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APRESENTA

UMA VEZ
AMOR
SÉRIE PASSADO DESPEDAÇADO

CECY ROBSON
EQUIPE PL
TRADUÇÃO: BELLA R.,ANJINHO, TATTY

REVISÃO INICIAL: MISS GENTILE, JESS

SEGUNDA REVISÃO: TERESA

REVISÃO FINAL: REGINA C, CRIS CM

LEITURA FINAL: NISHI

FORMATAÇÃO: DANIELA RODRIGUES

VERIFICAÇÃO: ANA PAULA

9 ANOS DE TRADUÇÃO
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SHATTERED PAST
PRÓLOGO
O ônibus alugado rangeu e guinchou enquanto
desacelerava. Animei-me quando o letreiro do campus do
Saint Jude surgiu. Ao meu redor, meus companheiros
residentes suspiraram coletivamente, soando aliviados que
nossa longa viajem tivesse finalmente chegando ao fim.
Tínhamos nos divertido estabelecendo laços no Camp
Freedom e aprendendo tudo que precisávamos saber como
RA1 para cumprir as normas da universidade. Tirando isto,
estávamos cansados. Seriamente cansados. Então era
realmente bom estar "em casa".

Os grossos óculos de Alice se moveram até a ponta


de seu nariz enquanto o ônibus fazia uma curva ampla na
estreita estrada que conduzia ao campus fazendo-a balançar
em seu lugar outra vez ganhando uma suave cotovelada.

— Então você e Brody estão juntos de novo, Lety? —


Perguntou tentando ser sutil, mas ser agente da CIA não
estava no futuro da minha amiga.

Brody inclinou seu enorme corpo no corredor onde


estava sentado de frente para nós, seus olhos azuis cinzentos
brilhando.

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RA: Abreviatura para "residentes assistentes".

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— Nop, ainda não, Alice. Mas não se preocupe, Lety
não tem nenhuma chance contra meu rápido raciocínio e
meu épico encanto. — Afirmou com seu sorriso de um milhão
de dólares. — Não é mesmo, pequena?

Ele me chamava de "pequena", sua brincadeira


comigo devido a minha estatura. Um sorriso se formou em
meus lábios.

— Provavelmente, não— Admiti, mas em minha


defesa, nenhuma mulher heterossexual viva teria uma
chance contra esse magro corpo musculoso, cabelo loiro na
altura do queixo e extremamente sexy.

Ajustei meu corpo para olhar pela janela e esconder


meu sorriso. Brody passou os últimos dias no acampamento
tentando reconstruir o que uma vez foi incrível entre nós.
Tentei lutar contra isso no princípio, convencida de que ele
estava melhor sem mim. Se ama algo, deixe-o livre certo? O
problema era que depois de algum tempo a sós com Brody,
eu já não me esforçava tanto.

Nosso tempo no Camp Freedom foi um sopro de ar


fresco pelo qual meus pulmões ansiavam desesperadamente.
Sentiu saudades. O ano anterior foi solitário sem ele. Fomos
tão próximos em nosso primeiro ano. Nós rimos, namoramos
e depois tudo se transformou em uma merda total.

Não foi culpa dele, foi minha por pertencer a uma


família tão destruída, e por lhe proporcionar um lugar na

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primeira fila para que presenciasse o quão realmente
arruinada minha família estava. Mas agora as coisas eram
diferentes. Novo ano escolar, novas oportunidades, um novo
começo. Sorrio de novo, pensando sobre nossa conversa da
noite anterior, talvez ele tivesse razão, talvez ainda houvesse
esperança para nós.

O motor do ônibus chiou enquanto Brody subia a


colina para nosso pequeno campus. As árvores de ambos os
lados se abriam como uma cortina, revelando um conjunto de
edifícios espalhados ao longo do vale... e os carros de polícia
com as luzes piscando em suas laterais.

Luzes alternadas de cor azul e vermelha batiam


contra minha janela. Nosso diretor ficou de pé, correndo para
a lateral.

— Que cara...?

Abaixo de nós, dois policiais do campus lutavam


para algemar os braços totalmente tatuados e muito fortes de
um homem latino.

Um calafrio percorreu toda a minha espinha. Não.


OH, Deus. Não.

Carlos, meu pai, dava chutes como uma mula e


derrubou os policiais que tentavam contê-lo. Eles caíram,
meu pai de costas, sobre o gramado impecável, aterrissando
ao lado de uma grande estátua de pedra de São Judas. Os
policiais se reagruparam e depois o atacaram quando tentou

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ficar de pé. Ele jogou um braço para trás golpeando um
policial no rosto e deu uma joelhada na virilha do outro.

— OH! — Gritaram todos que estavam a bordo do


ônibus, os estudantes subiam uns sobre os outros, lutando
para obter uma visão melhor do que estava acontecendo,
enquanto o motorista do ônibus manobrava lentamente
contornando o caos.

— Quem diabos é esse? — Disse Dina, gritando com


medo em sua voz.

— Seja quem for, é forte— Acrescentou Gary. —


Alegro-me de não estar lá embaixo.

— Maldito animal,— cuspiu Razor.

A vergonha me fez afundar em meu lugar. Puta


merda, eu queria apenas morrer. E então aconteceu algo que
eu não esperava e a surpresa sacudiu meu coração. Uma
grande mão se moveu pelo meu braço para entrelaçar-se com
a minha. Durante a comoção, Brody trocou de lugar com a
Alice. Não tinha que olhar para trás para saber que a mão era
dele. Lembrava do aroma de sua colônia e seu toque.
Especialmente, seu toque.

Brody se aconchegou e me protegeu da enxurrada de


vozes crescentes e comentários maldosos. Sem dizer uma
palavra, abraçou-me, fingindo igual a mim que Carlos era um
estranho. Mas ele o conhecia. Estava lá da última vez quando
meu pai me machucou e me fez sangrar.

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Pressionei minha mão livre sobre a boca, tentado
não chorar diante seu apoio ou da lembrança daquele dia.
Por enquanto, eu estava a salvo. Os vidros escurecidos
ofereciam privacidade e me mantiveram escondida. Mas
fracassaram em esconder a realidade acontecendo logo
abaixo.

Vi claramente como o restante da força policial


chegou para controlar a situação, meu pai sendo arrastado
para longe, o rosto de minha mãe inchado das contusões e os
lábios machucados. Ela estava lá de pé com os braços
cruzados observando tudo, sem dizer uma palavra, sem fazer
nada, exatamente como fazia cada vez que meu pai nos
golpeava.

Nesse momento, não soube dizer com certeza quem


eu odiava mais.

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CAPÍTULO 1
Deixei o vestiário rapidamente. Falei apenas com
alguém da minha equipe de remo e embora ninguém
houvesse dito nada diretamente, estava consciente de cada
olhar, de cada sussurro. Apesar dos esforços da reitora, os
estudantes descobriram que o homem detido no dia anterior
era meu pai. Queria gritar. Carlos sempre quis me humilhar e
conseguiu. Bastava juntar seus punhos à humilhação, então
tudo estava perfeito para ele.

A mochila bateu contra minhas costas enquanto me


apressava através do centro esportivo, meu passo se tornou
lento quando passava próxima a um grupo de jogadores de
futebol.

— Essa não é Lety Tres Santos? — Perguntou uma


garota no meio de suas companheiras. — Cujo pai
descontrolado golpeou a polícia do campus?

Virei para olhar.

— Sim, essa sou eu. — Elas se entreolharam


atônitas. Não esperavam que eu respondesse e não estavam
preparadas para minha reação. — Tem algo mais que vocês
queiram saber?

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As três fecharam suas bocas. Para elas era fácil
falar, seus pais não vieram ao campus totalmente fora de
controle. Eles não eram ex-presidiários que estavam fora da
prisão. E os pais delas não passaram uma vida inteira
machucando-as. Eu não podia dizer o mesmo.

Carlos só veio ao campus em outra ocasião, quando


exigiu dinheiro para comprar suas drogas. Se não houvessem
testemunhas naquele momento, ele teria me agredido porque
me neguei a obedecer. Meu pai era muitas coisas: um viciado,
bipolar e um grande idiota. Mas estupido não era um de seus
defeitos, por isso foi embora, depois de me chamar de cadela
diante dos meus amigos.

Uma das outras garotas encolheu os ombros.

— Melody não quis dizer nada com isso. — Disse. —


Ela estava apenas perguntando.

— Há coisas melhores sobre o que perguntar—


Respondi.

Afastei—me furiosa. Minha mente insistia que eu


deveria ignorar os comentários e esquecer a atenção dos
outros estudantes. Saint Jude era uma pequena universidade
privada com pouco mais de dois mil estudantes vivendo no
campus. Os rumores se espalhavam rapidamente, e quando o
resto dos alunos chegassem em dois dias, eles se espalhariam
ainda mais rápido. Mais cedo ou tarde todo mundo
esqueceria.

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Com exceção de mim.

Abri as portas de vidro que levavam para fora do


centro de atletismo. Duas garotas que caminhavam para o
edifício, com bolas de voleibol presas sob seus braços,
olharam-me enquanto entravam. Uma delas me apontou com
uma sacudida de queixo e falou com sua amiga em voz baixa.

Caramba, pergunto-me do que estão falando?

Avancei sem dar outra olhada em sua direção. Não


podia brigar com todo mundo, era exaustivo. Então cortei
caminho pela esquerda em direção ao campo de futebol, onde
alguns jogadores permaneceram. Embora não estivesse perto
deles, eles deixaram de chutar a bola para me observar
enquanto eu passava. A vergonha me fez querer me esconder
e baixar minha cabeça, em vez disso obriguei-me a manter a
cabeça erguida. Eu era uma garota durona da Filadélfia,
apesar de que por dentro estivesse quase soluçando.

Mantive meus olhos fixos em frente, onde


terminavam os campos de atletismo e começavam as trilhas
que levavam para o bosque. Se pudesse chegar até lá,
encontraria um pouco de descanso dos sussurros e olhares
críticos. Pelo menos, isso era o que eu esperava.

A brisa do final de agosto agitava as folhas das


árvores enquanto eu me arrastava pelo caminho, balançando
meu cabelo escuro e comprido. Respirei fundo, desfrutando
do ar fresco e ambiente tranquilo. Apesar do drama do dia

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anterior e da atenção negativa que trouxe sobre mim, eu
realmente amava estar aqui, preferia a localização remota do
campus do que as ruas barulhentas da Filadélfia e sua
desagradável agitação.

Localizada em uma pequena cidade nos arredores de


Allentown, Saint Jude estava rodeada por hectares de duas
coisas: bosques e campos de milho. As trilhas no campo que
cortavam através das florestas serviam como excelente pista
de corrida para testar a resistência dos atletas e como um
lugar para que os alcoólatras menores de idade tivessem suas
festas ilegais escondidas. Podiam estar completamente
bêbados, mas se seguissem qualquer um dos atalhos,
chegariam nos campos esportivos ou na entrada principal. Os
campos de milho eram usados mais do que tudo para a
iniciação dos calouros, era onde os estudantes do primeiro
ano corriam nus através das plantas altas em troca de uma
camiseta de cinco dólares.

Não deveria estar sorrindo, considerando o meu dia,


porém mesmo assim o fiz. A corrida ao campo de milho foi a
primeira vez em que Brody e eu nos vimos nus. E sim, nós
ainda usávamos nossas camisetas de cinco dólares.

Meu sorriso se apagou. Brody, oh, meu Deus, o que


faria com ele? Era doce, inteligente e muito bom para mim.
Mas eu não era boa para ele, apesar de querer realmente ser.

Meus passos ansiosos desaceleraram quanto mais


pensava nele. Conhecemo-nos na aula de química no começo

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de nosso primeiro ano. Ele se apresentou como apenas Brody
poderia, jogou uma bola de papel amassada na minha
cabeça. Encarei-o por cima do meu ombro.

— Faça isso de novo e vou chutar seu traseiro,


bonitão. — Eu o adverti. Ele apenas sorriu.

— Acha que sou bonito?

Não, acho que você é mais sexy que o Alex Pettyfer


de pé no inferno, pensei, mas não disse nada disso.

— Muito irritante. — Foi a minha resposta. Eu me


virei quando a professora entrou na sala de aula, e fiquei
rígida quando ouvi um papel sendo amassado atrás de mim.
Liguei meu computador, certa de que não viriam mais
bolinhas de papel em minha direção, quando outra
ricocheteou na minha cabeça. Numa reação instintiva, joguei
meu livro de química nele, Brody o agarrou antes que
atingisse suas costelas, ao invés de ficar irritado, riu e
segurou o elevador para mim depois da aula.

O resto do ano praticamente fomos inseparáveis,


mas não foi até o começo do semestre seguinte que nos
tornamos mais do que amigos próximos. O que mais doeu foi
que não durou.

Graças ao Carlos, de novo.

Meu treino de remo de duas horas foi pesado, mas


foram os pensamentos em minha família que me deixaram

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repentinamente cansada. Deixei o atalho depois de cinco
minutos de caminhada e cruzei a estrada. Não estava pronta
para ir ao meu quarto, então virei para o pequeno jardim de
reflexão no topo da colina. Sentei em um dos bancos de
madeira, permitindo que minha mochila caísse sobre o meio-
fio de cascalho. Gostava do lugar e o visitava frequentemente,
ele me dava uma sensação de calma que sempre ansiei desde
menina. Simples, fácil, não era algo que eu tivesse que
procurar debaixo da minha cama quando estava assustada.

Mas desta vez a paz não durou e não fiquei sozinha


por muito tempo. O som de passos trovejou a minha
esquerda. Levantei meu olhar e vi os membros da equipe de
lacrosse correr em minha direção em seu caminho para as
trilhas.

Todos corriam sem camisa, com exceção do Brody.


Como vice capitão do time, ele corria na dianteira junto de
seu amigo Logan.

O campeonato de lacrosse não começaria até o


próximo semestre. Mas Saint Jude ganhou o campeonato da
terceira divisão da NCAA2 nos últimos dois anos. O treinador
planejava manter o título e os fazia treinar bem antes que
marcassem sua primeira partida.

O olhar de Brody se iluminou quando me viu. Meu


corpo ficou tenso. Não estava preparada para vê-lo, mas não

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National Collegiate Athletic Association ou NCAA é uma associação composta de
1281 instituições, conferências, organizações e indivíduos que organizam a maioria
dos programas de esporte universitário nos Estados Unidos.

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deveria ficar tão surpresa. A equipe corria no perímetro do
campus no final de cada treino e terminava onde os atalhos
do campo se abriam para os ginásios esportivos.

Ele reduziu a velocidade até parar. Seus


companheiros de equipe, em sua maioria continuaram,
lançando-me olhares tortos antes de cruzarem a estrada e
desaparecer nos atalhos. Os poucos que ficaram apenas
olharam cuidadosamente.

— Irmão, vamos. — Falou Isaac Parker.

— Alcançarei vocês daqui a pouco meninos. — Brody


se juntou a mim no banco, colocando um pé no assento para
se esticar— Olá, Lety.

Isaac falou com Brody como se eu sequer estivesse


lá.

— Tem certeza de que quer fazer isto? Seu pai é bem


maluco.

Brody se elevou em toda sua estatura.

— Igual a certo alguém que foi apanhado se


masturbando com desenhos animados, enquanto usava
roupa íntima rosa. — Ele encolheu os ombros. — Mas mesmo
assim passo alguns momentos com você.

Um par de meninos riram com força enquanto o


rosto do Isaac se tornava cada vez mais vermelho. Brody
sorriu.

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— Não importa, Isaac, você não é o primeiro menino
que... espere, não importa, provavelmente você é. Mesmo
assim, não há nada do que envergonhar-se, amigo, apenas
siga fazendo sua coisa... E da próxima vez tente com os
velhos episódios de Baywatch em vez de desenhos animados,
pode ser que seja menos horripilante.

Isaac retrocedeu franzindo o cenho, antes de ir com


o resto da equipe atrás dele.

— Até mais tarde, Lety. — Gritou Logan com um


gesto.

— Até mais tarde. — Respondi, embora


provavelmente tenha sido muito baixo para que Logan
escutasse. Brody se sentou no banco ao meu lado. Puxei as
barras das minhas bermudas, era melhor enfrentá-lo. —
Obrigada!

— Dia difícil?

Suspirei.

— Pode-se dizer que sim.

Brody brincou com as mechas onduladas do meu


cabelo, sua voz profunda sussurrando.

— Por que não me ligou ontem à noite ou respondeu


a mensagem de texto hoje?

— Realmente, não estava com muita vontade de


conversar.

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— Até mesmo comigo? Nós costumávamos conversar
sobre tudo, lembra? — Ele deixou escapar um suspiro
quando não respondi. — Letz, pensei que estávamos
chegando em algum lugar.

O outro apelido que me deu não deveria acelerar


meu coração do jeito que fez, mas tudo em Brody tinha esse
efeito em mim.

— Também pensava o mesmo.

— O que mudou?

Fiz um gesto para onde desapareceram seus


companheiros de equipe.

— Não é óbvio? Meu pai completamente louco


apareceu, lembrando-me de por que você está melhor sem
mim.

Brody passou seus dedos através dos pelos loiros de


sua barba.

— Não posso acreditar que esteja fazendo isso


conosco outra vez. — Minhas mãos caíram a meu lado.

— Brody não estou tentando te machucar, por que


não pode simplesmente aceitar que não sou a pessoa mais
indicada para você?

— E por que você não pode aceitar o quanto significa


para mim?

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Minha cabeça baixou. Não era o tipo de garota que
chorava muito. Mas quando se tratava dele, era impossível
lutar contra as lágrimas. Alguém como Brody nunca deveria
se apaixonar por alguém igual a mim. Eu era a minoria do
lado errado da cidade. Ele o atleta popular que vinha da
riqueza, sobre quem todas as garotas bonitas e livres de
drama, esperavam ter a oportunidade de se lançar.

— Porque juntos não nos encaixamos. — Respondi


com sinceridade.

— Isso não faz sentido, passamos nosso primeiro ano


praticamente colados, divertindo-nos, aprontando. — Seu
tom se aprofundou. — E quando finalmente percebeu o
quanto eu te desejava, ninguém podia ficar entre nós.

Cobri meus olhos.

— Brody, não faça isso. Não posso pensar em nós


dessa maneira.

— Não consigo parar. — Suas grandes mãos


agarraram meus pulsos e ele as baixou lentamente. — Eu
falei sério no acampamento. Você quebrou o meu maldito
coração.

Tristeza e raiva surgiram no seu rosto, mas Brody


não foi o único afetado pelo que eu fiz. Minha voz tremeu.

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— Acha que foi fácil para mim te deixar ir? Você não
foi o único machucado. Chorei cada dia durante um mês
quando terminamos.

— Então por que fez isso conosco? E por que está


fazendo isto agora?

Minha visão nublou enquanto me lembrava do


horrível dia em que terminei nossa relação. Pouco depois de
chegar a uma festa de família, Carlos quebrou o meu nariz e
deu um golpe em minha cabeça. Brody viu o sangue jorrar de
mim, incapaz de se libertar dos homens que o seguravam.
Teria dado qualquer coisa para impedi-lo de conhecer essa
parte da minha vida. Mas ao invés disso, ele presenciou tudo.

— Nunca serei boa o suficiente para você, e sabe


disso.

— Está errada. — puxou-me para perto dele,


pressionou seus lábios contra os meus, forçando—os a se
separar e finalmente me rendi. Não deveria ter feito isso.
Sabia que não deveria, mas minha vontade se enfraqueceu e
me entreguei, jogando os braços ao redor de seu pescoço.

Seus braços fortes envolveram a minha cintura e


Brody aprofundou o nosso beijo. Sua língua se moveu com a
minha, dando voltas e me incitando a brincar. Minha coluna
se arqueou enquanto me apertava mais contra seu corpo. Ele
não me beijava desde o dia em que me afastei e agora não
queria que parasse.

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Gemi baixinho, enquanto retribuía sua
demonstração de afeto com a mesma força e entusiasmo.
Deus, senti saudades dessa boca. Nosso beijo se intensificou,
transformando-se em algo mais. Tomamos nosso tempo,
como se nada mais importasse. Quando finalmente nos
separamos, ambos estávamos ofegantes.

— Não deveríamos ter feito isso. — Eu disse.

Sorriu.

— Sim, deveríamos. A verdade é que não sei por que


paramos.

Afastei-me quando ele tentou me beijar de novo,


desejando que a vida fosse assim tão fácil.

Brody agarrou meu queixo, inclinando levemente


minha cabeça para que meu rosto se encontrasse com o dele.

— Letz, vamos lá, nós ficamos melhor juntos do que


separados.

Baixei o olhar.

— Não pode estar falando sério.

— Sim, eu estou. Fiquei o ano passado inteiro


tentando de todas as formas te esquecer.

Espalmei minhas mãos sobre os músculos


volumosos de seu peito amplo. Agora foi minha vez de sorrir.

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— OH sério, vi todas as garotas se oferecendo para te
ajudar com seu dilema.

Inclinando sua cabeça para um lado retrucou:

— Da mesma forma a vi com Justin Kalabrowski se


beijando no baile No-Pants.

— Não estava beijando.

— Sim, estava. Vocês estavam no vestiário perto do


banheiro e tive que me controlar para não bater nele.

Levantei as sobrancelhas.

— Penso que Karen Enderson, seu encontro daquela


noite, teria tido problemas com isso. Ou era Linda
Marrington? Ou Jessica Gustfenson? Ou Cindy Vincent?
Hum, possivelmente estou confundindo com a Lissette Miller.

Golpeei meus dedos contra ele.

— Esqueci de alguma?

Sorriu.

— Wendy Jenner.

Meus dentes se apertaram.

— OH sim, a boa e velha Wendy. A garota que canta


tirolesa durante o sexo. Como poderia esquecê-la?

— Disseram-me que não é realmente uma música da


tirolesa, mas sim

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Vibrato animado. — Riu quando falou, mas logo sua
expressão ficou sombria. — E para que conste, nenhuma
delas significou nada, são apenas algumas garotas com as
quais saí algumas vezes.

Sorri brandamente.

— E para que conste, não beijei o Justin. Ele que me


beijou.

Brody revirou os olhos.

— Lety eu os vi. O cara estava sobre você como um


pedaço de fita adesiva.

— Se viu isso, viu também quando o golpeei com o


joelho nas bolas porque pedi que parasse e ele não o fez?

A ira esticou seus músculos e aprofundou seu tom.

— Não. Eu não vi.

— Bom, mas foi isso que aconteceu.

— Sempre odiei esse garoto, lembre-me de chutar


sua bunda da próxima vez que encontrá-lo. — Minha cabeça
caiu contra seu peito quando Brody me atraiu para si.
Escutei o batimento constante e forte do seu coração,
invadida por uma sensação de paz que não sentia há muito
tempo.

— Não funcionou, sabe. — Ele disse depois de um


longo tempo.

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— O que não funcionou?

— Sair com todas essas garotas. Nunca te esqueci.

Agarrei o tecido cinza de sua camiseta, sabia sobre o


que ele se referia. Os poucos encontros aos que minhas
amigas me convenceram a ir foram irritantes. Nenhum dos
rapazes conseguiu me arrancar um sorriso fácil ou me fazer
feliz como o Brody fazia. Nenhum deles me fazia sentir sexy e
desejada. Brody foi tudo para mim, porém eu sabia que não
poderia lhe oferecer o mesmo em troca.

Suas mãos desceram pelas minhas costas.

— Se você não me quisesse Lety, juro por Deus que


me afastaria. Mas sei que me quer, vejo a forma como olha
para mim. E também como me beijou.

— Nunca se tratou de não te querer, Brody. Eu


estava apenas tentando evitar um problema para você.

Brody apertou mais seu abraço.

— Letz, não vou fingir que sua família não está


ferrada, mas se pensa que é a única com um passado
problemático, está errada.

Sua voz tinha um tom estranho e perigoso que me


assustou.

— Está falando sobre o quê?

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Afrouxando o aperto, deixou seus braços caírem,
inclinando a cabeça para um lado.

— Esqueça.

— Brody...

Ele ficou de pé e colocou as mãos nos quadris,


olhando para o chão fixamente. Por um minuto, pensei que
fugiria.

Levantei-me.

— O que está acontecendo?

Ele moveu o queixo e disse:

— Agora não, está bem?

A forma como disse me fez pensar que nunca seria


um bom momento. Agarrei suas mãos e as segurei com força.

Brody me olhou e deu um forte aperto em minhas


mãos.

— Quero outra chance com você. Permitirá que


aconteça?

Apesar de nosso beijo, não estava convencida de que


conseguiríamos, mesmo se tentássemos com força. Somos tão
diferentes.

— Não sei se posso, baby. Talvez o melhor é sermos


apenas amigos.

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Ele riu baixinho e me atraiu de novo contra seu
corpo.

— Não pode me chamar de "baby" como estava


acostumada a fazer e esperar que eu seja apenas seu amigo.

— Mesmo se for o melhor para você? — Ele então


deixou de sorrir.

— Você é o melhor para mim, apenas não sabe ainda.

O tom de sua voz, o olhar fixo e penetrante,


prenderam-me no lugar. Meu novo iPhone, presente do meu
irmão, vibrou dentro da minha mochila, criando a desculpa
perfeita para me afastar do seu abraço. Procurei entre as
calças extra e o tirei para olhar a tela. Uma mensagem de
texto da reitora Riley.

— Lety, está disponível para se encontrar comigo


em meu escritório na primeira hora da manhã?

Grunhi, sabendo que não seriam boas notícias.


Escrevi uma mensagem em resposta e enviei.

— Posso estar aí umas oito e meia, tudo bem?

Não demorou muito tempo para ele responder.

— Sim, vejo você então.

Brody franziu o cenho.

— O que aconteceu?

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Batendo meu dedo na parte posterior do celular,
debati-me entre lhe contar ou não.

— A reitora me ligou esta manhã, os O'Sullivan


revogarão minha bolsa.

— Pelo que o Carlos fez? — Brody amaldiçoou


quando assenti. — Não podem fazer isso.

— É um colégio particular e a bolsa uma doação


privada.

— É uma discriminação de merda.

Sacudi minha cabeça.

— Não quando declaram que é por falta de recursos.

— Malditos imbecis.

Sim, algo assim.

— A reitora quer tentar a aprovação de um


empréstimo estudantil para mim.

Ele bufou.

— Um empréstimo? Sejamos honestos aqui, seus


antecedentes e qualificações, a tornam elegível para uma
bolsa.

— Busquei todos os meios e formas possíveis de


conseguir descontos, mas com a mensalidade aumentando
neste ritmo, eu preciso dessa bolsa para continuar na escola.

26
— Chutei o cascalho. — Pode ser necessário arrumar outro
trabalho.

Brody descartou com a mão.

— O seu emprego atual já exige demais de você!

— Não tenho outra opção.

Seu olhar prendeu com o meu.

— Sim, você tem. Eu poderia te dar o dinheiro.

Endireitei-me. Brody dirigia um Porsche, vinha de


uma família rica e todos sabiam. Muitas putas caçadoras de
fortuna tentaram torná-lo seu gênio da lâmpada. Eu não
seria uma delas. Não agiria como minha mãe. Ela me ensinou
a importância de nunca depender de um homem... para
nada.

Agarrei minha mochila.

— Eu vou resolver isso, não se preocupe comigo.

— Lety...

— Ficarei bem. — Corri em direção às casas


residenciais onde morava, desejando intensamente ser capaz
de esquecê-lo. Falei a verdade, Brody merecia alguém melhor
do que eu.

27
CAPÍTULO 2
Sentei no escritório da reitora Riley na manhã
seguinte, mal me movendo enquanto a via mexer em sua
papelada.

Ela sacudiu sua cabeça.

— Você já fez todos os empréstimos disponíveis. Sei


que é próxima do seu irmão, Mateo, acha que estaria disposto
a fazer um empréstimo particular em seu nome?

Teo faria isso por mim, mas tentava construir uma


vida para ele e sua esposa Evie, de forma alguma eu
atrapalharia seus planos, minha mãe já lhe pediu o
suficiente.

— Ele já tem muito com o que se preocupar. —


Respondi com sinceridade.

Vinte mil dólares. Essa era a quantia que faltava. A


agência que me contratou como auxiliar de enfermagem neste
verão queria me manter e ofereceu um trabalho em
Allentown. Dispensei, por causa dos meus compromissos com
o programa de RA e a escola, será que me aceitariam de novo
agora?

— O que vai fazer? — Perguntou.

28
— Reitora Riley, sei que não costumam permitir que
os RA tenham um emprego adicional, mas não posso
continuar na escola se não conseguir outro trabalho.

Ela juntou seus dedos.

— Lety, seus deveres de RA exigirão muito de você


este ano, assim como o trabalho de enfermagem.

— Sim senhora, eu sei. — Movi-me nervosamente. —


Mas sou uma trabalhadora esforçada...

Minha voz se desvaneceu quando ela negou com a


cabeça.

— Lety, isso seria mais carga de trabalho do que o


humanamente normal, e o estresse te acompanhará a todo o
momento. Não sente que está exigindo demais, querida?

Não queria que minha voz tremesse, porém ela o fez.

— Minha educação é a única forma de fazer algo por


mim mesma... para não depender mais de ninguém. Por
favor, a senhora poderia considerar fazer uma exceção desta
vez? — Não respondeu. — Por favor. — Supliquei—lhe.

A reitora Riley se inclinou para trás em sua cadeira,


levando um tempo para considerar meu pedido.

— Farei uma exceção apenas desta vez... apenas


enquanto mantiver suas notas e se não se descuidar de seus
deveres como uma RA. — Fez uma pausa. — Também quero
que saia de sua equipe. — Negando com a cabeça quando

29
tentei discutir. — Tem que abrir mão de alguma coisa se for
essa opção. Não pode administrar tudo.

Não queria admitir que ela tinha razão, mas quando


analisei o quadro completo, a equipe não era minha
prioridade.

— Está bem, falarei ao treinador McMullen que estou


fora.

— Acredito que isso é o mais inteligente a se fazer,


mas ainda há uma grande porção em seu prato, acha que
pode administrar tudo?

Dois postos de trabalho, clínica e aulas, já estava


exausta só de imaginar como seria.

— Farei com que funcione.

— Está certa disso? — Suspirei em resposta.

— Tenho que estar.

Ela assentiu e se balançou calmamente na cadeira


de encosto alto.

— Muito bem, mas se esta nova posição interferir em


seus deveres ou nas suas aulas, pode ser necessário
reorganizar tudo. Não quero que saia da escola, Lety, mas
você é apenas humana, não se esqueça disso está bem?

A preocupação aprofundou as rugas que cobriam


seus olhos. Tínhamos passado uma hora desenvolvendo um

30
plano de segurança no dia em que Carlos foi detido para o
caso dele aparecer de novo. Um psicopata drogado com
cocaína não era algo com o qual a polícia do campus já
tivesse trabalhado, e no meio do caos ninguém se lembrou de
ler seus direitos, meu pai já estava fora da cadeia, e ainda era
uma ameaça.

Se isso não fosse suficiente, ela passou o dia


anterior e a manhã de hoje tentando encontrar recursos
adicionais e buscando subvenções nas quais eu pudesse me
qualificar. Tive que me controlar para não abraçá-la. A pobre
mulher provavelmente amaldiçoou o dia em que coloquei
meus pés no campus, mas em vez disso fiquei de pé e lhe
ofereci minha mão.

— Não irei decepcioná-la, senhora. — Prometi.

Ela agarrou minha mão entre as suas.

— Sei que não o fará, Lety.

Agradeci por sua ajuda e saí do escritório, fazendo


uma pausa na sala de estudos para ligar para a agência de
empregos em busca de um trabalho. Tinha uma boa
reputação e as vagas de empregos eram muito procuradas, já
que pagavam bem, felizmente, um dos coordenadores me
ajudava muito, então quando a recepcionista atendeu, pedi
que transferisse minha ligação para ele. Que atendeu no
segundo toque.

— Olá, Rodrigo, sou eu: Lety Tres Santos.

31
— Olá, menina. Como está?

— Desesperada à procura de um trabalho, meu


amigo. Sabe se esse trabalho AEC3 em Allentown ainda está
disponível?

— Espere... não, foi preenchido em julho. Você pode


ir até a Filadélfia?

— Não, é muito longe.

Eu podia ouvir ele escrever, parar e continuar


escrevendo de novo.

— Vamos ver o que tem em... Easton?

— Isso é muito longe. Tem algo perto de Allentown ou


Bethlehem?

Comecei a caminhar enquanto esperava, minha


ansiedade me fazendo transpirar.

— Saucon Valley Rose está próximo de você, não


está? — Perguntou. Então animei—me

— Sim, é uma pequena cidade a apenas dez minutos


de distância. — Ele deu mais alguns golpes no teclado.

— Então tenho algo. Talvez.

— O que você quer dizer com talvez?

3
AEC: Auxiliar de enfermaria certificado. Nos Estados Unidos, o assistente ou auxiliar de enfermaria
certificado (CNA, por suas siglas em inglês Certified Nursing Assistant), tipicamente trabalha em uma
casa de idoso ou hospital e leva a cabo as tarefas da vida diária para os idosos, pacientes com doenças
crônicas ou pacientes em reabilitação que não podem cuidar de si mesmos.

32
— Você teria que substituir, em algumas noites,
outra pessoa de nossa equipe da escola de enfermagem. O
trabalho requer cuidar de um homem paraplégico e de seu
filho caçula com necessidades especiais. Entretanto, o salário
é bom.

— Pelo menos uns dois mil dólares por mês?

— Sim, um pouco mais que isso, as informações que


nos passaram dizem que você terá que fazer uma entrevista
por telefone com o médico particular da família e logo depois
com a família. Tenho que te advertir, eles são muito
exigentes, foi o que me passaram os últimos cinco auxiliares
de enfermagem que enviamos para lá.

— Por que?

— Imagino que essas pessoas ricas têm certas


expectativas. Os três primeiros não passaram da entrevista
com o médico particular. Tem uma caneta?

Tentei não permitir que isso me desanimasse.

— Ah. Sim.

Rodrigo me deu os dados do médico da família.

— Ligue-me se conseguir o trabalho, passarei para o


chefe de recursos humanos e farei com ele providencie toda a
documentação que cabe a nós para formalizar tudo.

— Está bem. Obrigada.

33
Desliguei me sentindo mal do estômago,
perguntando quando poderia agendar uma entrevista. Os
alunos do segundo ano estavam programados para se
mudarem para o Heights, a fileira de casas na colina
amanhã, fiquei responsável por três casas e minha
companheira da RA Alice, estava com duas ao meu lado.
Tínhamos que cumprir nossa residência essa noite, então
isso só me deixava hoje.

Merda.

A ideia de manter minhas qualificações para não


perder as outras bolsas, minha responsabilidade como RA e
agora ter que mergulhar nas tarefas do AEC me deixou em
pânico. Normalmente costumo trabalhar bem sob estresse,
mas essa situação é incomum e extrema.

Acelerei através do campus, passando pela sala de


estudos, a biblioteca e o refeitório como se minhas sapatilhas
estivessem em chamas. Maldito Carlos. Conseguiu me
prejudicar mais uma vez.

Passei perto da multidão de estudantes do primeiro


ano sendo guiados por uma conselheira de orientação.

— Olá, Lety. — Chamou ela. — Vai à festa do Derrick


no sábado?

Foi agradável escutar uma voz amiga.

— Não sei ainda, tentarei.

34
Desviei de outro grupo de estudantes, e depois
reduzi a velocidade para me sentar em um banco sob a
sombra de um olmo. Procurei em minhas anotações até que
encontrei o número que Rodrigo me deu, respirei fundo e
liguei.

— Olá? — Perguntou uma voz profunda no outro lado


da linha.

— Olá, Dr. Frenen? Meu nome é Lety Tres Santos,


minha agência me deu seu número para falarmos a respeito
do trabalho de AEC no Saucon Valley Rose.

— OH, sim. Um dos representantes acabou de me


ligar para dizer que você entraria em contato. Quando seria
um bom momento para nos encontrarmos?

Fiz uma careta.

— Teria tempo agora?

— Agora? — Fez uma pausa. — Bom, imagino que


este seria um momento tão bom como qualquer outro, vou
examinar o Sr. Moore em uma hora. Talvez possa ajudar, mas
primeiro vamos conversar.

O Dr. Frenen me entrevistou por cerca de trinta


minutos: onde consegui minha licença de AEC, como foram
minhas rondas clínicas e quanta experiência eu tinha, blá,
blá, blá. Considerando o quão amável parecia, dava a
impressão de ser uma espécie de puxa-saco. Não era

35
novidade que ninguém mais conseguiu o trabalho antes de
mim. Quando ele finalmente comprovou que eu não era
nenhuma idiota, permitiu que nos reuníssemos na residência
dos Moore.

Parei em meu quarto para um banho rápido e trocar


o uniforme. Meu cabelo estava ensopado quando saí, então
sequei o melhor que pude com a toalha e o prendi em um
rabo de cavalo.

Ser um RA em Heights tinha muitas vantagens— um


quarto individual, banheiro privado, um monte de
privacidade— apesar do espaço ser bem pequeno. O maior
problema foi que vi a lista de garotas que dividiriam comigo a
casa e as outras duas do lado. A maioria era da Filadélfia.
Todas eram muito festeiras. Tinham experiência em fazer
drama e sabiam que eu não aceitaria suas artimanhas, mas
na minha ausência, Alice ficaria responsável.

Alice era a coisa mais doce que tinha na cidade de


trabalhadores de pescoço azul4 Schuylkill Haven. Era
extremamente tímida, mas tinha um coração de ouro e
chuparia o veneno de uma serpente que me picasse para me
salvar. Sério. Foi isso que prometeu fazer uma vez. Tive que
deixar claro para seus residentes que me zangaria muito se
eles a incomodassem. Dito isto, sabia que Alice

4
Trabalhadores de pescoço azul: Do inglês blue colar, é um termo que se utiliza para designar os
indivíduos que compõe a parte mais baixa da hierarquia das empresas; em particular com frequência
executantes tarefas manuais e como operários, opostos aos chamados de pescoços brancos, os que
fundamentalmente englobam os dirigentes e outros membros superiores administrativos e técnicos.

36
eventualmente teria que se defender ou arriscaria ser comida
viva.

Agarrei minha bolsa e fui para o estacionamento em


busca do meu velho Dodge Challenger que Teo reconstruiu do
zero. Amava meu carro. Era grande, verde e capaz de
derrubar o Godzilla. Apesar dos esforços do meu irmão,
entretanto meu bebê estava nas últimas.

Com muito esforço, meu Challenger rugiu pelas


estradas secundárias de Saucon Valley Rose. Estes caminhos
residenciais tinham pouco tráfico. A maioria eram tranquilo,
o constante estalo que meu motor fazia continuamente era o
único ruído.

Passei pelo clube de campo há menos de dez


minutos da saída de Saint Jude. As casas no vale se
tornavam maiores em tamanho e luxo quanto mais eu dirigia.
Estava grata que a Siri me dissesse para onde ir além dos
limites do meu iPhone. A viagem de carro não ficava longe,
mas as estradas podiam ser confusas como um labirinto,
passando de uma grande mansão para a outra. Teo e Evie
podiam ter vivido em uma das zonas mais ricas do estado,
mas o vale Lehigh teve a sua cota de dinheiro antigo.

Siri me conduziu por um caminho pavimentado de


uma só via, insistindo que cheguei em meu destino.

— Garota, não tenho certeza de que estamos no local


correto. — Disse—lhe em voz alta. Tudo o que via eram

37
fileiras de carvalhos antigos e um salgueiro chorão ocasional
lutando por espaço.

Dei a volta e tentei retornar para à estrada principal,


apenas para que a Siri voltasse a calcular e me enviasse de
volta para a estrada com uma só via.

Hum. O que está acontecendo aqui?

Desta vez, conduzi mais à frente, continuando até


que cheguei a um par de portões de metal.

Um homem de uns sessenta anos com uma grande


barriga caminhou até os portões. Não parecia ser um
segurança, mas a arma em seu quadril me fez pensar que
dispararia entre meus olhos se o incomodasse o suficiente.

— Sim?

— Ah. Sou Lety Tres Santos, e estou aqui pelo Sr.


Moore e o Dr. Frenen. — Ele não piscou. — Para o cargo de
AEC.

— O que aconteceu com o Roger?

— Se Roger for o outro AEC, imagino que trabalhará


menos horas.

Ele levantou a mão para me fazer calar e falou em


seu celular. Assentiu um par de vezes, e depois me deixou
passar pelos portões rangentes. Parei antes de passar e
abaixei o vidro.

38
— Aonde devo ir?

O cenho franzido em seu rosto de bulldog me dizia


que eu deveria ir diretamente para o inferno. Felizmente, não
foi isso o que disse. Como mencionei, tinha uma pistola,
então apenas apontou o caminho.

— Siga reto, você saberá quando parar, menina.

O caminho de entrada era inclinado e curvado na


parte superior, em torno de um grande lago. Essa foi minha
primeira vista real do grande imóvel estilo Tudor. Longo e
largo, com um teto em vários níveis e três andares, era
facilmente três vezes maior que a última casa pela qual
passei... e essa era um monstro em si. Suspirei me negando a
ficar intimidada pelo seu grande tamanho... e prestígio... e
tamanho... e riqueza... e sim, era um grande OH. Limpei a
garganta. Gritando castelo ou não, estava aqui para fazer um
trabalho.

Apesar de tudo, maldição.

Uma janela de chumbo e granito na frente me


saudaram, deixando claro que os proprietários eram grandes
e maus e eu seria lançada de cabeça do andar mais alto se
murmurasse algo sobre o mordomo. Os ricos tinham
mordomos, não é verdade?

Algo pulou no lago enquanto me apressava para


subir os degraus de pedra. De onde eu estava no arco
curvado, podia ver a água clara. Uma branca e alaranjada

39
carpa do tamanho de um gato serpenteava ao redor das
folhas de lírio, tentando morder. Pisquei ante as enormes
portas de madeira escura na minha frente. Ou isto era de
tudo legítimo ou o Drácula e seus seguidores alimentariam
estes peixes horripilantes com meus restos depois que
terminassem de me chupar como uma manga.

Não estava certa de como informar às gárgulas ou o


que seja estivesse esperando por mim, até que me deparei
com uma grande tela de computador conectada a um sistema
de alto-falantes à minha esquerda. Antes que pudesse
apertar o botão debaixo dela, um rosto apareceu na tela.

— Sim? — Um homem parecido com um avô me


atendeu e levantou suas espessas sobrancelhas brancas,
esperando que eu respondesse.

Sorri, reconhecendo sua voz da entrevista telefônica


de trinta minutos.

— Olá Dr. Frenen, sou Lety Tres Santos. Posso


entrar, senhor?

As fechaduras fizeram um clique e uma porta se


abriu como se fosse mágica. Entrei em um vestíbulo com o
teto cor nata, mas não havia ninguém ali para me receber.
Madeira de mogno e paredes de cor nata mais profunda me
rodeavam. Duvidei, insegura sobre onde ir e pouco disposta a
explorar.

— Aqui, menina, por aqui.

40
O Dr. Frenen me saudou do alto de uma extensa
escadaria. A dimensão e arquitetura interior eram tão
impressionantes que sequer notei que ele estava ali, até que
me saudou.

Caminhei com cuidado pelo chão de madeira nobre


para a parte inferior das escadas. Um elevador de cadeira de
rodas esperava na parte superior, seus resistentes corrimões
presos com parafusos grossos e correntes ao longo da escada.

O Dr. Frenen esperou atrás de uma porta de


madeira pesada que fazia jogo com a escada de madeira
escura à perfeição. Um menino pequeno perto dos seis anos
se agarrava ao seu braço, sua cabeça aparecendo por cima da
porta e me olhando com olhos azuis curiosos.

— Ande logo menina, o Sr. Moore está esperando.

Sorri para o menino, sua presença de algum jeito me


tranquilizava, sim precisava estar aqui e não, não seria
comida. Ele parou diante de mim mostrando um sorriso
largo. Não tinha muita informação sobre o menino, apenas o
que o Dr. Frenen revelou rapidamente, mas já gostava dele.

O Dr. Frenen apontou para um teclado eletrônico


introduzido no poste. Inicialmente, eu não notei. Alguém fez
todo o possível para introduzir dispositivos de alta tecnologia
sem danificar a elegância clássica dos Tudor.

— Sete mil oitocentos e noventa e um— Disse o Dr.


Frenen, assentindo com a cabeça para o menino.

41
— Certo. — Entregou o código de uma forma que o
menino não entenderia. Marquei 7—8—9—1 e a porta se
abriu.

— Tenha certeza de fechá-la imediatamente, Lety. O


equilíbrio de Tommy nem sempre é constante e precisa de
ajuda para descer as escadas.

Fechei a porta e me ajoelhei.

— É o Tommy? — Ele sorriu e assentiu com força


suficiente para sacudir seu cabelo negro azeviche. — Sou
Lety, você pode segurar a minha mão, lindo?

O Dr. Frenen sorriu quando Tommy o liberou para


segurar meus dedos.

— Bom, é evidente que você é boa com os meninos.


Vejamos como é com os adultos. — Caminhou diante de mim.
— Tommy acabou de completar oito anos. Sei que parece ser
mais jovem— Acrescentou o Dr. Frenen quando olhei em sua
direção. — O dano cerebral sofrido no acidente afetou seu
crescimento, desenvolvimento e fala. Neste momento, ele
possui a capacidade mental de um menino de quatro anos e o
vocabulário de um bebê. Temos esperança de que a
quantidade adequada de terapia, o fará melhorar com o
tempo.

— É óbvio que fará. — Dobrei meu braço ao redor


como um amplo círculo e o fiz girar, ele riu e cambaleou um
pouco, mas o firmei para ajudá-lo a manter o equilíbrio. Riu

42
mais forte quando fiz de novo. — Nós vamos nos divertir não
é mesmo amigo?

O Dr. Frenen agarrou meu cotovelo e falou comigo


em voz baixa.

— Edward Moore será mais que um desafio, eu temo.


Como sabe, o acidente provocou sua paralisia, e como ele era
o condutor, ... guarda uma grande quantidade de culpa pelo
que aconteceu. Você mencionou que tem experiência com
respiradores?

Assenti.

— Este é um de alto calibre que se regula sozinho


segundo os níveis de oxigenação do corpo. Contém também
um sistema de cópia de segurança de emergência se o
primeiro der defeito. Se tiver problemas apesar do ajuste da
máquina de respiração, basta apertar o botão de alerta detrás
de sua cadeira, que o hospital Lehigh Valley será notificado.
O pessoal tem ordens estritas de enviar uma ambulância de
emergência. A chamada seguinte deve ser para mim.

— Há uma bolsa e máscara dentro do quarto com um


adaptador de tubo de traqueostomia?

O Dr. Frenen assentiu com aprovação.

— Boa pergunta. Sim, há uma guardada atrás de sua


cadeira em todo momento e uma em cada andar, mostrarei
onde estão.

43
— Então há como oxigená-lo e se for necessário
realizar uma RCP5 até que chegue ajuda?

— Exatamente.

— Dr. Frenen, com todo respeito, por que está


procurando um AEC em vez de uma enfermeira formada para
o cargo?

Ele me estudou cuidadosamente.

— Contratamos enfermeiras formadas apenas


durante o tempo em que o Sr. Moore está doente. Ele é
bastante reticente em ter cuidados e não gosta de ser
mimado, com o tempo percebemos que responde melhor aos
auxiliares de enfermagem do que às enfermeiras formadas.

Ainda não tinha conhecido o Sr. Moore, mas podia


entender como se sentia.

— Está bem, lembrarei disso. — Tommy puxou meu


braço esperançosamente e riu de novo quando o girei
novamente. — Como é a saúde do Sr. Moore em geral?

— Alguns dias são melhores do que outros. — Isso foi


o que disse o Dr. Frenen, mas esses suaves olhos marrons
detrás das lentes bifocais me disseram que o Sr. Moore não
estava bem. — Sua memória, sentido para os negócios e
inteligência permanecem agudos, já o seu discurso está,

5
A reanimação cardiopulmonar (RCP) ou reanimação cardiorrespiratória (RCR)

44
obviamente deteriorado devido à cânula de traqueostomia e
sua paralisia limita sua independência.

— Ele é alérgico a algum alimento ou medicamento?

— Não, mas se começar a mostrar sintomas de


enfermidade, preciso ser informado imediatamente para
começar um tratamento agressivo.

— Ela está fazendo todas as perguntas corretas, Lou.


— Uma mulher magra com um cabelo loiro comprido até os
ombros me sorriu com lábios vermelhos brilhantes.
Provavelmente, era apenas em torno de sete centímetros mais
alta que eu, mas nesses saltos assassinos que usava, eleva-se
acima de mim apesar da forma que estava apoiada no marco
da porta. — Eu gosto, Lety.

Está bem. Ela não era bonita. Era impressionante...


do jeito como eu imaginava minha amiga Piper nos seus vinte
anos mais ou menos. A ausência de rugas sugeria
tratamentos faciais caros e a mão perita de um bom cirurgião
plástico. O Dr. Frenen a apontou.

— Lety, apresento-lhe Dionna Moore, a senhora da


casa.

— Olá, Sra. Moore. — Apertei—lhe a mão apesar de


que Tommy estava tentando me puxar para outro giro. — É
um prazer conhece-la.

45
— Por favor, chame-me de Dionna. — Riu ante a
insistência de Tommy. — Parece que meu bebê está um
pouco encantado por você. — Ela ajoelhou e estendeu seus
braços. — Vamos, Thomas, venha com a mamãe.

Tommy parecia hesitante, agarrando meus dedos


com mais força. Meu olhar foi de um para o outro. O menino
não parecia assustado, porém retrocedeu ainda mais para
trás de mim, considerando sua mãe como uma estranha.
Está bem, isso não era estranho nem nada.

Meu instinto me fez querer colocar o Tommy contra


mim até que notei uma pontada de dor cruzando os olhos
cinzas de Dionna. Insisti para que o Tommy fosse para a
frente.

— Vá até a mamãe, lindo. Brincaremos depois que eu


me reunir com seu papai.

Tommy caminhou com cuidado até ela, Dionna


acariciou sua bochecha quando ele chegou próximo. Houve
uma grande quantidade de afeto e amor atrás do gesto, mas
ela não pode evitar demostrar o desconforto que
acompanhava cada carícia. Era quase como se não soubesse
como ou se deveria tocá-lo.

O Dr. Frenen me fez um gesto para que continuasse


em frente.

— Por favor, por aqui.

46
Um homem em uma cadeira de rodas eletrônica
esperava perto do centro do quarto, observando-me com
atenção. Um computador portátil estava colocado sobre a
mesa por cima de seu colo e um fone de ouvido com um
microfone estava preso ao redor de sua cabeça. A cor cinza
salpicava seu cabelo escuro e costeletas. De acordo com a
documentação, o Sr. Moore tinha apenas cinquenta e seis
anos, mas sua forma descarnada, rosto gasto e suas
profundas rugas o faziam parecer muito mais velho.

Segui o Dr. Frenen através do quarto. A grande suíte


me lembrou um grande salão de baile dado o seu tamanho,
mas não havia música, nem risadas, apenas um vazio que
coincidia com o estado de ânimo dilacerador do quarto.

Uma cama king com um edredom bordado, um


armário, um escritório e duas poltronas eram as únicas peças
do mobiliário, além de uma grande tela plana montada na
parede. O resto do espaço continha prateleiras e nichos
cheios de material médico. Tentei sorrir, foi difícil. O Sr.
Moore era muito frágil e fisicamente limitado. Apesar de sua
grande riqueza, nada mudaria isso.

Além do locutor descrevendo um relatório de


negócios na tela plana, os assobios e respirações forçadas do
Sr. Moore eram os únicos sons no quarto. Não pude evitar me
perguntar por que Dionna não falava com Tommy, mas
tínhamos chegado até o Sr. Moore e teria sido grosseiro lhe
dar as costas.

47
— Edward, eu gostaria de lhe apresentar a Lety. A
agência a enviou como possível candidata para cobrir o Roger
durante as horas que ele não estiver disponível.

— Muito prazer, Sr. Moore. — Ele me analisou com


um olhar que sugeria inteligência e suspeita. Estiquei-me e
levantei sua mão, sacudindo-a brevemente antes de colocá-la
de novo sobre a mesa cuidadosamente. — Sinta-se livre para
me perguntar qualquer coisa. Gostaria que se sentisse
confortável se decidir me contratar...

— Tommy, não!

Tommy correu para longe de sua mãe, suas magras


perninhas movendo—se desajeitadamente e os braços
estendidos, cambaleou a meio caminho de mim, caindo com
força. Corri em sua direção, enquanto ele se empurrava nos
cotovelos, seu pequeno e doce rosto transtornado com medo e
dor.

Parei quando Dionna correu para ele, pensando que


o tomaria em seus braços. Em vez disso, ela abaixou-se sobre
Tommy, suas mãos para fora, o olhar passando sobre seu
filho, mas falhando em tocá-lo. Mas que raios?

Tommy gritou como um bebê, sua expressão


desmoronando me implorando que o salvasse. O Sr. Moore
virou na nossa direção, utilizando os dispositivos em seu
protetor bucal para controlar os movimentos da cadeira.

48
Talvez não devesse tê-lo feito, mas fui em busca de Tommy e
o puxei em meus braços.

Apertei-o contra mim.

— Está tudo bem. — Disse-lhe em voz baixa. — Tudo


está bem, pequeno.

Ele agarrou minha camisa, suas lágrimas


desenfreadas empapando meu top. Sua dor e seu medo me
lembraram de minha irmã Sofia, quando era pequena... tão
frágil e aterrada, com um espírito muito fácil de quebrar. Ok,
mas não no meu turno, menino.

Falei em voz baixa com ele até que se acalmou,


depois o levantei e cruzei o quarto, sentei-me com Tommy em
uma das cadeiras com almofadas. Quando tentei colocá-lo do
meu lado, segurou-me com mais força, com medo que o
deixasse ir, então deixei que ficasse em meu colo,
assegurando-lhe que estava a salvo.

O Sr. Moore virou e parou na minha frente quando


levantei os braços de Tommy para verificar se haviam
machucados.

— Está ferido? — Perguntou entre respirações. Sua


voz áspera soava como se estivesse se afogando com
cascalho, mas entendi claro o suficientemente.

49
— Está tudo bem. — Toquei o nariz do Tommy,
fazendo-o sorrir. — Ele apenas acabou de ter um pequeno
susto. Certo, amigo?

— Precisa de gelo? — A preocupação por trás da voz


do Sr. Moore me convenceu de que teria recolhido seu filho
em seus braços se pudesse.

— Posso buscar gelo se precisar.

Paralisei ante a sugestão de Dionna. Por um


momento, eu me esqueci que estava ali. O Sr. Moore cerrou
seus dentes, parecendo zangado de que ela não tivesse feito
nada antes, mas não conhecia nenhum dos dois bem o
suficiente para ter certeza.

Uma parte de mim não conseguia entender por que


Dionna parecia tão incapaz quando se tratava do próprio
filho, senti pena por ela. A confiança que demonstrou
inicialmente se evaporou no momento em que Tommy hesitou
ao aproximar-se dela. Sim, ela não conhecia seu filho. Mas
não podia deixar de pensar que gostaria de conhecê-lo.
Acariciei os grossos cabelos marrons de Tommy. Sorri de
novo. Talvez pudesse ajudar. Se não fosse por sua causa,
talvez pelo doce menino.

— Acredito que ficará bem. Não vejo nenhum


inchaço.

O Dr. Frenen observou tudo em silêncio. Embora


tivesse se aproximado de Tommy, não fez nada, igualmente a

50
mim, provavelmente, esperou que Dionna ajudasse seu filho.
Ele suspirou e colocou sua mão sobre o ombro do Sr. Moore.

— O que acha, Edward?

— Sim, por favor, contrate-a.

51
CAPÍTULO 3
O sol estava pintando os rios brilhantes de vermelho
e ouro através das nuvens no momento em que deixei a
residência dos Moore. O Dr. Frenen e eu cobrimos toda a
extensão dos meus deveres, os quais incluíam a alimentação
do Sr. Moore e do Tommy, ligar para ele se sentisse alguma
mudança na saúde de ambos conforme as avaliações diárias.
Com a permissão do Sr. Moore, examinei-o para estabelecer
uma base. Devido a sua paralisia, mesmo as mudanças mais
sutis poderiam indicar uma doença iminente. Ele me
informou, que minha avaliação não incluiria nada acima dos
joelhos ou abaixo da cintura. Fiquei bem com isso. Também
estava bem que outro assistente, Roger desse banho nele. O
homem ainda tinha seu orgulho, depois de tudo.

Ainda estava sorrindo enquanto pensava no pequeno


Tommy e em como o Dr. Frenen teve que levar com cuidado
para longe de mim para que eu pudesse ir embora. Pequeno e
doce menino. Incomodava-me que seus pais fossem incapazes
de tratá-lo como merecia. Seu pai tinha suas limitações, mas
sua mãe...

Saltei quando meu telefone tocou e "Echa Pa’lla" do


Pitbull explodiu no celular. Merda. Não me dei conta de que

52
deixei o toque tão alto. Felizmente, ninguém ligou durante
minha entrevista.

O rosto do Mateo iluminou a tela. Apertei o viva voz.

— Olá, Teo. O que aconteceu? — Minha voz


implorava que ele dissesse que Carlos meteu os pés pelas
mãos outra vez e estava de volta na prisão.

A profunda voz do meu irmão retumbou no outro


lado.

— Nada, estou apenas me assegurando de que está


tudo bem depois de ontem. — Meus ombros se afundaram.
Isto era como esperar por um milagre.

— Sim, eu estou bem.

— O que está fazendo?

Sorri.

— Procurando briga em um bar qualquer.

— Sério?

— Não.

— Melhor que não esteja, você está na universidade,


então não tem que brigar, idiota.

— Que lindo, Teo, você beija a sua linda esposa com


essa boca?

53
— Beijo muito a minha esposa, não que seja da sua
conta, sua intrometida.

Sorri, mas depois houve uma pausa incômoda. Ouvi


Teo suspirar do outro lado da linha, porém ele não estava
falando.

— Algo mais aconteceu com o Carlos?

— Quer dizer desde que bateu na mamãe?

Tentei acalmar a náusea provocada por suas


palavras.

— Sim.

— Não, estou surpreso que você queira saber, já que


desligou bem rápido ontem à noite.

— Sinto muito.

— Você não tem que se desculpar, sei por que fez


isso, também gostaria de desligar essa parte da minha vida.

Tirei a presilha que segurava o rabo—de—cavalo em


meu cabelo, com a esperança de aliviar um pouco da tensão
do meu corpo.

— Não é que eu não me importe, Teo, apenas estou


cansada que ela ainda aceite isso, sabe?

— Lety, todos nós aceitamos até certo ponto. Sou um


homem crescido e ainda luto com os problemas dela. Quem
dá dinheiro para mamãe quando Carlos não dá? Quem paga

54
as contas médicas quando ele a machuca? Sou eu. Estou
cansado disso... e de todo o resto que tem feito a nós. Mas se
eu não a ajudasse, quem faria?

Reduzi a velocidade quando vi uma manada de


cervos pastando em um pasto extenso a minha esquerda,
pensando na última vez que Teo e Carlos se enfrentaram. Não
acreditava que alguém fosse capaz de vencer o Carlos, mas
meu irmão mostrou que era durão.

— Sabe, quando você bateu no Carlos, eu tinha


certeza de que ele pensaria duas vezes antes de machucar
mamãe de novo, mas imagino que mais uma vez estava
errada.

— Isso é porque sabe que nossa mãe sempre voltará,


não importa o que aconteça. Além disso, tudo aquilo foi
diferente, Carlos ameaçou a Evie e de jeito nenhum tocaria
na minha garota.

— Parece que não tocará em você também, não


depois do que fez com ele. Você está seguro agora.

— Sim, mas tudo isso vem com um preço, fui eu


quem ficou no papel de filho mau, sem me importar com
nada. A maior parte da família ainda não quer falar comigo.
Cruzei uma linha quando golpeei o velho. — Escutei um som,
como se estivesse tamborilando com os dedos. — Olha, Lety,
o Carlos não vai se meter apenas com a mamãe, você e a

55
Sofia precisam ficar atentas, está me ouvindo? — Acelerei
enquanto deixava os cervos para trás de mim.

— Eu sei, trabalhei em um plano de segurança com o


colégio para o caso dele aparecer aqui mais uma vez.

