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A estrutura da
escola.
A ESTRUTURA DA ESCOLA(*)
Antônio Cândido
II
Isto posto, trata-se de averiguar o modo por que se deve analisar a estrutura da
escola, a fim de completar o ângulo administrativo pelo sociológico. Já se viu,
pelo dito, a necessidade de estudar a escola como grupo social e sob esse
aspecto não saberíamos fazer melhor do que citar os conceitos seguintes de
ZNANIECKI: "Todas as .escolas são grupos sociais com uma composição
definida e pelo menos rudimentares de organização e estrutura. Sua existência
depende basicamente da atividade combinada dos seus membros- os que
ensinam e os que aprendem". ".... cada escola enquanto grupo social mantém
um certo grau de autonomia interna, uma ordem que lhe é específica, similar à
de muitas outras escolas, mas diferente da de outros tipos de grupos, urna vez
que os papéis de professores e alunos são essencialmente diferentes dos papéis
dos membros de quaisquer outros grupos, e que a organização e estrutura da
escola não podem ser incorporadas às de qualquer outro grupo"(1).
Por outro lado, a maioria das escolas são instituídas; regem-se por normas
estabelecidas segundo interesse de outros grupos, e, no caso do Brasil,
ajustadas necessariamente às normas básicas ditadas pelo Poder Público. São,
pois, o que ZNANIECKI chama "grupos institucionalizados", isto é, os que "são
essencialmente produto da cooperação dos seus próprios membros, mas cujas
funções coletivas, e posições, são parcialmente instituciona1izadas por outros
grupos sociais"(2).
Estes últimos grupos - religiosos, políticos, de classe, etc. - estabelecem para a
escola um sistema de normas, em vista de conformá-la às suas finalidades
próprias, lembrando-se sempre que, no Brasil, sobre todas estas normas pairam
as que foram traçadas pelo Legislador. É esta circunstância que leva a considerar
na escola apenas o que ela tem de delegação de preestabelecido e legalmente
sancionado pela sociedade em vista das funções que lhe atribui; e a considerá-
la, freqüentemente, apenas do ponto de vista administrativo, que concretiza
este estado de coisas.
Mas, se é um grupo estável, com localização, população, sistema de normas e
finalidade, deve forçosamente apresentar uma diferenciação interna,
apresentando segmentos dispostos de modo definitivo. Mais ainda: a sua
dinâmica interna dá lugar a formações específicas, mantidas por um sistema de
normas e valores também internamente desenvolvidos.
É verdade que esta diferenciação da escola depende em parte da estrutura
social externa, de tal forma que as diversas escolas de uma região, ou país,
apresentam similaridades não apenas na superordenação estabelecida pelos
grupos instituidores, mormente o Poder Público, mas na própria vida social
internamente desenvolvida. E, num plano mais profundo, todas as escolas de
uma determinada civilização. têm muito de comum na sua "sociabilidade
interna", devido às tendências comuns da sociabilidade infantil e juveni1.
É por esta, pois, que deve começar o estudo da estrutura social da escola.
Na verdade, é preciso adquirir noção adequada não apenas dos aspectos
psicológicos do problema, mas do seu significado sociológico. Não basta
estudar o desenvolvimento da sociabilidade, desde a formação do sentido do
real, até a aquisição de hábitos necessários à vida em sociedade; é preciso dar
atenção ao que há de especifico na sociabilidade da criança e do adolescente
em face do adulto; aos tipos de agrupamento por eles desenvolvidos; ao
mecanismo de seleção dos líderes; ao conflito com os padrões sociais impostos
pela educação, etc.
Os estudantes de Pedagogia não encontrarão nisto maior dificuldade, graças
aos seus estudos de Psicologia Educacional, onde terão sido encaminhados para
a hoje em dia vasta bibliografia do assunto. Os sociólogos costumam, nesta,
destacar os livros de PIAGET, GESELL e WALLON, mas sobretudo os recentes
estudos devidos à colaboração de antropólogos e psicólogos; ou a
antropólogos psicologicamente orientados; ou, ainda, a psicólogos interessados
em Antropologia. Citem-se no primeiro caso os trabalhos de Kardiner e seus
colaboradores; os de Margaret MEAD e Gregory BATESON, no segundo; os de
ERIKSON, no terceiro. Para o nosso curso, foi selecionado o livro de Ruth
Fröyland NIELSEN, Le Développement de la Sociabilité chez l'Enfant, - moderno,
prático, breve, claro e adequado aos interesses pedagógicos.
