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13 de Fevereiro de 2022

Comentários à Lei de Contravenções Penais- Parte Geral

Decreto n. 3.688/41

Conceito de Contravenção Penal

O art. 1º doDecreto Lei 3.914/41 (Lei de Introdução do Código Penal e da


Lei das Contravencoes Penais) trás o conceito de contravenção penal:

Art 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena


de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa
ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a
infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de
prisão simples ou de multa, ou ambas. Alternativa ou
cumulativamente.

De acordo com a supracitada norma, nota-se que o legislador criou o gênero


INFRAÇÃO PENAL, o qual possui duas espécies: CRIME e
CONTRAVENÇÃO PENAL.

A Contravenção Penal é a espécie de infração penal a que a lei comina


apenas prisão simples, apenas multa, prisão simples ou multa
(alternativamente) ou ambas simultaneamente. Observe que em relação ao
crime jamais há pena isolada de multa.
A doutrina entende que o Decreto n. 3.688/41 foi recepcionado pela
Constituição Federal de 1988 como lei ordinária, satisfazendo, desse modo,
o Princípio da Legalidade, segundo o qual “não há crime sem LEI anterior
que o defina, nem pena sem prévia cominação LEGAL” (CF/88, Art. 5ª,
XXXIX).

É necessário fazer uma interpretação extensiva do Art. 5, XXXIX da CF/88,


no sentido de que o princípio da legalidade também alcança as
contravenções penais: não há CRIME e nem CONTRAVENÇÃO PENAL
sem LEI anterior que o defina; ou: não há INFRAÇÃO PENAL sem lei
anterior que a defina.

Observações pertinentes:

- Não há crime de receptação se o objeto material for produto de


contravenção penal:

Receptação

Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em


proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de CRIME,
ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou
oculte: (…)

Veja que o delito de receptação só ocorre na hipótese em que o objeto


material for produto de CRIME.

- Há denunciação caluniosa na imputação de prática de contravenção:


Denunciação caluniosa

Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de


processo judicial, instauração de investigação administrativa,
inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra
alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

(...)

§ 2º - A pena é diminuída de metade, se a imputação é de


prática de contravenção.

Todavia, a pena é diminuída de metade.

- Por expressa previsão legal, aquele que comunica a ocorrência tanto de


crime como de contravenção penal, provocando a ação de autoridade,
comete a infração descrita na norma do art. 340 do Código Penal:

Comunicação falsa de crime ou de contravenção

Art. 340 - Provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a


ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter
verificado:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

- Não se decreta prisão preventiva em face de contravenção penal, conforme


se extrai da leitura dos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal:

Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia


da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da
instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal,
quando houver prova da existência do CRIME e indício suficiente
de autoria.
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a
decretação da prisão preventiva:

I - nos CRIMES dolosos punidos com pena privativa de liberdade


máxima superior a 4 (quatro) anos;

II - se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença


transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput
do art. 64 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal;

III - se o CRIME envolver violência doméstica e familiar contra a


mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com
deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de
urgência;

(…)

-As contravenções penais são infrações de menor potencial ofensivo,


conforme disposto no art. 61 da Lei n. 9.099/95:

Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor


potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as
contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena
máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com
multa.

- De acordo com entendimento dos tribunais superiores, aos crimes e


contravenções penais sujeitos à Lei Maria da Penha não se aplicam os
institutos despenalizadores da Lei n. 9.099/95.

Competência para processar e julgar as contravenções penais:

Em consonância com a Súmula 38 do STJ, compete à Justiça Estadual


processar e julgar as contravenções penais:
Súmula 38 - Compete a Justiça Estadual Comum, na vigência da
Constituição de 1988, o processo por contravenção penal, ainda
que praticada em detrimento de bens, serviços ou interesse da
União ou de suas entidades.

Por força do 109, IV, da CF/88, as contravenções não tramitam na Justiça


Federal, em regra:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em


detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas
entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as
contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e
da Justiça Eleitoral;

As regras processuais de conexão e continência cedem lugar para a


disposição constitucional do art. 109, IV, de modo que mesmo se houver
conexão entre crime de competência da Justiça Federal e contravenção
penal, esta será processada na Justiça Estadual.

CUIDADO (exceção à regra): E se o autor da contravenção penal for um


Juiz Federal? Será julgado pelo TRF, porque possui foro por prerrogativa de
função (a competência funcional se sobrepõe à competência material).

Divergência entre Lei das Contravencoes Penais e Código Penal:

Diz o art. 1º da Lei das Contravencoes penais:

Art. 1º Aplicam-se às contravenções as regras gerais do Código


Penal, sempre que a presente lei não disponha de modo diverso.

Assim, diante de divergência entre Lei de Contravencoes Penais e Código


Penal, aplica-se aquela (Princípio da Especialidade). É o que ocorre ao
compararmos o art. 4º da LCP (Não é punível a tentativa de contravenção)
com o art. 14, II, parágrafo único do CP (Salvo disposição em contrário,
pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado,
diminuída de um a dois terços). Logo, a tentativa de contravenção não é
punível.

