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A REPERCUSSÃO DA TIMIDEZ EM UNIVERSITÁRIOS NO PROCESSO DE


FORMAÇÃO ACADÊMICA¹

Luiz Henrique Kirch


Carolina Bunn Bartilotti 

Resumo: O tema timidez é de alta complexidade uma vez que envolve


primordialmente afetividade. O medo e a ansiedade estão na base da timidez
causados pela possibilidade do tímido não corresponder ao esperado. A timidez é
um tema pouco estudado, mas que, segundo pesquisas, atinge cerca de 50% da
população e pode trazer prejuízos à qualidade de vida das pessoas. O objetivo desta
pesquisa é Identificar a Repercussão da Timidez em Universitários no Processo de
Formação Acadêmica. A pesquisa é classificada em exploratória, quantitativa, de
levantamento, de corte transversal e teve como instrumento de coleta de dados, um
questionário online, com tempo de resposta médio de 15 minutos. Os sujeitos de
pesquisa compreenderam 415 estudantes de todos os cursos presenciais de uma
Universidade Comunitária da região sul de Santa Catarina, nos quais se buscou
identificar as implicações da timidez em três eixos: nas interações acadêmicas, no
desempenho acadêmico e na sintomatologia de ansiedade social. Dos dados
obtidos, 67,3% dos estudantes se consideram tímidos e da análise dos três eixos
pode-se concluir que a timidez repercute nas interações, no desempenho e no
quadro de ansiedade durante o processo de formação acadêmica. Esta pesquisa
analisou dados de uma amostra de estudantes com intervalo de confiança de 95%, o
que aponta que os dados analisados são bastante representativos da população
estudada. A pesquisa não traz benefícios diretos aos participantes, mas pode
contribuir para que as instituições de ensino, profissionais da saúde e educação
possam desenvolver estratégias de cuidado aos estudantes tímidos.

Palavras-chave: Timidez, formação acadêmica, estudantes universitários.

1 INTRODUÇÃO

O tema timidez é de alta complexidade uma vez que envolve


primordialmente afetividade. Para Carducci (2012), timidez é um processo
persistente e dinâmico, um traço de personalidade, desencadeado por “gatilhos da
timidez”. Para este autor, os gatilhos compreendem: a “novidade”, como por
exemplo, “uma mudança para outro lugar quando se é criança”; segundo a

¹ Artigo apresentado como trabalho de conclusão de curso de Psicologia da Universidade do Sul de


Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Psicólogo, Palhoça, 2018.

Acadêmico do curso de Psicologia da Universidade do Sul de Santa Catarina. Endereço eletrônico
lhenriquek@gmail.com

Professora Orientadora da Universidade do Sul de Santa Catarina. Endereço eletrônico
carolina.bartilotti@unisul.br
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“imprevisibilidade” interpretada como ameaça; e a “avaliação”, que se traduz por um


sentimento de que seu comportamento está sendo julgado por outras pessoas.
Logo, unindo estes elementos, pode-se dizer que a timidez se irrompe por contextos
sociais novos, inesperados e que envolve avaliação, como “o primeiro dia de aula”
ou “divórcio e outros transtornos familiares” (CARDUCCI, 2012, p. 47).
Para Shirley (2005 apud AGUIAR, 2010, p. 15), timidez é um modelo
comportamental no qual a pessoa não se expressa ou se expressa de forma contida
suas ideias e sentimentos, tornando suas interações sociais acanhadas. Albisseti
(1998, apud AGUIAR, 2010, p. 9) entende o tímido como “aquele que tem medo,
medo de não agradar, medo de não corresponder ao esperado, medo de ser
criticado, questionado, humilhado”. Axia (2003), também enfatiza a existência do
medo, que está cristalizado na consciência da pessoa tímida e em determinada
situação, quando reconhece em si os sintomas, no momento em que não gostaria de
reconhecer, o indivíduo se apieda de si mesmo. Para Zimbardo (1982), considerado
o precursor de estudos sobre o tema timidez na pós-modernidade, uma das formas
mais autênticas para identificar se uma pessoa é timida ou não, além dos sintomas e
testes específicos, é a própria pessoa se declarar como tímida.
Autores como Wallon (1989) e Aguiar (2010) afirmam que o
comportamento de ser tímido não tem relação com a capacidade cognitiva, por
exemplo, se o aluno não participar da aula não quer dizer que ele não aprende o
conteúdo, porém, Aguiar (2010), Silva (2011) e Leahy (2011, apud ESTEVES, 2012)
apontam que a timidez pode ser consideravelmente reduzida, quando assimilada
como um comportamento a ser trabalhado com desenvolvimento de estratégias
assertivas, permitindo ao estudante alcançar maior desempenho em termos de
conhecimento.
Autores consagrados no estudo do desenvolvimento humano, como
Vygotsky (1998), Piaget (1990) e Wallon (1989), afirmam que a qualidade das
interações afetivas, nos primeiros anos de vida, é diretamente proporcional ao
desenvolvimento emocional da criança, assim como fundamenta a construção da
maneira como a criança irá se relacionar com o mundo que a cerca, repercutindo em
um comportamento mais ou menos extrovertido.
Barbosa e Wiezzel (2014, p. 1082) entendem que a timidez excessiva
“envolve baixa-autoestima, dificuldades de se relacionar, medo, privações, o que
dificulta um desenvolvimento emocional saudável, limitando a criança nos seus
relacionamentos, inclusive na escola”. Schneider e Silva (2007), apontam que a
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autoestima é alcançada através das interações criança/mediador(es), assim, ela