Neste terreno, o estudante deve preparar-se, sobretudo para considerar as
resultantes sociais da coexistência de adultos e imaturos. Aqueles exercem um
conjunto de pressões que atendem mais aos interesses da organização social
do que aos interesses destes, e estes reagem a seu modo, procurando dar
expressão à sua sociabilidade própria. Estabelece-se deste modo uma dupla
corrente de sociabilidade: a que envolve o ajustamento do imaturo aos padrões
do adulto, e a que exprime as suas necessidades e tendências. Na confluência
de ambas situa-se a prática pedagógica, tanto mais satisfatória quanto melhor
conseguir atenuar a tensão das duas correntes. Esta pode ser latente, limitando-
se à concorrência normal dos grupos de idade, e pode ser conflitual, levando ao
desenvolvimento de atitudes e normas socialmente reprovadas, que desviam da
organização social, como é o caso dos grupos de delinqüência infantil e juvenil.
Num sentido e noutro, influem, é claro, as condições do meio.
No caso da escola, considerando-se a presença duma superordenação racional
expressa na administração e no ensino, e de uma população imatura com
problemas específicos de ajustamento, torna-se evidente as relações entre
ambas dêem lugar a uma diversificação de relações, atitudes, comportamentos,
va1ores. Por outras palavras, a esco1a constitui um ambiente socia1 pecu1iar,
caracterizado pelas formas de tensão e acomodação entre administradores e
professores - representando os padrões cristalizados da sociedade - e os
imaturos, que deverão equacionar, na sua conduta, as exigências desta com as
da sua própria sociabilidade.
Um dos pontos mais interessantes da Psicologia Social e da Sociologia é a
determinação dos aspectos diferenciais da sociabilidade do educando conforme
o níve1 de idade. Foi o que nos levou a incluir nos seminários do curso o livro
de René FAU, les Groupes d'E´nfants et d´Adolescents, de grande interesse para
o educador, em vista do período total que a instrução abrange, - teoricamente
dos seis aos vinte e três anos. Quanto aos aspectos próprios à adolescência,
adotou-se o livro de G. M. FLEMING: Adolescence
Aquiridas as noções indispensáveis sobre a sociabilidade da infância e da
ado1escência, podemos encarar a análise da escola como agrupamento social
dotado de uma estrutura própria. Para tanto, figuremos um estabelecimento
que preencha as condições seguintes:
I. Formas de agrupamento
1. Grupos de idade
2. Grupos de sexo
3. Grupos associativos
4. Status
5. Grupos do ensino
2. Normas
a) que regem o comportamento do educador
b) que regem o comportamento do educando
3. Sanções
a) administrativas
b) pedagógicas
c) grupais
4. Símbolos
I. Formas de agrupamento:
Com efeito, toda a teoria e prática da "escola ativa" nas suas várias modalidades
implica o conhecimento e o reconhecimento da importância dos grupos
infantis, sobretudo os de jogo. A visão algo abstrata de um educando
idealmente isolado, com que Rousseau deu início, no Emílio, à grande revolução
da Pedagogia moderna, sucedeu, no decurso do século XIX, - graças talvez à
prática froebe1iana -, um sentido mais apurado da vida grupal da criança, que
veio encontrar em nossos dias a devida sistematização.
b) São intelectuais os agrupamentos constituídos em vista do aprendizado e
cultivo geral da inteligência. De tipo difuso, os grupos de colegas, que se unem
para repetir e esclarecer a matéria; de tipo organizado, os grêmios e academias.
Essas, com função que se poderia dizer para-escolar, ou de extensão escolar.
Aquelas, constituindo parte integrante do aprendizado e prolongando a
atividade da sala de aula, que deste modo penetra superfícies mais amplas da
inteligência e da sensibilidade, de vez que os alunos se agrupam aí segundo
afinidades mais estreitas, a fim de penetrar na matéria proposta em bloco à sua
turma escolar.
c) São cooperativos - à falta de melhor nome - os agrupamentos cujos
membros, voluntariamente associados, concorrem para uma finalidade comum,
que, sendo embora de benefício pessoal, é definida segundo o interesse geral
do grupo. Interesse que pode ser o prestígio, privilégio, prazer, subversão, mas
se subordina a princípios mais ou menos definidos de auxílio mútuo."
a) administrativas;
b) pedagógicas;
c) grupais.
III. Conclusão: