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Lab.

Utopia

Laboratório para Geração de Novas Utopias: Ativismo digital comunitário como ferramenta
de efetivação de Direitos Sociais e criação de redes de comunicação no Litoral do Paraná

Uma experiência grafica sonora interventiva e associativa de reprodutibilidade artistica para


a transformação social em diversos niveis

Nome: André Essenfelder Borges

Formação profissional: Professor Assistente I da UFPR- Litoral


Titulação (graduação e pós-graduação): Historiador (UFPR), MSc. em Antropologia Social (UFSC)

e_mail: ibirae@gmail.com

Matinhos, 2020
Laboratório para Geração de Novas Utopias: Ativismo Digital Comunitário como
ferramenta de efetivação de Direitos Sociais e criação de redes de comunicação no Litoral do
Paraná

A base do projeto é fomentar, mediar e articular grupos autogestionários (equipes


multidisciplinares auto-organizáveis) que, a partir de uma formação técnica inicial, passem de
consumidores a produtores de multiplas mídias. Os esforços e produtos gerados compõe um banco
de dados que objetiva alimentar e possibilitar a implementação de redes comunicacionais de
diversos níveis e tipos. A construção de redes de comunicação se propõe como ferramenta reativa de
mobilização e integração entre a UFPR e a comunidade, entre os municípios da região costeira
paranaense e Vale do Ribeira na identificação e fortalecimento das identidades locais e regionais.
Redes essas propostas a disseminar repertórios diversificados, formas de expressão e modos de vida
a partir do monitoramento e idealização de políticas públicas, material didático auxiliar, bancos de
dados e outros projetos de pesquisa desenvolvidos por esses grupos autogestionáveis.
 Divulgar histórias, mitos, ciclos, costumes, músicas a partir de entrevistas, programas, jogos,
artes performaticas, multimídias, podcast e rádio novelas;
 Realizar debates e entrevistas, sobre questões sociais, culturais, ambientais e legais;
 Produzir material didático educacional em áudio, video, multimídias, arte mural e performances
a partir das realidades locais;
 Produzir e divulgar projetos e campanhas de interesse público ou social;
 Promover entretenimento, diversificação de repertório e visibilidade para as práticas locais.
 Promover a visibilidade para as populações locais e sociedade civil organizada como
associações comunitárias e movimentos sociais.

Lab.Utopia
Laboratório para Geração de Novas Utopias: Ativismo digital Comunitário como ferramenta
de efetivação de Direitos Sociais e criação de redes de comunicação no Litoral do Paraná

Uma experiência gráfica sonora interventiva e associativa de reprodutibilidade artistica para


a transformação social em diversos niveis

Lab. Utopia e a UFPR Litoral


Observando o contexto geográfico regional com quilômetros de estuários e baías conectadas,
de difícil acesso na maioria das vezes, e que mantêm comunidades relativamente isoladas, excluídas
dos meios de comunicação e dos próprios materiais didáticos que utilizam. O Laboratório estrutura
o contato com os municípios da região auxiliando a produção de material educacional-midiático
local, empoderando e tornando visíveis modos de vida diferenciados existentes na região.
Como item viabilizador do Projeto foi elaborado um método de aproximação e estreitamento
dos laços entre a universidade e as comunidades civis e escolares da região. Duas estratégias se
fazem de forma presencial com equipes que visam a ação concreta nas localidades. Para tanto, os
meios de inserção e coleta de materiais se deu a partir de outros projetos desenvolvidos no Setor.
Por terra, por mar, a cerca de dez anos, grupos de estudantes e pesquisadores tem se empenhado em
visitas constantes a vilarejos da região tendo objetivos diversos, desde a organização,
implementação, formação, observação e registro de professores da rede pública, moradores locais,
pescadores, associações, poder público, e responsáveis, em boa medida, pelo fomento, manutenção
e socialização de saberes e práticas sociais locais.
A partir dessas interações, o Lab. Utopia se concentra na produção de material educacional
com a co-criação, produção e distribuição dos processos desenvolvidos sobre, pelas e com as
comunidades da região. Material educacional esse, pensado de maneira ampla, trata-se de ações,
impressos, performances, áudio, vídeo e que apresentem e representem as pessoas da região em
contato permanente com a universidade.
A UFPR Litoral e seu Projeto Político-Pedagógico, teve sua gênese na proposta
fundada com a intencionalidade de representar mais do que a ampliação de vagas no
ensino superior, instalou um Projeto inovador em uma região geográfica desacreditada
historicamente e com uma grande debilidade econômica. Além de orientar seus
fundamentos por um diagnóstico da realidade sócio-econômica da região onde se
instalou, fortaleceu sua concepção ousada ao inspirar-se no processo histórico de
fundação da então Universidade do Paraná em 1912 (WACHOWICZ, 1983).
Em 1912, na cidade de Curitiba, lideranças de diferentes matizes ideológicas como
representantes da Igreja Católica, lideranças do grupo positivista e das elites tradicionais
da cidade, uniram-se em torno de um objetivo comum definido: a criação de uma
universidade para o Estado do Paraná, que viabilizasse a formação de seus jovens para
exercerem lideranças políticas com consciência de sua identidade regional. Naquela
época o Paraná enfrentava a perda de um vasto território, para o Estado de Santa
Catarina, na chamada Questão do Contestado. Tinha sua economia baseada na cultura
da erva-mate, que era considerada, em nível nacional, de importância econômica
secundária. Esse contexto desafiador estimulou a criação da Universidade do Paraná que
nasceu com o intuito de interferir na realidade concreta de seu Estado .
A UFPR Litoral nasceu com as mesmas preocupações históricas da gênese da
Universidade do Paraná e, nesse desafio paradigmático, optou pela mesma proposta
emancipatória que esteve na base do movimento desencadeado a mais de cem anos.
Comprometida com ideais e valores advindos de uma concepção de educação anti-
hierárquica e anti-exclusivista a UFPR Litoral, emerge de esforços humanos que
entrelaçam oportunidades a desafios que evidenciam a necessidade de ampliação das
suas ações como instituição formadora, bem como de seu papel social.

O inédito viável torna-se o percebido destacado e surge a possibilidade

O litoral do Paraná é uma região histórica e culturalmente rica. Concentra remanescentes de


