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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

Escola de Engenharia – Departamento de Engenharia Civil


ENG01201 – Mecânica Estrutural I
Profa Vanessa Fátima Pasa Dutra

Material de Apoio

4. Comportamento dos Materiais

A partir da definição das componentes de tensão e deformação em um ponto de um dado


material, podemos estabelecer relações entre elas. Estas relações são conhecidas como relações
tensão-deformação ou relações constitutivas, onde constantes associadas a determinadas
propriedades físicas do material são utilizadas. Na presente explanação serão desenvolvidas
relações válidas apenas para materiais elásticos lineares, isotrópicos e homogêneos.

4.7 Lei de Hooke Generalizada

Considerando que um dado material esteja sujeito a um estado de tensões triaxial x, y e z
em determinado ponto, veremos que nesta posição desenvolvem-se as deformações normais
correspondentes x, y e z. Para estabelecermos relações entre estas componentes de tensão e
deformação podemos empregar o Princípio da Superposição (válido para pequenas
deformações) conjuntamente à aplicação da Lei de Hooke e do coeficiente de Poisson. O
procedimento é ilustrado na Figura 15, onde são obtidas deformações normais na direção x em
um elemento cúbico a partir da aplicação das tensões normais x, y e z separadamente.

Figura 15. Estado de tensão triaxial e suas deformações.

Quando x é aplicada, o elemento alonga-se na direção x e a deformação correspondente pode


ser obtida pela Lei de Hooke, isto é:
x
x =
E
E e  são, respectivamente, o módulo de elasticidade e o coeficiente de Poisson do material.
A aplicação de y provoca uma contração no elemento na direção x, com deformação dada pela
Lei de Hooke e coeficiente de Poisson, como mostrado abaixo:
y
x = − y  x = −
E
De maneira semelhante, a partir da aplicação de z, obtém-se pela Leis de Hooke e o coeficiente
de Poisson a seguinte deformação na direção x:

1
z

x = − z  
x = −
E
Ao superpor as três deformações normais calculadas acima, obtém-se a deformação normal x
para o estado de tensões triaxial atuando no elemento. Repetindo o procedimento para as
direções y e z, obtêm-se as seguintes relações:

 x −  (  y + z )  ,  z −  (  x +  y ) 
1 1 1
x = y = y −  ( x + z ) e z =
E  E E 
As equações acima expressam a forma geral da Lei de Hooke para um estado de tensão triaxial,
sendo válidas somente quando o Princípio da Superposição de Efeitos é válido. Para isso, o
material deve ter comportamento elástico linear com pequenas deformações. Como o material
é considerado isotrópico, o elemento ilustrado na figura acima permanece um bloco retangular
quando submetido a tensões normais, ou seja, não apresenta deformações por cisalhamento.
Por convenção, considera-se que as tensões normais são positivas em tração e negativas em
compressão. As deformações normais são tomadas como positivas quando provocam
alongamento do material e negativas quando geram contração.
Se aplicarmos agora uma tensão de cisalhamento xy no elemento, observa-se que o material se
deforma apresentando somente deformação por cisalhamento xy. Da mesma forma, yz e xz
produzem apenas deformações por cisalhamento yz e xz, respectivamente. Assim, pela Lei de
Hooke para tensão de cisalhamento e deformação por cisalhamento, obtêm-se as seguintes
relações:
1 1 1
 xy = xy ,  yz = yz e  xz = xz
G G G
onde G é o módulo de corte ou cisalhamento, apresentando a seguinte relação com o módulo
de elasticidade E:
E
G=
2.(1+)

Figura 16. Tensões e deformações por cisalhamento.

As relações tensão-deformação desenvolvidas acima podem ser apresentadas de uma maneira


compacta usando a forma matricial mostrada abaixo:

2
 1 − − 
 0 00
 x   E E E
  x 
    − −  
0 0 0   y 
1
 y E E E 
  z     z 
  =  − − 1
0 0 0   
  xy   E E E   xy 
  yz   0 0 0 G 0 0    yz 
    
  xz   0 0 0 0 G 0   xz 
 0 0 0 G 
 0 0

Quando um material elástico é submetido a tensão normal, há alteração em seu volume. Para
demonstrar este efeito, vamos considerar um elemento de volume (Figura 17 a) submetido às
tensões principais x, y e z, como mostrado na Figura 17 b. O elemento tem originalmente as
dimensões dx, dy e dz (volume igual a dV=dx.dy.dz) (Figura 17 a), sendo que após a aplicação
das tensões elas se tornam (1 + x).dx, (1 + y).dy e (1 + z).dz (Figura 17 b), respectivamente.
A mudança de volume é então determinada por:
V = (1 +  x ).(1 +  y ).(1 +  z ).dx.dy.dz − dx.dy.dz

(a) (b) (c)


Figura 17.

