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COGNITIVO-COMPORTAMENTAL
SÃO PAULO
2016
MARIA ANGÉLICA ALVES FREIRE
SÃO PAULO
2016
Fica autorizada a reprodução e divulgação deste trabalho, desde que citada a fonte
Maria Angélica Alves Freire, Renata Trigueirinho Alarcon, Eliana Melcher Martins
– São Paulo, 2016
35f + CD-ROM
BANCA EXAMINADORA
Parecer:
___________________________________________________________________
Parecer:
___________________________________________________________________
(Autor desconhecido)
DEDICATÓRIA
Neste instante constato o quão difícil é encontrar as palavras que expressem o meu
agradecimento a todos que de algum modo, nos momentos serenos e/ou apreensivos, fizeram
ou fazem parte da minha vida, que de alguma forma contribuíram para minha conquista
profissional e pessoal. Peço que considerem-se envolvidos pelos meus agradecimentos
independente de seus nomes constarem ou não neste espaço tão limitado.
Aos meus pais, pelo apoio, incentivo, força, esperança, fé e amor que sempre me
deram ao longo destes 2 anos de estudos.
Ao meu marido, que sofreu e sorriu comigo, seja na distância ou perto, entre Minas
Gerais e Tocantins, entre idas e vindas de aeroporto e viagens de carro, casamento....
Obrigado por sempre estar comigo!
Aos meus tios Paulo e Marta, Cincinato e Margarete, minha prima Ana Paula e meu
primo sobrinho Gabriel, por não medirem esforços para que meus dias em São Paulo não
fossem tão “pesados”.
Aos meus colegas do curso, em especial às minhas eternas amigas Rita, Selma e
Cecília, pela amizade demonstrada ao longo de toda nossa especialização.
Sabe-se que a morte tem sido na atualidade um tema tratado como tabu por grande parte das
pessoas. Apesar de ser vista como ‘interdita’, é necessário que se fala sobre ela, não apenas no
‘mundo dos adultos’, mas também com as crianças. Falar sobre a morte com crianças não
significa entrar em altas especulações ideológicas, abstratas, é colocar o assunto em pauta de
maneira concreta e simples. Sabe-se que a morte de um dos pais ou de um ente querido é uma
das experiências mais impressionantes na vida de uma criança. Desse modo, o presente
trabalho tem como objetivo realizar uma revisão bibliográfica sobre o luto infantil, com
enfoque na abordagem cognitivo comportamental. O levantamento de dados foi realizado por
meio da pesquisa bibliográfica, na qual foi possível encontrar, na literatura existente,
materiais sobre o tema abordado, isto é, luto na infância. Para tanto, foram utilizados livros,
artigos científicos disponíveis em bancos de dados como Scielo, revistas eletrônicas, bem
como dissertações de mestrado. Em relação ao presente trabalho, foram encontrados alguns
artigos sobre contribuições do luto em relação a abordagem cognitivo comportamental.
Porém, não houve nenhum artigo encontrado na literatura brasileira a respeito do luto infantil
e a terapia cognitivo comportamental. Em todos os artigos analisados, encontrou-se que a
morte de um ente querido é um fator gerador de muito estresse. Caso ele não seja elaborado
de maneira funcional, traz inúmeras repercussões na vida da criança. Frente a abordagem da
TCC, algumas técnicas são utilizadas com a criança, principalmente o brincar. Outro elemento
importante muito utilizado pelo terapeuta como estratégia de intervenção é o baralho das
emoções, visto como um instrumento facilitador no processo de identificar emoções,
pensamentos e crenças disfuncionais. Em relação as estratégias terapêuticas, que são
essenciais para ajudar o enlutado a produzir uma resposta saudável, utiliza-se mecanismos e
comportamentos que possam ser aprendidos e/ou modificados. É importante considerar que
esse processo do luto é bastante conflituoso e traumático para a criança, pois ela ainda se
encontra em estágio humano de desenvolvimento cognitivo e emocional. Diante disso, é
essencial para a criança que ela possa contar com um adulto capaz de dar a ela a certeza de
que não está só e de que a sua existência não está ameaçada. O papel dos adultos é essencial
nesse momento. Ele deve favorecer um ambiente em que a criança possa expressar seus
sentimentos, no qual ela também sinta a segurança de que é amada para que possa enfrentar
esse momento difícil da perda de um ente querido.
Palavras chave: Luto infantil. Abordagem TCC. Concepção da morte para a criança.