Lei das contravencoes penais no espaço:

Ao contrário do que acontece com os crimes (art. 7º do CP), não há


extraterritorialidade da Lei de Contravencoes Penais, sendo ela aplicável
somente quando a infração penal for praticada em território nacional. Veja
o art. 2ª da LCP:

Art. 2º A lei brasileira só é aplicável à contravenção praticada no


território nacional.

Vale frisar que não é possível extradição de estrangeiro por contravenção,


conforme se extrai do art. 77 do Estatuto do

Art. 77. Não se concederá a extradição quando:

II - o fato que motivar o pedido não for considerado crime no


Brasil ou no Estado requerente;

Reincidência:

A reincidência relacionada às contravenções penais deve ser analisada por


meio das normas pertinentes previstas no CP e do art. 7º da LCP, senão
veja:

Art. 7º Verifica-se a reincidência quando o agente pratica uma


contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha
condenado, no Brasil ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou,
no Brasil, por motivo de contravenção.

Não há reincidência quando o agente comete crime após ser condenado


definitivamente por contravenção penal e nem quando pratica
contravenção após ser condenado no estrangeiro por essa espécie de
infração penal.

Erro de direito:

Prevê o art. 8º da LCP que o erro de direito, quando escusável, leva ao


perdão judicial:

Art. 8º No caso de ignorância ou de errada compreensão da lei,


quando escusáveis, a pena pode deixar de ser aplicada.

Note que a norma estabelece duas espécies de erro de direito: ignorância da


lei e errada compreensão da lei.

A Ignorantia legis compreende o desconhecimento da existência da lei. O


art. 21 do CP aduz que o desconhecimento da lei é inescusável, sendo
tratado como mera atenuante prevista no art. 65, II, do CP. A disposição da
LCP deve ser aplicada em virtude do princípio da especialidade, além do
que é mais benéfica, vez que gera o perdão judicial.

Quanto à errada compreensão da lei, o art. 8º da LCP estaria tacitamente


revogado pelo art. 21 do CP, que permite a isenção de pena, em caso de erro
escusável.

Características da prisão simples:

Prevê o art. 6º da LCP:

Art. 6º A pena de prisão simples deve ser cumprida, sem rigor


penitenciário, em estabelecimento especial ou seção especial de
prisão comum, em regime semi-aberto ou aberto.

§ 1º O condenado a pena de prisão simples fica sempre separado


dos condenados a pena de reclusão ou de detenção.

§ 2º O trabalho é facultativo, se a pena aplicada, não excede a


quinze dias.
Desse modo, são características da prisão simples:

- cumprimento da pena em regime aberto ou semi-aberto (é vedada a


imposição de regime fechado, ressalvada a hipótese de transferência (art.
33 do CP);

- sem rigor penitenciário;

- estabelecimento prisional especial ou seção especial de prisão comum;

- separação obrigatória dos presos condenados em reclusão ou detenção;

- no caso de prisão de até 15 dias o trabalho é facultativo.

A duração máxima da prisão simples é de 5 anos:

Art. 10. A duração da pena de prisão simples não pode, em caso


algum, ser superior a cinco anos, nem a importância das multas
ultrapassar cinquenta contos.

Substituição das penas:

Tanto a doutrina quanto a jurisprudência entendem que é cabível a


aplicação do art. 44 e seguintes do CP para substituir a pena privativa de
liberdade por restritivas de direito e/ou multa em caso de condenação em
contravenção penal.

Livramento condicional e sursis:

A lei em comento não elenca os requisitos para a concessão do sursis e


livramento condicional, remetendo o art. 11 às condições legais do CP e
LEP. Destaca-se que o tempo de cumprimento do sursis da contravenção é
menor do que o do sursis do crime:
Art. 11. Desde que reunidas as condições legais, o juiz pode
suspender por tempo não inferior a um ano nem superior a três, a
execução da pena de prisão simples, bem como conceder
livramento condicional.

Medida de segurança de internação:

O prazo mínimo da medida de segurança de internação é de seis meses. O


juiz pode aplicar a substituição da medida de segurança por liberdade
vigiada. É o que reza o art. 16 da supracitada lei:

Art. 16. O prazo mínimo de duração da internação em manicômio


judiciário ou em casa de custódia e tratamento é de seis meses.

Parágrafo único. O juiz, entretanto, pode, ao invés de decretar a


internação, submeter o indivíduo a liberdade vigiada.

Ação penal:

As infrações penais de contravenção se processam mediante ação penal


incondicionada, conforme art. 17:

Art. 17. A ação penal é pública, devendo a autoridade proceder de


ofício.

Dispositivos revogados:

Afirma a doutrina que os artigos 13, 14 e 15 foram revogados, pois com a


reforma de 1984 o sistema duplo binário deu lugar ao sistema vicariante, ou
seja, não é mais possível a cumulação de medida de segurança com pena.

O art. 9º aduz que a multa converte-se em prisão simples, de acordo com o


que dispõe o Código Penal sobre a conversão de multa em detenção. A
doutrina entende que essa norma foi revogado pelo art. 51 do CP, o qual
postula que a pena de multa será considerada dívida de valor, de modo que,
se inadimplida, deve ser executada na vara de fazenda pública, não gerando
prisão.

Disponível em: https://wesleycaetano.jusbrasil.com.br/artigos/417273867/comentarios-a-lei-de-


contravencoes-penais-parte-geral

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