experimenta, organiza seu autoconceito de acordo com suas capacidades e se
adequa a cada contexto ou situação, fortalecendo a confiança em si mesma.
Segundo Mascarenhas (2007, apud ESTEVES, 2012), as mesmas
crianças que no início da infância foram vítimas de impropérios e humilhações, terão
maior probabilidade de apresentar desenvoltura acanhada quando adultos, bem
como diminuída sua criatividade. Estes adultos tenderão a interpretar as situações
equivocadamente, se colocando como objeto alvo de argumentações de cunho
geral, ter baixa autoestima, o que dificulta sua expressividade como sujeitos no
mundo.
Outro fator apontado por Axia (2003), que decorre da área familiar e
repercute para ênfase da timidez, diz respeito a importância que os pais dão às
aparências, exigindo comportamentos dos filhos em função dos julgamentos alheios,
em detrimento de um comportamento natural e autêntico. A autora também adverte
que há famílias que valorizam mais um filho que segue a educação imposta do que
outro que tenta burlar essa educação rígida e mascarada. Para a mesma autora, a
severidade da educação, seja com agressões verbais e até físicas, e ainda
“situações de descaso e indiferença, abandono, agressão, pobreza, doenças,
perdas, incompreensões e situações difíceis de ser superadas são questões
recorrentes em muitos lares” (AXIA, 2003, p. 53).
O tema timidez na área educacional se faz importante, sobretudo no
contexto universitário da atualidade, uma vez que o ensino evidencia-se nas trocas
de informações através de diálogos e debates, assim, muitos eventos e até mesmo
didáticas em sala de aula envolvem o grupo participativo. Observa-se que o
estudante precisa estar conectado, sentir-se pertencente à sua esfera de estudo e
ao próprio ambiente acadêmico. Para isso, a Universidade tem ampliado o espaço
de convivência entre alunos/alunos e alunos/professores, propiciando ambientes
agradáveis que incitem o estudo, a criatividade e inovação, bem como utilizando-se
do exercício da aceitação das subjetividades, ou seja, a interação salutar das
diferentes culturas e projetos de vida acadêmica. Desta forma, o estudante
desintegrado pode ser alvo de rótulos e isolar-se, além disso, dificulta o vínculo com
seus interlocutores, alterando a qualidade das relações sociais acadêmicas.
Segundo Barbosa e Wiezzel (2014), a timidez é um comportamento que não se tem
dado atenção em sala de aula, pois muitos professores veem no aluno tímido aquele
que não incomoda, colaborando para um ambiente sempre tranquilo e cômodo.
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Pesquisas envolvendo o tema timidez tendo como público alvo


universitários são escassas. Observa-se que os estudantes universitários perpassam
um longo período em sua formação (quatro, cinco anos), com um grau muito alto de
exigências, como apresentação de trabalhos, arguições e debates em sala de aula,
provas, estágios, etc., muitas vezes sobrecarregando-os e colocando em cheque,
suas capacidades de alcançarem os objetivos exigidos. Loreto (1985, apud
CAIXETA; ALMEIDA, 2013, p. 2) afirma que a universidade tem responsabilidade
neste fenômeno, devendo “oferecer suporte e orientação para superação desses
conflitos”.
É sabido que muitos estudantes chegam à universidade com poucas
habilidades sociais, ou seja, mais precisamente aquelas que envolvem o
desempenho da comunicação verbal e não verbal, notadamente importantes à boa
desenvoltura no fazer acadêmico. Sendo assim, para o estudante tímido, a escassez
destas habilidades, podem agravar seu estado biopsicossocial. Del Prette & Del
Prette (2006) afirmam que habilidades sociais correspondem a uma gama de
comportamentos sociais que o indivíduo tem em seu repertório, bem como a
capacidade de saber usar adequadamente um tipo de comportamento para cada
forma de interação interpessoal. Os mesmos autores salientam que os indivíduos
que adquirem estas habilidades têm mais sucessos em seus relacionamentos, no
ambiente escolar ou no trabalho, bem como são menos propensos a adquirir
doenças.
Em um estudo efetuado por Duarte e Oliveira (2004, apud SILVA, 2011)
na Universidade Católica de Goiás, observou-se que a timidez pode repercutir no
desempenho escolar, onde universitários participantes da pesquisa declararam que
temiam qualquer tipo de interação com os professores, como provas orais e até
mesmo fazer perguntas, produzindo ansiedade excessiva em todos eles. Segundo
os mesmos autores o medo e a vergonha, dificultam a exposição natural,
bloqueando novas experiências, assim como a incerteza do futuro.
O ambiente escolar também pode se apresentar hostil e contribuir para
um comportamento tímido. Críticas e humilhações públicas de professores e pares,
afetam impetuosamente o estudante, tolhendo sua expressividade como ser social
no ambiente escolar. Obviamente, estas consequências dependerão da forma que o
estudante processará essas críticas e humilhações, podendo acarretar baixa
autoestima na medida em que toma posse das afrontas infringidas, principalmente
se não forem verdadeiras (MASCARENHAS, 2007 apud ESTEVES, 2012).
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A ansiedade que é sentida pelo estudante, segundo Brandtner e Bardagi


(2009) é um estado emocional complexo e aversivo. Estas autoras salientam que
enquanto o medo é real, de origem externa e não conflituoso, a ansiedade é de
ordem interna e conflituosa, funcionando como um aviso que um perigo é eminente
e que o individuo lance mão de suas defesas, de luta ou de fuga.
A timidez pode se exprimir por sintomas comuns a todos os indivíduos,
como explica Esteves (2012, p. 42), através de “uma sensação de desconforto
comum” chegando a uma condição mais severa, também denominada de
“Transtorno de Ansiedade Social ou Fobia Social, nomes dados à timidez patológica,
para discriminá-la em relação à timidez”. Segundo o CID-10 (1993), quando trata dos
transtornos neuróticos, relacionados ao estresse e somatoformes, o que move o
sintoma neurótico é a ansiedade. O mesmo código informa que os sintomas de
transtorno de ansiedade sofrem diferenciação quanto ao grau de intensidade, como
também se diferenciam quanto a sua circunscrição, ou seja, quando evoca situações
episódicas denomina-se transtornos fóbico-ansiosos (F40), e quando é
generalizado, recebe o nome de outros transtornos de ansiedade, como por
exemplo, o transtorno de ansiedade generalizada (F41.1). Todos os transtornos
dessa classificação (F40 – F48), quando intensos, podem debilitar a vida escolar,
social e profissional do indivíduo.
Alguns estudos brasileiros efetuados com universitários indicaram
prevalência de ansiedade e depressão nestes participantes. A incidência de
ansiedade em universitários é alta. Uma pesquisa efetuada por Baldassin, Martins e
Andrade (2006, apud BRANDTNER; BARDAGI, 2009) apontou que 20,1% dos
estudantes de medicina apresentaram alto nível de ansiedade e 79,9% ansiedade
média. Já Furegato et al. (2006, apud BRANDTNER; BARDAGI, 2009, p. 84) em
outra pesquisa com 224 estudantes, de um curso de Enfermagem, apontaram
“10,3% para disforia, e 6,7% para depressão moderada e grave, índices segundo os
autores próximos aos da população geral”. Já Fonseca et al. (2008 apud
BRANDTNER; BARDAGI, 2009,) em uma amostra de 196 estudantes de psicologia
chegaram ao índice de 14,3% com sintomas de depressão.
Tendo em vista os ensinamentos de Schneider e Silva (2007), Axia
(2003), Barbosa e Wezzel (2014) e Macarenhas (2007 apud ESTEVES, 2012), vê-se
que a família e a escola têm parcela importante no desenvolvimento da criança e
posteriormente no jovem, em oferecer ambientes seguros, a fim de que a criança e o
futuro jovem estudante possa naturalmente desempenhar satisfatoriamente suas
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relações interpessoais. Estas reflexões elevam à importância do educador no


cuidado e preocupação com seus alunos tímidos em todos os níveis, promovendo
um ambiente aprazível, através do respeito entre os pares, na abordagem adequada
para trazer os tímidos ao diálogo, fazendo-os se expressarem natural e livremente,
sem melindres. Zabalza (2004) ressalta que a função do corpo docente tem se
ampliado para áreas mais amplas, compreendendo inclusive, atividades de auxílio e
assessoramento aos estudantes.
De um modo geral, as inibições e desconfortos nas relações sociais,
segundo Shirley (2005, apud AGUIAR 2010, p. 15), se manifestam no tímido em
quatro níveis, sendo eles, “cognitivo, afetivo, fisiológico e comportamental”, da
seguinte forma:
- no cognitivo sobressaem os pensamentos negativos, como por exemplo,
dar vexame ou medo de ser avaliado negativamente;
- no afetivo manifestam-se a “vergonha, tristeza, solidão, depressão,
ansiedade e baixa autoestima”;
- no fisiológico a autora enumera “o aumento do batimento cardíaco,
secura na boca, tremedeira, rubor, transpiração excessiva e gagueira”;
- por último, no comportamental cita “a inibição e passividade, evitação do
contato visual, baixo volume de voz, reduzida expressão corporal e apresentação de
comportamentos nervosos”.
Zimbardo (1995, apud FELIX, 2013, p.19), traz uma pesquisa realizada
pela Universidade de Standford (EUA), com 1642 entrevistados, em que

40% dos adultos afirmaram ser cronicamente tímidos, enquanto 40%


declararam que haviam sido tímidos em algum momento de suas vidas,
porém não mais se consideravam tímidos; 15% disseram ter se sentido
tímidos em alguma situação em suas vidas e apenas 5% declararam não se
considerar tímidos.

Relativamente à pesquisa acima, pode-se considerar que os números são


mais altos do que se poderia imaginar, ratificando “que a timidez é um fenômeno
comum, generalizado e universal” (ZIMBARDO, 1982, p. 25). Vê-se também que a
timidez é um fenômeno que as pessoas tentam se libertar usando estratégias de
acordo com a criatividade, de senso comum. Assim, a timidez pode passar
despercebida, tornando-se invisível, como afirmou Zimbardo (2008, apud FELIX,
2013), pois sendo indesejável, as pessoas ocultam-na, tornando esse
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comportamento difícil de percepção, demandando perspicácia e cuidado dos


educadores para percebê-la.
Axia (2003) sinaliza a presença de três elementos essenciais que
estruturam a pessoa tímida: o sujeito considerando aspectos hereditários; o
ambiente que pode favorecer o agravamento ou a amortização da timidez e; a
qualidade das interações sociais fazendo-o sujeito do seu mundo. Portanto, as
predisposições genéticas e as experiências sociais, vão modular o grau de timidez
em cada pessoa.
Mascarenhas (2007 apud ESTEVES, 2012, p. 57-58) aponta, que “a
dúvida a respeito de seu próprio valor, acompanhada do sentimento de inadequação
e vergonha de si mesmo, é o núcleo do complexo de timidez e inferioridade”. A
autora destaca que ao passar dos anos, as crenças vão se cristalizando como leis
imutáveis e inquestionáveis, fazendo com que o indivíduo desenvolva
comportamentos particulares de evitação das situações de exposição pública,
perdendo sua espontaneidade e oportunidades de novos encontros e relações.
Salienta ainda a autora que o adulto tímido não sabe de onde vem sua timidez e não
sabe como resolver esse conflito interior.
Como se viu até o presente, a timidez se estabelece nas relações ou na
eminência de uma situação que envolva o juízo de outras pessoas. Esse fenômeno
se expressa não somente através de sintomas visíveis e invisíveis, mas também de
estratégias utilizadas pelo tímido para não chamar a atenção para si.
O fato é que os tímidos tendem a se esquivar de situações de exposição,
assim, até os seus gestos e o sorriso são medidos, e poucos se encorajam a
enfrentar ou negociar uma possibilidade de enfrentamento. Para Zimbardo (1982),
essa análise que o tímido faz de si mesmo na eminência de exposição, consome
grande parte do seu raciocínio, colocando a ação de enfrentamento em segundo
plano, ou seja, toda energia é transferida para a análise (pensamento de si na cena)
e desta forma, a ação de interação é inibida.
Para Zimbardo (1982), o indivíduo que não age com autenticidade acaba
abafando os sentimentos e atitudes, sentimentos e atitudes que até gostaria de
externar, mas declina desse intento que revelaria sua fragilidade, uma verdadeira
repressão de sentimentos e pensamentos que ousam expressarem-se. Este autor
afirma que dentro do tímido “existe um labirinto de estradas de pensamento em que
se verificam colisões constantes de sensações e ruidosos engarrafamentos de
desejos frustrados” (ZIMBARDO, 1982, p. 43).
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Dentro do que foi acima exposto, esta pesquisa tem como objetivo geral
Identificar a Repercussão da Timidez em Universitários no Processo de Formação
Acadêmica, e como objetivos específicos identificar os impactos da timidez nas
relações sociais de universitários no ambiente acadêmico, apontar reflexos da
timidez no desempenho acadêmico de universitários, e identificar a relação da
timidez em universitários e a sintomatologia de ansiedade social.

