Fundação 16 de setembro de 1931
Registro 1936
Dissolução maio de 1938
Luta pelo direitos civis dos negros
Ideologia
Ultranacionalismo
Espectro político Extrema-direita[1]
Publicação A Voz da Raça
País Brasil
Sociedade Negra Princesa Isabel
Outros nomes
União Negra Brasileira
Cores Preto
Política do Brasil
Partidos políticos
Eleições
Índice
• 1 História
• 1.1 Origens e estrutura
• 1.2 Programa
• 2 Legado
• 3 Ver também
• 4 Referências
História
Ver artigo principal: Movimento negro no Brasil
Origens e estrutura
A Frente surgiu como decorrência da efervescência que se manifestava na comunidade
negra no início do século XX. Em vários pontos do Brasil foram sendo fundados clubes e
associações que procuravam fortalecer os laços da comunidade através de atividades
sociais, recreativas e educativas. Era claro neste período que apesar dos negros terem
obtido a libertação da escravatura em 1888, o racismo e a discriminação ainda eram
onipresentes e a conquista da cidadania plena ainda estava por ser construída. Diversos
jornais também vinham sendo fundados, divulgado debates e temas de interesse para os
negros, ao mesmo tempo em que eram abertas escolas para melhorar sua educação.
Nesta primeira fase procurava-se a integração na sociedade sem questionar
profundamente sua estrutura discriminatória, sendo consideradas prioritárias a ênfase no
trabalho e o aprimoramento da educação, da moral e da disciplina, como meio do negro
ganhar respeitabilidade entre os brancos e habilitá-lo para a vida profissional. Até 1930
mais de 80 associações e clubes negros funcionaram na cidade de São Paulo, sem
entretanto fomentarem o desenvolvimento de uma consciência política forte, e tampouco
as organizações de base e os partidos políticos brancos levavam em conta as demandas
da população negra. Essa situação começou a mudar com a fundação do jornal O Clarim
da Alvorada em 1924 e do Centro Cívico Palmares em 1926, que colocaram a política no
centro dos debates.[2]
Em vista do abandono ao qual os negros estavam relegados pelo sistema político e social
vigente, um grupo de negros fundou em 16 de setembro de 1931 a Frente Negra
Brasileira. Seu aparecimento foi de certa forma a culminância de um projeto de
construção de uma associação que aglutinasse a movimentação que já acontecia nas
irmandades religiosas, na imprensa negra e nas associações culturais e recreativas dos
períodos anteriores, onde já se começava a debater os problemas gerados pela
discriminação e se pensava em alternativas para melhorar a vida da população afro-
brasileira.[3] Seus fundadores foram Alberto Orlando, Francisco da Costa Santos, David
Soares, Horácio Arruda, Vitor de Sousa, João Francisco de Araújo, Alfredo Eugênio da
Silva, Oscar de Barros Leite, Roque Antônio dos Santos, Gervásio de Morais, Cantídio
Alexandre, José Benedito Ferraz, Leopoldo de Oliveira, Jorge Rafael, Constantino
Nóbrega, Lindolfo Claudino, Ari Cananéa da Silva, Messias Marques do Nascimento, Raul
Joviano do Amaral e Justiniano Costa.[4] Logo aderiram outros membros, entre
eles Arlindo Veiga dos Santos, José Correia Leite, Salathiel Campos, Isaltino Veiga dos
Santos, Jayme de Aguiar e Abdias do Nascimento.[4][3]
chegou a ser uma unanimidade dentro da organização, sendo com efeito uma frente
ideológica ampla e heterogênea, com muitos membros partidários da esquerda, o que
mais tarde produziria disputas e uma cisão interna.[4][8][9] Também havia a penetração
de uma significativa influência católica.[4] A Frente ainda criticava o projeto imigrantista
desenvolvido pelo governo desde o século XIX, acusando os imigrantes de roubarem o
trabalho dos negros, e tendia a rechaçar as tendências de esquerda porque via
o capitalismo como um dos instrumentos para a ascensão social e econômica do negro.[9]
Para algumas das principais lideranças da frente, em particular Arlindo Veiga dos Santos,
a "elevação" e integração do negro na sociedade em pé de igualdade com os brancos
passavam primeiro pela sua educação e modernização e pelo cumprimento de seus
deveres cívicos, articulando um projeto não apenas antirracista, mas acima de tudo
civilizatório,[10] onde não estavam ausentes traços das teorias eugênicas de