— Bom, pelo que o tio Linho me disse, o Carlos está


piorando... está mais medíocre, mais rancoroso, com muita
vontade de arranjar problemas. E como tem tempo de sobra o
suficiente, acredito que logo fará isso.

É uma lástima o sistema jurídico não conseguir


detê-lo.

— Simplesmente, não entendo por que mamãe não se


afasta dele. Isto não é Cuba, há muitas formas aqui de ajudar
mulheres maltratadas.

— Ela tem três coisas que a prejudicam, veio de uma


cultura antiga, de um velho país e de uma velha religião,
Lety. Quando você a olha, vê uma mulher muito estúpida
para fugir e muito fraca para lutar. Em sua mente, ela
acredita que permanecer junto ao marido e ser fiel aos votos
que fez quando se casaram faz dela uma boa esposa

A raiva cega tornava difícil me concentrar.

— Não importa como ele a tratou ou a nós?

Téo amaldiçoou.

56
— Eu não disse que está certo, apenas que ela não
pensa como você. Fique grata por ser mais esclarecida e não
vai cometer os mesmos erros.

Espero que não.

O silêncio permaneceu enquanto eu entrava em um


bairro com casas mais modestas e pequenas. Deixei o luxo de
Saucon Valley Rose e me dirigi para mais perto do campus.

— Aconteceu mais alguma coisa? Está muito quieto,


mesmo para você.

— Não— Respondeu.

— Teo? Ainda está aí?

— Evie quer ter um bebê.

Desacelerei sem sequer perceber o que estava


fazendo. Apesar de discutir sobre nossa vida familiar
fracassada, queria uivar, gritar, saltar fora do carro e correr
em círculos, agitando os braços como uma mulher louca...
algo assim, só não fiz porque a profunda voz de barítono do
Mateo não mostrava o entusiasmo que eu esperava. Então
não havia uivos, gritos ou braço se agitando, havia apenas a
preocupação por meu irmão.

— Como se sente sobre isso?

— Não sei, é o próximo passo, não é? Estamos


casados a mais de um ano, temos uma casa, e ganhamos um
dinheiro decente.

57
— E você a ama.

— Sim, eu a amo.

— Então, qual é o problema? — Mais uma vez não


respondeu. — Teo? Por que parece chateado?

— Não estou chateado, simplesmente, não estou


certo de que tipo de pai eu seria, não tive o melhor modelo
para seguir, entende?

— Teve o tio Linho. Ele foi bom para nós.

— Sim, mas não é a mesma coisa. — Um longo


minuto passou antes que falasse de novo. — Não quero ser
um imbecil para meu filho, Lety.

E ali estava, meu grande e forte irmão temia ser pai.


Acelerei o suficiente para atingir o limite permitido.

— Não será.

— Você não sabe isso, viu a merda pela qual


passamos. É carga suficiente para ferrar alguém para toda a
vida.

Pensei em todas as vezes em que Teo cuidou de mim


e da Sofia quando nossa mãe trabalhava longas horas para
nos dar o que comer. Ele nos fazia sanduiches para que
tivéssemos algo para comer, e se assegurava de que
fizéssemos nossa tarefa, usássemos roupa limpa na escola e
que nós escovássemos os dentes. Também pensei na primeira
vez que Carlos me bateu, realmente me bateu. Eu tinha

58
quatro anos, Teo tinha apenas nove anos. Meu irmão saltou
diante de mim e recebeu o restante dos golpes do Carlos,
depois se deitou comigo toda a noite enquanto eu chorava.

Somente depois que meu tio Linho levou o Teo ao


médico, no dia seguinte, descobrimos que o Carlos havia
quebrado seu braço.

Limpei meus olhos quando a estrada se nublou.

— Você será um grande pai, Teo. E vai dar ao seu


filho o amor que sempre quis e mereceu. Não há nenhuma
dúvida em minha mente.

Ele levou um momento para responder e soltou um


longo suspiro antes de fazê-lo.

— Obrigado. Olha, tenho que ir. Se precisar de algo,


dinheiro ou o que quer seja, ligue para mim ou para Evie, de
acordo?

— Eu ligo. Amo você, Teo.

— Sim. Eu também.

Mateo desligou quando entrava no campus. Deveria


estar aliviada por ter conseguido o trabalho, entretanto, eu
estava zangada. Carlos era um monstro imbecil e mesmo
quando não estava perto, entrava nas nossas cabeças. A
perspectiva de tornar-se pai do bebê de Evie deveria ter
enchido o meu irmão de alegria, mas em vez disso, ele estava
preocupado em ferir seu próprio filho.

59
Meu coração pulsava com o quanto eu odiava o
Carlos. Cambaleei ao sair do carro, fechando a porta um
pouco mais forte e me dirigi para minha casa. Os arbustos
plantados sob as janelas do primeiro andar eram pequenos e
deliberadamente podados. Havia uma fila de carros
estacionados em frente às casas a minha esquerda e a minha
direita. Embora o campus fosse relativamente seguro,
mantive meus olhos abertos e corri para minha casa.

Quase todo mundo ia a pé para as aulas. Os carros


eram usados em excursões fora do campus ou por aqueles
que eram muito preguiçosos para caminhar os oitocentos
metros até nossa academia. Eu esperava que uma vez que
começassem as aulas, a atividade no campus aumentasse e
não me sentiria tão sozinha. Exceto da maneira que já era
habitual. Suponho que o abuso infantil tem esse efeito
duradouro.

Entrei no pequeno espaço que era minha casa. O


curto corredor levava para a cozinha e sala cheia de tapetes,
enquanto às escadas à minha direita levavam aos três
quartos e aos dois banheiros no primeiro andar. O lugar era
pequeno e ainda uma novidade, mas me sentia mais
confortável ali do que na casa em que cresci.

Acendi as luzes quando entrei no meu quarto, fechei


a porta e me joguei sobre minha cama para enviar uma
mensagem de texto para a Piper e Alice.

60
— Olá, tive que arranjar outro trabalho, então
preciso reorganizar meu horário, podem me ajudar?

Piper respondeu a mensagem primeiro.

— E o que receberemos em troca, doçura?

Sorri, antes do treinamento do RH, não conhecia


realmente a Piper, muitas garotas não gostavam dela e a
rotularam como cadela. Mas estavam enganadas.
Simplesmente era insegura, apesar de sua surpreendente
aparência, e tinha problemas para fazer amizade com
mulheres. Respondi no meu iPhone.

— Eu te ofereceria uma nova cirurgia nos seios,


mas você resolveu isso neste verão.

— Eu poderia usa tetas novas, respondeu Alice.

Fazia-me bem rir. Parei tempo suficiente para enviar


outro texto.

— Que tal um bife com queijo e todo o chá gelado


formos capazes de beber?

Piper respondeu.

— Maravilhoso, perdi o jantar. Que tal levar


alguns sorvetes para a sobremesa?

— Parece bom, vemo-nos no meu quarto.

O entregador do Antônio trouxe a comida cerca de


meia hora mais tarde. Piper, Alice e eu falamos entre uma

61
garfada e outra, trabalhando para reorganizar minha agenda
e conseguir encaixar os Moore. Quando terminamos, lavamos
as mãos e Piper pegou os picolés no freezer do meu mini
frigorífico.

— Qual sabor você quer? Temos de cereja e uva. —


Alice ajustou seus óculos grandes no rosto minúsculo.

— Fico com o de cereja.

Encolhi os ombros.

— Uva está bom.

Alice e eu nos sentamos em minha cama. Piper se


sentou escarranchada sobre uma das cadeiras de minha
mesa e puxou seu cabelo loiro platinado. Deu uma longa
lambida em seu picolé e do nada perguntou:

— Então, alguma vez você deu uma boa chupada em


um menino?

Alice e eu deixamos de chupar nossos picolés.


Caramba, as delícias geladas pareciam ser uma boa ideia
quando ela ofereceu.

Piper começou a rir e deu uma dentada na parte


superior do seu picolé.

— Vamos lá— Disse. — Não é como se nós fôssemos


todas virgens aqui.

62
Deixando de lado nossa amizade, de maneira
nenhuma eu admitiria para elas que minha virgindade se
mantinha firmemente em seu lugar... ou que nunca fiz sexo
oral em ninguém. Brody e eu nos beijávamos e brincávamos,
mas ele nunca me pressionou para fazer nada. De alguma
forma chegou a equivocada conclusão de que meu último
namorado me machucou. Não, meu último namorado era
apenas um imbecil e o último homem na terra com o qual me
deitaria. Por mais estranho que parecesse, planejei transar
com o Brody na noite em que terminamos, mas em vez de
passar uma noite especial como era minha intenção,
terminamos nossa relação e seguimos caminhos diferentes.

Alice baixou a cabeça, fazendo com que seus óculos


escorregassem pelo seu nariz e com que seu cabelo castanho
escuro cobrisse seu rosto. Acariciei suas costas e falei com
suavidade.

— Está tudo bem, Alice. Você não tem que responder.

— Eu já tentei, só que parece que não sou muito boa


nisso— Disparou

O mundo parou de girar.

Puta merda.

— Não seja boba. — Piper deu outra lambida. — Um


menino com o qual eu saí me disse uma vez que não existe
essa coisa de boquete ruim. É bom ou é excelente.

63
Alice empurrou seus óculos de volta para seu rosto.

— Acho que eu mordi.

Piper e eu fizemos uma careta.

— OH.

— E acho também que apertei suas bolas muito forte.

— OH! — Dissemos de novo.

— Sim. Isso foi o que ele disse.

Comecei a rir e Piper também. Ela apontou para a


Alice com seu picolé.

— Mostre para nós o que você fez.

— O quê?

— Você sabe, mostre-nos a sua técnica. Talvez


possamos ajudar.

Alice me olhou. Tendo em conta que tinha mais


experiência do que eu, pensei que estava olhando para a
pessoa errada.

— Não posso. Estou ah, muito envergonhada.

Piper se inclinou para a frente.

— Quer que eu te ensine?

— Sim— Respondeu Alice um pouco rápido demais.

64
Então Piper mostrou, e santo Deus, seu picolé não
tinha nenhuma chance. Tentei não olhar, juro por Deus que
tentei, na maior parte, acredito que disfarcei bem. Mas não
vou mentir, meu cérebro fez anotações tão bem detalhadas,
como se dependesse apenas disso para resolver a fome
mundial e acabar com o aquecimento global.

— Como não você não engasga? — Perguntou Alice.


Ela não estava disfarçando tão bem. Seus olhos quase saíram
do seu crânio com o quanto estava se concentrando.

Piper tirou o que sobrou do seu sorvete do fundo de


sua garganta.

— Às vezes engasgo, mas os meninos gostam disso,


faz eles pensarem que são tão grandes, que não conseguimos
evitar de engasgar com seus bens. — Ela se virou para mim.
— Alguma vez você se engasgou com o Brody?

Geralmente, eu era a rainha das façanhas e das


respostas inteligentes. Mas não nesse momento.

— Como?

Ela deu uma risadinha.

— Os rumores dizem que as notas dele não são sua


única qualidade.

A cabeça de Alice se virou bruscamente para mim.

— Sério?

65
Meu rosto quente respondeu por mim. Sim, Brody
era bem "dotado" em mais de um sentido.

Alguém bateu na porta principal da casa, salvando-


me. Piper ficou de pé.

— Deixa comigo — ela apontou para a Alice antes de


se dirigir para o corredor. — E você não pode se esquecer de
brincar bem com os meninos. — Ela fechou a mão e fez
movimentos para cima e para baixo. — Suave, bem suave.

— Farei bem suave — Prometeu Alice.

Jesus Alice, a doce, reservada, e tímida Alice teve


mais sexo do que eu. Minha vida não era um desperdício total
ou algo assim.

A porta principal se abriu.

— Olá, queridos— Cantarolou Piper, voltou sorrindo


com Brody e dois amigos, Matt Hade, também conhecido
como Meathead, e Razor.

Brody sorriu quando me viu e se sentou ao meu


lado, fiquei aliviada porque ele ainda parecia feliz em me ver.
Não tínhamos nos falado desde ontem.

— Olá— Disse.

— Olá. — Engoli o resto do meu picolé antes que


Piper tivesse mais alguma ideia brilhante.

Colocou o meu cabelo para trás, nas minhas costas.

66
— Como vai?

Graças a Piper e sua demo de "como fazer os pênis


felizes", seu breve contato esquentou minha pele. Tentei não
reagir, mas não pude esconder o sorriso ou o rubor que o
gesto me causou.

— Bem, a coordenadora Riley me deu permissão para


arrumar outro trabalho. Fui a uma entrevista para um cargo
de AEC esta tarde e me ofereceram um contrato de meio
período. Alguns fins de semana, algumas noites na casa
quando precisarem, mas acredito que posso administrar.

Ele franziu o cenho.

— Letz, não gosto da ideia de você passar a noite na


casa de um desconhecido.

— Eles parecem agradáveis. Além disso, eu preciso


trabalhar. — Fiz um sinal para onde Piper flertava com o
Meathead e tentei mudar de assunto. Os direitos do paciente
não me permitiam dar nenhum detalhe, mas nada que eu
falasse acalmaria sua mente. — As meninas estavam me
ajudando a reorganizar minha agenda, então eu não deixaria
de cumprir nenhuma das minhas obrigações do RA. O que
vocês estão aprontando?

Brody encolheu os ombros.

67
— Estou voltando do restaurante Coopersburg.
Vimos você na janela quando passamos e queria ver o que
estava fazendo.

Fiquei gelada.

— Viu-nos da janela?

Ele inclinou a cabeça para o lado.

— Sim... porquê?

Piper falou.

— OH, estávamos apenas trocando informações de


como fazer sexo oral. — E bom, se isso não atraiu a atenção
de todos?

Razor parou de brincar com o colar de couro ao


redor de seu pescoço.

— Merda, não. É sério que vocês estavam falando de


boquetes? — Piper ficou olhando como se fosse óbvio.

— É obvio, é isso que as garotas fazem nos


dormitórios.

Foi só porque Meathead era de pele clara que seu


rubor cobriu o meu e o da Alice. Cruzou seus gigantescos
braços e sorriu.

— Isso é genial.

68
Quando levantei meu rosto carmesim, Brody olhava
para mim sorrindo.

— Não me olhe dessa maneira.

Seu sorriso se alargou.

— De que maneira?

— Como se a coisa seguinte que faríamos seria uma


briga de travesseiros nuas. — Os olhos de Meathead se
abriram de repente.

— Vocês também fazem essa merda, garotas?

Fiquei boquiaberta.

— Não!

Brody jogou a cabeça para trás rindo e ficou de pé,


puxando-me com ele.

— Vamos.

— Aonde nós vamos?

— Passear.

Não estava segura de que estar a sós com o Brody


fosse uma boa ideia e me virei para minhas amigas em busca
de ajuda. Alice enterrou o rosto sob meu edredom. Razor ria
às gargalhadas e tentava convencê-la a sair.

Quando olhei para a Piper, ela fez esse maldito


movimento de boquete com a mão e sorriu. Obrigado, Piper.

69
Brody moveu seu polegar contra minha palma.

— Preciso falar com você. Podemos fazer isso durante


a caminhada— Os cantos de sua boca se levantaram— Ou
nessa casa de obscenidade e pecado. A decisão é sua.

Considerei minhas opções e virei para Piper.

— Feche a porta ao sair, Peeps.

70
CAPÍTULO 4
Brody esfregou a parte inferior das minhas costas,
enquanto tomávamos o atalho para fora de Heights e
atravessamos a rua, pegando o caminho que conduzia aos
edifícios principais e aos dormitórios masculinos.

Já era quase meia-noite, mas as calçadas e o


exterior dos edifícios estavam brilhantemente iluminados
pelas luzes brancas dos postes.

— Quer caminhar pelo campus? — Perguntou.

— Claro, o que quiser.

Apoiou seu braço sobre meus ombros e me apertou


contra ele enquanto continuávamos avançando.

— Tudo bem?

Ri um pouco, afastando-me alguns centímetros.

— Dentro do razoável.

Considerando que ele desejava conversar, esteve


muito calado. Passamos pelo centro de estudantes. As luzes
no refeitório ainda estavam acesas. Através das janelas
panorâmicas, captei um porteiro polindo os pisos. Enquanto

71
deixávamos o grande edifício atrás de nós, Brody finalmente
falou.

— Sobre este trabalho, acredito que ao aceitá-lo, está


contrariando os seus principais interesses.

Encolhi os ombros.

— É parecido ao trabalho que tive no verão.

— No verão você não tinha um curso completo ou o


estágio de RA ou a sua ronda clínica. É muita coisa, Lety.

— Tenho que fazer isso, não posso deixar de estudar.

— Não estou lhe pedindo isso. — Passou uma mão


através de seu cabelo. — Eu falei sério, posso te ajudar, se
você apenas me permitisse isso.

Cruzei meus braços e olhei para baixo.

— Você é doce, mas não aceitarei nenhum dinheiro


seu.

— Posso saber o porquê?

Não podia esperar que ele entendesse.

— Porque não é certo.

— Então considere como um empréstimo, pode me


pagar quando se formar.

— Como se você fosse permitir que eu fizesse isso.

72
As sobrancelhas franzidas de preocupação do Brody
o impediram de retribuir o sorriso.

— Lety, você está tentando carregar o peso do


mundo... sempre fez isso, mas tem que entender que não está
sozinha, eu posso te ajudar.

— Minha mãe uma vez se convenceu de que meu pai


a ajudaria e lhe daria tudo, e você viu o quão bem acabou.

Ele ficou rígido como se o tivesse golpeado e seu


braço caiu dos meus ombros e se afastou.

— Não sou seu pai, não me compare com ele.

Eu me aproximei.

— Deus, sinto muito, não foi isso que quis dizer. É


apenas que não posso confiar totalmente em ninguém. A fé
cega é perigosa, sabia?

Sacudiu sua cabeça.

— Não, eu não sei, só procuro uma forma de tornar


as coisas mais fáceis para você.

— Eu sei. — Paramos perto da passarela que levava


ao centro de artes cênicas enquanto tentava encontrar as
palavras corretas. — Quando fui aceita em Saint Jude, fiquei
muito emocionada, eles me premiaram com bolsas de
estudos, uma chance de me afastar da minha família, a
oportunidade de ser uma enfermeira como sempre sonhei.
Quando contei para minha mãe, sabe o que ela me disse?

73
Brody fez uma careta.

— Seja o que for, não foi bom, não é verdade?

Quase desisti de contar a ele, já tinha arruinado o


que deveria ter sido um momento incrível na minha vida. Mas
Brody precisava entender o motivo do meu receio em aceitar
sua ajuda e porque estava tão apreensiva.

— Disse que estava feliz que recebesse educação,


pois assim, quando meu marido começasse a me bater, pelo
menos eu seria capaz de me sustentar.

Brody escancarou a boca lentamente.

— Cristo, Lety.

Balancei minha cabeça.

— O que quero dizer é que esse foi o futuro que ela


realmente esperou que Sofia e eu tivéssemos.

— Porque é somente isso que ela conhece.

— É tudo o que ela conhece. Por isso compartilhou


comigo, e com seus pais não foi diferente. — Coloquei as
mãos em meus quadris e fiquei olhando a calçada,
observando nossas sombras e como se mesclavam. — Preciso
fazer as coisas por mim mesma. Não posso ser como ela,
confiando nas pessoas para salvá-la, para ajudá-la, não
quero isso para mim.

74
— Mesmo vindo de alguém que jamais te
machucaria?

Não queria brigar com ele, mas meu tom foi firme.

— Brody, eu não posso.

Ficamos em silêncio por um longo momento. A


princípio pensei que ele iria ficar zangado, mas em vez disso
agarrou minha mão.

— Você pensa que somos muito diferentes para


estarmos juntos, certo?

Meus olhos ardiam.

— Sim, penso.

— Não somos, Letz. — Olhou-me de perto. — Você


alguma vez se perguntou como ganhei essas cicatrizes em
minhas costas? Sei que nunca acreditou na minha história
sobre a queda de uma casa na árvore.

O tom triste em sua voz parou os batimentos do meu


coração em dolorosos golpes secos. O corpo perfeito do Brody
estava marcado por grossas e feias cicatrizes que cobriam
suas costas, essa era a razão pela qual não tirava sua
camiseta durante os treinos de lacrosse e cada brutal corrida,
sem importar quão quente estivesse o dia.

— Está dizendo que seu pai fez isso?

Sua voz se endureceu.

75
— Estou dizendo que posso te entender muito mais
do que acredita.

Escutamos ecos de risadas a nossa frente enquanto


um grupo de alunos do teatro saía do centro de artes cênicas.
Alguém começou a cantar ―Acapella‖ uma melodia do Bruno
Mars e o resto se uniu imediatamente.

Brody me empurrou para o lado.

— Vamos para um lugar mais privado, longe de


todos, tudo bem?

Apertei sua mão, preocupada.

— Tudo bem.

Cortamos caminho pelo centro do campus e


cruzamos a via que levava às quadras de esportes. O centro
atlético ainda estava cheio de atividades. Brody nos conduziu
para a direita, mais perto das pistas de campo e longe de
ouvidos indiscretos.

Permaneceu estranhamente quieto e calado. Deixei


ele com seu silêncio e seus pensamentos, insegura de onde
estávamos nos dirigindo até que chegamos a um pequeno
conjunto de arquibancadas e subimos até o segundo degrau.

Sentamos e apoiamos nossos pés sobre os assentos


da frente. Por um momento, ele apenas olhou fixamente
através do campo onde a lua iluminava a densa linha de
árvores. Acariciei sua mão, ainda segurando a minha.

76
— Está tudo bem?

— Mais ou menos.

Essa não era a resposta que queria escutar. As


arquibancadas estavam frias sob as minhas pernas
descobertas, mas foram suas palavras que me gelaram.

— O que significa isso, exatamente?

— Significa que estou melhor do que estava, mas


ainda não estou onde gostaria.

— Brody, você está me assustando.

Ele afastou o comprido cabelo do rosto.

— Não é minha intenção fazer isso. É apenas que o


que tenho para dizer não é fácil. Mas acredito que deveria
contar isso.

— Está tudo bem. — Apertei sua mão com mais


força. — Mas faça apenas se achar que é o certo.

— Se não achasse, não o faria. — Considerou suas


palavras. — Sabe, todas as vezes que ficávamos conversando,
eu compartilhei algumas coisas, mas há muito mais coisas
que escondi.

Tinha minha cota de segredos, mas por alguma


razão doeu saber que ele escondeu coisas de mim.

— E por que escondeu?

77
Brody bateu seus dedos contra o degrau.

— Não queria que sua opinião sobre mim mudasse.

Assenti, encontrando seu olhar.

— Acho que sei o que quer dizer.

— Sim, eu sei que faz. — Inclinou para trás, soltando


uma longa e ofegante respiração. — Quando estava no ensino
médio, passei por uma época difícil em minha vida e comecei
a fazer um monte de coisas estúpidas: faltar a aula, curtir
com os professores, danificar propriedade pública, esse tipo
de coisas. Sabia que estava errado, mas tinha um monte de
raiva reprimida e não podia controlar— Encolheu os ombros.
— De certo modo, eu não queria.

Puxei minhas pernas contra meu corpo, observando-


o atentamente quando não disse mais nada.

— Com o que estava tão zangado?

— As coisas em casa não estavam bem. Quando


pensei que não podiam piorar, ficaram piores e eu também.
— Seus pés baixaram contra os assentos inferiores. —
Comecei a me meter em brigas, muitas. Nesse momento eu
era alto, mas muito magro. Na maioria das vezes, chutavam
minha bunda. Meus pais pensaram que eu estava
enlouquecendo e me fizeram ver um psiquiatra. Passei por
um monte deles, até que encontrei um que realmente me
entendeu e não aceitou minha atitude. Ela me ajudou a

78
controlar a raiva, mas era difícil mantê-la dominada. — Seu
olhar se prendeu ao meu. — Logo depois te conheci não ficou
tão difícil.

Meus lábios se separaram.

— Porquê?

— Você me escutava. Não como algumas garotas que


se prendiam a cada palavra, apenas porque queriam chegar
até mim, você realmente escutava o que eu tinha para dizer.
— Sorriu levemente. — Você se preocupava comigo sem ter
que se esforçar, apesar de terem se passado anos sem que eu
cuidasse de mim mesmo.

Coloquei minha mão em sua coxa e lhe dei um


aperto. Sabia exatamente o que queria dizer. Ele fez o mesmo
por mim.

Brody baixou sua cabeça.

— O problema foi que voltei para os velhos hábitos


quando nos separamos. E de todas as formas possíveis, fiquei
pior: zangado todo o tempo, bebendo muito e brigando em
cada oportunidade que tivesse. — Sua mão se moveu através
das minhas costas para meu quadril. — Ouviu sobre isso?

— Algumas coisas, o campus é pequeno você sabe?


— Era mentira. Os rumores que o envolviam sempre
chegavam até mim. Uma noite, um dos seus amigos me
procurou por todo o dormitório, esperando que eu pudesse

79
acalmá-lo. Brody e seus amigos de lacrosse começaram uma
briga com uma equipe rival em uma festa fora do campus. No
momento que seus melhores amigos o levaram miserável de
volta para seu quarto e eu cheguei lá, ele estava no banheiro
vomitando suas tripas. Fui embora, pensando que faria mais
mal se eu ficasse do que bem. Mas a julgar pelo seu estado de
humor negro, parecia que Brody precisou de mim.

Seus dedos massageavam minha lateral.

— Não era assim quando estávamos juntos—


Adicionou em voz baixa. — Este verão pensei em muitas
coisas e amadureci bastante. Não posso continuar com a
merda que fiz no ano passado. Tomei a decisão de crescer e
ser feliz com o que tenho.

— É uma boa decisão. Está sendo inteligente. —


Apertei de novo sua coxa quando a intensidade em seus
traços se manteve. — Brody, por favor me diga o que
aconteceu.

A curva de seus lábios se torceu.

— A coisa é que quando analiso o que me faz feliz, a


escola, o lacrosse, meus amigos, ainda não é a mesma coisa
sem você. Você faz tudo melhor para mim. Você, Letz, e não
qualquer uma dessas garotas... você.

Suas palavras penetraram em mim, fazendo-me


lacrimejar.

80
— Apesar de causar apenas dor?

Esfregou meu nariz com o seu.

— Acredito que ambos somos culpados, não acha?

Não respondi. Mas, sim, ele também me machucou.

Beijou minha testa quando me inclinei contra ele.


Esperei que explicasse a causa de suas cicatrizes, mas Brody
não o fez. Talvez não estivesse pronto ainda. Em vez disso,
sua profunda voz se suavizou quando acariciou minhas
costas.

— Lety, você é a única pessoa que me entende e


começo a pensar que faz isso por causa do seu passado.

Ele ainda pensava que nós tínhamos uma chance.


Fiquei rígida, sem acreditar que fosse possível.

— Brody, você não vê o quadro completo. Nós nunca


conseguiremos ficar juntos. Nosso ambiente, nossa criação...
são muito diferentes.

Ele esticou—se é virou seu corpo para poder me


olhar.

— Porquê? — Não respondi. — Não pode dizer algo


assim e não me dizer o porquê.

Meus olhos se encheram de lágrimas de novo, desta


vez era por uma razão diferente.

— Tem certeza de que quer saber a verdade?

81
— Sim. Preciso escutar.

Talvez ele precisasse disso. Isso não tornava mais


fácil contar, tomei várias respirações antes de finalmente ser
capaz de falar e quando o fiz, as palavras saíram livremente.

— Já fui para a cama faminta e coberta de feridas


que doíam muito para poder dormir. Escondi-me debaixo de
minha cama quando era pequena e estava assustada, e saía
ansiosa para a rua quando fiquei mais velha porque não
podia suportar nenhum outro grito da minha mãe.

Brody congelou.

— Letz...

Engoli um nó que se formou em minha garganta.

— Encontrei meu irmão inconsciente no chão da


cozinha quando tinha dez anos, desacordado sobre uma
piscina de sangue. — Respirei profundamente. — E fiquei
acordada escutando a minha irmã pequena chorar porque
estava assustada ou ferida ou simplesmente chorando,
porque o Teo e eu já não tínhamos mais lágrimas.

Abraçou-me contra ele, de maneira que o batimento


do seu coração palpitava contra minha orelha. Abracei-o mais
forte.

— Cada lembrança que tenho do Carlos leva uma


ferida física ou emocional. Estou tão ferrada por todos os

82
golpes, maus tratos e abusos verbais que em alguns dias
sequer entendo como cheguei tão longe.

Havia mais a dizer, muito mais, mas seu silêncio me


disse que escutou o suficiente. Seu corpo envolveu o meu.

— Por que não me falou sobre isso antes?

Elevei meu queixo, minha voz tremeu.

— Crianças abusadas aprendem desde cedo a não


dizer a ninguém, nada. Usamos mangas longas no verão para
esconder nossas marcas e fingimos sorrisos em nossos rostos
para mostrar que tudo está bem.

— Então ninguém sabe que está chorando no


interior. — Suas palavras me golpearam duro.

— Sim, é assim que funciona. — Limpei minhas


lágrimas quando continuou me olhando. — Brody, seu
passado não pode te ferir se não deixar. O meu passado pode,
porque continua sendo o meu presente.

— Isso não muda o que sinto por você.

Admitir o abuso não o impactou como pensei que


faria. Brody ainda não podia aceitar que eu não era a garota
certa para ele ou que merecia algo melhor.

— Deveria. Esta é a minha vida, meu problema. Não


deixe que seja seu também.

83
Fiquei de pé e avancei para a lateral do campo.
Brody fez uma breve pausa antes de me seguir pelo caminho
do bosque. A escuridão me envolveu enquanto eu entrava,
mas a lua cheia provia luz suficiente. Meus olhos não
levaram muito tempo para ajustar, e não levou muito tempo
para as lágrimas derramarem. Amava Brody. Sempre amei.
Apenas queria ser a garota especial que lhe daria tudo o que
precisava.

Quase chegamos ao fim do caminho, quando Brody


falou.

— Talvez você tenha razão, talvez nós sejamos muito


diferentes.

Doeu vê-lo concordar comigo, apesar de saber que


era o melhor, virei-me ao mesmo tempo em que ele me
alcançava.

— Sei que sou.

Em vez de se afastar, Brody pegou minhas mãos e


me puxou para me aproximar.

— O problema é que nunca dissemos adeus.

Minhas sobrancelhas franziram com força.

— O que você quer dizer? — Suspirei.

— Estamos nos afastando, tal como fizemos quando


terminamos da primeira vez, depois de tudo o que
compartilhamos, não acha que merecemos mais que do isso?

84
— Brody...

— Olha Lety, isso não é fácil para nenhum de nós, se


eu disser que manterei distância, você deixará que nós
tenhamos este momento juntos?

Tentei me afastar.

— Brody, não tenho certeza.

Ele segurou-me no lugar, baixando sua profunda


voz.

— Vamos lá, Lety, diga que estará comigo, mesmo


que seja apenas um pouco...

Uma última vez para estar com o Brody? Cada parte


dela doía, gritava sim, e outra parte sentia que não deveria
permitir. Quando terminei nossa relação, pensei que a dor me
partiria ao meio, então sabia que deveria recusar, exceto que
esperei muito para responder, dando-lhe tempo para fazer
seu movimento.

Beijou-me docemente, assim como fez no jardim da


reflexão. A princípio tentei me afastar, mas meu corpo acabou
cedendo. Queria estar com ele, mesmo quando sabia que não
era o correto.

Minhas mãos coçaram com a necessidade de tocá-lo


e ainda mais por saber que esta seria nossa última vez, então
quando seus lábios pressionaram mais forte, os meus
procuraram os seus com a mesma necessidade.

85
Suas mãos viajaram até segurar em meus quadris.
Exalei de repente quando me apertou contra uma árvore, sua
língua acariciando a minha prazerosamente, enquanto meus
ombros se empurravam contra o tronco rugoso. Ele gemeu
quando aumentei a profundidade do beijo, o calor
construindo-se com rapidez entre nós. Deixei sua boca para
gemer e tomar seu pescoço com meus dentes, deixando
mordidas até a base fazendo com que Brody empurrasse mais
forte contra mim.

Estremeci enquanto esfregava seu corpo com o meu


em lentos e fortes impulsos. A fricção entre minhas pernas
fez com que minhas pálpebras revirassem. Maldição, ele me
fazia sentir tão bem.

Brody colocou sua mão atrás do meu joelho e


levantou minha perna, permitindo-lhe ter mais espaço para
se esfregar. Quanto mais se movia, mais eu gemia e ofegava.
Sim, isto me fazia sentir bem.

A outra mão de Brody se moveu para debaixo da


minha blusa. Não o detive, respirei calmamente entre seus
longos e lentos beijos. Ele ergueu meu sutiã, sem incomodar-
se em desabotoar. Sua mão livre embalou meu seio exposto,
passando um polegar sobre a ponta endurecida.

— Jesus. — Murmurou e tomou um mamilo em sua


boca para sugá-lo.

86
Minha cabeça caiu para trás, golpeando contra a
árvore. Não me importei e gemi mais forte, perdendo o
controle e o que restava do meu equilíbrio, caímos e fomos
rolando pelo chão, meu comprido cabelo varrendo as agulhas
dos pinheiros e as folhas secas soltas. Brody se acomodou
sobre mim, beijando-me no pescoço e brincando com meus
peitos.

Minha língua se moveu ao longo de sua orelha e


minhas mãos perambulavam por debaixo de sua camiseta.
Seus músculos se enrijeceram enquanto meus dedos
passavam sobre as cicatrizes ao longo de suas costas.

— Deixe-me te tocar— Sussurrei quando parecia que


se retiraria. — Por favor, deixe-me te tocar.

Seu olhar travou com o meu enquanto eu tirava sua


camiseta. Ele fez uma ligeira pausa antes de arrancar minha
blusa e sutiã e lança-los de lado. Brody inclinou sua cabeça
de novo, atacando meus mamilos enquanto coloquei minha
mão entre nós para desabotoar suas calças. Depois que
baixei seu zíper, a terra debaixo de nós tremeu e um
bombardeio de xingamentos encheu a noite.

— Maldito seja! — Brody me colocou de pé,


agarrando nossas roupas do chão e nos escondeu mais
profundamente nas grossas árvores. Cobriu-me enquanto me
apressava para colocar meu sutiã e me vestir de novo, meu
coração e as partes baixas pulsavam tão forte que pinicava.

87
Uma horda de estudantes passou bem em frente a
nós quando terminamos de nos vestir, seus copos de plástico
derramando cerveja enquanto brindavam.

Meus ombros caíram.

— Uma festa ilegal?

— Sim, é o que parece. Malditos novatos.

Não pude esconder a risada e ele tampouco.


Tínhamos passado nosso primeiro ano juntos fugindo das
festas ilegais, agarrou minha mão na sua e me ajudou a subir
pela colina.

— Vamos antes que nos prendam acidentalmente por


beber sem ter idade. — Cruzamos o caminho em silêncio e
paramos na estrada que levava de volta ao Heights. Mais
meninos do primeiro ano passaram do nosso lado até que
viramos à esquerda e chegamos à porta de minha casa.

Inclinei minha cabeça para dizer adeus ao Brody,


apenas para que ele me levantasse e colocasse seus lábios
contra os meus. Para um beijo breve, teve o impacto
suficiente para queimar e derreter até a ponta dos meus pés.
Baixou-me com lentidão contra seu corpo, seu olhar fixo no
meu.

Quase me estiquei para beijá-lo de novo, mas de


alguma forma me contive, e me apoiei contra a porta. Ele

88
sorriu da maneira que eu tanto adorava. Amava-o. Realmente
o amava. Não era justo que não pudéssemos ficar juntos.

Suspirou, me olhando longamente.

— Adeus, linda.

Deixei sair uma respiração trêmula, tentando não


chorar de novo.

— Adeus, Brody.

— Estou feliz que tenhamos voltado.

O quê, o quê, o quê?

— Nós não... — Amaldiçoei com um palavrão e


apontei em direção ao bosque. — O que foi toda aquela
conversa sobre esta ser a nossa última vez juntos?

Inclinou sua cabeça como se estivesse confuso.

— OH, está falando sobre o que disse lá atrás. —


Elevou um polegar. — Lá no caminho?

— Sim, Brody.

— OH, baby, aquilo foi uma completa mentira. De


jeito nenhum vou deixar você ir, especialmente agora que eu
sei o quanto me deseja. Vemos-nos amanhã.

Ele piscou e se afastou enquanto permaneci


congelada de queixo caído.

89
CAPÍTULO 5
Os veteranos se mudaram no dia seguinte. Eu me
reuni com dezoito garotas que estariam sob minha supervisão
e expliquei minhas regras: não façam nenhuma merda e não
se meterá em nenhum problema. Depois fui até a casa da
Alice para ajudá-la com seu grupo de doze.

Uma das garotas mais duronas da Filadélfia estava


sentada na frente e franziu o cenho quando me viu.

— Por que ela está aqui?

Ela perguntou para Alice, mas eu respondi,


reconhecendo sua provocação pelo que era.

— Porque somos vizinhas, amigas e os supervisores


se apoiam. — Sorri. — Algo mais que esteja morrendo para
saber?

— Não.

— Bom. Alice, pronta para começar?

Alice tirou seu livro de regras e folheou as seções


cuidadosamente marcadas e ressaltadas. Maldita seja. Deve
ter ficado acordada toda a noite para se preparar.

Limpou a garganta.

90
— Temos muito do que falar, então por favor fiquem
confortáveis. — Uma vez mais limpou a garganta e nem
sequer começou a ler. — Está bem, vamos começar com
nossa política de reciclagem.

— Você está brincando— Exclamou alguém na frente.


Alice parecia confusa.

— Não, a Saint Jude tem contêineres separados para


reciclagem e também para resíduos de jardinagem. Mas vocês
não terão que se preocupar com os cortes de grama ou com
as folhas, a menos que sejam obrigadas a fazer serviço
comunitário...

— Serviço comunitário por não reciclar? —


Perguntou uma pessoa. — Isso é uma barbaridade.

Algumas garotas murmuraram em concordância, as


bochechas da Alice se ruborizaram.

— Ah não, não foi isso que eu quis dizer.

Alguém levantou a mão.

— Então não deveríamos reciclar?

Os óculos da Alice escorregaram até a ponta do seu


nariz enquanto lutava para esclarecer as dúvidas.

— Talvez deveríamos rever isso depois que


discutirmos os grafites.

— Você está brincando? — Perguntou a garota Philly.

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Alice franziu o cenho.

— Não, isso é um delito grave.

— Pior do que não reciclar? — Murmurou alguém


mais, provocando algumas risadas.

Jesus. Alice estava se queimado por todos os lados.


Ela me olhou pedindo ajuda, seu rosto tão rosado quanto sua
camiseta.

— Quer que eu assuma? — Ofereci, ela limpou a


garganta. De novo.

— Lety vai me substituir, minha garganta está me


incomodando.

Philly bufou.

— Claro que sim.

— Qual é o seu problema? — Interroguei, meu tom


agudo silenciando os murmúrios que encheram a sala, e
Philly não respondeu. Toda falante e toda a atitude, mais sem
nenhuma coragem.

Apontei com a mão.

— O quê? Não tem nada a dizer? — Ela apertou seus


lábios, claramente irritada, mas não estúpida o suficiente
para dizer merda de novo. — Bom. Fique assim até que eu
termine. — Recostei-me, apoiando meus braços sobre o
encosto do sofá e examinei a sala. — Aqui está o acordo, se

92
não tiverem vinte e um anos, não bebam na nossa frente,
saiam da escola, há um monte de festas para escolher na
cidade. Não sejam estúpidas. Levem alguns amigos. Façam
um pacto: vão juntas e voltem juntas. Revezem-se para ser o
motorista da noite, vocês são as responsáveis pelos danos
causados à propriedade pública e privada, e são responsáveis
pelas ações de seus convidados. Comecem uma briga, e
terminaremos ela por vocês no escritório do diretor. E pelo
amor de Deus, reciclem. — Fiquei de pé. — Alice e eu
estaremos aqui se precisarem realmente de nós, mas se nos
incomodarem, faremos de suas vidas um inferno. Alguma
pergunta?

Silêncio.

— Bom. — Olhei para a Alice. — Vemos-nos mais


tarde, está bem?

Ela sorriu.

— Obrigado, Lety.

Saí correndo de sua casa e voltei para à minha. Meu


primeiro turno com os Moore começava hoje e eu queria
descansar enquanto pudesse. Brody realmente me deixou
exausta e depois apenas queria dormir. Cada vez que fechava
os olhos, pensava em suas mãos e boca passeando pelo meu
corpo. Mas continuava em conflito sobre o que fazer. Meu
trauma infantil não o assustou, mas tinha um segredo

93
guardado que faria isso. Era minha maior vergonha e algo
que Carlos usava com frequência para me ameaçar.

O que aconteceu nunca me deixou. Era sujo e


entrava em cada parte da minha vida, impedindo-me de
desfrutar plenamente da felicidade, mesmo em meus
melhores momentos com o Brody.

Merda.

Afastei meus pensamentos e me apressei para abrir


minha porta. Quando corri para o meu vestíbulo, parei
abruptamente. Um grande vaso de barro com um enorme
cacto estava apoiado perto da porta, uma pequena nota presa
na lateral. Agarrei-a, sorrindo enquanto lia.

— Sinto muito, fui um idiota. Brody.

Cuidadosamente, levei o vaso de barro para o meu


quarto, colocando perto da grande janela. Em vez de
descansar como precisava, coloquei a minha roupa de
trabalho, agarrei as chaves do carro e saí para encontrar o
homem que me deu de presente o cacto.

Entrei minutos depois no centro esportivo e


estacionei perto do campo de lacrosse. Escalei e sentei sobre
o capô do meu carro verde. De onde observava, tinha uma
bela vista e avistei ele imediatamente.

94
Brody Quaid se movia com uma perfeita
musculatura, força e coordenação. Um gol. Dois gols. Todos
um minuto atrás do outro.

Ele corria através do campo, suas longas e


musculosas pernas movendo-se em uma velocidade
desumana. Droga. Esqueci como era rápido e quanto adorava
vê-lo jogar.

Umas garotas sentadas na grama perto do campo


gritaram quando Brody passou perto delas e levou outra bola
até a rede. Dentro da minha cabeça franzi o cenho para elas,
desejando que o impulso de matá-las não me consumisse.
Não podia culpá-las por desejá-lo. Eu mesma desejava. Isso
não significava que seus gemidos, aplausos e assobios não
me afetassem.

Meu telefone tocou no bolso traseiro do meu


uniforme. Achei que era o Teo de novo antes de ver o rosto da
Sofia na tela. Respondi com rapidez.

— Olá. Está tudo bem?

Fez uma pausa.

— Estou com a mamãe.

Demônios. Era para ela estar com a Evie e o Teo.

— Porquê?

Sofia não respondeu imediatamente.

95
— Ela precisava de mim, Lety. Não posso deixa-la
sozinha.

— Ela não estará sozinha por muito tempo— Adverti.

— Está tudo bem. Papi não está por perto.

Sofia era a única que chamava de "Papi" o Carlos.


Não era um termo que usasse muito, mas quando fazia,
incomodava-me. Minha irmã sempre foi doce, mas muito
inocente em vários sentidos. Ela teve esperança de que Carlos
mudasse, que tratasse sua doença mental e fosse o pai que
ela sempre quis.

Ele falhou de todas as maneiras.

Quando Sofia foi estuprada aos quatorze anos,


Carlos a culpou e a acusou de ser a responsável. O culpado a
feriu, roubou sua virgindade e quebrou seu espírito. Nesse
momento Carlos deveria apoiá-la, ser um verdadeiro pai pelo
menos uma vez em sua patética vida e tudo o que fez foi
terminar de destroçá-la.

Cerrei meus dentes, tentando controlar minha ira.

— Você não deveria estar aí, Sofi.

— Alguém deve cuidar dela, Lety. O passado já


cobrou o suficiente. Mamãe já não pode trabalhar tanto como
estava acostumada a fazer. Está cansada e sofre de terríveis
enxaquecas.

96
Deve ser por causa dos golpes que recebeu na
cabeça, assumi. Levantei o olhar quando o treinador soava o
apito, esperando que Sofia dissesse algo mais. Os jogadores
de lacrosse caíram na grama em posturas perfeitas para fazer
flexões, contando e movendo seus grandes corpos em
uníssono.

— Sofi, por que ligou? — Perguntei quando


permaneceu em silêncio. Ela sussurrou em voz baixa como se
tivesse medo de ser ouvida.

— Mamãe precisa de dinheiro.

Fechei os olhos brevemente. É claro que precisa.

— Lety, odeio ter que lhe pedir isso, mas tem pouca
comida, e como disse, ela não pode trabalhar como estava
acostumada a fazer. — Sua voz implorou quando não
respondi. — Posso ajudar um pouco, mas mamãe é muito
orgulhosa para pedir ao Teo.

— Sofi, ele já paga o aluguel e seu seguro. — Meu


tom foi mais duro do que eu gostaria. Quanto mais a família
poderia pedir ao Teo? — Isso deveria ser o suficiente.

— Não é, ela tem um monte de dívidas, está


passando fome, Lety.

Pensei em quanto ganharia cuidando dos Moore. O


dinheiro compensava o da minha bolsa, e ainda sobraria um

97
pouco. O extra não era muito, apenas uma economia para os
gastos que pudessem surgir.

— Lety?

Esfreguei meus olhos ardentes.

— Diga—lhe que enviarei dinheiro, mas em troca


mamãe tem que ir na terapia e procurar um abrigo para
mulheres maltratadas.

Sofia deixou escapar um suave suspiro.

— Sabe que ela não vai fazer isso. Prefere morrer de


fome do que envergonhar a família.

Envergonhar a família. Sim, Deus nos livre que isso


aconteça. Caminhei na frente do meu carro, pronta para
arrancar o meu cabelo. Só que, por mais que isso me
incomodasse, minha mãe fez todo o possível para manter um
teto sobre nossas cabeças e comida na mesa. Não podia
deixá-la nessa situação.

— Está bem.

— Obrigado, Lety, direi a ela.

Desliguei a chamada sem dizer adeus, a raiva e a


frustração cavando um profundo buraco no meu interior.

— Olá, Lety!

— Tudo bem, Lety? Saudades de você, garota!

98
Alguns dos meus amigos da minha antiga equipe
gritaram comigo em seu caminho para o lago; depois foi a
equipe de animadoras de torcida agitando suas saudações.
Devolvi-as. Como tantas vezes antes, forcei um sorriso,
fingindo que minha vida estava bem, mesmo que não
estivesse.

Entrei no carro e liguei o motor que arrancou com


um ruído surdo. Levantei o olhar para encontrar o de Brody
que me observava com uma garrafa de água em sua mão. A
seu redor, seus companheiros de equipe tomavam suas
bebidas e as duas garotas que estiveram torcendo por ele,
tentando atrair sua atenção.

Brody as ignorou, mantendo seu olhar fixo em mim


até que saí do estacionamento.

99
CAPÍTULO 6
Tommy se atirou em meus braços, quase caindo
quando tentou pular.

— Bom trabalho, amigo. Você está aprendendo. O


que acha de irmos ver seu papai e lhe mostrarmos isso?

Entrei no quarto do Sr. Moore com a mão do Tommy


agarrada à minha. O canal informativo de negócios Fox News
estava ligado no gigante televisor de tela plana. A atenção do
Sr. Moore permaneceu no computador portátil que ficava
sobre sua bandeja, sussurrando comandos para se deslocar
pela tela através de um microfone. Sorri quando ele levantou
o olhar.

— Olá, senhor. O que acha de um passeio ao ar livre?

Olhou-me confuso. Sorri, não permitindo que me


desanimasse. Se iria cuidar dele, nós estaríamos unidos,
maldição.

— Sabe perfeitamente bem ao que me refiro. — Fiz


um gesto para o Tommy. — O verão não durará para sempre
e logo estaremos presos aqui dentro. Vamos desfrutar do
jardim enquanto ainda podemos.

Sua atenção mudou para seu filho.

100
— Estou com problemas para controlar a minha
temperatura— apontou entre longas respirações.

Aproximei-me e coloquei a parte superior da minha


mão em sua testa. Ele parecia igual a quando medi seus
sinais vitais mais cedo.

— Vamos fazer o seguinte, vou pegar uma manta, e


se não se importar, medirei sua temperatura frequentemente.
Se por ventura ela baixar, usaremos a manta para mantê-lo
aquecido.

Vacilou.

Inclinei-me perto e sussurrei próximo do seu ouvido.

— Não quero ser desrespeitosa, mas seria ótimo para


o Tommy.

Ele piscou várias vezes, parecendo entender que eu


tentava ajudá-lo a se conectar com seu filho e provavelmente
se dando conta de que não tinha o mesmo tempo que a
maioria dos pais davam por garantido.

— Muito bem.

Peguei uma manta do armário do quarto e a dobrei


cuidadosamente detrás de sua cadeira. Logo peguei seu
computador e o coloquei sobre a mesa.

— Uh, uh, uh— Disse quando sua atenção seguiu


com desejo seu computador. — Negócios depois. Luz solar
agora.

101
— Está bem, enfermeira Ratched.

Ri, debaixo de todas as capas de seriedade existia


um senso de humor. Segurei com força a mão do Tommy e
segui o Sr. Moore pelo corredor. Ele esperou pacientemente
enquanto eu abria a pesada porta no topo das escadas,
depois movi sua cadeira de rodas para o elevador
cuidadosamente, fixei o cinto de segurança e apertei o botão
para baixá-lo, depois ajudei o Tommy a descer as escadas.

— Vamos parar na cozinha.

— Para quê? — Perguntou o Sr. Moore entre


respirações. Soltei o cinto de segurança e olhei para ele.

— Para pegarmos um pouco de pão e alimentar esses


tubarões que você chama de peixes.

O Sr. Moore andou ao meu lado até a cozinha, e nos


abastecemos de algumas fatias de pão na despensa. Guardei
em uma bolsa plástica e as entreguei para o Tommy.

— Quer segurar isto para mim, lindo?

Ele assentiu como se eu tivesse lhe pedido fazer um


trabalho muito importante, emocionado por estarmos saindo
de casa.

Abri a porta traseira. O Sr. Moore se moveu em sua


cadeira com cuidado para o terraço, examinando o jardim de
estilo inglês que parecia uma réplica do pátio traseiro do
Henrique IV. Mesmo da porta podia sentir que a temperatura

102
estava uns vinte e sete graus. Perguntei-me como estaria o
treino do Brody com este calor e esperava que ele estivesse
bem.

Meus pensamentos rapidamente se voltaram para o


Tommy, que saltava impacientemente ao meu lado. Como
raramente o Sr. Moore saía de casa, não tive pressa e me
estiquei, esperando que ele se movesse.

— Fizeram um bom trabalho com o jardim—


Murmurou.

— Fizeram. — Esfreguei suas costas. — O que acha


de nos aproximarmos? — Entrecerrou seus olhos azuis para
mim e sorriu.

— Você não é muito sutil, não é verdade, senhorita?

Sorri.

— É tão óbvio?

Ele voltou a sorrir. Sem qualquer aviso, acelerou


para descer a rampa. Apressei-me para acompanhar, com o
cuidado de não correr tão rápido para que Tommy pudesse
cair, mas o encorajando a trabalhar suas pequenas pernas e
a desenvolver sua coordenação.

Por um breve momento, fiquei preocupada em


perder o Tommy entre as árvores cuidadosamente podadas e
temi que teria de me arrastar para buscá-lo através dos
espinhos das roseiras. Graças ao bom coração do pequeno

103
menino, ele ficou perto de mim, arrastando-me ao seu lado e
apontando as flores com entusiasmo, como se visse suas
cores de amarelo, laranja, lavanda e rosa pela primeira vez.

O Sr. Moore estava certo, os paisagistas que


cuidavam do jardim fizeram um excelente trabalho. Pararam
quando passamos, oferecendo sorrisos respeitosos e
inclinando suas cabeças em reconhecimentos antes de voltar
rapidamente a seus trabalhos.

Segui o Sr. Moore enquanto se movia pelos atalhos


sinuosos através do jardim.

— Há um pátio nos fundos grande o suficiente para


que o Tommy corra?

Ele diminuiu a velocidade até parar para falar


comigo.

— Sim, porquê?

Ri quando o Tommy me agarrou com mais força.

— Seu menino tem uma grande quantidade de


energia e seu pessoal está ocupado. Vamos para onde ele
possa queimar um pouco dessa força.

— Muito bem. — O Sr. Moore passou voando adiante,


e em pouco tempo saímos do jardim e entramos em um
grande espaço onde instalaram uma linda área de jogos. Os
tobogãs coloridos, pontes, balanços e uma mini parede de

104
rochas estavam limpos, seminovos, quase não foram usados.
Tommy me surpreendeu afastando-se lentamente.

— Ele não gosta do playground— Disse o Sr. Moore


quando tentei convencê-lo.

Deixei que Tommy me guiasse de volta para a


passarela.

— Acha que está com medo de cair?

A tristeza se mostrou na voz do Sr. Moore entre


respirações.

— Sim. Já passou por muita dor. Eu queria fazer


algo lindo para ele com a construção desse lugar. — Esperou.
— Parece que não tive êxito.

Eu me virei em direção ao Tommy.

— Então teremos que pensar em algo mais aqui fora,


não é mesmo rapazinho?

Não sabia muito sobre o acidente que causou a


paralisia do Sr. Moore e o trauma cerebral do Tommy. Pela
forma como o Dr. Frenen havia me confidenciado, parecia um
assunto não discutido na casa. Saber que era o Sr. Moore
quem dirigia quando o carro perdeu o controle partia meu
coração. Não podia imaginar a magnitude de sua culpa. Mas
percebi rastros quando observava Tommy lutar.

Continuamos em frente ao longo do caminho que


corria paralelo ao bosque. A propriedade era enorme e me

105
lembrou a Saint Jude, mas essa era uma das melhores áreas,
ainda havia um monte de terra de sobra.

— Let—tee.

Tommy mostrou uma joaninha subindo pelo


caminho. Agachei-me junto a ele e sorri.

— É tarde na temporada para este pequenino estar


aqui fora, não é, bonito?

Os grandes olhos do Tommy piscaram para mim,


devolvendo meu sorriso apesar de que provavelmente não ter
entendido minhas palavras. Deixei a joaninha subir sobre
meus dedos, depois virei minha mão para que a pequena
criatura pudesse passar de minha mão para a dele. Tommy a
observou cuidadosamente enquanto movia ao longo de sua
mão para a ponta de seu dedo médio.

— Vá mostrar a seu papai seu pequeno novo amigo.

Tommy ficou de pé cuidadosamente com a intenção


de não assustar o pequeno inseto, caminhou para o Sr.
Moore com um enorme sorriso em seu rosto e estendeu seu
dedo médio, mostrando completamente o dedo ao seu pai.
Coloquei minha mão sobre a boca, lutando para não deixar
escapar uma gargalhada completa.

O alarme frenético e a intermitente luz do respirador


interromperam minha risada e me fizeram correr para o Sr.
Moore. Seus traços— Querido Deus— o homem se contorcia

106
de dor e o tom de sua pele mudou de vermelho para um
arroxeado profundo. Ele não conseguia respirar... o
respirador estava falhando e impedindo-o de respirar!

Estávamos a uma curta caminhada de cinco


minutos da casa e da equipe de emergência. Dei a volta no
sistema de alerta, pronta para ativá-lo com meu punho e
arrastá-lo de volta para a casa quando o Sr. Moore falou.

— Estou bem, Lety— Disse entre os engasgos.

— É óbvio que não!

Ele fez um estranho ruído estrangulado, seu rosto


mudando de cor de novo. Congelei a meio caminho de pegar
as vasilhas plásticas que continham a bolsa de oxigeno
manual, o Sr. Moore não estava morrendo. Estava... rindo.

Amaldiçoei. Não com um ou dois palavrões. Mas


bem como uma prostituta esculachando um marinheiro
bêbado enquanto fumava crack e assistia pornô
simultaneamente.

Felizmente, em vez de me despedir no ato, o Sr.


Moore apenas riu com mais força.

O alarme se desconectou abruptamente e o assobio


da máquina voltou a seu ritmo normal. Ele continuou rindo
entre dentes.

— Tem mais algumas outras palavras rudes ou


gestos que queira ensinar ao meu filho enquanto ainda

107
estamos aqui? — Perguntou através de profundas inalações.
— Ou está economizando seu mais criativo e delicioso
repertório para depois do jantar?

O calor subiu entre meus peitos e debaixo dos meus


braços. Puta merda. Acredite ter matado o meu chefe no
primeiro dia de trabalho. Mas não foi isso o que lhe disse.
Tossi com nervosismo.

— Não, senhor. Acredito que esgotei todo o meu


repertório.

— Bom. — Sorriu. — É bom saber que você se


preocupa.

— Com você?

A pergunta ficou sem resposta e isso me entristeceu,


tentei sorrir, mas parecia forçado e o Sr. Moore merecia algo
melhor. Então em vez disso apertei seu ombro apesar de
saber que ele não podia sentir o gesto.

— Sabe, eu não pensei que fosse capaz disso.

— O que exatamente?

— Dar uma boa risada.

Os cantos de sua boca se esticaram em um amplo


sorriso.

— Suponho que a máquina também não. Ela teve


que se ajustar para acomodar minha respiração quando o fiz.

108
— Seu humor se dissolveu lentamente, mas ele se esforçou
para manter o sorriso. — Não é algo que eu faça muito agora.

— Rir?

— Sim.

Sorri.

— Você se dá conta de que está me forçando a contar


piadas?

— Conte. — Seus olhos voltaram sua atenção à


máquina. — Agora sei que o respirador pode aguentar.

Ri de novo e ainda mais forte quando Tommy


caminhou até nós com seu dedo médio ainda estendido e a
joaninha instalada na ponta.

— Está se preparando para voar, garotão. Faça um


desejo.

Tommy fechou suas pálpebras justamente quando a


joaninha levantava suas asas. Quando os abriu, ela voou.

— Pergunto-me o que ele desejou— Comentou o Sr.


Moore.

Eu esperava que fosse mais tempo com seu pai. Mas


isso não foi o que disse.

— Provavelmente, um pijama de algodão doce com


botões de balas doces? — O Sr. Moore arqueou uma

109
sobrancelha. — Vamos lá, é isso o que eu teria desejado na
sua idade. E você?

— Um helicóptero blindado. — Cruzei meus braços.


— Está bem, um cachorrinho.

— Foi isso que pensei. — Tommy agarrou meu braço


e apontou para o bosque. — Acho que ele quer explorar. —
Apontei com um movimento de queixo para a cadeira de
rodas de alta tecnologia do Sr. Moore. — Essa coisa tem
tração nas quatro rodas?

O Sr. Moore piscou os olhos e depois voou até a


abertura nas árvores com o Tommy e eu correndo atrás.
Ficou atolado três vezes. Três! E nas três vezes tive que
resgatá-lo e sua pesada cadeira. Mas ele estava se divertindo
e Tommy também.

Sentei o Tommy em seu colo quando voltamos para


a casa. Os músculos faciais do Sr. Moore se esticaram até
que seu pequeno menino envolveu o braço ao redor de seu
pescoço e apontou tudo o que lhe chamava a atenção.

— Pássaro. Esquilo. Flor. Folha. Folha. Folha. Árvore.


— Nada escapava da linha de visão do Tommy.

Ri, se eu tinha alguma reserva sobre trabalhar para


os Moore, foi embora. Não os conhecia absolutamente, mas
podia ver que eram boas pessoas. O que não sabia era que
mesmo eles tinham segredos para manter e pecados para
pagar.

110
CAPÍTULO 7
A irmã Marguerite, nossa bibliotecária da Gestapo,
patrulhava os corredores, seu carrinho cheio até a beirada e
uma grande enciclopédia no topo da pilha. Meus dedos
teclam rapidamente, tentando montar um plano de estudos
com minhas melhores amigas e companheiras da escola de
enfermagem. Tínhamos tido nossa primeira semana de aulas
e os requerimentos já pareciam entristecedores.

Mary Kate, que teve o prazer absoluto de ser minha


companheira de quarto por dois anos, elevou o olhar de sua
análise de programa do curso.