Desprezando os produtos de deformação (termos desconsiderados por serem muito pequenos),


temos que:
V = ( x +  y +  z ).dx.dy.dz

A deformação volumétrica, também conhecida por dilatação, é definida por:


V
e= = x +  y + z
dV
As deformações por cisalhamento, por outro lado, não alteram o volume do elemento, mas
apenas seu formato retangular.
Ao usarmos a Lei de Hooke generalizada, podemos escrever a dilatação em termos das tensões
aplicadas, isto é:
− 
e= (x + y + z )
E

3
Quando um elemento de volume do material é submetido a uma pressão uniforme p (Figura 17
c), a pressão é a mesma em todas as direções e é sempre normal em qualquer superfície sobre
a qual atua. Este estado é conhecido como hidrostático, onde as tensões normais são iguais em
todas as direções e, portanto, um elemento do material estará sujeito neste caso a tensões
principais x = y = z = - p. Substituindo este resultado na equação que define a deformação
volumétrica, obtém-se:
p E E
=− , K=
e (− ) (− )
onde o termo à direita da equação acima é conhecido como Módulo de Compressibilidade K.
Para um material incompressível, seu valor teórico é infinito, o que se obtém quando  = 0,5.

4.7.1 Estado plano de tensões

Imagine uma placa fina de material elástico linear, contida no plano xy, submetida somente à
ação de forças contidas no plano da placa. Devido à ausência de carregamento, nas faces da
placa a tensão normal z é nula. Além disso, em razão da pequena espessura da placa, pode-se
considerar que z não varia consideravelmente ao longo da espessura, de modo que pode ser
tomada como nula em toda a placa. Da mesma forma, as componentes de tensão tangencial na
direção z, xz e yz, são nulas. Assim, aplicando estes resultados à Lei de Hooke generalizada,
obtêm-se as seguintes relações:
1 1 − 1
x = x − .y  ,  y = y − x  , z = x + y  e  xy = xy
E E E  G
ou, de forma inversa:
E E
x =  +  y  ,  y =
  x
 y + . x  ,  z = 0 e  xy = G. xy
(1 −  ) (1 −   ) 

4.7.2 Estado plano de deformações

Considera-se agora um corpo com uma das dimensões muito maior que as demais. O
carregamento atuante se dá de forma igual em todas as seções ao longo desta maior dimensão,
com as cargas contidas no plano das seções. Como o comprimento de uma das dimensões é
muito maior que o comprimento das demais, ocorre constrição lateral, onde as seções vizinhas
a uma dada seção impedem sua deformação na direção da maior dimensão. Considerando esta
maior dimensão na direção z, pode-se assumir que z = 0 (em regiões afastadas das extremidades
do corpo). Aplicando estas observações à Lei de Hooke generalizada, obtém-se:

x . (−   ) − .y (+  ) ,  y =  y . (−   ) − . x (+  ) ,  z = 0 e  xy = xy


1 1 1
x =    
E E G
ou, de forma inversa:
E  (− )   E  (− )  
x =  x  + y .  , y =  y  + x . ,  z = ( x +  y )
(1 − )  (+ ) (+ )  (1 − )  (+ ) (+ ) 
 xy = G. xy

Em estado plano de deformações, uma das tensões principais corresponde à direção normal ao
plano de deformações, sendo que as duas tensões principais restantes são determinadas em um
plano transversal a essa direção. Assim, em estado plano de tensões uma das tensões principais

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é nula, enquanto que no estado plano de deformações, esta tensão deve ser calculada pela lei de
Hooke generalizada, ou seja:
 =  (  +  )
onde  é o coeficiente de Poisson e as tensões principais são indicadas por apóstrofos.
As possíveis configurações de círculos de Mohr para o estado plano de deformações são
mostradas abaixo.

Figura 18. Círculos de Mohr para o estado plano de deformações.

4.8 Exemplos

Exemplo 1:
Dado o sólido abaixo, calcular as deformações totais e os respectivos
alongamentos/contrações nas direções x, y e z.

Pela convenção de sinais adotada em estados tridimensionais de tensão, obtém-se que:


 x = 20MPa;  y = 15 MPa;  z = −40 MPa

Aplicando a Lei de Hooke Generalizada, resulta:

 x −  (  y + z )  =
1 1
x =  −   (15 − 40 ) 
E   2x105 
 x = 1,375x10−4
1 1
y =  y −  ( x + z )  =  −   ( 20 − 40 ) 
E 2x105 
 y = 1, 05x10−4

5
 z −  (  x +  y )  =
1 1
z = − −   ( 20 + 15) 
E   2x105 
 z = −2,525x10−4
Considerando que as tensões são constantes ao longo de cada direção, os
alongamentos/contrações são obtidos por:
L x =  x .L x = 1,375x10−4 .20 = 0, 00275cm
L y =  y .L y = 1, 05x10−4 .30 = 0, 00315cm
L z =  z .L z = −2,525x10−4 .15 = −0, 00378cm

Exemplo 2:
O sólido abaixo está confinado entre dois suportes indeslocáveis, e após a sua montagem
nos suportes sofre uma variação de temperatura de +50ºC. Calcular as deformações totais
nas direções x e z e a tensão na direção y.

