSIÇÃO E CRISE NO PERÍODO PÓS-INDEPENDÊNCIA


No período 1974-76, a indústria transformadora enfrentou muitos problemas:
1. Empresas sabotadas e abandonadas pelos antigos proprietários: o capital foi
transferido; os stocks foram inutilizados; e a produção paralisada.
2. Escassez de técnicos qualificados para substituir os estrangeiros que haviam
abandonado o país.
3. Paralisação da rede de comercialização agrária.
4. Obsolescência tecnológica do parque industrial que foi agravada pelo desgaste físico
do equipamento e pelas dificuldades de manutenção.
Todos estes factores fizeram com que a produção da indústria transformadora, durante o
período 1974-76, decrescesse em 35%.

2.1. As Directivas Económicas do III Congresso da Frelimo


Num contexto de direcção centralmente planificada, à indústria foram definidos os
seguintes objectivos, a serem alcançados durante o período 1977-90:
1. Satisfazer as necessidades do povo em produtos alimentares, de vestuário, calçado,
combustíveis e energia, produtos de higiene e utensílios domésticos.
2. Produzir as matérias-primas, combustíveis e instrumentos de produção à todos os
sectores económicos, em particular à agricultura.
3. Valorizar os nossos produtos agrários do subsolo e marinhos.
4. Contribuir para o equilíbrio do nosso comércio com o exterior.
5.Incrementar as relações da indústria com os outros sectores; em particular com a
agricultura, aumentando a quantidade e qualidade dos fornecimentos dos meios de
produção e a capacidade de transformação dos produtos agrícolas.
6.Desenvolver a indústria básica, de modo a alterar a estrutura industrial
subdesenvolvida do país.

Fruto desta reorganização, ao rápido declínio da produção do sector no período (1974-


77), seguiu-se um período (1978-81) de recuperação da economia no seu global. A
produção da indústria transformadora cresceu em 18%, à uma taxa média anual de 4%.

No entanto, a partir de 1982, a indústria transformadora sofreu uma queda vertiginosa


que culminou com um crescimento de (-23.8%) em 1985. Concorreram para esta
situação os seguintes factores:
• medidas de política económica e financeira desajustadas da realidade industrial,
designadamente em matéria de preços, salários, créditos, câmbios, gestão industrial e
comercial;
• baixa qualificação profissional dos operários e gestores industriais;
• intensificação do boicote económico da RAS, reduzindo ainda mais o trânsito ferro-
portuário e o trabalho migratório de moçambicanos;
• a escassez de divisas fruto da redução de exportações e divisas;
• os choques petrolíferos de 1974 e 1979, aliados à crise económica mundial;
• a redução do investimento pelo OGE e a quase paralisação do investimento de
reposição;
• intensificação de acções de banditismo armado, originando:
- instabilidade económica e social
- actos de sabotagem de vias férreas, de linhas de distribuição de energia, de unidades
agro-silvícolas e de outras unidades produtivas, prejudicando a produção e as
exportações;

2.3. Fraquezas do Programa de Industrialização


O programa de industrialização estava condenado ao fracasso à partida pois, eram
muitos os factores que concorriam para tal facto:
1. O excesso de mão-de-obra não qualificada e fuga massiva de quadros após a
independência, com resultante sabotagem;
2. Excesso de centralização na planificação, decisão e afectação de recursos financeiros,
humanos e materiais;
3. Orientação comercial excessivamente centrada no mercado interno;
4. Relação estruturalmente inadequada com o sector agrário;
5. Gestão macroeconómica desequilibrada:
• Concessão de crédito ilimitado e indiferenciado à algumas empresas
consideradas estratégicas. Por outro lado, as EE não eram encorajadas a ser
lucrativas;
• Mecanismos de preços controlados e determinados centralmente.
6. Dependência de recursos externos:
• Todo o investimento na economia nacional era público;
• Mais de metade do investimento público era coberto por ajuda externa;
• Diminuição das receitas em divisas por causa de:
- boicote económico da RAS contra Moçambique
- aplicação de sanções contra a Rodésia do Sul
- efeito combinado da redução das exportações e da deterioração dos
termos de troca.
• Crescente escassez de recursos para a industrialização.