— Que demônios? Temos exame de alcalose e acidose


respiratória na semana que vem? Acho que o diabo está nos
perseguindo.

— A alcalose e acidose metabólicas estão atrás de


nós. — Esclareceu Tonya, ela apontou uma página em seu
texto. — Olha, os valores de laboratório não são os mesmos.

Observei-as do outro lado da mesa, sabendo que


minha notícia apenas as deixaria mais incomodadas.

— Supõe-se que saibamos as diferenças no exame


que vem. Amanda, uma aluna mais avançada, comentou

111
comigo que é o mesmo exame do ano passado, haverá pelo
menos dez perguntas relacionadas a cada uma.

Foi a vez da Tonya dizer um palavrão.

— Dez? Mais isso é um quinto do exame! E eu só


posso diferenciar um do outro.

Remexi em minha bolsa.

— Aqui, talvez isto ajude. Fiz cartões com resumos. É


mais fácil ver a diferença desta forma.

Passei os cartões enquanto Brody se sentava ao meu


lado. Não o via desde o treino de lacrosse, recebi várias
mensagens dele pedindo para me ver, e lhe disse que
precisava de um tempo para pensar. O problema era que
cada pensamento meu se voltava para ele.

Ficou uma semana sem enviar mensagens, sem


telefonar, nem passar para me ver. Isso era tempo demais
para o Brody. Particularmente, quase enlouqueci, sorri
enquanto ele se acomodava em sua cadeira, surpreendendo-
me com o quanto senti saudades.

— Olá, mandão.

As corridas que fez sob o sol forte, clarearam seu


cabelo loiro e bronzearam sua pele, ressaltando ainda mais
seus olhos azuis e os traços perfeitos.

— Olá, Letz. — Cumprimentou e deu um sorriso a


Mary Kate e Tonya. — O que estão fazendo, garotas?

112
— Olá, Brody. — Cantaram juntas, dando-me olhares
conspiratórios.

Mary Kate e Tonya viram como fiquei com o coração


partido depois de terminar com o Brody. Estiveram lá com
abraços, comida confortadora e álcool. Também estiveram lá
para segurar meu cabelo quando bebi demais em uma última
e estúpida tentativa de afogar minhas mágoas. Elas sabiam o
quanto ele significou para mim e como fiquei perdida quando
nos separamos.

Empurrou-me brincando.

— Recebeu minhas flores?

— Você fala do cacto? — Sorri zombando.

— Tecnicamente, elas são um cacto.

— Sim, eu as recebi. — E de novo lá estava seu


sorriso preferido. Parecia que não podia esconder quando
estava ao meu lado

— Então, o que achou?

— Sr. Quaid! — A irmã Marguerite abandonou seu


carrinho e se dirigiu em nossa direção. — Este é um lugar
para ler, estudar e pesquisar, não para socialização. —
Pousou seus olhos entrecerrados em mim. — Se for para
conversar com a senhorita Santos, sugiro que o façam em
sua casa.

Brody piscou para ela inocentemente.

113
— Mas não vou à casa da Lety para conversar, irmã.

Mary Kate e Tonya tamparam a boca com as mãos


para acalmar sua combinação de ofego e risadas e se
esconderam atrás do corredor de história mundial.

Merda. De que lado elas estão? Baixei minha cabeça,


tentando lutar contra o rubor em meu rosto.

A irmã Marguerite franziu seus lábios.

— Você já vai para o inferno, Sr. Quaid, seja amável e


não arraste à senhorita Três Santos para lá com você.

Brody abriu suas mãos.

— Como eu poderia ir para o inferno com você do


meu lado, irmã? O que diz de me ajudar a salvar minha
alma? Talvez rezar um terço em minha intenção... e dizer a
São Pedro coisas boas sobre mim?

Embora tentasse, a irmã não pôde evitar que os


cantos de sua boca se erguessem ligeiramente. Todos
gostavam de Brody, apesar de seu jeito louco.

— Vou te aconselhar várias Ave Marias e talvez


muitas velas, depois de dizer ao padre O'Key que o espere
para confessar-se no sábado.

Fez uma forma de pistola com sua mão e deixou sair


sua língua.

— É uma sugestão, coisa doce.

114
— Rezarei algumas Ave Marias por ele também. —
Ofereci.

Ele realmente teve que lutar para manter seu rosto


neutro. Sim, a irmã Marguerite era uma bibliotecária durona,
mas eu também lhe agradava. Ela assentiu e retornou para
seu carrinho e para suas rondas.

Inclinei para mais perto do Brody e sussurrei:

— Você não é católico.

— Eu sei.

Meus ombros sacudiram quando tentei conter


minha risada.

— Realmente vai se confessar?

— Totalmente, de que outra forma poderia


compartilhar meus pensamentos pecaminosos sobre você?

Cobri meu rosto.

— Deus, Brody.

Deu-me um empurrão de novo.

— Então, não me disse o que achou do meu presente.


— Sua voz se manteve suave, mas disse cada palavra
seriamente.

— Eu amei, obrigado.

— Mesmo?

115
Sorri.

— Sim.

Seus olhos brilharam perigosamente antes dele se


inclinar sobre a mesa e remexer em sua mochila.

— Nesse caso, talvez ame ainda mais isso.

Ele deixou cair um ramo de flores rosas e laranjas


em meu colo. Minha boca se abriu e ofeguei enquanto as
segurava contra mim. Brody acariciou minha bochecha.

— Já jantou?

Meus olhos se afastaram do lindo arranjo de flores


para olhar, enquanto cuspia as palavras.

— Ah, n—não.

— Jantaria comigo?

Sabia pela forma como agarrou meu rosto que não


falava apenas sobre o jantar, estava pedindo que "nos" desse
uma chance. Pensei no tempo em que ficamos afastados e
como cada um dos meus pensamentos se voltava para ele
desde o dia em que me afastei. Brody se esforçava tanto,
apesar de saber o que aconteceu e os riscos que corria ao
ficar comigo.

Eu devia lhe dar uma chance... talvez devesse isso a


mim também.

116
Coloquei uma mecha de seu cabelo atrás da orelha e
deixei que meu dedo arranhasse seu pescoço, mantendo o
olhar travado no dele.

— Eu adoraria.

Brody inclinou um pouco para trás, dando conta de


que eu disse o "sim" pelo qual tinha brigado tanto.

— Está bom às nove?

Ele aproximou-se de novo quando concordei e então


beijou minha bochecha, enviando doces sensações por todo
meu corpo.

— Vejo você em breve, linda. — Sussurrou.

Observei-o atravessar o segundo andar e


desaparecer pelas amplas escadas de madeira... também
fizeram o mesmo Mary Kate e Tonya, que espiavam de uma
prateleira de livros mais distante, e o mesmo fazia a irmã
Marguerite. Elas me olharam e levantaram suas
sobrancelhas. Pensavam que eu estava em sérios problemas.

Sorri, sabendo que tinham razão.

O jantar se tornou algo mais na volta para o


campus. Brody virou bruscamente seu Porsche 911 pelo
caminho atrás dos campos de milho que rodeavam o campus.
Agarrei a barra da minha saia curta. Fiz um esforço extra
para ficar linda para ele e usei um vestido vermelho com
estampas de flores e um belo par de botas.

117
— O que é isto? — Perguntei quando desligou o
motor.

— Uma aula de astronomia. — Apertou um botão no


painel de controle do conversível.

O capô se recolheu para trás lentamente, revelando


os milhões de estrelas no espaçoso céu de setembro.

— Astronomia, é?

— É claro.

Levantei meu queixo para enfrentá—lo.

— Então decidiu mudar de carreira? Engenharia não


era bom o suficientemente para você, espertalhão?

— OH droga, não. Astronomia é onde estão as gatas.


— Ri.

— Tem certeza?

— Eu te trouxe aqui, não é verdade?

— Trouxe. — Recostei e me acomodei no banco. —


Tudo bem. Estou esperando que me impressione com suas
loucas habilidades.

Ele apontou direto sobre mim.

— Essa é a estrela do Norte.

Enruguei meu nariz, tentando ver o que indicava.

118
— Aquela solitária bem ali?

— Sim.

— Tem certeza? Está piscando.

— As estrelas piscam.

— Não, elas brilham... como diz a canção. Acho que é


um satélite. — Ele contemplou—a por um momento.

— Está bem, talvez seja, mas quem se importa? —


Abaixou o encosto do seu assento para trás o máximo que
pôde e se recostou até a metade, depois diminuiu o pequeno
espaço que nos separava. — Este foi o primeiro lugar em que
te beijei, lembra?

— Eu lembro. — Sorri. — O que me leva a perguntar,


se gostava tanto de mim, porque levou tanto tempo para fazer
um movimento? Apaixonei-me por você desde o primeiro dia
em que falamos.

Suas mãos acariciaram meu braço.

— Estava convencido de que você não estava


interessada. Cada vez que te convidava para sair, sempre
estava ocupada.

— Isso é porque cada vez que me convidava, eu


estava!

— E cada vez que íamos a uma festa, sempre


dançava com todos os caras, exceto comigo.

119
Apontei para ele.

— Eles me convidavam, você não o fazia. — Seu


sorriso aumentou.

— E cada vez que uma garota se aproximava de mim,


você fugia.

— Um. Não.

— Um. Sim. — Seu olhar estava cheio de pesar.

— Essas garotas não se aproximavam para conversar


com você, Brody, elas queriam mais.

— Nah, você está imaginando coisas.

— Peige Migalowski acariciou sua bunda bem na


minha frente.

Seus ombros tremiam, enquanto pateticamente


tentava esconder a sua diversão.

— Acho que foi um acidente.

— Não foi, ela se empurrou entre nós e droga, e te


apalpou. Bom Deus, eu quase a soquei!

— Ela estava apenas dizendo olá.

— A quem? Sua nádega esquerda?

Brody jogou sua cabeça para trás, rindo. Fiquei feliz


que ele achasse que era engraçado, já que estava ocupada
soltando fumaças, lembrando-me da Peige e suas mãos

120
bobas. Meus braços cruzaram sobre meus peitos e olhei para
o painel de comando.

— Não ficava próximo, porque não queria ver essas


garotas se jogarem sobre você.

— E eu estava muito ocupado olhando você se


afastar para desfrutar da atenção delas. — Minha cabeça
virou em sua direção.

— Estava? — Ele assentiu e a sinceridade em seu


leve sorriso me derreteu. — Sabe, depois de tantas vezes que
ficamos conversando, por que Sean Erikson teve que tentar
me beijar para que me dissesse como se sentia?

Apertou a ponta do seu nariz.

— Sim, lamento por isso, mas de jeito nenhum eu o


deixaria te beijar na minha frente.

Meu peito tremeu, desta vez quem riu fui eu.

— OH, meu Deus, pensei que fosse matar o pobre


menino, e tudo o que eu podia fazer era sorrir como uma
idiota porque me dei conta que você gostava de mim.

— Não se deu conta quando aquele estudante do


último ano te segurou em nossa primeira festa fora do
campus? Viu o quão irritado eu fiquei por colocar as mãos
sobre você.

Aquele perdedor não havia apenas me segurado,


apertou meu peito enquanto caminhávamos através da

121
multidão. Brody o golpeou por isso, sem se preocupar quem
era, com quem estava ou que fosse alguns anos mais velho.

Deixei cair a cabeça contra o respaldo do assento.

— Nós tínhamos nos conhecidos recentemente,


pensei que estava sendo meu amigo.

— Quero ser mais do que seu amigo Lety. —


Embalou minha bochecha e se aproximou lentamente. —
Venha aqui.

Não tenho certeza de quem se inclinou para frente


primeiro, mas quando nosso beijo começou, já não importava
mais. Nossas bocas buscaram uma a outra, o contato
atraindo Brody para desabotoar meu minivestido. Um botão.
Dois botões. Três. Desabotoou até minha cintura, expondo o
sutiã de encaixe vermelho segurando meus peitos.

Meus dedos arranharam seu cabelo enquanto me


beijava, descendo por meu pescoço e mordiscava o feixe no
centro de cada taça. Gemi levemente quando continuou
avançando, permitindo que retirasse as mangas do vestido de
meus braços para que apenas o sutiã cobrisse meu peito.

Seus dentes e lábios passaram por meu pescoço, ele


desabotoou facilmente e com impaciência o sutiã, deixando
cair e me despindo para si. Acariciou meus peitos, sentindo
seu peso e beliscando-os.

122
— Senti tanta falta de você. — Sussurrou contra meu
ouvido quando gemi.

Minhas mãos desceram por seu estômago e ainda


mais, até a crescente tensão pressionando contra seu zíper.
Sim, também, senti saudades de você baby.

Desabotoei seus jeans, liberando sua ereção que


encheu minhas mãos, o que o fez grunhir quando esfreguei
para cima e para baixo. O calor de sua boca e suas suaves
mordidas em meus mamilos se tornaram mais agressivas.
Mas diferente de nosso relacionamento de antes, não era
assim que queria ficar com ele.

Levantando seu quadril, minhas mãos agarraram a


cintura da calça, permitindo baixar junto com sua boxer até
seus joelhos, ele tinha apenas se sentado quando o tomei em
minha boca, a surpresa e o contato fizeram sacudir-se.
Nunca fiz isto antes, mas seu sabor e sua resposta a minha
língua me incentivaram a lhe mostrar o que aprendi.

Comecei com a ponta, movendo, saboreando e


lambendo com puxões de meus lábios apertados firmemente.
Cada passada ia mais profundo, e a sensação dele em minha
boca ia deixando-me cada vez mais louca e mais atrevida.

— Jesus Lety. — Ofegou. — Porra. — Amaldiçoou.

Brody agarrou minha nuca e segurou meu cabelo,


respirando duro e inclinando sua coluna. Seus gemidos e
palavrões contribuíram para formar mais umidade entre

123
minhas pernas. Girei meus quadris, incapaz de acalmar a dor
que acompanhava minha excitação.

Provavelmente, era a deixa que Brody precisava para


agir.

Agarrou minha pequena saia para subi-la sobre


minhas costas e baixou minha calcinha. Continuei dobrada
sobre ele, trabalhando com frenesi até que penetrou dois
dedos dentro de mim. Gemi profundamente enquanto seus
dedos se aprofundaram e giravam, esticando-me e
procurando o movimento certo para me fazer gritar. A
vibração em minha garganta o deixou perto de gozar,
aumentando seus movimentos e fazendo com que sua palma
golpeasse contra minha pele.

Um letárgico prazer me envolveu, liberando uma


abundância de lágrimas por meu rosto. Ele foi o último a me
tocar dessa maneira, mas se lembrava do meu corpo e sabia
onde encontrar o lugar perfeito. Liberei-o de minha boca, mas
não de minha mão, estendendo meu corpo sobre o seu
enquanto sua velocidade e a minha aumentavam. Amaldiçoei
e ofeguei uma e outra vez, a fricção me fazendo paralisar.

Calor em espirais desceram por minhas pernas,


queimando em uma fome aguda e me fazendo gritar. Estava
vagamente consciente de sua liberação, muito ocupada
agarrando a maçaneta da porta para me segurar através das
ondas de êxtase que me consumiam.

124
Não sabia dizer quantas vezes cheguei ao orgasmo,
um seguido do outro. Quando finalmente as coisas se
acalmaram, desabei contra ele que tirou seus dedos para me
abraçar.

Levou um longo momento para poder me mover.


Quando o fiz, paralisei no assento do passageiro. Brody
olhava fixamente para o céu, seu peito subindo e descendo
pelo esforço. Retirei o cabelo de meu rosto. Apesar do ar
fresco da noite, a transpiração se reunia ao longo da minha
nuca. Vesti-me lentamente, esperando que dissesse algo.

Quando sua respiração finalmente se acalmou,


subiu suas calças e voltou a atenção para mim, sua
expressão indecifrável.

— Está tudo bem? — Perguntei em voz baixa.

— Não.

Merda, será que o machuquei?

— Não está?

Ele me agarrou dando um beijo profundo. Quando


se afastou, seu olhar perfurou o meu.

— Isso foi incrível.

Baixei minhas pálpebras, aliviada porque Brody


desfrutou do que fiz, mas sobretudo feliz por estarmos juntos.
Era o certo. Precisava estar com ele.

125
Brody beijou ao longo do meu queixo na pequena
marca detrás de minha orelha.

— Letz... tenho algumas camisinhas em casa, se


quiser podemos ir para lá e passar a noite.

Sua voz morreu quando captou o nervosismo


tocando como uma sinfonia contra meu rosto ruborizado.
Sorriu levemente antes de acariciar meus lábios com os seus.

— Quer levar as coisas com calma, não é?

Meus dedos se estenderam ao longo de seu peito


esculpido.

— Não estou tentando ser uma barra-sexo, mas as


coisas estão movendo-se um pouco rápido demais para mim.
Ficamos juntos um ano e o máximo que fazíamos era dizer
"olá" e agora... Sinto muito, Brody. O sexo é um grande passo
para mim. Não deveria ser, mas é.

Tentei dizer mais alguma coisa, mas ele me silenciou


apertando-me contra si.

— Ahhh, não se preocupe, foi um movimento imbecil


perguntar isso para você, especialmente, porque nunca
fizemos isso antes.

— Sinto muito. — Disse de novo.

— Não sinta. — Beijou a ponta do meu nariz. — Leve


o seu tempo. Se precisa de alguns dias, terá alguns dias.

126
— Obrigada. — Murmurei. — Só não pense que não
me importo com você, porque eu faço, você é tudo para mim
Brody.

Sua mão se moveu sobre meu ventre até segurar


meu quadril.

— Você é tudo para mim também. Nunca deveria ter


deixado você ir.

Baixei a cabeça contra seu peito e o abracei com


força. Queria dizer " Eu te amo", mas não o fiz. O amor te
torna vulnerável à dor. Se minha mãe havia me ensinado
algo, foi isso.

127
CAPÍTULO 8
Considerando que Brody e eu moramos a poucos
passos de distância um do outro, mal nos víamos. Entre as
nossas aulas, especializações e os turnos de RA, o nosso
tempo a sós era limitado. Mas quando estávamos sozinhos,
fazíamos valer a pena.

Esta noite deveria ser uma daquelas noites. Brody


tinha treino de lacrosse e algumas coisas para cuidar, mas
planejava vir para minha casa por volta das onze e passar a
noite.

Esfreguei meus olhos cansados. No fim de semana


passado, esteve fora em um pré-temporada no Pitt. Quando
voltou, cerca de uma hora da manhã, meteu-se na minha
cama. Não dormimos muito, preferindo aproveitar nosso
tempo a sós. Eu já tinha assistido as minhas aulas da manhã
e agora estava com os Moore, tentando manter todos seguros.

Cada vez que Tommy tirava uma soneca, eu me


sentava com o Sr. Moore em seu quarto, trabalhando em
meus deveres escolares, enquanto ele utilizava seus
dispositivos de alta tecnologia para viajar através de seu
laptop. Talvez fosse pelos muros altos e pelas propriedades

128
vizinhas, mas assim como no Saint Jude, sua casa era um
refúgio para o meu passado e meu drama familiar.

Saí correndo na frente do Sr. Moore quando


voltamos de nossa caminhada. A brisa do início de outubro
levantava as folhas secas, fazendo-as girar ao nosso redor. Os
dias estavam se tornando mais frios e curtos. Este era,
provavelmente, o último dia que seríamos capazes de
desfrutar do ar livre até a primavera.

Agarrei a toalha velha que deixei no corrimão.

— Aqui, senhor, vou limpar sua cadeira antes que


deixemos um rastro de lama por toda a casa. — Ele freou
gradualmente para que eu pudesse limpar sua cadeira. As
rodas estavam cobertas com uma grossa capa de sujeira. —
Uau, tivemos uma boa aventura não é verdade?

Sorriu.

— Foi um dia especialmente agradável. Poderíamos


repetir amanhã?

— Não tenho certeza de que o clima ainda estará


firme assim. Estão prevendo chuva.

Parecia decepcionado, assim como o Tommy que


permanecia sentado em seu colo. Tommy sempre corria atrás
de seu pai, mas aprendeu a subir em seu colo para a viagem
de volta, dei uma piscada e terminei de limpar a cadeira. Ao

129
finalizar, dobrei a toalha suja e abri a porta de trás para que
pudessem entrar.

Encontramos Dionna tomando uma xícara de chá na


grande cozinha de estilo inglês. Passou mais de uma semana
desde que a vi pela última vez. O Dr. Frenen se referiu a ela
como a "senhora da casa", embora eu rapidamente tenha
descoberto que não restava muito da relação entre ela e o Sr.
Moore.

Seu quarto ficava no extremo oposto do segundo


andar, longe do Sr. Moore e do Tommy. Ela sempre fazia
notar sua presença, mas geralmente saia pouco depois da
minha chegada e retornava perto do final do meu turno. Era
sempre a mesma coisa: sorriso brilhante, conversa amistosa e
a relação constrangedora com seu marido e filho.

Ela ficou de pé, sacudiu as calças cinza e sua blusa


roxo escuro, embora eu não tivesse visto nenhuma migalha.
Seu traje mantinha as partes mais importantes cobertas, mas
o estilo e a forma em que as malhas se ajustavam as suas
curvas aumentavam seu já enorme atrativo sexual. Dionna se
vestia para chamar a atenção, parecia precisar de atenção,
porém não a recebia de seu marido e eu não sabia o motivo.

Pensei no grande corpo do Brody, tonificado e


dotado de vigor, adorava vê-lo no campo de lacrosse como se
fosse o dono. Que Deus o livre de perder o uso de suas
pernas ou de qualquer outra coisa... seria devastador para
ambos. Mas ainda assim eu o amaria, apesar da perda e de

130
tudo o que lhe fizesse. Essa não era a mesma sensação que
percebia em Dionna.

Ela sorriu quando nos viu, esperando pacientemente


até que cruzássemos a soleira antes de se aproximar.

— Aí estão meus meninos.

Ela beijou o Sr. Moore na testa como uma saudação,


deixando seus lábios por alguns instantes. O Sr. Moore
baixou os olhos, apreciando o contato e aparentemente dando
boas-vindas ao seu afeto, mas à medida que ela se endireitou,
a decepção nublou seus olhos.

Depois se estendeu para o Tommy, com o mesmo


entusiasmo forçado.

— Vamos, bebê, o papai precisa descansar.

— Deixe-o ficar— Disse o Sr. Moore devagar.

— Edward, ele é muito pesado para você querido. —


Virou-se para mim. — Sei que tem boas intenções, Lety, mas
não quero que o corpo do Sr. Moore fique mais debilitado do
que já está.

Levantei as sobrancelhas. Normalmente, Dionna não


questionava meus cuidados e achei estranho seu desejo de
afastar o Tommy do seu marido. Não pude evitar a sensação
de que ela estava competindo pelo controle.

Como sempre, Tommy fugiu da sua mãe.

131
— Vamos, meu menino precioso, papai está cansado.

Tommy soltou lentamente a mão do pescoço do pai,


mas em vez de permitir que Dionna o pegasse, apoiou o rosto
no peito dele. O gesto amoroso fez com que meus olhos
ardessem. Tommy queria ficar com seu pai.

Dionna pareceu não perceber.

— Vamos, meu menino doce, por favor— Insistiu.

O Sr. Moore ficou olhando atentamente para a


frente, seu tom suave, mas decidido.

— Eu já disse, deixe-o ficar.

Ela se endireitou juntando as mãos, seus olhos


surpresos.

— Edward...

Rapidamente, agarrei a toalha suja e levei para a


lavanderia onde lavei minhas mãos, apressando-me para
terminar de preparar o jantar, arranjando algo para fazer em
vez de me sentir um voyeur.

A convivência na casa era dilaceradora, não havia


abuso, pelo menos que eu tivesse visto ou sentido, mas a
tristeza e a culpa? Merda. Era absolutamente insuportável
quando Dionna estava presente.

Verifiquei os peitos de frango na panela elétrica. Um


cozinheiro local que preparava os alimentos para as pessoas

132
com problemas de ingestão mantinha o congelador dos Moore
cheio com comida: proteína picada, verduras, tudo em forma
de purê com uma base de batata. Para falar a verdade, a
apresentação parecia desagradável e não cheirava muito
melhor do que parecia. Servi ao Sr. Moore e ao Tommy duas
dessas refeições, até ter o suficiente e começar a fazer sua
comida eu mesma. Depois de provar minha comida, o Sr.
Moore e Tommy concordaram com a decisão que tomei e
frequentemente pediam mais. Ambos ganharam peso e o
rosto do Sr. Moore parecia mais saudável e robusto.

Ela se afastou lentamente do seu marido quando


nenhum dos dois disse mais nada, sentou na ponta mais alta
do balcão e observou meus movimentos ao redor da cozinha.
Com exceção das noites que em que eu ficava, as segundas-
feiras eram minhas jornadas mais longas com os Moore,
assim que terminava minhas aulas à tarde, corria para cá e
trabalhava até as dez, depois voltava para a escola para
estudar e me preparar para as aulas. Para mim era o dia
mais comprido da semana. Mas hoje, com a tensão enchendo
a grande cozinha, o tempo se arrastava em minúsculos
passos.

As batatas que coloquei para cozinhar no vapor


estavam prontas. Levantei a tampa, parando para olhar para
onde Dionna estava sentada em silêncio.

— Quer me ajudar com o jantar?

Ela apontou para si mesma.

133
— Eu?

— Não precisa fazer se não quiser. — Ela suspirou,


agradecida.

— Eu quero, é só que nunca aprendi a cozinhar.

— Pode desfiar o frango?

— Ah, talvez?

Deixei as batatas na agua para esfriarem.

— Que tal se você fizer o purê e eu me encarrego do


frango?

Dionna sorriu.

— Acho que posso fazer isso.

Eu lhe passei o amassador e expliquei o que fazer.


Dionna parecia emocionada por ser útil, acrescentando a
manteiga e o leite às batatas e conversando com entusiasmo
sobre como sempre quis aprender a preparar comidas
caseiras para sua família.

Os esforços de Dionna não eram fáceis para ela e


algo em seu entusiasmo parecia exagerado. Se não fosse
consciente da tristeza que o afastamento do Tommy e do Sr.
Moore lhe causavam, eu a teria rotulado de falsa e não me
importaria com o fato deles a ignorarem. Mas estava claro
que Dionna se importava. Apesar de suas torpes interações,
amava a sua família. Também a admirava por continuar

134
tentando. É algo que minha mãe nunca fez. Ela sempre
acreditou que nos proporcionar um teto e comida era o
suficiente. Não era. Sofia, Teo e eu precisávamos do seu
amor, também do amparo desse imbecil que chamávamos de
pai.

Dionna me deu uma cotovelada leve, apontou para o


lugar onde estavam Tommy e o Sr. Moore. Os dois dormiam
profundamente, a cabeça do Tommy estava escondida no
peito de seu pai.

— Eles parecem doces juntos— Disse e baixou o


queixo.

— Sim. Devem estar esgotados pelo dia.

Não tinha certeza se ela quis dizer isso como uma


crítica contra mim. Antes que pudesse lhe perguntar, Dionna
limpou a garganta.

— O que faço em seguida, Lety? Gostaria de terminar


este fabuloso banquete.

— Ah, está bem.

Apontei para o prato de cenouras no vapor.

— Pode amassá—las se quiser.

Levantou o amassador de batatas, gotejando seu


conteúdo.

— Com isto?

135
Ri, ela usou leite demais.

— Não, basta colocar um pouco em cada prato e usar


um garfo para amassar. Já quase terminei com o frango.

Ela remexeu através da gaveta atrás de um garfo e


rapidamente fez o que pedi.

— Fico feliz em saber que cozinhar é uma de suas


muitas habilidades, Lety. Tivemos uma chef durante vários
anos, mas apesar de Roxana ser ótima, não tinha muito
trabalho. Edward e Tommy comem muito pouco e eu
geralmente peço comida fora ou janto com alguns
conhecidos.

Dionna parecia ter um monte de "conhecidos",


embora nenhum deles jamais se aproximasse da casa para
visitá-la ou a sua família. Desde que comecei a trabalhar lá, o
Sr. Moore não recebeu nenhuma visita com exceção do Dr.
Frenen. O mesmo acontecia com Tommy, deu-se conta de que
ele também não tinha amigos.

Tentou não pensar no que Dionna fazia fora da casa,


mas às vezes não conseguia evitar. Nenhum dos seus
pensamentos inquietantes a faziam parecer mais respeitável.
Sabia que ela se sentia sozinha. Mesmo assim, não podia
aprovar indiscrições que poderiam ferir o Sr. Moore ou
Tommy. Continuou conversando animadamente sem se dar
conta das minhas suspeitas.

136
— Posso usar o micro-ondas e um fazer um
sanduiche, mas não muito mais que isso.

Seu tom de voz me fez pensar que havia mais coisas


em sua declaração. Fiz um gesto para o Sr. Moore e Tommy.

— Parece que você terá que esquentar isto mais


tarde.

ela levantou a cabeça tirando a atenção das


cenouras amassadas.

— OH, talvez, seja melhor acordá—los. Tenho planos


para esta noite.

O Sr. Moore abriu os olhos, não tinha certeza se


escutou Dionna, mesmo assim ela respondeu como se a
tivesse ouvido.

— Mas posso mudá-los facilmente. — Ela riu com


absolutamente nenhum indício de humor. — Nada é mais
importante para mim do que minha família.

Tive que me controlar para não reagir ou lhe dar as


costas. Concluí que as pessoas ricas eram simplesmente
insanas. Levei o prato de comida ao Sr. Moore.

— Está com fome, senhor?

Ele piscou várias vezes.

— Acho que sim, o cheiro está bom o suficiente para


me acordar.

137
Tinha esperança de que estivesse sendo honesto e
não tivesse escutado a resposta absurda da Dionna.

— Quer que eu carregue o Tommy para cima?

Tommy se agitou e esfregou os olhos, levantando os


braços para mim quando me viu. Coloquei o prato sobre a
mesa e o peguei em meus braços.

— Bom, suponho que isto responde a minha


pergunta. Quer jantar grandão? — Sentei-o junto ao Sr.
Moore ele quando assentiu. — Quer dar comida para o
Tommy, Dionna?

Ela correu, fazendo um espetáculo para se sentar ao


lado do filho. Coloquei um pano de prato sobre o peito do Sr.
Moore e levantei o prato para lhe dar de comer, sem saber o
que Dionna pensava. Espetei um pouco de frango desfiado
com o garfo.

— Avise-me se a textura está boa ou se as porções


são muito grandes.

O Sr. Moore mastigou lentamente e engoliu.

— Está delicioso, Lety, obrigado.

— De nada. Prove as batatas e me diga se gostaria


delas misturadas com o frango. — Levantei o garfo, parando
quando ouvi passos pesados pelo corredor que levava a
entrada. Gus, o guarda da segurança, não entrava na casa a

138
menos que houvesse um problema e as empregadas tivessem
terminado o dia.

Os passos ficaram mais perto e fortes; a pessoa que


caminhava para nós era grande. Estava quase perguntando
ao Sr. Moore se esperava companhia quando as primeiras
notas assobiadas de "chave and. a hirsuto" ecoaram da sala.

As expressões de Dionna e Tommy se iluminaram.


Tommy aplaudiu calorosamente duas vezes, terminando
assim a melodia antes de correr para a porta com Dionna
atrás dele.

— Querido! — Gritou expressando uma alegria


sincera nunca demonstrada antes.

Brody entrou na cozinha, levando o Tommy alto no


ar antes de abraçá-lo contra seu peito. Tommy agarrou seu
pescoço com força, fazendo o Brody sorrir.

— Olá, tigre, como você está?

Deu uma parada brusca quando me viu, congelando


no seu lugar.

Dei um grito de alegria ao vê-lo sob o suave


resplendor das luzes da cozinha. Meu sorriso desapareceu
quando ele visivelmente empalideceu. Seus traços suaves
endureceram e as sobrancelhas franziram em uma careta
feroz, imobilizando-me no lugar.

139
Brody não estava contente em me ver. Estava furioso
por me encontrar aqui.

Dionna não se deu conta e agarrou seu rosto,


ficando nas pontas dos pés para beijar sua bochecha.

— Carinho, que surpresa agradável, por que não nos


disse que viria?

Brody baixou o Tommy lentamente ao chão, sua


expressão furiosa e obscurecida fixa em mim.

— O que você está fazendo aqui?

Fiquei imóvel com o garfo ainda suspenso na mão,


estupidamente aturdida pelo seu tom.

— Eu...

A atenção de Dionna foi de um para o outro.

— Essa é a Lety, nossa cuidadora.

— Sei quem ela é, mãe! — Respondeu entre dentes.


Minha cabeça se virou em direção a Dionna. Mãe?

Passou a mão por seu cabelo emaranhado antes de


avançar para mim, sua respiração pesada.

— Esta é a família que você esteve cuidando... a


minha família?

Suas palavras soaram como acusações, como se de


algum jeito eu o tivesse traído.

140
Brody amaldiçoou.

— Cuidado com sua linguagem— Advertiu o Sr.


Moore. — Há damas presente.

Brody olhou em sua direção.

— Você é a última pessoa que poderia me dar um


sermão sobre o que é apropriado, papai.

Caramba... A tensão em meu punho fechado fez com


que meu braço doesse enquanto eu o abaixava ao meu lado.

— Brody, por que está tão bravo?

— Por que estou tão bravo? Não imaginava que você


estivesse aqui, Lety!

Meus lábios se separaram, incapazes de formar uma


resposta. Dionna cruzou os braços, com estranheza e
suspeita em sua voz.

— Como vocês se conhecem?

Nenhum dos dois respondeu, nossos olhares


continuavam queimando buracos um no outro. Esta era sua
família. Tinha que lhes dizer quem eu era.

Brody se inclinou para trás sobre seus calcanhares.

— Da faculdade— Respondeu finalmente. — E


somos... RA juntos.

141
Isso foi tudo. Foi a maneira como me apresentou a
seus pais. Poderia simplesmente ter dito que eu era uma
vagabunda insignificante, isso me machucaria da mesma
forma. Tirei meu avental e o joguei sobre a mesa.

— Desculpe-me, Sr. Moore. Vou embora agora.

Não me afastei dois passos do Brody antes dele girar


e agarrar meu braço. Soltei-me, liberando-me com um duro
puxão.

— Não me toque. Não me ligue. Não fale comigo. Não


quero nada com você.

Apesar das lágrimas nublando minha visão, eu me


lembrei de agarrar minha bolsa e as chaves ao sair. Sabia
que não era boa o suficiente para o Brody ou sua família. Ele
tentou negar, mas todo este tempo sentia o mesmo.

Chorei, desde o momento em que saí pelos portões


de metal até me deitar na cama e soluçar. Mais uma vez
Brody Quaid quebrou o meu coração.

142
CAPÍTULO 9
Não pude me concentrar essa noite. Quando tentava
ler minhas anotações de psicologia, as letras se tornavam
imprecisas e via tudo em dobro. Por muito tempo
simplesmente olhei para os livros que cobriam minha cama.
Meus dedos tamborilavam em meu iPhone enquanto me
debatia se ligava para o Teo e a Evie. Será que poderia pedir a
eles um empréstimo tão alto? E se pudessem me emprestar
todo o dinheiro, ainda ficaria em Saint Jude?

Se ficasse, eu me encontraria com o Brody por todo


o campus, como no ano anterior. E da mesma forma que no
ano anterior, cada encontro me destruiria.

Como as coisas ficaram tão mal entre nós tão


rápido? Não nos beijamos ainda essa manhã?

Esfreguei meus olhos cansados. Provavelmente,


seria melhor ir embora. Mas se fosse, teria apenas a casa do
meu irmão para ficar. Não queria me transformar em minha
mãe... alguém implorando e chorando por um lugar onde
ficar. Teo já tinha o suficiente com ela. Não aumentaria seu
fardo tão pesado.

A porta principal da minha casa se abriu e fechou.


Pesados passos cruzaram o pequeno saguão. Escutei o duro

143
suspiro de Brody antes que seus grandes dedos batessem em
minha porta.

— Letz, sou eu. Posso entrar?

Meus olhos voaram para o relógio e vi que já passava


da meia-noite. Parecia ser quatro da manhã de tão cansada
que me sentia.

Ele bateu de novo.

— Lety... baby, sei que você está aí. Sinto muito. Por
favor, deixe-me entrar para que eu possa te explicar tudo.

Lancei meus livros e anotações no chão e me deitei


na cama, rolando de modo que meu rosto ficasse para a
porta.

— Agora não, Brody.

Baixei minhas pálpebras, seu peso fazendo com que


meus olhos se fechassem quase que imediatamente. Houve
outro golpe um pouco depois.

— Que tal agora?

— Não.

— Está bem.

Meus olhos se fecharam de novo e tomei algumas


respirações.

— Agora?

144
Grunhi. Ele não iria embora.

Desci da cama, notando que passou apenas meia


hora desde a última vez que olhei para o relógio. Deus, esse
cochilo parece que foi há uma eternidade.

A última coisa que eu queria era brigar com o Brody.


Mas tinha que fazê-lo. Por mais que soubesse que nossos
passados nos separariam eventualmente, ele não tinha o
direito de me tratar como fez.

Abri a porta com um puxão, pronta para desafiá-lo.

Estava sentado com as costas contra a parede, uma


perna inclinada, e outra esticada pelo piso de linóleo. Escuros
círculos marcavam seus olhos azuis e gotas de chuva
molhavam sua camiseta. Inclinei-me contra a porta,
cruzando os braços.

— Olá. — Disse. — Você está bem, linda? — Será que


justo agora tinha que me chamar assim.

— Não.

Em minha garganta se formou uma dolorosa bola e


não consegui falar, só fiquei olhando como se o estivesse
desafiando.

Fechei a mão sobre meus olhos para tentar conter as


lágrimas, mas elas escaparam de qualquer forma. Brody se
levantou e tentou me tomar em seus braços. Afastei do seu

145
abraço e corri de volta para meu quarto. Ele me seguiu,
fechando a porta atrás de si.

— Deus, Letz, eu sinto tanto.

Inalei algumas vezes.

— Porquê? Por gritar comigo, por me humilhar na


frente dos seus pais ou por admitir finalmente que não acha
que sou boa o suficiente para você?

Sua expressão caiu.

— É isso o que acha... que estou com vergonha de


você? — Olhei com toda a dor que sentia. — Nunca... nunca
pense isso, porque de verdade isso me mataria. Você é a
única coisa que é certa em minha vida.

Queria tanto acreditar nele, porém não podia.

— Se sou tão importante para você, por que sua


família não sabia nada sobre mim? Meu nome não é comum.
Frequentamos a mesma universidade. É como se nunca
tivesse existido para eles ou para você.

Ele colocou as mãos em seus quadris e baixou a


cabeça.

— Não é tão simples, Letz.

Limpei as lágrimas dos olhos com as pontas dos


dedos.

— Nada nunca é quando se trata de nós.

146
— Tem razão. — Demorou um pouco antes de
continuar. Quando o fez, sua expressão ferida se encontrou
com a minha. — Você me contou sobre o seu passado,
acredito que é hora de te contar sobre o meu. Eu te devo isso.
— Fez uma pausa. — Você se deitaria comigo para que possa
te contar?

Assenti, sabendo que Brody queria conversar.


Algumas das nossas melhores conversas foram na cama,
quando fomos simplesmente amigos íntimos.

Ele esperou até que retirei meu edredom verde e


rosa antes de tirar as botas e o suéter por cima da cabeça. Eu
me aconcheguei sob o suave edredom, repentinamente com
frio em meus shorts de algodão minúsculo e uma das velhas
camisetas sem mangas do Mateo.

Brody se deitou depois de mim, apoiando-se de lado


para que nós olhássemos um para o outro. Esticou uma
hesitante mão para mim e limpou minha última lágrima com
seu polegar.

— Fui um completo imbecil. E sinto muito. Poderia


dizer que estava surpreso como um estúpido por te encontrar
lá, mas isso não é desculpa pela forma como a tratei.

— Não, não é. — Meus olhos passearam do seu olhar


devastado até o queixo com uma ligeira barba, logo depois
voltaram para seu rosto. Foi então que vi indícios dos fortes
traços de seu pai e alguns poucos de sua mãe. Brody tinha os

147
grandes olhos dela, enquanto a combinação da cor era de
ambos, cinza como sua mãe com um toque de azul de seu
pai. Nunca diria que eram da mesma família se os
encontrasse em uma multidão, mas podia ver como eram
parecidos agora que realmente o olhava. — Juro que não
sabia que eram sua família.

Brody baixou os olhos.

— Eu sei.

— Seus sobrenomes nem sequer são os mesmos.


Como isso é possível? — Ele cerrou os dentes.

— Eu mudei quando fiz dezoito anos, Quaid na


realidade é meu segundo nome. Era conhecido como Brody
Quaid a maior parte da minha vida, então foi uma transição
fácil.

Levantei a cabeça. Teo e eu conversamos sobre


trocar nosso sobrenome para quebrar nossa conexão com
nosso estúpido pai. Se Brody o fez, deve ter tido uma
tremenda razão.

— Porquê?

A dor criava rugas em seu rosto e extinguiu o que


sobrou de minha raiva. Algo estava realmente errado aqui.

— Brody?

Ele pressionou seus lábios em uma fina linha.

148
— Para me distanciar da minha família e do
sobrenome Moore.

— Pelo acidente? — Falei sem pensar. Sua imagem


assombrada me disse que eu tinha razão. — Não conheço os
detalhes. — Acrescentei cuidadosamente. — Sei apenas que
houve um.

Quando não respondeu, meus dedos vagaram sob


sua camiseta azul marinho. Roçaram a primeira cicatriz, a
que tinha forma de faca de açougueiro, em suas costas.
Brody se encolheu como se ainda pudesse sentir dor.
Comecei a me afastar, preocupada por ter cruzado uma linha.

Brody agarrou minha mão, mantendo-me no lugar.

— Pode tocar, você é a única que poderia fazer isso.

A vontade de me aproximar dele me dominou. Meus


dedos exploraram lentamente sua coluna vertebral, seguindo
em direção aos ombros onde as cicatrizes se uniam e
engrossavam formando um padrão cruzado.

Os músculos tensos relaxaram sob as prolongadas


carícias. Aprendi a forma de cada uma, gravando-as em
minha memória, e torcendo que isso o ajudasse em vez de
machucar.

— Quer que eu conte o que aconteceu? — Disse com


a voz rouca.

149
— Não a menos que queira fazê-lo. Sei o que se sente
ao desenterrar segredos. E sei o quanto dói quando os outros
descobrem. — Sacudi a cabeça. — Não farei isso com você.

Brody levantou meu rosto gentilmente.

— Ninguém me entende como você. — Seus lábios


roçaram os meus, o gesto tão amoroso e a dor em seu tom tão
cru, fez com que mais lágrimas se formassem em meus olhos.
— Cristo, estive rodando em círculos desde que você deixou a
casa, sabendo o quanto a havia ferido, e convencido de que
nunca mais conversaria comigo.

Minha voz falhou.

— Bom, sim essa ideia me passou pela cabeça.

Ele amaldiçoou.

— Letz, você é a pessoa mais importante no mundo


para mim. Está me destruindo tê-la ferido. Mas esta merda, o
que tenho para te contar, é algo que nunca disse a ninguém.
E ninguém pode saber, ok?

Fiquei quieta.

— Isso é como o que te contei sobre a minha


infância? — Assentiu.

— Sim, dê-me um minuto está bem?

— Está bem.

150
Um minuto se tornou vários. Não foi até que sua
mão viajou até meu quadril que ele finalmente falou:

— Nós já falamos sobre tudo: nossos sonhos, nossa


moral, nossas comidas favoritas, o que queremos fazer com
nossas vidas, sobre tudo certo? — Assenti. — A única coisa
que sempre foi um tabu para nós, o que nenhum de nós
jamais trouxe à tona?

Meus olhos se abriram.

— Nossos pais.

— Sim. — Cerrou os dentes. — Como você, eu queria


nos manter separados do mundo no qual nossos pais
existem. Não é um bom lugar para nenhum de nós dois.
Você, aqui comigo, isso é sagrado, Lety. Entende o que estou
tentando te dizer?

Não eram palavras que me apaziguavam, mas me


identifiquei com o que dizia mais do que provavelmente era
sua intenção. É a mesma razão pela qual a presença do
Carlos no campus parecia uma invasão para mim. Interferia
em minha felicidade no Saint Jude.

— Entendo.

Seus olhos piscaram antes que se sentasse


abruptamente e pendurasse os pés na lateral de minha cama.
Pensei que iria embora porque inclinou seus antebraços
contra suas musculosas coxas.

151
— Meu pai era alcoólatra. Nem sempre foi assim.
Começou mais ou menos e gradualmente piorou. No
princípio, eu não entendia e pensava que ele simplesmente
tinha sede todo o tempo. — Riu sem humor. — Bem estúpido,
não?

Sentei ao seu lado e coloquei os braços ao redor de


seus ombros.

— Não acho, provavelmente, você era muito jovem


para entender.

— Bom, tive de amadurecer bem rápido. — Estendeu


seus dedos, depois os apertou até que suas mãos formaram
punhos. — Eu o encontrava no pátio, às vezes na frente,
jogado na grama junto a uma garrafa vazia de whisky
escocês. Estava acostumado a colocar um lençol em cima
dele e dormir a seu lado, fora de casa toda a noite, mesmo
nos finais de outono. É um milagre que nenhum dos dois
tenha congelado até morrer.

Apoiei-me contra ele.

— Deus, Brody.

Manteve sua cabeça abaixada.

— Minha mãe não conseguia suportá-lo e começou a


passar mais tempo fora de casa. Tommy? Eu já tinha doze
anos quando o pequeno chegou. Acredito que foi seu último

152
recurso desesperado para fazer funcionar as coisas.
Provavelmente, você percebeu o quão bem isso saiu.

Não respondi, esperando para ver se continuaria.


Brody, o Sr. Grande Homem do Campus, o menino que
brincava e fazia todos rir, o menino com o qual eu sempre
contava para me fazer sorrir, não estava mais sorrindo então.
Abriu as comportas de seus segredos e pela forma que
esfregava as mãos, soube que ainda não tinha terminado.

— Minha mãe era treze anos mais nova que meu pai
e teve uma dura criação. Pode ser que tenha vivido nas ruas
em uma ou duas ocasiões, mas não tenho certeza. Acredito
que viu meu pai como seu Príncipe em um cavalo branco,
suponho que estava equivocada.

Olhou-me então, provavelmente, para avaliar minha


reação. Meus braços se envolveram ao redor dos seus,
assegurando-lhe que eu não iria a nenhuma parte.

— Eu estava em meu quarto na noite do acidente.


Papai, tropeçou em uma das mesas do vestíbulo e deixou cair
um vaso de flor. O impacto foi forte o suficiente para que eu
escutasse no terceiro andar. Desci as escadas correndo para
me assegurar de que ele não estava sangrando nem nada, e o
encontrei carregando o Tommy pela porta...

Cobri minha boca, tomada pela surpresa ao


imaginar o Sr. Monroe em seu estado bêbado carregando o
seu menino.

153
Um olhar distante nublou os olhos brilhantes de
Brody, como se também estivesse imaginando o momento.

— Saí correndo atrás dele. "Papai, aonde você vai


com o Tommy?", perguntei—lhe. Apenas olhou para mim e
disse que tinha que encontrar a minha mãe... e que Tommy
era muito pequeno para ser deixado sozinho. Segui ele para
fora, implorando para que retornasse para casa. Fazia frio e
estava chovendo, era início de março. Tommy usava seu
pijama e meu pai nem sequer tinha vestido uma camiseta.

A tristeza de sua voz me assustou.

— Brody, se não estiver preparado para me dizer isso


não tem que fazê-lo.

Ele olhou-me com olhos reluzentes.

— Acredito que preciso, permite-me fazer isso?

Beijei sua bochecha e assenti, esperando que isto


não o destruísse. Ele demorou um pouco, esperando e
pesando suas palavras com cuidado.

— Meu pai não parecia estar bem, Letz. Estava mais


que bêbado. Algo estava mal e me assustava. Eu continuava
pensando que tinha que avisar alguém. Como um imbecil,
corri de volta para casa e liguei para minha mãe que não
atendeu o seu celular e liguei pelo menos quatro vezes. Como
não consegui falar com ela, corri descalço novamente para
fora, mas minhas ligações demoraram muito e papai já tinha

154
colocado o Tommy em seu assento do carro, mal pulei para o
banco do passageiro, antes que ele arrancasse.

Em momentos eu saberia os detalhes do acidente,


mas não tinha certeza de ter força o suficiente para passar
com Brody esse momento— não pela forma como sua voz
tremia ou com a maneira em que a dor enchia seus olhos e
escurecia sua expressão,— exceto por seus ombros tensos e
seu aperto sobre minha mão, não demonstrava sua
dificuldade de terminá-la. Tanto quanto o estava torturando
reviver essa noite, Brody estava determinado a me contar isso
e não ia parar até terminar.

Sua voz adquiriu um tom estranho que não


reconheci.

— Estávamos rodando por essas loucas colinas, as


que estão perto do estádio. Eu gritava para que parasse e
voltássemos para casa, Tommy estava atrás, choramingando
e assustado. Nós derrapamos por todo o caminho. Papai, não
escutava e continuava golpeando seu próprio rosto. Levou
uma eternidade para me dar conta de que chorava, e foi
nesse momento que percebi que perderia o controle do carro,
mas em vez de diminuir a velocidade, ia cada vez mais rápido,
insistindo que precisava encontrar a minha mãe. — Brody
deixou sair um suspiro irregular. — Eu sabia que não
chegaríamos a fazer a curva seguinte. Então fui para o banco
de trás e protegi Tommy com meu corpo.

Lágrimas caíram dos meus olhos.

155
— Não consegui me segurar bem firme Lety, eu
tentei. Eu... o puxei com força contra mim.

— Está tudo bem, Brody. Está tudo bem...

Brody limpou o rosto.

— Atravessamos a mureta, e de algum jeito fui jogado


contra o para-brisa e para fora do carro. Acho que bati no
capô e rolei para o lado, não me lembro, tudo que recordo é
das minhas costas batendo em algo duro e meu corpo
girando.

A tensão em meu peito se intensificou.

— Você saiu rolando pela ravina?

Assentiu.

— Não sei contra o que bati, até que finalmente parei.


Depois tudo pareceu acontecer ao mesmo tempo, ouvi um
estrondo, o carro bateu, as árvores partiram, Tommy
gritando... então tudo acabou. Tudo ficou em silêncio.

Ele tomou várias respirações, fechando os olhos por


um momento antes de tentar terminar.

— Foi o frio que me forçou a me mover. A chuva fazia


meu rosto arder, deixando—o tão molhado que não percebi
que sangrava. A única coisa que sabia era que todo o meu
corpo doía. Subi pela ravina, escutando as sirenes atrás de
mim, sabendo que a ajuda já estava a caminho. Mas não
podia ficar lá, então me arrastei pelo chão. Quando percorri a

156
metade do caminho um policial me encontrou e gritou para
que eu parasse de me mover. Não o escutei. Podia ver o
automóvel de onde estava. — Estremeceu. — Tudo o que
sobrou foram pedaços de metal retorcidos. Meu pai e Tommy
jaziam do lado oposto dos destroços, parcialmente cobertos
de terra. Nenhum dos dois se movia. Pensei que eles... —
Soprou. — Eu precisava chegar até eles, disse à polícia que
precisavam de mim.

Engoli um soluço.

— Você não podia ajudá-los, baby.

— Sim, poderia ter feito algo. — Sua cabeça se voltou


para mim. — Eu revivi essa noite mil vezes em minha cabeça.
Tudo o que tinha que fazer era esconder as chaves do carro
do meu pai e não o fiz.

Minha voz permaneceu firme.

— Estava assustado e confuso, você ainda era um


menino. Isto não foi sua culpa. — Seu rosto ficou tenso.

— Tem razão, foi culpa do meu pai, mas eu poderia


tê-lo detido.

— Brody... não.

— Você está errada sobre mim.

— Brody...

157
— Não sou o herói que as pessoas pensam. —
Levantou—se abruptamente. — Ferrei com tudo da pior
maneira, agora meu irmão e meu pai estão arruinados por
toda a vida.

Levantei-me.

— Nada disto foi sua culpa. Jesus, você tinha apenas


quatorze anos!

— Velho o suficiente para saber o que era melhor e já


era grande o suficiente para jogar um bêbado no chão, mas
em vez disso, assisti o Tommy e o papai serem jogados para
fora da maldita ravina e passei quatro horas em cirurgia
enquanto eles tiravam vidro e cascalho das minhas costas.

Começou a caminhar de um lado para outro.

— Agora o Tommy e meu pai jamais terão uma vida


decente... tudo porque não tive cabeça ou bolas para fazer o
que deveria ser feito. — Ele parou de repente. — Não deveria
sequer estar aqui.

Levantei minha cabeça.

— O quê?

— Eu disse...

— Eu sei o que disse— Disse rispidamente. — E


jamais volte a dizer algo assim de novo!

Enterrou o rosto em suas mãos.

158
— Letz, você não entende.

Mas sim eu o entendia... exceto que não poderia


admitir a verdadeira razão do por que. Então cuidadosamente
movi suas mãos e lhe disse tanto quanto me atrevi.

— Houve momentos em minha vida em que roguei a


Deus que me levasse. Eu não era uma suicida. — Acrescentei
rapidamente quando seu rosto empalideceu. — Mas às vezes
Carlos era tão cruel e minha vida era tão difícil que não
acreditava que poderia seguir adiante, mas segui e me alegro
por ter conseguido. — Meus olhos se encheram de lágrimas.
— Se não o tivesse feito, não estaria aqui com você.

Levou minhas mãos para seus lábios e as beijou,


depois me puxou contra seu corpo.

— Você pode culpar a si mesmo e lutar com o que


poderia ter sido Brody, mas a verdade é que seu pai era um
homem doente que cometeu um terrível erro e vejo o
arrependimento em seus olhos cada vez que estamos juntos.

Ele colocou seu queixo sobre minha cabeça.

— Talvez, mas não posso perdoa-lo. Não acredito que


alguma vez possa. — Minha voz estremeceu.

— Às vezes as coisas são mais complicadas do que


simplesmente odiar ou culpar.

Nenhum dos dois se moveu por um longo tempo,


lutando com a intensidade do que tínhamos compartilhado.

159
Nesses momentos de silêncio, considerei quanto ódio Brody
carregava contra seu pai. Mas não podia odiar o Sr. Moore.
Era um bom homem, com um bom coração, que sofria por
seus pecados cada vez que sua máquina respirava por ele e
seu filho mais novo lutava para falar ou caminhar. Mas agora
não era o momento de discutir com Brody. Estava muito
ferido.

Levantei minha mão e acariciei seu rosto.

— Faria algo por mim?

— Faria qualquer coisa por você.

— Então poderia tentar perdoar a si mesmo? — Ele


desviou o olhar. — Por favor. — Implorei. — Você fez o melhor
que pôde, inclusive se sacrificou por seu irmão mais novo.

— Mas não com êxito. — Tentei sorrir.

— Os heróis nem sempre ganham. — Sacudiu a


cabeça.

— Eu já lhe disse isso, não sou nenhum herói.

— Você está errado. — Suspirei levemente. — É o


meu.

Voltei a subir na cama, empurrando—o comigo, ele


me seguiu tranquilamente, envolvendo o edredom a nosso
redor. Não me recordo de dormir, só me lembro da forma em
que sua mão viajou ao longo da minha coluna e do seu calor
enquanto me segurava contra si.

160
CAPÍTULO 10
Brody se agitou enquanto procurava chegar ao seu
iPhone.

— Olá! Estou com Lety. O que aconteceu? Sim... está


bem... Meat, confie em mim quando digo que Gretel Ann não
vale a pena.... É boa na cama, eu entendo. Mas te traiu. —
Suspirou— Com a equipe masculina de basquete, Meathead,
e algumas das mulheres... bem... sei... até mais tarde, cara.

Esfreguei meus olhos.

— Gretel Ann está tentando voltar com Meathead?

Ele virou-se para mim.

— Sim, chateia-me muito saber que Meat está


considerando voltar. Sabia que o apelido dela é "A transa da
morte"?

Bocejei.

— Sim, mas pode não ser verdade se Meathead


continua vivo e esperneando.

Brody riu. Gretel Ann se tornou a capitã da seleção


de remo e capitã da equipe de basquete feminino, em seu

161
segundo ano. Parte alce, parte amazona, todos músculos, não
mexa com Gretel Ann.

Olhei por cima do ombro de Brody antes de cair


sobre o colchão.

— Que horas são?

— Onze e Vinte. A que horas é sua primeira aula?

— Depois da uma. Logo tenho duas horas de


laboratório antes de ir à casa da sua família. — Fiz uma
pausa— Como se sente comigo trabalhando para sua família?

Seus dedos passaram sobre minhas costelas.

— A verdade?

— Sim.

— Preferiria só te dar o dinheiro. Mas sei que


provavelmente é a melhor pessoa para cuidar deles.

— Acredita que concordarão com isto?

Riu entre dentes.

— Querido, falo a sério.

Brody riu de novo.

Apoiei-me sobre meus cotovelos.

— O que é tão engraçado?

162
— Tecnicamente, sou quem te paga. Por isso é que
falo que pode ficar com o trabalho se ainda o quiser. — Tirou-
me de cima dele e colocou uma mecha do meu cabelo atrás
de minha orelha— Meu pai ficou em péssimo estado por um
longo tempo após o acidente. Ninguém tinha certeza de que
melhoraria, inclusive ele. Refez seu testamento de forma que
ao completar dezoito anos, através de uma procuração, eu
pudesse administrar suas finanças, nossas propriedades,
também me tornando responsável pelos seus cuidados e de
meu irmão.

Franzi o cenho.

— Por que não passou para sua mãe?

Apertou os lábios.

— Não acredito que papai confie plenamente nela.


Não lhe deixou nenhum dinheiro ou ativos, só o que adquiriu
durante o tempo que estiveram casados.

Inclinei minha cabeça.

— Mas ainda estão casados.

— Estão, mas minha mãe nunca teve poder de


decisão sobre as finanças da família. — O olhar de Brody se
fixou em algum ponto acima do meu ombro, os traços de seu
rosto adquirindo uma mescla de tristeza e ressentimento—
Meus avós nunca tiveram minha mãe em alta estima.
Fizeram que ela assinasse um acordo pré-nupcial

163
incontestável, estabelecendo que enquanto estiver casada e
morar com meu pai, recebe uma pensão mensal satisfatória.
Se meus pais se divorciarem, minha mãe só tem direito ao
que adquiriu durante o casamento e perderá a pensão. —
Encolheu os ombros— Nunca teve direitos sobre a empresa
ou os investimentos. O dinheiro que recebe mensalmente é a
única renda que tem.

Meus dedos passaram pela barba de Brody.

— Então ela fica.

Assentiu.

— Sim.

— E seu pai não discorda?

Brody negou com a cabeça, devolvendo meu abraço.

— Ele a ama, Lety. Sempre amou. É uma certeza que


tenho quando se trata deles.

— Não é da minha conta e provavelmente não deveria


dizer isto, mas... não gosto que tenha essa procuração.
Coloca-o numa situação difícil com seus pais.

— Sei, mas me dá a oportunidade de cuidar de


minha mãe, independentemente do que acontece entre eles.
Também acredito que era a forma de papai tentar permanecer
perto de mim.

164
— E vir para escola era sua maneira de permanecer
perto deles? — Desloquei-me ao lado de Brody quando não
respondeu e apoiei minha cabeça em minha mão— Brody. É
brilhante e sabe disso. Poderia ter ido para Stanford,
Berkeley, MIT ou qualquer outra faculdade de engenharia
com prestígio. Ao invés disso, veio para cá, uma pequena
universidade particular no meio de um campo de milho, a
menos de quinze minutos da sua casa de infância.

Ele sorriu.

— Qual é seu ponto?

Beijei sua bochecha. Apesar da dor que continuava


sentindo, Brody tentava a sua maneira superar isso.

— Meu ponto é que por mais que você queira se


afastar da sua família, não consegue.

Levantou uma mecha de meu cabelo e o roçou contra


meu queixo.

— Você me dá muito crédito. A culpa me mantém


perto, mas isso é tudo. Mando mensagens de texto de vez em
quando. Pergunto se está tudo bem. E a cada dois meses,
obrigo-me a visitá-los.