Floresta Tropical Atlântica, e também por isso, um valioso patrimônio natural. Em seus 90 km de
praias e mais de 650 km2 de baías e estuários, há manifestações culturais específicas como o
fandango, sistemas artesanais de pesca, atividades derivadas dos ciclos econômicos, artesanato,
mitos e particularidades simbólicas que enfrentam um processo histórico de invisibilidade. Neste
contexto, a observação, valorização, registro e divulgação de matérias/materiais locais gerariam
processos de empoderamento dessas populações com relação aos seus próprios modos de vida,
ampliando sua visibilidade e a compreensão/estruturação das identidades locais.
A UFPR-Litoral possui um projeto político pedagógico estratégico baseado na interação com
as comunidades do litoral do Paraná, permitindo que alunos e professores dos três níveis
educacionais (Municipal, Estadual, Federal) e comunidades participem no envolvimento local e
identifiquem demandas regionais. A construção do registro e divulgação do patrimônio imaterial do
litoral contribui também para ampliar as relações entre moradores, visitantes e universidade na
participação e incentivo ao envolvimento socioeconômico regional. O Laboratório se integra tanto a
escolas como as demais instâncias do poder público e da sociedade civil da região na elaboração e
produção de midias, criação, divulgação e publicação dos mesmos a partir do fomento e da
implementação de redes de comunicação que sejam espaços coletivos e de utilidade pública.
O Laboratório para Geração de Novas Utopias objetiva não apenas transmitir informação
mas construir uma rede de comunicação proposta como ferramenta reativa de mobilização e
integração entre a UFPR e a comunidade, entre os municípios da região costeira paranaense e Vale
do Ribeira. Proposta a disseminar repertórios diversificados, formas de expressão e modos de vida a
partir do monitoramento e idealização de políticas públicas por grupos autogestionáveis (equipes
multidisciplinares auto-organizáveis). Para tanto, o projeto vem a cerca de 10 anos mantendo um
banco de dados baseado em coleta e divulgação de histórias, mitos, ciclos, costumes, músicas a
partir de entrevistas e registros audiovisuais; Realizando debates e entrevistas, sobre questões
sociais, culturais, ambientais e legais; Produzindo material didático educacional em áudio e video a
partir das realidades locais; Divulgando projetos e campanhas de interesse público ou social;
Promovendo entretenimento, diversificação de repertório e visibilidade para as práticas locais; e
assim possibilitando a visibilidade para as populações locais e sociedade civil organizada como
associações comunitárias e movimentos sociais.
A partir de um grande numero de projetos, programas, extensões e articulações institucionais
voltadas para a integração intercomunitária e respeitando as comunidades locais quanto a sua
capacidade de suporte de visitações, projetos de diagnóstico e intervenção, o Laboratório contou,
nos ultimos anos, com a anuência dos coordenadores de outros projetos em desenvolvimento para a
participação, registro e produção de programas de áudio e video a partir da trajetória de suas
atividades.
Outra fonte de relação intercomunitária observa-se nos estudantes que desenvolvem Projetos
de Aprendizagem. Ambos os grupos já se mostram diversamente integrados as comunidades
regionais, tornando-se assim, parceiros. Dessa maneira, os Comitês de Pesquisa, Extensão, o Grupo
de Estudos de Projetos e o Grupo de Interações Culturais e Humanísticas fornecem os temas que
compõe as pautas e indicam linhas para a produção de programas e produtos educacionais
diversificados a partir das demandas socioambientais locais.
Diretamente envolvidas são as comunidades dos municípios pertencentes ao Litoral do
Paraná e Vale do Ribeira onde estejam sendo desenvolvidos projetos da UFPR-Litoral,
especialmente professores e estudantes das escolas do ensino fundamental, médio e universitário,
participantes das instâncias do poder público e demais organizações civis locais e regionais.
Como integração para a produção e manutenção coexistem o Laboratório de Produção de
Material Educacional, o LABCOM Laboratório de Comunicação e o LABMIDIA, Laboratório de
Mídias Integradas que objetivam a criação, produção e distribuição dos processos desenvolvidos
pelas comunidades civis e escolares da região gerando fluxos de interações dialógicas e polifônicas.
Uma escolha coloca fim a um leque de possibilidades.

A partir de uma longa vivencia na planície costeira e nas regiões estuarinas do litoral do
Paraná, observa-se a utilização disseminada do rádio nas vilas mais distantes da região. A título de
exemplo, na Barra do Ararapira, vila com 160 habitantes na divisa dos estados do Paraná e São
Paulo, existe apenas uma TV que funciona das 19:00 as 22:00hrs, mas durante o dia, o rádio está
ligado. No local, enquanto a TV torna-se um ritual público, o rádio é familiar e restrito as casas com
uma presença cotidiana, ininterrupta.
No dia 20 de abril de 1923. Na sala de física da Escola Politécnica, no Largo de São
Francisco, Roquette-Pinto e um grupo de cientistas liga, pela primeira vez, o transmissor da Rádio
Sociedade do Rio de Janeiro e lança um ideal: o Rádio é um formidável instrumento para a
educação popular e deve ser usado “pela cultura dos que vivem em nossa terra”.
Em estudos recentes sobre o “educomunicador”, Geneviève Jacquinot (2003, p.2) lembra
que não se pode mais negligenciar o fato de que os alunos de hoje são impregnados de uma “cultura
midiática”, e a atitude dos professores tem sido ignorar a influência dos meios de comunicação,
mantendo a tradição da escola, cujo modelo de mediação é exposição oral e valorização da escrita.
Levando-se em conta que os modos de apropriação do saber mudaram, o que deveria ser pensado,
na prática pedagógica, é uma verdadeira aproximação da escola com os meios de comunicação, uma
vez que os dois têm pontos comuns e o que se aprende na escola pode ajudar a compreender a mídia
e vice-versa.
O reconhecimento da força de persuasão do rádio e de suas possibilidades de uso político,
desde seu surgimento, determinou a concentração de concessões pelo Estado, que atendeu,
sobretudo, os interesses de empresários do setor. As emissoras estatais de caráter educativo
receberam poucos incentivos tornando-se quase inexpressivas diante da expansão dos grandes
meios privados de comunicação. No início o rádio era inspirado no modelo europeu, de linha
cultural e educativa, diferenciando-se daquele apenas por não ter caráter estatal, e dependia do
apoio da comunidade. Mas, pouco tempo depois, adotou o padrão americano, mais barato,
dinâmico, variado e bem sucedido comercialmente, que passou a servir de modelo para as rádios
existentes e as que vieram posteriormente.
A introdução de mensagens comerciais transfigura imediatamente o veículo que, de
“erudito”, “educativo” e “cultural”, transforma-se em “popular”, voltado ao lazer e à diversão. A
radiodifusão brasileira tem se configurado apenas como um canal distribuidor de informação,
gerando, neste processo, um distanciamento emissor/receptor, uma vez que, na difusão para as
massas, reverte-se a função principal da comunicação que é a relação dinâmica entre eles, a “dupla
mão de direção” preconizada por Bertold Brecht nos anos 1920.
Contudo, desde o final dos anos 70, a história do rádio no Brasil tem sido alterada com o
surgimento de várias experiências locais em comunicação popular, como as rádios universitárias,
livres e comunitárias. Trazendo a marca do idealismo de seus protagonistas, elas demonstram a
conquista de um direito fundamental do cidadão: o direito de comunicar. Apesar da modernização
das cidades e da evolução tecnológica, os excluídos da grande mídia, nos dias atuais, têm se
organizado em associações, passando a utilizar estes sistemas radiofônicos alternativos.
Os movimentos sociais estão construindo algo de “novo”, expressando interesses coletivos
que trazem em seu interior um esforço pela autonomia e por um “quefazer” democrático, num novo
espaço de ação política. Vários estudos têm contribuído para aprofundar a temática da comunicação
comunitária, ora considerando as experiências bem-sucedidas, ora constatando as dificuldades da
participação popular para a continuidade dos modelos de comunicação educativa voltada ao
envolvimento social local.
Porém, diante da importância do veículo, que vem subvertendo o modelo linear de
comunicação, transformando o receptor em sujeito e permitindo-o atuar enquanto emissor-produtor
de mensagens no meio de comunicação de seu próprio bairro, cidade e região, faz-se necessário
avaliar os diversos aspectos que incrementam essas iniciativas cidadãs, ampliando sua escuta.
O educador Paulo Freire (FREIRE, 2014, p.120) encara os grandes grupos de mídia como
instrumentos da comunicação vertical e alienante, encarregados de auxiliar na subjugação dos
oprimidos, através da difusão de mitos, normas e valores de minorias oligárquicas. A proposta de
uma Educação para a Libertação, capaz de alterar o processo educativo do tipo bancário, que
promove a submissão e a passividade, segundo Paulo Freire, passava pela comunicação e não
deveria ser tratada fora da estrutura econômica, política e cultural da sociedade (BELTRAN, 1981,
p. 28). Foi dessa forma que o movimento de Cultura Popular da Ação Popular, no início dos anos
1960, encontrou principalmente no rádio e no teatro instrumentos poderosos para alterar tanto as
relações de poder como a educação no Brasil (FÁVERO, 1983, p. 9).
Mas, se por um lado tem sido fundamental a luta pelo funcionamento das rádios
comunitárias, por outro é primordial buscar modelos educativos a serem divulgados. Esta meta
educativo-cultural faz parte da história do veículo desde seus primórdios e foi oficializada a partir
de 1936, com a doação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro ao Ministério da Educação e Cultura.
As várias experiências registradas desde então, como a proposta do educador Anísio Teixeira, nos
anos 30, ou do Movimento de Educação de Base (MEB), nos anos 60, lançaram a pedra
fundamental da comunicação comunitária.
Na década de oitenta, aparecem as primeiras experiências de uso do rádio em ambiente
escolar. Embora tenham sido desativadas, elas foram importantes do ponto de vista do aprendizado
e da integração dos alunos nas escolas. Rádios escolares como a Radioteca Jovem, o projeto
RádioVisão, e a Rádio Vanguarda Educativa de Campos, no Rio de Janeiro, fizeram parte de um
projeto da Secretaria Estadual de Educação daquele Estado. Em São Paulo, a Rádio RM 2.002,
surgida em 1989 no Colégio Regina Mundi, a partir de uma idéia de rádio itinerante. Em Curitiba,
no Paraná, a Rádio Interna Vila Verde, funcionou de 1989 a 1991 na Escola Municipal de 1º grau
Vila Verde, com apoio de estagiários da PUC-PR, que ajudaram a incrementar a produção de jornais
e a Radiorecreio, que esteve ativa de 1992 a 1994, agregou escolas de 1º e 2º graus da rede pública
estadual. Os programas gravados por alunos eram ainda retransmitidos pela Radio Paraná Educativa
FM.
As iniciativas relatadas demonstram que a radiodifusão no Brasil assume importância social
à medida que o rádio figura como único meio de levar a escola e a informação até os habitantes de
várias regiões que não têm acesso à educação ou às mídias locais, considerando-se diversas razões
de ordem geográfica, econômica ou culturais. Elas apontam ainda para a possibilidade de se buscar
modelos educativos para as programações a partir da escola.
Como uma das sonoridades do rádio é justamente a oralidade, e que a palavra geradora da
dialogicidade impõe um novo sentido às relações sociais, pois “o mundo pronunciado, por sua vez,
se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar” (FREIRE,
1980, p. 92), o jovem vai se conscientizando de seu próprio papel na sociedade.
Assim, o Laboratório para Geração de Novas Utopias, cujo embrião surge, nos idos do ano
2010 como Rádio Educativa Litoral FM, faz parte de um programa que integra os diversos níveis
escolares a partir da produção de mídia educacional pelas comunidades civis e escolares do litoral
do Paraná e Vale do Ribeira, servindo a escola como recurso didático mas extensivo a todos. Esta
idéia fora colocada pelo educador Paulo Freire, que propunha “fundamentar na comunicação toda
ação educativa, para reabilitar a palavra, o diálogo ação-reflexão, num reconhecimento crítico da
situação opressora, primeiro passo para a humanização e conseqüentemente para a libertação”
(FREIRE, 1980, p. 35).