ABSTRACT
It is known that death has been present in a subject treated as taboo by most people. Although
be seen as "prohibited", it is necessary to talk about it, not only the 'adult world', but also to
children. Talking about death with children does not mean going into high ideological
speculations, abstract, is to put the matter in a concrete and simple way agenda. It is known
that the death of a parent or a loved one is one of the most impressive experiences in the life
of a child. Thus, this study aims to conduct a literature review on child bereavement, focusing
on cognitive behavioral approach. Data collection was conducted through literature, in which
it was possible to find in literature, materials on the topic discussed, that is, mourning in
childhood. Therefore, books were used, scientific articles available in databases such as
Scielo, electronic journals and dissertations. In relation to this work, found some articles on
bereavement contributions in relation to cognitive behavioral approach. However, there was
no article found in Brazilian literature about child bereavement and cognitive behavioral
therapy. In all the articles analyzed, it was found that the death of a loved one is a factor that
generates a lot of stress. If it is not prepared in a functional way, it has numerous
repercussions on the child's life. Front of the TCC approach, some techniques are used with
the child, especially the play. Another important element widely used by the therapist as an
intervention strategy is the deck of emotions, seen as a facilitator in the process of identifying
emotions, thoughts and dysfunctional beliefs. Regarding the therapeutic strategies that are
essential to help the bereaved to produce a healthy response, it uses mechanisms and
behaviors that can be learned and / or modified. It is important to consider that this process of
mourning is quite confrontational and traumatic for the child, because it is still in human stage
of cognitive and emotional development. Therefore, it is essential to the child that she can
count on an adult able to give her the assurance that you are not alone and that their existence
is not threatened. The role of adults is essential that time. It should foster an environment in
which children can express their feelings, in which she also feel the security that is loved so
you can face this difficult time of loss of a loved one.
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 9
1.1 Concepção da morte na infância .................................................................................. 9
1.2 O luto infantil ............................................................................................................. 12
1.3 Breve conceituação histórica da TCC ........................................................................ 14
2 OBJETIVO ......................................................................................................................... 17
3 METODOLOGIA .............................................................................................................. 18
ANEXOS ................................................................................................................................. 35
9
1 INTRODUÇÃO
Sabe-se que a morte tem sido na atualidade um tema tratado como tabu e interdito por
grande parte das pessoas, pois sempre há um desconforto quando se fala nesse assunto,
principalmente pela dor e vazio que causam (KÓVACS, 2003).
A morte e o morrer são inerentes à existência humana (KUBLER-ROSS, 2000). As
incertezas e a imprevisibilidade que se dispõem em torno do processo morte/morrer fazem
com que o ser humano necessite conviver com a sua presença desde o início ao estágio final
do seu desenvolvimento (ZORZO, 2004).
Observa-se, através da literatura, que um grande teórico sobre a morte, Ariès (1990),
em seus estudos refere que, por algum tempo, ela foi considerada como natural ao ser
humano, tranquila e até mesmo vista de maneira ‘resignada’. Sua vivencia ocorria no âmbito
familiar, os rituais se davam numa cerimônia pública, de que todos participavam e eram
autorizados a expressar os sentimentos pela perda (inclusive as crianças).
Com o avanço dos anos, embora fosse vista como cotidiana, a morte começou a ser
percebida como um fracasso do ‘morto’ em relação à vida. Nesse ínterim, devido aos
sentimentos de comoção e de pesar, a face do morto era coberta por um tecido, tornando-se
oculta aos olhares (ARIÈS, 1990). Porém, frente ao avanço da ciência e o crescimento da
industrialização, foi percebido também o ‘inconformismo’ frente a morte de si mesmo e do
outro. Nota-se, no entanto, que mudanças socioculturais vão além, provocam o afastamento
da morte no cotidiano. Aos enfermos é “omitida a morte iminente, e perante a sociedade ela é
camuflada, vista como tabu-objeto de interdição”. (KÓVACS, 2003, p.12).
Porém, entende-se que falar sobre morte é assumir um processo pelo qual passamos
desde que se inicia a nossa existência. Ela faz parte do cotidiano de todos os indivíduos,
inclusive das crianças. Observa-se, que no ‘universo infantil’, a morte está presente nos
desenhos animados dos quais as crianças tanto gostam e assistem.