Se o corpo não estivesse confinado, o aumento de temperatura provocaria as seguintes


deformações específicas:
 x =  y =  z = T
 x =  y =  z = 0, 00005.50 = 0, 0025
Como o corpo está confinado na direção y, surgirá nesta direção uma tensão normal que causará
no corpo uma deformação específica de contração igual àquela da dilatação térmica, fazendo
com que não haja variação de dimensões na direção x, ou seja:
1
y =  y −  (  x +  z ) 
E
1
−0, 0025 =  − 0    y = −0, 0025.2x105 = −500 MPa
5  y
2x10
Devido à tensão que surge na direção confinada, haverá deformações nas direções transversais
por efeito Poisson, dadas por:
− y −0,3.(−500)
 x = z = = 5
= 8, 75x10−4
E 2x10
As deformações específicas totais serão a soma das resultantes da dilatação térmica e do efeito
Poisson:

6
 x =   +  x10−4 = 0, 003375
 z =  x = 0, 003375
Finalmente, os alongamentos são obtidos por:
L x =  x .L x = 0, 003375.20 = 0, 0675cm
L z =  z .L z = 0, 003375.10 = 0, 03375cm

Exemplo 3:
Um corpo prismático foi inserido em um orifício perfeitamente ajustado em um sólido
indeformável e submetido a uma tensão de compressão de 30 MPa e uma variação de
temperatura de +10ºC. Calcular a deformação total do corpo na direção z e as tensões nas
direções x e y. Considere: E = 200.000 MPa;  = 0,4;  = 2x10-5 ºC-1.

Considerando que o material permanecerá dentro do regime elástico linear, a solução pode ser
obtida tomando-se separadamente os efeitos da tensão aplicada e da temperatura.
A deformação específica em função da variação da temperatura é dada por:
 x =  y =  z = T
 x =  y =  z = 2x10−5.10 = 0, 0002
Como o corpo está confinado nas direções x e y, surgirão nestas direções tensões normais de
compressão que causarão no corpo deformações específicas de contração iguais àquelas da
dilatação térmica, fazendo com que não haja variação de dimensões nas direções x e y. Como
só está sendo considerado o efeito da temperatura, z = 0. Assim, temos:

 x −  (  y +  z ) 
1
x =
E 
1
−0, 0002 =  x −   y 
2x105 
1
y =  y −  (  x +  z ) 
E
1
−0, 0002 =  y −   x 
2x105 
Resolvendo um sistema formado pelas duas equações acima, obtém-se:
 x =  y = −66, 7 MPa

A deformação correspondente à ação da temperatura na direção z é dada por:

7

z = z −  (  x +  y )  + 0, 0002
E 
− 
z = . ( −66, 7 − 66, 7 ) + 0, 0002
2x105
 z = 0, 000467
Considerando que o corpo está confinado nas direções x e y, as deformações específicas
correspondentes à tensão aplicada são nulas. Logo:

 x −  (  y +  z ) 
1
x =
E 

 x −   (  y − 30 ) 
1
0=
2x105  

1
y =  y −  (  x +  z ) 
E
1
0=  y −   (  x − 30 ) 
2x105 
Resolvendo o sistema formado pelas duas equações acima, obtém-se:
 x =  y = −20 MPa

A deformação correspondente à ação da tensão aplicada na direção z é dada por:



z =  z −  (  x +  y ) 
E 

z = .  − −   ( −20 − 30 ) 
2x105 
 z = −0, 00007
Considerando ambos os efeitos simultaneamente:
x =  y = −20 − 66, 7 = −86, 7 MPa
z = − MPa
Finalmente, os alongamentos/contrações são dados por:
L x = L y = 0
Lz =  z .Lz = ( 0, 000467 − 0, 00007 ) .50 = 0, 01985cm

Bibliografia

Mecânica dos materiais. 5. ed. Beer, Ferdinand Pierre e Johnston, E. Russell, Jr. Porto Alegre:
AMGH, 2011.
Mecânica dos materiais. Gere, James M. São Paulo : Cengage Learning, 2010.
Resistência dos materiais. 7. ed. Hibbeler, Russell Charles São Paulo: Pearson Education, 2010.
Resistência dos materiais 4. ed. Beer, Ferdinand Pierre, Johnston, E. Russell, Jr. e DeWolf, John
T. São Paulo : McGraw-Hill, 2006.
Introdução à Mecânica Estrutural, Masuero, João Ricardo e Creus, Guillermo Juan, Ed. da
Universidade.

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