Você está na página 1de 3

- Blog do Desemprego Zero - http://www.desenvolvimentistas.com.

br/desempregozero -

Mais GENIAL texto de ciência política do século XX: OS ASPECTOS


POLÍTICOS DO PLENO EMPREGO
Posted By Autores Clssicos On 7 março, 2008 @ 4:51 pm In Artigos Teóricos,Autores
Clássicos,Pleno Emprego | 6 Comments

KALECKI – 1944

A manutenção do pleno emprego por meio da despesa governamental financiada por


empréstimos tem sido amplamente discutida nos anos recentes. Essa discussão, porém,
concentra-se nos aspectos puramente econômicos do problema, sem dar a devida
atenção às realidades políticas. É falsa a suposição de que um Governo manterá o pleno
emprego numa economia capitalista se ele sabe como faze-Io. Com relação a isso é de
crucial importância a desconfiança dos grandes empresários acerca da manutenção do
pleno emprego por meio do gasto governamental. Essa atitude foi mostrada claramente
na grande depressão dos anos trinta, quando os grandes empresários se opuseram
firmemente às experiências de aumento do emprego através da despesa governamental,
em todos os países com exceção da Alemanha nazista. Essa atitude não é fácil de
explicar. Maior produção e emprego claramente beneficiam não apenas os trabalhadores,
mas também os empresários, porque seus lucros crescem. E a política de pleno emprego
baseada na despesa governamental financiada por empréstimos não usurpa os lucros,
porque não envolve tributação adicional. Os empresários, na depressão, sonham com
uma expansão econômica; por que, então, eles não aceitam com prazer a expansão
“sintética” que o Governo está apto a oferecer-Ihes? É esta questão difícil e fascinante
que pretendemos tratar neste artigo.

1. Os motivos para a oposição dos “líderes industriais” ao pleno emprego obtido por meio
da despesa governamental podem ser agrupados em três categorias: (a) a reprovação à
interferência pura e simples do Governo no problema do emprego; (b) a reprovação à
direção da despesa governamental (para investimento público e subsídio ao consumo);
(c) a reprovação às mudanças sociais e políticas resultantes da manutenção do pleno
emprego. Examinaremos minuciosamente cada uma dessas três categorias de objeção à
política de expansão do Governo.

2. Trataremos em primeiro lugar da relutância dos “capitães da indústria” em aceitar a


intervenção do Governo no problema do emprego. Cada alargamento da atividade estatal
é encarado com suspeita pelo “mundo dos negócios”, mas a criação de emprego por meio
da despesa governamental tem um aspecto especial que torna a oposição
particularmente intensa. Em um sistema de laissez faire o nível do emprego depende, em
grande parte, do assim chamado estado de confiança. Se este se deteriora, o
investimento privado declina, do que resulta uma queda do produto e do emprego (tanto
diretamente como através do efeito secundário que a queda das rendas exerce sobre o
consumo e o investimento). Isso dá aos capitalistas um poderoso controle indireto sobre
a política governamental: tudo que possa abalar o estado de confiança deve ser
cuidadosamente evitado, porque causaria uma crise econômica. Mas, uma vez que o
Governo aprenda o truque de aumentar o emprego por meio de suas próprias despesas,
esse poderoso mecanismo de controle perde sua eficácia. Daí que os déficits
orçamentários necessários para efetuar a intervenção governamental passam a ser
encarados como perigosos. A função social da doutrina da “finança sadia” é fazer com que
o nível de emprego dependa do “estado de confiança”.

3. A reprovação dos “líderes do mundo dos negócios” a uma política governamental de


despesas torna se ainda mais aguda quando eles consideram os objetos em que o
dinheiro seria aplicado: investimento público e subsídio ao consumo popular.

Os princípios econômicos da intervenção governamental requerem que o investimento


público seja limitado a objetos que não concorram com o equipamento de capital dos
negócios privados: por exemplo, hospitais, escolas, rodovias etc. Do contrário, a
rentabilidade do investimento privado seria enfraquecida e o efeito positivo do
investimento público sobre o emprego seria anulado pelo efeito negativo do declínio do
investimento privado. Essa concepção satisfaz muito bem aos homens de negócio. Mas o
âmbito do investimento público desse tipo é estreito, e há o perigo de que o Governo,
prosseguindo nessa política, possa ser eventualmente tentado a nacionalizar os
transportes ou outros serviços de utilidade pública a fim de ganhar uma nova esfera onde
aplicar o investimento.