Segundo, Paiva (2013, p. 27), a ideia mágica da imortalidade aparece quando, “o pica
pau é atropelado por um trem e fica completamente estendido no chão como folha de papel, e
depois, em questão de instantes, toma sua forma original e continua no desenho”. Ou das
aventuras de Tom e Jerry, ao explodir a bomba na boca de Tom, Jerry fica totalmente
chamuscado e depois se recupera.
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Ainda segundo a mesma autora, atualmente em relação aos jogos eletrônicos, tão
comuns na realidade das crianças, elas enfrentam situações de batalha nas quais conseguem
driblar a morte, ganhando ‘bônus’ por suas estratégias para combater os inimigos, adquirindo
“vidas extras”. (PAIVA, 2013, p.27)
Por um lado, vemos a banalização da morte e, por outro, o pensamento da
imortalidade. Assim, observa-se que continua-se negando a morte e fazendo com que ela
fique mais longe de nós. Assim, surgem questionamentos: “Qual o espaço da morte na nossa
vida? Existe um espaço específico para a morte? Quem é o responsável para trabalhar com a
morte? Existe algum preparo para enfrentá-la?” (PAIVA, 2013, p. 30).
Em relação a curiosidade da criança, Priszkulnik (1992) afirma que: “a criança está
disposta a saber a verdade sobre a morte, tanto que indaga sobre ela e de várias maneiras.
Muitas vezes, é o adulto que teme falar sobre o assunto” (p.496)
Azevedo (2003) diz que:
Falar sobre a morte com crianças não significa entrar em altas especulações
ideológicas, abstratas e metafisicas nem em detalhes assustadores e macabros.
Refiro-me a simplesmente colocar o assunto em pauta. Que ele esteja presente,
através de textos e imagens, simbolicamente, na vida da criança. Que não seja mais
ignorado. Isso nada tem a ver com depressão, morbidez ou falta de esperança. Ao
contrário, a morte pode ser vista, e é isso que ela é, como uma referência concreta e
fundamental para a construção do significado da vida. (AZEVEDO, 2003, p. 58).
Segundo Bromberg (1998), o significado dado pela criança à morte depende muito de
sua idade, o vínculo estabelecido com a pessoa falecida, o momento de seu desenvolvimento
psicológico, além de como o adulto, com quem convive, lida com a perda. Sabe-se que a
morte do pai ou da mãe, ou de algum membro muito próximo causa uma dor imensa na
criança. Porém, diferentemente do que se pensa, conversar com ela sobre o assunto não irá
aumentar essa dor, ao contrário, a tendência é amenizá-la, além de auxilia-la na elaboração de
seu luto.
Infelizmente, de maneira muito equivocada, os adultos, em muitos momentos,
“mentem ou ocultam a verdade à criança, e ela deixa de acreditar neles e pode não voltar a
perguntar sobre o assunto” (ABERASTURY, 1984, p. 129). Assim, “a criança sente uma
terrível confusão e um desolado sentimento de desesperança, criado porque já não tem a quem
recorrer” (ABERASTURY, 1984, p. 129). Nesse ínterim, o silêncio do adulto sobre a morte
com o argumento de evitar o sofrimento à criança, porque ela nada compreenderia a esse
respeito, acaba inibindo-lhe no que diz respeito a sua curiosidade, sentimentos e
questionamentos. Torres (2002, p. 162) traz a contribuição de que “a prudência do adulto
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Nesse aspecto, em muitos momentos, a família acredita que seja possível omitir a
morte de um ente querido à criança. Porém, observa-se que esse comportamento é inútil, pois
a criança perceberá a mudança no contexto familiar em algum momento.
Dentre alguns estudos referentes à concepção de morte pela criança, Torres (2002)
apresenta três características: (1) irreversibilidade - a impossibilidade do corpo morto retornar
ao estado anterior; (2) não funcionalidade - entendimento de que todas as funções definidoras
da vida cessam com a morte; (3) universalidade - tudo o que é vivo morre.
Nesse mesmo prisma, de acordo com Piaget (1990), a criança pensa diferente do
adulto e se desenvolve de acordo com estágios relacionados a seu desenvolvimento. O autor
distingue quatro períodos do desenvolvimento cognitivo: sensório motor, pré-operacional,
operacional-concreto, operacional-formal
Bee (1997) é uma autora que realiza importantes estudos sobre o significado da morte
para a criança. Assim, para as crianças o significado da morte pode ser revertido pela oração,
por mágica ou pensamento em sua fantasia, fazendo as sentirem que, mesmo após a morte, é
possível ter sensações ou respirar. Além disso, a criança pode encarar a morte como uma
punição por ser “mau”. Apenas a partir da idade pré-escolar, conhecida por Piaget como
início das operações concretas, que a maioria das crianças parece compreender a morte de
forma mais próxima à realidade (TORRES, 1999).