3. O PROGRAMA DE REABILITAÇÃO ECONÓMICA (PRE) E A


ESTRATÉGIA DE REABILITAÇÃO INDUSTRIAL
3.1. Objectivos para a indústria transformadora
1. Atingir, em 1990, os níveis de produção e de exportação de 1981 nos ramos
considerados prioritários, nomeadamente:
- indústrias produtoras de bens de consumo;
- indústrias produtoras de instrumentos de trabalho para o campo;
- indústrias transformadoras de produtos agrícolas.
2. Alterar o ambiente para o desenvolvimento industrial, liberalizando-o e privatizando
as empresas e estabelecimentos industriais.
3. Lançar as bases para uma política industrial virada para um desenvolvimento
equilibrado e competitivo para o futuro.

3.2. Estratégia de Reabilitação Industrial


A estratégia de reabilitação industrial assentava em três pressupostos:
a) A comunidade internacional garantiria os fundos em moeda externa para a
importação de peças e sobressalentes, equipamentos e assistência técnica, bem como
para matérias-primas, materiais auxiliares e combustíveis.
b) A guerra terminaria e a economia rural começaria a recuperar rapidamente;
c) A produção industrial encontraria um mercado disponível para todo o seu produto.

A reabilitação industrial foi orientada em duas vertentes:


1. Para um grupo de empresas consideradas estratégicas;
2. Para o grosso de empresas que beneficiou de certas facilidades para a reabilitação e a
manutenção do equipamento e aquisição de matérias-primas e materiais auxiliares.
Os Fundos para o financiamento da Reabilitação Industrial provinham da POUPANÇA
EXTERNA (Donativos, Créditos e algum Investimento Directo Estrangeiro). Os
Donativos vinham na sua forma condicionada, quer à projectos, quer à fontes, ou à
ambos.

3.3. Os Problemas Conceptuais do Programa


Os problemas centrais para o financiamento sustentado e equilibrado da estratégia não
eram enfrentados. A estratégia de reabilitação industrial não enfrentava os problemas
estruturais da indústria:
a) A sua debilidade estrutural
b) A sua fraca ligação inter e intra-sectorial
c) A sua completa dependência do exterior
d) A sua incapacidade de competir e ganhar mercados externos importantes.

4. OS CONDICIONALISMOS DA IMPLEMENTAÇÃO DO PRES


4.1. Política Fiscal, Custos e Protecção
A política fiscal, tendo como único objectivo o aumento de receitas do OGE, não era
favorável ao desenvolvimento industrial.
O efeito combinado dos Impostos Indirectos e das Tarifas Aduaneiras penalizava a
indústria nacional.

4.2. Política Cambial e Custos de Produtos Domésticos


As desvalorizações e ajustamentos subsequentes à taxa de câmbio tinham em vista o
restabelecimento do equilíbrio das contas com o exterior através da promoção das
exportações e da contracção das importações.
Dada a dependência externa das indústrias produtoras para o mercado doméstico em
factores de produção, uma desvalorização da taxa de câmbio resulta num aumento
automático directo dos custos médios de produção independentemente de quaisquer
factores.
No período 1987-1992, os custos reais de produção industrial para o mercado interno
aumentaram em duas vezes, somente pelo efeito inflacionário das alterações da taxa de
câmbio.
4.3. Política Cambial e Exportações
Dados os constrangimentos do sector, a política cambial serviu mais para consolidar o
padrão subdesenvolvido da produção industrial, do que para desenvolver novas
vantagens comparativas.
4.4. Política Cambial e Importações
As importações deveriam ter crescido mais lentamente que as exportações, por causa do
efeito composto da liberalização da taxa de câmbio e das elasticidades das importações
relativamente ao preço e ao rendimento.
4.5. Política de Crédito e Custos de Produção
A política de restringir o crédito à economia tinha em vista eliminar os desequilíbrios
monetários, reduzir a inflação para níveis razoáveis e estabilizá-la, elevar a poupança
doméstica e aumentar a eficiência do investimento.
4.6. Política de Preços, Liberalização e Rentabilidade Empresarial
Gradual liberalização de preços (até 1993):
a) Preços fixos e subsidiados pelo Estado, para bens e serviços considerados
prioritários;
b) Preços condicionados, formulados em função dos custos de produção;
c) Preços livres, teoricamente determinados pela relação entre a oferta e a procura no
mercado.