Interações Culturais e Humanísticas (ICH), Rádio Livre e Lab.Utopia

Durante o primeiro semestre de 2009, no espaço curricular de aprendizagem do campus


UFPR-Litoral denominado Interações Culturais e Humanísticas (ICH), que objetiva a ligação entre
a formação profissional dos estudantes e a realidade das comunidades locais, propiciou o espaço
para iniciar um projeto de rádio livre e democratização dos meios de comunicação. O projeto
chamado ICH de Rádio, naquela época, já objetivava a organização de um grupo de fomento,
infraestrutura, coleta de informações, interação com a comunidade e com os diversos projetos e
eventos desenvolvidos tanto pela universidade quanto pelas escolas e sociedade civil local.
A partir das experiências na produção dos programas piloto em desenvolvimento no espaço
pedagógico de Interação Cultural e Humanística (ICH), a equipe inicialmente, elaborou debates
relacionados a constituição de uma rádio universitária FM. A necessidade de implementação de um
acervo de programação através da criação de redes de diálogo e diagnósticos de audiência levou o
grupo a pensar na web para geração de sistemas de avaliação da programação. Assim, o segmento
áudio-visual escolhido foi a webrádio. A produção dos programas em formato Net-Cast, áudios
acessados via internet, é favorecida pela infra-estrutura existente na UFPR-Litoral. A estrutura de
produção, composta por células autogestionáveis (equipe multidisciplinar) que organizam
programas de áudio a partir de um sistema de redes de comunicação. A execução do projeto
acontece com a participação direta das comunidades escolares locais tendo sido inicialmente
implementado o projeto piloto no Complexo Educacional Francisco dos Santos Junior localizado no
bairro do Tabuleiro em Matinhos.
Foram ainda desenvolvidos exercícios de coleta de informações sobre a legislação que
regulamenta as rádios educativas, universitárias e comunitárias e sobre técnica de montagem e
roteirização de programas e programação, exercícios vocais para locução, participação em editais e
a construção de uma webrádio WWW.webradiolitoral.com e posteriormente um podcast
WWW.suprawa.podomatic.com onde se divulgava o que estava sendo produzido na época.

O projeto acontece a cerca de 10 anos e envolveu centenas de estudantes de todos os cursos


do setor durante esse período. Os grupos ou células autogestionaveis como estamos chamando já
desenvolveram ações efetivas e se mostram capazes de realizar muito mais. o envolvimento dos
estudantes acontece mesmo além dos espaços destinados ao projeto. Com ima média de cerca de 60
participantes por semestre, em diversos graus e níveis contribuíram na produção de quase dez horas
de programas de áudio por período.
Como resultado desse processo, foram acumulados cerca de 70Gigabytes de dados.
Registros sonoros em boa parte, mas tambem experiencias fílmicas digitais e animações curtas
feitas com tecnicas de Stop Motion. Entre esses, diversos foram idealizados e desenvolvidos a
partir e com as Escolas Públicas da regiao, aldeias Mbya Guarani, apresentações musicais, peças de
teatro de bonecos e entrevistas feitas por estudantes com seus pais, avós, professores e que nos
trazem um pouco do cotidiano e das realidades vivenciadas nas mais diversas localidades.
Contra o Método ou o erro como o contraditório da verdade estabelecida

A partir da organização, mediação e formação técnica de células autogestionáveis, criando