Nesse prisma, suas contribuições relatam que crianças com idade anterior a cinco anos
acreditam que a morte seja um acontecimento reversível, pois não possuem noção da
realidade ou do conceito de morte. É indicado, nessas situações, tentar explicar, de forma
clara, dando exemplos mais concretos possíveis e que de preferência já tenha feito parte de
sua vivência, como, por exemplo, um animal de estimação que morreu. A autora ainda traz
que evitar contar a verdade pode causar consequências, ou seja, abalar a capacidade de
12
estabelecer laço de confiança com a criança. Somente a partir dos oito anos que a criança tem
o entendimento da morte como algo irreversível.
Já aos nove anos, a morte passa a ser entendida como universal e não necessariamente
induzida por alguém, de forma que a criança já se mostra capaz de participar das conversas
como os adultos. Assim, independentemente da idade da criança é importante informá-la
sobre o evento, adaptando o linguajar e a complexidade da explicação ao seu nível de
compreensão (TORRES, 1999).
Em relação ao luto infantil, Franco e Mazorra (2007) nos trazem que a morte de um
dos pais ou de um ente querido é uma das experiências mais impressionantes na vida de uma
criança. Nesse aspecto, “com a morte de um genitor, a criança perde o mundo que conhecia.
Agora seu mundo está enlutado: torna-se difícil lidar com toda a gama de sentimentos que
parecem invadi-la com o desmoronamento da família” (p.504).
Ainda segundo Franco e Mazorra (2007), “diante da ausência irreversível de um
vínculo provedor de sustentação, a criança se depara com profundos sentimentos de
desamparo e impotência” (FRANCO E MAZORRA, 2007, p. 504). Todos esses sentimentos
vivenciados pela criança são resultado de uma insegurança que prevalece diante da perda de
seu ente querido.
De acordo com Priszkulnik (1992), o processo de luto infantil tem uma duração
subjetiva mais extensa que o luto dos adultos, pois seu psiquismo ainda está em
desenvolvimento e em organização. Porém, é importante acrescentar que esse processo será
facilitado ou dificultado dependendo do auxílio que o genitor ‘sobrevivente’ poderá fornecer
diante da situação da perda. Além disso, o comportamento desse adulto influenciará na
maneira como a criança elabora o processo do luto.
Já Bowlby (1993) relata que a criança vivenciará melhor seu processo de luto através
do conhecimento que têm sobre a perda, através dos outros relacionamentos afetivos (relação
de segurança que se estabelecerá com seus familiares), e, principalmente, com a oportunidade
de compartilhar seus sentimentos e emoções.
Kovács (1992) explica que a maneira como a criança vivencia o processo do luto é
fortemente influenciada pelo modo de como ele também acontece com os adultos, podendo
estar relacionado também com as informações que a criança possui a esse respeito. É
importante considerar que, assim como o adulto, a criança também passa pela fase de negação
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da morte do outro, com muitas fantasias frente ao falecimento de seu ente querido; isso pode
fazer com a criança comece a sentir sintomas parecidos com os da pessoa que faleceu.
Frente a essa questão, Torres (2012) pontua uma semelhança existente em relação ao
luto do adulto e da criança. Segundo a autora, a intensidade com que esse luto ocorre pode
caracterizá-lo como esperado ou como um luto complicado. Nesse ínterim, de acordo com
Grollmam (1967 apud TORRES, 2012), o luto complicado pode ser observado quando há
uma negação prolongada da realidade e a persistência de distúrbios somáticos como: culpa,
apatia crescente e de insistência de reações hostis em relação aos outros. Assim, é importante
observar não apenas o comportamento da criança, mas por quanto tempo esse comportamento
persiste.
Em um estudo realizado por Torres (1999), em que ela observou inúmeras crianças em
fase de desenvolvimento com embasamento na teoria de Piaget, ela aponta que apenas após a
aquisição de um pensamento cognitivo concreto a criança é capaz de compreender a
irreversibilidade da morte. Desse modo, a autora pontua que a ausência dessa capacidade
cognitiva em compreender a morte como um fato irreversível dificulta o processo de
elaboração da perda.