Observei ele de perto.

— Porquê?

— Se não vejo Tommy ou papai, não tenho que


pensar no que aconteceu e como não consegui impedir. É

165
egoísta demais e algo que tento superar através da terapia,
mas é a única maneira que consigo seguir em frente. — A
seriedade do seu olhar me perfurou.

— O alcoolismo e os problemas entre meus pais me


deixaram fora de controle. Mas depois do acidente, perdi
totalmente minha cabeça... não quero passar por isso de
novo. Assim mantenho distância, estampo um sorriso, digo
um par de piadas e espero que ninguém veja através da
máscara que uso. Parece familiar?

Sim. Joguei o mesmo jogo... externamente forte,


sempre sorrindo, assim ninguém percebia o sofrimento que
habitava dentro de mim.

— Eu entendo.

A mão de Brody saiu de minha bochecha para fazer


massagens em meus ombros.

— Sei disso. É a única.

Estava certo. Não somos tão diferentes, só dois


palhaços rindo através de suas lágrimas. Passei meus lábios
sobre seus nódulos.

— Esses esqueletos em nossos armários são bastante


brutais, não são? Riu.

— Sim, e acredito que fazem uma festa do barril às


nossas custas. — Observou-me durante alguns segundos. —
Ontem à noite foi lá, né?

166
— Fui.

— Algum arrependimento sobre o que falaram?

Neguei com a cabeça.

— Quero saber tudo sobre você.

— Sim. Digo o mesmo... — Sua íris brilhava com


desejo enquanto continuava me hipnotizando— Ouça, Letz,
não quero pensar em coisas ruins.

Meu corpo se esquentou imediatamente, sabendo o


que queria dizer.

— Eu também não.

Colocou o braço em minhas costas, animando-me a


montar de novo. Não me incomodei em pôr roupa íntima.
Inclinei-me para trás, escarranchada em seus quadris e tirei
a blusa. Meu short de algodão moveu-se para um lado,
revelando o volume que empurrava contra seus jeans.

Minhas pálpebras baixaram enquanto seus quadris


se moveram por debaixo de mim, o volume roçando contra
minhas dobras. Quando abri os olhos, Brody havia tirado a
camisa e o calor consumia seu olhar. Ele empurrou seu corpo
até uma posição sentada, pegou meus peitos e beliscou os
bicos, ansioso de me ter em sua boca.

Agarrei sua cabeça contra mim e a levantei


ligeiramente. Arrastamos ao redor, nossos corpos retorcendo-
se e nossas mãos livres tentando eliminar seus jeans e

167
boxers. À medida que suas roupas caíam ao chão, Brody caiu
para trás, levando-me com ele. Passou a mão pela abertura
de meu short, fazendo uma pausa quando sentiu minha
nádega nua sob sua palma.

— Calcinha? — Murmurou entre puxões de sua boca.

Baixei a cabeça para vê-lo me chupar.

— Mm, não.

— Ainda melhor— sussurrou.

Empurrou seus dedos dentro de mim. Minhas costas


curvadas o suficiente para que pudesse segurar sua ereção e
esfregá-la, movendo a mão rápida e firme, deixando-o sem
fôlego.

Mordi meu lábio inferior enquanto seus dedos se


desviavam, meus quadris balançando. Estava próxima do
orgasmo quando Brody me virou de costas, colocando-se
sobre mim.

Beijamos enquanto ele tirava meu short, sua língua


jogando com a minha e meu corpo retorcendo-se debaixo
dele.

— Deus, te desejo demais— disse com voz rouca.

Levantou-me e colocou a mão entre nós, observando-


me com seu olhar ardente, enquanto passava seu pênis duro
pela minha pele formigando. Minha cabeça balançava, cada

168
uma das investidas de Brody pressionando meu ponto
latejante.

Ofeguei e gemi, sem saber quanto mais poderia


aguentar. Os movimentos breves e intoxicantes enviaram
uma tormenta de necessidade para o meu núcleo. Abri
minhas pernas, disposta a convidá-lo. Em lugar de empurrar
dentro de mim, Brody se retirou e ficou de barriga para cima
com o braço cobrindo o rosto, sua respiração pesada e
agonizante.

— Sinto muito. Sei que não está preparada.

Não era verdade. Eu realmente estava.

Fiquei de lado, perguntando-me por que Brody


parecia chateado e apoiei a palma da mão contra seu peito.

— O que está errado?

— Toda a merda que te disse me fez... —


Amaldiçoou— Preciso me sentir perto de você.

Deixou cair o braço sobre o colchão

— Tem sentido?

— Sim. Também quero me sentir perto de você.

Por isso estava tão disposta a ter sexo com ele.


Afinal, o desejo que despertou em mim continuava ardendo e
eu estava inquieta por mais. Necessitava de Brody de
qualquer maneira que pudesse têm—lo. E ele também

169
necessitava de mim. Tínhamos passado por uma gama de
emoções na noite anterior. Já era hora de algo mais.

Fiquei por cima dele e lhe dei um beijo profundo,


tomando meu tempo e mordiscando seu lábio inferior quando
me separei. Dei-lhe um tímido sorriso antes de abaixar minha
cabeça e escorregar sobre seu corpo quente, movendo-me
para baixo.

Meu cabelo comprido espalhado contra seu peito


definido, minha língua e dentes brincaram até alcançar a sua
cintura. Tomei sua dureza em minha boca tão profundo como
pude, lentamente o liberando para levá-lo ainda mais
profundamente.

Brody gemeu e arfou várias vezes antes de agarrar de


forma inesperada meus tornozelos e me puxar em sua
direção. Eu o soltei, sem entender o que fazia até que me
segurou pela cintura e enterrou sua boca entre minhas
pernas.

Gritei. Porra, gritei! Minhas pernas se dobraram e caí


contra ele. Temendo machucá-lo ou asfixiá-lo inclinei os
quadris. Brody me agarrou com força, puxando-me em sua
direção. OH, Deus... OH, Deus.

Brody gemeu quando sacudi meus quadris


instintivamente. Minhas pálpebras se agitaram e voltei a
gritar. Uma vez mais gemeu, desta vez mais profundo. Eu
estava à beira do orgasmo e ele superexcitado. Caí para

170
frente, minha cabeça dando voltas, vagamente consciente de
onde estava. Entre palavrões e gritos, eu me lembrei de suas
necessidades.

Novamente me posicionei e o levei em minha boca,


com vontade de lhe devolver tudo. Quanto mais rápido me
movia, mais rápidos eram seus esforços, seus dedos fortes
apertando minhas coxas, prendendo-me a ele. Minha língua
se moveu e o provocou. Sua boca devorou e chupou,
explorando cada centímetro até que pensei que iria me afogar
em êxtase.

Nós gozamos juntos, nossos corpos sacudindo com


violência. Desabei ao seu lado de costas para a parede.
Caramba, foi incrível.

Vários segundos passaram antes que Brody falasse


com uma voz rouca.

— Está bem. Isso não foi sexy nem nada.

Não podia responder, meu corpo continuando com


espasmos.

— Lety?

Nada sairia de minha boca.

— Letz?

— Ah?

Sentou-se.

171
— Você está bem? Isso foi bom?

Estava brincando? Meus olhos estavam perdidos e


mal podia lembrar meu nome. Levantei um polegar, mas isso
foi tudo.

Riu e baixou a cabeça.

— Tenho que ser honesta. Nunca fiz isso antes.

— Não? — Poderia ter me enganado, vaqueiro.

Passou sua mão grande sobre o músculo da minha


coxa.

— Nunca quis... exceto contigo. Desejei isso durante


um tempo. — Seus olhos selvagens deram uma olhada sobre
os bicos dos meus seios e baixou pelo meu ventre— Eu, ah,
gostei muito,— lambeu os lábios. — Gostei de tudo.

— Sério? — Seu ronronar atrativo me fez lutar para


me sentar. Arregalei os olhos, vendo como ficava novamente
excitado e aumentava de tamanho, sua dureza voltando
alegremente a me saudar. — Quer fazer de novo?

Mantive minha atenção em sua virilha.

— OH, claro que sim.

Brody e eu nos vestimos cerca de uma hora mais


tarde. Ele puxou a camiseta por sua cabeça, observando-me
prender novamente o cabelo ainda molhado da ducha.

— Acredito que precisamos conversar sobre algo.

172
— Fala.

— Não quero ser um idiota aqui..., mas, está


tomando pílula?

Eu mexi em meu cabelo um pouco mais, sabendo


que precisávamos ter este bate-papo, mas insegura de aonde
poderia nos levar. Apertei meu rabo de cavalo com um puxão
forte antes de responder.

— Não, nunca tomei.

Brody se apoiou no marco da porta de meu armário.

— As coisas nunca foram sérias o suficiente entre


você e outro cara?

— Não.

Inclinou a cabeça.

— Acho que isso não deveria me deixar feliz, mas


deixa.

Sorri e caminhei em sua direção, enganchando os


dedos no cós de seu jeans.

— Sei que você quer dizer mais alguma coisa—


acrescentei em voz baixa. Agarrou meus quadris.

— Quero, mas quero encontrar uma maneira de dizer


sem estressar e transformar esta conversa em um desses
vídeos de merda sobre a abstinência, que fomos forçados a
assistir nas aulas de biologia.

173
Fiz uma careta.

— Os que têm as imagens das doenças?

— Sim. — Estremeceu. — A do quarterback ainda me


persegue.

Nós dois rimos, mas então o humor de Brody se


desvaneceu.

— Só diga, bebê— disse.

Beijou-me na face, permitindo que as pontas úmidas


de seu cabelo roçassem minha bochecha.

— Não quero te pressionar, mas talvez você deveria


pensar em começar o controle de natalidade,— encolheu os
ombros. — Não temos que transar até que esteja pronta e,
como te disse, pode levar o tempo que precisar. Mas, Letz, as
coisas ficam excitantes quando estamos juntos. Nunca foi
assim para mim antes... com ninguém. Sabe ao que me
refiro?

Assenti. Oh, sim, sei. Por muito que tivéssemos


brincado essa manhã, minhas mãos se mantinham dispostas
a viajar dentro de seus jeans.

Seus dedos apertaram meus quadris, juntando o


tecido de minha túnica branca debaixo deles.

— Levava camisinhas no bolso desde que tinha


quinze anos e sempre tomei cuidado. Nunca tive nenhuma
DTS ou nada. E você?

174
Neguei com a cabeça.

— Não. Também fui cuidadosa.

— O problema é que não sou cuidadoso quando


estou com você. Perco o controle cada vez que estamos
sozinhos. Não tinha nenhuma comigo desta vez e me tornei
descuidado porque te desejo demais.

Brody não era o único que não pensava com clareza.


Mesmo ciente de que ele não usava camisinha, estava
disposta a levar a transa até o final. Inclusive se tivesse
tirado, não teria importado. Nove meses depois, poderia ter
um bebê para cuidar, ao invés de terminar faculdade. Percebi
minha estupidez. Realmente, Brody tinha razão, seria fácil
perder o controle quando ficássemos sozinhos.

— Não quero engravidar,— admiti.

Ele segurou minhas mãos, entrelaçando nossos


dedos.

— Eu sei. Também estou preocupado com isso.

— Estou disposta a tomar pílula, mas o sexo é algo


complicado para mim. Algumas vezes realmente quero. Na
maioria das vezes, no entanto, tenho muito medo.

— Então não faremos.

Suspirei.

175
— Você faz parecer tão simples. Só que não é. Sei o
quanto quer transar e sinto que te deixo confuso ao dizer que
não.

Brody me abraçou pela cintura e me levantou para


um breve beijo.

— Façamos um trato. Sim, quero transar com você.


Às vezes é tudo no que posso pensar. Mas não quero te
assustar e nem fazer com que se arrependa por estar
comigo... nunca. Letz, isso seriamente me destruiria. Assim
se quiser esperar, esperaremos. O que me preocupa é que nós
dois perdemos a cabeça quando começamos a nos tocar. Se
estiver tomando a pílula e quiser, com camisinha ou não, não
teremos um problema.

Mordi meu lábio inferior.

— Tem razão. Sei que tem razão.

Brody provavelmente pensava que minhas cicatrizes


da infância me impediam de dar esse último passo em
relação ao sexo. Impedia. Mas havia uma cicatriz em
particular que me perseguia mais que as outras. Meu maior
segredo, não suportaria a ideia de ele descobrir, tornava tudo
mais difícil do que era. O problema é que às vezes, como
nesta manhã, Brody tornava fácil voltar ao passado.

— Tomarei a pílula no caso de... — disse de novo. —


Enquanto isso, poderia...?

176
Sorriu.

— Manterei algumas camisinhas à mão.

— Obrigada.

Inclinou a cabeça.

— Por quê?

— Por entender o que isto significa para mim.

Sorriu e me beijou de novo.

— Vamos, linda, vamos almoçar antes das aulas.

Fomos de mãos dadas durante o caminho para meu


carro. Tudo parecia tão perfeito entre nós até que tentei ligar
o motor. Ligou, grunhiu e se parou. Tentei mais três vezes,
até que o motor morreu, apenas morreu. Golpeei o volante.

— Droga!

— Quer que dê uma olhada no motor? — Brody se


ofereceu.

Encolhi os ombros. Meu conhecimento sobre carros


era maior que o dele. Brody deu de ombros.

— Sinto muito. Só tentava agir como um homem ao


me oferecer. Os homens dizem coisas masculinas como essa.

Esfreguei meus olhos. Como ia trabalhar? Brody se


inclinou e pôs seu braço ao redor de mim.

177
— Talvez seja hora de fazer algumas mudanças. Se
alugar um, não custará muito.

Fiquei olhando o painel.

— Não posso pagar, querido.

— Inclusive com o dinheiro que ganha cuidando da


minha família? Sei que vai ser apertado, mas... — Acariciou
meu cabelo. — Qual o problema?

Não queria contar-lhe, mas também não queria


mentir.

— Todo o extra vai para minha mãe.

Sua mão saiu do meu ombro.

— Está mantendo a sua mãe. — Concordei com a


cabeça— Há quanto tempo está acontecendo isto?

Não precisava ser um gênio para saber que estava


chateado.

— Desde que comecei a trabalhar para sua família.

— Lety, você mal consegue manter a si mesma. Como


pôde...?

Minha expressão de dor o interrompeu.

— Os golpes de Carlos a deixaram com sequelas. Já


não pode trabalhar, não como estava acostumada. — Neguei

178
com a cabeça. — Por mais que ela não esteve ali por mim,
não posso deixar ela morrer de fome.

Brody voltou a cair no banco.

— E se te der um aumento?

— Não.

Estendeu-me uma mão.

— Não é um empréstimo, não é uma esmola. Está


trabalhando por isso.

Meus olhos suplicaram sua compreensão.

— Brody, não posso.

— Porquê?

— Porque é meu problema, não seu.

— Não tem que ser. Viu o lugar onde cresci. Tenho o


dinheiro para te ajudar. Só me permita te ajudar.

Amaldiçoou quando endureci meu queixo. Agarrei


seu braço quando alcançou a maçaneta da porta e tentou
sair.

— Não quero brigar. Mas não posso ficar correndo


para você toda vez que algo dá errado na minha vida.

Soltou a maçaneta e se acomodou no carro, seus


olhos suavizando, enquanto me observava lutar para

179
recuperar a compostura. Colocou seu braço cuidadosamente
sobre meu ombro de novo e beijou o alto da minha cabeça.

— Pensei que havia dito que era seu herói.

— E é. — O problema é que Brody ainda não


percebeu que dependia só de mim para me salvar.

180
CAPÍTULO 11
Uma nova Range Rover com os vidros opacos parou
em frente à minha casa enquanto olhávamos o reboque levar
meu carro. O vidro da Range Rover baixou, revelando o anjo
no banco do motorista. Está bem. Não realmente. Mas minha
cunhada, Evie, era muito bonita. Inclusive na escuridão da
caminhonete, seu cabelo loiro brilhava tanto como seu
sorriso. Possivelmente era o vestido fúcsia que usava. Não.
Era somente Evie.

— Olá, Lety. — Ajustou os óculos de sol sobre a


cabeça.

— Olá, Brody. É bom te ver.

Brody a saudou.

— Olá, Evelyn.

Ele não brincou e seu sorriso estava notavelmente


ausente, chateado porque chamei meu irmão para me ajudar.
Apertei ligeiramente seu braço.

— Eu te verei mais tarde, está bem? — Não me


respondeu— Brody, não se zangue— sussurrei.

Olhou o chão.

181
— Não estou zangado. Simplesmente, gostaria que
me deixasse ajudar.

— Não posso. Por favor, tente entender.

Quando não respondeu, pensei que o melhor seria


lhe dar espaço e fui para a porta. Brody pegou minha mão e
puxou meu corpo contra o dele, envolvendo minha cintura
com um braço.

— Vai voltar esta noite?

— Sim, mas mais tarde. Como já perdi aulas, pensei


em jantar com Teo e Evie.

— Está bem. Ligue-me quando voltar ao campus.

— Ligarei. — Para meu alívio, beijou-me docemente


antes de abrir a porta e me observar subir.

Mantive o olhar fixo nele até que Evie pegou a rua


que saía do campus.

— Está tudo bem com o Brody?

Tossi e todas minhas lágrimas caíram nesse


momento.

— Oh, querida— disse.

Procurou em sua bolsa e me passou uns lenços. Isso


era incrível em Evie. Não tinha que ser durona na frente dela.
Era uma garota feminina que derramou algumas lágrimas.

182
Quando chegamos à rodovia, tinha a saia cheia de
lenços usados, mas finalmente pude falar.

— Deus, lamento tanto. Arruinarei seu carro novo.

Esfregou meu braço.

— Não se preocupe com isso. — Olhou em volta. — O


carro é quase novo demais. Precisa ser estreado.

Olhei minha pilha de lenços.

— Estou certa de que meu irmão não concordaria.

Ela sorriu.

— Provavelmente não, mas já deixou claro que é meu


carro, não dele e posso fazer o que quiser com ele.

Um dos lenços caiu no chão.

— Duvido que Teo se referisse a isto.

Ela riu brandamente.

— Se está tão preocupada, há uma sacola plástica no


porta luvas. Só tome cuidado ao abrir.

— Está bem... — Abri a porta luvas e congelei. Santo


Deus. Olhei a nova Glock 17—. Planeja atacar uns ninjas, E?

Sacudiu a cabeça.

— Não me irrite. Odeio essa coisa. Mas Mateo me faz


levá-la quando não está comigo.

183
— Não me parece o tipo Garota Fatal, amiga.

Apertou seus lábios rosados.

— Oh, acredite, não sou. Teo me fez tirar o porte e


comprou a arma. Logo me levou a pista de tiro e praticamos
até ter certeza de que eu não arrancaria meu pé.

Meu corpo ficou tenso.

— Faz você levar por causa do Carlos?

Assentiu.

— Já que presenciei a última briga deles, o Teo ficou


preocupado que Carlos se lembre do meu rosto e tente me
ferir para atingi—lo.

— Jesus, Evie.

— Eu disse o mesmo.

Queria alivia-la do medo, mas Carlos era


suficientemente desgraçado para fazer algo assim.
Continuamos em silêncio antes que pudesse tomar coragem
para perguntar sobre ela e meu irmão.

— Evie, como é estar casada com Teo?

Isso a fez sorrir.

— É perfeito. Ele me faz mais feliz do que pudesse ter


imaginado.

184
— Perfeito? — Esfreguei os olhos— Mesmo com toda
essa bagagem?

O sorriso de Evie se desvaneceu.

— Lety, Carlos é um imbecil. Todos sabemos, mas


nem você, Teo ou Sofia o fizeram assim. Gostaria que
continuasse preso? Claro. Mas por enquanto está livre e
temos que lidar com isso.

— E nossa mãe?

— Sim. Com ela também. — Suspirou, com um tom


de lástima— É uma vítima, Lety. De certa forma, acredito que
sempre será.

— Mas apesar da nossa desastrosa família, continua


com Teo?

— Tenho que estar, Lety. — Olhou-me— Amo-o.


Minha vida não é nada sem ele.

E novamente precisei de um lenço. Droga, eu não era


tão sensível.

— O que está acontecendo entre você e Brody?

Assoei o nariz.

— Quer cuidar de mim.

Evie levantou uma sobrancelha perfeita.

— Isso é tão ruim?

185
— É quando você vem da merda de onde venho. —
Coloquei o lenço na sacola e me estiquei para o álcool gel de
bolso que havia no porta luvas— Minha mãe sempre quis que
cuidassem dela, em troca cozinharia, limparia e ficaria com
seu homem, custe o que custar. — Bufei. — No lugar de ser
cuidada, terminou casada com um monstro que batia nela e
em seus filhos.

— Então, se deixar Brody cuidar de você, terminará


como sua mãe.

— O que quero dizer é que nunca me permitiria ficar


nessa posição, com ninguém.

— Lety...

— Ev, é assim que me sinto. — Assinalei com um


lenço. — Gostaria de não me sentir assim, mas olhe o que
nos trouxe as decisões de minha mãe.

Evie trocou de faixa quando a caminhonete em frente


a ela diminuiu a velocidade.

— Sei que tem medo, Lety. Mas não deixe o passado


determinar quem você será ou poderá ser seu. Teo quase
permitiu que acontecesse e por pouco não o perdi.

Suspirei.

— É difícil quando o passado não para de se meter


em meu presente. Viu mamãe depois da última briga com
Carlos?

186
— Sim, vi-a.

— E ela o perdoou de novo, não é?

— Não só isso. Voltou a morar com ela.

— O quê? Então onde diabos está Sofia?

Ela apertou mais o volante.

— Teo fez com que Sofia se mudasse para nossa


casa. Sabe que não demorará muito antes que Carlos volte a
enlouquecer.

— Não. É verdade. — Meu estômago se retorceu,


imaginando minha mãe ferida caminhando com muletas
enquanto atendia os desejos de Carlos. Furiosa com ambos,
considerei cortar a ajuda financeira. Mas não podia porque
tinha certeza de que minha mãe ainda a necessitava— Como
consegue, Evie?

— Consegue o quê?

— Ficar com um homem cujo pai é tão


desequilibrado que você precisa carregar uma arma para o
caso dele aparecer?

— Já lhe disse isso, amo Mateo.

— Evie. Não é tão fácil. Estou surpresa de que não


tenha fugido.

Evie baixou os óculos de sol quando chegamos a uma


curva e o sol começou a bater em nossos rostos.

187
— A coisa é assim. Minha vida era uma merda antes
de começar a sair com Teo. Além de minha amiga Lourdes,
ninguém mais se importava comigo. E seu irmão não deveria
ter sido a exceção, mas foi. — Limpou uma lágrima solitária
da bochecha. — Teo gastou seu tempo para me conhecer e
me amar, quando somente eu me amava. Ninguém se afasta
de alguém tão bom de qualquer jeito.

Não sabia se foi seu tom desolado, suas lágrimas ou


suas palavras, mas em pouco tempo eu também chorava. Por
um instante, não podia respirar, imaginando o que a levou a
render-se completamente ao amor... e compreendendo que
sou incapaz de fazer o mesmo.

— Lety, você está bem?

Coloquei minhas mãos trêmulas debaixo de minhas


coxas.

— Lety?

O amor era perigoso, recordei firmemente.

— Estou bem— foi tudo o que disse, embora não


estava certa. Estava tão arrasada.

Evie não pressionou e me deu um momento para me


recompor. Olhei uma minivan nos passar, seguida por um
Dusang velho e um ônibus escolar, antes que Evelyn tomasse
a primeira saída para Philly.

— Não te agradeci por vir me ajudar. Mas obrigada.

188
Sorriu brandamente.

— Teo queria vir, mas estava ocupado entrevistando


a outra equipe de mecânicos.

— Outra equipe? Vão abrir outra empresa?

Ela riu.

— Não. Outras duas.

— Uau. Isso é incrível.

— Sei, pode acreditar? A estrutura de negócios de


Teo e seu treinamento militar ajudaram. Ensina seus
meninos a serem rápidos, eficientes e confiáveis. Fazem mais
porque podem assumir projetos mais complexos e terminar
em menos tempo por menos dinheiro. Começou com nosso
amigo Pete, o policial de Philly, contando aos seus amigos
policiais. O rumor se espalhou pela polícia da cidade, entre
seus amigos e familiares. Agora o Estado ofereceu ao Teo um
contrato para manutenção e reparação das patrulhas
policiais.

— Nossa...

— Sei. — Estava radiante— Ninguém esperava que


isto crescesse tanto em tão pouco tempo. Estou muito
orgulhosa dele.

— Deve estar extasiado.

Suspirou.

189
— Está, mas acredito que com tudo que está
acontecendo entre Carlos e sua mãe, não consegue desfrutar.

Não gostei do seu tom de preocupação.

— Ev, como ele está levando? Sinceramente.

Seus lábios se torceram como se lutasse entre me


dizer isso ou não. Quando pensei que não diria nada, dobrou
em uma rua lateral a poucas quadras da oficina principal de
Teo e estacionou.

— Não muito bem. Está preocupado de que a


próxima vez que Carlos bater em sua mãe, ela não se
levantará. Também se preocupa com o que Carlos pode fazer
se me encontrar sozinha.

Olhei-a.

— Ev. Não posso culpá-lo. Não somente porque


Carlos é louco, mas também é mau. Adicione as drogas, não é
uma boa combinação. Tem que tomar cuidado, entende?

Evie baixou o olhar.

— Sei. É um dos motivos pelo qual vivemos numa


comunidade fechada. Teo está tão obcecado com minha
proteção que fez com que um velho amigo do exército
instalasse um sistema de segurança de alta tecnologia. —
Sacudiu a cabeça— Deveria ver o controle remoto disso. Juro
por Deus que essa coisa deve disparar raios laser.

Ajustei meu cinto.

190
— Se Teo é tão protetor, estou surpresa por deixá-la
dirigir até Allentown para me pegar.

Seu rosto ficou vermelho e voltou para a estrada.

— Eu, eh, tinha uma consulta médica e estava


saindo, por isso fazia mais sentido se a buscasse. Além disso,
estava ocupado hoje com as entrevistas e negociações
contratuais entre seu advogado e o do Estado.

Sua repentina preocupação me alarmou.

— E por que foi ao médico? Está bem, querida?

Abri os olhos como pratos ao vê-la ruborizar mais e


não responder. Voltei minha atenção à estrada. OH, Meu
deus. OH, Meu deus. OH, Meu deus.

Evie ficou em silêncio até chegarmos ao


estacionamento de Autos M&E, junto a um Volkswagen
Carocha cor azul escura com um detalhe rosa. Procurou em
sua bolsa e pôs um jogo de chaves em minha mão, sorrindo.

— Feliz Natal adiantado.

Olhei as chaves, certa de ter entendido mal.

— Como?

Seu sorriso permaneceu no rosto.

— Teo o comprou usado e arrumou para vender. Com


tudo o que aconteceu e o sucesso nos negócios, pensamos
que o melhor seria lhe dar de presente.

191
Respirei fundo, mas meus olhos lacrimejaram de
todas formas.

— Não posso aceitá-lo.

Fechou sua bolsa.

— Lety, entendo suas dúvidas em deixar Brody te


ajudar. Mas somos família. É o mínimo que podemos fazer. —
Sua voz baixou enquanto me puxava contra seu corpo— Sofia
me disse que mandou dinheiro para sua mãe.

Gemi.

— Teo sabe?

— Sim e está chateado, acredita que Carlos está


cheirando tudo.

— Sim. Também pensei nisso. Mas se não for assim,


não posso deixar que ela passe necessidades.

— Entendo e devo te dizer que estamos no mesmo


barco. — Retirou—se, mas manteve uma mão em meu ombro.
— Sei que está zangada com sua mãe, Lety, e que deve ter
sido muito difícil ajudar. Mas, embora Teo e eu, apreciemos
seu esforço, acreditamos que está fazendo muito.

— Brody diz o mesmo— disse em voz baixa.

Sorriu brandamente.

— Então pegue o carro, Lety. Uma vez em sua vida,


deixe-nos ajudá-la.

192
Limpei meus os olhos com o dorso da mão.

— Acreditei que me emprestaria seu velho Cherokee.

Riu.

— Meu pobre monstro e sua velha sucata serão


desmontados e doados a uma escola técnica local. Desfrute
do Coroca, Lety. É lindo, também deixará Teo e a mim felizes.

Levei vários minutos para ceder. Abracei-a com força,


tentando manter a calma.

— Obrigada.

— De nada, querida. — Esfregou as minhas costas—


Agora, venha. Vamos ver seu irmão.

Soltei-a.

— Está bem, mas não posso ficar.

— Por que não?

— Devo voltar para a escola. O quanto antes.

— Porque não fica para o jantar?

— Eu, eh, acredito que você e Teo deveriam jantar


sem mim.

Suas bochechas rosadas mostraram que a apanhei,


mas não disse mais nada. Tinha que compartilhar a notícia
com seu marido. De nenhuma forma arruinaria sua surpresa.
Saímos do carro. Depois de uns minutos admirando meu

193
presente e de várias lágrimas de agradecimento, dirigimos até
a oficina.

Evie passou uma mão ao redor de meus ombros.

— Agora, não pense que estamos te pagando. Se


precisar de dinheiro, fale conosco. Concorda?

Devolvi o abraço.

— Concordo. — Disse, mas isso não queria dizer que


fazia uma promessa. O inferno se congelaria antes que eu me
aproveitasse de sua bondade.

Caminhamos atrás das enormes janelas principais


onde podia ver meu irmão. Com um metro noventa e cinco,
musculoso, era difícil não encontrá-lo. E com esses preciosos
e latinos olhos cor de avelã, era difícil ignorá-lo. Sabe esses
homens que as mulheres devoram com os olhos? Sim, assim
era o meu irmão.

Um exemplo disso: uma assanhada com um maldito


menino em seu quadril e outro correndo em círculos ao redor
dela, estava olhando-o como se ele fosse um doce que queria
lamber. Sério, falo de um decote escandaloso, um grande
sorriso e uma mão bem em cima de seus seios. A garota tinha
muita coragem, especialmente com sua baba quase caindo
em seu bebê.

Virei a cabeça para Evie. Sim, ela percebeu. Pôs os


olhos em branco.

194
— Bem-vinda a meu mundo. Às vezes não é tão
divertido que seu marido seja um mecânico sexy.

Mateo assobiou ao menino atrás do painel quando


nos viu. Quando estávamos entrando, a caixa já estava
cobrando a senhora.

— São mil quinhentos e setenta e nove no total.

A mulher entregou seu cartão, sem deixar de olhar o


traseiro de Teo. Ele continuou ignorando-a e puxou Evie para
um beijo.

— Tudo bem, bebê?

Ela sorriu.

— Conversamos daqui a pouco, sim?

Franziu o cenho ao vê-la ruborizada, mas se voltou


para me empurrar brincando.

— O que há com você?

— Nada. — Perto de meu irmão, a fachada de garota


alegre jamais desaparecia. — Obrigado pelo carro. Eu te
pagarei.

— Não, não pagará. Ficará com ele e o usará, sempre


e quando for para a faculdade. Se o abandonar, chutarei seu
traseiro logo que souber.

— Oh, mas se quer chutar meu traseiro, terá que


deixar a sua linda esposa para me encontrar. — Apontei o

195
braço que ele mantinha na cintura de Evie— Ouça, menino
bravo. Não sei se poderá dirigir e ficar tanto tempo separado
de sua mulher.

Riu e me despenteou.

— Realmente é um pé no saco. Vamos para nossa


casa. Preciso tomar banho antes do jantar.

— Não posso. Devo voltar para a faculdade.

— Pensei que ficaria.

Não conseguia conter a emoção, sabendo que ele e


Evie precisavam ficar sozinhos.

— Tenho muito que fazer, assim não atrapalhe.

Mudou sua atenção de mim para Evie como se


sentisse que algo andava mal. O olhar dela foi para o chão.
Ele a soltou lentamente, o suficiente para me abraçar.

— Ok. Mas tente nos visitar em algum fim de semana


quando puder. Tentei não chorar de novo quando o abracei.

— Obrigado Teo. Ouça... eu te amo, ok? Parabéns


pelo seu grande contrato.

— Também te amo. — Soltou-me. — Se precisar de


algo, ou se Carlos aparecer, chame-me. Entendido?

— Sim. Alto e claro. — Beijei Evie na bochecha e corri


para porta. Dado que sempre respeitava a privacidade alheia,
escondi atrás do edifício, e espiei pela janela aberta.

196
Agora Evie estava de costas. Vi os braços de Teo
envolver suas costas quando ela elevou o queixo para falar
com ele. Não podia ouvi-la, mas sim, vi claramente o rosto de
Teo. Congelou ante o que dizia Evie. Seus ombros tremeram e
notei que ela ria. Disse-lhe outra coisa. Teo a aproximou dele,
envolvendo-a protetoramente, sua expressão dividida entre a
surpresa e a preocupação. Sussurrou algo ao ouvido dela.
Evie assentiu. E então os lábios dele formaram um pequeno
sorriso.

Então eu fui embora, emocionada com meu carro


novo e mais que feliz. Meu irmão deixaria de ser
simplesmente meu irmão. Agora seria pai.

197
CAPÍTULO 12
Passei outros minutos revisando o interior de meu
novo veículo antes de escrever um SMS para Brody.

Oi. Estou voltando para a escola.

Sua mensagem foi quase instantânea.

Isso foi rápido.

Sei. Mas hoje não foi um bom dia.

Aconteceu alguma coisa?

Tudo acontecia quando vinha de minha mãe e


Carlos, mas não entre Teo e Evie. Sorri como uma parva
enquanto falava pelo microfone.

Evie está grávida.

Calou-se.

É verdade.

Não parecia.

Brody tinha razão. Ela ainda estava bem magra no


doce vestido fúcsia.

Acredito que está de pouco tempo. Soube hoje.

198
Mas estão felizes, não é? É algo bom, não é?

Pensei na expressão de puro choque no rosto de Teo.


Estava morto de medo. Mas quando vi a forma como pegou
Evie em seus braços, soube que ficaria bem.

É a melhor coisa que aconteceu em muito tempo.

Genial.

Volto em uma hora e meia aproximadamente.


Estará aí?

Tenho Engenharia 3.5, mas posso faltar.

Não falte.

Não tem problema.

É importante para sua carreira e não quero isso.


Vemos-nos amanhã, está bem?

Por que amanhã?

Tamborilei meus dedos sobre o volante enquanto


falava.

Tenho que procurar seus pais e falar com eles.


Roger se comprometeu a cobrir meu turno da noite se
precisar.

Vai ficar toda a noite na casa?

Sim. Se me receberem.

199
Brody demorou um tempo para responder.

Durma bem.

Sim?

Sim. Estou bem tranquilo com isso. Escreva-me


quando voltar ao campus.

Bom. Adeus.

Adeus, Letz.

Liguei o motor e passei o resto de minha viagem de


volta à escola brincando com o sistema de som, o Bluetooth e
conhecendo meu novo carro. Quando cheguei ao campus,
parei em meu quarto para trocar para meu uniforme e
arrumar uma bolsa para passar a noite. No momento em que
calcei meus sapatos esportivos, escrevi ao Teo e ao Brody
para avisar que cheguei.

Geralmente, vestir o uniforme me colocava em modo


trabalho. Hoje, isto me levou a ter um ataque de pânico.
Temia minha iminente interação com os Moore e não estava
segura do que faria se me pressionassem. Brody disse que
podia continuar trabalhando ali porque ele era o chefe. Isso
era genial em teoria, mas seus pais me aceitariam de volta?
Especialmente depois de que virtualmente disseram a seu
filho que fosse para o inferno?

Joguei minha bolsa e mochila no carro e ensaiei o


que diria quando estivesse lá. Por mais que Brody e eu

200
tivéssemos conversado, não tínhamos discutido o que diria a
seus pais ou o que pensava lhes dizer. Talvez quisesse falar
com eles em particular. Talvez fosse melhor e seria mais fácil
para mim os enfrentar.

Ou talvez não.

Gus me deixou passar pelas portas sem sequer


piscar. Pelo menos não tentou atirar em meus pneus ou dizer
que eu não era bem-vinda ao local. Cheguei à casa, estacionei
perto do pequeno lago e subi os degraus. Mal cheguei perto
da porta quando Roger saiu.

— Olá, Lety,— disse. — Obrigado pela troca.

Manteve a porta aberta até que subi.

— Disseram alguma coisa?

Franziu o cenho, sua pele escura era uma sombra


estranha sob a luz deslumbrante da entrada.

— A respeito do quê?

— Oh, nada.

Inclinou a cabeça, mas logo encolheu os ombros.

— Até mais tarde, garota.

Tudo bem até aqui. Arrumei os ombros, abracei


minha garota do interior de Philly e entrei na casa, decidida a
resolver as coisas. Os pequenos assobios do respirador e o

201
som longínquo das respirações controladas do Sr. Moore me
atraíram em direção da cozinha bem iluminada.

Dei um passo pelo arco e parei abruptamente. Brody


estava sentado na mesa da grande cozinha entre seus pais. A
cadeira de rodas do Sr. Moore se reclinou ligeiramente para
dar espaço ao Tommy, que agora parecia ser um elemento
permanente em seu colo. Dionna segurava a mão de Brody,
apertada dentro das suas. Não estava certa do que estavam
discutindo antes da minha chegada, mas baseada na tensão
espessa da atmosfera, deve ter sido memorável.

Todos os olhos se voltaram para mim.

— Olá— disse Brody.

— Ah, olá— consegui dizer.

O rosto do Tommy se iluminou.

— Let—tee!

Saiu do colo de seu pai e se jogou feliz para mim,


envolvendo seus pequenos braços ao redor de minha cintura.
Revolvi seu cabelo, levando um tempo para reunir coragem.

— Olá, amigo.

— Fora? — Perguntou, apontando a porta. As luzes


traseiras brilhavam ao longo do amplo terraço. Além disso, a
escuridão cobria a propriedade como uma manta de lã
grossa.

202
— Fora? — Perguntou de novo.

Ele era bastante insistente.

— Está muito tarde e muito escuro, campeão. — Seu


lábio se inclinou para baixo. — Tenho que falar com sua
mamãe e papai primeiro, mas talvez depois podemos pensar
em outra coisa para fazer. — Se não me despedirem por
agarrar seu irmão. Obviamente, não o disse.

Levantei o queixo. O Sr. Moore e Dionna continuaram


me observando. Está bem, isto ia ser um canhão de há—hás6.
Peguei a mão de Tommy e me aproximei.

— Sr. Moore, Sra. Moore, desculpem-me por sair


daquela maneira ontem. Meu comportamento foi pouco
profissional e impróprio de um auxiliar de enfermagem
formado. Asseguro-lhes que não voltará a acontecer.

Esperei. Ninguém disse nada no que pareceu uma


eternidade. Muito bem.

— Não estou certa do quanto discutiram com Bro.


seu filho... seu outro filho. — Merda. — Mas quero que
saibam que levo minha profissão e o cuidado de meus
pacientes muito a sério. Estou envergonhada por não mostrar
o cuidado exemplar que merecem e espero que possam
perdoar minha atitude inapropriada.

6
Há—há: Foi utilizado em antigas fortificações com o fim de atrasar o avanço dos atacantes.

203
Ainda nada, à exceção de Tommy insistindo em que o
rodasse. Está bem, amigos. Concedam-me uma folga. Fiquei
sem palavras para continuar.

Quando não disse mais nada, Dionna e o Sr. Moore


se centraram em Brody. Ele sorriu.

— Lety é minha namorada.

Fiquei boquiaberta e minha língua poderia ter caído


no chão. Oh, sim, eu era uma profissional nata.

— Você... — Dionna me olhava como se tivesse sido


esbofeteada. — Ela é sua namorada?

— Sim.

Dionna ficou de pé.

— Desde quando?

— Do primeiro ano de universidade, tecnicamente.

Dionna passou a mão sobre seu peito, como se


estivesse tendo um infarto.

— Lety é a garota que rompeu seu coração?

Doce Jesus, ajude-me.

Piscou para mim.

— Sim, foi ela.

204
— Espere— ele— fez— isso— foi minha volta
impressionante.

— É sério? — Perguntou o Sr. Moore em voz baixa,


levando um tempo para respirar entre suas palavras.

O sorriso de Brody ficou mais contido, assim como


seu tom.

— Sim. É sério,— levantou e se aproximou de mim, o


que foi doce até que passou o braço ao redor de minha
cintura e me beijou na testa. Diante de seus pais. Deus me
ajude.

Brody ignorou o calor queimando através do meu


rosto.

— Quero me desculpar de novo por te envergonhar e


ferir seus sentimentos.

Meu olhar baixou, me dando conta do impacto de


sua desculpa na presença de seus pais.

— Está tudo bem, Brody.

— Letz, não está. Não merecia o que fiz com você.


Juro que esta não era a forma como queria te apresentar a
meus pais.

Um sorriso pequeno e grato surgiu em meu rosto.


Então ele planejou me apresentar.

205
Devolveu-me o sorriso antes de se concentrar em sua
mãe.

— Se forem enlouquecer, enlouqueçam comigo. Lety


é minha garota, mas é suficientemente forte e inteligente para
não se envolver em minhas merdas.

— Linguagem— advertiu o Sr. Moore.

Brody apertou os lábios. Supus que o Sr. Moore era


mais crítico com seu filho amaldiçoando que eu quando o fiz.
Não estava certa se a intenção de Brody era desculpar-se,
mas não podia esperar. Fiquei calada tempo suficiente.

— Asseguro que não sabia que Brody era seu filho. A


agência me colocou aqui porque era perto da universidade.

— Saber disso teria afetado sua decisão de trabalhar


aqui? — Perguntou o Sr. Moore.

Embora não tenha dito diretamente, ele questionava


se eu conhecia os segredos de sua família. Não queria mentir,
mas também não queria ofendê-lo. Por mais que amasse ao
Brody, tinha um sentido de lealdade com relação a seu pai.
Assim respondi da melhor maneira que consegui.

— Sim, teria.

O Sr. Moore permitiu que sua máquina dessas duas


respirações longas em seu lugar.

— E como se sente agora?

206
Considerei o que dizer, apesar de ter ensaiado
minhas palavras cem vezes no caminho para cá.

— Gostei de trabalhar aqui e conhecê-los. Se


desejarem, continuarei. Dito isto, sinto que minha presença
não seria apropriada, a menos que todo mundo esteja de
acordo. — Deixei meus problemas financeiros fora disso e
esperava que Brody também o fizesse.

Dionna permaneceu muito tranquila, esperando,


imaginava, que o Sr. Moore tomaria uma decisão. Baseada no
que me havia dito Brody, de sua relação e minha interação
com eles, sabia que estaria de acordo com a atitude que seu
marido tomasse.

— Muito bem, Lety. Sempre e quando se sentir


cômoda— respondeu finalmente o Sr. Moore.

Talvez só imaginasse, mas o Sr. Moore parecia


aliviado. Dionna assentiu, mas não se incomodou em
acrescentar algo a declaração. Brody? Sim, era puro
espetáculo. Atraiu-me para si e se inclinou para juntar-se aos
meus lábios. Movi a cabeça tão rapidamente que seu beijo
acabou em meu rabo-de-cavalo. Ele franziu o cenho quando
me separei.

— O que está fazendo?

Apertei os dentes.

— O que quer dizer com o que estou fazendo?

207
Problemas surgindo sob seu sorriso malicioso.

— Sério, não vai me deixar te beijar?

— Estou trabalhando.

— Não está. Está de pé na cozinha.

— Brody, estou com seus pais!

— E?

Levou tudo o que tinha para não perder a paciência


no modo latina, ficando completamente louca.

— E não é apropriado!

Fingiu surpresa.

— Mas, bebê, você me deixa te beijar todo o tempo.

— Brody— adverti.

— Quero dizer, justo nesta manhã, nós...

— Estão dormindo juntos? — Perguntou Dionna.

Mate-me, Jesus. Deus não quis escutar.

Disse que não ao mesmo tempo que Brody respondeu


que sim.

Isto caiu em Dionna tão bem como eu pensei. Ela


levantou as sobrancelhas, seu tom de estridente.

— O que vai ser? Sim ou não?

208
Brody entrelaçou seus dedos com meus e apertou.

— Como disse, mamãe, as coisas são sérias entre


nós.

Pensei que me acertaria na cabeça com a fruteira de


cristal. Isso era provavelmente o que teria feito minha mãe.
Ao invés disso, aproximou-se de Brody e negou com a cabeça
antes de ficar nas pontas dos pés para lhe beijar a bochecha.

— Tome cuidado, querido. Não quero ser avó antes


do tempo.

— Está bem, mamãe,— respondeu Brody enquanto


eu fazia o possível para não desmaiar. Riu quando viu minha
cara de assombro. — O que está acontecendo, Letz? Nós, os
brancos privilegiados, estamos te assustando?

— Não seja desagradável— disse-lhe.

Soltei sua mão e caminhei para seu pai com Tommy


em meus calcanhares. Afastou-se de mim quando Brody se
aproximou, observando-nos curiosamente em silêncio.
Coloquei minha grande bolsa de lona sobre a mesa.

— Preparado para brincar de doutor, amigo?

Assentiu com entusiasmo e procurou na bolsa meu


estetoscópio.

— Vou avaliá-lo, está bem, Sr. Moore? — Meu rosto


se manteve bem quente depois da honestidade brutal de
Brody a respeito de nossa relação e seus sentimentos. Evitei

209
contato visual direto com o Sr. Moore, incapaz de enfrentá-lo
nesse momento.

— Tudo bem.

Jogou-me um olhar e notei a sugestão de um sorriso


de aprovação. Eu devolvi, esperando que sua aprovação fosse
em relação ao fato de que eu estivesse com seu filho.

— Tosse ou sintomas de resfriado hoje?

— Não.

— Bom.

Coloquei minha mão em sua testa para verificação de


temperatura, em seguida avaliei a circulação na ponta dos
dedos. Brody me observava à distância, falando em voz baixa
com sua mãe. Quando comecei a desabotoar a camisa cor
oliva do Sr. Moore, Brody veio para perto de mim.

— Lety, que droga você está fazendo?

Peguei o estetoscópio que Tommy me passou, minhas


sobrancelhas franzindo-se.

— Estou prestes a verificar os pulmões de seu pai. —


Brody me olhou boquiaberto— É parte de minha avaliação
física. — Horror cobriu suas feições— Assim confirmo se seus
pulmões estão limpos.

— Tem que tirar a roupa dele para fazer isso?

Fiquei de pé e pus as mãos nos quadris.

210
— Não tem que estudar para uma prova?

O alarme no respirador estalou quando o Sr. Moore


riu. Brody tremeu como se tivesse levado um susto.

— O que ele tem?

— Ele está bem. Só está rindo do seu comportamento


ridículo. — Ajustei o auscultador do estetoscópio nas orelhas
e o diafragma sobre o peito do Sr. Moore.

— Não é ridículo.

— Vá estudar, Brody.

— É minha namorada e está tirando a roupa do meu


pai!

Pus os olhos em branco.

— Brody.

— Isso é assustador demais.

Mais alarmes. Mais risadas afogadas do Sr. Moore.


Bem. Faremos à sua maneira. Pisquei para o Sr. Moore.

— Se não puder aceitar isto, realmente terá um


problema quando chegar a hora do banho.

— Eu gosto de bolhas,— adicionou o Sr. Moore.

A pele do Brody ficou cinza. Pus-me a rir, unindo-me


ao Sr. Moore enquanto seu respirador gritava em protesto.

211
— Vocês não são engraçados,— queixou-se Brody.

— Não é minha culpa que o comediante não possa


aceitar uma brincadeira. — Levantei a mão do Sr. Moore para
bater com a minha, logo terminei minha avaliação da cabeça
aos pés.

Dionna levou Brody de volta a sua cadeira quando o


Sr. Moore riu uma vez mais.

— Não se preocupe, querido. Roger e eu ainda


cuidamos das necessidades mais pessoais de seu pai.

O rosto de Brody relaxou.

— Graças à Deus.

Passei à avaliação de Tommy depois de limpar meu


estetoscópio com álcool. Ele levantou a camiseta do Huck
para que eu pudesse auscultar seu coração e pulmões mais
facilmente. Perguntei a Brody:

— Está bem com isto ou prefere que mantenha meus


olhos fechados, assim não vejo nada delicado?

Brody sorriu e não no bom sentido.

— Você sabe que vai pagar por isso?

— Vá em frente, gostosão.

Não deveria ter zombado dele como fiz, mas às vezes


não posso manter a boca fechada. Brody era um vingador
perito. Golpearia quando eu menos esperasse.

212
CAPÍTULO 13
Fiz tapas de milho para todos, acompanhadas com
abacate, nata azeda e o que sobrou do frango desfiado da
noite anterior. Brody comeu conosco, dando dentadas
enquanto estudava para seu exame de engenharia.

Dionna estava surpreendentemente feliz quando


todos nos acomodamos para comer.

— Isto não é adorável? Não posso recordar a última


vez que comemos juntos como uma família.

Sorri ante a piscada de Brody. Meu sorriso se


desvaneceu com o seguinte comentário dela.

— Talvez Lety e eu pudéssemos ir às compras


qualquer dia.

Amassei um pequeno pedaço de abacate com um


garfo e pus na boca do Sr. Moore.

— Sinto muito, Dionna, mas isso não é realmente


algo que possa me dar ao luxo de fazer.

— Tolices, Lety, querida. Eu pagarei.

Fiquei envergonhada, cada vez mais desconfortável.

213
— Desculpe-me, mas não me sinto à vontade para
permitir que você faça isso.

A excitação da Dionna desapareceu. Droga. Ela


estendeu uma bandeira de paz e tudo o que fiz foi esbofeteá-
la no rosto com a mesma. Brody levantou o olhar de seu
trabalho.

— Mamãe, Lety é muito orgulhosa para te deixar


levá-la ás compras.

Dionna bateu na frente de sua blusa cor nata,


embora não havia nada sujando-a.

— Mas certamente te permite pagar algumas coisas.

Fiquei rígida ante seu comentário, consciente de que


o Sr. Moore me observava.

— Na verdade, não permito.

Continuei alimentando ao Sr. Moore, como se aquilo


não tivesse me afetado. Brody ficou em pé e se alongou.

— Lety não me deixa comprar nada, mamãe. — Ele


sorriu. — Na verdade, fica brava se me ofereço para fazê-lo,
de vez em quando me deixa pagar o jantar ou um filme, mas
isso é tudo.

As sobrancelhas do Sr. Moore franziram ao terminar


de engolir.

— Você está ciente do seu patrimônio?

214
— Não e não me interessa saber. — Meu tom
permaneceu cortês, mas decidido. O dinheiro era algo que
estava acostumada a não ter. Possivelmente, por isso não me
importava se Brody o possuía ou não.

Terminei de alimentar o Sr. Moore em silêncio,


consciente de sua inspeção e a de sua esposa sobre mim.
Provavelmente, pensavam que enterrei minhas garras em
Brody pelo tamanho de sua carteira. Na verdade, agora que
compreendi melhor sua riqueza, assustei-me. Imaginei que
morava em uma casa bonita. Nunca imaginei este nível de
extravagância.

— Isto estava delicioso, Lety,— disse o Sr. Moore


quando terminou de engolir sua última porção. — Está entre
meus favoritos.

— Obrigado. Fico feliz que gostou. — Ainda não podia


encará-lo. Não, não me sentia insegura nem nada. Não,
absolutamente.

Com muitíssimo cuidado, limpei sua boca e logo


retornei ao lavabo para lavar as mãos. Surpreendi-me quando
Brody pôs seus braços a meu redor e beijou meu pescoço.
Separei-me dele e, oh, sim, seus pais estavam nos
observando.

— Brody, o que está fazendo?

Caminhou para mim e tropecei ao recuar, seu sorriso


malicioso no rosto.

215
— Agradecendo-a pelo jantar.

— Tenho que terminar de cuidar de seu irmão e seu


pai, depois acomodá-los na cama. — Parei quando minhas
costas bateram contra a porta da despensa. — Possivelmente
é hora de dar boa noite e voltar para o campus.Eu o verei no
almoço amanhã.

Seu sorriso se ampliou.

— Não vou retornar ao campus.

Senti meu estômago revirar.

— Você... Brody, não pode ficar aqui.

— Está me dizendo que não posso ficar em minha


própria casa?

Estreitei os olhos.

— Você, pequeno... esse era seu plano desde o


começo, não é ... a razão de estar tão tranquilo de que ficasse
esta noite?

— Sim.

Abaixei para poder ver seus pais.

— Se vai ficar, então talvez eu devesse ir.

Franziu o cenho.

— Não vou ficar aqui sem você.

216
Dionna parou quando estava pondo o prato de
Tommy na máquina de lavar pratos e se apressou para mim.

— Lety, tenho planos esta noite e devo insistir que


fique. — Olhou ao Brody— Embora não esteja certa de que
fiquem na mesma casa.

Brody cruzou os braços.

— Mamãe, somos adultos...

— Escute sua mãe,— espetei. Voltei à mesa, meus


passos rápidos enquanto o Sr. Moore me analisava com as
sobrancelhas levantadas. — Não se volte contra mim,
Judas,— disse-lhe. Enquanto dava as costas para limpar as
mãos e boca de Tommy. — Vamos, hora do banho.

— Vai de verdade dar banho em meu pai?

Virtualmente grunhi a Brody quando passamos ao


seu lado.

— Estava falando com Tommy, Capitão Assustador.

A cadeira de rodas do Sr. Moore desviou quando


tentou conduzi-la e rir ao mesmo tempo. Seu alarme de
ventilação soou como se houvesse um iminente colapso
nuclear no vestíbulo. Suspirei quando Brody deu a volta pela
mesa.

— Vamos, bebê...

217
Tentei não perder o controle com ele empurrei a
cadeira de seu pai para o elevador.

— Brody, de verdade está atrapalhando o meu


trabalho.

Sorrindo, falou comigo em espanhol.

— Por que não dorme comigo aqui? Fazemos isso o


tempo todo na escola.

Pressionei o botão do elevador e conduzi Tommy


pelas escadas, respondendo a Brody no mesmo idioma.

— Porque você sabe, e eu sei, que não dormiremos se


estivermos juntos.

Assentiu, continuando em espanhol, seu acento


perfeito.

— Se não formos dormir, então o que faremos?

Continuamos nossa conversação enquanto subíamos


ao segundo andar. De maneira nenhuma teria esta conversa
em inglês.

— Não falarei o que acontece quando estamos


sozinhos, Brody.

— Beijaremos?

— Brody.

— Tocaremos?

218
— Brody.

— Letz, somos adultos.

— Então se comporte como um. Estou trabalhando.

Sorriu com malícia.

— Ainda pode trabalhar e ter um pouco de diversão


na hora de dormir.

Abri a porta de cima, permitindo que o Sr. Moore e


Tommy passassem. Tommy saiu correndo para o seu quarto,
sabendo que era hora de escolher o pijama. O Sr. Moore o
seguiu, mas ficou perto de nós.

— Tenho que permanecer alerta caso seu pai precise


de mim.

— Então a manterei acordada. Toda a noite se for


necessário. O que posso dizer? Sou bom nisso.

— Brody, não posso me concentrar em manter seu


pai seguro, se você estiver me acariciando.

Minhas bochechas se aqueceram apesar da conversa


não ser em inglês. Os ombros do Brody se balançaram e
tossiu em seu ombro, tentando esconder sua diversão.

— Falo sério, Brody. Não brincarei com você se isso


significa colocar em perigo o cuidado ou a segurança de sua
família.

219
Os Srs. Moore e Brody me seguiram ao monstruoso
banheiro. Abri a torneira da grande banheira e acrescentei
sais de banho à água. Depois coloquei a bandeja e os objetos
para o cuidado oral do Sr. Moore.

— E se eu prometer controlar minhas mãos? —


Perguntou Brody de novo em espanhol.

Grunhi.

— Sabe que não o fará, eu também não.

Riu entre dentes.

— Sério?

— Sim.

— Então me deseja?

Conectei os canos de sucção e liguei a varinha oral


dramaticamente.

— Sim. Eu te desejo. desejo muito, quente, duro


como o aço e extremamente sensual. Aí está. Está feliz?

Brody jogou a cabeça para atrás, rindo.

— Agora estou,— disse, falando novamente em


inglês.

— Bem. Agora, se comporte para que eu possa cuidar


de seu pai. — Coloquei uma toalha sob o queixo do Sr.
Moore. — Pode abrir sua boca para mim, senhor?

220
— Lety?

— O que, Brody?

— Esta é uma boa hora para dizer que meu pai é


fluente em quatro idiomas?

Fiquei completamente imóvel, minha mão apertada


ao redor da varinha oral e meu rosto tão quente que pensei
que minha cabeça racharia e expeliria lava.

— O.. ah, espanhol... são um deles? — Grasnei.

— Sim,— respondeu o Sr. Moore.

Uma vez mais, os alarmes de ventilação ressonaram


em modo nuclear. Controlei-me para não chutar Brody nas
costelas quando caiu no chão em meio a um ataque histérico.

— Oh, vamos. Não pode estar ainda zangada comigo,


pequena.

Ajudei o Sr. Moore a ajustar sua cadeira junto à


cama e trocá-lo para o modo manual.

—Caso não tenha notado, estou. — Não lhe disse


nenhuma palavra durante o banho do Tommy e até terminar
os cuidados om o Sr. Moore. Apontei ao Sr. Moore quando ele
sorriu. — Você também. Supõe-se que deveria estar de meu
lado.

— Baby,— disse Brody.

221
— Não me diga "baby". Não posso acreditar que me
fez dizer sacanagem na frente de seu pai!

— Sacanagem? Como eu gosto de como isso soa.

Esquivou quando atirei nele uma embalagem


plástica. Murmurei uma maldição e me virei para ligar o
respirador que o Sr. Moore usava ao dormir. Meus dedos
voaram pela tela enquanto revisava duas vezes para me
assegurar de que os parâmetros estivessem ainda na
configuração apropriada.

Brody esfregou minhas costas.

— O que está fazendo?

Embora permanecesse bastante zangada, não pude


deixar de aproveitar a oportunidade de explicar os cuidados
de seu pai, especialmente, quando estava demonstrando
interesse.

— Tommy gosta de brincar com as coisas eletrônicas


que há na casa. O respirador é mais complexo, mas não
posso ter certeza de que não mexeu nele quando ninguém
estava vigiando.

— Não tem uma trava?

— Tem, mas Tommy gosta de brincar, assim sempre


há perigo de que o desarme por acidente. — Cheguei mais
perto da cama para que ele pudesse ver o que estava fazendo
e revisei as funções na tela— Isto mantém seu oxigênio ao

222
mínimo de noventa e dois por cento quando dorme, este
mantem suas respirações entre dezesseis e vinte, dependendo
de suas necessidades. Os alarmes da máquina se ativam se
algo sai errado. Também há um alarme portátil que levo
comigo caso não escute este. — Pus minha mão no ombro do
Sr. Moore. — Está pronto, senhor?

— Sim. Estou cansado.

Arqueei as sobrancelhas.

— Todas essas risadas as minhas custas o deixaram


exausto, senhor?

Riu entre dentes o suficiente para necessitar de ar


adicional, mas não o suficiente para que os alarmes
entrassem em caos. Inclinei seu corpo e pernas ao pressionar
um botão, de modo que a cadeira ficou paralela à cama, logo
subi à cama e me ajoelhei.

— Está bem. Última respiração. Estale com a língua


se tiver problemas.

Desconectei o respirador de sua traqueia e


rapidamente o troquei pelo que respiraria por ele em seu
sono. O Sr. Moore tomou seu primeiro fôlego quando assenti.

— Obrigado, Lety.

Desliguei o respirador em sua cadeira para silenciar


o alarme, consciente de que Brody me observava antes de
sequer levantar o olhar.

223
— Precisa de ajuda para acomodá-lo na cama?

Apoiei-me em meus calcanhares.

— Posso fazer isso sozinha, mas sua ajuda é bem-


vinda.

Brody subiu à cama ao meu lado. Normalmente, eu


puxava o Sr. Moore à cama pelo lençol que mantinha
acomodada sob seu encosto. Antes que pudesse lhe explicar,
Brody levantou facilmente o frágil corpo de seu pai em seus
fortes braços, cuidadoso em evitar que seu estoico olhar
encontrasse o dele. O Sr. Moore se concentrou no rosto de
seu filho, sua expressão carregada com tanta tristeza que mal
conseguia olhá-lo.