um sistema de redes de comunicação entre as comunidades, próximo à realidade, através de
sistemas dialógicos de escuta/transmissão com feedbacks constantes, proporcionando um espaço de
convergência de interesses, aberto ao debate, divulgação de eventos, encontro e cidadania para a
região. A criação desses sistemas dialógicos entre os três níveis educacionais, as comunidades,
Poder Público, associações civis e movimentos sociais, quando fortalecida apenas reforçará seu
estabelecimento e conseqüente fortalecimento e ampliação.
A viabilidade da proposta e a potencialidade do Laboratório acontece a partir da abordagem
dos problemas das populações locais em situação de vulnerabilidade social, inicialmente no
município de Matinhos e posteriormente contando com a ampliação para os demais municípios da
região onde a UFPR-Litoral mantém projetos em andamento.
A partir de uma perspectiva de laboratório, onde os produtos encontram-se em permanente
construção/transformação, as células autogestionáveis responsáveis por esses produtos participam
dos projetos tanto da comunidade quanto da universidade e auxiliam na integração e disseminação
de informações, datas, direitos sociais, encontros. Para tanto, os servidores docentes, graduandos,
graduados e membros da comunidade diretamente envolvidos atuarão como mediadores juntamente
com alunos e professores das escolas municipais e estaduais para a construção das redes tanto nas
escolas como fora delas, nas associações comunitárias locais, em grupos vulneráveis ou
historicamente invisibilizados.
As rotinas acontecem com o acompanhamento de saídas a campo realizadas por professores
e estudantes envolvidos em projetos da UFPR Litoral levando equipamentos portáteis de captura de
áudio e video. Assim, desde o início do deslocamento são realizadas entrevistas com os
participantes e sobre o projeto. O que é aquela saída a campo, aonde vamos e o porque seriam
perguntas iniciais, porém as capturas durante a atividade podem ser diversas. Historias de vida das
comunidades visitadas, mitos, descrições da paisagem.....
Ao retornar as equipes elaboram a edição dos áudios e colocam ali complementos que
ampliem e amplifiquem as paisagens sonoras visitadas, sons que misucalizem os relatos e historias
de vida registradas. A rádio tem seu “produto” e o projeto tem sua “divulgação” em áudio.
Paralelamente a esse processo cria-se um vínculo com a região visitada, um compromisso de escuta
e uma responsabilidade de amplificar a voz daquelas comunidades não hegemônicas.
Outra rotina, outra célula autogestionária, tema jornalístico. Equipes buscam compor
roteiros de noticias locais relevantes e que são descaradamente ignoradas pela mídia instituída.
Temas relacionados a parques nacionais e unidades de conservação, conflitos com comunidades
tradicionais, alternativas de renda, direitos sociais, serviços de utilidade pública como o horário e o
dia das Sessões das Câmaras Municipais da região. Noticias de cunho científico e artístico com a
promoção das atividades locais, divulgando bandas locais, artistas, sábios e saberes.
Outra rotina, outra célula autogestionária, tema literário. As equipes compõe roteiros com
base na literatura brasileira, contos fantásticos, poesia ou autores específicos. A musicalização
constitui-se também através de pesquisas de época. Qual musica Machado de Assis ouvia? É samba
de gafieira que acompanha seu programa, os sons da rua, da cidade fervilhando, passos e cavalos
com charretes.
A partir de uma das saídas a campo um dos participantes identificou uma demanda em
algum bairro da região. Tipo... cachorros na rua, zoonozes, pulgas, reprodução canina descontrolada
(muito comum no litoral). Desenvolve uma pesquisa, roteiriza, grava e edita um programa em áudio
que esclarece os cuidados que deve-se ter com os cães como castração e desvermifugação, cuidados
com resíduos, separação de recicláveis e compostagem.
As rotinas já funcionam e compõe programas sobre a prevenção e cura do câncer de mama,
sobre direitos da criança e do adolescente, sobre lendas caiçara, lendas africanas, nórdicas, latinas.
Recitação de poesias e textos de Eduardo Galeano, Gabriel Garcia Marques, Jorge Luis Borges,
Ivan Ilich, Jacques Ranciere, Michel Onfray. Existem depoimentos de caboclos, curandeiros,
professores e pescadores habitantes do interior da baía de Paranaguá. Existem gravações de
apresentações de grupos teatrais de Guaraqueçaba e de bandas com engajamento político.
Todas as células envolvidas encontram-se as quartas-feiras após as 19:00 hrs no espaço
pedagógico definido como Interação Cultural e Humanística (ICH) sendo o momento de
socialização de pautas, identificação de demandas, formação continuada da equipe, debates de
temas relevantes, preenchimento de editais etc.
A partir de referencias iníciais sobre o ato de comunicar, os seus meios, as suas mensagens e
essas como extenção dos sujeitos como abordadas por Marshall McLuhan e Quentin Fiore na obra
O Meio são as Massa-gens (McLuhan, 1969). Suas experiẽncias com a poesia concreta e
metadiálogos utilizando texto e imagens na criação de narrativas visuais. Essas reflexões iniciais
possibilitam a critica aos meios de comunicação e sua gênese assim como a dos sujeitos, que
deixam de ser consumidores passivos para tornarem-se produtores ativos de midias, multiplas
agora.
Paulo Freire na obra Pedagogia da Indignação: Cartas Pedagógicas e Outros Escritos
(FREIRE, 2014) aborda os desafios em relação as novas tecnologias e a maneira como essas
reestruturam a educação. Estamos vivendo isso com as quarentenas, Lockdows, ensino remoto,
Educação Hibrida e EaD que ganharam força apartir de uma Pandemia altamente letal. Freire ainda
aborda tecnicas e teçe criticas a alfabetização via televisão, seus limites e os pactos mediocres que
agem na sublinguagem desse tipo de meio de comunicação.
O mesmo autor, no seu texto A importância do Ato de Ler, faz uma narrativa de sua infância
e como ele percebe o mundo em complexidade crescente a partir do cotidiano, do pomar, do ato de
brincar e assim constroe sua leitura mundo. Seu entendimento do mundo, essa leitura seria o fator
de importância chave para construir uma alfabetização ou letramento com real significado na vida
dos sujeitos.
Hoje, necessitamos de um processo educacional que nos permita complexificar essa leitura
mundo mas também que nos localize e georefencie na atmosfera tecnologica em que estamos
imersos. Alguns envoltos em pacotes atmosfericos tecnológicos bastante densos, outros nem tanto e
ainda outros sem nenhum acesso a esse novo mundo. Se faz necessária pesquisa e a construção de
um tipo de alfabetização tecnológica, critica, não passiva e que traga a diversidade das leituras
mundo possíveis que nos rodeiam.
Necessárias também a abordagem, estudo, pesquisa e producçao sobre estilos e tipos de
midias e formas comunicacionais contextualizadas no tempo e no espaço presentes na história
humana. Da arte rupestre ao graffite. Da escrita cuneiforme ao pixo. Do hieróglifo à xilogravura. O
jornal que marca a história oficial e o funzinne da contracultura outsider. Da ópera à arte
performática e o teatro de rua, os grupos manbembes, o circo, os benandanti e andarilhos do bem.
Dos jogos competitivos aos jogos colaborativos. Do representativo ao associativo. Radios
comerciais fast food à radio livre e comunitária. Transmissões de TV clandestinas.
Para além da concretude do cotidiano real, do imaginário, da materialidade do papel jornal,
da obsolescência dos periódicos, das ondas eletromagnéticas do rádio ou da Televisão, somos
apresentados hoje a sistemas multimidiáticos virtuais, a informática, a NET, a WEB e diversificadas
plataformas de compartilhamento.
Porém, depois das primeiras experiencias de compartilhamento nas redes BBS5 o que se
constituiu foi um sistema de rede hierárquico. A NET seria a rede formal onde se compartilham
dados militares e bancários e a WEB seria uma rede livre e que origina a CONTRANET em seus
interstícios. Nessa, aparecem os CyberPunks do mundo moderno, as redes horizontais, clandestinas,
ilegais e dedicadas a pirataria de dados.
Redes de informação são comuns e diversificadas, a fofoca e o boca-boca, zinnes, telefonia,
correios. Porém, não importa o tipo mas a abetura e a hotizontaliedade da estrutura. A NET e sua
relação com seus usuários é de rápida transformação e apresenta relações mutantes. Nos
transformamos em caçadores-coletores de informação, nômades portanto. A dicotomia falaciosa da
tecnologia ou anti-tecnologia é superada e percebemos a criação de redes, de ilhas comunicacionais
que só existem na NET, caóticas, mapas escondidos dentro de outros mapas escondidos em outros
mapas. A experiência dos virus, dos hakers constituem essa topografia interdimensional caótica,
incontrolável e horizontal (WILSON, 1991).
Pierre Lévy na sua obra Cibercultura (LÉVY, 1999) caracteriza essa nova realidade
definindo o ciberespaço em suas dimensões de memória, transmissão, interfaces, programação e o
próprio computador. A partir de um debate sobre sua característica determinante ou condicionante e
a formação de uma inteligência coletiva, talvez remédio, talvez veneno.
A partir de um universal sem totalidade como essencia da cybercultura, sua existência cria
um novo tipo de movimento social, de música, de arte, de cidade e de democracia. Forja novos
mundos, cria novas relações com o saber e mutações nos processos educativos influenciados por
essa inteligência coletiva.
O invisibilização de tradições autóctones em detrimento a uma cibercultura global
homogênea seria o nó central dessa pesquisa. O compartilhamento dessas culturas autóctones nas
redes globais fariam um enrriquecimento e uma diversificação de ideias e possibilidades, essa é a
resposta fácil mas não acontece dessa maneira.
O ambiente Laboratório, os diversos tipos de midias, modelos e formatos produz conteudo a
partir da vontade e da intenção dos participantes. O registro da história e cultura da região, das
comunidades, seus hábitos, suas paixões, a vocação dos artistas e suas raízes são balisadas pela
literatura que aborda e torna significativas algumas características da cultura local definida
genéricamente como Caiçara.
A partir de obras referenciais sobre as culturas caiçaras e populações das terras úmidas
publicadas por Antonio Carlos Diegues (DIEGUES, 1979, 1988, 1993a). A antropologa Gioconda
Mussolini escreve a obra Ensaios de Antropologia Indígena e Caiçara (MUSSOLINI, 1980) traça
relações viáveis e mitos sobre ancestralidade, transformações e possíveis permanências culturais.
Também presente na construção dessa reflexão estão obras comparativas de Luiz Geraldo Silva,
Caiçaras e Jangadeiros: cultura marítima e modernização no Brasil (SILVA, 1993) e A festa, a Faina
e o Rito: uma etnografia histórica sobre as gentes do mar, sécs.XVII ao XIX (SILVA, 2001).
Outra dimensão do Laboratório trata-se do conhecimento e uso de softwares livres de
captura e edição para produção de conteúdos, fazendo com que os participantes conheçam um
pouco das técnicas, rotinas e especificidades da produção de conteúdos pra radio, vídeo e técnicas
para produção de gravura, xilogravura, reprografia, tipografia, Histórias em Quadrinho e jogos
colaborativos reconhecendo e entendendo as principais diferenças entre os diversos gêneros, tipos e
modelos comunicacionais e de reprodutibilidade de ideias e mensagens.