Desse modo, frente a uma maior dificuldade cognitiva e emocional para significar a
perda, “a elaboração do luto vivido pela criança é processada ao longo da estruturação
psíquica, em distintos momentos de sua vida, à medida que ela vai podendo significar o que
viveu” (FRANCO; MAZORRA, 2007, p. 505).
Outro aspecto importante que necessita ser levado em consideração diz respeito aos
fatores externos frente a morte tais como: “relação com a pessoa perdida, circunstância em
que a perda ocorreu, informação recebida pela criança, tipo de morte, estressores e mudanças
no cotidiano da criança” (FRANCO; MAZORRA, 2007, p. 505).
Em relação ao enfrentamento no processo do luto infantil, Torres (2012) retrata
algumas considerações importantes tais como:
Diante disso, Fujisaka (2009) relata que é de extrema importância que a criança possa
contar com o apoio dos adultos mais próximos, e que estes tenham uma comunicação aberta
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com ela, fornecendo segurança para que ela seja capaz de expressar suas emoções. Além
disso, sabe-se da importância de a criança participar dos rituais que envolvem o luto (velório e
enterro).
Outro fator relevante a ser considerado é o fato de que o adulto próximo mostre suas
emoções diante da morte. No momento em que ele se expressa seu choro e saudade, faz com
que a criança também se sinta à vontade para fazer o mesmo. Além disso, ainda que a criança
seja incapaz de compreender o que está acontecendo, é necessário compartilhar as emoções
com ela, pois, mesmo que sentimentos de tristeza predominem naquele momento, a criança
precisa se sentir amada, protegida e cuidada (FUJISAKA, 2009).
Por fim, todos os autores citados ressaltam que é através da elaboração do luto que
ocorrerá a reorganização psíquica e afetiva após a perda. Sabe-se, como já foi dito
anteriormente, que cada criança possui uma maneira subjetiva de vivenciar esse momento
difícil de dor. Desse modo, diante deste processo do luto infantil, cada criança reage com suas
particularidades. É necessário considerar a vinculação com o genitor, as informações que ela
tem sobre a morte, as características do desenvolvimento cognitivo e emocional.
Como já foi discutido no início do texto, apesar de a morte ser um processo natural, a
interdição e negação frente ao processo de morrer, em muitos momentos, dificulta a
elaboração do luto. Necessário se faz desmistificá-la e proporcionar diálogos para que possa
ser vista, apesar do grande sofrimento, como parte do ciclo vital de forma mais leve e serena.
Nesse ínterim, a TCC dá uma grande ênfase aos pensamentos do paciente e a forma
como ele interpreta o mundo (BAHLS, 1999). De acordo com Knapp (2004), todos os
experimentos comportamentais têm um elemento cognitivo e a modificação das distorções
cognitivas se dá por meio das técnicas comportamentais.
Em relação ao objetivo das técnicas ou intervenções comportamentais, é necessário
aumentar o comportamento positivo enquanto diminui-se o negativo. Sendo assim
subentende-se que o engajamento em um comportamento traz resultados positivos, aumenta a
auto eficácia do indivíduo e estimula o empenho em novos comportamentos mais adaptativos.
Entende-se que o modelo cognitivo propõe que o pensamento disfuncional pode
influenciar de maneira considerável o humor e o comportamento do indivíduo e está presente
em todos os transtornos psicológicos. Assim, nota-se que quando as pessoas aprendem a
avaliar seu pensamento de forma mais realista e adaptativa, elas obtêm uma melhora em seu
estado emocional e no seu comportamento (BECK, 2013).
Desse modo, o modelo cognitivo pressupõe, portanto, que as emoções, os
comportamentos e a fisiologia de uma pessoa são fortemente influenciados pelas percepções
que tem dos eventos que ocorrem em suas vidas. Não é a situação em si que determina o que a
pessoa vai sentir. É como ela interpreta ou significa a situação. (BECK, 2003).
Já em relação ao tratamento em TCC, ele está baseado em uma conceituação ou
compreensão de cada paciente, identificando suas crenças específicas e padrões de
comportamento. Nesse ínterim, para que ocorra uma efetiva e duradoura melhora no humor e
no comportamento do paciente, o terapeuta trabalha num nível mais profundo de cognição: as
crenças básicas do paciente sobre si mesmo, seu mundo e em relação as outras pessoas,
chamada de tríade cognitiva. Assim, a modificação dessas crenças disfuncionais subjacentes é
que produz as mudanças mais permanentes. Entende-se que essas crenças são construídas
desde a infância, através de experiências que o indivíduo vai vivenciando e compondo
significados sobre si, os outros e sobre o mundo (BECK, 2013).