Dada a existência de muitas indústrias operando em condições de monopólio e


oligopólio, a liberalização de preços apenas reforçou a ineficiência monopolista ou
oligopolista, porque os lucros dependiam do poder do produtor sobre o mercado e da
sua capacidade de fixar o preço, e não do aumento da eficiência empresarial motivada
pela competição.
As empresas não conseguiram que os preços dos seus produtos aumentassem à mesma
taxa do aumento dos seus custos, por causa da baixa utilização da capacidade instalada,
da elevada elasticidade da procura dos bens industriais relativamente ao rendimento e
aos preços, da competição motivada pelos donativos em espécie e da fraqueza das
relações inter e intra industriais dentro da economia o que diminui as possibilidades de
substituição de importações. Por isso, o mercado para os produtos industriais foi-se
tornando cada vez mais pequeno. Em face disso, as empresas diminuiram ou
paralisaram a produção.

Os impostos indirectos aumentaram, substancialmente, os preços dos produtos aos


consumidores, por causa das taxas elevadas e da sua aplicação em cascata sobre o valor
bruto do produto.
Portanto, os consumidores pagam preços altos pelos produtos industriais, mas as
empresas industriais recebem uma proporção que, muito frequentemente, é inferior à
metade desse valor.

5. A CRISE DOS ANOS 90


Nos primeiros anos da implementação do programa de reabilitação industrial, a
produção nacional cresceu como resultado directo da injecção de divisas dirigidas para a
importação de peças, sobressalentes, combustíveis e matérias-primas. A produção
industrial durante o período 1985-1990 aumentou em 85%, crescendo anualmente à uma
taxa de 2%, apesar de não ter atingido os níveis programados de 13% ao ano. No
entanto, tal estratégia viria a consolidar a dependência externa do sector, com efeitos
imediatos no declínio posterior dos níveis de produção.

ESTRATÉGIA PARA O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA EM


MOÇAMBIQUE
A estratégia do desenvolvimento da indústria pretende alcançar os seguintes objectivos:
• A criação de um ambiente mais favorável à actividade industrial;
• A promoção do investimento industrial;
• A reabilitação e modernização do sector industrial;
• A promoção do sector privado;
• O crescimento da indústria;
• O desenvolvimento da indústria no sentido dos objectivos da política industrial
traçada; e
• O desenvolvimento de um tecido industrial forte e competitivo no contexto dos
programas de integração regional.

Os vectores principais da actuação estratégica são os seguintes:


• Promoção do Papel do Sector Privado;
• Promoção das Micro, Pequenas e Médias Indústrias (PMI’s);
• Enquadramento do Sector Informal;
• Promoção do Investimento Estrangeiro;
• Reestruturação das Empresas Industriais do Estado;
• Reabilitação/Modernização do Parque Industrial;
• Investimento Público;
• Simplificação e Racionalização do Ambiente Regulamentar;
• Financiamento da Indústria (mecanismos bancários e não-bancários);
• Protecção e Incentivos à Indústria Nacional;
• Melhoria do Acesso à Importação;
• Promoção de Exportações de Produtos Industriais;
• Criação de Zonas Francas Industriais;
• Localização Industrial como um Instrumento de Desenvolvimento Nacional
Equilibrado;
• Promoção do Desenvolvimento Tecnológico;
• Promoção e Controlo da Qualidade;
• Criação de um Sistema de Informação Industrial;
• Desenvolvimento das Infra-estruturas e Serviços de Apoio; e
• Desenvolvimento de Recursos Humanos.

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