A audição de material presente no banco de dados registrados em comunidades, entrevistas


em campo, locuções em estúdio e debates diversos nos trazem conceitos de pertencimento,
proximidade, interação dos conteúdos com a realidade, identidade local e regional além de pessoas
com reconhecida atuação em campos como rádios comunitárias, ativismo comunitário, produtores
de conteudo digital, arte mural, performers, musicos.

Paralelo a esse processo e a partir das reflexões adquiridas e do histórico do banco de dados
já existente foi possível agrupar estilos e padrões. Experiências criativas em gravura,
transformaram-se em arte urbana. Um conjunto delas e trechos radiofonicos transcritos compuseram
um funzzine, impresso em mimiógrafo dimensionou sua reprodutibilidade e foi distribuido na
Universidade Federal do Paraná, Setor Litoral induzindo um movimento ativista que possibilitou
associativismos e formação de diversos centros acadêmicos, ausentes no Setor até então. Paralelo a
arte mural, as gravuras passaram a ser reproduzidas nas paredes do Setor, antes brancas,
desencadeando um processo de fala, escuta e exigência de direitos a partir das paredes. É possível
acompanhar uma narrativa visual e polifônica horizontal e não hierárquica dessa arte mural,
gravuras, poesia, textos e palavras de ordem possibilitando o empoderamento e dando voz a grupos
e segmentos presentes na universidade que tradicionalmente eram invisibilizados e oprimidos.

Esse movimento descrito acima começõu a ser desenvolvido a partir de 2011. A observação
e o registro tem sido reunido e também compõe o banco de dados do Laboratório. A divulgação, o
envolvimento da comunidade e sua mensuração passou a ocorrer a partir do estabelecimento de
bancos de dados públicos acessiveis nas plataformas de compartilhamento no cyberespaço e que
começam a se constituir como redes reativas que crescem em envolvimento, numero de
participantes e complexidade.

Inicialmente constituiu-se uma página no www.Facebook.com nominada RádioLivreLitoral


e um Grupo na mesma plataforma. Nessa plataforma é compartilhada parte da produção do
Laboratório. O repositório do banco de dados registrado em audio, encontra-se parcialmente
compartilhado na plataforma www.SoundClowd.com com diversos nomes e layouts. Seriam eles:
Laboratório Para Geração de Novas Utopias; Rádio UFPR Litoral; De pernas pro ar A Escola do
Mundo ao Avesso; Jacques Ranciere- o mestre ignorante e as cinco lições sobre emancipação
intelectual; Botânica Fantástica; Apocalipse Motorizado; Sobre Flores e Diamantes; Série
Biografias e Banditismo Social; Biografias e Outras Viagens; Biografias e Mais Sabotágens;
Mitológicas. O repositório visual do banco de dados encontra-se parcialmente compartilhado na
plataforma www.Instagram.com com o nome UtopicLab. Por fim as experiências audio visuais e
filmicas de curta metragem são compartilhados na plataforma www.Youtube.com com o nome
LabUtopia.
Piratas são eles, não estamos querendo lucro. Politicas e uso educativo
Ao usar a estrutura do Laboratório, os grupos ou pessoas concordam em ser livres com os seguintes
princípios:

I - respeitar os direitos humanos


a) respeitar sempre a liberdade de opinião, credo, crença e a diversidade política, étnica e religiosa;
b) zelar pela diversidade cultura e regional, sem cercear nenhum tipo de expressão;
c) não disseminar nenhum conteúdo ofensivo de qualquer espécie.

II - ter responsabilidade social


a) responder pelos seus atos de acordo com o item I
b) ter clareza que é responsável pelo que expressa.

III - por parte do Laboratório


a)O Laboratório incentiva a ação coletiva entre indivíduos e grupos para filtrar e excluir possíveis
desrespeitos a esse acordo mútuo.
b) o Laboratório deve ser usados para a promoção de uma Comunicação Livre. Logo, os
participantes não devem usar a conta web para fins comerciais e/ou de lucro.

Resultados ou el camino hace al camiñar

O projeto contribuirá na criação de banco de dados com formas de expressão, elaboração de


programação didático educacional nos diversos níveis, democratização da informática e dos meios
de comunicação, disseminação de técnicas de produção de multimídias, criação de canais de
comunicação com as realidades locais, criar sistemas de análise e organização de informação. O
projeto constituirá a experiência para sua continuidade e começará a formar um acervo atemporal de
consulta sobre as manifestações culturais do litoral paranaense. A título de exemplo, os programas
produzidos a partir das demandas locais relacionadas a direitos sociais englobam temas sobre
Educação Ambiental, Estatuto da Criança e Adolescente, Estatuto do Idoso, Direitos das Mulheres,
Direitos Humanos, Observatórios da Cidadania, Organizações comunitárias, Cooperativas de
Pescadores, alternativas de geração de renda e economia solidaria entre outros.
Paralelo a esse processo e a partir das reflexões adquiridas e do histórico do banco de dados
já existente foi possível agrupar estilos e padrões. Experiências criativas em gravura,
transformaram-se em arte urbana. Um conjunto delas e trechos radiofonicos transcritos compuseram
um funzzine, impresso em mimiógrafo dimensionou sua reprodutibilidade e foi distribuido na
Universidade Federal do Paraná, Setor Litoral induzindo um movimento ativista que possibilitou
associativismos e formação de diversos centros acadêmicos, ausentes no Setor até então. Paralelo a
arte mural, as gravuras passaram a ser reproduzidas nas paredes do Setor, antes brancas.
Desencadeando um processo de fala e escuta, e exigência de direitos a partir das paredes. É possível
acompanhar uma narrativa visual e dialógica horizontal e não hierárquica dessa arte mural,
gravuras, poesia, textos e palavras de ordem possibilitando o empoderamento e dando voz a grupos
e segmentos presentes na universidade que tradicionalmente eram invisibilizados e oprimidos.