Partindo da postulação da TCC, da ideia de que ao longo de nossas vidas são
construídas e adquiridas cognições sobre si mesmo, sobre o mundo e sobre o futuro, não raro
as pessoas tendem a fazer interpretações errôneas acerca das situações. Através desses erros
de pensamento, acaba-se proporcionando sofrimentos emocionais, físicos e psicológicos e, de
acordo com os autores Dattilio e Freeman (2004), dentre os eventos ameaçadores e críticos,
situações de crise e situações da perda de um ente querido podem ser situações ativadoras
dessas crenças disfuncionais.
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2 OBJETIVO
O presente trabalho tem como objetivo realizar uma revisão bibliográfica sobre o luto
infantil, com enfoque na abordagem cognitivo comportamental.
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3 METODOLOGIA
O levantamento de dados foi realizado por meio da pesquisa bibliográfica, na qual foi
possível encontrar, na literatura existente, materiais sobre o tema abordado, isto é, luto na
infância. Para tanto, foram utilizados livros, artigos científicos disponíveis em bancos de
dados como Scielo, livros considerados clássicos de autores como Aberastury, Bee, Beck,
Bowlby, Bromberg, Caminha, Kovács, Kubler-Ross, dentre outros, bem como dissertações de
mestrado da escola de enfermagem da Usp.
Foram utilizadas palavras-chave no idioma português, sendo elas: “luto”, “luto
infantil”, “morte”, “a criança diante da morte” e “luto para a criança”, “abordagem cognitivo
comportamental”.
Diante disso, Gil (2002) aponta que esse tipo de pesquisa é constituído a partir de
livros e artigos científicos, permitindo assim que o autor se aproprie de uma gama de
fenômenos mais ampla do que qualquer outro tipo de pesquisa. Assim, vale acrescentar que
este trabalho foi elaborado com base em teorias já existentes, tendo como um de seus
objetivos fornecer ao leitor os principais estudos elencados sobre o tema proposto.
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4 RESULTADO E DISCUSSÃO
Sabe-se que o luto pela perda de uma pessoa amada é a experiência mais universal e,
ao mesmo tempo, mais desorganizadora e assustadora vivida pelo ser humano. Quando há um
sofrimento como esse, muitas questões da vida são repensadas, relações são refeitas a partir
de uma avaliação de seu significado, a identidade pessoal se transforma. Muitas prioridades se
invertem e busca-se um novo sentido para diversas situações. Apesar do grande sofrimento
ocasionado pela perda, há esperança de transformação, de recomeço.
Em relação ao presente trabalho, foram encontrados alguns artigos sobre contribuições
do luto em relação a abordagem cognitivo comportamental. Porém, não houve nenhum artigo
encontrado na literatura brasileira a respeito do luto infantil e a terapia cognitivo
comportamental. Todos os artigos diziam respeito a teóricos do desenvolvimento e da
psicanálise (ABERASTURY, 1984; KÓVACS, 1992; TORRES, 1999; PIAGET, 1990)
Dessa maneira, o grande desafio da pesquisadora foi realizar uma compilação de
artigos sobre luto infantil de modo abrangente, fazendo correlações com o material
encontrado sobre o luto em adultos, além de realizar adaptações ao público infantil com
técnicas e intervenções da TCC frente ao atendimento com crianças.
Em todos os artigos analisados, encontrou-se que a morte de um ente querido é um
fator gerador de muito estresse. Caso ele não seja elaborado de maneira funcional, traz
inúmeras repercussões na vida da criança. Viu-se também que a forma como o adulto se
comporta frente ao luto influenciará positivamente ou negativamente no luto da criança.
Em seus estudos sobre o luto Kovács (1992) relata que a morte sempre nos traz
recordações, já que se trata de uma das mais dolorosas perdas. Para a autora: “A morte do
outro se configura com a vivência da morte em vida. É a possibilidade de experiência da
morte que não é a própria, mas vivida como se uma parte nossa morresse, uma parte ligada ao
outro pelos vínculos estabelecidos” (KOVÁCS, 1992, p. 153). Nesse sentido, a morte se
relaciona diretamente com o rompimento de vínculos. A pessoa que vivencia essa perda
retrata a morte como sendo um pedaço de si que lhe fora retirado. O sentimento de perda de
um ente querido é extremamente forte, sendo quase remota a possibilidade de encontrar
alguém que nunca tenha passado por tal situação dolorosa.