Os traços no rosto de Brody permaneceram duros


como granito, mas seus movimentos foram lentos e precisos,
carregando seu pai cuidadosamente e colocando no centro de
sua cama.

— O que faço agora?

A voz de Brody estava estranhamente tensa e seu


foco permanecia em direção à porta. Ele queria fugir. Sabia.
Só que esperou que eu falasse.

Não tinha certeza de quanto tempo mais demoraria e


me preocupava o quanto o afetaria tudo isto. Era demais para
ele, especialmente, logo depois de me contar sobre o acidente.
Removi os sapatos do Sr. Moore e suas meias.

224
— Tenho que pôr seu pijama. — Minha mão apertou
a do Brody quando me olhou. — Estarei bem, precisa voltar a
estudar.

Ofereci uma saída, mas não aceitou.

— Não. Posso ficar.

Brody não fez nenhum comentário no que concernia


a despir seu pai desta vez. Depois que despimos o Sr. Moore e
deixa-lo só com sua boxer, ele ajudou a pôr as calças de
flanela enquanto eu o ajudei com a camisa do pijama.
Acomodamos o Sr. Moore rapidamente, pelo bem dele e do
Brody. Ambos pareciam lutar para manter suas emoções
reprimidas.

Coloquei os lençóis do Sr. Moore a seu redor antes de


conferir a configuração uma última vez.

— É hora de acender o abajur,— disse ao Brody.

Ele apontou o botão fixado na cabeceira da cama.

— Este? — Com meu assentimento, pressionou.

A cama de alta tecnologia valia no mínimo uns cem


mil dólares e estava agradecida de que tivessem condições de
mantê-la. Funcionava evitando que o Sr. Moore desenvolvesse
feridas de pressão que pudessem levar a uma infecção
sistêmica.

Brody olhou o colchão, observando o delicado


movimento que ia dos pés de seu pai até sua cabeça e de

225
volta abaixo outra vez, movendo o corpo do Sr. Moore
gentilmente.

— Algo mais? — Perguntou, sua voz tensa.

— Não. Já terminámos.

— Obrigado, filho. — disse brandamente o Sr. Moore


por cima do profundo zumbido da cama.

Brody assentiu e deixou o quarto. Forcei-me a sorrir.

— Precisa de mais alguma coisa, Sr. Moore?

— Não... — Seu olhar viajou para a porta,


derramando melancolicamente cada palavra que lutou por
formar. — Costumávamos ser próximos.

Acariciei sua cabeça cuidadosamente.

— Pude ver pela forma em que brincaram comigo


antes. — As comissuras de sua boca se levantaram um
pouco, apesar da tristeza que continuava presente em seus
olhos. — Estarei lá embaixo se precisar de mim,— disse
quando ficou calado.

— Boa noite, senhor.

— Boa noite, Lety.

Fechei suas pesadas cortinas e saí com o alarme


portátil, fechando a porta atrás de mim. Parei para verificar
Tommy. O pequeno já estava profundamente adormecido com
seu urso de pelúcia favorito sob seu braço. Quando cheguei

226
ao quarto que usava no final do corredor, Brody já estava lá.
Sentado no piso com suas costas contra a cama, seus livros
espalhados na frente dele.

— Onde vai minha mãe quando você está aqui?

Merda. Eu não queria ter esta conversa de forma


alguma. Dionna passou pelo quarto principal durante o
banho de Tommy para se despedir, saindo rapidamente outra
vez.

— Não sei,— respondi com sinceridade.

— Você me diria se soubesse?

Assenti.

— Só porque não quero mentir para você, jamais.

— Obrigado. — Suspirou. — Ela fica fora a noite


toda?

— Acho que não. Às vezes que dormi aqui, sempre a


escutei voltar.

Levantou as sobrancelhas.

— Sozinha?

— Sempre.

Minha mochila para passar a noite estava na cama.


Brody trouxe para mim enquanto terminava de fazer o jantar.

227
Coloquei o alarme remoto na mesa de cabeceira e abri a
pesada mochila.

Tirei meu notebook e os livros que precisava para


terminar de estudar enquanto Brody abria espaço para mim
ao seu lado.

— Letz, não quero te pressionar, mas preciso saber...


Minha mãe alguma vez ajuda a cuidar dele? Ou
simplesmente fica lá embaixo fumando?

Sentei ao seu lado e coloquei a mão em sua coxa.

— Ela tenta, Brody. Mas acho que sofre com isso


também.

Brody manteve os olhos fixos à frente, essa horrível


expressão de dor surgiu novamente em seu olhar.

— A minha presença aqui te incomoda? Tenho


trabalho para fazer, mas vou embora se quiser.

Só quando apertei sua coxa que pareceu perceber


realmente minha presença.

— Não. Por favor, fique.

Ambos lemos e trabalhamos em nossos deveres até


bem depois da meia-noite, falando muito pouco. Quando
Brody subiu na cama comigo e envolveu seu braço ao redor
de meu estômago, cobri seu braço com o meu.

— Éramos próximos,— disse ele.

228
— Eu sei,— suspirei.

229
CAPÍTULO 14
Senti uma presença pairar sobre mim antes de Brody
pular e jogar seu comprido corpo contra o meu.

— Que merda? — Vociferou ele.

Ouça. Meus olhos se abriram para encontrar Tommy


em seu pijama do Spider-Man e uma desgastada cópia do
Ferdinando presa debaixo de seu braço. Alcançou o livro com
a outra mão e me entregou.

— Let—tee.

— Ei, garotão. — Espreguicei e esfreguei o rosto,


parando quando peguei Brody olhando-o boquiaberto sobre
meu ombro.

— Cristo. Ele sempre faz isto?

Ri entre dentes e puxei Tommy para a cama conosco.

— Além da hora de dormir, este é seu momento


favorito para ler.

Brody o acomodou entre nós.

— Por um minuto pensei que estavam caindo todos


―Os meninos do milho”, sobre nós, carinha.

230
Tommy ofereceu o livro ao Brody.

— Brody, ler?

— Tigre, ainda é de madrugada.

Levantei meu celular do criado mudo.

— São quase oito.

— Como disse, de madrugada— Bocejou quando


Tommy se aninhou contra ele. — Este é o trato amigo. Lety e
eu temos esta coisa...

— Let—tee?

— É assim. Lety e eu somos algo... quente, sabe?

Tommy sorriu com aprovação.

— Let—tee.

— Assim, provavelmente, vou começar a ficar com ela


quando estiver aqui.

Arregalei meus olhos.

— Ah, vai?

Ele piscou os olhos.

— OH, sim. Vou.

— Brody, não tenho certeza disto.

Ele ignorou.

231
— Já que somos muito excitantes...

— Excitante? — Tommy enrugou seu rosto, tentando


entender. — Lety excitante?

— Amigo. Não tem ideia.

— Brody!

Ele franziu o cenho.

— Importa-se? O menino e eu estamos tendo um


momento íntimo. — Ele retornou sua atenção ao Tommy. —
De qualquer maneira, sim. Vai ter que começar a bater na
porta. Em caso, já sabe, Lety é tão sexy que ela simplesmente
tem que tirar a roupa.

Sufoquei-o com um travesseiro. Riu e o lançou ao


outro lado da cama.

— Tirar roupa? — Repetiu Tommy— Quando Lety


sexy.

— Vê, é um homem. Entende.

Saí da cama.

— Não posso acreditar, Brody.

— Bem. Terei que instalar uma fechadura, pelo sim,


pelo não. — Ajustou o edredom em volta de Tommy e
começou a ler.

232
Procurei em minha bolsa com roupas limpas. Brody
franziu o cenho.

— Aonde vai?

— Ver se seu papai está acordado. Se ele acordar


antes das oito e meia, normalmente, deixo-o pronto antes do
Roger chegar.

— Não tem laboratório às nove e trinta as quartas-


feiras?

Fui para o banheiro.

— Sim. Então tenho que me apressar.

Tommy apontou às imagens.

— Brody ler?

— Um segundo, tigre. Letz, sempre faz isto quando


está aqui?

Encolhi os ombros, sentindo-me tensa.

— Ler para Tommy? Sim. Se se levanta mais cedo


que isto, geralmente, distraio-o com uma quebra-cabeças.
Mantém ele ocupado. O terapeuta e os tutores não chegam
antes das dez.

— Refiro-me a se levantar cedo e cuidar de todos


antes de ir.

Parei com minha mão no trinco.

233
— É obvio, é meu trabalho.

Tommy bateu o dedo mais forte contra o livro quando


Brody continuou a olhar para mim

— Sinto muito.

— Porquê?

— Parece um trabalho difícil.

Dei de ombros.

— É, mas está tudo bem.

Tommy se retorceu.

— Brody, ler, ler.

Brody me analisou cuidadosamente.

— Sempre fez assim, não é verdade? Trabalhar dessa


maneira?

— Sou uma cubana de segunda geração. Está


incluso no pacote.

— Sabe o que quero dizer— disse ele.

Vê-lo reconhecer minhas lutas contínuas retorceram


meu coração. Nossos olhares se encontraram e, por um
momento, tive certeza de que finalmente confessaria que o
amava. Mas uma vez, a insegurança me dominou,
interrompendo nossa conexão. Apontei para o Tommy.

234
— É melhor começar com o Ferdinand antes de
deixar o Spider-Man zangado.

Apoiei-me contra a porta do banheiro depois de


fechá-la. Brody e eu tínhamos uma relação completamente
diferente agora que sua família estava envolvida. Eu não
havia me preparado para nada disto... extrema riqueza, o jogo
de poder, a tensão e a dor, especialmente a dor. Ou nos
aproximaria mais ou nos separaria como fizeram os
problemas com minha família no início do nosso
relacionamento. Pensei como era bom tê-lo deitado contra
mim e esperava que pudéssemos vencer os obstáculos de
algum jeito e superar nossas diferenças.

Corri para ficar pronta logo, tentando impedir que


todas as diferenças entre nossos mundos me oprimissem.
Quando saí do banho, Tommy gargalhava. Brody deitado de
costas, segurava-o no ar com suas pernas compridas,
inclinou-o para a esquerda, depois direita, segurando forte
suas mãos.

— E o avião se equilibrou sobre a montanha..., mas


OH, não, aqui vêm os flamencos assassinos.

A maneira descontraída de Brody com Tommy e sua


alegria acrescentaram muitos pontos extras ao seu status já
muito elevado. Normalmente, eu gastava cinco minutos em
uma leitura rápida para o Tommy, menos tempo trocando-o e
depois o tinha me seguindo até o quarto de seu pai. Isto—
jogo e união— foi um verdadeiro deleite para ele. Queria tanto

235
que Tommy tivesse amigos e que ele e Brody fossem mais
próximos de seus pais.

Levei um susto quando abri a porta e encontrei


Dionna em sua camisola de seda.

— Bom dia, Lety. Brody está aqui?

— Bom dia. Ah, sim, está aqui.

— Está vestido?

Não tínhamos feito nada, mas seu sorriso recatado


fez que meu rosto avermelhasse.

— Sim. Seus dois filhos estão apresentáveis.

Ela observou por cima do meu ombro, seu rosto


brilhando quando viu a interação entre Brody e Tommy.

— Olha os meus meninos!

Apressadamente passamos uma ao lado da outra.


Bati levemente à porta do Sr. Moore antes de entrar. Ouvi
sua voz, mas essa se perdia na imensidão do quarto. Entrei e
abri as cortinas quando ele sorriu para mim.

— Bom dia, senhor.

— Bom dia, Lety.

— Algum problema ou preocupação?

— Não neste momento, obrigado.

236
Rapidamente ajustei o respirador, fixando-o em sua
cadeira, substitui a tubulação e desliguei o sistema de alta
tecnologia da cama.

— Então, o que quer assistir?

Ele sorri maliciosamente.

— Three Dog Night, "Never Been to Spain".

Procurei através de seu iPod.

— OH, excelente escolha, senhor. — Peguei o


estetoscópio em meu bolso. — Auscultarei seu coração e
pulmões, está bem?

— Muito bem. — depois de uma cuidadosa


verificação de seu coração e sons de sua respiração, peguei o
iPod— Alguma vez esteve lá?

Meus dedos fizeram um trabalho rápido em


comprovar seus pulsos e circulação.

— Na Espanha? Não, senhor. Estive em Jersey, Nova


Iorque, e isso é tudo. — Parei para pôr minhas mãos nos
quadris— Foi lá que aprendeu esse genial espanhol para
zombar de mim?

Ele sorriu.

— Sim.

237
Ri enquanto terminava minha avaliação. Quando
terminei, escrevi tudo em um iPad que o Dr. Frenen revisava
diariamente e lhe enviei uma cópia via correio eletrônico.

— Onde está Brody? — Perguntou o Sr. Moore.

— Brincando com Tommy.

— Parece bastante interessado em você.

Baixei meu olhar.

— Tommy? Sim, é uma doçura.

Riu entre dentes.

— Sabe a quem me refiro, senhorita.

E outra vez, aí estava meu rubor.

— Não vou trocá-lo, já que é seu dia de banho.


Gostaria de ficar na cama ou ir a seu Bat móvel?

— Cama, por enquanto.

Levantei-o, tomando cuidado de colocá-lo no


almofadão especial para que não caísse.

— Lety, posso perguntar, como se sente com respeito


a minha família?

Essa não era uma pergunta qualquer.

— Venho de uma grande e barulhenta família


cubana. Muitos primos, cultura, esse tipo de coisas. Sou

238
muito próxima do meu irmão, irmã e agora da esposa de meu
irmão.

— E seus pais?

Levantei suas pernas, apoiando-as sobre uma


espuma delicada e arrumei suas meias.

— Não tenho pais.

— Lamento escutar isso.

— Não se preocupe. — Envolvi a manta em volta dele


para manter a temperatura e comecei a limpar o local. O Sr.
Moore tentava se aproximar de mim, e eu esperava manter
nosso vínculo limitado aos filmes, literatura ou música...
nada íntimo como sempre fizemos. Mas, agora que eu saía
com seu filho, imaginei que isso já não era possível.

O Sr. Moore me observou colocar a roupa suja da


cama dentro do cesto.

— Tommy adora Brody, não é?

— OH, sim. — Empurrei sua tubulação velha num


saco de reciclagem, lembrando como Brody o fez rir. — Será
um excelente pai algum dia. — Parei quando me dei conta do
que havia dito. Esta não era uma conversa para ter com seu
pai.

O Sr. Moore aproveitou a deixa.

239
— E quanto a você? Gostaria de ter filhos quando a
hora chegar? — Suas sobrancelhas se suavizaram quando
congelei— Perdoe-me, Lety. Eu a ofendi?

Senti a tensão endurecer minhas costas.

— Sinto muito, senhor. Só não tenho certeza do que


o futuro me reserva.

— No que se refere à família?

— Sim— admiti.

Roger, felizmente, entrou em cena, sorrindo.

— Bom dia, Sr. Moore.

O Sr. Moore sorriu amavelmente.

— Bom dia, Roger.

— Oi, Lety. Como estamos?

— O respirador está preparado, os tubos foram


trocados, a avaliação do Sr. Moore foi registrada e enviada.
Tommy ainda precisa ser avaliado, mas parece ótimo... OH, e
peça aos empregados que troquem e lavem as roupas de
cama.

— Entendido. — Sorriu ao Sr. Moore— Brody acabou


de me contar sobre o extra que receberemos, além do salário
combinado. É muito generoso de sua parte, senhor e ajudará
muito a minha família.

240
Eu mal ouvi o resto do que Roger disse, Brody estava
perto da porta, girando Tommy com uma mão enquanto sua
mãe lhe sussurrava calmamente do lado oposto.

— Lamento interromper, mas se não houver mais


nada, preciso me despedir.

— Não, não há nada mais. Vemos-nos amanhã, Lety?

— Sim, senhor. Amanhã.

Passei pelo restante dos Moore rapidamente.

— Tenham um bom dia.

— Letz, espera. — Meus pés desaceleraram até


pararem, próximo de Brody quando me alcançou.

— O que aconteceu?

Mantive minha voz baixa.

— Brody, não posso permitir que faça coisas como


esta. — Inclinou a cabeça— Sabe o que quero dizer... dar-me
dinheiro, tentar cuidar de mim. Quando se trata de sua
família, e nós, há linhas distintas que nenhum dos dois pode
cruzar.

Ele se apoiou sobre seus calcanhares.

— Tanto você como Roger receberam um aumento.


Ele ainda receberá mais porque trabalha aqui há mais tempo.

— Mas...

241
— Lety, não imaginava tudo o que fazia por minha
família ou como o trabalho é difícil. Agora que sei, só parece
correto te pagar de acordo.

Cruzei meus braços.

— A agência já me paga mais que o resto dos


empregos do AEC.

— Então pagam muito pouco. — Seu tom era firme.


Não cedi quanto a isso.

Dionna se aproximou de nós.

— Querido, você nos acompanhará no café da


manhã? Farão uma comida incrível.

— Tenho que voltar ao campus, mamãe. Outra hora,


está bem?

A felicidade da Dionna dissipou-se.

— Por favor, fique— roguei-lhe.

Juntou suas sobrancelhas.

— Lety, quero voltar com você.

— Tenho três horas de laboratório e aula. Sua


primeira aula não começa antes das onze e meia de hoje. —
Abriu sua boca para discutir— Por favor? Significaria muito
para sua família e para mim.

Estava certa de que diria não.

242
— Está bem,— disse finalmente.

Sorri.

— Obrigada. Eu a verei a uma para o almoço.

Ele me seguiu até o degrau onde deixou minhas


bolsas embaixo do corrimão.

— Uma coisa antes de você ir.

Levantei a mochila sobre meu ombro.

— O que é, grande homem?

Brody me puxou para ele, beijando-me com


suficiente ardor para envolver meus dedos dos pés e acelerar
meu pulso. Piscou os olhos quando me liberou.

— Só isso.

Peguei Dionna tampando sua boca surpresa um


segundo e meio antes de descer as escadas e sair da casa.
Inflexível, totalmente profissional. Sim. Essa era eu.

243
CAPÍTULO 15
Alguém bateu em minha porta. Levantei os olhos da
pilha de anotações revisadas para minha prova.

— Um segundo. — Terminava a última seção em


arritmias cardíacas quando a pessoa bateu mais forte— O
que está acontecendo?

— Lety? — Gritou Piper— Abre. Estou com sérios


problemas.

Fui até a porta e a abri. Piper entrou como um raio


seguida por Alice. A cor rosa iluminava suas bochechas e
Piper atravessou a sala. Permaneci em pé perto da porta e a
tranquei.

— Está grávida?

Piper cambaleou, seus olhos arregalados.

— Pior.

— Pior?

Ela assentiu.

— Sabe como esses caras estavam me incomodando


no baile ―Sem Calças‖ na semana passada?

244
Escutei sobre isso depois que Brody e eu tínhamos
saído, esperando continuar o tema a sós no quarto dele.

— Sim?

— Bom, sabe como Meathead me protegeu, brigando


com esses caras?

Segundo o amigo do Brody que estava lá, Meathead


limpou o piso com eles e precisou de vários deles para detê-
lo. Estava realmente orgulhosa dele por isso. O antigo
namorado de Piper foi extremamente controlador. As coisas
que Piper contou me convenceram de que o pegou ao menos
em uma ocasião e a pressionou para fazer coisas na cama
que ela não queria. Minha pele formigou, preocupada de que
tivesse sido vítima de novo.

Agarrei sua mão.

— Esses caras ainda estão te incomodando? Algum


te machucou?

— Não. Meathead se assegurou de que jamais


voltassem a me incomodar. Devo contar a ele se o fizerem. —
Baixou seu olhar— Levou-me para casa depois para ter
certeza de que estava segura. Nenhum cara foi tão agradável
comigo, nunca.

— Então, isto não é a respeito desses caras? — Olhei


para a Alice, insegura sobre qual realmente era o assunto. A
mudança em seu olhar me fez suspeitar e voltei minha

245
atenção de volta em Piper— Você e Meat...? — Seu sorriso
culpado me fez pensar que sim. — OH, não. Não, não, não.

Estendeu suas mãos.

— Não, não dessa maneira. Ainda não, de qualquer


modo.

— Ainda não?

Ela riu.

— Ele é doce, Lety. Sim, sim, não é a lâmpada mais


brilhante do candelabro, mas é doce. Adorável, na verdade.

Meu olhar foi direto a Alice, que enterrou o rosto em


suas pequenas mãos. Considerando que isto envolvia
Meathead e Piper, estava se comportando de maneira
estranha.

— Só me diga o que aconteceu.

Ela saltou em seu lugar.

— Beijei-o hoje.

Fui pega com a guarda tão baixa que só pude falar.

— É a sério?

— Sim. Mas não era minha intenção. Somente queria


lhe agradecer e, bem, simplesmente, aconteceu. Olhou-me
com esses formosos olhos cor de avelã dele e bam... não pude
me segurar. — Retorceu a manga de sua jaqueta, rindo

246
nervosamente. — Começou lento, mas logo... caramba, Lety,
realmente foi muito excitante.

Pisquei para ela.

— Não brinca. — Meathead era aproximadamente do


tamanho de dois tanques. Piper era alta, mas muito magra.
Fiquei até um pouco impressionada que não a tenha
quebrado por completo.

Ela sorriu radiante.

— Faz uma coisa totalmente impressionante com sua


língua.

Estendi minhas mãos, parando seu TMI7

— Ah... isso é incrível e tudo, mas como está em


problemas?

Piper parou de sorrir.

— Gretel Ann me viu. Bom, viu a nós dois.


Estávamos em público... em frente à biblioteca. Ela estava do
outro lado, indo para a biblioteca. Eu não percebi sua
presença até que fez um barulho estranho, parecido com um
rosnado.

Coloquei minhas mãos sobre sua boca.

7
TMI – Too much information - Muita informação - muito mais do que você precisa / quer saber sobre
alguém.

247
— Ela rosnou... como um cão? — Piper assentiu.
Está bem. Isto não era bom. Presenciei uma vez quando
Gretel Ann fez esse ruído. Estávamos em uma festa fora do
campus comemorando a vitória da nossa equipe contra o
Saint Joe. Ela pegou um centro de mesa e jogou em alguém
que a chamou de gorda.

Piper balançou sua cabeça.

— Fica pior, garota. Depois, toda a equipe veio me


advertir que ela quer me bater.

OH, merda.

— Não me olhe dessa maneira, Lety. — Retomou seu


passeio frenético. — O que devo fazer? Não sei o que fazer.
Diga-me o que fazer!

Ah, correr, esconder-se, ficar em posição fetal e


cobrir sua cabeça?

— Lety? — Mmm? Deteve-se.

— Pensei que você pudesse falar com ela.

Acreditei ter escutado mal.

— Quer que eu fale com Gretel Ann para que não


chute seu traseiro?

— Sim. Ela era sua capitã, certo? Eram próximas,


não?

248
— Quase nada. — Principalmente, porque estávamos
sempre morrendo de medo dela.

— Por favor, Lety? Não quero envolver o reitor se


puder evitar.

Olhei fixamente Piper. Gretel Ann partiria seu


pequeno pescoço em dois se tivesse a oportunidade. Droga,
ela nos partiria em duas... a mim apenas por tentar defendê-
la. Mas Piper era minha amiga. Ela e Alice trabalharam
comigo durante as últimas semanas para que eu pudesse
cuidar dos pais do Brody e obtiver notas decentes.

— Certo. Falarei com ela.

Piper me puxou em sua direção.

— Obrigado, Lety. Você é a melhor.

— Fiz um boquete em Razor. — Soltou Alice.

Acho que o pescoço de Piper e o meu rangeram


quando viramos nossas cabeças para olhar em direção a
Alice, nossos queixos caíram lentamente. Seu rosto ficou
vermelho.

— Apenas aconteceu.

Minha voz era de incredulidade.

— O que quer dizer com "apenas" aconteceu? Você


tropeçou e aterrissou com a boca em seu pênis?

Alice não me respondeu.

249
— Alice... como... merda. — Minhas amigas estavam
fora de si.

Gigantes lágrimas caíram dos suaves olhos marrons


da Alice.

— Realmente eu gosto dele e nos tornamos bons


amigos. Mas acho que estraguei tudo agora.

Piper e eu levamos Alice para minha cama e


sentamos uma de cada lado dela. Piper tirou seu casaco e
ajudou Alice com o dela.

— Ao menos te devolveu o favor?

Não precisei olhar em seus olhos para entender


porque Piper fez a pergunta. Queria saber se a conexão foi
unilateral e se Razor foi um imbecil sobre isso.

— Oh, sim— respondeu Alice— Devolveu.

Piper suspirou.

— Obrigada, Jes...

Alice levantou suas mãos.

— Por favor, não coloque Jesus nisto— rogou-lhe.

Sim, sem brincadeiras.

— Quando aconteceu?

250
— Duas noites atrás. Não o vi depois. Não me
chamou ou escreveu. Estou com medo dele estar me
ignorando.

Piper enrugou seu nariz.

— Depois de lhe dar uma mamada? Odeio quando


acontece isso.

Minhas amigas pareciam, ter levado a fraternidade


do RA para o outro completo extremo. Antes de conseguir
elaborar um plano de ação, o alarme do meu telefone tocou.

— Droga!

Piper franziu o cenho.

— O que aconteceu?

Levantei e fui até minha mesa para desligá-lo, depois


corri para afastar minhas anotações e livros.

— Entre o trabalho, aulas e a clínica, mal vi o Brody.


Está na casa dele assistindo o Futebol de segunda à noite
com os meninos. Planejava surpreendê-los levando algo para
comerem durante o jogo. Vocês me ajudam? Podemos
conversar enquanto trabalhamos, depois voltamos aqui e
arrumamos as coisas.

Piper e Alice concordaram e me ajudaram a tirar a


comida do meu mini refrigerador. Falamos sem parar sobre
Gretel Ann, Meathead e Razor enquanto preparávamos
cachorros quentes e seis pratos gigantes de nachos. Como

251
um grupo de operários em linha de produção drogados,
envolvemos trinta e seis cachorros quentes e pães em papel
alumínio, em seguida empacotamos— latas de refrigerantes,
sacos de batatas, pratos de papel e um prato de salada de
couve nas caixas de papelão que pedi ao pessoal do refeitório
e nos dirigimos à casa de Brody.

Empurrei a porta dos fundos com o calcanhar para


fechá-la, depois que Alice passou. Estávamos atravessando o
comprido jardim que separava minha casa da de Brody, as
três amaldiçoando, quando o vento frio de novembro bateu
em nossos rostos.

— Brrr. Parece neve. — Alice afundou mais seu rosto


na gola alta do casaco e nós corremos o resto do caminho.

Bati na porta detrás da sala de estar do Brody com


meu pé. Seu amigo Al atendeu.

— Mano, Lety está aqui— chamou sobre seu ombro.


Deixou-nos entrar, fechando a porta atrás de nós.

Brody deixou seu lugar no sofá e desviou dos


meninos sentados no chão. Quando me alcançou, pegou a
caixa das minhas mãos e me beijou.

— Olá. — Apontou a caixa— O que é isto?

— Cachorros quentes, batatas, nachos, salada de


couve e bebidas. — Sorri— Surpresa!

Brody levantou a caixa sobre sua cabeça.

252
— Minha mulher trouxe comida!

Parecia até que voltávamos para casa da guerra.


Cerca de vinte caras sentados ao redor da sala de estar
balançaram seus punhos no ar e aplaudiram.

Eu ri.

— Prepararemos seus pratos; só digam o que


querem. — Tentei pegar a caixa da Alice, mas ela a segurou
com força, olhando fixamente à frente para onde Meathead e,
sim, também Razor, estavam sentados perto da televisão.

Os olhos de Razor se arregalaram quando a notou.

— Ei, Alice— gritou por cima do barulho. Alice corou


e isso foi tudo.

— Vamos lá— sussurrei— Hora de vestir sua


calcinha de garota adulta. — Ela e Piper me seguiram à sala
onde dois colegas de quarto do Brody arrumavam uma mesa
para colocar a comida. Em menos de dez minutos e quatro
jogadas, empilhamos comida nos pratos para cada menino.
Fizemos uma tonelada, mas sobrou apenas um pouco de
salada.

Brody me levou através da multidão com seu prato


cheio de comida e depois me sentou em seu colo, oferecendo-
me um pedaço do seu cachorro quente.

— Estou bem— disse— Mas pegarei uma batata.

— Você vai ficar comigo hoje à noite?

253
Acariciei o cabelo atrás de sua orelha.

— Sim, eu gostaria.

Piscou para mim.

— Passou um tempo, não é?

— Sim. — Entre as provas e minha política de "nada


de carícias na casa de seus pais", passou muito tempo. Movi
os dedos dos meus pés só de pensar em suas mãos em mim.
Respirei fundo, observando-me contemplar seu corpo sexy.

— Bro, consiga um quarto! — Gritou outro de seus


amigos do outro lado da sala. Ninguém podia nos ouvir acima
das outras conversas, mas estava óbvio nosso momento
íntimo.

— Fecha a boca e come! — Brody limpou sua


garganta e apontou seu prato— Deixa que os meninos e eu
paguemos por isso.

— Não. — Esfreguei seu peito— Senti saudades e


quis fazer algo lindo para você. Além disso, meu chefe me
paga mais que suficiente por meus serviços.

— Seu chefe parece incrível. — Deu outra mordida


em seu cachorro quente.

— É.

— É sexy.

Mordisquei meu lábio inferior.

254
— Isso também.

Sua íris piscou antes dele se inclinar e sussurrar em


meu ouvido.

— Como é na cama?

Enrolei sua manga para cima para que não se


sujasse com comida.

— Espero conferir logo.

Comeu o que ficava de seu pão.

— É?

Assenti.

— É.

— Esta noite?

Meu olhar se perdeu no seu. Durante as últimas


semanas, Brody frequentemente me acompanhou quando eu
cuidava de sua família. Enquanto sua relação com Tommy e
a mãe se fortalecia, ele e o pai raramente se falavam. Seu pai
tentou, mas as respostas de Brody eram sempre curtas e
bruscas. A tensão tornou difícil trabalhar. Apesar de minhas
conversas com Brody e suas contínuas sessões de terapia,
sua raiva contra o pai permaneceu. Mas na última semana,
algo mudou.

Tinha acabado de colocar Tommy na cama quando


encontrei Brody falando tranquilamente com o pai em seu

255
quarto. Não tinha certeza de quem disse o quê, mas por um
breve momento se conectaram e sorriram. Passei meus dedos
na parte posterior de seu pescoço enquanto recordava esse
momento de amor entre os dois.

— Sim, talvez, esta noite...

— Genial— disse calmamente.

Deitei minha cabeça sobre seu ombro. Todos


assistiam ao jogo. Vi Meathead deixar discretamente sua
cadeira e sentar ao lado da Piper no chão quando terminou
de comer. Ela o recebeu com um maravilhoso sorriso que foi
retribuído com outro genuíno, que parecia demostrar a
felicidade dele em tê-la ali.

Alice, pobrezinha, tentava sem sucesso encaixar a


tampa do pote de salada de repolho quando Razor se
levantou do lugar perto do Brody onde estava sentado. Foi até
ela a tempo para vê-la espalhar salada por toda sua camisa
quando derrubou o pote acidentalmente.

Ela tirou seus óculos e o grosso casaco, revelando a


justa camiseta negra sem mangas que usava debaixo. Razor
parou, observando atentamente a minha garota. Alice não o
notou parado ali até que colocou seus óculos de volta sobre o
nariz. Ele se inclinou e lhe disse algo que não pude escutar
por causa do barulho. O que quer que seja, fez-a sorrir. Ela
era realmente linda quando sorria. Eu torcia para que Razor
também percebesse isso.

256
Não tinha certeza do que lhe disse, mas ela pareceu
considerar com cuidado. Piscou algumas vezes antes de
concordar e segui-lo de volta ao sofá. Al mudou de lugar,
permitindo que sentassem juntos.

Brody não percebeu, muito ocupado animando os


Eagles, agora perdendo por doze.

— Que droga, árbitro, está cego? Mostra uma maldita


bandeira!

Duas perdas de bola e uma interceptação depois, os


Eagles voltavam ao jogo e todos perdemos a cabeça. Piper
correu em volta de todos durante os comerciais.

— Ouça, Lety. Os meninos ainda estão famintos.


Meathead pediu pizza do Romeo. Vamos comigo buscar? Não
quero que perca o jogo.

Olhei para Brody.

— Você ainda está com fome, também?

Ele sorriu.

— Somos meninos em crescimento, Letz. Precisamos


de muitas calorias.

— Não esqueça as de aliche— gritou alguém mais.

— Está bem. — Piper subiu o zíper de sua jaqueta.

257
Brody me segurou no lugar antes que me levantasse.

— Ouça. Você quer que eu vá junto?

— Não. Fique e assista o jogo. Os Eagles não


ganharão se você não gritar para a televisão e chamar o
arbitro de idiota.

Riu e liberou o aperto no meu quadril.

— Certo. Onde estariam sem meus comentários


intelectualmente estimulantes?

Apontei para a televisão.

— Abaixo de doze.

Alice se levantou quando ouviu.

— Já vão?

Em sua preocupação com Razor, perdeu


completamente nossa conversa.

— Piper e eu vamos pegar algumas pizzas no Romeo.

— Irei com vocês.

Queria dizer que não, mas sabia que Alice não ficaria
em uma sala cheia de meninos sem nós. Sorri para Brody.

— Viu, agora somos três. Ficaremos bem.

Alice se ofereceu para nos levar em sua caminhonete


Ford celeste. Localizado a uns minutos do campus, o

258
pequeno grupo de edifícios era o ponto que todos usavam de
referência para saber onde terminava o bairro de Saint Jude e
começava Allentown. Já que ninguém estava morrendo para
comprar cartões de felicitação ou passar pela tinturaria a esta
hora numa segunda-feira, era a única loja aberta quando
chegamos.

— Merda, merda, merda. Faz frio. — Piper reclamou


enquanto entrávamos na pizzaria. Ela me entregou todo o
dinheiro que os meninos deram. — Toma, Lety. Você é a
mágica da matemática.

Na realidade era ciência, mas não discuti.

— Olá— disse ao homem do balcão. Reconheci-o


como o dono— Viemos retirar o pedido de Matt Hade.

— Meathead? — Perguntou.

Ri.

— Sim. Esse mesmo

Contei o dinheiro quando me disse o valor. Havia o


suficiente para a pizza e uma incrível gorjeta. O dono sorriu
quando lhe entreguei tudo.

— Obrigado. Vão precisar de algo mais?

Olhei o menu da pizzaria. A loja era pequena, só


umas mesas, mas sua comida era legendária e muito
conhecida por fazer entregas.

259
— Acho que não. Mas, conhecendo os meninos, o
senhor pode nos ver mais tarde.

O dono assentiu.

— O futebol e os universitários são um bom negócio.

Comecei a rir.

— Com certeza sim, senhor.

Piper abriu a geladeira.

— Deveríamos levar mais refrigerantes?

Empilhei as duas primeiras caixas de pizzas nos


braços da Alice.

— Não. Havia muitos quando saímos e Al foi buscar


mais cerveja.

— Certo. Ainda bem que você olhou.

Piper fechou a porta e esticou os braços, permitindo


que empilhasse duas caixas mais. Peguei minha bolsa e as
segui. Alice e Piper correram para o lugar onde estacionamos
a caminhonete. Santo Deus, estava congelando.

Fechei a porta de vidro atrás de mim quando notei


algo estranho. Conferi a quantidade de caixas e o valor pago.
Ou o dono nos deu um pacote de batatas em cortesia ou por
acidente. Não queria extorqui-lo, assim entrei novamente na
loja.

260
Uma enorme mão cobriu a minha e a apertou. Saltei,
retrocedendo um passo e deixando cair a pizza e as batatas.

Carlos estava de pé na entrada da pizzaria, com rosto


escondido entre as sombras. Jesus Cristo, o que ele fazia
aqui?

O sangue bombeava nos meus ouvidos, abafando os


ofegos de Piper e Alice. Tinham-no visto, mas Carlos não se
importou. Sua atenção presa brevemente sobre a comida
caída.

— Mmm. Que desperdício. Mas acredito que você


pode se permitir isso agora que tem dinheiro.

Retrocedi aos tropeções, com o medo e a fúria me


invadindo como uma ducha de água fria quando entendi o
motivo do porquê que veio.

— Não tenho dinheiro. Não tenho nada por sua


culpa!

Meu comentário o irritou, fazendo que seu sotaque se


aprofundasse.

— Não minta, Lety. Sua mãe me disse que tem um


noivo rico.

— Ela... — Que droga! Alguém disse a ela que voltei


com Brody. Isto não era bom. Não era nada bom. Ao invés de
negar, falei apressadamente.

— Deixe-o fora disto.

261
Ignorou-me, seus dedos apoiados contra a janela do
caixa enquanto me seguia de volta.

— O que está mandando a sua mãe não é suficiente.

— Seria se não você não cheirasse pelo nariz—


espetei.

— Ela precisa de mais. — Estreitou os olhos—


Entende o que digo? Tem que dizer a seu noivo que lhe dê
mais.

Apertei os dentes, atenta a todos os movimentos de


suas mãos.

— Não vou dizer nada.

— Bom, então talvez eu deveria falar com ele. Tenho


certeza que teremos muito o que discutir.

Tropecei, sentindo minha boca muito seca. Não faria


isso. Maldição, não podia fazer isto.

— Será que ele sabe sobre você? — Perguntou— Por


que está realmente aqui? — Assobiou como surpreso quando
minha respiração acelerou— Não sabe, não é verdade? Acha
que eu deveria contar?

— Não vai dizer nada. Afaste-se dele e de mim.

Um pequeno sorriso retorcido se formou em seus


lábios enquanto seguia avançando.

— Se quiser meu silêncio, vai ter que pagar.

262
— Vá para o inferno.

— A decisão é sua, minha filha. Ou paga ou eu falo.


— Deteve-se— Acha que seu namorado continuará com você
quando souber a verdade?

OH, Deus.

Piper e Alice correram para o meu lado. Hesitaram


diante do olhar duro de Carlos.

— Nem pense, Carlos. Nem pense em fazer isso—


vaiei.

— Estas são suas amigas, minha filha? — Apontou


Piper— Elas sabem?

Entrelacei minhas mãos com os braços de Piper e


Alice e as arrastei à caminhonete.

— Temos que sair daqui.

Piper cobriu minha mão.

— Está tudo bem. Brody e os meninos estão vindo.

O sorriso do Carlos aumentou ao ver que meu rosto


perdia a cor.

— Brody? É ele, não é? E ouviu isso, Lety? Está


vindo. — Seu sorriso desapareceu— Última chance.

— De quê? — Perguntou Alice com a voz tremendo—


Lety, o que está acontecendo?

263
Uma dor enorme apertou meu peito e respirar ficou
mais difícil.

— Cale a boca, Carlos. Por uma vez em sua vida


fecha sua maldita boca! — Gritei.

O motor de um carro soou rua abaixo. Puxei mais


forte Piper e Alice, tentando afastá-las. Brigaram comigo,
confusas por meu pânico, seus olhares fixos no Carlos
enquanto continuava se aproximando. Chegamos à porta da
tinturaria quando o Porsche do Brody parou bruscamente.
Ele e Razor saltaram e correram para nós. Não...

Brody me empurrou para trás de si.

— Afaste-se dela!

Carlos se reclinou contra o edifício como se Brody


não tivesse falado. Não tinha medo dele, nem de Razor, nem
de Meathead, que saltou de seu Jipe para nós. Manteve o
corpo relaxado e confiante. Carlos sabia como fazer sangrar a
homens com o dobro de seu tamanho.

Apertei o braço de Brody.

— Vamos, por favor, só vamos. — Sentia as náuseas


em meu estômago. Tinha que tirá-los dali antes que Carlos
lhes dissesse tudo.

Meu tom temeroso só enfureceu mais ao Brody.

— Ele te feriu? — Não esperou que respondesse e


fixou sua irritação em Carlos— Você a tocou?

264
Meathead e Razor se aproximaram de Brody,
segurando-o.

— Não pode bater nele primeiro amigo— advertiu


Razor.

Brody amaldiçoou, olhando Carlos fixamente, apesar


das meninas e eu implorarmos para dar o fora dali.

Alice procurou o celular em seu casaco.

— Vou chamar a polícia.

— Alice, não! — Chiei.

Então todos notaram minha histeria e que estava


tremendo.

— Temos que ir!

Brody correu para o meu lado, com um olho em


Carlos.

— Lety... o que está acontecendo?

Não podia responder.

— Diga-me o que ele te fez!

As lágrimas corriam por meu rosto enquanto debatia


o que deveria fazer. Não podia lhe dar dinheiro. Não tinha
nada para lhe dar. Mas também não podia permitir que
falasse. Carlos apertou os lábios e sacudiu a cabeça, como se
não entendesse por que estavam todos tão incomodados.

265
— Eu não fiz nada, exceto lhe dar a vida.

— Cale-se! — Gritei em espanhol.

O olhar do Carlos se encontrou com o meu.

— Não se preocupe. Sua mãe parou de chorar assim


que acabei.

O mundo parou quando as palavras de Carlos


impactavam a todos. Alice e Piper cobriram a boca com as
mãos, Meathead e Razor trocaram olhares atordoados, mas a
expressão horrorizada de Brody foi a que me fez começar a
soluçar. Ele olhou meu rosto, como se eu fosse uma
desconhecida.

— Lety...

Carlos inclinou a cabeça com satisfação e se virou.


Não dei o que queria e me castigou por isso, justo como fez
toda minha vida. Partiu sem preocupar- se com o que fez.

— Adeus, filha.

A fúria fez me fez começar a suar. Agi sem pensar,


gritando de fúria enquanto corria atrás dele. Mas não podia
lutar com alguém como Carlos. Era forte e cruel e estava
preparado.

Ele se virou, levantou-me no ar e jogou sobre o


concreto. A dor explodiu em meu ombro e rosto e o caos
irrompeu como uma barragem.

266
As vozes se acendiam e apagavam, distorcidas e
abafadas. Por algum motivo, foi Piper a primeira a chegar ao
meu lado.

— Brody! — Estava chorando. — Lety está ferida.


Temos que ir a um hospital!

Abri os olhos e minha visão clareou lentamente.


Estava vagamente ciente da ausência de Carlos e da agonia
que sentia no meu lado direito. Mas nada disso importava. O
que mais doeu foi Brody estar lá e o que descobriu: que eu
nasci, como resultado do estupro de minha mãe.

267
CAPÍTULO 16
A enfermeira interrompeu o policial me interrogando
para colocar paracetamol na minha intravenosa.

— Se precisar de algo mais forte, avisa-me? — Ela


brincou com a ponta do seu estetoscópio enquanto via minha
agitação. — Querida, temos algo para diminuir sua
ansiedade. Quer tomar?

— Estou bem— insisti. Fiz um gesto ao tubo


correndo por meu braço esquerdo— Poderia tirá-lo, quando
terminar?

— Assim que o policial terminar de conversar com


você, preencho a papelada de sua alta e tiro isso. Enquanto
isso, pense no que disse.

Acenei com a cabeça, mesmo que preferia morrer


antes de considerar tomar um tranquilizante.

— Obrigada.

Esperei até que ela saísse, e voltei a me concentrar


no jovem policial me interrogando. Era melhor que enfrentar
Brody ou Mateo. Deus, não sabia quem era pior. Ódio e
ameaça apareciam nos olhos de Teo, sombreados com
escuros círculos. Estava prestes a destroçar o quarto. Brody

268
permanecia estranhamente quieto, seu rosto tão branco como
o lençol, o queixo tenso.

O policial McAfee coçou sua abundante cabeleira.

— O negócio é o seguinte. Seu pai tem uma ficha


criminal que remonta a décadas. O problema é que você o
atacou primeiro.

— Ele a provocou— disse Brody.

O vazio em sua voz fez com que me encolhesse. Como


poderia olhar em seus olhos de novo? E os outros?

O policial McAfee fez uma pausa enquanto eu


limpava mais lágrimas do rosto.

— Não duvido. Exceto que no papel consta um único


indivíduo contra seis... isso sem contar o dono da pizzaria,
que saiu correndo com um taco de beisebol. Se apresentar
queixa, com antecedentes criminais ou não, seu pai tem uma
excelente defesa.

A voz do Brody caiu várias oitavas.

— Há um histórico de violência contra ela cometida


por ele...

— Um histórico não documentado— destacou o


policial McAfee. Balançou a cabeça e virou-se para mim. —
Lety, existem provas, documentos... não há evidências que
apontem que você estava com medo do seu pai e nada escrito
afirmando que a maltratou.

269
O policial me dizia de forma indireta que já era hora
de tomar alguma providência. Minhas lesões confirmavam
que tinha razão, mas os valores adquiridos durante minha
criação— gritavam que eu deveria preservar os segredos
familiares e me calar, não revelar nada à polícia—
atormentando-me, exigindo que prestasse atenção.

Brinquei com a beirada da tipoia em meu braço.


Carlos fraturou minha clavícula quando me jogou contra o
piso do jardim. Teria que usar a maldita coisa por no mínimo
seis semanas. A humilhação? Essa vinha se desenvolvendo a
um longo tempo e explodiu hoje à noite em minha cara

A raiva torceu meu estômago. Não acho que Carlos


poderia ter me humilhado mais se tivesse tentado. Mas esse
era seu modus operandi e obteve sucesso. Minha mãe... que
Deus a amaldiçoe. Deu a ele um motivo para me encontrar.
Falei rápido antes que mudasse de opinião.

— Posso apresentar uma PFA, ordem de proteção


contra abuso? — A cabeça de Mateo se virou para mim. Doía
falar, minha garganta sensível devido ao choro— Já não
posso lutar com ele, Teo. Não posso.

Teo olhou a parede quando comecei a chorar.

— Faça o que quiser, Lety. Mas no final será pior.


Carlos só vai ver esse pedaço de papel como um insulto e um
desafio. — Seus olhos voltaram para mim— Não quero você
em mais problemas por causa disso.

270
O policial McAfee se reclinou em sua cadeira.

— Lety, o temor do seu irmão é válido. Os


abusadores se importam muito com o controle sobre suas
vítimas. Mulheres vítimas de abuso correm mais risco
quando obtêm PFA.

Minha voz se quebrou.

— Eu sei. Mas ficar em silêncio também não


funcionou.

— Não tento convencê-la a desistir— esclareceu o


policial McAfee— Só quero preveni-la para que você esteja em
segurança. Se quer apresentar uma ordem emergencial, darei
alguns telefonemas para que você possa ir até o juiz ainda
esta noite. Se não for possível, você pode esperar até amanhã
para encontrar o juiz quando abrir o tribunal.

— Vou esperar até a manhã. Conhecendo o Carlos,


não voltará esta noite.

— Tudo bem! — O policial McAfee ficou de pé e me


deu seu cartão— Se precisar de algo, ou se Carlos aparecer,
ligue-me.

Peguei seu cartão.

— Obrigada.

Brody se virou para mim quando o policial saiu, seu


rosto mantinha essa palidez doentia. Afastei-me dele quando
se aproximou de mim, tentando não fazer um gesto de dor

271
quando involuntariamente endireitei os ombros. Sentia— me
suja agora que ele sabia o meu segredo. Não era minha culpa.
Sabia disso. Mas nasci do ódio e de um ato vil. Não era algo
do que se recuperava facilmente.

Toquei a arranhada e inflamada pele de meu rosto.


Carlos sabia como causar dor em todos os níveis. Teria
colocado seu pé em meu nariz se Brody não o tivesse
derrubado. Não queria pensar o que teria acontecido se Razor
e Meathead não o tivessem afastado ou se Carlos decidisse
permanecer ali. Foi demais. Tudo isso foi demais.

Mateo se aproximou da cama

— Vem para casa comigo.

Minha mão livre puxou o lençol mais perto da minha


cintura.

— Não.

— Não estou pedindo! — Gritou. Então olhei para seu


rosto.

— Talvez você não me ouviu na primeira vez. De


forma alguma.

— Lety, Carlos está ferrando com sua cabeça e


divertindo-se com isso. A manipulação e o controle... estão
piorando. Acha que esse pedaço de papel vai impedi-lo?

— Tenho que fazer algo! — Não queria gritar. Paguei


por isso com uma pontada de dor em minha garganta e

272
alimentando a fúria no olhar de Teo. Estava assustado por
minha causa. Sabia que estava. Então, respirei fundo
algumas vezes e tentei fazê-lo raciocinar— Conquistar o meu
diploma é a única forma de me afastar do Carlos. Não
permitirei que arruíne isso... principalmente, quando estou
tão perto de concluir o semestre. — Minha cabeça palpitava
enquanto tentava analisar bem. O que Carlos faria em
seguida, agora que teve êxito, espancaria minha mãe,
encontraria a minha irmã, iria atrás de Evie? Ou ficou
satisfeito ao contar a todos como eu...?

Brody amaldiçoou quando me afastei de novo dele


para soluçar sozinha. Teo andou pelo quarto.

— Lety, você está um desastre. Não posso te deixar


assim.

Calmamente, apertei o botão para chamar à


enfermeira e desci da cama, alcançando minha roupa
dobrada na cadeira ao meu lado. No momento em que ela
entrou, já tinha colocado minhas meias três quartos. Estendi
meu braço.

— Pode tirar isto?

Assentiu depois de um breve olhar em meu rosto.


Enquanto tirava a intravenosa, deu instruções que eu escutei
centenas de vezes antes. Suas feridas demorarão de seis a
oito semanas para sarar... gelo e Tylenol... repouso... procure-
nos se houver dor, enjoos, perda de consciência...

273
No momento que terminou, peguei minha roupa e
entrei no banheiro. Brody segurou a porta quando tentei
fechá-la, sua voz firme.

— Não tem que falar comigo, não tem que me olhar,


mas que Deus me amaldiçoe se você se vestirá sozinha.

Voltei minha atenção para o Teo, cujo olhar duro


poderia partir o granito.

— Quer que chame à enfermeira para te ajudar?

— Consigo me virar sozinha.

Brody grunhiu frustrado.

— Não me afaste!

Enfrentei-o.

— Não posso sequer te olhar agora, Brody.

— Por quê?

As lágrimas se juntaram em meus olhos.

— Sabe o porquê.

Ele sacudiu sua cabeça.

— Não sei.

Minha mente lutou entre lhe dizer que se afastasse


ou desculpar-me por, Deus, o que... viver, respirar, ser algo
que não deveria ter acontecido? Enquanto meu rosto se

274
decompunha, ele me empurrou mais para dentro do banheiro
e fechou a porta.

Lágrimas caíram por meu queixo. Com o mais suave


dos cuidados, Brody as enxugou e roubou meu fôlego ao
colocar seus lábios sobre os meus. Sem uma palavra, passou
os próximos minutos ajudando a me vestir. Os jeans foram
fáceis de colocar, uma perna de cada vez, depois puxá-la até
minha cintura, fechando-a. Minha camiseta foi mais difícil.
Cuidadosamente, removeu minha tipoia e enfiou a manga por
meu braço machucado. Tentei não chorar quando passou a
camisa sobre a minha cabeça. Brody amaldiçoou, de novo.
Por mais que tomasse cuidado, movimentar meu braço
machucado estava me matando.

— Não conseguirei vestir o casaco sem te machucar.


Vamos descartá-lo e usar só a camisa, ok?

Em minha mente, naquele momento, eu não merecia


sua amabilidade. Por isso que cada gesto tenro, qualquer
amostra de compaixão, deixava-me em carne viva. Estava a
um passo de perder o controle, assim em lugar de responder,
assenti e empurrei meus pés em minhas sapatilhas. Brody
congelou antes de abrir a porta.

— Isto não muda nada— disse.

Mas estava equivocada. Teo nos guiou ao automóvel


de Brody.

275
— Envie-me uma mensagem quando a levar de volta
ao campus, ok? — Inclinou-se e beijou minha testa quando
Brody respondeu com um rígido assentimento. — Se precisar,
chame. Entendeu?

Respirei forte, tentando evitar chorar. Teo olhou atrás


de mim, parecendo a segundos de arrebentar algo.
Finalmente se foi amaldiçoando a alguns automóveis atrás de
nós.

Brody dirigiu em silêncio. Eram quase cinco da


manhã quando chegamos ao campus. Usou sua chave mestra
do RA e abriu minha casa.

— Vou com você ao tribunal. Vamos dormir enquanto


podemos. — Serviu um copo de água e o trouxe para meu
criado mudo. Tirei o casaco cobrindo meus ombros e o deixei
na cadeira do escritório. Ele desapareceu no banheiro e
retornou com ibuprofeno, lendo o frasco enquanto
caminhava— A enfermeira disse que podia tomar isto com o
Tylenol que te deu. Deve ajudar a diminuir a dor e o inchaço.

Terminei de tirar minha última sapatilha.

— Por favor, não.

— Não o quê?

— Não posso.... Como pode ser tão amável sabendo o


que sabe de mim?

Seus dentes cerraram.

276
— Esta é uma pergunta séria?

Meus olhos brilhantes diziam que era. Ficou ainda


mais tenso.

— Lety, por favor não faça isto.

— Eu não deveria estar aqui, Brody. Não assim. Não


depois do que Carlos fez a ela! — Perdi o controle outra vez.
Não o senti aproximar-se. Simplesmente estava ali,
abraçando-me gentilmente.

— Este é o problema. Quando te disse do acidente e


como não acreditava que estivesse ali, quis dizer cada maldita
palavra... exceto hoje. Quer saber o porquê? — Não esperou
que respondesse— Porque quero estar aqui, contigo. É meu
aviso de quão boa pode ser a vida. Não importa como, este é
seu presente para mim.

Minha cabeça se levantou. Ignorei a dor que causou e


me derreti no olhar cálido de Brody, enchendo-se de
lágrimas.

— Estou agradecido por você, Lety. Veio de algo


horrível e se converteu em algo lindo...

Mesmo contra a minha vontade, Brody ligou para


seus pais e falou da minha briga com o Carlos. Quando
chegamos ao tribunal mais tarde, uma moça em traje formal
se aproximou, sorrindo suavemente. O cabelo curto loiro,
roçava seus ombros e um traje azul marinho cobria seu corpo

277
magro. Cumprimentou ao Brody, mas estendeu sua mão para
mim.

— Olá, Lety. Sou Cathleen Broderick. Os Moore me


contrataram para ser sua advogada.

Fiquei tensa e olhei para o Brody.

— Letz, de maneira nenhuma meu pai e eu


deixaremos que cuide disso sozinha.

Estava cansada e não dormi muito, estressada e


intimidada por ter que me apresentar no tribunal. No
momento, não discuti e estendi a mão para Cathleen.

— Prazer em conhecê-la.

Estendeu-me um cartão de papel grosso gravado em


relevo com letra dourada. Dei uma olhada em seu nome e
informações para contato.

— Vou acompanhá-la com a papelada, no processo e


quando ficar diante do juiz Harper. Se tiver alguma dúvida ou
perguntas depois, estou à sua disposição.

Meus ombros relaxaram lentamente ao saber que não


iria confrontar o juiz sozinha.

— Obrigada.

Sua voz suavizou.

278
— Lety, quando terminarmos, eu gostaria de retornar
ao meu escritório e discutir sua história com Carlos. Também
gostaria de ver algumas fotografias.

— Fotografias? — Jesus, não queria recordar esta


merda.

A mão de Brody se apoiou em minhas costas.

— Evidências, Lety. O oficial McAfee estava certo,


temos que começar a registrar e criar provas documentais.

Coloquei o cartão de Cathleen em minha bolsa.

— No caso de Carlos contra-atacar?

O olhar de Brody se obscureceu, mas foi Cathleen


quem respondeu.

— Lety, você desafiou a um agressor violento. Esta


situação piorará antes de melhorar. Quero que esteja
preparada para o que vier a acontecer...

279
CAPÍTULO 17
Pensei que certamente os pais de Brody o obrigariam
a cortar relações comigo. Ao invés disso, sua família me
tomou sob suas asas protetoras.

— Nada disto é sua culpa— insistiu Dionna— Não se


atreva a pensar isso nem por um minuto, querida.

Precisei de todas as forças em mim para não chorar


quando ela me abraçou.

O Sr. Moore me enfrentou com uma ira da qual ainda


não tinha sido testemunha.

— Não— concordou— Não é sua culpa. Isto é


inaceitável.

O Sr. Moore estava muito zangado pelo assalto e


pelas coisas que Brody revelou sobre o abuso, usou sua
influência para contatar o escritório do fiscal de distrito na
Filadelfia e Lehigh County. Não tinha certeza do que foi
discutido, só que Carlos agora estava sob uma maior
investigação.

A necessidade de me manter a salvo uniu Brody e


seu pai. Sua relação não era perfeita, mas a participação de
Brody nos cuidados de seu pai e seu mútuo objetivo de me

280
ajudar lentamente reduziam a tensão entre eles e curava
suas feridas. A presença do Brody na casa também mantinha
Dionna em casa. No princípio, pensei que era porque ela não
queria que Brody se desse conta da extensão de sua
ausência. E talvez era. Mas logo algo mudou e vi ela e o Sr.
Moore começando a se reconectar.

Sua preocupação por mim me tocou profundamente,


assim como o amor e a lealdade de meus amigos. Meathead,
Razor, Alice e Piper guardaram meu segredo. Nunca
mencionaram nada sobre essa noite, exceto para assegurar
que estavam ali por mim. Para falar a verdade, precisava do
apoio. A bomba que Carlos deixou cair bagunçou minha
cabeça. Com a insistência de Brody, comecei a ver um
terapeuta. Discutir meu passado não foi fácil e algumas vezes
era tão doloroso que o terapeuta parava as sessões.

Provavelmente, levaria anos para me curar de tudo,


mas dei o primeiro passo para isso.

Brody era incrível, paciente e tão amoroso, que em


alguns momentos, não parecia real. O que não era tão genial
era a relação física entre nós. Minha clavícula levou um longo
tempo para sarar e cada vez que tentávamos nos divertir, algo
a fazia doer, interrompendo a nossas mãos errantes e
lembrando ao Brody que não foi capaz de me proteger.
Felizmente, quando nossas férias de Natal chegaram, deixei
de usar a tipoia.

281
Brody e eu caminhávamos sobre a grossa camada de
neve com nossas botas forradas quando Evie abriu a porta
principal.

— Feliz Natal— disse ela.

Cumprimentamos-a com um beijo quando entramos,


eu tinha os braços cheios com os presentes que compramos e
Brody carregava o novo jogo de malas que me deu.

— Legal, Evelyn. Rosetta Stone está valendo a pena?


— Perguntou— lhe.

Evie riu.

— Tento aprender por causa do bebê, mas é mais


difícil do que pensei. Definitivamente, entendo mais do que
falo.

Tirei meu casaco e o pendurei junto com o de Brody


no grande armário do vestíbulo. No momento em que fechei a
porta, corri para seu lado e esfreguei sua pequena
barriguinha.

— E como está meu bebê, Evelyn?

Ela alisou seu estômago amorosamente.

— Crescendo. Acho que logo poderei competir com o


Papai Noel.

Peguei os presentes da pequena mesa onde os deixei


e a segui pelo curto corredor.

282
— OH, vamos. Apenas se nota. De quantas semanas
está?

— Acabei de completar vinte, mas já não entro em


minhas roupas.

Brody colocou minha bolsa na sala de jantar e nos


encontrou na cozinha, bem devagar, na intenção de observar
o lugar.

— Linda casa, Evelyn.

Ele não estava brincando. Teo e Evie moravam em


uma formosa casa colonial de 1920, saída diretamente de um
velho filme de Hollywood.

Ela se apoiou contra a mesa de granito.

— Obrigada. Só estamos aqui há um ano, mas Teo


quer comprar uma casa maior.

Observei-a espantada.

— Uma casa maior?

Ela assentiu.

Não podia acreditar. Sua casa media cerca de quatro


mil metros quadrados e isso antes de reformarem o porão.

— Caramba, Evie, quantos bebês você e Teo


planejam ter?

Ela ficou em silêncio.

283
— Não é tanto pelo tamanho, é mais por causa da
localização. Fica em outro condomínio fechado a alguns
quilômetros daqui. O prestígio e a riqueza superam a nossa,
por isso oferece mais vigilância e mais segurança.