2 MÉTODO

A presente pesquisa quanto aos objetivos se classifica como exploratória,


quanto à natureza como quantitativa, quanto ao delineamento como levantamento e
quanto ao corte como transversal.
Os sujeitos compreenderam 415 estudantes maiores de 18 anos,
matriculados em cursos presenciais de uma Universidade Comunitária da região sul
do país. Os cursos com maior participação foram Psicologia 34%, Direito 21%,
Nutrição 10% e Engenharia Civil 8%. Compreendeu 324 (78%) estudantes do sexo
feminino e 91 (22%) do sexo masculino. 51 estudantes (12,3%) já têm curso superior
contra 364 (87,7%) que não tem. 249 (60%) estudantes trabalham e 166 (40%) não
trabalham.
Para a coleta de dados foi construído um questionário e postado na
plataforma Pesquisa Online. O instrumento foi constituído de perguntas objetivas,
nível de mensuração ordinal e respostas de escolha ordinal que varia de 1 à 6, da
seguinte forma:
1 = nada/nunca;
2 = raramente;
3 = ocasionalmente;
4 = frequentemente;
5 = muito frequentemente, e;
6 = totalmente/sempre.
Estruturalmente o instrumento tem cinco perguntas com enunciado
específico e cada pergunta se divide em um grupo de afirmações e para cada
afirmação o respondente escolheu uma alternativa dentre as seis alternativas de
escolha ordinal, conforme visto acima. Cada pergunta contava dos seguintes
números de afirmações:
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- questão 1: Assinale as alternativas quanto ao seu comportamento no


ambiente acadêmico = 22 afirmações;

- questão 2: Nas situações em que você tenha que se expor pode ocorrer
algumas alterações físico-cognitivas. Considere aquelas que você percebe e aquelas
que outras pessoas percebem = 15 afirmações;

- questão 3: Quanto a sua participação em sala de aula = 08 afirmações;


- questão 4: Quanto ao seu desempenho escolar: (desempenho =
conhecimento ≠ notas) = 08 afirmações, e;
- questão 5: Assinale as alternativas correspondentes que, em geral,
aparecem quando da apresentação de um trabalho escolar ou outras situações de
interação = 13 afirmações.
Em poucas palavras, o questionário mediu determinadas variáveis
grupais, procurando se enquadrar ao objetivo geral e específicos, bem como
alinhando-se ao referencial teórico. Importante se faz salientar que o número de
alternativas para responder a cada objetivo específico não está na mesma ordem e
número de afirmações como já visto. Todos os itens foram analisados considerando
as médias para o grupo de sujeitos que se declararam tímidos e não tímidos. Para
analisar se a diferença entre as médias dos dois grupos (tímidos e não tímidos)
apresentaram-se como estatisticamente significativas, primeiramente utilizou-se o
teste de Kolmogorv Smirnov. Este apontou que as respostas dos sujeitos não
apresentaram uma distribuição normal, o que implica no uso de procedimentos
estatísticos não paramétricos. Assim, em seguida utilizou-se o teste Mann-Whitney
(adequado para procedimentos estatísticos não paramétricos) para verificar se as
diferenças de resultados entre os dois grupos foram estatisticamente significativas.
Além disso, foram feitas análises de porcentagem de sujeitos que atendiam
determinados critérios que serão descritos ao longo da análise.
A escolha por uma versão informatizada foi relevante pela praticidade e
maior abrangência considerando o público alvo de 15.605 universitários e a amostra
mínima de 390 universitários, conforme cálculo amostral aleatório simples com erro
de 5%.
Com o fim de testar o instrumento de pesquisa foi encaminhado um e-mail
a doze universitários do Curso de Psicologia, convidando-os a participarem do pré-
teste, assim como foi solicitado sugestões para aprimoramento do instrumento. Dos
doze convites, oito responderam, mas somente 6 foram válidos por concluírem todas
as questões do questionário. Nenhum dos participantes efetuou feedback ou
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sugestões referentes ao instrumento, conforme solicitado no convite. Dessa forma


concluiu-se que o instrumento estava coerente em relação à estrutura e conteúdo,
assim como os fatores éticos foram respeitados, ficando clara a voluntariedade e
desistência a qualquer momento, o sigilo, o tempo para a resposta, bem como não
foi notificado qualquer mal estar dos universitários ao responderem o instrumento.
Em seguida foi encaminhado um e-mail para a Coordenação do Curso de
Psicologia para que esta encaminhasse o mesmo e-mail para a Reitoria e esta para
todos os coordenadores de cursos presenciais da Universidade, divulgando a
pesquisa e solicitando aos 15.605 universitários, voluntários para participação. Ainda
foi solicitado ao site de divulgação de eventos da Universidade (boletim de notícias -
newsletter), via web, a divulgação da pesquisa e o convite aos universitários para
participação.
Como os meios de divulgação acima não foram suficientes para que fosse
alcançada a amostra mínima, o pesquisador ainda visitou algumas salas, e procurou
de forma mais empática conquistar o interesse dos universitários em voluntariarem-
se na participação da pesquisa. As últimas estratégias obtiveram êxito, chegando o
cômputo final a 107% da amostra esperada, antes do prazo previsto.
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), sob
número do parecer 2.880.648. A avaliação desta etapa mostrou a importância dos
cuidados e zelos para com o instrumento de pesquisa, a persistência imprescindível
ao pesquisador para que alcançar os objetivos, assim como o respeito aos
parâmetros éticos e científicos de uma pesquisa científica.