aperfeiçoamento racial, muito populares na época.[11] Os meios autoritários e
disciplinatórios imaginados pelas lideranças para alcançar esses objetivos eram prática
comum e marcante em todas as correntes políticas de então, mas ainda é obscuro até
que ponto essa ideologia era abraçada pela massa dos associados ou se era apenas
produto dos dirigentes. Segundo Rodrigo de Almeida, "a doutrina de Veiga e dos estatutos
da FNB são assim, de algum modo, condicionados pela doutrina maior dos anos 1930,
que é o autoritarismo como instrumento de construção do moderno. [...] Mais importante
do que o reconhecimento das raízes históricas e culturais do povo preto, era sua
incorporação na ordem brasileira moderna".[10] Para Silva & Toledo, "a perspectiva
frentenegrina e sua atuação não foram de ruptura, pelo contrário, foram de aproximação e
de certa forma, de sujeição e aceitação de padrões impostos pela moderna sociedade
industrial e burguesa. Sua postura era de contestação, mas sua proposta era de
assimilação".[12] Naquele período, segundo Márcio Macedo, ainda não emergira a questão
do resgate da memória africana como elemento fortalecedor da identidade negra, que só
seria desenvolvida mais tarde.[13]
Em sua luta pelos direitos dos negros, acabava por utilizar argumentos discriminadores
contra a própria comunidade, entendendo que a massa dos negros ainda não era
civilizada, e para emancipar-se precisava abandonar hábitos negativos e depreciativos,
como o alcoolismo e a ociosidade, e adotar valores que eram atribuídos aos brancos bem
sucedidos. Em muitos artigos do Voz da Raça se fazia menção a diferenças entre os
negros. Aqueles que não adotassem os valores positivos apregoados eram considerados
inimigos da raça e do movimento. Como disse Hildeberto Martins, "seguir certo padrão
(moral) de conduta era o caminho viável para que isso [a integração] acontecesse, e por
isso não beber tanto, alisar o cabelo, seguir a doutrina cristã e estar devidamente trajado
seriam exemplos da aceitação e inserção nesse processo civilizatório, calcado nos
moldes de um padrão social esperado e desejável (burguês e branco)".[14] Um artigo de
Isaltino Veiga dos Santos no jornal da entidade e dirigido "aos negros de boa vontade",
dizia:
"[...] ou o negro brasileiro se define de uma vez por todas como gente séria, de
caráter, nobre, morigerada, capaz de sacrifícios pela coletividade, capaz de
compreender as grandes causas que sacodem a Pátria Brasileira e a
humanidade toda, — ou deve ser varrido e aniquilado como gente perniciosa,
incapaz de compreensão, incapaz de se premunir contra exploradores imorais,
contra pescadores de águas turvas, contra os inimigos do próprio Negro e da
Nacionalidade".[15]
Em que pese o seu desejo de integração pacífica numa sociedade onde negros e brancos
convivessem com respeito mútuo e colaborassem juntos para o engrandecimento da
Pátria, recusando o modelo segregacionista baseado no ódio adotado nos Estados
Unidos, a Frente percebia com clareza que o racismo não deixara de existir e que era
uma falácia a teoria da democracia racial então desenvolvida em várias instâncias da
oficialidade, combatendo também as teorias de racismo científico que procuravam
justificar as diferenças de progresso entre os diferentes grupos étnicos.[9]
A Frente conquistou respeito dentro da comunidade negra, na sociedade paulista e até
mesmo entre a polícia,[8] expandindo-se para diversos estados, num momento de crise
econômica e de transformações políticas em que muitas lideranças negras do país
percebiam a importância de politizar a questão racial.[3] A FNB possuía dezenas de filiais
ou grupos homônimos criados à sua inspiração, nos estados de Minas Gerais, Espírito
Santo, Bahia, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Pernambuco.[16] A estimativa do
número de afiliados que a Frente teve é muito incerta, variando de 8 a 100 mil membros,
conforme a fonte.[13][9]
Nas palavras de Abdias do Nascimento:
Conflitos e dissolução
A Frente sofreu cisões importantes já no início do seu funcionamento. Assim que foi
fundada, surgiu uma forte divergência entre o grupo majoritário de Arlindo Veiga dos