E mais proteção do Carlos, não disse. Parecia mais


nervosa que da última vez que conversamos. Não precisava
ser um gênio para descobrir que ela e Teo temiam pela
segurança da família que aumentava. Se fosse possível odiar
mais o Carlos, eu consegui, mas fiz o meu melhor para não
demonstrar.

— Bom, espero que independentemente de onde


forem morar, sejam felizes.

Ela sorriu de leve.

— Sou feliz aqui, Lety. Amo esta casa. A família de


minha amiga a mantém impecável para nós. Tudo o que
tenho que fazer é aproveitar. — Seu sorriso se iluminou. —
Não quero me mudar se não houver necessidade.

— Então espero que possam ficar— disse-lhe.

Ela limpou suas mãos no avental, cobrindo seu lindo


vestido de veludo vermelho.

— Eu também— acrescentou solenemente.

Brody voltou de colocar os presentes debaixo da


árvore na sala de estar e apontou seu queixo na direção de
Evie.

284
— Vai querer saber o sexo?

— Não! — Disse Teo, descendo pelas escadas e


entrando na cozinha.

— Dá azar— concordei.

Brody se afastou para que Teo e eu pudéssemos nos


abraçar. Deu uma cotovelada leve em Evie, apontando para
mim e Teo.

— Vê? Este é um perfeito exemplo de outra das


loucuras dos latinos. — Abaixou-se para falar com a barriga
dela— Não tem escapatória, criança. Quando perceber estará
dançando em volta de um chapéu e balançando um frango
sobre sua cabeça para afastar os espíritos malignos.

Teo sorriu e deu um aperto de mão em Brody quando


este ficou em pé.

— Só trazemos frango na Páscoa, menino branco.

Brody inclinou sua cabeça.

— Para ter ovos para colorir?

Teo tentou não rir, mas o fez de qualquer maneira,


juntando-se a Evie, que teve um ataque de risos. Pôs seu
braço ao redor dele e o guiou para a geladeira.

— Vamos tomar uma cerveja. — Perguntou por sobre


seu ombro— Lety, quer um pouco de vinho ou outra coisa?

285
Era agradável ser legal. Brody completou vinte e um
anos pouco depois do Dia de Ação de Graças. Eu depois da
primeira semana de dezembro.

— Tomarei uma cerveja.

Evelyn retornou para a porta do forno e tirou a carne


assada que estava preparando.

— Teo, poderia me trazer água Seltzer e arándanos


vermelhos?

Ele franziu o cenho.

— Sente-se bem?

Ela sorriu.

— Estou bem. Só estou com vontade de algo


diferente.

Minha boca se encheu de água, enquanto o aroma da


carne assada flutuava para meu nariz.

— Uau. Está se tornando uma boa chef.

Ela devolveu o grande assado ao forno e fechou a


porta.

— Não foi você a garota que me disse, que se queria


segurar seu irmão, tinha que aprender a cozinhar?

Ri quando Teo deu um gole e envolveu suas mãos ao


redor dela.

286
— OH, querida, não acredito que agora possa se
desfazer de meu irmão nem se tentasse.

Ele mordiscou seu pescoço, fazendo-a ruborizar.

— Correto.

Abri a gaveta menor da pia e tirei um avental. Brody


juntou suas sobrancelhas quando o amarrei ao redor de meu
vestido prateado armado.

— Está cobrindo o melhor.

Teo pôs os olhos em branco.

— Importa-se? É minha irmãzinha e estou parado


bem aqui.

— Tem a sua mulher para acariciar. Eu tenho a


minha. — Brody encolheu os ombros e tomou um gole de sua
cerveja— Não tenho culpa se são parentes, amigos.

Olhei feio para Brody quando Teo murmurou uma


maldição.

— Venha comigo e pare de causar problemas— disse-


lhe.

— Vou tentar, mas você sabe que minha inteligência


brilhante e personalidade se recusam a serem domesticados.
— Beijou minha bochecha— O que vai fazer?

— Paella. Não demorará muito, já que está bem


adiantado. Teo, pegou o camarão e o chouriço?

287
Teo apontou ao refrigerador.

— Segunda gaveta.

Evie caminhou para o outro lado do balcão.

— Precisa de ajuda?

— Não, ela pode fazer isso com seus olhos fechados.


— Teo trouxe um banco— Aqui. Sente-se. Já fez o bastante
hoje.

Ela se sentou em minha frente, falando quando


levantei o olhar.

— Se fosse por seu irmão, ficaria sentada em casa o


dia todo nua, esperando que entrasse pela porta.

Teo apontou para ela com sua cerveja.

— Nunca disse isso. Mas pode fazer isso se quiser.


Não é nada mal, chegar em casa e encontrar sua mulher nua.

— Nua é bom— concordou Brody com um sorriso—


Posso gostar disso.

Evie sacudiu a cabeça.

— Jesus.

Ri e comecei a trabalhar. Teo estava certo em uma


coisa, podia preparar a maioria das comidas latinas com
meus olhos fechados. Minha tia passou anos me ensinando.

— Como está sua família Brody? — Perguntou Evie.

288
— Melhor desde que ficaram sob os cuidados da Lety.
— Piscou os olhos em minha direção— Ela investigou um
pouco e encontrou um parque de jogos para meninos com
necessidades especiais. Minha mãe começou a levar Tommy
algumas horas todos os dias. A ajuda a se relacionar com
outras mães na mesma situação e ele começou a fazer
amigos.

— Também a ajudou a criar um vínculo com o


Tommy. — Empurrei Brody com meu quadril. Não
acrescentei que ele e seu pai também criavam um vínculo,
não era da minha conta. Ao invés disso, falei sobre a
celebração do Natal com a família do Brody ontem à noite e
esta manhã.

Teo ficou rígido quando a campainha tocou. Baixei


minha tigela, esperando que não tivesse convidado nossa
mãe. Ela ligou quando obtive meu PFA, repreendendo-me por
envergonhar à família e insultar meu pai.

Evie levantou uma mão.

— Está tudo bem. É Killian.

— Killian Ou'Brien? — Evie assentiu lentamente.


OH... merda— E está bem com isto, Teo?

— Não.

Evie saiu da banqueta e desamarrou seu avental.

289
— Nós o encontramos algumas semanas atrás em
Philly. Mencionei que faria o jantar de Natal e o convidei para
vir quando comentou que sua família celebraria a véspera
este ano e é muito grande para acomodá-la.

Arqueei uma sobrancelha.

— Ah, Sofía ainda planeja ficar com MA e o tio Linho


esta noite?

Teo ficou tenso quando a campainha tocou outra vez.

— Se não planejasse, garanto que Killian não estaria


aqui.

Evie franziu o cenho.

— Prometeu que seria amável.

Teo seguiu Evie para o quarto, reclamando de algo


que não pude escutar e do que Evie simplesmente riu. Brody
se voltou para mim.

— O que aconteceu?

— Lembra— se do Killian, da festa de minha prima


Sol?

— Não.

— O homem alto que veio visitar Sofia... o velho


companheiro de briga de Teo?

— Não estou me lembrando, Letz.

290
Brody era esse tipo às vezes. Escutei vozes
aproximando-se, assim falei rápido.

— É da vizinhança. Ele e Teo estavam acostumados a


ser unidos, mas aconteceu algo entre os dois. Agora está
zangado porque pensa que Killian está apaixonado pela Sofía.

Teo e Evie voltaram à cozinha seguidos por uma


montanha de homem. Onde Teo era um peso pesado, Killian
era um peso pesado que brigava nos encontros profissionais
de MMA. O curto cabelo ondulado negro, cobria sua cabeça e
os olhos cor azul meia—noite piscaram para mim. Apesar de
todos os músculos que Killian possuía, sua postura era
surpreendentemente relaxada... como a de um tigre dormindo
ao sol depois de maltratar algo duas vezes o seu tamanho.

— Oi, Lety. — Sua profunda voz retumbou como um


trovão— Feliz Natal.

Sorri, feliz em vê-lo.

— Olá, Killian.

Brody o olhou desde suas botas extra grande até sua


estrutura de um metro noventa e seis.

— Ah. Coisa boa é que minha dignidade não é


ameaçada tão facilmente.

Abracei e beijei Killian antes de apresentá-lo ao


Brody. Os meninos se deram surpreendentemente bem e o
jantar estava quase pronto quando pés pisaram levemente no

291
terraço dos fundos. Todo mundo congelou quando minha
linda irmã, Sofía, entrou, agarrando cuidadosamente uma
grande assadeira de alumínio coberta com papel alumínio.

292
CAPÍTULO 18
O frio deixou o rosto exótico de Sofia vermelho. Os
flocos de neve cobriam tanto o gorro de lã cinza que usava,
como a parte exposta do longo cabelo encaracolado.

— Olá, fiz pasteizinhos cubanos...

Ela deixou de sorrir, ficando de queixo caído quando


viu Killian sentado na mesa da cozinha com Teo e Brody.

Killian ficou de pé, sorrindo levemente.

— Olá, Sofia. Como está?

— Ah— eh— olá.

Belisquei a ponta do meu nariz. OH, garota.

Sua gagueira combinada com o sorriso de Killian só


aprofundou o seu rubor. Evie se apressou para pegar a
assadeira.

— Olá, querida. Pensei que ficaria o dia todo ocupada


na casa de Linho.

Olhou de Teo ao Killian com a boca aberta.

— Ah. Jantamos cedo assim pude vir para cá. Tudo


bem, não é?

293
Teo, que até então parecia gostar do reencontro com
Killian, fulminou-o com o olhar enquanto falava com Sofía.

— Já te disse que esta também é sua casa. É bem-


vinda a qualquer hora.

Tentei esquecer o latejar em minhas têmporas. Está


bem. Isto será divertido.

Evie lançou um olhar mordaz ao Teo.

— E também é dos nossos convidados.

Ele levantou os braços.

— Ela não sabia que Killian estaria aqui, Evie.

— Agora sabe. Ah, ah— disse, apontando para ele. —


Sem brigar, sem gritar, é Natal... e o bebê pode escutá-los—
acrescentou quando Teo abriu a boca.

Sorri.

— Assim, Teo. Não xingue perto do bebê Evelyn.

— Fique quieta, Lety— disse-me.

Sua expressão suavizou quando Evie se aproximou e


o afastou de Killian.

— Ajude-me a terminar?

Teo cruzou seus braços em volta da cintura dela.

294
— Se isso significar que irá descansar. Já falei que
está trabalhando muito.

Ela acariciou seus musculosos bíceps tatuados num


estilo gótico com as palavras Ira e Poder. Para todos, meu
irmão parecia grande e malvado, mas Evie o tratava como se
fosse inofensivo. Quando se tratava dela, imagino que era.

— Estou bem, meu amor— acrescentou ela em voz


baixa.

Chamar Teo de "meu amor" pareceu esfriar o


temperamento de Mateo, mas eu não tinha certeza que isso o
impediria de recomeçar o drama com Killian. Houve uma
época que Teo e Killian eram inseparáveis, como irmãos.
Sabia que Killian tinha a reputação de sair com putas, mas
era uma boa pessoa e Teo sabia. Não entendia porque o
incomodava o fato de Killian estar loucamente apaixonado
pela Sofia.

Sofia tirou o casaco cinza e correu para pendurá-lo


no enorme cabide da parede. Usava sobre o corpo magro um
suéter comprido marfim com contas de pérolas, botas cinza
escuro que cobriam os jeans justo escuros até os joelhos.

— Como posso ajudar?

— Você e Killian poderiam pôr a mesa?

Então isso fez Killian ganhar outro olhar do meu


irmão.

295
— Eu adoraria— disse Killian, sorrindo para Mateo.

Sofia se moveu inquieta.

— Está bem... vou lavar as mãos.

Killian a observou sair. Mateo observou Killian vê-la


sair.

— Sério, Teo? — Perguntei.

— Falei com você?

Brody, felizmente, veio em meu socorro, a sua


própria maneira.

— Ouça, Killian. Não se preocupe, amigo. De vez em


quando, Teo também quer pendurar minhas bolas como
enfeites.

Killian riu entre os dentes e bateu no ombro de


Brody.

— Pode me chamar de Kill. Só os caras que me


conhecem desde criança me chamam de Killian.

— Kill? Como "Kill" 8?

— Correto.

Brody olhou Mateo.

— E já esteve preso?

8
Kill: Em inglês, kill significa matar

296
— Sim.

— Mmm. — Brody cruzou os braços. — E estamos


todos reunidos em uma casa para celebrar o nascimento do
menino Jesus. — Piscou para mim— Deveria ser uma festa.

OH, e foi. Bem, na realidade não.

Mateo se sentou à cabeceira da mesa, Evie a sua


esquerda. Provavelmente, queria estar por perto caso
precisasse acalmar ao Teo. Zangado ou não, Teo não se
arriscaria a acertar Evie, caso tentasse bater em Killian.

Brody e eu nos sentamos no outro lado, de frente


para Killian e Sofia.

— Como vai a faculdade? — Perguntou Killian.

Sofia brincava com a comida em seu prato.

— Vai bem.

— Apenas bem? — Perguntei, animando a minha


irmã tímida a falar.

Lançou-me um olhar de cumplicidade antes de voltar


a atenção ao seu prato.

— Meu trabalho com websites e a experiência em


informática ajudarão a pagar as contas, mas meu objetivo é a
decoração de interiores e design. Há muitos pré-requisitos
para trabalhar na área e a faculdade me ajudará a preenche-
los. — Sorriu para Mateo— Teo e Evie são muito bons e

297
pagam todas as despesas que ultrapassam os meus
rendimentos.

Killian sorriu à Sofia que ruborizou novamente. Sofia


estava caidinha por ele.

— Tenho certeza de que se saíra bem. — Disse-lhe.

— Somente se estiver focada— Teo pegou seu garfo


como se quisesse usá-lo para apunhalar Kill no olho. —
Contanto que ninguém a distraia, ela se dará bem.

— Não tento distrai-la, homem. — Fez uma pausa,


mantendo o sorriso treinado em Sofía— Não muito, pelo
menos.

A pobre Sofia se converteu em cervo frente aos faróis


antes de ser atropelada por um caminhão Mack. Teo? Ele era
o condutor do caminhão irritado que atropelou o Bambi,
quebrando seu para-brisa.

— Precisa se manter afastado de minha irmã, Kill.

— Já é uma mulher. Deixa-a em paz, carinho—


acrescentou Evie suavemente.

Kill inclinou seu corpo enorme contra a mesa,


inclinando-se em direção ao Teo.

— Não quero ser desrespeitoso, Teo.

Teo terminou de mastigar sua comida, engolindo com


dificuldade.

298
— Quase me enganou.

— Só estamos conversando, Teo— disse Sofía


baixinho.

Algo em sua declaração chamou o interesse de Teo.

— Sim? Desde quando?

Sofia olhou Evie com nervosismo.

— Depois que fui ao ginásio de MMA do Killian.

OH...

Teo baixou seu garfo.

— E por que demônios fez isso?

Mesmo quando Sofia franziu o cenho, conseguiu


parecer delicada.

— Não sabia que era seu ginásio quando aceitei o


emprego. Só que era encarregado do local. Precisava de ajuda
no escritório e na criação do seu site na Web. Eu o ajudei e
isso foi tudo.

Killian riu entre dentes.

— Só porque ela me dispensou quando a convidei


para sair.

Não tinha certeza se o rosto de Sofia pareceria menos


vermelho se usasse uma cor diferente do marfim, mas droga,
um tremendo rubor subiu pelo pescoço dela

299
— Não te dispensei. Eu... tinha uma prova.

Killian sorriu.

— Se é o que você diz. Mas sinta-se à vontade para


voltar aos treinos ou ao emprego.

Teo colocou seu garfo sobre a mesa.

— Não precisa aprender a golpear cabeças.

Sofia suspirou.

— Você aprendeu.

— Isso foi diferente. Golpear cabeças era algo no que


era bom. — Teo olhou Killian— Ainda sou.

A expressão de Killian se manteve ilegível. Mas tão


tranquilo como era, Teo o desafiou diretamente. Os músculos
de seus antebraços tatuados se incharam; estava preparado
para agir.

— Algum problema? — perguntou Teo.

Evelyn colocou sua mão sobre o ombro de Teo.

— Amor, é Natal. Por favor, pare.

— Droga, Teo. Por que ficar irritado?

— Fique fora disso, Lety.

Respondi no mesmo tom duro de voz dele.

300
— Por que deveria? Killian não fez nada... ou Sofia.
Você e ele eram próximos. Que droga aconteceu com toda
aquela merda fraternal?

— Fomos próximos uma vez— disse Killian, seu tom


sério.

— Então as coisas mudaram, não é? — O olhar letal


de Teo sobre Killian— Mas não tenho que lembrá-lo disso. Ou
sim, Kill? Sabe o que fez.

Killian levantou o queixo, remorso espalhando-se por


seu rosto.

— Teo...

— Deu-me a sua palavra. — Teo falou em voz baixa—


Sua palavra de honra e olhe o que aconteceu.

Todo mundo ficou imóvel, à exceção de Killian, que


apertou os punhos. Minha cabeça girava entre eles. O que
estava acontecendo não era bom. E Killian não negava.

Teo não tinha terminado.

— Minha irmã merece algo melhor que a merda que


fez e você sabe.

Passaram-se vários segundos de angústia até que


Killian relaxou sua mão. Quando o fez, cobriu a mão da Sofía
com ela.

— Qual o problema de tentar compensar isso?

301
Fiquei boquiaberta. Assim como Sofia. Também Evie.

Teo se endireitou.

— Um pouco tarde para isso, irmão.

Fiquei de pé, sem saber o que estava prestes a


acontecer. Brody sorriu, comendo alegremente sua terceira
porção do assado.

— Uau. Um montão de amor nesta mesa. Se


quiserem, podemos falar da separação de meus pais na
sobremesa ou a ruptura de meu apêndice durante a prova de
matemática no segundo grau. — Pegou outro bocado— Isso
sempre é bom.

Houve uma breve pausa enquanto olhávamos para


Brody que agia como se Teo não houvesse quase atingido o
corpo de Killian através da mesa. Talvez fosse o
comportamento de Brody ou o comentário ridículo, mas a
tensão se dispersou lentamente.

Sofia tampou a boca, tentando sufocar seu pequeno


riso.

— Brody, você é adorável.

Desta vez, foi a vez de Killian endireitar-se. Seus


olhos cortavam entre Brody e minha irmã caçula, vermelha
como um tomate. Brody parou de mastigar.

— Sofia. Não faça com que golpeiem minha bunda.


Só gosto quando Lety o faz.

302
O resto do jantar ocorreu tranquilamente,
principalmente, graças aos comentários divertidíssimos de
Brody e o pequeno bate-papo de Evie com Mateo. Killian foi
embora pouco depois da sobremesa e Teo, graças a Deus, não
tentou estrangulá-lo quando Sofia se ofereceu para
acompanhá-lo à porta.

Brody acariciou meu cabelo enquanto observávamos


como era bom viver como Teo e Evelyn. Por mais zangado que
tenha ficado, Teo acalmou-se e relaxou, encantado por sua
esposa.

Evie se aconchegava contra seu corpo comprido


estirado sobre o sofá. Teo sussurrou algo que a fez sorrir e
beijá-lo. Foi doce. Por mais assustado que a ideia de ser pai o
deixasse, ele acariciava levemente o ventre volumoso da Evie
enquanto continuavam a se beijar.

Pensar no tipo de pai que seria talvez o deixasse


nervoso, mas não a mim. Teo amava Evie e cuidaria da vida
que criaram juntos.

O filme não terminou, mas o momento se


transformou em algo mais.

— Hora de ir, pequena— sussurrou Brody.

Gemi, sem querer que fosse embora e o segui


relutante até o vestíbulo. Ele vestiu a jaqueta de couro. As
pontas de seu desgrenhado cabelo loiro roçavam seus
ombros. Estava comprido. Conhecendo-o bem, sabia que o

303
cortaria logo. Por hora, era meu para admirar. Toquei as
mechas com cuidado.

— Eu o verei em alguns dias, tudo bem?

Seus olhos piscaram enquanto diminuía a distância


entre nós.

— Sei que precisa de um descanso do trabalho e da


faculdade. Só que não gosto de ficar longe de você.

Baixei os olhos, sabendo que o olhava fixamente


como se o desejasse e me dando conta de que ele sabia.
Embora tivesse tirado a tipoia, dormimos separados na casa
de seus pais. Brody me queria em seu quarto. Eu queria
evitar criar problemas com seus pais, especialmente, agora
que as coisas estavam melhorando entre eles.

— Eu também não gosto. Mas não temos um lugar


próprio.

— Se tivéssemos, voltaria comigo?

A fase de lua de mel entre Teo e Evie continuou


muito tempo depois do "Sim, aceito". Estariam melhor se eu
não me intrometesse no espaço deles.

— Cara, se tivesse seu próprio lugar, com certeza


ficaria o tempo todo.

Senti as pontas de seus dedos tocando meu queixo.


Foi o suficiente para levantar meu rosto e encontrar sua
boca. Uma vez. Duas vezes. Beijou-me levemente três vezes

304
antes de fechar seus lábios com força contra os meus. Meus
dedos se afundaram em seu cabelo, enquanto sua língua
varria a minha e nossos corpos respondiam ao contato.

Duro. Era como sentia Brody contra mim. Músculos


duros formavam os braços que me envolviam com força, o
peito firme e liso empurrando contra o meu. Gemi enquanto
me beijava mais profundamente, meu coração batendo com
força contra minha caixa torácica.

Meus joelhos dobraram e caímos para trás contra a


pequena mesa da entrada. Brody se afastou para tomar ar,
praguejou levemente, antes de mergulhar de novo em minha
boca. Minhas pernas se separaram, permitindo que se
posicionasse entre elas. Não foi um esforço deliberado. Só
aconteceu. Tudo em mim reconhecia que ele encaixava em
mim. Suas mãos passearam das minhas costas, para meu
cabelo, contra meu traseiro, tentando aprofundar mais os
beijos.

Merda. Precisava me deitar... com Brody em cima de


mim.

Alguém limpou a garganta, bastante grosseiramente


e em modo ameaçador, fazendo-nos pular. Teo surgiu
ameaçador na porta, braços cruzados, expondo as tatuagens
em seus antebraços. Evie se apressou para chegar ali, seus
olhos dançando entre ele e Brody, que se mantinha bem
perto de mim.

305
— Teo, agimos da mesma maneira, se não pior,
quando estávamos saindo.

Teo não se moveu.

Brody sorriu.

— Ei, homem. Lamento por isso. Pensei ter deixado


cair minhas chaves pela garganta de Lety e tentava tirá-las
com minha língua.

Evie fez um estranho chiado e cobriu o rosto. A


expressão de Teo era uma mescla de aborrecimento com uma
dose pesada de "vou chutar seu traseiro". Deu um passo para
frente. Evie parou na frente dele, seu corpo pequeno
bloqueando sua grande figura.

Teo não falou. Grunhiu. Meu maldito irmão grunhiu.

— Sujeito engraçado ou não, se deixar minha irmã


grávida, juro Por Deus que arrancarei sua coluna e baterei
em suas bolas com ela.

Brody parou.

— Como uma piñata?

— Como a droga de uma piñata saída de seu pior


pesadelo.

Brody deu acenou rigidamente com a cabeça.

— É bom saber.

306
Evie envolveu os braços em um dos braços de Teo e o
guiou para os degraus lentamente.

— É tarde. Vamos para a cama.

Realmente não era tarde, mas acredito que todos


sabíamos disso. Graças a Deus, "cama" pareceu ser a palavra
mágica para captar a atenção de meu irmão. Seguiu Evie ao
andar de cima sem brigar. Não passou muito tempo antes
que escutássemos a porta de seu quarto fechar-se.

Sorri para Brody. Ele não me devolveu o sorriso. Seu


humor típico sumiu do seu rosto, mostrando uma
intensidade que nunca vi.

— Olha, sei que faz um tempo desde que estivemos


juntos e sei que é minha culpa por permitir que o Carlos te
ferisse.

Acariciei seu peito.

— Isso não é verdade.

— Lety...

— A única pessoa a quem culpo é o Carlos, mas não


quero pensar nele agora.

Agarrei os lados de sua jaqueta de couro e o puxei


para mim.

— Beije-me.

Um sorriso sexy se espalhou pelo seu rosto.

307
— Está bem, mas só porque insiste.

Beijou-me devagar, brincando, mas eu queria mais


do que uma provocação e uma amostra. Senti saudades e
cansei de nosso contato limitado nas últimas semanas.

Movi a mão entre nós e a deixei roçar para baixo.


Sim, estava indubitavelmente duro. O gemido de Brody
retumbou em seu peito. Não quis que eu brincasse sozinha,
assim, beijou-me mais profundamente e moveu as mãos
entre minhas pernas. Saltei. O contato foi breve, mas me
senti tão bem. Ele deve ter percebido, porque repetiu o
movimento. E uma vez mais.

— Deus, Lety— disse, seu coração acelerado contra o


meu.

Joguei a cabeça para trás quando beijou meu


pescoço e suas mãos passaram sobre as pontas endurecidas
de meus seios. Tentei ficar quieta, mas apenas não consegui.

— Desejo-o— ofeguei.

A respiração do Brody estava acelerada, enquanto


sussurrava contra meu ouvido:

— Também te desejo. — Suas mãos continuaram


viajando— Ao invés de desejar, façamos algo a respeito.
Podemos conseguir um quarto de hotel...

— Está bem. — Sabia o que estava me pedindo.

Suas mãos pararam sobre minhas costas.

308
— Será um lugar agradável. Prometo. — Falou
lentamente, como se tentasse me convencer.

Mas não precisava de persuasão. Já estava ali.

— Tudo bem— disse de novo.

— Sim? — Pareceu surpreso. Possivelmente,


esperava que lhe dissesse que ainda não estava pronta para
sexo. Mas estava. Estava há muito tempo.

— Só preciso pegar umas coisas antes da gente ir...

309
CAPÍTULO 19
Brody nos levou a um dos hotéis mais famosos no
distrito histórico de Philly. Deixei uma nota escrita ao meu
irmão na cozinha de Evie, avisando que voltaria no dia
seguinte. Ela entenderia. E de alguma maneira, pensei que
Teo o faria também.

Quatro pilares enormes estavam situados como


guardas frente à formosa estrutura de mármore. O porteiro se
apressou para nós.

— Já esteve aqui antes? — Perguntei.

Sorriu brandamente.

— Não, Letz. Nunca vim aqui antes.

Abaixei a cabeça. Sim. Precisava tanto escutar isso.


O porteiro abriu a porta. Saí, aconchegando-me em meu
casaco enquanto Brody pegava minha pequena mala no
porta-malas de seu Porsche.

— Ele é meu— pensei.

Agarrou minha mão. Apertei-a com força enquanto


passávamos através do grande vestíbulo, onde mais mármore
de cor marfim nos esperava. Alguém como eu não pertencia a

310
este lugar. Se não estivesse com Brody, seria arrastada para
fora.

A jovem atrás do balcão levantou suas sobrancelhas


levemente quando nos viu, provavelmente porque parecíamos
tão jovens e claramente não estávamos aqui com nossos pais.

Felizmente, não deixou que sua curiosidade


transparecesse.

— Boa noite.

— Olá. — Brody me soltou e pegou sua carteira,


tirando sua identificação e três cartões de crédito, sem deixar
dúvidas de que podia pagar um quarto.

— Sua melhor suíte disponível, por favor.

A mulher pegou seu cartão negro.

— Só por esta noite, senhor?

— Por enquanto sim. E eu gostaria de estender nossa


hora de saída tanto quanto possível. — Colocou sua mão no
balcão, chamando a atenção da mulher enquanto sua outra
mão acariciava minhas costas— É uma noite muito especial.
Por favor, preparem o quarto de acordo com a ocasião.

— Muito bem, senhor. — Seus dedos voaram sobre o


teclado, escrevendo rapidamente.

Brody era amável e seu comportamento relaxado.


Não ostentava sua riqueza, mas sua educação tornava fácil

311
para ele pedir e conseguir o que desejava. Agarrou minha
mão outra vez, sem dúvida sentindo meu nervosismo. Era
tudo o que podia fazer para evitar que meus joelhos
dobrassem.

— Gostariam de ajuda com suas malas?

— Não, obrigado. Queremos privacidade o tempo todo


que ficarmos aqui.

— Sim, senhor.

— Obrigada— consegui dizer.

A mulher sorriu gentilmente e assentiu. Era sutil,


respeitosa e me fez ruborizar. Ela sabia o que íamos fazer.
Brody pegou o cartão chave. Ela caminhou ao redor do balcão
da recepção e nos acompanhou em direção ao elevador. Como
se isso não fosse suficiente, fez sinal ao carregador que se
apressou em pegar minha pequena mala de rodinhas das
mãos do Brody.

Nenhum de nós falou até que chegamos à nossa suíte


e Brody fechou a porta atrás de nós.

— Este está bem? Se não, posso pedir outro quarto.

O pequeno corredor se abriu em uma grande sala.


Um lindo sofá confortável ficava em frente a uma lareira de
mármore entre o par de janelas panorâmicas. Chamas
dançavam na lareira, banhando a sala escura com um suave
brilho de bem-vindo. Toalhas brancas de linho cobriam uma

312
grande mesa redonda e duas cadeiras estofadas situavam-se
em frente às portas francesas que levavam ao terraço. No
centro da mesa, uma tigela de prata cheia de morangos com
chocolate derretido borbulhando, uma quantidade variada de
biscoitos e queijos rodeava uma garrafa de vinho gelado.

Ignorei o doce aroma de chocolate e caminhei para a


lareira, momentaneamente hipnotizada pela clássica
elegância da suíte e este momento entre nós. A nossa direita,
portas duplas se abriam para o dormitório, onde uma
clássica cama com dossel repousava contra a parede. Nosso
momento chegou.

— É perfeito.

Brody caminhou lentamente atrás de mim, movendo


sua mão através de meus ombros enquanto desabotoava meu
casaco. A pesada lã caiu a meus pés. Estremeci quando seus
lábios passaram ao longo do meu pescoço e seus braços
envolveram a minha cintura. Uma dor aguda de necessidade
assolou meu ventre indo diretamente para o meio das minhas
coxas. Não me lembro de ter precisado de ar tanto quanto
precisava dele. Suas mãos subiram, acariciando meus seios
quando inclinei o queixo para beijá-lo. Meus dentes
morderam levemente seu lábio inferior antes de terminar o
beijo e me afastar. Era difícil deixá-lo. Mas criou este cenário
perfeito e eu queria recompensá-lo. Dei um passo atrás
quando deu um para frente, sorrindo timidamente.

— Já volto.

313
Seu sorriso sexy quase me fez correr de volta para
ele.

— Leve o tempo que precisar.

— Tem certeza disso? — Seus olhos piscaram.

— Nem sequer um pouquinho.

Observou-me enquanto peguei a minha mala e entrei


no dormitório, fechando cuidadosamente as portas atrás de
mim. A primeira coisa que fiz foi tomar minha pílula, como fiz
todas as noites durante o último mês. Logo tirei a roupa e
pus um negligé preto transparente com calcinhas
combinando.... Um presente da Piper por salvá-la da Gretel
Ann. Apressei-me, ansiosa para voltar para Brody. Mas
enquanto me virava para escovar meu cabelo de frente para
um grande espelho oval, meus movimentos pararam ficando
mais lentos.

Olhei meu reflexo a cada lenta escovada. As ondas de


meus cabelos caíram por cima de meus seios e o negligé se
moldou as minhas curvas, o material era tão transparente e
fino que as aureolas escuras dos meus seios apareciam
através do delicado tecido. Não havia nada que quisesse mais
que ser tudo para Brody. Enquanto dava uma última
escovada em meus cabelos, esperava que pelo menos esta
noite, pudesse ser suficiente.

Com um suspiro determinado, abri a porta e entrei


na sala. Meu cabelo balançava nas minhas costas enquanto

314
eu caminhava pela sala. Brody esperava na mesa, descalço
com sua camiseta e calças, comendo os morangos. Congelou
e parou de mastigar quando me viu, seus olhos arregalando-
se, dei uma risadinha. Um jantar com cinco pratos, duas
sobremesas e meu homem ainda tinha fome.

Cruzei a sala lentamente, meu olhar cravado em seu


rosto enquanto ele passava os olhos pelo meu corpo. Parei
perto o suficiente para que meus peitos roçassem o seu.

— Olá— sussurrei.

Engoliu com grande esforço.

— Lety...

Não tinha certeza do que diria. Provavelmente, era


algo doce ou íntimo ou inclusive sexy. Mas não podia esperar
e o beijei, sem pressa a princípio até que superada a
surpresa, seu corpo respondeu ao meu.

Suas mãos acariciaram meus seios e ventre. Antes


que pudesse me tocar, realmente me tocar, tirei sua camiseta
e beijei seu peito. Meus dedos apressados para abrir seu
cinto e baixar suas calças e boxes. Brody praguejou,
tropeçando para trás enquanto eu caía em meus joelhos e o
abocanhava em minha boca. Morangos e queijos caíram como
pequenos montículos de neve e uma pilha de pratos se
estatelaram no chão atrás da mesa. Ignorei tudo menos o
Brody. Nesse momento, ele era o único que importava.

315
Trabalhei-o com minha boca, tomando-o profundo, dando
pequenos golpes com minha língua onde não podia alcançar.

Pela primeira vez, dei-lhe uma olhada. Brody estava


inclinado contra a mesa, agarrando a beirada com tanta força
que seus nódulos ficaram brancos, seu peito subindo e
descendo rapidamente. Gemeu fortemente, como se estivesse
com dor. Mas não estava. Tinha certeza, pois quanto mais o
acariciava mais endurecia. Abaixou sua cabeça, olhando-me
enquanto o tomava em minha boca. Pensei que fugiria e
baixaria meu olhar, mas não podia, apreciando o efeito que
causava nele.

Seus grunhidos me disseram que gostava do que


estava fazendo. Suas maldições me informaram que o estava
enlouquecendo. Cada gemido, cada grunhido, incitaram
minha paixão e o calor queimando entre minhas pernas.

Quando agarrou meus ombros, soube que explodiria.


Mantive minha mão nele, fazendo-o terminar enquanto Brody
paralisava contra uma das cadeiras e os tendões de seu
pescoço se esticavam. Minha mão continuou movendo-se
inclusive depois de seus espasmos cessarem. Não queria
deixá-lo ir, não enquanto minha respiração se mantinha tão
rápida quanto a sua. Suas mãos se enredaram em meu
cabelo, acariciando-o, até que me levantou e me carregou até
o sofá. Brody manteve seu olhar azul cinzento selvagem em
meu rosto.

— Deus, você é linda.

316
Foi a última coisa que disse antes que me devorasse
com seus lábios e suas mãos me percorressem inteira
seguidas pela sua boca. Saltei quando deixou minha boca
para roçar as pontas de meus peitos. Tomou com sua boca
um de cada vez, chupando, lambendo, usando seus dentes
para raspar o material contra eles. Segurei sua cabeça,
respirando com dificuldade enquanto tirava minha calcinha.

Com rápidos puxões, moveu as alças de meu negligé


pelos meus ombros, expondo as pontas rígidas de meus
seios. Seus dedos giraram e apertaram, sua boca me
saboreou. Brincou comigo durante o tempo que quis,
chupando e provocando, deixando-me louca.

Minhas pálpebras tremiam e minhas mãos passaram


por seu cabelo.

— Você gosta disso? — exalou contra minha pele.


Gemi em resposta. Ele sorriu, beliscando-os gentilmente—
Talvez você goste mais disto.

Dois de seus dedos passaram por meus lábios. Sabia


o que queria e os umedeci com minha boca. Brody praguejou
outra vez e levou seus dedos molhados entre minhas pernas,
empurrando-os dentro do meu corpo. Meus quadris se
ergueram, mas sua mão sustentou firmemente, movendo
seus dedos dentro e fora de mim, permitindo que sua palma
esfregasse contra o meu botão dolorido. Ofeguei, gemendo
seu nome.

317
— Brody.

— Sim? — Provocou. Enganchou seus dedos,


movimentando-os com rapidez.

— Brody.

Sua velocidade e fricção aumentaram enquanto


chupava e lambia meus mamilos.

— Deus. Brody!

Gritei seu nome enquanto chegava ao orgasmo.


Minhas pernas tremeram energia se espalhando por elas. E
Brody não se deteve. Prolongou a sensação, abandonando
meus peitos e enterrando sua boca entre minhas pernas.
Lágrimas de êxtase nublaram minha visão. Afastei-as,
querendo ver a maneira como sua cabeça e língua faziam
círculos abaixo. Desta vez, seu olhar permaneceu no meu.
Empurrei-me sobre meus cotovelos, inclinando minha pélvis
e balançando-a com força. Isso o deixou louco. Gemeu contra
mim, atraindo-me para perto. Enterrou seus dedos em meus
quadris, observando-me chegar ao orgasmo mais duas vezes
antes de me abaixar e se apoiar sobre seus pés.

Paralisei contra o tecido acolchoado. Brody ficou de


pé lentamente, ofegando forte.

— Tem certeza de que quer fazer isto? — Perguntou


sua voz brusca.

318
Minha cabeça ainda girava pela adrenalina, mas
assenti e me inclinei para lhe dizer que sim. Não havia dúvida
de quanto o desejava.

Brody se abaixou até estar acima de mim e se


colocou entre minhas pernas, provocando minha carne com
sua ereção. Cada roçada fazia com que meus olhos girassem
e meus dedos agarrassem seus ombros com mais força.

— Haa, caramba— gemeu.

Empurrou para frente, movendo-se contra mim, sua


pele quente e úmida contra a minha. Inicialmente, pensei que
mudou de opinião. Logo percebi que estava com dificuldades
para me penetrar. Abri mais as minhas pernas e beijei seu
pescoço, mordiscando e acariciando de forma que logo estava
gemendo outra vez. Continuei ajustando minha posição,
tentando ajudar meu corpo a receber o seu. Brody ofegou
quando teve êxito. Sim ele conseguiria. Brody se acomodou
em cima de mim, olhando-me enquanto me estirava
lentamente, cuidando para não me machucar. Mordi o lábio
inferior enquanto ele empurrava devagar para dentro mim.
Nossas preliminares me prepararam, mas não
completamente. A pele sensível começou a doer e queimar.
Tentei relaxar, preocupada de que parasse. Mas não o fez,
avançando com cada pressão de seus quadris. Brody não
suspeitou de nada até que uma dor forte o suficiente me fez
gritar. Seus olhos se arregalaram. Baixou o olhar entre

319
nossos corpos e logo depois olhou de volta para mim,
compreensão aparecendo em suas feições.

— Letz...

Agarrei seus ombros quando começou a retirar-se.

— Não— roguei- lhe— Quero fazer isto.

Não se moveu sua expressão atormentada.

— Por favor, Brody.

A cabeça de Brody caiu a meu lado, sua respiração


dura. Esperou um momento para começar seus movimentos,
movendo-se agonizantemente lento até que meu corpo lhe
deu as boas-vindas ao lugar que ele pertencia. Travei meus
tornozelos em volta de sua cintura, incentivando-o a mover-
se mais profundo e rápido. Enquanto o ardor se acalmava e
meu corpo aceitava o dele, Brody aumentava a velocidade e a
profundidade de suas investidas. Prazer rapidamente
superou qualquer desconforto. Nada importava então.
Somente Brody e eu. Deus me ajude, nunca queria deixá-lo
ir.

Um sol nublado derramou a pouca luz contra as


finas cortinas. Ia nevar de novo e não poderia me importar
menos. Jazíamos na cama, nossos braços ao redor um do
outro. Brody acabava de me beijar, dando-me bom dia ou boa
tarde. Não tinha certeza que horas eram. Tínhamos dormido
muito, tentando nos recuperar de nossa noite.

320
Afastou-se, acariciando minha bochecha
cuidadosamente enquanto se inclinava sobre mim. Apesar de
sorrir para mim, notei uma preocupação oculta em seus
olhos.

— Por que não me disse que era virgem?

— Isso importa? — perguntei em voz baixa.

Sua mão passou por meu rosto, ao longo de meu


braço para entrelaçar nossos dedos.

— Sim. Importa. Sinto que tomei algo especial de


você.

— Não tomou. Eu quis lhe dar isso— Sorri


meigamente— E estou feliz por fazê-lo.

Ele baixou sua cabeça, permitindo que sua testa


viesse levemente sobre a minha.

— Obrigado— sussurrou.

Não se moveu por um tempo, permitindo que o


momento entre nós se convertesse em uma lembrança que
sempre amarei.

— Só gostaria de estar ciente— disse— Poderia ter


feito especial para você.

Beijei seus lábios.

— Foi. Ontem à noite foi a melhor da minha vida.

321
— Poderia ter sido melhor— acrescentou quase
silenciosamente. Virou- se ficando sobre suas costas
colocando seu braço sobre os olhos— Deus, Lety. Sinto-me
como um imbecil.

Apoiei-me em meu braço, franzindo o cenho.

— Porquê?

— Pensei que você tinha transado ao menos algumas


vezes. Nunca me ocorreu que não tivesse experiência. Deveria
ter pensado. Só que não o fiz.

Sorri e repousei minha cabeça em minha mão.

— Porquê? Porque sou uma garota do lado mau da


Filadélfia?

Brody afastou seu braço.

— Não. Porque é desgraçadamente linda. — Meus


lábios se abriram pela honestidade em sua voz, colocando um
lento sorriso relaxado em seu rosto. — Não entende, certo?
Quantos homens te desejaram.... Quantos quero arrebentar
por isso.

Bati seu peito de brincadeira.

— Brody, deixa de brincadeira.

Ele segurou minha mão e a beijou.

— Não é brincadeira. Não desta vez. — virou- se para


mim, mantendo nossos dedos entrelaçados— Poderia ter

322
quem quisesse. Sempre pôde. Sei que pensa que todos estão
olhando a Piper quando caminha junto a ela... e fazem depois
que terminam de te despir com os olhos.

— Isso não é verdade!

Riu do meu rosto ruborizado.

— O que quero saber é. Confie em mim, acredite não


estou reclamando, mas por que esperou? Não me diga que
ninguém tentou.

Minha voz se suavizou, assim como seus olhos


enquanto observava as emoções passando pelo meu rosto.

— A verdade?

— Sim. — Assentiu

— Há duas razões: primeiro, tenho muitos


arrependimentos. Se realmente pensar nisso, são muitos
considerando quão jovem sou. — Suspirei— Não queria
perder minha virgindade e ser um deles. Assim esperei, por
alguém que valesse a pena esperar.

— Então todos esses homens antes de mim...

— Eram idiotas que só queriam tirar as minhas


calças.

— E depois de mim? — Sua voz profunda abaixou—


Nosso rompimento me arruinou Lety. Na verdade, destruiu-
me, mas sei que também a machuquei.... eu sei que ao

323
menos alguns rapazes lhe pediram para sair, no momento em
que souberam que tínhamos terminado.

— Mas não eram você. — Disse a mim mesma que


não seria uma menina chorona, mas um nó doloroso já
estava instalado na minha garganta. Nosso rompimento
ainda me perseguia. Pior que a surra que meu pai me deu
nesse dia, foi saber que tinha que me afastar da única pessoa
que me fazia feliz e acreditar que estava melhor sem mim. Eu
brincava com a beirada do lençol que cobria a minha barriga.

— Quer saber a outra razão pela qual não tive sexo


antes de ontem à noite? — Sustentei seu olhar quando
assentiu— Porque te amei uma vez... e nunca deixei de amar.

Ele ficou quieto. Deveria ter mantido minha boca


fechada, mas não pude.

— Nunca me senti assim antes, com ninguém. Você é


tudo em que penso e tudo o que quero. O ano passado foi o
pior da minha vida.... porque você não fez parte dele.

— Também te amo.

Meu coração parou.

— Não tem que dizer...

— Do primeiro dia que te conheci e me bateu com o


maldito livro de física.

Não podia respirar.

324
— Era de química— consegui dizer. — Podia ter
quebrado as suas costelas.

Bufei, agora chorando totalmente.

— E mesmo assim me enlouqueceu. — subiu sobre


mim, sorrindo em meus lábios e secando minhas lágrimas
com seus polegares— Eu te amo, Lety. E juro Por Deus que
sempre amarei...

325
CAPÍTULO 20
Dormimos mais duas noites no hotel.
Provavelmente, teríamos ficado mais tempo se não fosse pelo
telefonema da Dionna.

— Carinho— disse a Brody— Papai está muito


doente. Precisamos que venha para casa.

Brody me levou para a casa do Teo. Literalmente,


jogamos nossas malas no meu carro e o segui de retorno ao
Saucon Valley Rose. Ambos corremos para dentro da casa a
tempo para ver o Dr. Frenen descendo os degraus. Levantou
sua mão, esperando-nos perto do alpendre.

— Edward contraiu uma infecção respiratória.


Estamos tratando-o de forma agressiva com antibióticos, mas
com sua respiração comprometida, tenho medo que não fique
bem.

Droga. Dr. Frenen olhou-me nos olhos.

— Lety, vou deixá-lo aos cuidados de uma enfermeira


registrada. Audrey tem muita experiência e trabalhou por
muitos anos em um asilo para idosos. Ela ficará aqui o tempo
que for necessário. Não é nada pessoal, mas Edward requer
mais cuidado do que uma AEC pode lhe dar neste momento.

326
— Não me deve explicações. Entendo-o
perfeitamente. — De onde estávamos, podia escutar o som da
equipe médica— Com todo respeito, Dr. Frenen, se o Sr.
Moore estiver doente, não deveria estar no hospital?

Brody cruzou de braços.

— Papai não gosta de hospitais. Disse inclusive que


quando chegar a sua hora quer estar aqui.

Isso explicava todo o equipamento de alta tecnologia.


Brody passou uma mão por seu rosto. Deus, parecia muito
cansado.

— Doc, onde ficará Audrey? E Roger, onde está?

— Audrey está ficando no quarto que Lety e Roger


usam para seus turnos noturnos. Roger ficará em casa com
sua família. — Voltou sua atenção para mim— Como ele,
Lety, continuará trabalhando aqui. Entretanto, com Audrey e
eu cuidando do Edward, sua participação e tarefas serão
limitadas.

— Você ficará aqui também? — perguntou Brody. O


Dr. Frenen assentiu.

— Estarei aqui tanto tempo quanto Edward me


necessite. Temo, entretanto, que ocupei a sala vazia do
primeiro andar.

Brody sacudiu sua cabeça.

— Isso não importa. Lety estará comigo.

327
Agarrei a mão de Brody e a apertei. Nessas
circunstâncias, não havia maneira de deixá-lo sozinho.

— Se Audrey necessitar minha ajuda, estou


disponível a qualquer hora.

O rápido olhar do Dr. Frenen a nossas mãos


entrelaçadas foi o único reconhecimento que deu a nossa
relação.

— Obrigado, Lety. Estou certo que Audrey agradecerá


sua ajuda.

Os dedos do Brody ficaram impressionantemente


frios.

— Posso vê-lo?

— Sim. Está descansando. Seu corpo está exausto de


lutar contra a infecção, assim pode não estar disposto a
conversar.

— Não tenho que conversar. Só quero ver como está.

Seguimos ao Dr. Frenen para o andar de cima. Logo


que chegamos ao segundo piso, Dionna falou sua voz com
preocupação exagerada.

— Tenho medo de que seja minha culpa, Audrey—


insistia ela— Tommy jogou com muitos meninos, alguns com
fluido nasal. Deveria ter lavado melhor suas mãos.

328
— Estou certa de que não é sua culpa— respondeu
uma voz tranquila— As pessoas ficam doentes mesmo com o
melhor atendimento.

As luzes estavam apagadas ao redor da cama do Sr.


Moore. A única luz brilhava à esquerda, onde uma mulher em
seus quarenta anos— Audrey presumia— vestida dos pés à
cabeça em uniforme branco, trabalhava em bombear a
intravenosa. Adicionou uma grande seringa cheia de
medicação à administração da cânula e passou seus dedos
pelo teclado. Com um último bip, a medicação começou a
entrar, bombeando através da cânula com alguns cliques
simples.

O Sr. Moore estava em sua cama coberto com um


lençol branco areia em seu colchão especial assentado em
pequenas ondas debaixo de seu corpo. A cor azul escuro de
suas veias ao longo de suas pálpebras fechadas parecia
afundar seus olhos em suas órbitas, dando uma aparência de
morte iminente e apagando qualquer vestígio do homem
sorridente que deixei na manhã de Natal.

Ficou doente muito rápido. Não esperava nada disto.


Alguns dias atrás, seus pulmões estavam limpos e sua
oxigenação era perfeita.

— Quando começou a ter os sintomas?

O Dr. Frenen tirou seu estetoscópio do bolso de seu


cardigã.

329
— Roger escutou os primeiros sintomas ontem de
manhã. Começamos a tratá-lo, mas a infecção nos superou.

— Entendo— adicionei. Era difícil pensar sobre o que


poderia acontecer ao Sr. Moore, especialmente, com aqueles
mais próximos a ele que se reuniram em torno de nós.

Tommy se sentou ao lado de sua mãe. Esperaram na


cadeira perto do centro do quarto, o suficientemente perto
para observar, mas o suficientemente longe para que não
interferissem com o cuidado do Sr. Moore.

Tommy nos olhou com olhos tristes. Não era o


mesmo menino que eu conheci, o menino vacilante de
aproximar-se de sua mãe. Estava sentado com seu pequeno
urso perto de Dionna e suas mãos ao redor do seu pescoço.

Dionna, em resposta, abraçou seu pequeno quadril


com seus braços, procurando a comodidade tanto para ela
como para ele. Calor encheu meu peito, reconhecendo quão
próximos se tornaram depois que ela se permitiu amá-lo.

Fomos apresentados a Audrey rapidamente antes de


Brody se sentar junto ao pai.

— Olá, papai— disse baixinho.

As pálpebras do Sr. Moore se moveram, mas não


respondeu. Não estava certa se estava dormindo ou
simplesmente débil, mas não queria saber. Este era seu

330
momento com o filho. Não o negaria. Assim beijei a cabeça de
Brody e me afastei cuidadosamente para ver Dionna.

Caminhei ao centro do quarto e me ajoelhei junto a


ela.

— Como está? — Perguntei.

Ela forçou um sorriso.

— Estou bem, Lety querida. Desfrutou do tempo com


sua família?

— Sim. Obrigada. — Algo a respeito dela parecia


diferente. Não podia precisar o que era. Só sabia que não
parecia bem. Era mais que a saúde do Sr. Moore e me
preocupava— Poderia te ajudar em algo?

Tommy soltou a sua mãe e pegou a minha camiseta.

— Let— tee? — Apontou ao Mr. Moore— Papai.

Os lábios da Dionna tremeram várias vezes, lutando


entre manter seu sorriso e perder o que ficava de sua
compostura. Assim que cheguei até ela, os alarmes do
respirador estalaram.

Virei minha cabeça em direção ao Sr. Moore. Brody


se levantou bruscamente para mover sua cadeira enquanto o
Dr. Frenen começava a dar ordens a Audrey. Corri para a
cama, puxando a cadeira e afastando o Brody para que o
doutor e Audrey tivessem mais espaço para se movimentar.

331
Brody agarrou meu braço.

— O que está acontecendo?

Olhei sem poder fazer nada à medida que Audrey


injetava algo na intravenosa do Sr. Moore enquanto o Dr.
Frenen ajustava a configuração do monitor. Outro monitor
soou.

— Lety? — Perguntou Brody, sua voz tremendo.

— Seus níveis de oxigênio estão baixando— consegui


dizer.

— Lety! — Gritou o Dr. Frenen— Pegue a bolsa de ar.

Soltei Brody e corri ao outro lado do quarto. Minhas


mãos passaram sobre os equipamentos médicos no grande
armário, meus olhos examinando as etiquetas dos pacotes
freneticamente até encontrar o correto. Corri de volta
enquanto Audrey injetava algo mais na intravenosa. Fosse o
que fosse, alterou o Sr. Moore, suas pálpebras
completamente abertas.

— Abre o kit e puxe o equipamento— insistiu


Audrey— Nós faremos o resto.

— Brody— chamou o Sr. Moore, sua voz débil.

Subi na cama, tirando o plástico da tenda e


prendendo—a nos postes da cama.

— Fale com ele, Brody. Faça-o saber que está aqui.

332
Brody se moveu para frente, tomando as mãos de seu
pai. Ao princípio parecia estar perdido, então algo passou e
começou a lhe perguntar se recordava a primeira vez que
foram navegar à baía Pulôver. Afastei-me da cama, deixando-
os sozinhos. Foi então quando o segundo alarme parou.
Estava a ponto de derrubar água esterilizada no motor da
máquina quando o outro alarme parou abruptamente.

Fiquei de pé, tremendo tão forte que os conteúdos


salpicaram as paredes do recipiente de plástico.

— Ele está bem. — Audrey retirou o recipiente das


minhas mãos— Lety, está bem, querida— disse ela de novo
quando falhei em me render a seu apertão.

Pensei que Audrey estava drogada, mas de todos os


modos assenti. Os níveis de oxigenação na tela do monitor
alternavam entre 94 e 96 por cento, excelente considerando
que caíram para cinquenta minutos antes. E embora a
palidez do Sr. Moore mantinha o mesmo tom mortal,
agradeceu a Brody com uma voz firme.

A ideia de aumentar minha adrenalina me ocorreu


mais de uma vez. Se não fosse pelo tom calmo do Dr. Frenen
em seu celular junto a mim, poderia ter vomitado em cima
das sapatilhas brancas e limpas da Audrey. Falava com
cuidado, trocando os antibióticos do Sr. Moore de três fortes
para quatro mais potentes. Não podia culpá-lo. Se o Sr.
Moore desenvolvesse uma pneumonia, poderia jamais se
recuperar.

333
Brody continuou conversando com seu pai.

— Lembra do tubarão? — Perguntou ele— Pensei que


era brincadeira quando me disse que foi o que pescamos.
Parecia pequeno, muito pequeno. Esperava por dentes.

Seu pai respondeu tão baixo que não consegui


escutá-lo mesmo estando tão perto. Fiz gestos ao redor da
cama.

— O que isso faz exatamente?

— Umedece e oxigena o ar em volta dele. O Dr.


Frenen estava considerando usá-lo. Não queria manter Sr.
Moore fechado sem necessidade.

Ajustei a tenda de plástico, sentindo como se tivesse


colocado um Band— Aid do Bob Esponja sobre uma ferida
enorme.

— Assim tudo isto foi por nada? Não fui muito útil.

Audrey sorriu com carinho.

— Não, Lety. Tudo isto o ajudará e facilitará a


fisioterapia peitoral que o terapeuta respiratório e eu
planejamos.

Não tinha certeza falava a verdade, mas apreciei sua


amabilidade.

334
— Tudo bem. Se precisa de mais alguma coisa....
Avise-me. — Assim posso chamar alguém que realmente
tenha uma boa ideia.

Ela sorriu de novo.

— Pode deixar, Lety.

Dionna atravessou o quarto, guiando o Tommy pela


mão. Esqueci que ele estava aqui.

— Dionna?

Ela estendeu a mão para mim.

— Tommy está faminto. Não jantou.

Em poucos minutos descemos escada abaixo. Eu


preferia ter ficado no caso de Brody ou a equipe médica
necessitarem de mim, mas alguma coisa em sua voz me
chamou atenção, algo estranho, inclusive para ela. Quando
entrei na cozinha, Tommy estava sentado na mesa, comendo
ruidosamente um sanduíche de manteiga de amendoim e
geleia. Dionna colocou leite em um copo para ele e acariciou
seu cabelo escuro, sorrindo com adoração para o pequeno.

Ao princípio pensei que Dionna estava bem, genial,


considerando que eu certamente não estava. Minha mente
reproduzia o cenário uma e outra vez em minha cabeça
enquanto lutava por compreender tudo o que o Dr. Frenen e
Audrey fazia pelo Sr. Moore. Epinefrina. Deveriam ter dado
epi para abrir seus pulmões e forçar seu coração a trabalhar

335
mais para fornecer oxigênio. Por isso o Dr. Frenen escutava o
coração dele quando saí. Duas doses... Acredito que isso foi o
quanto recebeu. Se estiver certa, seu coração estava
acelerado. Que mais fizeram? Teria que lhes perguntar mais
tarde. Fosse o que fosse, funcionou e evitou que tivesse uma
parada respiratória ou cardíaca.

Minhas mãos ainda estavam trêmulas quando enchi


um copo com água na pia. Sabia que precisava me
tranquilizar, exceto que era difícil. O Sr. Moore poderia ter
tido uma parada cardiopulmonar. Nenhum de nós seria
capaz de salvá-lo. E sua família o teria visto morrer.

Talvez fosse minha necessidade de me preparar para


o pior ou minha mente analítica trabalhando através de meus
nervos. Isso me fazia rever os passos para RCP9.

— Aconteceu algo, não é, Lety?

A voz da Dionna me trouxe de volta à realidade. Não


entendi a pergunta.

— O quê?

Meio envergonhada, Dionna foi para trás de mim,


estendeu a mão e pegou uma maçã da fruteira de cristal.
Devolvi o copo à mesa antes de tomar um gole e a observei
pegar uma faca de açougueiro.

9
RCP: Reanimação cardiopulmonar

336
— Eu disse que aconteceu algo. — Levantou a maçã
para olhá-la contraluz da lâmpada pendurada do teto,
inspecionando a fruta como um diamante que pudesse ser
lapidado— Tommy adora maçãs, não?

Sua voz estava no mesmo tom exagerado de antes,


mas algo havia mudado. Como aconteceu antes no andar de
cima quando me disse que Tommy estava faminto.

Não esperou que respondesse.

— Deve ser sua fruta favorita, não?

Concordei aturdida.

Dionna se colocou com as costas para o corredor e


começou a cortá-la. Um arranhão aqui, outro ali. Algumas
partes finas, outras mais como pedaços...

— Sabe, você deve ser especial.

Coloquei o copo sobre a mesa.

— Desculpa?

Ela balançou a mão.

— Para o meu Brody, querida. Ele te adora, a forma


que sorri quando te vê. É como se seu dia não começasse até
você entrar em cena. — Uma lágrima escorreu por seu
rosto— Edward agia da mesma forma comigo um tempo
atrás. Cobria-me com amor, presentes e joias, quase não

337
parecia real. Um homem como ele, tão rico e bonito, dando
atenção a uma inocente como eu que vinha do nada.

Outra lágrima caiu enquanto passos ecoavam do


corredor. Meus lábios se separaram. Jesus Cristo, Dionna
estava surtando.

— Mas foi real, Lety. Foi. — Limpou a folha da faca


contra suas calças, sujando a malha antes continuar
cortando de forma retalhada a maçã— Não sabia o que era e
o dava por certo. — Ela apontou para mim com a faca— Não
o dê por certo. Não, não, não, não se atreva.

Sacudi minha cabeça, sem saber realmente o que


fazer e me dando conta que ela não estava completamente
comigo.

— Não o farei.

Dionna terminou de cortar o que ficava da maçã


mutilada, logo a partiu ao meio. Cortou dois pedaços de novo
antes de baixar a faca e olhar fixamente seu trabalho. Seu
peito ofegava para cima e para baixo, suas respirações
acelerando-se como se tivesse corrido a toda velocidade.
Cuidadosamente, aproximei-me dela e tirei a faca de seu
alcance. Não tinha certeza se feriria a si mesma, mas não
quis me arriscar.

— Dionna, acredito que deveríamos ir ao andar de


acima e falar com o Dr. Frenen, está bem?

338
Sacudiu a cabeça grosseiramente, fazendo com que
seus cabelos batessem contra seus ombros e caíssem em
mechas desordenadas junto a seu rosto. Sua expressão
mudou enquanto sua mente sucumbia às lembranças
propagando-se em sua cabeça.

— Nem sequer pense que há melhores lá fora, Lety,


porque não há. Não há ninguém melhor que meu Brody e
meu Edward. Entende o que estou dizendo? Nunca
encontrará a alguém melhor, assim não pensa que
encontrará.

— Sei que não há ninguém melhor que o Brody—


falei brandamente. Soluçou e meneou um dedo reprovador
para mim.