(1) Poder-se-ia esperar, portanto, que os líderes empresariais e seus assessores fossem
mais favoráveis ao subsídio ao consumo popular (por meio de pensões às famílias,
subsídios para manter baixo o preço dos produtos essenciais etc.) do que ao
investimento público, porque, subsidiando o consumo, o Governo não estaria embarcando
em nenhum tipo de “empresa”. Na prática, porém, esse não é o caso. De fato, o subsídio
ao consumo popular é muito mais violentamente combatido do que o investimento
público, porque coloca-se aqui um princípio “moral” da mais alta importância. Os
fundamentos da ética capitalista requerem que “Você ganhará seu pão com o suor de seu
rosto” a menos que você tenha meios privados.

4. Consideramos os motivos políticos da oposição à política de criar emprego por meio de


gasto governamental. Mas mesmo se essa oposição fosse superada como poderia
acontecer sob pressão popular, a manutenção do pleno emprego causaria mudanças
sociais e políticas que dariam um novo ímpeto à oposição dos líderes empresariais. De
fato, sob um regime de permanente pleno emprego, a demissão de empregados deixaria
de exercer sua função de medida disciplinar. A posição social do patrão estaria minada e
cresceriam a autoconfiança e a consciência da classe trabalhadora. As greves por
aumentos salariais e melhorias nas condições de trabalho criariam tensão política. É
verdade que os lucros seriam mais elevados em um regime de pleno emprego do que o
são, em média, no laissez faire; e mesmo o crescimento das taxas de salário, resultante
do mais forte poder de barganha dos trabalhadores, provavelmente causaria menos uma
redução dos lucros do que um aumento de preços, e assim afetaria adversamente apenas
os interesses repentistas. Mas os líderes empresariais apreciam mais a “disciplina nas
fábricas” e a “estabilidade política” do que os lucros. Seu instinto de classe lhes diz que,
de seu ponto de vista, um pleno emprego durável é insano, e que o desemprego é uma
parte integrante do sistema capitalista normal. 1. Uma das mais importantes funções do
fascismo como tipificado pelo sistema nazista, era a de remover as objeções capitalistas
ao pleno emprego.

A reprovação à política de despesa governamental é superada, sob o fascismo, pelo fato


de a máquina estatal estar sob o controle direto de uma associação do grande negócio
com os bem sucedidos fascistas. É removida a necessidade do mito da “finança sadia”,
que servia para impedir o Governo de sobrepor-se, por meio dos gastos, à crise de
confiança. Numa democracia ninguém sabe como será o próximo Governo. No fascismo
não há próximo Governo.

A reprovação ao gasto governamental em investimento público ou em consumo é


superada concentrando-se em armamentos a despesa governamental. Por fim, a
“disciplina nas fábricas” e a “estabilidade política” em pleno emprego são mantidas pela
“nova ordem”, que varia da supressão dos sindicatos até os campos de concentração. A
pressão política substitui a pressão econômica do desemprego.

2. O fato de que os armamentos sejam a espinha dorsal da política de pleno emprego


fascista tem uma profunda influência sobre seu caráter econômico.

Os armamentos em grande escala são inseparáveis da expansão das forças armadas e


da preparação de planos para uma guerra de conquista. Eles também induzem o
rearmamento competitivo de outros países. Isso faz com que o principal objetivo do gasto
se desloque gradualmente do pleno emprego para o máximo efeito de rearmamento. A
resultante escassez de recursos leva a uma contração do consumo quando comparado
com o que poderia haver sob o pleno emprego.

O sistema fascista começa com a superação do desemprego, desenvolve-se em uma


“economia de armamento” de escassez, e inevitavelmente termina em guerra. 1. Qual
será o resultado prático da oposição ao “pleno emprego por meio da despesa
governamental”, numa democracia capitalista? Tentaremos responder essa questão com
base na análise dos motivos dessa oposição, apresentados na seção I deste ensaio.
Argumentamos que se pode esperar a oposição dos “líderes industriais” em três planos:
(a) a oposição de princípio ao gasto governamental apoiado num déficit orçamentário; (b)
a oposição a esse gasto dirigido ou ao investimento público que pode prefigura intrusão
do Estado em novas esferas de atividade econômica ou ao subsídio ao consumo popular;
(c) a oposição a manutenção do pleno emprego e não apenas à tentativa de evitar
profundas e prolongadas depressões econômicas.

x Deve-se reconhecer que é mais um assunto do passado o estagio em que os “líderes


empresariais” podiam opor-se a qualquer espécie de intervenção governamental para
aliviar uma depressão. Concorda-se hoje que seja necessário “fazer alguma coisa na
depressão”; mas o conflito continua primeiro, no que se refere à direção a ser dada à
intervenção governamental na depressão, e, segundo, no que concerne o fato de se essa
intervenção deveria ser usada meramente para aliviar depressões ou para obter
permanente pleno emprego.