Esse movimento descrito acima começõu a ser desenvolvido a partir de 2011. A observação
e o registro tem sido reunido e também compõe o banco de dados do Laboratório. A divulgação, o
envolvimento da comunidade e sua mensuração passou a ocorrer a partir do estabelecimento de
bancos de dados públicos acessiveis nas plataformas de compartilhamento no cyberespaço e que
começam a se constituir como redes reativas que crescem em envolvimento, numero de
participantes e complexidade.
Inicialmente constituiu-se uma página no www.Facebook.com nominada RádioLivreLitoral
e um Grupo na mesma plataforma (www.facebook.com/radiolivreLitoral). Nessa plataforma é
compartilhada parte da produção do Laboratório. O repositório do banco de dados registrado em
audio, encontra-se parcialmente compartilhado na plataforma www.SoundCloud.com
(https://m.soundcloud.com/ichradiolivre) com diversos nomes e layouts. Seriam eles
Laboratório Para Geração de Novas Utopias; Rádio UFPR Litoral; A Escola do Mundo ao Avesso;
Jacques Ranciere- o mestre ignorante e as cinco lições sobre emancipação intelectual; Botânica
Fantástica; Apocalipse Motorizado; Sobre Flores e Diamantes; Série Biografias e Banditismo
Social; Biografias e Outras Viagens; Biografias e Mais Sabotágens; Mitológicas. O repositório
visual do banco de dados encontra-se parcialmente compartilhado na plataforma
www.Instagram.com com o nome UtopicLab (www.Instagram.com/utopiclab). Por fim as
experiências audio visuais e filmicas de curta metragem são compartilhados na plataforma
www.Youtube.com com o nome Lab Utopia (www.Youtube.com/LabUtopia ).
Como breve historico e portfolio do Laboratório, que na época ainda não havia sido
denominado dessa forma, a equipe foi contemplada com três prêmios de abrangência nacional. O
Edital Nossa Onda, financiado pela ARPUB, Associação de Radios Públicas do Brasil selecionou
dois projetos idealizados e produzidos pela equipe. Ambos encontram-se em anexo.
Anexo I: Lendas Caiçara, a Piragui e o Pai do Mato (https://m.soundcloud.com/user-
100529914/lendas-caicara-final).
Anexo II: William Michaud: o Superagui em 7 cartas (https://m.soundcloud.com/radio-
livre-847954791/william-michaud-superagui-em-7-cartas).
O terceiro edital, organizado tambem pela ARPUB, Associação de Radios Públicas do
Brasil, financiado pela Petrobras com apoio do Ministério da Cultura contemplou o projeto Mar
Aberto: mergulhe em ideias. Uma sequencia de doze capítulos com 30minutos cada que abordam o
reconhecimento, história, cultura, paisagens, geografia, caminhos antigos, fauna, flora, musica e
gentes do litoral do Paraná. Porém por motivos diversos não teve sua produção concluida.
Enfrentando um processo histórico de invisibilidade, o litoral do Paraná, apresenta
idiossincrasias simbólicas que a partir de uma observação acurada, registro e divulgação, gerariam
processos de empoderamento dessas populações com relação aos seus próprios modos de vida,
ampliando sua visibilidade e a compreensão/estruturação das identidades locais. Sendo os
municípios do litoral do Paraná e Vale do Ribeira a área de abrangência da UFPR-Litoral, é onde
projetos da instituição possibilitam a criação de redes de comunicação. As webrádios são
mecanismos inovadores e descentralizadores, amplamente utilizados para a disseminação de
conhecimento, arte e cultura, com grande potencial para divulgar as expressões locais. Ele permite
grande abrangência geográfica via web e pode ser inserido na programação de rádios FM e AM
locais.
O projeto prevê o município de Matinhos como ponto de partida com cinco escolas onde
inicialmente o projeto poderia ser implementado devido a contatos prévios já efetivados, (Escola
Municipal Wallace Thadeu de Melo e Silva, Complexo Educacional Francisco dos Santos Junior,
Colégio Estadual Gabriel de Lara, Escola Municipal Monteiro Lobato e Escola Municipal Pastor
Elias Abrahão) e se estende em parceria com os projetos da UFPR nos municípios de Guaratuba,
Pontal do Paraná, Morretes, Antonina, Guaraqueçaba, Adrianópolis, Dr. Ulisses.
A partir de programas em áudio produzidos a partir das demandas locais relacionadas a
direitos sociais e temas sobre Educação Ambiental, Estatuto da Criança e Adolescente, Estatuto do
Idoso, Direitos das Mulheres, Direitos Humanos, Observatórios da Cidadania, Organizações
comunitárias, Cooperativismo, alternativas de geração de renda, economia solidaria, idealização e
monitoramento de políticas públicas, o Projeto se integra tanto a escolas como as demais instâncias
do poder público e da sociedade civil da região na elaboração, produção e divulgação de seus
modos de vida, identidades, demandas, reivindicações e problemas locais a partir da criação de
redes de comunicação que sejam espaços de utilidade pública e que por isso mesmo criem
condições alternativas de envolvimento da população com seu próprio território
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BELTRAN, Luiz Ramiro. Adeus à Aristóteles: comunicação horizontal. Revista Comunicação e


Sociedade , n. 6, Set. 1981, São Paulo: Ed. Cortez, p. 5-35.

FÁVERO, Osmar (org). Cultura Popular, educação popular: memórias dos anos 60. Rio de
Janeiro: Edições Graal Ltda., 1983.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 8. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.

JACQUINOT, Geneviève. L’éducommunicateur. Paris. Pesquisa realizada em 21/10/03 no site:


ttp://innovalo.scola.ac-paris.fr/Innovatio/innovatio4/educommunicateur.htm.

MUSSOLINI, Gioconda. Ensaios de Antropologia Indígena e Caiçara. Paz e Terra, RJ, 1980.

DIEGUES, Antonio Carlos. Ilhas e Mares: simbolismo e imaginário. Hucitec, 1998.


_________. Populações Tradicionais em Unidades de Conservação: o mito moderno da natureza
intocada. NUPAUB. 1993
_________. Povos e Mares: uma retrospectiva de sócio-antropologia marítima. CEMAR, USP. 1993
_________. Enciclopédia Caiçara. Hucitec. Universidade do Texas, 2004.

SILVA, Luiz Geraldo. Caiçaras e Jangadeiros: cultura marítima e modernização no Brasil. Centro de
Culturas Marítimas, 1993.
_______. A festa, a Faina e o Rito: uma etnografia histórica sobre as gentes do mar, sécs.XVII ao
XIX. Coleção Textos do Tempo. Papirus Ed. Universidade de Michigan. 2001.
ANEXO 1

Rádioconto -
Lendas Caiçara – Piragui e Pai do Mato
Justificativa

O litoral do Paraná é uma das primeiras regiões colonizadas da costa brasileira, com
influências indígena, européia e afro-descendente, e por isso histórica e culturalmente rica. Ele está
localizado no setor sudeste da costa brasileira, que, entre Cabo Frio (ES) e o Cabo de Santa Marta
(SC), concentra remanescentes de Floresta Tropical Atlântica, atualmente uma das mais importantes
Reservas da Biosfera da América do Sul, incluída como um dos 25 hotspots de biodiversidade do
mundo, e por isso também um valioso patrimônio natural.

Em seus 90 km de praias e mais de 650 km 2 de baías e estuários, há manifestações culturais


específicas, tais como o fandango (dança e música popular), sistemas artesanais de pesca, atividades
derivadas dos ciclos econômicos, artesanato, lendas e particularidades da relação entre sociedade e
natureza. Entre as 60 comunidades de pescadores atualmente existentes (de frente oceânica ou de
interior de baías) muitas identificadas como isoladas, muitas tendo acesso somente por água, ainda
não tiveram estas ricas e diversificadas tradições culturais materiais e imateriais devidamente
registradas em trabalhos anteriores. Neste contexto, o registro e divulgação do patrimônio cultural
do litoral do Paraná contribuirá não só para valorizar e fortalecer a identidade cultural local, como
também para ampliar as relações entre moradores e incentivar o desenvolvimento socioeconômico
regional.
O programa abordará as lendas e mitos locais, suas especificidades histórico-culturais e as
relações sociedade/natureza que remetem, a partir de locuções das lendas e entrevistas com
pescadores, professores e público jovem morador da região. Esta experiência de produção tem o
intuito de formar um acervo atemporal de consulta continua sobre as manifestações culturais do
litoral paranaense.
Sinopse
As lendas selecionadas compõe um vasto acervo cultural presente nas tradições orais das
populações costeiras de sul e sudeste brasileiro. As lendas ainda apresentam interfaces com
tradições indígenas e em muitos casos estão presentes e disseminadas por todo o território nacional.
Devido a estas características, os nomes apresentam-se genéricos fazendo sentido apenas na região
onde são contados, ou seja, a mesma lenda pode receber nome diferente em outra região, assim
como seu sentido e interpretação. Por se tratar de mitos, lendas ou contos de domínio popular e
passados de geração em geração por tradição oral como autor consta apenas o local ou as
populações e tradições culturais que os contam.
Nesse caso específico os contos selecionados fazem parte do imaginário da Ilha das Peças e
Superagui inseridas no Complexo Estuarino Lagunar de Paranaguá, na sua porção norte, divisa
entre o estado do Paraná e São Paulo. Estas ilhas são abrangidas pelos programas governamentais
PROJOVEM e de EDUCAÇÃO NO CAMPO que propõe temas de aprendizado diferenciados para
as escolas rurais, das ilhas, dos remanescentes de quilombos, dos faxinalenses.
Uma das interfaces dos programas governamentais é a produção de material didático a partir
dos contextos culturais dessas escolas rurais. Com relação as lendas, mitos e contos populares sua
função nas sociedades agrárias e ribeirinhas sempre foi a de orientação, de significação e de
educação frente a realidade vivida. No limite, as escolas, as lendas e contos populares teriam a
mesma função social. A escolha dos contos remete as relações sociedade/ natureza e serão
roteirizadas em dramaturgia com um narrador e dois atores auxiliados por efeitos na composição
das paisagens sonoras.