— Pensa isso agora, mas estou te advertindo, as


coisas mudarão. Convencerá a si mesma de que pode fazer
melhor. Depois de tudo, aqui está este rico homem bonito que
te ama e te diz que é algo especial, assim deve ser verdade,
não? Pode ter a qualquer mulher, o mundo está a seus pés?
Assim em vez de só apreciar o que tem, começa a procurar
mais: mais elogios, mais homem bonitos, porque se a gente
pensar que é especial, todos o farão.

Minha cabeça ficou tonta. OH, Deus.

Lagrimas ziguezagueavam por suas bochechas,


manchando com rímel e criando linhas feias em sua
maquiagem perfeita.

339
— E então Brody descobre. E se dá conta de que está
te perdendo. E começa a..... ferir-se sem saber o que está
fazendo. Beberá porque não quer pensar com quem está
deitada, não quer acreditar que já não o ama, esquecer o
aroma do perfume de outro homem em seu corpo.

Coloquei minha mão sobre minha boca, a verdade


golpeando tão forte contra mim que quase me derrubou.
Dionna não começou a passar tempo longe do Edward Moore
porque se transformou em um bêbado. Ele bebia porque a
mulher que amava dormia com outro homem.

O olhar vidrado de Dionna encontrou o meu.

— Mas sabe quem são os que mais sofrerão? Seus


filhos, Lety.

Meu estômago se contraiu brutalmente. Não. Não


diga. Brody parou atrás dela, preso no lugar, seu rosto
cinzento do momento em que entrou na cozinha e escutou as
palavras de sua mãe. Dionna sabia que ele estava ali. Droga,
ela sabia. Mas a culpa e sua voz alta me diziam que não ia
parar sua confissão agora.

— Por causa de suas indiscrições, sofrerão Lety. Por


causa de seu egoísmo! — Ela esbofeteou as mãos sobre seu
rosto, incapaz de suportar sua própria verdade— Seu marido
arrasado, destruirá si mesmo, a você e seus filhos.... entrará
em um carro quando não deveria dirigir.... Irá te buscar, Lety,
porque foi suficientemente estúpida para estar com um

340
homem a quem ele uma vez chamou de amigo. — Baixou as
mãos, sua voz agora apenas um chiado e sua expressão triste
a um fôlego de destroçar— Desejará te encontrar, implorar
para voltarem juntos. Mas ele e seus filhos nunca chegarão
até você, não quando está longe, encontrando-se com um
homem com quem não deveria estar...

Seu corpo inteiro convulsionou por causa do choro


intenso. Levantei meus braços e os abaixei em seguida, na
dúvida entre consolá-la e gritar para que o Dr. Frenen
descesse depressa. Mas então, entre um suspiro e outro,
Dionna se deteve... parou de tremer... de chorar... parou de
respirar.... Simplesmente parou.

Assustei-me quando se moveu abruptamente e


limpou as lágrimas restantes de suas bochechas.

— Sinto muito, Lety. Não sei o que deu em mim. —


Colocou no rosto o sorriso que vi centenas de vezes— Se me
desculpar, devo ver meu Edward.

Ela passou por Brody, ignorando suas respirações


desiguais e punhos apertados. Não disse uma palavra. Mas
enquanto via a primeira lágrima escapar dos olhos dele, dava-
me conta que já havia dito suficiente.

Caminhei lentamente em sua direção, minhas mãos


estendendo-se para consolá-lo.

— Bebê...

341
Brody pegou a fruteira de cristal e jogou contra a
porta da dispensa, quebrando-a em pedaços quando se
chocou e caiu no chão.

— Porra!

Esperança, a faxineira, entrou depressa, gritando


enquanto Brody saia pela porta traseira. O vidro se estilhaçou
ficando só o quadro da porta enquanto seguiu sozinho,
desaparecendo na escuridão.

— Brody! — Os gritos de Tommy me impediram de


correr atrás dele. Suas pequenas mãos estavam cobertas com
manteiga de amendoim e seus olhos arregalados de medo.
Levantei em meus braços. — Tudo bem, querido. Tudo bem
vou procurar Brody, está bem?

— Bro— dee? — repetiu ele.

— Sim, querido. Vai para o seu quarto jogar um


pouco?

— Jogar?

Tratei de sorrir.

— Sim, amigo. Jogar. — Entreguei ele a Esperança,


falando rapidamente em espanhol e lhe dizendo o que fazer.

Quando a vi concordar, agarrei um grande edredom


colocado sobre a cadeira e corri a toda velocidade para fora. A
escuridão se estendia sobre o jardim inglês. A única luz vinha
da janela da cozinha e desaparecia entre a primeira fileira de

342
roseiras. Corri para fora, examinando tudo em volta, meu
fôlego falhando quando encontrei a marca das grandes
pegadas do Brody na abundante neve.

Dirigia-se para os fundos da propriedade, onde a


extensão de grama terminava e começava o denso bosque.
Corri, minhas botas afundando na neve e o edredom
agarrado contra meu peito. Um vento forte se levantou,
lançando neve sobre o meu rosto e jogando meu cabelo em
todas as direções. Coloquei-os para trás irritada, com medo
de perder Brody no frio e escuridão.

343
CAPÍTULO 21
O vento aumentou enquanto corria, através do
jardim e mais à frente do pequeno pátio de jogos. Na área
aberta, a neve estava mais alta e sua capa superior era puro
gelo, impedindo meus passos e me atrasando. Tropecei
quando a neve chegou a meus joelhos. A confusão branca se
desmoronou, entrando pelo cano de minhas botas. Olhei
atrás de mim, agradecida de que as luzes da casa
iluminassem a escuridão. Enquanto fossem visíveis, eu não
me perderia.

Um grunhido doloroso me obrigou a virar à direita.

— Brody?

Outro grunhido, mais forte.

— Brody?

Mais grunhidos, um eco de ruído e agonia. Meus


olhos encheram-se de lágrimas. Senti sua dor em cada
lamento.

Caminhei para o som cada vez mais alto, procurando


evitar que o edredom roçasse nos bancos de neve. Enquanto
me aproximava, meus olhos se acostumaram à escuridão e o
encontrei.

344
Brody estava dentro do perímetro da propriedade na
parte arborizada, de joelhos diante de um grande carvalho,
sua cabeça inclinada e as mãos penduradas dos lados.
Apressei-me. A neve não era tão profunda ali, mas cobria o
chão o suficiente para me impedir de ver as raízes que se
sobressaíam. Amaldiçoei quando tropecei e meu joelho bateu
em uma pedra.

Levantei-me e continuei meu caminho. Não me


preocupava comigo. A confissão de Dionna foi horrível e me
incomodava. Não podia imaginar o que fez com Brody.

Com minhas mãos trêmulas peguei o cobertor e o


coloquei sobre seus ombros com cuidado. Como não o
agarrou, apertei o cobertor ao seu redor, envolvendo-o com
seu calor abaixando-me aos seus pés.

— Olá, Letz. — Seu olhar se fixou no tronco da


árvore— Quer apostar qual das famílias é mais problemática?
Se for assim, acredito que ganhei um ponto hoje.

A devastação da confissão de sua mãe estava


marcada em sua voz, aprofundando e tornando-a vazia. Mas
foi sua expressão em branco o que me preocupou mais.
Agarrei seu rosto. A bochecha parecia como o gelo contra a
palma de minha mão.

— Brody...

— Não precisava escutar essa droga, sabe? Não


agora, nenhuma maldita vez.

345
Agarrei suas mãos e as levei ao meu peito. A pele
sobre seus nódulos estava machucada. Quando as examinei,
não pude conter meu soluço. A pele estava aberta e úmida
com sangue fresco.

Olhei o tronco da árvore e de volta para ele.


Descontou sua raiva na árvore. Meus dedos apertaram seus
ossos, medo de que tivesse quebrado suas mãos.

— Estou bem— disse, em tom afiado.

Movi as mãos ao redor de sua cintura e deixei cair a


cabeça contra seu peito.

— Não, não está.

Era como abraçar um muro de pedra. Brody não me


tocava. Esperava que a qualquer momento saísse correndo e
me deixasse, pois parecia tão distante. Mas permaneceu,
então fiquei junto dele, dando meu apoio em silêncio.

Rajadas de vento chicoteavam através das árvores.


Aconcheguei-me mais contra seu corpo, ignorando o frio
agudo em minhas pernas. À medida que a intensidade se
acalmava, levantei a cabeça e o beijei no queixo. As lágrimas
encheram meus olhos quando notei suas feições severas.

— Eu te amo! — sussurrei— Não importa como, mas


vamos passar por isso.

Brody encontrou meu olhar, sua voz uma sombra do


que era.

346
— Ela é a razão pela qual meu pai entrou no carro
aquela noite. Todo esse tempo, eu o culpava.... um pobre
infeliz de coração partido que passou anos afogando suas
culpas. E ela permitiu isso. Somente ela.... permitiu que eu
pensasse assim.

Meu coração se encolheu.

— Cometeu um engano.

— Você acredita nisso? — zombou.

Ignorei por completo sua ira, sabendo que não era


dirigida a mim.

— Não tento desculpar suas ações e não gosto do que


fez a você e a seu pai. Mas acredito que sua intenção é fazer
as pazes.

— Agora que meu pai está morrendo?

Enxuguei meus olhos e os dele.

— Brody, não pode pensar assim. Ele está muito


doente, mas também está sendo cuidado por uma equipe de
médicos e profissionais.

— E se não der certo? Se não melhorar?

Quase não respondi. Às vezes a verdade


simplesmente feria, exceto que Brody precisava ouvir o que
tinha a dizer.

347
— Então é o momento de dizer o quanto é importante
para você e que independente do que aconteceu, nunca
deixou de amá-lo.

Abracei-o mais forte quando curvou seu corpo ao


redor do meu e liberou sua dor, raiva e essa horrível sensação
de impotência da qual não podia poupá-lo.

Demorou um tempo para que Brody pudesse se


acalmar. O vento aumentou muito e a temperatura estava
baixando rapidamente quando finalmente ficou de pé,
puxando-me com ele. Cambaleei, minhas pernas dormentes e
parcialmente congeladas. Se Brody estava com frio ou se
sentia rígido, não o demonstrou. Ajudou-me a manter o
equilíbrio e me puxou contra ele enquanto nos dirigíamos
para casa.

O caminho de volta pareceu durar uma eternidade e


meus dentes batiam durante no percurso apesar do cobertor
que Brody envolveu ao nosso redor. Tropeçamos ao caminhar
para a cozinha, nossas botas cobertas de neve. A neve caía
aos tufos de nossos jeans congelados. Pensei que encontraria
a cozinha uma bagunça, como a tínhamos deixado, mas não
havia nem um pedaço de vidro lá. Esperança deve ter
arrumado a bagunça. O que significava que Dionna cuidava
do Tommy.

Tirei meu suéter e peguei o dele quando também


tirou, então joguei rapidamente com nossas meias na
lavanderia.

348
A casa estava quente, mas não podia impedir os
arrepios passando pelos meus braços. Quando retornei à
cozinha, Brody estava apoiado no balcão.

— Deveria ir ver meu pai— disse em voz baixa.

Agarrou os lados do balcão de granito. Foi então


quando olhei de verdade seus nódulos mutilados.

— Deus, Brody.

Puxei-o até a pia; afastou suas mãos com um puxão


quando tentei lavá-las.

— Eu te disse que estava bem.

— Brody, não pode deixar que seu pai te veja assim.

Endireitou-se. Eu tinha certeza que discutiria


comigo, mas retornou a pia e permitiu que cuidasse de suas
mãos. Quando terminei de secá-las, coloquei um pouco da
pomada antibiótica que tinha no kit de primeiros socorros e
cobri com gaze. Sem dizer uma palavra, Brody pegou a minha
mão e fomos para o andar de cima.

Respirou fundo algumas vezes antes de entrar no


quarto de seu pai. Audrey e o Dr. Frenen olharam em nossa
direção quando entramos.

— Está acordado? — Perguntou ao Dr. Frenen. Ele


assentiu— Poderiam nos dar um minuto?

349
Audrey terminou de colocar a manta em volta dos
pés do Sr. Moore enquanto o Dr. Frenen se inclinava e falava
em voz baixa. Sorriram cortesmente ao passar a nosso lado e
desapareceram em seus quartos. O foco de Brody se manteve
do outro lado da grande suíte onde seu pai estava deitado na
cama, as máquinas de monitoramento chiando suavemente.
Acariciei seu braço.

— Vou dar uma olhada no Tommy. Quando estiver


pronto, ou se precisar de mim, estarei no seu quarto, tudo
bem?

— Sim.

Eu o vi atravessar o quarto, mas não sai até que


sentou junto à cama de seu pai e pegou sua mão.

Abracei-me contra o frio que continuava envolvendo


minha pele e a tristeza pela qual Brody passava. Essa
conversa estava com anos de atraso. Eu não podia protegê-lo
do que estava por vir.

Só desejava que isso não fosse necessário.

Meus braços permaneceram cruzados enquanto me


dirigia ao dormitório de Tommy. Dionna estava na cama com
ele, seu corpo curvado junto ao dele enquanto passava a mão
suavemente por seu cabelo. Embora tivesse me afastado por
apenas uma hora, Tommy já dormia.

350
O estresse do dia deve ter sido muito para o pequeno.
Principalmente, para sua mãe. As lágrimas corriam pelas
bochechas de Dionna quando levantou a vista.

— Brody me odeia, não é verdade?

Apoiei-me no marco da porta.

— Ele precisa de tempo. — Era tudo o que diria.

— Está com o Edward agora?

— Sim.

Seu corpo estremeceu e deixou de acariciar a cabeça


de Tommy.

— Causei tudo isto, não é? É minha culpa.

Não respondi. Cometi minha própria cota de pecados.


Não poderia julgá-la, assim como não cabia a mim absolvê-la.

— Lety? — perguntou— Deveria ir embora? Você iria?

O que estava dizendo?

— Quando chegar o momento terá que conversar com


Brody e com seu marido. Não posso te dizer o que deveria
fazer, Dionna, ou se deveria ficar. Só posso dizer que Tommy
precisa de você e que se o Sr. Moore lutou todo este tempo, é
porque também precisa de você.

Começou a chorar de novo. Não podia lhe dizer que


tudo ficaria bem. E não estava confortável a consolando, não

351
sem sentir como se traísse Brody. Assim sai do quarto,
desejando ter o poder de curar de algum jeito o que estava
acontecendo entre eles.

Meus pés descalços passaram cuidadosamente pelo


corredor. Fiz uma pausa no quarto do Sr. Moore. Ali, na
porta, meu coração se rompeu mais uma vez. Brody tinha a
parte superior do corpo ao lado da cama de seu pai, seu
corpo tremendo com cada respiração agitada, sua mão
agarrando a coxa de seu pai. Não tinha que ver o rosto do Sr.
Moore para saber que também estava chorando. Percebi na
forma como a máquina se ajustava para acompanhar sua
respiração.

Precisei de grande esforço para não chorar ou correr


para junto deles e envolver aos dois com meus braços. Mas
precisavam passar por isso, necessitavam dessas lágrimas.
Assim continuei caminhando, passei pelos outros quartos e
ao final do corredor, desci a escada de caracol indo em
direção ao quarto do Brody.

Passei as horas seguintes sozinha olhando as


prateleiras cheias de objetos esportivos, troféus de atletismo e
certificados de conquistas acadêmicas. Na superfície, Brody
era o melhor atleta, o melhor estudante, o melhor amigo.
Ninguém suspeitava das imperfeições em seu mundo
supostamente perfeito.

Usava máscaras para esconder a realidade. Jesus,


todos as usávamos, não é mesmo?

352
Não fazia muito tempo que tinha me deitado em sua
cama quando o vi entrar, os ombros cansados pelo
esgotamento. Afastei-me para o lado quando se sentou. Brody
fechou os olhos, apreciando meu toque quando lhe acariciei o
cabelo.

— Olá.

Virou-se para me olhar, seus olhos azuis cinzentos


tão tristes que fizeram arder os meus.

— Preciso que me prometa algo. — Pressionei um


beijo em seu ombro.

— Algo?

Seu olhar piscou com algo que não pude reconhecer.

— Se alguma vez quiser ficar com outra pessoa...

— Não. — Não podia acreditar que sequer tivesse


mencionado isso.

— Lety...

Endireitei—me.

— Brody, isso não é sequer uma possibilidade. Juro


para você e por nós, que jamais te enganarei.

Baixou o queixo, o queixo tenso.

— Minha mãe provavelmente pensou da mesma


maneira no passado.

353
Talvez sim, mas eu não era ela. Inclusive depois do
tempo que passamos no hotel, ele não tinha ideia do que
significava para mim.

— Brody olhe para mim. — Sua imagem ficou


imprecisa quando encontrou meu olhar— Prefiro morrer a te
fazer passar por isso. Está entendendo? Nunca faria isso com
você.

Observou-me limpar as lágrimas antes de me abraçar


apertado.

— Sou um estúpido problemático, mas precisava


escutar isso. Nunca imaginei isso, mas depois dessa noite,
depois do que ela disse... merda, Lety. Seja lá o que for que
não deu certo entre os dois, não quero isso para nós, nunca.

— Nem eu.

Envolvi meus braços ao redor dele quando me atraiu


para mais perto.

— Eu te amo— disse em voz baixa.

— Também te amo.

Minha cabeça se inclinou para cima a tempo para


encontrar sua boca. A princípio, seus beijos foram lentos,
calmos, lembrando-nos que mesmo com todos os problemas
que enfrentávamos, tínhamos um ao outro. Depois o beijo se
tornou mais intenso, mais voraz, minha cabeça começou a

354
rodar com a intensidade do desejo e uma forte pressão
cresceu em minha virilha.

Brody foi muito machucado em questão de horas.


Sabia que seu corpo queria sentir algo mais que a dor. Por
isso, quando suas mãos passearam por debaixo da minha
camisa, permiti. E quando desabotoou os meus jeans,
levantei os quadris para que fosse mais fácil me despir.

Despertei pela manhã com o toque do meu celular.


Era Teo. Agora o quê? Coloquei minha roupa intima e corri
para o banheiro do Brody, sem querer despertá-lo.

— Olá?

— Está com Brody?

A voz de Teo estava carregada.

— Sim. Estamos na casa de seus pais.

— Como está seu pai?

Envolvi uma toalha ao redor dos meus peitos e me


sentei ao lado da banheira de hidromassagem.

— Nada bem.

— Merda.

Um pequeno suspiro escapou de meus lábios.


Conhecia meu irmão o suficiente para saber que essa não era
a única razão pela qual estava me ligando.

355
— O que está acontecendo? — Teo não respondeu.
Brody abriu a porta do banheiro enquanto uma horrível
queimação subia através do meu estomago— Só me diga.

— Não precisa se preocupar com isso, Lety.

Belisquei a ponta do nariz, sabendo o que vinha.

— O que Carlos fez? — Podia escutar Teo


tamborilando os dedos. Era algo que sempre fazia enquanto
pensava no que dizer— Teo vamos...

— Enviou nossa mãe para o hospital.

Minha mão tremeu com força suficiente para deixar


cair o telefone, mas o sustentei com força quando Brody me
atraiu para si.

— Ela está bem?

— Não. Está na UCI10.

10
UCI: Unidade de Cuidados Intensivos.

356
CAPÍTULO 22
Minha mãe estava imóvel em uma cama de hospital.
Uma intravenosa lhe administrava soro por um dos braços,
uma cânula nasal lhe enviava oxigênio pelo nariz e os ECG11
que estavam em seu peito, monitoravam o ritmo de seu
coração e sinais vitais. Bip, bip, bip, bip. O tom se repetia
com seu coração em oitenta.

Eu olhava para fora da janela do quarto agarrando


com força uma xícara cheia de café. Teo, Evie, Sofia e o tio
Linho se foram. Ficaram com minha mãe toda a noite e
durante a manhã. Sofia e Linho a dois passos de desfalecer
pela fadiga e estresse. Encontraram-na inconsciente e
sangrando no chão de sua sala no dia anterior, próximo da
hora em que Brody e eu retornamos ao Saucon Valley Rose.

Teo estava mais que zangado, mas a necessidade de


levar a esposa grávida para casa o impediu de ficar. Queria
tirar Evie dali, longe do drama e os estragos que Carlos
sempre causava. Eu queria sair dali também. Mas não podia
ir. Era tudo pela família, não? Sem importar que diabos
fizessem.

11
ECG: Eletrocardiograma

357
A xícara tremia em minhas mãos, derramando café
pela tampa de plástico. Brody queria vir. Mas seu pai
precisava que estivesse por perto e de forma alguma os
afastaria neste momento.

Droga! Não podia acreditar no desastre em que


estava minha mãe. Os aparelhos de emergência que a
rodeavam eram similares aqueles que monitoravam o Sr.
Moore. Exceto que havia uma grande diferença entre o Sr.
Moore e minha mãe: ele lutava para viver; por si mesmo e por
seus filhos. Ela nunca lutou por nada. Nem uma vez. Nem
sequer contra o homem que batia nela e nos seus filhos.

Contusões cobriam cada centímetro da pele exposta.


Seus braços estavam roxos com os machucados e sua cabeça
foi raspada para suturar os cortes em seu couro cabeludo. O
inchaço em seu rosto era tanto, que estava irreconhecível.
Mas sabia que era ela. Quem mais séria? Quem mais estaria
deitada assim?

Meu telefone vibrou. Soube que era Brody antes de


procurá-lo em minha bolsa para olhar a mensagem. Não
enviei mensagem para lhe dizer que cheguei; estava muito
furiosa com minha mãe por permitir que Carlos lhe fizesse
isso, de novo. Peguei o celular com minha mão trêmula.

Está no hospital?

Traguei com força e digitei a mensagem. Sim.

Como ela está? Você está bem?

358
Falaremos depois.

Letz. O que aconteceu?

Depois, sim?

Meu telefone vibrou e o rosto de Brody apareceu na


tela. Estava chamando, recusando-se a aceitar um "depois"
como resposta. Voltei a colocar o telefone na bolsa quando
uma mão grande agarrou meu ombro.

— Olá, minha filha.

Pulei para trás, derramando meu café por todo o


chão e me segurando ao corrimão na parede para não cair.
Carlos estava apoiado contra a parede de vidro que rodeava o
quarto de minha mãe. Vestia uma jaqueta jeans e calças
escuras.

Sorriu zombador, feliz por me surpreender outra vez.


Isto quase estava se tornando um hábito. Mesmo cenário.
Mesma reação. Havia uma grande diferença. Hoje eu não era
uma mulher com a que se deveria mexer.

— Que droga você faz aqui?

Sua resposta foi simples.

— Visitando minha esposa.

Meu coração batia com força contra o peito.

— Suponho que saberia onde encontrá-la, já que a


colocou aqui.

359
— Isso é o que ela disse? — Sua voz era zombadora,
rindo ligeiramente quando não respondi— Não deveria
acreditar.

Deu um passo para mim, na intenção de me forçar a


retroceder. Não me movi e mantive minha postura.

— O tribunal o proibiu de se aproximar de mim.

O brilho frio em seus olhos avelã me congelou no


lugar. Não estava drogado. Estava sóbrio e calculista. De uma
maneira que me assustava mais.

— O tribunal não está aqui. Isso é só um pedaço de


papel. Estou aqui para ver minha esposa. — Sacudiu a
cabeça— Não deveria ter faltado ao respeito com seu pai
dessa maneira.

Meu pulso acelerou, o sangue rugia em minhas


orelhas e meu rosto se esquentou.

— Pode ser que ela tenha o forçado a me criar, mas


não é meu pai. É só um pedaço de porcaria.

— Um pedaço de porcaria que te deu a vida? Então


isso a transforma em quê?

Estirou os dedos para meu rosto. Empurrei a sua


mão com um tapa.

— Não me toque, idiota!

— Há algum problema?

360
Algumas enfermeiras se reuniram. Nem sequer as
notei, muito concentrada em Carlos. A que falou tinha um
metro e cinquenta e usava um uniforme escuro do hospital.
Seu cabelo branco curto sugeria que estava próxima aos
sessenta anos. Seu tom severo e lábios franzidos sugeriam
que não acreditaria em uma mentira.

Carlos retrocedeu, sorrindo como se estivesse no


controle de tudo.

— Não aconteceu nada. Só estou aqui para ver minha


esposa— respondeu com seu marcado acento cubano. Deu a
volta e entrou casualmente no quarto.

— Afaste-se dela! — Corri para ele com o pessoal da


enfermaria atrás dos meus calcanhares e parei a uns passos
de sua cama.

Carlos continuou como se não tivesse falado,


tomando uma cadeira de plástico e sentando-se junto a
minha mãe.

— Disse para ficar longe dela!

A cabeça da minha mãe se moveu em sua direção


quando o viu. Ele pegou a mão dela na sua, essas mesmas
mãos que transformaram seu rosto em uma massa
sangrenta. As lágrimas desceram por suas bochechas
inchadas e o som bip, bip, bip de seu ritmo cardíaco
aumentou até cento e vinte. Não estava assustada por causa
de Carlos. Jesus cristo, estava aterrorizada.

361
— Deveríamos chamar a segurança? — perguntou
alguém. Mais pessoas chegaram. Pude sentir o calor do
número de pessoas crescendo atrás de mim.

Apertei os dentes, com respirações bruscas enquanto


observava a farsa desenvolvendo-se diante de mim.

— Sim. Chame-os agora.

A enfermeira com roupa vermelha se aproximou


enquanto anunciava um Código Cinza. Outras duas a
seguiram, depois uma terceira.

— É o homem que a machucou? — perguntou a


enfermeira. Os lábios da minha mãe estavam pressionados
em uma linha apertada.

— Este é o homem que a machucou? — perguntou a


enfermeira de novo, com os olhos fixos em Carlos.

— Ma, diga-lhe.

Os olhos de minha mãe permaneceram em Carlos.


Não respondia. A enfermeira falou de novo.

— Podemos ajudá-la se permitir.

Dei mais um passo para frente quando permaneceu


calada, com a adrenalina me percorrendo, dificultando que
ficasse quieta.

— Ma, diga a ela o que ele fez!

362
Essa era sua oportunidade para admitir o que este
cretino fez. Este era seu momento. Precisava confessar a ela,
contar tudo. Era agora ou nunca, seu momento de finalmente
dar um basta.

E não aproveitou. Sacudiu a cabeça.

— Não. É meu marido— foi sua única resposta.

Todos os olhos foram para mim enquanto minha


visão ficava embaçada.

— Ma... Mama— supliquei— Por favor, só lhes diga.


Por favor.

Mais lágrimas caíram, mesclando-se com o sangue


seco que manchava seu rosto. Carlos levantou o olhar, seus
olhos avelã eram agudos e frios.

— Não percebe, Lety. Está incomodando a sua mãe.

— Maldito mentiroso! — Lancei-me para frente.


Corpos e braços me mantiveram atrás enquanto eu investia
contra ele, meus membros se moviam grosseiramente,
querendo fazer que sangrasse... Querendo fazer que pagasse.

As lágrimas de minha mãe tornaram-se soluços


afogados, enviando uma onda de alarmes soando a seu redor.
Uma enfermeira correu para ela enquanto me arrastavam
longe e meus gritos se convertiam em chiados.

— Olhe o que você fez, olhe o que você fez a minha


mãe.

363
— Eu te odeio.

— Desgraçado, eu te odeio!

Uma equipe de oficiais de segurança chegou ao


corredor. Um dos enfermeiros que me arrastava sussurrou
em minha orelha:

— Pare com isso, menina. Basta. — Elevou a mão ao


pessoal da segurança— Deixem-na sozinha. Ela está bem,
está bem. — Olhou-me então— Não é certo, garota? Mostre-
lhes que está bem. — Seu tom autoritário me manteve em
meu lugar. Meus braços se sentiram pesados enquanto
deixava de lutar. Assenti, embora meu corpo continuasse
tremendo e os braços me agarrando diminuíram um pouco o
aperto.

As enfermeiras me guiaram pelo corredor, longe do


quarto da minha mãe, enquanto dois guardas de segurança
entravam. Foi só quando estávamos ao outro lado do corredor
que finalmente me soltaram. A compreensão em seus olhares,
tornou difícil encará-las.

— Sinto muito! — gaguejei.

— Não tem nada do que se desculpar, garota— disse-


me o enfermeiro.

O telefone continuava vibrando em minha bolsa.


Brody se tornava mais insistente. Sabia que algo estava
errado e lhe devia uma explicação. Mas não podia falar.

364
Precisava me preparar para o que viesse. Um momento
depois, a enfermeira de roupa vermelha saiu apressada do
quarto e se dirigiu para mim.

— Viu-o bater nela?

Não perguntou meu nome. Não questionou quem eu


era. Mas não acredito que realmente importasse. Se ela não
foi uma vítima, alguém próximo a ela sim. Reconheceu os
sinais. Sacudi a cabeça.

— Não o vi tocá-la faz um bom tempo.

Esticou sua postura.

— A medida cautelar de restrição por agressão é de


cinco anos. Mas se não falar agora, não falará nunca mais,
certo?

— Não. Nunca falará. — Limpei minhas bochechas—


Tenho uma ordem de proteção por abuso contra ele.

A enfermeira se inclinou para trás sobre seus


calcanhares

— O problema é que você o perseguiu— bufou ela—


Ele sabia o que estava fazendo. Sim. Sabia.

Uma enfermeira mais jovem se aproximou.

— Já chamei o Serviço Social. Estarão aqui mais


tarde. Pena que não fara nenhuma diferença.

365
Mantive a cabeça abaixada, mas então algo que a
enfermeira disse chamou minha atenção.

— Disse que a medida cautelar de restrição por


agressão é de cinco anos?

Analisou-me atentamente.

— Sim.

— Então qualquer pessoa a quem agrediu pode


apresentar acusações, certo? Desde que tenha ocorrido
dentro desse prazo?

Eu podia sentir os olhos de todos sobre mim,


enquanto a enfermeira se endireitava.

— Qualquer pessoa que agrediu pode apresentar


acusações.

Apertei os lábios.

— É bom saber disso.

Afastei-me deles e caminhei pelo corredor. Talvez


minha mãe não tivesse chegado ao seu limite, mas eu sim.

Meu telefone tocou de novo enquanto entrei no carro


e bati a porta. Dessa vez atendi.

— Olá?

— Letz, estava quase louco...

— Vou apresentar queixas contra Carlos.

366
Houve uma breve pausa.

— Pelo que ele fez a algumas semanas?

— Não. Por tudo o que me tem feito nos últimos cinco


anos. — Minha voz tremeu— Esteve aqui hoje. Colocou
minha mãe no hospital e ainda teve a coragem de aparecer,
sabendo que ela não fará nada.

— Ele... você está bem?

Apertei a ponta do nariz, sabendo como fui


manipulada.

— Fui provocada.

— Droga. — Escutei os ruídos no outro lado— Estou


a caminho. Apenas me diga onde está.

— Estou no Saint Enjoe's, mas já estou saindo. Vou


à polícia em South Philly para começar ali, logo ao Allentown
para falar com o oficial McAfee. — Eu disse tudo o que tinha
a fazer. — Estou fazendo tudo errado Brody. Preciso de ajuda.
Chamarei Cathleen Broderick, mas não tenho dinheiro...

— Eu vou cuidar disso. O que você precisar, está


bem?

Baixei a cabeça.

— Obrigada. — Foi difícil manter a conversa, mas


continuei falando, formando um plano. Brody fazia algo a

367
respeito do seu passado. Estava na hora de eu fazer algo em
relação ao meu.

368
CAPÍTULO 23
Minha família não aceitou muito bem o fato de eu
apresentar acusações contra Carlos.

— Lety, Carlos não vai aceitar isso muito bem—


advertiu Teo— Acredita que tornou—se um idiota agora?
Espere até a polícia o notificar.

— Já não me importa. Não pode escapar do que fez,


Teo.

— Tem feito e vai continuar a fazer— Amaldiçoou—


Não posso te proteger onde você está. Se for seguir adiante
com isto, tem que vir morar comigo.

— Não. Não farei deste seu problema também.

— Lety...

— Estarei bem.

O frio em sua profunda voz me manteve em meu


lugar.

— Não se Carlos puser as mãos em você.

369
Mateo tinha boas intenções, mas doía não ter todo
seu apoio. O pior dia foi quando minha mãe ligou, exigindo
que retirasse as acusações

— Envergonhou a família, Lety! — Disse-me.

— Ele a envergonhou mais! — disparei de volta— Não


percebe que faço isso por você também?

— Ainda é seu pai— foi sua resposta.

Desliguei e bloqueei suas chamadas depois disso.


Tinha que me manter focada se fosse levar isso adiante. Dois
municípios. Tinha que testemunhar tanto na Filadélfia como
nos tribunais do Lehigh baseado nos lugares em que Carlos
me atacou nos últimos anos.

Cathleen, minha advogada, me acompanhou para


apresentar as queixas e falar com os escritórios de advocacia
dos distritos tanto na Filadélfia como no Allentown. Havia
dias em que desejava entrar num buraco e desistir de tudo,
intimidada por todos os procedimentos legais frente à ideia de
dar o testemunho. Se não fosse pelo Brody e o apoio de sua
família, provavelmente, eu o teria feito. Apesar de seus
problemas, todos se uniram para me ajudar.

O Sr. Moore estava recuperando da infecção. Atribuí


a melhora na saúde ao Dr. Frenen e a Audrey, mas também
ao maior envolvimento de Dionna com sua dedicação e
carinho.

370
Mais de uma vez, Brody e eu a encontramos deitada
junto dele em sua cama quando chegamos, conversavam em
voz baixa e pareciam verdadeiramente felizes na companhia
um do outro. Quando nossas férias de Natal terminaram, a
cama de Dionna foi transferida para o seu quarto. Era
estranho que ela saísse de casa somente para levar Tommy
ao grupo de jogos, mas quando o fazia, parecia ansiosa em
voltar para junto do seu marido.

Sentia-me feliz por eles. Mas acima de tudo estava


contente por ter Brody. Era minha força, o escape de todas
minhas preocupações e estresse. Era a semana das provas do
período e eu estudava para meu exame final quando Teo
ligou.

— Carlos apareceu no tio Lino enlouquecido e te


procurando, acusando de traí—lo. Lino disse que nunca o viu
tão furioso.

Desgraçado. Esfreguei meus olhos cansados.

— Teo, não preciso disso agora, meu exame final de


enfermagem será em vinte minutos.

— Lety, escute-me. Carlos está convencido de que o


enviaremos para a cadeia. Se for assim, não tem nada a
perder. Precisa se cuidar.

Eu não poderia lidar mais com o demônio do Carlos.


Quando desliguei, peguei as chaves, o telefone e me dirigi à

371
sala onde seria realizado o exame. No momento em que
terminei, fui ver Brody para uma muito necessária distração.

Bati na sua porta. Quando não ouvi uma resposta,


usei minha chave pessoal e a abri com cuidado. O quarto do
Brody normalmente estava limpo e organizado, beirando a
obsessão. Exceto que esta semana por causa das provas, a
ordem e organização foram pelos ares.

Papéis amassados, cadernos, livros de engenharia,


gráficos de barras, marcadores e lápis cobriam o chão como
se um tornado tivesse passado pela Office Depot12 e caído
diretamente no quarto do Brody. Estava deitado de costas
com uma perna longa pendurada fora da cama e um braço
cobrindo seus olhos. A pequena manta que lhe dei mal cobria
seu corpo. Não entendia sua necessidade de se cobrir; o
quarto estava quente e o jeans e camiseta de manga
comprida que usava pareciam suficientes. Mas se estava com
frio, eu poderia esquentá-lo.

Um pequeno sorriso, cansado, surgiu em sua boca


apesar dele manter o braço no lugar.

— Olá, linda.

Tirei minha jaqueta e a pendurei na maçaneta da


porta.

— Como soube que era eu?

12
Office Depot: A Office Depot, Inc. é uma empresa americana de varejo de material de escritório com
sede em Boca Raton, Flórida, Estados Unidos.

372
— OH, sinto muito, Letz. Pensei que foi Rhonda.

Tirei as botas.

— A senhora da limpeza?

— Sim, usava um novo par de sapatos ortopédicos.


São muito sexys. Disse que eu era um menino sujo e
repugnante, quando esta manhã acidentalmente passei por
lugares cheios de barro. Deus, eu adoro quando fala
sacanagem.

Tirei a camisa e empurrei meus jeans justos para o


chão. Ao som da queda do tecido, Brody levantou seu braço
para olhar. Mmm, agora estava acordado. Imagine só.

— Olá! — disse, um pouco mais alerta.

— Ei! — Minhas calcinhas e sutiã foram os


seguintes. O sexo com o Brody era delicioso. — Olá. — Eu
disse.

Talvez fossem nossos hormônios em ebulição ou o


fogo que nos consumia. Independentemente do que fosse,
funcionava bem. Os coelhos selvagens na primavera tinham
menos sexo que nós.

Cruzei o quarto e subi sobre seu corpo. A manta que


o cobria fez cócegas contra minhas coxas nuas.

— Como foram suas provas?

373
Suas mãos imediatamente seguraram minha bunda e
esfregaram.

— Isso não está certo.

A protuberância que crescia debaixo de mim insistia


em me mostrar que não deveria sentir-me insultada.
Esfreguei-me contra ele, fazendo-o arquear o pescoço e
gemer.

— O quê?

— Eu ainda estou vestido.

Saí de cima dele para que pudesse tirar a camisa.

Ajudei-o a tirar o resto de sua roupa e puxei seus


quadris em direção ao meu rosto.

— Vem aqui...

Brody jogou as calças para fora da cama e veio com


entusiasmo, sua respiração quase falhou quando segurei seu
pênis, prendi-o entre meus seios e o levei a boca. Segurei-o
com força obrigando—o a se jogar para trás e segurar na
cabeceira da cama, observando-me enquanto o chupava com
vontade. Quando o tomava mais profundamente em minha
boca e o esfregava com mais força contra minha pele, seus
gemidos e maldições aumentavam.

Meu corpo se contorcia dolorido e tenso, ciente de


como o excitei com facilidade.

374
— Você precisa de algo, Lety? — Um selvagem sorriso
se espalhou por seu rosto sexy.

— Sim! — ofegou quando minha sucção aumentou—


Acho que sim.

Pôs dois dedos em sua boca e os tirou lentamente.


Logo estendeu sua mão para trás para empurrá-los entre
minhas pernas. Saltei quando seus dedos úmidos se
moveram para dentro do meu corpo.

Minhas coxas tremeram e apertaram em volta dele,


desejando que se aprofundasse mais, com medo que parasse.
Ele balançou mais rápido, aumentando sua velocidade por
cima e dentro de mim.

Os movimentos de seus dedos me fizeram desejar


mais. Soltei—o de minha boca e puxei seus quadris para os
meus.

— Ainda não— disse e puxou minha cintura para seu


rosto.

Agarrei seu travesseiro e o utilizei para amortecer


meus gritos. Brody se soltou ansioso e faminto por me
agradar. Tirou o travesseiro de minhas mãos quando minhas
pernas chutaram e o jogaram no outro lado do quarto. Droga.
Separei-me dele e caí no chão. Brody se levantou atrás de
mim, sua respiração ofegante.

— Aonde vai?

375
Apertei o botão para ligar seu aparelho de som,
quando me agarrou e imobilizou contra a parede. Levantou
meus braços sobre minha cabeça, beijando até minha orelha.

— Baby... o que está fazendo? — perguntou sem


fôlego.

Seu beijo me silenciou e suas mãos grandes me


levantaram pela cintura. Amaldiçoou e engoliu um grunhido
enquanto me penetrava.

Ficou mais calmo depois que estava dentro de mim.

Fizemos sexo de pé, uma primeira vez para nós, mas


piedade, com sorte não seria a última. Cada golpe me fez
gemer, minha excitação crescia rapidamente se tornando
descontrolada. Cruzei meus tornozelos, depois de envolver
sua cintura e passei a movimentar meus quadris de encontro
aos seus.

Brody jogou minhas pernas sobre seus ombros


quando caímos contra a cama, seu corpo empurrando mais
rápido contra o meu. Ele cerrou os dentes, fechando os olhos
com força.

— Porra!

Revirei meus olhos e minhas unhas cravaram no


colchão. O êxtase se apoderou do meu interior, açoitando-me,
meus gemidos transformando-se em gritos.

376
Brody caiu em cima de mim, seu coração pulsando
conta o meu. Por um longo tempo ficamos lá, apenas
tentando respirar.

— Você gostou disso? — sussurrou depois de um


momento.

Meu corpo seguia tremendo do assalto pós orgasmo.

— Só um pouco.

Ele riu e beliscou meu queixo.

— Prometo me esforçar mais a próxima vez.

Um sorriso travesso apareceu no meu rosto.

— Muito bem, então, a próxima vez.

Ajustou nossos corpos, mas continuamos em uma


posição estranha.

— Vou sair, tudo bem?

Apesar de ter me avisado, ambos gememos quando o


fez. Procurei não franzir o cenho quando ficou de pé. Não
gostava de Brody longe de mim.

Cambaleou para seu aparelho de som, diminuiu o


volume e trocou a lista de reprodução para uma mais suave.
Pegou seu travesseiro do chão quando voltou, observando-me
esticar meu corpo na cama antes de rastejar sobre mim. Sorri
enquanto arrumava o travesseiro debaixo da minha cabeça e
meus peitos embaixo de seu tórax.

377
Eu ri.

— O que está fazendo?

Suas mãos pararam.

— São meus amigos. Tenho que cuidar deles.

— É obvio que sim. — Acariciei seu cabelo loiro,


amando a forma como os fios longos se espalhavam pelas
maçãs o rosto. Beijou-me de novo, desfrutando lentamente
até que nossos corações desaceleraram, adquirindo um ritmo
normal.

Eu tinha certeza de que ele queria mais.


Normalmente, era assim, o que era ótimo para mim. Desta
vez Brody se virou, apoiando-se sobre os cotovelos e sorrindo
enquanto seus olhos percorriam meu rosto.

— O que aconteceu entre você e o travesseiro?

Fiz uma careta.

— Não me viu perdê-lo?

Sua íris brilhava.

— Inferno, claro que vi. Essa é quase a melhor parte:


te enlouquecer e vê-la tentar esconder isso de mim.

— Não estava escondendo. Só tentei abafar meus


gritos para que seus colegas de quarto não nos ouçam
transando.

378
Então alguém desceu as escadas, atrasado para um
exame, que pelo visto não foi bem pela força com que fechou
a porta. Passos atravessaram o andar de cima e alguém ligou
a televisão na sala. A casa do Brody estava sempre
movimentada. Ele me mordeu no pescoço.

— Tenho certeza que meus colegas perceberam que


estamos transando.

Alguém bateu na porta.

— Hey, irmão. Você e Lety já terminaram de transar?

— Escutou? — sussurrou Brody.

Cobri meu rosto. OH, Deus.

— O que você precisa, Al? Estou ocupado. — Tirou


minhas mãos e as estendeu ao meu lado para continuar sua
tarefa de sugar meu pescoço.

— O chuveiro está quebrado.

— O quê?

Disse meio engasgada quando se afundou mais baixo


e encontrou seus amigos com sua língua.

— O que quer dizer com o quê? É de onde a água sai.

Brody levantou a cabeça, amaldiçoando porque teve


que parar.

379
— O chuveiro Al? Aquele perto das escadas ou o das
janelas?

— Ohhhhhh. O que está perto das janelas.

Droga. Al era tão alto que dava a impressão de que


pairar sobre nós, observando nossos movimentos.

— O que está fazendo? — Perguntou-me Brody


quando me cobri.

— Nada agora. Estava tomando uma ducha até que a


maldita coisa...

Brody pôs os olhos em branco.

— Não, você, Al. Olha, farei a ordem de serviço. —


Jogou a manta longe— Precisa de mais alguma coisa?

— Está falando comigo ou com a Lety?

— Com você!

— Não, estou bem. Obrigado, irmão. Até mais tarde,


Lety— gritou quando voltou a subir.

Coloquei minhas mãos sobre os olhos.

— Adeus, Al.

Eu puxei minha mão quando Brody riu.

— Fico feliz em ver como acha isso divertido. — Ele


riu mais alto— Você é a única que fica feliz com uma besta
dura entre os lençóis.

380
— Não estávamos sob os lençóis. — Beijou a parte
posterior de minha orelha— Mas, sim, tem razão. Obrigado
por isso.

— Maravilhoso, Baby.

Levantou a cabeça e tirou o cabelo do meu rosto...

— Tenho que falar com você sobre algo.

Seu sorriso permaneceu, mas perdeu um pouco do


seu brilho.

— O que é?

Suspirou.

— Aceitaram-me para o programa de doutorado em


engenharia robótica na Universidade do Bristol.

Meu estômago se contraiu antes de desmoronar.


Estava levemente consciente dos meus dedos sobre seus
ombros.

— Robótica?

— Sim. Quero desenvolver um esqueleto externo ou


algo parecido... Assim posso ajudar meu pai a voltar a andar.

Demorei um segundo para falar.

— Brody, isso é... Incrível.

— Eu não sei se é possível. Mas tenho que tentar. —


Deu de ombros— Pensei nisso durante muito tempo. Pelo que

381
tenho lido, Bristol oferece o melhor programa para algo tão
avançado. Levará anos, inclusive décadas, mas se eu
conseguir posso ajudar papai e outras pessoas como ele.

Falei em voz baixa.

— Então aí é onde tem que estar. Na Universidade do


Bristol.

Na Inglaterra.

Na Europa.

Droga.

Esfregou seu nariz contra o meu.

— Tenho que fazer três cursos nesse verão para ser


aceito.

— Em Bristol?

— Sim. Também farei outros no próximo verão depois


da formatura. Eles me ajudarão a ter uma classificação
melhor quando me inscrever em tempo integral. — Arrumou
seu peso em cima de mim— É uma espécie de programa de
sonho, sabe?

— Aposto que sim. — Foi difícil manter meu sorriso,


mas me agarrei a isso. Era algo que ele queria, precisava e
merecia... e também seu pai. Deus, se alguém podia fazer
isso, era Brody— Estou orgulhosa de você. Uau, Inglaterra...

382
— Quero que venha comigo. — Seus lábios se
abriram num pequeno sorriso enquanto congelei. — Este
verão e no próximo ano. Quero você comigo. — Brody se
ajoelhou sobre os seus calcanhares quando estremeci.

Tudo o que podia fazer era olhar, um milhão de


pensamentos passaram pela minha cabeça, nenhum dos
quais se dirigiram para minha boca.

— Letz. Diga algo.

— Eu não posso.

— Por quê? — Pegou minha mão quando tentei pegar


minhas roupas, e seguida a levantou para beijar meus
nódulos— Diga-me por que não pode ir comigo.

— Porque é a Inglaterra... outro país. Está longe da


minha família e, e...

— Carlos. — Sua mão agarrou a minha com mais


força— Finalmente escapará do Carlos e toda a porcaria que
vem com ele.

E lá estava.

— Você está falando desse verão? — Assentiu— E o


próximo verão? Assentiu de novo, sua expressão cada vez
mais intensa.

— E o próximo ano. E para sempre, também, se me


aceitar.

383
Meu pulso se acelerou como se eu estivesse correndo.

— Jesus, Brody.

Tocou meus dedos.

— Não fique tão assustada, Lety. Não estou pedindo


que se case comigo... ainda não, pelo menos. Mas pela
maneira como me sinto, sei que com o tempo o farei. —
Sorriu levemente quando uma lágrima grossa rolou por
minha bochecha— Não quero ficar longe de você, pequena.
Gostaria que viesse comigo. Pode estudar ali também, se
desejar. Seu programa de pesquisa e de ciência é de alto
nível. Faça algumas aulas ou prática de enfermagem na
Inglaterra. Caramba, talvez você possa me ajudar também.
Com seu conhecimento épico em anatomia e fisiologia,
poderíamos pensar em algo para ajudar meu pai.

Sequei meu rosto.

— Brody, mesmo se eu quisesse, não posso me dar


ao luxo de voar para a Europa muito menos viver lá.

— Vou cuidar disso. — Voltamos para a cama e me


apertou contra ele quando neguei com a cabeça— Olhe, sei
que você não está interessada no dinheiro que tenho.

— Tem razão. Não estou. — Meus dedos passaram


pelo seu queixo, notando a forma como sua barba roçava
minha pele— Não é por isso que gosto de você.

384
— Eu sei. — Sua voz se aprofundou— É uma das
primeiras coisas que observei sobre você.

Arqueei uma sobrancelha.

— De verdade? Minha falta de interesse em sua conta


bancária é uma das primeiras coisas que observou?

Pensou sobre isso.

— Bem, depois de ter terminado de olhar seu traseiro


como se pudesse tocar música, e me perder em seus olhos, e
olhar seu traseiro de novo... Ah, e seus lábios sexys pra
caramba também, e esse traseiro...

Riu quando lhe dei um empurrão de brincadeira.


Mesmo através das minhas lágrimas e a bomba que ele
lançou sobre mim, conseguiu me fazer sorrir.

— A verdade é que quando alguém me vê sair do meu


Porsche, não consegue ver além do dinheiro que foi utilizado
para comprá-lo. A primeira vez que te levei para dar um
passeio, subiu como se eu tivesse parado uma caminhonete
velha e saiu da mesma maneira.

Encontrei seu olhar.

— Isso é porque estava muito ocupada encantada


pelo cara que me dava uma carona para notar carro.

Beijou-me.

385
— Veja, isso é o que quero dizer. Quando você vem de
onde eu venho, algumas pessoas olham apenas para o meu
patrimônio, não podem ver mais do que isso. Você pode e
sempre foi assim.

A expressão "patrimônio" me dava arrepios. Ajustei


meu corpo para poder vê-lo melhor.

— Se o incomoda tanto, por que dirige um Porsche


911?

— Porque é um carro incrível. E porque posso. Sou


um homem, você sabe.

Minhas mãos passearam para baixo para acariciar


seu abdômen, parando justo abaixo do umbigo.

— OH, sei.

Voltou sua atenção para o meu rosto quando


percebeu que não desceria mais.

— Acho que é hora de te contar sobre a quantidade


de riqueza em minha família.

— Riqueza. — Havia outra expressão que provocava


comichão— Brody, não. Não é necessário.

Embalou meu rosto, passando seu polegar sobre meu


queixo.

— Acredito que tenho que fazê-lo, assim pode


entender. — Ignorou meu cenho franzido e acomodou a

386
manta a nosso redor— Herdei uma grande quantidade de
dinheiro quando me formei no ensino médio... meus avós
sempre se preocuparam com a educação. Para motivar a seus
netos, receber a herança estava condicionado à obtenção de
graus acadêmicos.

— Parece justo.

— Uh. Sim. A coisa é que sou o único neto, além de


Tommy. A quantidade que recebi por me graduar no ensino
médio é suficiente para nós vivermos com conforto pelo resto
de nossas vidas...

— Está bem. Mas não quero...

— ... E a vida de nossos filhos...

— Nossos filhos?

— E possivelmente a vida de seus filhos. Presumindo


que nossos quatro filhos não terão mais de dois... Fiz os
cálculos.

Quatro crianças?

Ele limpou a garganta quando minha única reação foi


olhá-lo boquiaberta.

— Receberei aproximadamente três vezes mais


quando terminar a faculdade e, ah, o resto de sua fortuna se
fizer mais do que isso.

387
Não me deu as cifras exatas, mas já sabia que não
poderia contar um valor tão alto.

— Isso é muito dinheiro.

— Eu sei que é. — Seus olhos se cravaram nos


meus— Assim quando digo que posso cuidar de você, é
porque posso, e o farei se permitir.

Brody tinha boas intenções, mas não seria correto


que eu ficasse com ele, simplesmente porque tinha muito que
oferecer.

— Brody, não posso. Já é ruim o suficiente você


cobrir meus gastos com a advogada.

— Cathleen trabalha no escritório de advocacia da


minha família. Não é problema.

Estiquei o pescoço.

— É para mim. Deus, Brody, já me sinto como se


estivesse me aproveitando de você!

— Então, você está apenas me usando para o sexo?

— Brody, não. — Comecei a ficar nervosa— Isto não


está certo. Dê a alguém que necessite. Que realmente
necessite.

— Minha família tem fideicomissos criados para isso.


Sempre fazemos doações. Caramba, deveria ver a lista das
placas de caridade que meu pai costumava ajudar antes do

388
acidente. Falando nisso, o que pensa sobre salvar macacos
aranha órfãos?

— Muito entusiasmada. Dito isto, não aceitarei mais


do seu dinheiro.

Ele deixou escapar um longo suspiro frustrado. Mas


o que mais me afetou foi a tristeza que se espalhou pelo seu
rosto.

— Não quero te perder, Lety.

Não era característico do Brody me dar um ultimato.


Esperei antes de fazer a próxima pergunta.

— Assim se disser não... Terminará comigo?

Sacudiu a cabeça.

— Não. Mas não irei para Inglaterra sem você. Vou


para a Universidade da Pensilvânia e ficarei perto.

Para ficar comigo, renunciaria à oportunidade de


ajudar a seu pai. Quase não podia falar.

— A Universidade da Pensilvânia te oferece o mesmo


que Bristol?

Não respondeu imediatamente.

— Não. Mas não te deixarei aqui com o Carlos.

— Brody, isso não é problema seu.

O ar entre nós se esquentou e não no bom sentido.

389
— Lety, o julgamento começa em uma semana.
Pensou no que acontecerá se não ganhar? Ou o que Carlos
fará quando for condenado e sair em um ano?

Provavelmente, iria me bater até a morte. Mas, é


obvio, não disse isso. Isso não era sobre mim e meu drama.
Isso era sobre o Brody e ao que renunciaria.

— Esqueça de mim. O que acontece com seus pais e


o Tommy? O que acontece com eles se for para a Europa?

— Tive uma longa conversa com meu pai. Quer que


eu vá. Estudar no exterior era seu sonho quando tinha minha
idade, mas nunca o fez. — Brody ficou em silêncio— Quando
lhe disse minha razão para escolher Bristol, disse-me que
estava orgulhoso do homem em que me transformei durante
sua ausência... e se desculpou por não ser o pai que desejava
e merecia.

Cobri minha boca.

Baixou seu olhar, provavelmente, lembrando essa


conversa.

— Minha mãe está preocupada, o que quer que


aconteça entre ela, papai e Tommy tem que acontecer sem
mim. Quero que dependam um do outro. É a única forma de
tornar isso possível. — levou um momento, pensando nas
questões— Não acho que acontecerá se continuar aqui. Tem
sentido?

390
Entendi o que queria dizer. Dionna precisava ser
necessária. O Sr. Moore e Tommy finalmente permitiram a ela
esse prazer. A tensão entre o Brody e sua mãe também
diminuía, quanto mais tempo ficavam separados. Era o
melhor para todos. Não tinha certeza de que era o correto
para mim.

— Eu entendo.

— Irá comigo?

E ali de novo estava esse doloroso nó queimando


através da minha garganta.

— Não. Você precisa ir sem mim.

391
CAPÍTULO 24
Saí da cama de Brody e comecei a me vestir.

— Não faça isto, Lety.

Eu parei antes de pôr meus jeans e abotoá-lo com


força. Brody estava sentado na beira da cama com o rosto
enterrado em suas mãos. A dor atravessou seu rosto quando
olhou para cima.

— Falo sério. Não pode fazer esta droga de novo.

— Não estou tentando fazer nada. Só estou dizendo


para ir à Inglaterra, ajude seu pai. Ele precisa de você.

— E você não?

Minha respiração ficou presa em minha garganta.


Exalei dolorosamente.

— Não ficarei entre seu papai e você.

— Realmente? Isso é tudo? — Amaldiçoou e vestiu


suas cuecas e suas calças— Antes, não queria estar comigo
porque sua família estava com problemas.

— Brody...

392
— Logo não podíamos ficar juntos porque pensava
que eu merecia algo melhor.

— Ainda penso isso.

Congelou. Não queria brigar com ele e calcei minhas


botas. Bloqueou meu caminho quando tentei recuperar meu
casaco.

— Agora está me dizendo "Precisa ir para a Inglaterra


sem mim, Brody. Seu pai precisa de você, Brody"... são
apenas desculpas, Lety. Quando isso vai acabar? Porque você
não pode simplesmente ficar comigo?

Meus olhos queimavam.

— Você chama de desculpas. Eu chamo escolhas que


tenho que fazer por causa da minha maldita vida! Tem
alguma ideia do que acontecerá se eu for com você?

Levantou as mãos para o alto.

— Ah, não sei. Provavelmente será feliz, ficará segura


e menos estressada por não viver perto de seu pai psicopata.

— Carlos está furioso. Se eu for embora, ficará livre


para fazer o que quiser a minha mãe, sabendo que ela não irá
denunciá-lo.

— E que tal se ele vier atrás de você? Foi quem


finalmente teve a coragem de quebrar o silêncio e denunciá-
lo. O que acontece se decidir descontar sua fúria em você?

393
Minhas mãos se fecharam em punhos.

— Então vou lidar com isso.

— Porra! Tem que estar de brincadeira. — Os


músculos de Brody se esticaram o suficiente para sacudir
sua figura— Esse é seu plano, esperar que vá até você, como
se não fosse me destruir se te machucar de novo?

Sua acusação foi como uma bofetada.

— Acredita que quero que me machuque? Não. Estou


cansada de apanhar, cansada de escutar as coisas
asquerosas que me diz, cansada de esperar que o telefone
toque... que alguém me diga o que ele fez agora... Porra...
estou cansada de tudo isso! — Solucei, tentando me conter—
Mas agora sou a única disposta a fazer alguma coisa. Então
eu fico, e espero, e luto com isso quando acontecer.

Seu rosto ficou tenso.

— Não tem que ser assim.

— Mas é assim. A minha realidade. Minha vida. Não


posso me afastar de nada disso. Não aqui, não na Inglaterra.
Em nenhum lugar.

Olhei para seu peito sem expressão. A maneira em


que subia e baixava coincidia com sua crescente fúria.
Abracei-me, odiando ter arruinado sua boa notícia com a
porcaria da minha família.

394
— Eu não sou bom o suficiente para você, certo? —
disse.

Minha cabeça se levantou.

— O quê?

— Todo este tempo, você estava me dizendo que não


era boa o suficiente para mim, mas é o contrário.

Meus olhos arderam.

— Não é verdade.

— Se fosse verdade, aceitaria o que significa para


mim, iria comigo e me deixaria cuidar de você. — Brody
passou a mão pelo rosto— Mas você não vai. Nunca serei
bom o suficiente para você, Lety, porque você não permitirá.

Ele respirou fundo várias vezes antes de falar. Brody


inverteu as posições, voltou tudo contra mim: meus
problemas, minhas inseguranças, meu passado. Brody não
acreditava que Carlos fosse o obstáculo entre nós. Acreditava
que era eu.

E tinha razão.

Minha voz tremeu ao entender o que vinha a seguir.

— Carlos deveria cuidar de minha mãe. Em vez disso,


deu-lhe uma surra. Para todos os efeitos, minha mãe está
morta, Brody. É apenas uma concha oca.

A fúria brilhou em seus olhos cinza azulados.

395
— Nunca te machucaria... não percebe?

As lágrimas corriam pelo meu rosto. Pela primeira


vez, percebi o dano que estava lhe causando.

— O que sei é nunca poderei me entregar a ninguém.

O olhar de Brody perfurou o meu. Não havia maneira


de esconder a decepção em sua voz.

— Nem sequer a mim?

Dizer a verdade em voz alta doía mais do que pensei


que doeria.

— Nem mesmo a você— sussurrei.

Apesar da dor afundando os ombros de Brody,


abraçou-me quando comecei a soluçar.

— Entreguei-me a você quando percebi que te amava,


Lety. Foi fácil. Ele estava certo. E o faria de novo. — Suas
mãos acariciaram cuidadosamente minhas costas— Ainda
sou eu. Deixar-se levar dessa maneira não se trata de
permitir ser manipulada. Trata-se de confiar. Quero que
confie em mim dessa maneira. Mas não posso te obrigar... e
não o farei.

Minhas lágrimas umedeceram seu peito.

— Eu não acho que posso fazer isso.

Suas mãos se imobilizaram.

396
— Então tinha razão. Você e eu, nunca vamos
conseguir.

Minha miséria se liberou como uma avalanche.


Brody me sustentou ali no meio de seu quarto até que
finalmente deixei de chorar. Precisou de um longo momento.
Foi paciente, como sempre, exceto que desta vez não tinha
palavras para me fazer sorrir.

