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FICHA DE LEITURA

Nome _________________________________________________________ Nº __________


OBRIGADA, MARISA MATIAS (POR TODOS E TAMBÉM POR MIM)
Porque em Portugal não falamos destas coisas, a entrevista da eurodeputada foi uma ajuda muito
importante para normalizar um assunto que toda a gente sabe que existe, em que somos todos muito bons a
falar “no geral”, mas fugimos a assumir quando nos toca de perto.
Calha este domingo ser o Dia Mundial da Saúde Mental. Houve uma cimeira mundial esta semana, em
que a ministra da Saúde lá se comprometeu, como fizeram os seus antecessores, a trabalhar para que a
doença mental não continue a ser o parente pobre do SNS.
Na realidade, o SNS reflete apenas o que a sociedade, no seu conjunto, nos diz: a doença mental é um
estigma profundo para quem a vive e para as pessoas próximas. Se já não vivemos no tempo em que ir ao
psiquiatra era uma coisa “para malucos”, a ansiedade, a depressão e outras doenças conexas discutem-se
baixinho, entre a família e os amigos íntimos. Se a doença física já comporta muitas vezes várias questões
estigmatizantes (há quem oculte doenças crónicas de empregadores, temendo consequências desagradáveis
ou o labéu da “fragilidade”), a doença mental é hoje ainda um tabu.
Por isso foi tão importante que Marisa Matias tenha contado ao Observador a sua história – o
esgotamento por que passou em 2019/2020, os ataques de ansiedade, os ataques de pânico, os sintomas
físicos que a fizeram pensar que estaria a sofrer de uma doença neurológica, o medo de sair à rua sozinha, a
decisão de ir ao psiquiatra para se tratar, a escolha de fazer terapia. Em Portugal, um país onde não se pode
falar de quase nada – pelo menos pessoas “sérias”, como políticos –, a entrevista de Marisa Matias é uma
pedrada no charco. Já havia o precedente de António Horta Osório, que tinha falado no seu esgotamento no
tempo em que trabalhava no Lloyd’s. Mas Horta Osório vivia em Inglaterra, onde se fala de quase tudo. (…)
Eu tive um esgotamento no Verão de 2019, que aconteceu paralelamente ao diagnóstico de uma
doença física grave. O esgotamento foi ultrapassado mais ou menos em dois meses, a doença física demorou
mais. Mas nem consigo precisar bem a altura em que tive o meu primeiro ataque de ansiedade – algures na
adolescência. Uma vez aconteceu-me um ataque fortíssimo de ansiedade no Parlamento, no dia em que se
discutia a amnistia aos presos das FP-25. Devia ter 24 anos e tinha feito uma direta a trabalhar.(…). Pedi à
Sãozinha – na altura secretária de António Guterres – que me arranjasse um |médico|. A Sãozinha mandou-
me deitar no sofá do gabinete de Guterres e apareceu um atencioso deputado do PS, que lá me acalmou. (…)
Fora de Portugal é comum falar-se destas doenças. O diretor da Atlantic, Scott Stossel, escreveu há
anos um ensaio, “Surviving anxiety”, incrivelmente interessante e que chega a ser cómico. Stossel também é
autor de um best-seller onde conta a sua história de lidar com ansiedade desde a juventude – My Age of
Anxiety: fear, hope, dread and search for peace of mind. Isabel Hardman, da direção da revista britânica
Spectator, esteve há algum tempo de baixa por depressão e também escreveu um livro sobre como a
natureza a ajudou a lidar com a doença: Natural Health Service.
Porque em Portugal não falamos destas coisas, a entrevista da eurodeputada foi uma ajuda muito
importante para normalizar um assunto que toda a gente sabe que existe, em que somos todos muito bons a
falar “no geral”, mas fugimos a assumir quando nos toca de perto. Na verdade, temos medo, o medo de
passar a ser olhado como alguém frágil, logo menos capaz, logo menos competente. Um dia, o estigma vai
acabar, mas amanhã não é a véspera desse dia.
Ana Sá Lopes, in Público em 10/10/21
1. A doença mental em Portugal, tendo em conta a leitura global o texto
A. É vista como um problema sem solução
B. Apesar da preocupação da população em geral, o SNS não dá a resposta adequada.
C. Não é tida como prioritária pela SNS e pela sociedade.
D. Não é tratada com os devidos procedimentos médicos.
2. O uso do advérbio lá no segundo parágrafo
A. Pode ser substituído por “entre aquela gente”.
B. Tem valor expletivo para dar um sentido irónico à frase.
C. Tem como referente um lugar já mencionado (naquele lugar).
D. Tem como referente um tempo já mencionado (naquele tempo).

3. O terceiro parágrafo, relativamente ao segundo parágrafo,


A. Apresenta uma contradição, fundamentando com exemplos.
B. Continua a ideia anterior e ilustra-a com exemplos.
C. Apresenta uma contradição, tendo em conta a realidade da autora.
D. Continua a ideia anterior e introduz uma ideia nova.

4. A afirmação «Se já não vivemos no tempo em que ir ao psiquiatra era uma coisa “para malucos” (…) a
doença mental é hoje ainda um tabu.» (terceiro parágrafo), sublinha a ideia de que houve
A. Um recuo significativo
B. Um avanço inconsequente
C. Um avanço lento e incompleto.
D. Total estagnação

5. Com a expressão «pedrada no charco» (quarto parágrafo), a autora do texto pretende dizer que a
entrevista de Marisa Matias
A. Caraterizou-se por ser agressiva.
B. Agitou as águas.
C. Foi polémica, causou discussão.
D. Foi “um murro no estômago”.

6. No quarto parágrafo a autora refere Horta Osório para


A. Mostrar a excecionalidade da atitude de Marisa Matias.
B. Dar um alerta para outras figuras que tiveram problemas de saúde mental.
C. Retirar o valor à entrevista de Marisa Matias.
D. Indicar um exemplo de alguém que viveu um problema de saúde mental.

7. De acordo com a globalidade do texto podemos dizer que


A. A saúde mental é apenas encarada com normalidade em Inglaterra.
B. Ao contrário de outros países, o nosso ainda não encara com normalidade os problemas de saúde mental.
C. A saúde mental é vista de igual modo nos diferentes países do mundo.
D. A saúde mental tem ações terapêuticas diferenciadas nos diferentes sistemas de saúde de cada país.

8. A última mensagem do texto


A. Reforça a ideia de ceticismo relativamente à existência de um tratamento eficaz para a doença mental.
B. Expressa total incredulidade nas mudanças de mentalidades relativamente ao modo como encaramos a
doença mental.
C. Expressa ceticismo a curto prazo no que diz respeito às alterações de mentalidades relativamente ao modo
como encaramos a doença mental.
D. Expressa otimismo numa alteração das mentalidades a curto prazo no que respeita aos tratamentos da
saúde mental.

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