Lenda do Piragui
Em uma antiga lenda, Nhãnderu, deus dos índios guarani, havia prometido paraísos
guardados a seus filhos caçulas. Em um determinado momento, então, esses guaranis, que
viviam no interior, começaram a andar em direção ao oceano, guiados pela crença de que se
caminhassem para onde o sol nasce, encontrariam a terra sem mal.
Andaram durante muito tempo, até que chegaram ao litoral, e lá, bem perto do mar,
enfim avistaram as ilhas cercadas pelo oceano. Entenderam que afinal tinham chegado ao
paraíso. Assim, embriagados pela fé que estimulava a possibilidade do cumprimento de uma
promessa divina, os escolhidos começaram a travessia.
Passaram por Jacutinga (Ilha da Cotinga), por Ieretã (Ilha doMel) e, quando estavam
indo à Ilha de Superagüi (Ju Piragüi), foram apanhados por uma tempestade. Uma mulher já
bem velha e por isso muito fraca, não suportou as provações da travessia, seu corpo foi
“comprado” pelo mal e o mar a levou. Piragui, como era chamada, ficou então temida pela
redondeza. Ela aparecia nos rios e não gostava que as pessoas desrespeitassem o mar.
Um dia um homem estava tentando pescar e não conseguia pegar nada, quando,
revoltado, resolveu fazer cocô na água do rio para provocar Piragui. Ela apareceu, bateu na
bunda do pescador e disse: “Por que você está fazendo isso?”. O homem então reclamou da
falta de peixes. E Piragui fez uma proposta a ele: “Tenho observado a aldeia onde mora e vi
que sua mulher está grávida. Vamos fazer assim: eu lhe dou agora todos os peixes que você
puder levar e quando seu filho nascer, você o dará para mim.”
O homem chegou em casa com muitos, mas muitos peixes e disse à sua mulher: “Já
pesquei tanto neste rio que nunca mais quero pescar por lá de novo”. E nunca mais voltou!
Mas seu filho cresceu e um dia foi pescar. Quando entrou no rio, Piragui, que não havia se
esquecido do trato, estava lá, esperando por ele. Então, ela o enrolou com seus longos
cabelos e o levou para o fundo do mar. Os pais do rapaz o procuraram por todos os lugares e
não o encontraram. Foi quando seu pai, apavorado, lembrou-se do antigo acordo: ele tinha
trocado o seu próprio filho com Piragui.
Sem saber o que fazer, levou o caso a um grande Pajé. O Pajé mandou construir uma casa de
reza no local onde viram o rapaz pela última vez. Cantaram e dançaram por três dias inteiros
chamando por Piragui. No final do terceiro dia, Piragui apareceu, dançando
e cantando. Ela trazia o rapaz enrolado em seus longos cabelos. Piragui dançou e bebeu a
cachaça que lhe foi oferecida durante a noite inteira, e quando estava amanhecendo o dia, ela
acabou adormecendo embriagada. O rapaz aproveitou-se e se desenrolou de seus cabelos e
quando Piragui acordou não tinha mais nada a fazer a não ser voltar sozinha para o rio.
Piragui é uma espécie de sereia que habita os estuários da região de Paranaguá a Cananéia,
cuidando e controlando os estoques de peixes, camarões e outros seres marinhos.

A lenda de Piragui nos conta mais do que a história de um personagem, conta a história de
um tempo, de uma época. Conta a chegada dos guarani mbiá no paraíso prometido por Nhãnderu,
seu deus. As pessoas temiam Piragui e isso era muito importante para que também a respeitassem.
Piragui podia cantar e arrastar embarcações para bancos de pedra a fim de afundá-las. Mas como
toda a cultura oral, estas lendas eram passadas em histórias para crianças com a finalidade de impor
limites e respeito. “Piragui pega as crianças que ficam sozinhas na beira do rio”, e quando a criança
cresce, traz como marca de sua cultura estes cuidados com a natureza, sabendo que poderá ser
punido se desrespeitar estas leis.

Lenda do pai do mato


A lenda do Pai do Mato também fala deste cuidado com a natureza, com o ambiente
onde essas comunidades vivem. Mas, neste caso específico, o cuidado é com a mata. O Pai
do Mato é um homem assustador, de cabelos e barba compridos. Carrega um saco cheio de
ferramentas, que fazem barulho quando ele se desloca pelas matas, assustando as pessoas
que entram nas florestas sem respeitar seus habitantes. Dessa forma, o Pai do Mato é um
protetor das matas e dos animais.
O Pai do Mato é filho da Caapora, que em tupi significa caa (mato) pora (fera).
Dizem os mais velhos que a Caapora antes de morrer engravidou uma índia e que ela deu à
luz a um menino que ainda criancinha foi para o mato e nunca mais voltou. O Pai do Mato
também é um personagem muito temido e respeitado por mateiros, caçadores e todos
aqueles que se aventuram mata adentro. Quando está bravo, o Pai do Mato derruba árvores,
faz barulhos, assusta... Dizem os mais velhos que quando ele se irrita não adianta entrar no
mato para caçar, pois ele agita os animais, todos os bichos ficam bravos.
Esta lenda tem um sentido muito claro: o Pai do Mato guarda a floresta, impõe regras
inquebrantáveis àqueles que se aventuram a entrar na mata sem respeitar suas leis. Os
caçadores eram os principais responsáveis pela manutenção dessa crença, que tinha como
objetivo manter as pessoas afastadas das matas, de onde tiravam o sustento da família.

A lenda de Piragui, assim como a do Pai do Mato, são lendas indígenas absorvidas quase de
forma integral pela cultura caiçara do município de Guaraqueçaba, no litoral do Paraná. Estas
lendas nos mostram o respeito, o medo e o cuidado que estas culturas tinham em preservar seus
ecossistemas, e nos dão uma mostra de como se dava essa relação com o ambiente. Na leitura
dessas duas lendas percebemos que desde há muito tempo o homem já elaborava formas de regular
sua relação com a natureza. Na cultura caiçara, foram as lendas, contadas de pai para filho, que
sempre tiveram esse papel. Conforme o tempo foi passando e o número de pessoas que habitam o
planeta aumentando, as tradições culturais passaram naturalmente a se misturar, a se fundirem.
Muitas delas acabaram simplesmente se perdendo. Ou ainda estão circulando por aí, com outros
nomes, basta achá-las!
ANEXO 2
Radio documentário – William Michaud: Superagui em seis cartas

Justificativa

O litoral do Paraná é uma das primeiras regiões colonizadas da costa brasileira, com
influências indígena, européia e afro-descendente, e por isso histórica e culturalmente rica. Ele
concentra remanescentes de Floresta Tropical Atlântica, atualmente uma das mais importantes
Reservas da Biosfera da América do Sul, e por isso também um valioso patrimônio natural.

Em seus 90 km de praias e mais de 650 km 2 de baías e estuários, há manifestações culturais


específicas, tais como o fandango (dança e música popular), sistemas artesanais de pesca, atividades
derivadas dos ciclos econômicos, artesanato, lendas e particularidades da relação entre sociedade e
natureza. Entre as 60 comunidades de pescadores atualmente existentes, algumas tiveram sua
identidade forjada a partir de uma base cultural indígena, outras se construíram a partir de relações
parentais e religiosidade forte. Ainda outras formaram sua identidade a partir de viajantes e
estrangeiros que as escolheram como lar. Dessa maneira foram formadas estas ricas e diversificadas
tradições culturais materiais e imateriais e, neste contexto, o registro e divulgação do patrimônio
cultural do litoral do Paraná contribuirá não só para valorizar e fortalecer as identidades culturais
locais, como também para ampliar as relações entre moradores e incentivar o desenvolvimento
socioeconômico regional.
O programa abordará a vida de William Michaud a partir da recriação do fato/personagem
baseado em documentos históricos e autobiográficos. As seis cartas escolhidas para compor esse
programa reconstroem em quadros a vida de William Michaud na Ilha do Superagui, de sua chegada
até sua morte. Esta experiência de produção tem o intuito de formar um acervo atemporal de
consulta continua sobre as manifestações culturais do litoral paranaense.
Sinopse
O gênero do presente programa radiofônico seria um documentário dramatúrgico, uma
recriação de um fato/personagem descrito a partir de documentos históricos. Não apenas
documentos, mas William Michaud, além de constar em documentos históricos deixou séries de
gravuras, aquarelas e cartas além de diversas influências presentes até hoje na região norte da baía
de Paranaguá, mais especificamente na Ilha do Superagui e na Vila dos Barbados, município de
Guaraqueçaba. Manteve durante toda sua vida uma escola no local e criou laços de parentesco com
antigos moradores locais.
As seis cartas escolhidas para compor esse programa reconstroem em quadros a vida de
William Michaud na Ilha do Superagui, de sua chegada até sua morte. As cartas mostram otimismo
e euforia no início da vida para dar lugar a dificuldades cada vez maiores e o fim de um sonho de
construção de uma sociedade melhor devido a influencias governamentais e ambientais.
As transcrições das cartas serão locutadas por um ator no papel de Michaud e um narrador
fará as introduções necessárias:
Narrador – William Michaud nasceu em Vevey, na Suíça em 21 de junho de 1829 e chegou ao
Brasil em primeiro de fevereiro de 1849. Desembarcou no Rio de Janeiro e trabalhou como
engenheiro até1854 quando mudou-se para o litoral do Paraná. Morou durante 50 anos na Ilha do
Superagui num local hoje chamado de Vila do Barbados.