Em relação ao sentimento relacionado à morte do outro, Kovács (1992, p. 154) relata
que:
20
Sobre isso, Bee (1997) considera que os que manifestam sua dor, que “se permitem ao
luto”, estão se comportando de uma forma saudável. Aquelas pessoas que não evidenciam
imediatamente o sofrimento após uma perda costuma ser aqueles que ainda se mostram
deprimidos vários anos após, ao passo que aqueles que evidenciam um mínimo de sofrimento
imediatamente não mostram sinais de problemas posteriores. (BOWLBY; SANDERS, 1989
apud BEE, 1997, p. 602).
Em relação a fundamentação teórica da TCC, sabe-se que a maioria das pessoas que
vivenciam situações de estresse, como a perda de um ente querido, desenvolve respostas de
enfrentamento desadaptativas, ou seja, uma estratégia que a pessoa apresenta em certas
circunstâncias para conseguir lidar com o evento traumático. Em relação a criança, é
importante considerar como ocorreu a morte de seu familiar (de maneira abrupta ou
gradativa); se a criança presenciou ou não o momento do óbito, a vinculação com esse
familiar. Todas essas questões deverão ser levadas em conta no processo psicoterápico
(YOUNG et al., 2008).
Em relação aos estágios de reação à perda e as fases do luto descritas respectivamente
por Kübler-Ross (2005) e Bowlby (1990), é interessante percebermos que a perda repentina
de um ente querido pode ser considerada um evento ameaçador à integridade física,
psicológica e social de um indivíduo. Devido a isso, como resposta de enfrentamento, alguns
esquemas são ativados, e, para amenizar os sentimentos provocados, os pacientes podem
então hipercompensar, evitar ou resignar tais esquemas.
Desse modo: “esquemas de privação emocional, abandono, defectividade, além de
esquemas de inibição emocional, são caracterizados, principalmente, por uma evitação na
expressão de sentimentos e pensamentos” (BASSO; WEINER, 2011, s/p). Esses mecanismos
defensivos que barram emoções desagradáveis ao indivíduo e podem ser encontrados nos
primeiros estágios de reação à perda e nas fases do luto descritas por Kübler-Ross (2005) e
Bowlby (1990), pois a negação e o entorpecimento não deixam de ser uma resposta de
enfrentamento desadaptativa frente à situação de perda por morte.
Além disso, crenças relacionadas ao esquema de abandono também são ativadas. Os
pacientes enlutados buscam de maneira incessante pela pessoa que partiu, hipergeneralizando:
"Se ele me deixou, as outras pessoas vão me deixar também". Já a barganha tem relação com
a manutenção esquemática, pois envolve perdas e ganhos. Este também é o momento em que
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deles e dos erros de pensamento que a TCC vai poder auxiliar os pacientes enlutados na busca
de um alívio e melhor aceitação da perda do ente querido e de todas as implicações que nela
repercute. O impacto gerado por uma perda pode ser tão doloroso que impossibilita os
indivíduos de uma recuperação saudável. Sendo assim, a reorganização e a aceitação são uma
etapa difícil de alcançar, e, muitas vezes, é devido a elas que é solicitada uma ajuda de um
profissional.
Em relação aos sentimentos frente a perda de um ente querido, tanto adultos quanto
crianças apresentam tristeza, raiva, culpa, ansiedade, solidão, choque. Frente as cognições
podem ser encontrados descrença, confusão, preocupação, sensação de presença. Já em
relação aos aspectos comportamentais estão presentes transtornos do sono, transtornos do
apetite, isolamento, sonhos com a pessoa morte, passeios a lugares em que lembrem da pessoa
morta. Por fim, em relação as questões físicas observou-se vazio no estomago, aperto no
peito, nó na garganta, falta de ar, fraqueza muscular, boca seca, anedonia (BASSO; WEINER,
2011, s/p).
Desse modo, frente a todas as considerações feitas acima, o acompanhamento
psicológico para a criança torna-se extremamente necessário visando ajudá-la nesse momento
de luto. A meta é servir de maneira facilitadora no processo de readaptação dessa criança,
tópico que será discutido a seguir.
Como já ressaltado anteriormente, a perda por morte repentina, tende a ser traumática,
principalmente quando esta ocorre na infância. Franco (2005) salienta que a pessoa enlutada
em condições traumáticas encontra-se fragilizada, geralmente desorganizada, incoerente,
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Por fim, sabe-se que a TCC é composta por inúmeros instrumentos que podem ser
usados no decorrer dos tratamentos para auxiliar na modificação de padrões de funcionamento
disfuncionais, provedores de sofrimento. O objetivo foi descrever apenas algumas delas, as
mais relevantes e utilizadas na psicoterapia de um paciente enlutado. Ressalta-se a dificuldade
de realizar o trabalho em relação ao luto infantil pelos poucos materiais encontrados na
literatura que abordam o luto com ênfase na teoria cognitiva e comportamental. Desse modo,
a proposta deste trabalho foi promover reflexões para que os psicólogos que optam por essa
abordagem tenham mais oportunidade de encontrarem estudos sobre o tema.
É importante enfatizar que o terapeuta terá a função de facilitar a expressão dos
sentimentos associados à perda do ente querido, observando todas as implicações que ela trará
ao paciente. É necessário levar em conta as crenças que o paciente enlutado tem sobre a morte
e seus pensamentos disfuncionais. Outro aspecto importante é que as técnicas e estratégias
cognitivas e comportamentais possam aumentar as características adaptativas e auxiliar na
tomada de decisões e na busca de novas atividades e relacionamentos, a fim de melhor
elaborar a perda.
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo do luto sempre será algo difícil para os que passam pela perda de um ente
querido. Para a maioria das pessoas, a morte de alguém que se ama será sempre a morte de
uma parte de nós mesmos, pois, de acordo com os estudos realizados por autores como
Kovács (1992), é essa a sensação que se tem diante de tal acontecimento.
Sendo assim, foi possível perceber através do estudo que a morte de alguém com
quem se tem importantes laços afetivos é um dos acontecimentos que mais desorganiza o
psíquico de um ser humano.
Em relação ao objetivo da pesquisa, buscar entender como a criança vivencia o
processo do luto foi um desafio. Foi possível entender, com os dados e as informações obtidos
na literatura, que cada criança lida e elabora a perda de diversas formas. Algumas se calam,
outras manifestam sua dor, outras questionam o sentido da morte antes de expressar qualquer
tipo de emoção.
Além disso, de acordo com estudos elaborados por Anton e Favero (2010), a idade da
criança influenciará na maneira como ela vê a morte, pois algumas delas ainda não
conseguem entender a morte como algo irreversível. Sendo assim, é de grande importância
dialogar com a criança sobre esse tema, bem como esclarecer as dúvidas pertinentes à faixa
etária em que ela se encontra.
É importante considerar que esse processo do luto é bastante conflituoso e traumático
para a criança, pois ela ainda se encontra em estágio humano de desenvolvimento cognitivo e
emocional. Sendo assim, perder um genitor ou uma pessoa muito próxima, que até então era
considerado sua fonte de segurança e proteção, traz para a criança intensos sentimentos, entre
eles o de culpa, de raiva, de abandono e ainda de negação da perda, pois um relacionamento
entre pais e filhos sempre envolve todos esses sentimentos conflitantes.
Assim, é preciso reafirmar que a perda de um dos pais se configura como uma das
maiores crises da vida da criança, pois os pais são aqueles que irão garantir a sua
sobrevivência, tanto física quanto emocional e psíquica. Diante disso, é essencial para a
criança que ela possa contar com um adulto capaz de dar a ela a certeza de que não está só e
de que a sua existência não está ameaçada.
O papel dos adultos é essencial nesse momento. Ele deve favorecer um ambiente em
que a criança possa expressar seus sentimentos, no qual ela também sinta a segurança de que é
amada. Estudos feitos por Franco & Mazorra (2007) apontam que a elaboração do luto por
parte da criança irá depender também da maneira como o adulto próximo vivencia tal
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processo. Por isso, é importante frisar que o genitor sobrevivente mostre a sua dor, expresse o
seu luto, para que a criança partilhar essa dor e sentir-se à vontade para fazer o mesmo.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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comportamentais inovadoras. Porto Alegre: Artmed, 2008.
ANEXOS
Eu Maria Angélica Alves Freire, afirmo que o presente trabalho e suas devidas partes
são de minha autoria e que fui devidamente informado da responsabilidade autoral sobre seu
conteúdo.
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