3 ANÁLISE DE DADOS

A fim de organizar e facilitar o entendimento da análise de dados, este


capítulo foi dividido em três eixos, sendo: Eixo 1 - Impactos da timidez nas relações
sociais de universitários no ambiente acadêmico; Eixo 2 - Reflexos da timidez no
desempenho escolar de universitários; e Eixo 3 - Relação da timidez em
universitários e a identificar a relação da timidez em universitários e a sintomatologia
de ansiedade social.
Preliminarmente, chamou a atenção nesta pesquisa, os índices dos
sujeitos que se declararam tímidos (66,7%, n=277) e àqueles que não se declararam
tímidos (33,3%, n=138). Esse alto índice de tímidos, confirmam as pesquisas de
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Zimbardo (1995, apud FELIX, 2013, p.19), efetuada com 1642 entrevistados, na qual
“40% dos adultos afirmaram ser cronicamente tímidos, enquanto 40% declararam
que haviam sido tímidos em algum momento de suas vidas”.
Examinando os itens que caracterizam timidez ou não timidez no Gráfico
1, que possui 14 afirmações e nível de mensuração de frequência que vai de 1 à 6,
pode-se observar que as médias apontadas pelos estudantes tímidos foram maiores
nos aspectos comportamentais que apontam para a timidez, desta forma, os dados
colhidos convergem com as características de timidez apontadas na literatura. De
outro modo, os participantes que não se declararam tímidos, tiveram médias maiores
nos itens que indicam maior desinibição. Faz-se importante destacar que todos os
itens apresentaram diferenças estatisticamente significativas, por meio do teste
Mann-Whitney, considerando as respostas do grupo de tímidos e não tímidos,
exceto o item ”busco sempre a perfeição não me permitindo errar”.

Gráfico 1 – Aspectos comportamentais da timidez

Fonte: Elaboração do autor, 2018.


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Nos aspectos físicos e cognitivos da timidez (Gráfico 2), as médias


assinaladas pelos universitários, demostraram que os estudantes declarados
tímidos, apresentam incidência de aspectos físicos e cognitivos para timidez
relativamente maiores do que os que não se consideram tímidos. Neste gráfico, a
diferença das médias foi estatisticamente significativa em todos os itens de acordo
com o teste Mann-Whitney, considerando as respostas do grupo de tímidos e não
tímidos.

Gráfico 2 – Aspectos físicos e cognitivos da timidez em situação de exposição

Fonte: Elaboração do autor, 2018.

Considerando as porcentagens dos estudantes tímidos, que assinalaram


frequência de ocorrência dos itens acima de 4 pontos (“frequentemente” ou mais),
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encontrou-se os seguintes dados: 74% (n=205) tem “dificuldade de expor


corretamente as ideias”; 76% (n=210) tem “aumento dos batimentos cardíacos”; 64%
(n=176) para “’dá branco’ (esquecimento)”, e 64% (n=177) tem “dificuldade para
falar”. Vê-se então, que também nos aspectos físicos e cognitivos os dados
apresentados convergiram com o preconizado pela literatura. Cabe o registro de que
os sintomas físicos e cognitivos, conforme Gráfico 2, não se manifestam
simultaneamente e dependem de fatores biológicos e psíquicos, subjetivos a cada
estudante.

3.1 EIXO 1 – IMPACTOS DA TIMIDEZ NAS RELAÇÕES SOCIAIS DE


UNIVERSITÁRIOS NO AMBIENTE ACADÊMICO

O Gráfico 3 apresenta doze afirmações de situações em que o


universitário geralmente se vê envolvido no ambiente acadêmico e de alguma forma,
dependendo do seu grau de timidez, poderão alterar a qualidade e/ou oportunidade
de relações sociais na universidade. Todos os itens que dificultam as relações
interpessoais tiveram médias maiores para os estudantes tímidos em relação aos
não tímidos. Todos os itens do Gráfico 3 apresentam diferenças das médias
estatisticamente significativas, conforme teste Mann-Whitney, considerando as
respostas do grupo de tímidos e não tímidos.
Dentre os itens mais apontados, para os tímidos, destacam-se as
seguintes médias de frequência: “na praça de alimentação/biblioteca não sento à
mesa com alguém que não conheço” (M=4,6); “concordo que entrei na universidade
sem habilidades para me expor publicamente” (M=4,5); e “a falta de habilidade para
me expor publicamente me intimida nas interações” (M=4,3), considerando todos
com média de frequência acima de “frequentemente”.
Considerando as mesmas afirmações destacadas já destacadas para os
tímidos, os valores em percentuais e número de estudantes que assinalaram
“frequentemente”, “muito frequentemente” e “totalmente/sempre” (4, 5 ou 6) foram os
seguintes: 75% (n=209) declararam que “na praça de alimentação/biblioteca não
sento à mesa com alguém que não conheço”; 75% (n=208) disseram que “concordo
que entrei na universidade sem habilidades para me expor publicamente”; e 71%
(n=196) que “a falta de habilidade para me expor publicamente me intimida nas
interações”.
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Se verificarmos os dois últimos itens juntos, que tratam da falta de


habilidade social, 36% (n=100) dos estudantes tímidos assinalaram que “muito
frequentemente” e “totalmente/sempre” (nível de frequência de 5 à 6 pontos) isso
ocorre simultaneamente com eles no cotidiano acadêmico.

Gráfico 3 – Impactos da timidez nas relações sociais de universitários no


ambiente acadêmico

Fonte: Elaboração do autor, 2018.

Para o tímido a falta de habilidades sociais agrava seu estado emocional


e consequentemente amplia a possibilidade de evitar interações, perdendo a chance
de aprimoramento pessoal. Neste viés, Del Prette e Del Prette (2001) esclarecem
que os entraves encontrados nas relações interpessoais, empobrece a qualidade de
vida, demandando ações reativas e preventivas. Para esses autores as habilidades
sociais são apreendidas, desta maneira, quando o estudante tímido se esquiva de
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interações, não exercita ou experimenta, não adquire essas habilidades,


aumentando ainda mais o cabedal de motivos para não se expor. De outra forma,
Aguiar (2010), Silva (2011) e Leahy (2011, apud ESTEVES, 2012), afirmam que o
sujeito que exercita a interação com outros mediadores, desenvolve o gosto pela
expressão, pelo debate, expondo seu entendimento ou interpretação, alcançando
maior amplitude de conhecimentos.
No que tange as possibilidades de interação, 58% (n=162) dos
respondentes tímidos identificaram que, frequentemente, muito frequentemente ou
sempre, o “meu jeito mais retraído(a) diminuem minhas possibilidades de interação”.
Além disso, 51% (n=142) identificam ter “dificuldade de iniciar uma conversa” e 52%
(n=144) costumam se “esquivar e/ou fugir de situações sociais na universidade”,
dados que apontam para uma dificuldade no estabelecimento de interações sociais
no ambiente acadêmico. Na questão do comportamento evasivo predominante nos
tímidos, há contextos como a sala de aula, que o estudante até gostaria de tirar suas
dúvidas ou expor seu posicionamento, mas se retrai por medo da exposição, medo
de errar, medo do ridículo (ZIMBARDO, 1982). Se considerarmos simultaneamente,
os três itens acima o resultado é que 26% (n=76) dos estudantes que se declararam
tímidos vivenciam estas três situações cotidianamente de forma “frequentemente”,
“muito frequentemente” ou “totalmente/sempre”.
Para Zimbardo (1982), a iminência de se expor, leva o tímido para um
exame sobre si mesmo, toda energia é transferida para a análise (pensamento de si
na cena) e desta forma, a ação de interação é inibida.
A partir dos dados vistos até o presente é possível ter uma ideia da
dimensão físico-comportamental-emocional do estudante tímido que impactam nas
relações sociais acadêmicas. Pode-se destacar, como visto no Gráfico 1, que a
média foi de 4,8 para o item “sinto-me desconfortável em situação de exposição
pública” e no Gráfico 2, a média foi de 4,1 para o item “dificuldade para falar“, ambos
com frequência acima de “frequentemente” (4 a 6 pontos). Se considerarmos os dois
itens simultaneamente 38% (n=105) dos estudantes tímidos assinalaram estes itens,
com frequência de “muito frequentemente” ou “totalmente/sempre” (5 ou 6).
Quanto aos dados dos estudantes não tímidos, destacou-se o item “tenho
facilidades de fazer amigos” com média de frequência de mensuramento igual a 4,7
(“frequentemente” ou mais”), ou seja, 62% (n=83).
Neste eixo pode-se compreender, através de situações cotidianas do
contexto acadêmico, que o estudante tímido apresenta dificuldades de
16

relacionamento interpessoal. E porque evita a interação? Viu-se que sentimentos de


desconforto, ansiedade e a falta de habilidades sociais, acabam inibindo
oportunidades de interações. Ficou evidenciada, por parte do estudante tímido, a
necessidade de uma maior confiança em si mesmo e, conforme visto na literatura,
além do treinamento de algumas habilidades de expressão, a necessidade de uma
natural afetividade entre os atores na dinâmica das interações acadêmicas, de forma
a propiciar um ambiente seguro onde o estudante possa se expressar com
segurança.

3.2 EIXO 2 – REFLEXO DA TIMIDEZ NO DESEMPENHO ACADÊMICO DE


UNIVERSITÁRIOS

O termo desempenho a ser analisado aqui é concernente à


qualidade/profundidade de conhecimentos provindos das interações no ambiente
acadêmico, principalmente em sala de aula.
O Gráfico 4, com um total de doze itens (afirmações), apresenta as
médias resultantes quanto ao reflexo da timidez no desempenho acadêmico. Nos
itens que indicam déficit para o desempenho, a média de intensidade de frequência
para os universitários que se consideram tímidos foram relativamente maiores do
que para os universitários que não se consideram tímidos. Neste conjunto de itens,
as médias também apresentaram diferenças estatisticamente significativas, de
acordo com o teste Mann-Whitney, considerando as respostas do grupo de tímidos e
não tímidos.
Destacaram-se os seguintes itens que obtiveram média igual ou acima de
4, com nível de frequência “frequentemente” ou mais: “sinto-me mais confortável nas
aulas que não exigem exposição oral” (M=4,9); “meu nervosismo interfere no meu
raciocínio” (M=4,6); “prefiro tirar as dúvidas com amigos, com o professor no final da
aula ou na Internet” (M=4,6); “costumo evitar exposição pública em sala de aula”
(M=4,6); “meu medo de falar em público altera meu desempenho” (M=4,3).
Conforme Aguiar (2010), quando o estudante declina em participar de
interações sociais, perde a oportunidade de se apropriar de conhecimentos mais
profundos. Zimbardo (1982) também assevera que a opção do tímido em não
participar de interações, se estabelece em virtude da ansiedade e medo de se expor,
17

o que justifica preferirem aulas que não exigem exposição oral, optando por tirar
dúvidas após a aula e assim, evitar exposição pública em sala de aula.

Gráfico 4 – Reflexo da timidez no desempenho acadêmico

Fonte: Elaboração do autor, 2018.

Os dados da amostra pesquisada demonstram que 51% (n=140) dos


estudantes que se declaram tímidos, assinalaram que “totalmente/sempre” “o medo
de falar em público altera meu desempenho”, neste mesmo item e parâmetro, sobe
para 68% se considerarmos o nível de frequência “frequentemente”, “muito
frequentemente” e “totalmente/sempre”. Esses dados convergem com Aguiar (2010,
p. 39), que localiza a linguagem oral como instrumento indispensável às interações e
“fator primordial para o desenvolvimento de múltiplas aprendizagens, dentre elas as
de organizar o pensamento”. Neste viés, a mesma autora enfatiza que o aluno que
opta por não interagir, não socializa seus saberes e restringe seu crescimento
intelectual.
18

Quanto ao item relacionado ao nervosismo interferir no raciocínio, 78%


(n=216) dos tímidos declaram que “frequentemente”, “muito frequentemente” ou
“totalmente/sempre” há essa interferência. Destes 216, 70% declaram que
apresentam os sintomas cognitivos de “dá branco (esquecimento)” e tem “dificuldade
de expor corretamente as ideias”, numa frequência maior que “frequentemente”
(mensuração acima de 4 pontos). Analisando esta mesma combinação de três itens,
porém, no grupo dos não tímidos, somente 14% assinalaram respostas iguais ou
maiores que 4. Como vimos em Zimbardo (1982), as interações causam ansiedade
ao tímido e o fato de não conseguir vencer o nervosismo, combinado com o foco em
si mesmo, altera sua organização cognitiva.
Outros dados que chamam a atenção, foram as médias baixas do nível de
mensuração dos declarados tímidos, nas afirmativas que contribuem para o
desempenho do estudante, como por exemplo, no item “fico tranquilo(a) com
discussões e debates quando instigada minha participação” (M=2,2); também no
item “sinto-me confortável de participar de debates expondo meu ponto de vista”
(M=2,3); e no item “quando tenho dúvida pergunto” (M=2,5). Em muitas ocasiões,
conforme Zimbardo (1982), o tímido até gostaria de proferir uma pergunta, uma
sugestão ou ideia, mas sua ansiedade e nervosismo muitas vezes o demovem de
fazê-lo. Já para Duarte e Oliveira (2004, apud SILVA, 2011) o medo e a vergonha,
dificultam a exposição natural, bloqueando novas experiências e a tensão das
exigências no ambiente acadêmico pode interferir no desempenho do estudante.
Pode-se verificar que o desempenho acadêmico será diretamente
proporcional, do ponto de vista qualitativo/quantitativo, às interações sociais
acadêmicas que vimos no Eixo 1, ou seja, os dados sinalizam de forma direta e
indireta, prejuízos no desempenho dos universitários, quando prepondera a opção
em não participar e/ou interagir no ambiente acadêmico, sobretudo em sala de aula.
Compreendeu-se que fatores como o medo e o nervosismo reduzem a qualidade do
desempenho, e por consequência, a qualidade da formação profissional.

3.3 EIXO 3 – RELAÇÃO DA TIMIDEZ EM UNIVERSITÁRIOS E A


SINTOMATOLOGIA DE ANSIEDADE SOCIAL

Pode-se observar no Gráfico 5, que todos itens que indicaram para


alteração do quadro de ansiedade, tiveram médias de intensidade de frequência
19

maiores para o grupo de universitários que se declararam tímidos, como também


que os itens apresentaram diferenças estatisticamente significativas, por meio do
teste Mann Whitney, considerando as respostas do grupo de tímidos e não tímidos,
exceto os itens “esqueço minhas falhas com naturalidade” e “consigo controlar a
desaprovação”.
Destacaram-se os seguintes itens (afirmativas) que causam medo e
ansiedade: “as demandas universitárias me deixam ansioso(a)” (M=4,5); “a dúvida
quanto a minha capacidade me deixa com medo e/ou ansioso(a)” (M=4,5); “costumo
me auto avaliar quanto ao meu grau de ansiedade” (M=4,2), todos com nível de
mensuração acima de “frequentemente”.

Gráfico 5 – Relação timidez em universitários e a sintomatologia de


ansiedade social

Fonte: Elaboração do autor, 2018.


20

Quando falamos em demandas universitárias, se enquadram não só o


nível de exigência quanto à profundidade dos estudos e a quantidade de provas,
trabalhos, seminários, etc., mas principalmente a frequência de exposições
requeridas dos estudantes. Essas demandas aos estudantes tímidos, quando
extrapolam a capacidade de respostas, podem resultar em medo e ansiedade,
principalmente “o medo de falar em público em estudantes universitários, pode
transformar-se em um sofrimento muito grande por representar um aspecto bastante
valorizado no meio acadêmico” e comprometer sua saúde psíquica em virtude de
não corresponder às expectativas (ESCUDERO, 1999, apud DUARTE; OLIVEIRA,
2004, p. 185), sendo capaz de chegar a transtornos de ansiedade e depressão
(SANTOS e ZUZE, 2001).
Analisando em termos percentuais os mesmos itens acima, dos estudantes
tímidos que apresentam nível de mensuração acima de quatro pontos
(“frequentemente” ou mais), 75% (n=207) apontaram que “as demandas
universitárias me deixam ansioso(a)”; e 57% (n=157) apontaram que “as demandas
universitárias me deixam com medo”; e 55% (n=153) apontaram simultaneamente os
dois itens, todos com escala de mensuração 4, 5 ou 6. Viu-se em Axia (2003) que o
medo é a emoção predominante pela presença real ou simbólica de outros atores,
que na visão do tímido, estarão julgando-o quanto à transgressão de regras e
valores. Os resultados acima corroboram com Carducci (2012, p. 18) que constatou
em uma pesquisa que “para 3 a 13% dos adultos tímidos, a timidez é uma condição
debilitante que causa reações de extrema ansiedade”.
No item “a dúvida quanto a minha capacidade me deixa com medo e/ou
ansioso” o índice percentual foi de 76% (n=211) para os estudantes tímidos,
considerando frequência acima de “frequentemente” (4, 5 ou 6). Mascarenhas (2007,
apud ESTEVES, 2012) afirma que a timidez assenta base na falta de coragem que
se estabelece nas comparações e sentimentos de inferioridade manifestando-se no
medo de enfrentamento, duvidando do seu real valor.
Quanto ao item “costumo me auto avaliar quanto ao meu grau de
ansiedade”, o percentual foi de 40% (n=110) para os estudantes tímidos, com
frequência acima de “muito frequentemente” (5 ou 6), esta afirmação reflete o foco
que ele o tímido tem sobre si mesmo (ZIMBARDO, 1982).
O tímido também se autoavalia depois de decorrido o evento, como algo que
reverbera em sua mente, em constante volta à cena, avaliando seus erros e acertos
(CARDUCCI, 2012). Pois vejamos, dos estudantes que se consideram tímidos, 46%
21