A vida de William Michaud no Superagui e sua visão de mundo foram por ele retratadas em
pinturas e cartas enviadas para a irmã na Suíça.... Michaud, logo na sua chegada encontrou
Custódia, um grande amor com a qual teve oito filhos.

O inicio dos anos 1800 foram difíceis na Europa, Em Vevy, na Suíça não era raro que alguém saísse
pelo mundo afora. No ano de 1801, 17 famílias tinham imigrado para a America do Norte,
fundaram New Vevey, no Kentucky. Não foram poucos os que tentaram a sorte no Brasil.

No Brasil havia o programa de imigração e colonização de Charles Perret Gentil, cônsul Suíço que
fundou a Colônia Particular Suíça em Superagui. Nesta empreitada vieram 13 famílias européias, 13
homens adultos, 10 mulheres adultas, 7 filhos e 3 filhas, no total de 33 pessoas. Havia mais um
casal brasileiro que se juntou ao grupo e mais toda uma população nativa que vivia nas
vizinhanças. Naquela época a colônia do Superagui tinha quase 400 habitantes.....

Som de aves e água calma...

1. Colônia do Superagui, primeiro de janeiro de 1865.

Minha cara irmã Emma, você não pode fazer idéia da beleza, da exuberância e da riqueza da
vegetação, vê-se por toda parte [arvores gigantescas cobertas de cipós, trepadeiras com flores mais
belas, coqueiros, bananeiras, bambus e nogueiras da Índia... Magnífico.

Os homens, vivendo nas bordas da baia, conservam em si uma grande ingenuidade, uma magnífica
simplicidade. Entre eles, a gente encontra figuras nobres, elegantes e com graça natural.
Orgulhosos, desfrutam de uma liberdade ilimitada, são moderados na comida e na bebida, limpos
no vestuário e sem preconceitos com relação aos estrangeiros. Os homens ocupam-se das pescarias,
as mulheres, das crianças e serviços da casa e do campo.

Musica – instrumental técnico europeu

Som de aves e água calma...

2. Colônia do Superagui 28 de dezembro de 1884.


Querida Emma, sabes que estamos no verão, faz um calor sufocante que ocasiona tempestades
terríveis/ na terça feira passada tivemos um vendaval tão forte que as casas foram destelhadas, os
campos destruídos, milho, banana e até os vinhedos foram por terra. Os cafeeiros nada sofreram, e
estão cobertos de flores, inclusive nos bosques, não se vê a não ser flores, se poderia crer que
estamos no paraíso. As vinhas estão carregadas, a colheita será em janeiro... Temos cana de açúcar o
ano todo, bananas, laranjas... O reverso da medalha são as febres constantes, a dificuldade de
criação de gado por causa dos morcegos que chupam o sangue dos animais. Pense também em um
pais que não faz frio, o verde e constante e as ervas daninhas crescem com vigor.. Apesar de todos
os inconvenientes este e um paraíso para as pessoas pobres, honradas e trabalhadoras.

Musica - instrumental técnico europeu com detalhes de musicas locais

Som de aves e água calma...

3. Colônia do Superagui 15 de agosto de 1896.

Emma, tu sabes que sou mestre-escola desde marco de 1883, tenho atualmente, uma quarentena de
rapazes e mocas entre 8 e 15 anos. Todo o ensino e dado em língua portuguesa... Eu desejo criar um
novo mundo, algo que se retenha e não possa ser destruído por um simples carnaval iconoclasta...
Ensino meus filhos durante a noite, José me ajuda na escola, Robert, o mais velho ajuda nos
trabalhos rurais junto com sua mãe. Leocádia casou-se a pouco, Elisa devera casar-se dentro de dois
ou três meses. Julia esta noiva e ainda assim me restarão, Maria com 17 anos ,Antonia com 11 e
Ana com 8. Nos costumávamos chamar as duas ultimas de As duas pequenas.

Musica- Musica - instrumental técnico europeu com detalhes de musicas locais – do violino a
rabeca

Som de aves e água calma...

4. Colônia do Superagui 7 de abril de 1899

Emma, meu amigo Louis Duriel enviara a sua irmã Louise um saco de café. Eu remeto 10 quilos
que ela te entregara e tu repartiras com Cecile, mais tarde, se o paladar e o aroma lhe agradarem,
poderei enviar o quanto queiras. Também enviarei vistas das paisagens que reproduzo
eventualmente....

Outrora a vida era muito fácil no Superagui, hoje não e mais a mesma coisa...o aumento da
população, a escassez de produtos, a falta de dinheiro, o preço crescente dos objetos de primeira
necessidade, o aumento dos impostos,... a Republica e um governo mal versador de dinheiro e tem
muitos amigos com apetites a satisfazer... a vida e difícil e cara. Não temos como outrora, a
abundancia de pescados, ostras, caça. Há muita gente, as terras boas começam a faltar e eu me
pergunto o que será do Superagui dentro de uma dúzia de ano?

Musica- Musica - instrumental técnico europeu com detalhes de musicas locais – do violino a
rabeca

Musica- Musica - instrumental técnico de musicas locais com detalhes europeus – predomínio da
rabeca

5. Colônia do Superagui 20 de novembro de 1901

A vida no Superagui e cada vez mais difícil, nossos produtos não tem nenhum valor, o café, arroz,
bananas e laranjas apodrecem no chão e não vale a pena recolhe-las. Já não temos agencia postal no
Superagui, foi fechada pelo governo federal, bem como aquela de Guaraquecaba...o titular pediu
demissão uma vez que o pagamento era uma miséria/ de modo que não posso escrever-lhe a não ser
quando houver uma boa ocasião para remeter as cartas por Paranaguá, e não sabemos como, nem
por quem, receberemos as suas, o que e deveras muito triste..

Musica- Musica - instrumental técnico de musicas locais– predomínio da rabeca, adufo

Som de aves e água calma...

6. Colônia do Superagui 8 de maio de 1902

Os conhecidos e amigos que se vão nos advertem de que estamos prestes a ir também...Mas a
questão não e morrer, e saber como e de que vamos morrer. Seria preferível não pensar nisso...Não
tenho estado apenas indisposto, mas muito doente, com febre, e tenho passado noites horríveis
numa espécie de delírio indescritível. No final de abril, meu amigo Sigwalt conseguiu cortar a febre
com medicamentos homeopáticos que continuo tomando, porem, estou muito enfraquecido, porque
não tenho comido quase nada, de vez em quando, um caldo de galinha, porque não posso suportar
nenhum alimento

Musica- Musica - instrumental técnico de musicas locais– predomínio da rabeca, adufo, pandeiro e
viola

Narrador - No dia 7 de setembro de 1902, William Michaud faleceu, aos 73 anos, rodeado por
todos os filhos e netos, como era costume no Brasil.

Em 1989 foi criado o Parque Nacional do Superagui, considerado um dos cinco


ecossistemas mais notáveis do planeta e faz parte do complexo estuarino lagunar de Iguape,
Cananéia e Paranaguá.

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