(2. Nas discussões correntes desses problemas freqüentemente surge a concepção de


contrapor-se à depressão por meio do estímulo ao investimento privado. Isso pode ser
feito pela redução tanto da taxa de juro como do imposto de renda, ou pelo subsídio
direto ao investimento privado de um modo, ou de outro não surpreende que tal
esquema seja atraente para os “negócios”. O homem de negócios continua sendo o meio
pelo qual a intervenção é efetuada. Se ele não sentir confiança na situação política, não
será persuadido a investir. E a intervenção não implica que. o Governo “jogue com” o
investimento (público) ou “desperdice dinheiro” com o subsídio ao consumo.

Pode-se mostrar, todavia, que o estímulo ao investimento privado não provê um método
adequado de evitar o desemprego em massa. Existem aqui duas alternativas a serem
consideradas: (a) a taxa de juro ou o imposto de renda, ou ambos, é fortemente reduzido
na depressão e aumentado na prosperidade. Nesse caso, tanto o período como a
amplitude do ciclo econômico serão diminuídos, mas o emprego estará longe de pleno não
apenas na depressão, mas mesmo na prosperidade, isto é, o desemprego médio poderá
ser considerável, embora suas flutuações sejam menos acentuadas; (b) a taxa de juro ou
o imposto de renda é reduzido na depressão, mas não aumentado na subseqüente
prosperidade. Nesse caso, a prosperidade durará mais tempo, mas deverá terminar em
nova depressão: é claro que uma redução da taxa de juro ou do imposto de renda não
elimina as forças que causam flutuações cíclicas numa economia capitalista. Na nova
depressão será necessário reduzir novamente a taxa de juro ou o imposto de renda, e
assim por diante. Assim, num tempo não muito remoto, a taxa de juro teria de ser
negativa e o imposto de renda teria de ser substituído por um subsídio à renda. O mesmo
aconteceria se tentasse manter o pleno emprego pelo estímulo ao investimento privado:
a taxa de juro e o imposto de renda teriam de’ ser continuamente reduzidos.

1 Em adição a essa fraqueza fundamental de combater o desemprego pelo estímulo ao


investimento privado, existe uma dificuldade prática: é incerta a reação dos homens de
negócio às medidas acima descritas. Se a depressão é forte, eles podem ter uma visão
pessimista do futuro, e a redução da taxa de juro ou do imposto de renda pode então,
por um longo período, não exercer qualquer influência sobre o investimento e, portanto,
sobre o nível de produção e de emprego.

3. Mesmo os que advogam o estímulo ao investimento privado para contrapor-se à


depressão freqüentemente não se fiam só nisso, mas consideram que esse estímulo
deveria ser associado ao investimento público. Parece, atualmente, que os “líderes
empresariais” e seus assessores pelo menos parte deles tenderiam a aceitar como um
PIS além a despesa pública financiada por empréstimo como um meio de aliviar as
depressões. Mas eles ainda parecem opor-se firmemente tanto à criação de emprego pelo
subsídio ao consumo como à manutenção do pleno emprego.

Essa situação é talvez sintomática do futuro regime econômica das democracias


capitalistas. Na depressão, ou pela pressão popular ou mesmo sem ela, o investimento
público financiado por empréstimo será adotado para evitar o desemprego em larga
escala. Mas se forem feitas tentativas de aplicar esse método a fim de manter o alto nível
de emprego alcançado na subseqüente prosperidade, é provável que haverá uma forte
oposição por parte dos “líderes empresariais”. Como já foi assinalado, um pleno emprego
duradouro não é absolutamente do gosto deles. Os traba¬lhadores estariam “fora de
mão” e os “capitães da indústria” estariam ansiosos por “ensinar-Ihes uma lição”.
Ademais, o aumento de preços na fase de prosperidade é desvantajoso para os
pequenos e médios repentistas e os tornaria “aborrecidos”. Nessa situação é provável a
formação de um poderoso bloco de grandes empresários e repentistas, que encontraria
mais de um economista para declarar que a situação é claramente enferma. A pressão de
todas essas forças, e em particular das grandes empresas, muito provavelmente induziria
o Governo a retomar à política ortodoxa de corte do déficit orçamentário. Seguir-se-ia uma
recessão, na qual a política governamental de despesa voltaria a seu sentido próprio.

Esse padrão de “ciclo econômico político” não é inteiramente conjectural; alguma coisa de
muito parecido aconteceu nos Estados Unidos em 1937-38. A interrupção da prosperidade
na segunda metade de 1937 deveu-se realmente à drástica redução do déficit
orçamentário. De outro lado, na aguda recessão que se seguiu, o Governo prontamente
reverteu à política de gastos.

6 Comments To "Mais GENIAL texto de ciência política do século

XX: OS ASPECTOS POLÍTICOS DO PLENO EMPREGO"

Você também pode gostar