Seu rosto era uma mescla de preocupação e tristeza


quando finalmente me afastei de seu abraço.

— Olhe, sobre a Inglaterra. Não vamos falar sobre


isso agora. — Ele pegou a camisa de manga longa.

Eu agarrei seu braço.

— Não te segurarei aqui.

Ele olhou para o chão.

— Letz, agora não, está bem?

Por mais chateada que eu estivesse, Brody não


estava longe de perder a cabeça.

— Está bem.

Passou a minha jaqueta e ficou com a sua.

— Vamos comer alguma coisa. Podemos resolver as


coisas... mais tarde.

397
Rodeou-me com um braço quando concordei e me
guiou para a porta. Enquanto o olhava fechá-la, outro
arranque de emoção me pegou. Amava Brody, mas tinha
razão. Eu nos impedia de progredir. Por que não podia deixar
as coisas seguirem seu curso, como ele desejava? Realmente,
estava tão destruída? Os dedos de minhas mãos percorreram
a cicatriz perto de minha têmpora, cortesia do punho de meu
pai. Sim, possivelmente, sim.

— Sinto muito.

Sua expressão machucada se encontrou com a


minha antes que me aproximasse.

— Temos que corrigir isso. Perder você Lety... não é


uma opção.

Eu não tinha tanta certeza.

Saímos. Não me dei conta de como estava tarde, até


ver a escuridão invadir o que ficava do céu. A brisa de março
enviava ar úmido contra nossos rostos enquanto seguíamos
em direção ao carro do Brody. Como se fosse um sinal, as
luzes da rua se acenderam, iluminando o concreto da rua.
Brody me segurou forte quando comecei a tremer.

— Está bem agasalhada?

— Estou bem. — Não, na realidade não. Mas


precisava estar bem.

398
— Olá, irmão! — exclamou Razor do outro lado do
estacionamento quando nos viu.

Brody acenou com a cabeça na direção dele, forçando


uma saudação.

— O que aconteceu, Razor?

— Nada. Só passeando um pouco. — Conversava


com um pequeno grupo de garotas reunidas em frente à casa
dele. Entre elas estava aquela que agarrava o seu traseiro e a
cantora. Nunca convidou Alice para sair, mas estava andando
muito com essas duas. Que bom. Muito bom.

— Yodel— leh— lê— hoo— murmurou Brody.

— Lety... Brody? O que aconteceu?

Merda.

Piper estava diante de nós, suas sobrancelhas finas


juntando-se com preocupação. Não precisava de um espelho
para saber que meus olhos estavam inflamados de tanto
chorar. E embora Brody não tivesse derramado uma lágrima,
a preocupação escurecendo seu rosto era tão óbvia como
minha tristeza. Esfregou meu braço enquanto ela se
aproximava.

— Olá, Piper— respondeu— Foi um dia difícil, isso é


tudo.

399
— Aw. — Ela me abraçou com cuidado— Não vão
terminar certo? Sério, são os únicos que me dão esperanças
de que relacionamentos decentes ainda são possíveis.

Razor e Alice não foram os únicos que não seguiram


em frente. Meathead e Piper nunca fora a lugar nenhum,
principalmente, porque Gretel Ann ainda estava metida na
cabeça dele e o ex de Piper tentou voltar novamente para sua
vida.

— Estamos resolvendo alguns problemas. Isso é


tudo— afirmou Brody em voz baixa.

Ela afastou-se.

— Carlos fez algo?

Seu nome foi como um soco em meu estômago.


Elevei o queixo.

— Não posso falar agora. Mais tarde, está bem?

Assentiu. Esperava fazer uma fuga rápida com


Brody, mas então Alice e Gary Stetson, outro RA,
aproximaram-se. Por mais chateada que estivesse não pude
evitar ver como o braço dele acariciava suas costas. Sorriu
em nossa direção.

— Ei pessoal. O que há?

Brody me pressionou contra si, tentando me defender


quando abaixei a cabeça. Piper também moveu seu corpo

400
protetoramente em frente ao meu. Embora não podia ver o
rosto do Brody, captei a surpresa em seu tom.

— Vamos comer. O que vocês estão fazendo, meninos


loucos?

Alice subiu os óculos. Estávamos debaixo da luz de


um poste da rua, mas mesmo assim percebi um rastro de
rubor.

— Estudamos para micro. Nossas provas são


amanhã.

E como o maldito vento, Razor de repente estava ali.

— Olá, Alice— disse, soando chateado e fulminando


com o olhar ao Gary— O que é isso?

Alice piscou.

— O que quer dizer? Estudamos juntos.

Razor cruzou os braços, as mangas de sua jaqueta


negra de motociclista se apertaram contra seus músculos.

— Combinamos de fazer juntos, antes de me


expulsar— resmungou. Razor ciumento?

Piper se aproximou de mim.

— Evitou-o de novo?

401
— Cale a boca— sussurrei. Piper não foi exatamente
discreta. Pelo jeito como Brody se endireitou junto a mim, ele
também a escutou.

Alice franziu o cenho.

— Não te expulsei. Cheguei à biblioteca no horário.


Provavelmente, não percebeu porque estava tão ocupado
flertando com Paige e Wendy, que nem percebeu que eu
estava lá!

Razor se inclinou, apoiando-se em seus calcanhares.

— De que droga está falando?

— Vi você com elas. Nem sequer teve a decência de


ser discreto.

— Não ficaram, Alice. Só passaram para dizer olá.

Alice cerrou os dentes.

— Sim, claro.

Os olhos do Razor se arregalaram.

— Na verdade está zangada comigo.

— Menino experto!

OH, droga. Bem, Alice!

Razor levantou as mãos.

— Bom, agora estou aqui.

402
Gary entrecerrou os olhos para ele.

— Eu também.

O rosto da Alice se voltou para mim. Queria que a


salvasse. Ah, não dessa vez, amiga.

— Os dois querem estudar comigo?

— Acho que é uma forma de colocar— ofereceu


Brody.

Alice olhou lentamente entre eles, seus rostos tão


aturdidos que pensei que iriam ter um ataque.

— Está bem. Bem. — Com um suspiro determinado,


caminhou para sua casa... e tropeçou com uma rachadura na
calçada. Os dois meninos a alcançaram. Ajudaram-na a
levantar-se, com o cenho franzido.

Droga. Sério. Droga.

Piper chamou por cima de seu ombro.

— Tem certeza que pode lidar com dois...?

Dei-lhe uma cotovelada antes que pudesse terminar.


Jogou a cabeça para trás, rindo enquanto os três
desapareciam no interior da casa de Alice.

— Essa pequena descarada.

Brody tomou minha mão.

403
— Razor é como eu e provavelmente não deveria dizer
isto, mas estou orgulhoso de Alice nesse momento.

Sim. Eu também de certa forma.

Piper me ofereceu um abraço, seu sorriso minguou.

— Vão e desfrutem do jantar. Estarei aqui se


precisar.

— Obrigada, Piper.

Cumprimentamos várias pessoas que passaram por


nós. Felizmente, ninguém mais nos deteve. Brody abriu a
porta do carro para mim, mesmo que pudesse simplesmente
acionar o controle, era algo que sempre fazia e eu gostava.

Antes de subir, agarrou meu rosto em suas mãos e


me beijou. Meus dedos roçaram seus nódulos quando me
largou.

— Por que fez isso?

— Porque posso e porque quis fazê-lo.

Enquanto subia e o observava entrar pelo lado do


motorista, dei-me conta de algo mais. Brody sabia que nossos
dias estavam contados. Eu também sabia. Sempre foi assim.
Mas esperava que tivéssemos mais tempo. Agora, com suas
notícias, não tinha tanta certeza.

Ligou o motor de alta potência que soltou um rugido.


Nenhum dos dois falou até que saímos do campus. Arrumei

404
uma mecha do seu cabelo loiro atrás da orelha, querendo
estar próxima dele.

— Aonde vamos?

Seus ombros relaxaram enquanto minha mão


percorria seu braço.

— Onde você quiser. Pulei o almoço para poder jantar


com você.

Não tinha fome depois de tudo o que passei, mas não


queria admitir.

Precisava levantar seu ânimo, assim escolhi um de


seus lugares favoritos.

— Vamos ao Patrick’s. Ok?

Quase podia ver sua boca se encher de água.

— Ok.

Suspirei quando sorriu.

— Perfeito.

Brody foi para a direita e pegou a rota alternativa,


segurando minha mão quando o trânsito ficou mais
tranquilo.

— Letz, sobre hoje, não queria que as coisas


terminassem assim. Pensei que minha notícia seria boa.

— E é, baby.

405
Seu olhar saiu da estrada.

— Não se você não fizer parte dela.

— Você está errado. Foi aceito rapidamente na


Universidade de Bristol. Quantas pessoas têm essa sorte?
Todo seu trabalho e dedicação foram reconhecidos de uma
maneira épica.

Não respondeu, mal piscou quando a luz de um carro


veio diretamente no seu rosto.

— Estou orgulhosa de você— acrescentei


calmamente— Sabe disso, certo?

— Não é isso— disse— Eu te amo, Lety, de todas as


maneiras possíveis. Mas preciso que sinta o mesmo.

Uma renovada sensação de tristeza tomou meu rosto.


Estava arruinando tudo entre nós. Mas não sabia como
parar. Minhas ações, meus sentimentos, não se
manifestaram da noite para o dia.

Demorou toda uma vida.

Olhei como sua mão segurava a minha,


perguntando-me o que faria sem seu toque.

— Quero ser tudo para você, Brody. Só que não


tenho certeza do que eu poderia fazer.

Soltou minha mão para apertar com força o volante,


sua voz tensa enquanto se concentrava no espelho retrovisor.

406
— Letz, temos companhia.

Virei rapidamente para traz. Um carro sem luzes


estava nos seguindo e ganhando velocidade. Minha pele ficou
gelada cada instinto primitivo gritou em alerta.

— É o Carlos.

— Eu sei. — Brody acelerou.

E o motorista atrás de nós fez o mesmo, tentando nos


alcançar.

407
CAPÍTULO 25
Qualquer que seja o carro que Carlos utilizava para
nos seguir, era veloz, ganhando velocidade enquanto
virávamos.

Brody tocou o Bluetooth.

— 911. Qual é a sua emergência?

— Sou Brody Quaid Moore. Minha namorada e eu


estamos em perigo. Precisamos de ajuda...

Meu corpo se sacudiu para frente, batendo


dolorosamente contra o cinto de segurança quando Carlos
nos atingiu. Os pneus cantaram e o metal estalou quando
chocamos contra a grade de segurança. Brody girou
bruscamente à direita, acelerando e esquivando por pouco de
um carro que acelerava em nossa direção. Estávamos perto
do estádio, percorrendo curvas fechadas... Aquelas onde
Brody sofreu o acidente.

O motor rugia por cima da frenética voz da operadora


do 911.

— O que está acontecendo? Diga-me o que está


acontecendo!

408
Outro golpe, outro violento choque com a grade.
Brody derrapou, tentando manter o controle enquanto
girávamos. Mas as curvas eram armadilhas mortais... ravinas
de um lado, paredão de pedra do outro. Carlos estava
arriscando-se muito, forçando Brody a raspar nas paredes
para evitar atingir as grades de metal.

De algum jeito, encontrei minha voz.

— Estamos sendo perseguidos e atingidos por Carlos


Três Santos. É meu pai. Tenho uma PFA contra ele. Enviem
um alerta à polícia agora...

Meu corpo balançou para a frente quando entramos


numa curva acentuada, batendo com força contra a janela.

A voz da operadora subiu de tom. Ela podia ouvir


cada golpe, cada grito, cada chiado do metal nesse momento.

— Digam-me aonde se encontram!

— Estrada Tallmadge a pouco mais de um quilômetro


do estádio!

O som de metal explodiu quando um carro que vinha


na direção contrária, se jogou na parede de pedra para evitar
colidir com o nosso. Brody grunhiu.

— Merda, segure-se!

Apenas mais três curvas. Três curvas que teríamos


que percorrer, antes de chegarmos à parte reta da estrada.
Carlos voltou a colidir contra nós, uma, duas, três vezes.

409
Cada vez, Brody manobrava o carro à esquerda e direita, o
Porsche gemendo em protesto e as rodas chiando sua agonia.
Duas curvas mais, outro choque e outro mais. Jesus Cristo,
não iríamos sair com vida dessa.

Algo explodiu, destroçando a janela traseira. A cor


abandonou meu rosto. Carlos tinha uma arma. Lembro-me
vagamente da minha cabeça balançar em direção ao Brody
quando perdeu o controle do carro, no momento que que
recebemos o segundo disparo.

Nós chocamos contra a grade, quebrando-a e sendo


lançados para a ravina. As árvores, o chão, tudo se
aproximava em grande velocidade.

Lembro-me de olhar para o Brody tentando lhe dizer


que o amava, antes de batermos e tudo ficasse negro.

O estrondo de metal se chocando ameaçou romper o


meu tímpano. Cada volta era uma chuva de golpes para meu
corpo. A terra gritou um furioso chiado antes de tudo de
repente parar.

Fiquei desorientada. Pensei que tinha morrido. Tudo


doía. Deus, porquê doía tudo?

— Lety...?

Brody estava em cima de mim, seu pesado corpo me


esmagando.

— Letz... Por favor, fale baby.

410
Tentei me mover, mas não podia.

— Você está bem? — consegui perguntar finalmente.

Soltou seu corpo aliviado.

— Sim, sim, acredito que sim. E você?

— Estou bem... Eu acho.

Deixou escapar o fôlego.

— Pensei...

— Que íamos morrer? Sim. Eu também. — Estou


bem— assegurei— lhe.

Seu peso lentamente se afastou de mim. Ouvi os


cliques quando soltou nossos cintos de segurança. Forcei
meu olhos, tentando me ajustar à escuridão. Levei alguns
minutos para absorver onde estávamos. O que sobrou do
veículo amassou para dentro. Se tivéssemos entrado em uma
ravina mais estreita, estaríamos sangrando até a morte em
vez de conversar.

Brody empurrou os airbags, chutando com força os


restos de sua janela. Lentamente, eu me sentei, sentindo meu
corpo como um hematoma gigante. Pelo que percebi, não
havia nada quebrado, só ferimentos. Droga. Dolorosos
ferimentos.

Brody se esticou em minha direção, apertando minha


mão com força.

411
— A minha perna está presa embaixo do console. Não
posso sair. Você pode?

Assenti, o que me causou tontura.

— Sim. Acho que sim. Só estou um pouco


desorientada.

— "Desorientada" é uma boa palavra. — Liberou uma


respiração dolorosa— Nós não podemos ficar aqui, Lety.
Tente sair está bem?

— Está bem. — Dobrei os joelhos, esperando


conseguir. Tudo doía, mas parecia funcionar. Engoli sangue.
Eu devia ter cortado a língua de alguma forma. Mas se ele
estava sangrando...

— Brody tem certeza que está bem? Não está


sangrando nem nada, não é? — Não respondeu— Brody?

— Só um pouco.

— O quê?

— A minha perna, onde ficou presa. Mas acho que


não é nada sério. Provavelmente, alguns arranhões.

Passei minhas mãos por sua perna. Senti seus jeans


empapados.

— Pode sentir seus dedos?

— Sim. Posso movê-los. Não há nada quebrado, só


machucado. Muito machucado.

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Senti as mãos pegajosas ao retirar. OH, Deus. Toquei
sua cabeça e quase paralisei de alívio. Sua pele estava
morna, não fria ou úmida, como a de alguém que tivesse uma
hemorragia interna ou entrando em choque. Mas isso podia
mudar. E Carlos estava lá fora.

— Lety, não se preocupe comigo. Apenas saia.

Ele tentava controlar meu pânico, falando com uma


voz suave. Muito tarde para isso.

— Tudo bem.

Deu trabalho abrir minha porta. Tive que empurrá-la


com o ombro, mas consegui sair aos tropeções. O único
motivo pelo qual ainda estávamos vivos era porque Brody
passou a última curva. A ravina não era tão profunda aqui e
havia mais arbustos para amortecer a batida.

Apalpei minha roupa. Perdi meu telefone.

— Brody, está com o seu telefone?

— Não. Devo ter perdido na batida. O Bluetooth do


carro também não funciona.

Sua voz soava mais nítida. Começava a sair do


choque. Eu também, mas meu corpo continuava duro e tenso
por causa do choque. Olhei ao redor, tentando entender onde
estávamos na escuridão.

Era possível ver uma antiga casa colonial à distância


e algumas luzes acesas mais à frente. Estávamos perto de um

413
bairro. Se Brody e eu pudéssemos chegar até lá, com certeza
alguém nos emprestaria um telefone.

Eu ouvi sirenes vindas da cidade. A ajuda estava


chegando. O problema era que pelo menos dois carros
bateram ao tentarem evitar bater de frente com o nosso.
Demoraria até que a polícia chegasse a nós, se nesses carros
tivessem pessoas feridas gravemente.

Tropecei entre os arbustos para chegar no lado do


carro em que Brody estava. A porta estava muito amassada.
Puxei com toda a minha força, mas não consegui puxá-la. Eu
me virei e olhei para dentro do carro.

— Não consigo abrir sua porta.

— Eu sei. — Reclinou seu banco e o puxava no lugar


onde o console prendeu sua perna. O movimento era mínimo,
mas parecia funcionar— Não se preocupe, acho que em um
minuto sairei.

— Aqui. Deixe-me ajudar. — Arrastava-me no


assento traseiro quando outra bala atravessou o carro,
destroçando o que restava do para—brisa.

Brody me empurrou longe dele, com os olhos


arregalados.

— Vai embora, saia daqui!

Peguei sua cintura, tentando puxá-lo. Outro disparo.


Brody me empurrou mais forte.

414
— Vai!

Outro disparo. Esse mais perto. O terror me tirou o


fôlego. Teo tinha razão. Carlos chegou ao limite.

Isso não significava que permitiria que machucasse a


mim ou ao Brody.

Afastei meu medo, deixando que a irritação


aumentasse minha adrenalina e saí, usando a porta aberta
como escudo. Uma figura negra parou no meio da ravina. Não
precisava ver seu rosto para saber que era Carlos. Sua
presença e a arma em sua mão alimentaram minha fúria e
eliminaram o medo que eu ainda sentia.

— Você quer a mim? — gritei, afastando-me do carro


e indo em direção às árvores. Não se moveu, observando-me.

O Porsche tremeu pela força com que Brody puxou


sua perna.

— Lety, saia daqui!

Ignorei-o, mantendo minha concentração na porta na


minha frente.

— Perguntei se me queria desgraçado!

Carlos então atacou, veio correndo pelo caminho


deixando para trás o local do nosso acidente. Corri para a
direita, afastando-o do carro enquanto ele continuava
atirando. O ar foi cortado pelas balas enquanto eu
ziguezagueava entre as árvores. Cada disparo parecia mais

415
próximo. Droga, Carlos era rápido. Mas o imbecil não caiu
pela encosta abaixo.

Meu coração retumbava com cada um dos meus


passos. Não sabia para onde estava indo. Só sabia que tinha
que continuar. Quanto mais longe o levasse, mais o afastava
de Brody. Tirei minha jaqueta, jogando—a, sacudindo os
braços para mais conseguir ganhar velocidade.

Mais na frente apareciam mais luz acesas. Estava


perto da vizinhança. Carlos voltou a disparar. Alguém a
minha esquerda gritou. Tinham-no visto. Mas se estavam
gritando à minha esquerda... onde ele estava agora?

Atravessei as árvores até o jardim de alguém. Do


outro lado da rua, uma porta se abriu e um ancião saiu
correndo. Abri a boca para gritar quando algo duro bateu na
lateral do meu corpo, empurrando-me para o chão.

Com o tombo o ar escapou dos meus pulmões com


um chiado e o cascalho machucou minhas costas. Queria
gritar, mas não tinha fôlego suficiente.

Carlos montou em cima de mim, com uma mão


segurando minha garganta, seu rosto a centímetros do meu.
Grunhiu.

— Você perdeu a porra do respeito pelo seu pai. Você


foi contra mim!

Retorci-me e lutei embaixo dele.

416
— Você não é meu pai!

— Ei! — gritou o ancião do outro lado da rua— Solte


essa garota. Está me ouvindo!

Carlos ajustou seu peso e disparou na direção do


ancião. Foi quando ataquei, golpeando-o com força na
têmpora. Afastou-se, amaldiçoando. Não parei, não podia
parar, atingindo-o mais e mais vezes.

Esbofeteou meu rosto com força, sacudindo meu


crânio. Mais gritos, seguidos pelo som distante de uma arma.

— Que merda? — cuspiu Carlos.

— Já disse para deixar a garota! — voltou a dizer o


ancião.

Carlos levantou o braço, disparando três vezes mais


até deixar a arma vazia.

Com cada grama de força que permaneceu em mim,


levantei meus punhos, golpeando Carlos direto no queixo.
Sua cabeça girou, mas seu aperto em minha garganta só
aumentou. Lentamente, baixou seu rosto para o meu, com
uma fúria que aguçava a loucura em seu olhar.

— Cadela estúpida— disse.

Seu punho grande atingiu meu rosto. Algo quebrou,


como um osso se partindo. O mundo desapareceu em um
flash de dor. Acreditei ouvir mais gritos, portas e janelas
abrindo-se, gritos de terror e um grunhido desumano.

417
Mas tudo parecia afogado... e tudo deixou de ter
sentido...a vida simplesmente parou.

A nuvem que cobria minha visão se desvaneceu


gradualmente. Estava levemente consciente de que estava
sozinha e que o peso esmagando meu peito foi retirado. A
princípio não consegui me mover, fazendo pouco mais que
olhar para cima.

As nuvens se afastaram revelando milhões de


estrelas, como as que Brody e eu vimos meses atrás no
milharal. Queria voltar a vê-lo mais que qualquer coisa e que
me dissesse que daríamos um jeito nas coisas e tudo voltaria
a ficar bem.

À distância, sirenes soavam, anunciando a


aproximação de várias patrulhas. Voltei minha cabeça nessa
direção. Foi quando vi a luz suave refletindo na arma de
Carlos. Estava abandonada na terra úmida. Eu não entendia
o que fazia ali até que um grunhido de dor me fez olhar mais
para frente.

Duas figuras enormes trocavam uma enxurrada de


socos, batendo uma na outra com muita força, sangue
salpicando com cada golpe. O fluido que caía de meu nariz
me esfriou a pele quando entendi o que acontecia.

Brody estava lutando com o Carlos na rua.

O sangue continuava saindo de sua perna esquerda,


encharcando os jeans rasgados. Tremia pela força de seu

418
punho quando se conectava com o rosto de Carlos, apenas
capaz de manter o equilíbrio com a perna ferida. Carlos
tropeçou para trás, mas como o predador que era reconheceu
a debilidade do Brody e foi para matar.

Deu um chute forte na coxa machucada, atirando-se


sobre ele quando caiu.

Não...

Ajoelhei-me enquanto Carlos batia em Brody.

Não.

Procurei a arma enquanto me punha de pé e Carlos


tirava uma faca de seu bolso.

— Não!

Não me lembro da distância. Não me lembro de me


mover. Só lembro da enorme dor disparando em meu braço
quando choquei a coronha da arma contra seu rosto.

As sirenes de polícia pararam com um chiado de


rodas. Um coro de vozes me cercando de todos os lados.

— Polícia do Allentown!

Segurei a arma com mais força.

— Solte a arma!

Tinha que deter o Carlos.

— Repito, solte a arma!

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Tinha que fazê-lo.

Pisquei várias vezes, tentando dar sentido à cena aos


meus pés. O enorme corpo do Carlos estava caído em um
ângulo estranho, algo vermelho se espalhava pela rua,
próximo à calçada onde sua cabeça bateu. Eu cambaleei
confusa do por que ele não se movia. Por que não estava
atacando. Por que não estava lutando.

— Solte a arma, agora!

— Lety, basta, basta. Acabou Lety. Acabou! — A voz


do Brody me alcançou através do pânico e o caos me
envolvendo por completo. A arma escorregou da minha mão,
o metal batendo com força no asfalto. Lembro-me de ouvir
várias vozes.... alguns policiais, algumas das mulheres que
gritavam.

— Ela o matou. Ela matou esse homem!

— Esperem o que estão fazendo? — Brody foi retirado


do meu lado— Ela não fez isso. Porra, ela não fez isso!

Meus pulsos foram puxados dolorosamente nas


minhas costas.

— Tem direito a permanecer em silêncio...

— Ela tem um advogado! — gritou Brody.

— Tudo o que disser será usado contra você no


tribunal...

420
— Lety, diga para eles que tem um advogado! —
Brody amaldiçoou enquanto um policial o empurrava sobre o
capô da viatura.

Fui arrastada e empurrada para a parte traseira de


um carro de polícia. O policial continuava cuspindo os meus
direitos. Eu estava vagamente consciente de que Brody
tentava me dizer alguma coisa enquanto o levavam algemado.
Ele me ajudaria. Permaneceria a meu lado. Iria me proteger.

Mas enquanto fechavam a porta do carro, nada pôde


me proteger da imagem do sangue gotejando do crânio de
meu pai.

Ou do conhecimento de que eu o matei.

421
CAPÍTULO 26
Duas policiais femininas me vigiavam, uma a um
lado da minha cama de hospital, a outra a meus pés. Minhas
mãos tremiam forte o suficiente para sacudir as algemas que
me seguravam.

A médica interrompeu o exame e o ajuste do tubo em


meu nariz.

— Você está bem, querida?

Assenti.

— Quer um pouco de água? Algo além do Toradol


para sua dor?

— Não, o...obrigado. — Ela não percebeu que a dor


era um sentimento distante, um que não podia segurar
através do intumescimento que me controlava.

Ficou de pé, olhava-me com uma expressão


maternal, triste e olhos gentis. Ela não devia saber o que eu
fiz. Não deve ter escutado que matei meu próprio pai.

Nunca pensei que seria capaz de tirar uma vida, nem


sequer dele. Nem mesmo sabendo que tentou matar a mim e
ao Brody.

422
Quando saiu, outras cinco pessoas entraram: três
policiais, um deles o oficial McAfee; Cathleen, minha
advogada; e um rapaz com camisa polo escuro e calças. O
oficial McAfee imediatamente abriu as algemas e tirou dos
meus pulsos.

— Olá, Lety.

A suavidade em sua voz fez meus olhos encherem de


lágrimas.

— Olá.

Ante seu assentimento, os policiais saíram. Fez um


gesto para que Cathleen se aproximasse e lhe ofereceu uma
cadeira.

— Como está, Lety? — perguntou Cathleen. Pegou


minha mão quando não respondi— Os Moore querem que
você saiba que tem todo seu apoio. Não tem que se preocupar
com nada. Eles cuidarão de tudo.

— Brody não fez nada— sussurrei— Fomos atacados.


Carlos nos atacou. Juro que não fizemos nada para provocar
isso.

Ela sorriu levemente e acariciou minha mão.

— Sabemos. — Ela gesticulou atrás dela para o


homem de calças e polo— Esse é Miles Fenske, o promotor
Lehigh County. Está assumindo o seu caso ... contra Carlos
Três Santos. Solicitou que o processo em Philly também seja

423
transferido para cá. Quero que fale com ele. Queremos ter
certeza de que Carlos nunca mais a prejudicará.

Meu olhar saltou de Cathleen para o oficial McAfee.

— Assumindo o caso? — Que caso? Carlos estava


morto— N— não estou entendo.

Trocaram olhares antes que o oficial McAfee


abaixasse a cabeça.

— Lety, Carlos está vivo. Está internado no andar de


baixo até que seja tratado de seus ferimentos...

Meus soluços afogaram todo o resto que disse, meus


ombros sacudindo-se violentamente pela força do meu
pranto. Alguém colocou uma mão em meu ombro. Pensei que
era Cathleen até que levantei os olhos e vi o promotor,
Fenske, observando-me com seus amáveis olhos cor de café.

— Ele sempre te machucou, não é? — Assenti


minhas lágrimas caindo mais rápido. — Você tem a minha
palavra de que não machucará a mais ninguém novamente.
Mas preciso da sua ajuda. Você vai me ajudar, Lety?

Minutos se converteram em horas enquanto os


advogados, o oficial McAfee e eu conversávamos. Carlos tinha
três acusações de tentativa de assassinato— a minha, do
Brody e do senhor no qual atirou – direção perigosa, lesão
corporal qualificada, conduta criminal e um montão de
multas de velocidade. Sua perseguição resultou em dois

424
acidentes além do nosso, um estudante de uma universidade
próxima gravemente ferido e uma família jovem.

Eram quase quatro da manhã quando permitiram a


Mateo, Sofia, e a reitora Riley entrarem em meu quarto. Teo
amaldiçoou quando me viu e a decano abafou seus gritos.
Sim. Entre os pontos de sutura e meu nariz quebrado, pode-
se dizer que Carlos arruinou meu rosto.

Sofia me ajudou a me vestir com a roupa que trouxe


para mim, falando enquanto lágrimas escapavam de seus
olhos a montões.

— Você virá comigo. Entendeu? — disse Teo— Não


pode voltar à faculdade assim.

A reitora Riley concordou que era o melhor.

— Vou falar com seus professores, Lety, e enviarei


por e-mail seus trabalhos enquanto se recupera. Não se
preocupe com seu registro. Vou me certificar de justificar
isso.

Apertei o cardigã contra meu peito, sentindo-me nua


e só, apesar de minhas roupas e deles estarem ali.

— Quero ver o Brody. — O oficial McAfee me garantiu


que estava bem, mas não era suficiente. Precisava vê-lo.

Cathleen colocou sua mão sobre meu ombro.

— O FD quer interrogá-lo separado hoje á tarde. No


momento, eu gostaria que ficasse longe dos Moore.

425
Afundei mais no casaco de lã, com a certeza de que
ficaria deprimida por ser afastada do Brody. Arriscou sua
vida por mim. Se não conseguisse confiar nele, nunca seria
capaz de confiar em ninguém.

— Só quero falar com ele.

— Lety, o FD13 não quer levantar suspeitas de que


você e o Brody conspiraram contra o Carlos ou de que de
alguma forma provocaram esse ataque. É só temporário,
apenas um ou dois dias.

Eu balancei a cabeça, sem querer aceitar o que


estava me dizendo.

— Lety, ela é sua advogada. Escute-a— advertiu-me


Teo. Ele colocou seus braços ao redor de mim e me levou até
a porta— Vamos. É hora de ir. Você se sentirá melhor depois
de dormir.

Não acreditava nisso, mas não queria ser um


incomodo. Todo mundo estava do meu lado. Precisava
recordar isso a todo custo.

Olhei as enfermeiras agrupadas ao redor da sala


quando saímos do quarto. Uma delas me deu as papeladas
da alta, mas algo não parecia correto.

— Eu não deveria assinar algo?

Cathleen olhou sobre seu ombro.

13
FD: Federal de Distrito

426
— Já está tudo arranjado.

Teo franziu o cenho.

— Eu posso cobrir suas despesas.

— Obrigado, Sr. Três Santos. Mas lhe asseguro que


isso não será necessário.

Estávamos quase no elevador quando vi Brody.


Estava de pé ao final do corredor entre sua mãe e seu pai e o
que parecia ser uma equipe de guarda-costas ao seu redor.

Um longo curativo cobria sua testa e manchas roxas


dos golpes que recebeu pintavam seu rosto, inflamando as
maçãs do rosto e queixo. Seus jeans cheios de sangue foram
substituídos por shorts de basquete, expondo o curativo
grosso colocado ao longo de sua perna esquerda. Inclinava-se
pesadamente em um par de muletas. Não pensei tivesse me
notado até que sua cabeça se voltou em minha direção.

— Lety! — Um homem com um terno azul marinho


tomou seu ombro, falando baixo. Brody o empurrou a um
lado— Lety!

Teo manteve seu braço ao meu redor. Cathleen


sussurrou em minha orelha.

— É melhor manter sua distância até que o FD tenha


a oportunidade de falar com ele.

O elevador soou. No entanto, eu me recusava a me


mover, mas Teo estava me apressando. Brody abandonou

427
suas muletas e mancou até mim. Mais homens em ternos
escuros tentaram detê-lo, mas passou através deles,
caminhando rapidamente pelo corredor.

— Lety!

Eu me soltei do aperto de Teo e corri para o Brody,


chocando contra seu peito enquanto me arrastava para ele.
Pensei que já acabado com as lágrimas até que esses braços
familiares se esticaram protetoramente ao redor de mim.

— Nós ficaremos bem, está me ouvindo? Não importa


o que acontecer, vamos superar isso.

Todos se juntaram ao redor de nós, mas foi o Sr.


Moore quem falou.

— Deixe-os ter esse momento. Merecem pelo menos


isso...

428
CAPÍTULO 27
Não sabia quando conheci o Promotor Fenske, mas
ele tinha tanto amor pelo Carlos quanto eu.

— Carlos Três Santos representa tudo o que está


errado em nosso sistema legal— disse-me— Se não tivesse
sido liberado, você e todos os outros estariam a salvo.

— Você acredita que posso fazer isso? — perguntei—


Afastá-lo da minha vida?

— Lety, qualquer tentativa tem a mesma sentença


que o verdadeiro crime. Se conseguir convencer o júri sobre o
tipo de homem que ele é, nunca terá que temê-lo novamente.

Assim caberia a mim convencer o juiz e enterrar de


vez o meu passado. O advogado de defesa do Carlos tentou
argumentar para fazer um acordo e retirar as acusações de
agressão, lesão corporal e direção perigosa... Com uma pena
de dez anos e a oportunidade de liberdade condicional depois
de cumprir três anos. Dado seu histórico criminal,
instabilidade e tendência à violência, isso não seria
suficientemente bom para mim ou para a Promotoria.

O promotor Fenske foi bastante convincente,


expondo Carlos como um sociopata violento e calculista que

429
passou anos atormentando a sua família e comunidade.
Brody prestou depoimento, assim como Teo, Sofia, meu tio
Linho e o doce homem que tentou me defender. Mas eu era a
testemunha principal, da qual a promotoria dependia.

Chorei baldes de lágrimas no depoimento enquanto o


Promotor contava a minha história de abuso e não conseguia
parar de tremer durante o meu exame. Minhas reações não
eram simulação. Cada minuto do testemunho de três dias me
deixou seca. E nas noites quase não dormia. Brody, Teo,
Sofia e os pais de Brody estavam na sala, presenciando cada
lágrima, cada estremecimento e o medo em meus olhos por
ter o Carlos tão perto.

Algumas vezes foi muito para eles e tiveram que


desviar o olhar. Algumas vezes minha voz tremia tanto que
era difícil me entender. Foi uma das piores experiências da
minha vida, e entre as piores histórias de abuso que o
Promotor escutou alguma vez. E o teria feito centenas de
vezes de novo, só para escutar os jurados o declararem
culpado de novo.

Terminei meu segundo ano da universidade com


uma média de 3.8 e afastando ao Carlos Três Santos por
sentenças perpétuas consecutivas, e bem a tempo de dar as
boas-vindas ao bebê de Teo e Evie.

Congelei quando entrei na sala de parto e vi minha


mãe. Era a primeira vez que a encontrava desde que me
ligou, exigindo que retirasse as acusações contra Carlos.

430
Sofia se apressou junto a mim, sussurrando muito
baixo.

— Não vai ficar, Lety. Só está aqui para oferecer uma


bênção.

Minha mãe assinalou o sinal da cruz sobre Evie. Não


acredito que Evie tenha visto. Estava apoiada pesadamente
contra Teo enquanto tentava controlar sua dor.

Enquanto as contrações diminuíam, minha mãe


caminhou até a porta, detendo-se junto a mim.

— Mateo me rasgou ao meio.

A cabeça da Evie se voltou em direção ao Mateo, com


uma voz aguda.

— Acaba de dizer que a rasgou ao meio? — Sua voz


subiu várias oitavas quando Teo não respondeu— Isso é o
que disse, não? Jesus Cristo rasgou-a ao meio quando te
pariu!

A única coisa que a impediu de entrar em histeria foi


o início de outra contração. Teo segurou mais forte e lançou
um olhar para a porta.

— MA, saia daqui— grunhiu em espanhol.

Sofia rapidamente a apressou para que saísse.

— Eu não sabia que a pequena gringa entendesse


espanhol— murmurou, desculpando-se.

431
Fechei a porta atrás dela e me apressei a lavar
minhas mãos, logo passei a seguinte hora tentando apoiar
Evie em sua dor. Conseguiu resistir seis centímetros antes
que enlouquecesse e exigisse uma epidural. Teo e eu
estávamos de pé junto a ela, olhando-a dormir quando estava
finalmente confortável.

— Você sabe que posso lidar com qualquer coisa,


certo?

Sua voz profunda era tão suave que mal podia ouvir.

— Sim, eu sei, Teo.

— Só não posso aguentar se algo acontece com Evie.


Entende-me? Perderei a cabeça se algo acontecer com ela.

Esfreguei seu braço sem saber o que dizer. Observar


a sua esposa ferida seria demais para ele.

A enfermeira, amiga de Evie, Lourdes, caminhou em


sua direção.

— Olhe Teo, é difícil para os homens ver aqueles que


amam sofrer e não poder fazer nada. Por que não vai tomar
um copo de água?

Lourdes apenas sorriu quando ele abaixou as


sobrancelhas.

— Eu vou cuidar dela e seu bebê. Eu prometo. Você


vai precisar e um pai desprovido de sono e desidratado não é
bom para ninguém.

432
Teo demorou um pouco para mover-se. Olhou a Sofia
e a mim.

— Ficaremos com ela até que retorne. — prometi.

Dez minutos depois que Teo saiu, Evie se sentou e


esfregou os olhos.

— Há algo diferente aqui, Lourdes.

Lourdes se aproximou apressada.

— Sente a pressão de que falamos?

Evie assentiu.

— Sim. Vai olhar?

Sofia e eu esperámos no lado oposto da cama.


Lourdes foi uma completa profissional durante o exame.
Bom, de certa maneira.

— Santa Pelotas. O bebê está bem aqui.

Os olhos do Evie se abriram de repente.

— É sério?

— Não há dúvida de por que você teve tanta dor,


querida. Esse bebê não podia esperar para conhecer sua
mamãe. — Lourdes manteve o lençol elevado sobre o colo de
Evie— Aqui. Sinta.

Evie tocou debaixo do lençol.

433
— OH, Meu deus. — Voltou sua expressão
assombrada em minha direção— Lety traz o Teo. É hora.

Cruzei o quarto e virtualmente caí pelo corredor de


tão rápido que ia. Teo estava perto da porta da sala de
nutrição com Brody e Killian. Suas cabeças se voltearam
juntas na minha direção quando me viram.

— É hora.

Teo permaneceu no lugar.

— Está brincando comigo?

— Não. Vem cá, é hora!

Deu ao Brody seu copo, mas não se moveu rápido até


que viu outra enfermeira e um médico apressando-se ao
quarto de Evie. Seguiu-os rapidamente, arrastando-me com
ele.

Lourdes e a outra enfermeira estavam colocando as


pernas do Evie em estribos quando entrámos. Teo se
apressou a seu lado e agarrou sua mão.

— Está bem?

Assentiu, embora parecesse muito assustada.

— Fica comigo, sim?

Beijou sua testa enquanto olhava o médico fazer a


avaliação.

434
— Vejamos o que temos aqui. — O doutor sorriu—
Mocinha, não terá que empurrar muito. Seu pequeno está
aqui.

Evie sorriu ao Teo.

— Sim. Eu sei.

Lourdes ajustou a luz.

— Teo vai pegar o bebê e cortar o cordão umbilical.

— Pegar o bebê? — repetiu Teo. Imaginei que isso era


novidade para ele.

— Não se preocupe, vou te ajudar— disse-lhe o


doutor, lançando-lhe um par de luvas.

Oito minutos, esse foi o tempo que Evie levou para


ter seu bebê. Sofia e eu observávamos imóveis enquanto o
doutor posicionava as mãos de Teo e o ajudava a guiar a seu
filho até o mundo. Por um momento, tudo o que Teo fez foi
olhar o bebê em seus braços. Uma lágrima caiu pelo seu
rosto

— É um menino— anunciou em voz baixa.

Evie chorava enquanto Mateo abaixava


cuidadosamente seu filho movendo-se e gritando no peito
dela. Sofia e eu nos aproximamos suavemente quando ela o
segurou. Está bem. Não, não o fizemos. Soluçamos como um
desastre, abraçadas para o corredor.

435
Um filho. Meu irmão teve um filho. Killian a alcançou
quando a viu.

— Então?

Ela secou seus olhos, sorrindo.

— É um menino.

Levantou sua pequena figura no ar e deu voltas, mas


quando a colocou no chão, ela o empurrou.

— Sinto muito— disse ele.

Ela abaixou a cabeça, cruzando os braços de forma


protetora.

— Está bem.

Killian esfregou o queixo, olhando-a.

— Eu deveria ir. Diga a Teo que desejo felicidades e


que me deve cinquenta.

Ela olhou para cima.

— Pensou que Evie teria uma menina?

Killian riu.

— Sim. Eu sabia que estava certo. — Piscou um


olho— Sempre tenho razão quando se trata de mulheres.

436
Os olhos da Sofia se arregalaram. Também os meus.
Havia muito por trás desse comentário. Killian puxou seu
cabelo de brincadeira.

— Vejo você em algumas semanas, está bem?

Concluí que não seria minha irmã se não corasse.

— Vemos-nos, Killian.

Eu o vi caminhar até o final do corredor antes de


levantar uma sobrancelha.

— O que acontece?

Ela mordeu o lábio, mas não pôde esconder o sorriso.

— Contratou-me para reestruturar o seu site


novamente e instalar um programa para suas contas.

— Ah, aha. E quanto vai demorar?

Ela cobriu o rosto brevemente antes de reunir


coragem e deixar que suas mãos caíssem para os lados.

— Algumas semanas, possivelmente, um pouco mais.


Não poderei começar até julho.

— Julho? Parece muito tempo, Sofia. Estou surpresa


que não tenha pedido a outra pessoa.

Um ligeiro brilho iluminou seus olhos.

— Ele disse que me amava e que iria esperar até que


estivesse preparada.

437
E por falar em comentários carregados.

— Sim?

— Sim. Fez. — encolheu—se de ombros— Acredito


que estou preparada... Para seguir adiante, quero dizer. Tive
medo por muito tempo.

O sorriso se sumiu da minha boca. Considerando


tudo o que passou, isso era algo forte.

— Killian é um bom rapaz.

Suas pequenas sobrancelhas se juntaram com medo.

— Assim espero.

Eu a abracei com força, rezando que ele pudesse ser


tudo o que Sofia precisava e merecia. Devolveu meu abraço.

— Quero ficar bem, Lety. Estou cansada de me


acovardar e ser fraca. Estou muito cansada.

— Eu sei— sussurrei.

Seu longo e suave cabelo roçou minha bochecha


enquanto se afastava. Ela apontou na direção aonde Killian
desapareceu.

— Eu vou sair e pegar o jantar de Teo e Evie antes de


me despedir. Um de seus restaurantes favoritos é aqui perto,
italiano. Quer algo?

438
Sua abrupta mudança de humor me preocupou. Mas
se não queria falar de seu passado, não a obrigaria. Sorri e
tirei algumas notas da minha bolsa.

— Brody e eu retornaremos ao hotel para jantar.


Queremos dar ao Teo e a Evie tempo a sós com seu bebê.

— Sim, eu também. — Pegou o dinheiro e o meteu no


bolso traseiro de seus jeans— Obrigada, Lety. Vejo-a amanhã,
ok?

— Está bem, vemos-nos amanhã— Beijei-a na


bochecha e a observei ir. Se alguém tinha uma oportunidade
de chegar a Sofia, era Killian. Cresceu com ela. Cuidou dela.
E sabia o que aquele desgraçado fez.

Apoiei—me contra a parede para enviar uma


mensagem ao Brody. De onde estava, vi minha mãe sentada
sozinha na sala de espera. Teo e Evie não quiseram muitos
visitantes. Imaginei que nossa família, agora maior, iria para
a casa dele quando voltassem, mas não sabia e não me
atrevia a perguntar para minha mãe. Brody se aproximou
com dois copos de café em suas mãos antes que pudesse lhe
enviar a mensagem. Beijou minha testa.

— O que tivemos?

— Um menino.

— Bom. Parabéns!

Tentei não chorar de novo.

439
— Sim, foi bastante assustador.

— Você acredita que o nosso primeiro filho será um


menino?

Eu ri.

— Baby, depois do que vi ali, teremos cachorrinhos.

Sorriu zombador.

— Acho que tenho alguns anos para te convencer do


contrário. — Colocou os dois copos de café em minhas mãos.

— O que é isso?

Ele apontou para onde minha mãe estava sentada


sozinha.

— Uma oferenda de paz.

Sacudi minha cabeça.

— Não... posso.

— Letz, não vou pedir que a perdoe ou peça perdão.


Mas foi uma mulher que sofreu abuso, pequena. Fez o melhor
que pôde.

Depois da sentença de meu pai, prometi que não


pensaria mais sobre todas as vezes que me machucou e aos
meus irmãos, e em todas as vezes que minha mãe esteve ali e
não fez nada para nos salvar. Mas lá estavam minhas
lembranças, vindo à tona, recordando-me do meu passado.

440
— Não foi suficiente.

— Não. Não, por muito tempo. Mas uma vez a amou.


E apesar de te machucar, sei que mesmo assim te ama. Só
para dizer adeus, Lety— disse quando lágrimas frescas
desceram por meu rosto. — Só um adeus, por mim.

Meus pés se moveram sem permissão para onde


minha mãe esperava com sua bolsa marrom de plástico
contra o colo. Não queria falar com ela, nunca. Mas se Brody
pôde perdoar seus pais, eu poderia me despedir da minha
mãe.

Entreguei o café sem nenhuma palavra, sentando no


braço da cadeira em frente a ela.

— Obrigada.

Assenti, mas não disse nada. Bebeu um gole do seu


café, olhando uma pintura de uma mãe segurando seu filho.

— Você está indo embora?

Respondi em inglês:

— Sim, MA. Vou.

— Com o Brody? — perguntou, com sotaque


carregado.

— Sim. Nós vamos para a Inglaterra durante o verão


e provavelmente mudaremos para lá depois de nos
formarmos.

441
Esperei palavras duras e críticas, que me
perguntasse se ainda era virgem ou que me julgasse por ir
com um homem que ainda não era meu marido. Mas essas
palavras nunca chegaram. Em vez disso, disse:

— Nunca te machucaria certo?

Minha visão ficou turva enquanto via as lágrimas


escapar de seus olhos.

— Não, MA... Ele jamais faria isso.

Ela tirou um lenço velho de sua bolsa.

— Bem. Isso é bom.

Minha mãe nunca seria minha melhor amiga e


provavelmente não falaríamos muito pelo resto de nossas
vidas. Mas enquanto ficava aqui sentada com ela por mais
um momento, compartilhamos um ar de perdão que não pode
ser dito em voz alta.

— Adeus, mamãe— disse finalmente.

— Adeus, minha filha.

Brody me puxou para mais perto dele quando o


alcancei. Com sua mão apertada fortemente na minha,
guiou—me pelo corredor e fora do hospital.

O sol de maio nos saudou com um calor e brilho que


nos fez sorrir, apesar de minhas últimas lágrimas molharem
minhas bochechas. Inclinou—se para frente e me beijou.

442
— Está preparada, linda?

— Sim, estou preparada. — Dei um apertão na sua


mão, aceitando por completo que nossa vida juntos acabava
de começar.

Eu e Brody enfim felizes e juntos.

443
444
CAPÍTULO 1
Os barulhos constantes de soco no saco de boxe
continuavam como se os golpes de corpos e maldições não
ricocheteassem em cada parede do ginásio de MMA. Cada
golpe prometia dor e exigia respeito. Eu tentei não reagir a
cada golpe forte ou me encolher pelos corpos enormes
gotejando suor, mas era difícil. Caos controlado era a melhor
maneira para descrever a cena desvendando—se diante de
mim. E ninguém fazia isso melhor que Killian Ou'Brien.

Eu coloquei meus dedos na bolsa do computador


pendurado em meu ombro, fingindo procurar provas e pastas
colocadas contra meu computador portátil, enquanto
observava completamente Killian por trás da segurança de
meus óculos de sol.

Suas largas e musculosas costas eram deliciosas,


mais que deliciosas. Gostava da forma como sua tatuagem de
cruz celta se seguia por sua coluna vertebral e se estendia
por suas omoplatas. Gostava da forma como seu cabelo negro
ondulado desprendia de sua cabeça. Gostava da forma... está
bem, a quem estava enganando? Gostava de tudo nele. Foi
assim desde que tinha sete anos, quando ele e sua grande
família católica se mudaram para a casa da em frente à
nossa.

445
Killian não percebeu minha presença. Estava
ocupado chutando o restante do saco pesado, mostrando aos
jovens lutadores do MMA como deveriam fazer. Com um
metro noventa e cinco e lutando na categoria de super
pesados, Killian não deveria ser tão flexível. Mas era. Querido
Senhor e como era.

Seu pé roçava a parte superior do saco com cada


golpe brutal, fazendo com que a corrente que o prendia no
teto sacudisse aos solavancos. Killian era conhecido pelos
seus chutes. Se desse um chute em seu adversário no rosto
com o pé, o pobre rapaz estaria com o rosto desfigurado, e
não teria mais nenhuma chance.

— Olá, Sofia!

Pulei quando o jovem Ou'Brien se aproximou.

— OH. Olá, Finn.

A covinha em sua bochecha direita se aprofundou


quando sorriu. Fez um gesto para a bolsa de nylon de meu
computador.

— Está pronta para trabalhar?

— OH, sim. Pronta para começar. — Tirei a mão de


dentro da bolsa e deixei cair de lado um pouco sem graça. Em
um intento de me recuperar, coloquei meus óculos de sol em
cima de minha cabeça, empurrando os fios do meu cabelo
longo encaracolado atrás das orelhas.

446
O sorriso do Finn se alargou. Provavelmente, sentia
meu nervosismo. Seu sorriso largo o fazia parecer mais jovem
que seus dezenove anos, mas era doce o suficiente para
acalmar a tensão que causou o meu primeiro dia. Eu sempre
gostei de Finn. Era mais novo que seus irmãos, mas tão duro
quanto, fazendo o necessário para subir nas filas do MMA
como peso welterweight.

Golpeou com suas mãos enluvadas, cheias de energia


como de costume. Deus, ao que parece, colocou todos os
músculos Ou'Brien na pesada figura de Killian. Deus era
divertido nesse sentido. Isso não significa que Finn não
derrubaria a um cara com o dobro de seu tamanho. Finn era
divertido dessa forma.

Ele coçou a parte superior de seu encaracolado


cabelo vermelho.

— Killian sabe que está aqui?

— Ah, não, mas tudo bem. Posso ir para o seu


escritório e começar com o site...

— Kill, Kill! — Finn embalou sua boca com suas


mãos, gritando muito forte— Sua mulher está aqui! — Sua
atenção se voltou pra o meu rosto mortificado— É sua
mulher, certo, Sofia?

— Ah...

447
A cabeça se Killian se virou em nossa direção, junto
com a maioria dos monstros treinando. Eu não tinha certeza
se podia ver quão vermelho estava meu rosto de onde estava
de pé, mas o sorriso fácil estendendo-se por suas feições me
dizia que sim. Ele abandonou o que restava do saco pesado e
cruzou o acolchoado enquanto o resto dos lutadores reatava
suas brigas.

Eu congelei, observando-o rondar como a besta louca


que eram seus braços musculosos e densamente tatuados
balançando-se ligeiramente dos lados. Não demoraria muito
tempo para chegar a nós, apesar da grande extensão do
armazém convertido, assim tentei falar rápido.

— Não sou sua mulher, Finn.

— Assim só estão transando?

— Não!

— Mas quer?

— Querer o quê?

— Transar com meu irmão como um par de


címbalos— disse, como se eu fosse uma estúpida.

— Sim... Não. — OH, céus.

— Por que não?

— Finn!

— Ele é um cara bom.

448
— Finn, não vou ter essa conversa com você.

— Quer tê-la com o Kill, então?

— Ter o que comigo? — A voz profunda de Killian


retumbou como um trovão quando ele parou na minha
frente.

Querido. Senhor.

Passaram várias semanas desde que o vi pela última


vez. Uma barba rala escura raspava seu queixo, formando
um pequeno cavanhaque e enfatizando os ângulos de seu
queixo quadrado. Mas seu rosto não prendeu minha atenção
por muito tempo. Meu olhar desceu por seu corpo,
apreciando sua pele clara reluzindo de suor.... Antes que
recordasse que meus óculos de sol agora estavam na parte
superior de minha cabeça e estava olhando-o
descaradamente.

— Você gosta do que vê? — perguntou brincando.

— Eu... — O impulso de fugir me teve trocando de


peso, o suficientemente forte para golpear a barra da minha
saia branca longa contra minhas pernas nuas. Mas fiquei
quieta, tratando de não engasgar por seu ardente nível de
maldade e trabalhando para formar uma resposta decente —
Só estava admirando seu suor.

— Que resposta tão decente.

Ele deixou de sorrir.

449
— Meu suor?

Eu deveria levar um soco no braço, porque sim, eu


era tão patética.

— Com certeza. Deve ter tido um bom treinamento,


não é?

Finn fez uma careta como se lhe doesse me ver falar.


Eu era boa com computadores. Não podia dizer o mesmo a
respeito dos homens. Se o destino do mundo dependesse de
que tivesse uma interação bem-sucedida com a espécie
masculina sem gaguejar, ruborizar ou retroceder, o mundo
terminaria e todos teriam uma morte apocalíptica.

Killian me analisou de perto como muitos fariam com


um inseto que se debatesse, antes de esmagá-lo, então seu
peito começou a sacudir por causa da risada. Deus, essa é
Sofia. Por favor, golpeie-me até morrer.

Killian diminuiu a distância entre nós, as pontas de


seus dedos tocaram o meu queixo.

— Eu só estava começando. É agradável que uma


garota bonita aprecie meus esforços.

Seu toque eletrificou meu corpo, enviando choques o


suficiente para eletrizar as pontas do meu cabelo. Sorriu
levemente enquanto continuava a me olhar, seu olhar
soldando fixamente o meu à medida que sua mão se retirava
da minha pele.

450
Havia momentos na vida de uma garota quando
afligir-se de felicidade era necessário e profundamente
justificado. Esse era um deles. Mordi meu lábio inferior,
tentando suprimir meu profundo rubor e ignorando o
movimento de punhos que Finn fez com suas mãos e os
muito aprovadores polegares acima que se seguiram.

Fiz um gesto em direção ao escritório de Killian,


incapaz de suportar a intensidade nesses olhos azuis que
detinham o meu coração.

— Quer que comecemos?

— Muito. — Piscou-me os olhos— Mas agora,


possivelmente, deveria começar com o meu site.

Pressionou sua mão contra a parte baixa de minhas


costas quando tudo o que fiz foi ficar ali de pé com a minha
boca aberta e me conduziu para frente. Independentemente
de sua enorme força, seu toque era suave. Eu deveria ter
ficado com medo, apesar dele ser muito cuidado comigo. Era
grande e poderoso e podia derrubar a alguém tão fraca e
magra como eu. Mas não temia Killian.

Só temia o que ele podia descobrir de mim.

Eu queria que mantivesse a palma da mão contra


mim. O gesto me assegurava que possivelmente gostava.
Pensava que era bonita. Gostaria que me conhecesse mais do
que como a garota com quem cresceu. Quase grunhi quando
deixou cair sua mão. Se fosse alguém mais forte e mais

451
segura, teria me estendido para tocá-lo ou talvez tivesse lhe
dado um sorriso. Mas não era uma dessas garotas coquetes
que sempre pareciam dizer as coisas corretas. Era
simplesmente eu.

Caminhamos ao longo do ginásio para seu escritório.


O chão não estava acolchoado aqui, assim os saltos de
minhas sandálias de prata ressonavam contra o chão de
concreto. Eu ajustei a alça fina do meu Top floreado quando
a alça da bolsa do meu computador portátil a fez descer pelo
meu ombro.

— Aqui, deixe-me te levar isso. — Killian levantou a


bolsa, aliviando o estresse de seu peso de meu corpo— Você
está linda— acrescentou em voz baixa.

Abaixei meus cílios, evitando seu olhar. Eu tinha me


arrumado especialmente para ele, querendo que notasse.
Assim quando o fez, fiquei balançada. Mas só um pouco, eu
juro.

— Obrigada. — Os cantos de seus lábios se


levantaram em um sorriso sexy. Ok, eu menti. Talvez eu
balançasse muito.

— Como foi o tráfego em Philly?

— Huh? OH, bem. Eu saí cedo para fugir dele, mas


estava bom. Ficarei com a minha mãe assim posso vir até
aqui e não terei que me preocupar por causa disso.

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— Você vai ficar no antigo bairro?

Assenti.

— Sim. Ficarei ali até terminar aqui. Fica mais fácil


eu vir até aqui, entende?

— Bem. Eu gosto de ter você por perto.

Detive-me abruptamente ante seu comentário justo


enquanto chegávamos a seu pequeno escritório que se
localizada no centro do ginásio. Grandes janelas encerravam
a fachada, dando-me a visão de dois homens lutando no
octógono enquanto vários outros esperavam sua vez no
ringue de MMA. Maldições, golpes, tudo pareciam derramar-
se no espaço das lutas.

Meus dedos se moveram sobre a mesa marrom


grande.

— Isso é lindo.

Ele bufou e colocou minha bolsa em cima da mesa.

— Muito lindo. Não encaixa nessa maldita sala.

Uma folhagem estava empoleirada em cima de um


arquivo, a única presença colorida no local. Eu tirei meu
laptop da bolsa e o liguei, enquanto terminava de examinar a
área, a designer de interiores dentro de mim trabalhando em
maneiras de enfeitar o pequeno espaço.

453
Antes que pudesse fazer algumas sugestões, Finn
entrou correndo.

— Kill, o escritor da revista de MMA está aqui para


fazer a entrevista.

— Diga-lhe que já vou. — Sorriu-me— Eu tenho que


cuidar disso. Você vai ficar bem aqui sozinha?

Assenti.

— Estarei bem.

Sorriu e acariciou meu queixo.

— Vejo você daqui um pouco.

Saiu pela porta. Observei-o, incapaz de apagar o


sorriso bobo do meu rosto. Eu me sentei na cadeira perto da
mesa, ainda flutuando de felicidade enquanto começava a
trabalhar.

Uma voz profunda ecoou pela sala do outro lado do


ginásio.

— Ugh. Olhe a mulher linda e fina no espaço do Kill.

— OH, merda— disse outro rapaz— Sabe quem é?

Olhei brevemente para o grupo de homens


esperando sua vez para treinar. O menor dos três olhou em
minha direção.

454
— Sim. Não é essa Sofia Três Santos? A irmã de
Mateo?

Examinei a pasta que montei para Killian, na


tentativa de ignorá-los. Meu irmão tinha uma reputação.
Todos no sul e oeste de Philly o conheciam. O cara que
perguntou quem eu era, estava rindo.

— Talvez, mas isso não é o que quis dizer. — Eu fui


parando de escrever enquanto uma sensação familiar de
medo se arrastava por minhas costas— Pelo o que eu ouvi ela
transa com qualquer um que tenha pernas.

Velcro se rasgou enquanto um dos lutadores ajustava


suas luvas.

— Merda, não. — ele riu entre dentes— Bem eu


tenho duas pernas.

Meu estômago se agitou e suor se acumulou em


meus braços.

— Tem certeza? — perguntou o cara que conhecia


Mateo— Sempre pensei que era toda tímida... Veja, qual é a
palavra? Pura. Inocente.

— Saia daqui. Minha prima Kenny diz que finge ser


doce e inocente, mas é tudo mentira. Um punhado de irmãos
se aproveitou de...

Fechei a porta do escritório de repente e me inclinei


contra esta, minha respiração muito rápida e meu coração

455
parece que explodiria. A sala se tornou nebulosa enquanto
meus olhos se enchiam de lágrimas. Pressionei a minha mão
sobre minha boca, desejando que tudo o que ele havia dito
não fosse verdade. Eu não era doce, não era pura... Não mais.
Qualquer inocência da que tinha orgulho foi roubada de mim
no dia em que fui estuprada.

CONTINUA...

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