(n=127) declaram que “as falhas são relembradas constantemente como uma
obsessão”, 45% (n=125) apontam que “a desaprovação se torna uma tragédia” e
42% (n=116) afirmam que “tenho mal estar intenso”, todas com escala de
mensuração de frequência acima de “frequentemente”. Esses dados corroboram
com a média de 4,1 para os tímidos que assinalaram o item “busco sempre a
perfeição não se permitindo errar” do Gráfico 1. Já o item “esqueço minhas falhas
com naturalidade”, do Gráfico 5, a média de frequência foi de 2,4 para os tímidos.
É importante destacar ainda que o item “tenho expectativa constante de
avaliação negativa” (M=3,9); “as demandas universitárias me deixam com medo”
(M=3,9); e “tenho necessidade de aprovação dos colegas e professor” (M=3,8),
conforme o Gráfico 5, apresentaram para os tímidos médias muito próximas ao nível
de mensuração “frequentemente”. Se analisarmos simultaneamente os três itens
acima e considerarmos somente aqueles que assinalaram média de frequência
acima de 4 pontos (“frequentemente”), o resultado é de 32% (n=90). Mascarenhas
(2007, apud ESTEVES, 2012), aponta em suas pesquisas, que o tímido, procura
sempre a perfeição, não se permitindo errar, gerando sofrimento e ansiedade pela
possibilidade de se ver impotente e incapaz e não ter a aprovação do outro.
Neste último eixo, pôde-se perceber que a timidez exprime-se por
sintomas comuns de diferentes gradações a todos os estudantes, pois mesmo
àqueles que não se consideram tímidos apresentam alguns aspetos que alteram seu
estado psíquico. Viu-se que a expectativa de desaprovação e de avaliação negativa
de colegas e professores, a dúvida quanto sua capacidade de enfrentamento às
exigências imprimidas e a não possibilidade de errar, são assimilados no estudante
tímido em medo e ansiedade em gradações distintas.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

"A confiança é talvez a dimensão mais importante das relações humanas”


(ZIMBARDO, 1982, p. 232).

Ao final desta pesquisa, reforça-se a importância do estudo do tema


timidez, uma vez que a sociedade em que vivemos e o mercado de trabalho, exigem
habilidades de interações sociais que contribuam para aumentar seu rendimento
produtivo. Essa mesma exigência é também muito valorizada no fazer acadêmico,
em que despontam modalidades didáticas, onde o aluno é estimulado a participar
22

ativamente da construção do saber, através de sua participação efetiva no processo


de ensino aprendizagem, principalmente pelas arguições da língua falada, o que
pode trazer dificuldades de interações àqueles alunos tímidos, que não apresentam
essas habilidades.
Esta pesquisa foi capaz de revelar não somente o alto índice de
estudantes tímidos, uma vez que 66,7% dos participantes se declararam tímidos,
consoante às pesquisas já efetuadas referentes ao tema, mas também, os dados
encontrados revelaram que as características determinantes e consequentes da
timidez, vão ao encontro ao preconizado pelos principais autores da área,
demonstrando que a timidez é um processo dinâmico e subjetivo, de ordem afetiva,
que tem na sua base o medo e a ansiedade devido a iminente possibilidade de
submissão ao julgamento de outrem.
As dificuldades encontradas no decorrer do estudo compreendeu,
principalmente, a escassez de referencial bibliográfico, essencialmente de
pesquisas que vinculasse o fenômeno timidez com sujeitos universitários, assim
como a dificuldade de alcançar a participação mínima da amostra de 390
estudantes.
Os objetivos específicos analisados nos eixos 1, 2 e 3, se encadeiam e
interagem um com os outros; pois vejamos, se o estudante não interage devido a
sua timidez, será consequente a diminuição do desempenho acadêmico, uma vez
que a não participação em questionamentos, discussões e debates abreviam a
profundidade do conhecimento. Na medida em que as exigências acadêmicas
extrapolam a capacidade de resposta do estudante, combinado com o medo e a
ansiedade devido à possibilidade de desaprovação, poderá ultrapassar a linha tênue
entre timidez normal e a timidez patologia, ou seja, poderá chegar “a uma condição
mais severa, também denominada de “Transtorno de Ansiedade Social ou Fobia
Social, nomes dados à timidez patológica, para discriminá-la em relação à timidez”
normal (ESTEVES, 2012, p. 42). Outrossim, um estudante com sua saúde
psicológica alterada, terá reflexos na qualidade de suas interações bem como seu
desempenho acadêmico.
Faz-se importante destacar que esta pesquisa analisou dados de uma
amostra de estudantes com intervalo de confiança de 95%, o que aponta que os
dados analisados são bastante representativos da população estudada.
Considerando que as consequências da timidez podem incluir preconceito e
discriminação, sentimentos que introvertem ainda mais a pessoa tímida, faz-se
23

importante que os profissionais da saúde e educação, intervenham de forma a


minimizar o sofrimento e auxiliar no desenvolvimento de estratégia de manejo para
potencializar os relacionamentos interpessoais e minimizar a ocorrência de sintomas
físicos e psicológicos que acometem o tímido.
Para novos estudos sobre o tema seria interessante uma investigação
junto aos sujeitos da pesquisa sobre a relação da timidez com outros transtornos
que não os ligados a ansiedade. Também aqueles declarados tímidos, o índice dos
que procuraram tratamento psicológico ou psiquiátrico, e ainda aqueles que em
função do fenômeno timidez não conseguiram concluir seus cursos.
Cabe a sociedade, cuidado e respeito ao cidadão que tem dificuldade em
se expressar e que essa dificuldade possa ser contemplada com medidas
assertivas, seja a nível educativo, proporcionando treinamento de habilidades
sociais ou a nível psicológico, através dos serviços de psicologia de universidades
ou na rede privada ou pública de saúde. No desenvolvimento de estratégias de
intervenção do fenômeno timidez, Zimbardo (1982, p. 232) afirma que a confiança é
“que faz desaparecer o medo da rejeição, do ridículo e da traição que persegue a
existência dos tímidos. É ela ainda que abre o caminho à amizade e a intimidade, e
é nela que assenta o amor pelo outro e a aceitação de nós próprios”.

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