Santos e um grupo menor sob a liderança de José Correia Leite, o qual mantinha o
jornal O Clarim da Alvorada. O grupo de Correia Leite criticava a orientação fascista e
autoritária que o outro queria impor à entidade, foi impedido de participar da votação dos
estatutos e afastou-se, sustentando uma ácida campanha contra Arlindo através do seu
jornal.[4][18][6] Segundo Abdias do Nascimento, enquanto Arlindo, que atuava em São
Paulo, liderava o Movimento Patrianovista, movimento nacionalista, tradicionalista,
católico e monarquista alinhado à Ação Integralista Brasileira e recrutava membros que
em sua predominância eram funcionários públicos, empregados domésticos e
trabalhadores do setor de serviços, Correia Leite, que atuava em Santos, se filiava ao
pensamento socialista e recrutava membros que eram predominantemente trabalhadores
do Porto de Santos.[17] Em 1932 O Clarim foi empastelado por membros da Frente e
deixou de circular.[19] Assim, Correia Leite, junto com José de Assis Barbosa e outros
ativistas, acabou fundando em São Paulo o Clube Negro de Cultura Social como uma
oposição à Frente.[20]
Ainda em 1932, por ocasião da Revolução Constitucionalista, movimento paulista que
exigia a deposição de Getúlio, a Frente recebeu a visita do interventor de São Paulo
solicitando que se juntasse aos revoltosos, mas seus dirigentes apoiavam Getúlio e ela
permaneceu oficialmente neutra. No entanto, deu liberdade a seus associados para que
agissem conforme suas consciências. Neste período a Frente praticamente paralisou
suas atividades. Descontente, um grupo liderado por Joaquim Guaraná Santana e Gastão
Gourlart se prontificou para lutar na revolução, juntando–se à Legião Negra, que
conseguiu reunir cerca de dois mil combatentes.[21][13]
Outra dissidência surgiu em 1933, quando um grupo, onde estava Guaraná Santana,
discordando da orientação direitista de Arlindo e seu irmão Isaltino, deixou a Frente para
criar a Frente Negra Socialista, que rapidamente atraiu milhares de membros em várias
cidades. Isso gerou uma nova crise e enfraqueceu a posição dos irmãos Veiga dos
Santos. No mesmo ano Isaltino acabou expulso, acusado de comportamento indecoroso.
[22]
Referências
1. ↑ «A Frente Negra Brasileira». Geledés. 14 de dezembro de 2017. Consultado15.↑ Apud Martins, op. cit.
em 9 de junho de 2021
16.↑ Domingues, Petrônio. "Movimento negro brasileiro: alguns
2. ↑ Ir para:a b c d e f Domingues, Petrônio. "Um 'templo de luz': Frente apontamentos históricos". In: Tempo, 2007; 12 (23)
Negra Brasileira (1931-1937) e a questão da educação". In: Revista
Brasileira de Educação, 2008; 13 (39)
17.↑ Ir para:a b Cavalcanti, Pedro Celso Uchôa & Ramos,
3. ↑ Ir para:a b c d e f g h Franco, Paulo Fernando Campbell. "A trajetória do Jovelino. Memórias do Exílio, Brasil 1964-19??. Editora e Livraria
movimento negro organizado e suas estratégias de superação do racismo Livramento, 1978, pp. 27-28
na sociedade brasileira (1931-2003)". In: Leopoldianum, 2019; 45 (125)
18.↑ Oliveira, Laiana, p. 85
4. ↑ Ir para:a b c d e f g h Malatian, Teresa. "Memória e contra-memória da
Frente Negra Brasileira". In: XXIX Simpósio Nacional de História da
ANPUH. Brasília, 2017
19.↑ Santos, Renan Rosa dos. "Pela integração negra: a trajetória do jornal
5. ↑ Braga, Walisson. «A Voz da Raça - A voz da população negra excluída O Clarim da Alvorada (1924-1932)". In: XXV Encontro Estadual de
pós-abolição». Fundação Cultural Palmares. Consultado em 9 de julho de História da ANPUH — História, desigualdades & diferenças. São Paulo,
2020 08-11/08/2020
13.↑ Ir para:a b c d e Machado, Leandro. "Frente Negra: a história do 27.↑ Barbosa, Márcio. "Frente Negra Brasileira: Gestando um projeto
movimento que apoiava o integralismo e foi pioneiro do ativismo negro no
político para o Brasil". Fundação Perseu Abramo, 10/11/2011
país". BBC Brasil, 13/06/2020
14.↑ Martins, Hildeberto Vieira. "Outros personagens entraram em cena: o28.↑ Pereira, Amilcar Araujo. "A educação eurocêntrica e o racismo no
movimento negro e a emergência de uma política racializada". In: Estudos Brasil republicano". Ciência Hoje, 20/11/2020
e Pesquisas em Psicologia, 2018; 18 (4): 1393-1414