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Estado do Rio de Janeiro Poder Judiciário

Tribunal de Justiça
Comarca de Nova Friburgo
Cartório da 1ª Vara Criminal
Av Euterpe Friburguense, 201 CEP: 28605-130 - Centro - Nova Friburgo - RJ Tel.: (22) 2524-2158 e-mail:
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Fls.

Processo: 0001075-57.2014.8.19.0009

Réu preso

Classe/Assunto: Ação Penal de Competência do Júri - Homicídio Simples (Art. 121, caput - CP) E
Homicídio Simples (Art. 121, Caput - Cp) C/C Crime Tentado, Art. 14, incos II N/F Concurso
Material (Art. 69 - Cp)
Autor: MINISTERIO PUBLICO
Acusado: CRISTIANO CARVELLAS MATHEUS
Flagrante 151-01220/2014 22/02/2014 151ª Delegacia Policial

04/03/2015

____________________________________
Talita Bretz Cardoso de Mello
Matr. 33068
___________________________________________________________

Sentença
O Ministério Público com atribuições junto a este Juízo deflagrou ação penal pública
incondicionada contra CRISTIANO CARVELLAS MATHEUS devidamente qualificado nos autos,
como incurso nas penas dos artigos 121, §2º, incisos III e IV; art. 121, §2º, incisos III e IV c/c 14,
inciso II e art. 16,parágrafo único, IV da lei 10.826/03, tudo na forma do artigo 69 do Código Penal
pelos seguintes fatos narrados na denúncia:

"(...)no dia 21 de fevereiro de 2014, por volta das 17 horas e 30 minutos, no estabelecimento
denominado "Bar da galera", situado na Rua Espírito Santo, nº 45, Bela Vista, Alto de Olaria, Nova
Friburgo/RJ, o denunciado, com vontade livre e consciente de matar, direcionada à prática do
injusto penal, efetuou disparos de arama de fogo contra a vítima JAKSON MEDEIROS AROUCA
ALCÂNTRA, causando-lhe as lesões corporais descritas no Auto de Exame Cadavérico que será
oportunamente acostado, as quais, por sua natureza e sede, foram a causa eficiente da sua
morte.
Na mesmas circunstâncias de tempo e local, o denunciado, com vontade livre e consciente de
matar, direcionada à prática do injusto penal, efetuou disparos de arma de fogo e desferiu
coronhadas contra a vítima ODAIR DA SILVA, causando-lhe as lesões corporais descritas no BAM
e no AECD que serão oportunamente acostados.
O crime praticado contra Odair foi cometido por meio cruel, uma vez que o denunciado desferiu
coronhadas em sua cabeça quando a mesma já se encontrava baleada, causando-lhe intenso e
desnecessário sofrimento.
O crime praticado contra a vítima Odair somente não se consumou por circunstâncias alheias à
vontade do denunciado, diante do término das munições após alguns disparos e em razão do
pronto e eficaz atendimento médico recebido pela vítima.
Ambos os crimes foram cometidos através de meio do qual resultou perigo comum, eis que os
disparos foram efetuados em um bar onde se encontravam outras pessoas.
Ambos crimes foram cometidos mediante recurso que dificultou a defesa das vítimas, que
foram surpreendidas com o retorno do denunciado ao bar onde se encontravam, efetuando
disparos inopino.
Não sendo possível precisar desde que data, mas certamente até o dia 21 de fevereiro de
2014, por volta das 17 horas, no interior de sua residência, localizada na Rua Acre, nº 34, bairro
Olaria, Nova Friburgo/RJ, o denunciado, com vontade livre e consciente, sem autorização e em
desacordo com determinação legal ou regulamentar, possuía uma arma de fogo, do tipo pistola,

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TALITABRETZ
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marca Taurus, calibre.9 mm, sem numeração de série aparente, conforme auto de apreensão de
fls.15.
Naquela oportunidade, as vítimas se encontravam na companhia da testemunha Maria de
Lourdes, no mesmo bar emque estava o denunciado, que em dado momento saiu de lá.
Passados cerca de 10 minutos, o denunciado retornou ao bar e sacou da arma de fogo que
trazia em sua cintura efetuando inúmeros disparos contra as vítimas.
Diante do término das munições, o denunciado passou a desferir coronhadas na cabeça da
vítima Odair, já alvejada.
Após receberem notícias de que dois homens haviam sido baleados, policiais militares
compareceram ao local dos fatos, onde se depararam com a vítima Jakson já sem vida e com a
vítima Odair caída ai chão, porém ainda consciente.
Em seguida, diante da informação passada pela vítima Odair, de que o denunciado fora autor
dos disparos, tendo esta declinado seu endereço, os policiais se dirigiram à sua residência.
Quando lá chegaram, os agentes da lei foram atendidos pelo denunciado, que, trajando uma
camisa suja de sangue, confirmou a autoria delitiva.
Ato contínuo, os policiais realizaram buscas no intuito de localizar a arma de fogo, logrando
êxito em encontrá-la, sem fundo, sem mola e igualmente suja de sangue, escondida embaixo de
entulhos na escada que dá acesso à residência do denunciado e o prenderam em flagrante delito.

(...)"

O processo tramitou conforme relatório anexado aos autos, o qual passa a fazer parte integrante
da presente sentença.

Ressalte-se que o réu foi pronunciado, conforme fls. 219/223, nas penas dos artigos 121, §2º,
incisos III e IV; art. 121, §2º, incisos III e IV c/c 14, inciso II, tudo na forma do artigo 69 do Código
Penal.

Submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri na data de hoje, aos Senhores Jurados foi
apresentada uma série de quesitos, tendo os Srs. Jurados reconhecido, sempre por maioria, a
MATERIALIDADE e AUTORIA dos crimes dos artigos 121, §2º, incisos III e IV; e art. 121, §2º,
incisos III e IV c/c 14, inciso II, todos do Código Penal, não absolvendo o acusado na resposta ao
quesito obrigatório.

Deste modo, em resposta, quanto a ambas as vítimas, se o crime foi cometido através de meio de
que resultou perigo comum, já que os disparos ocorreram em um bar, onde se encontravam outras
pessoas e se o delito foi cometido mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, um vez que
estas foram surpreendidas com o retorno do denunciado ao bar onde se encontrava, efetuando
disparos de inopino, os jurados por maioria responderam afirmativamente.

Especificamente quanto à vítima Odair da Silva, quanto ao quesito da tentativa ("assim agindo, o
réu deu início à execução de um crime de homicídio, que somente não se consumou por
circunstâncias alheias à sua vontade, haja vista o término das munições e o pronto e eficaz
atendimento médico recebido pela vítima") e quanto ao quesito se "o crime foi cometido através de
meio cruel, tendo em vista que o acusado desferiu coronhadas na cabeça da vítima quando esta já
se encontrava baleada", também por maioria responderam afirmativamente.

Contudo, no que tange às duas vítimas, os jurados, por maioria, votaram negativamente
quanto aos quesitos: (i) "o réu, por embriaguez, decorrente da ingestão de álcool e medicamento
de uso controlado, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação, a
plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento"; e (ii) "o agente agiu sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta
provocação da vitima, consistente em ameaças a si e a seus familiares".

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Assim, diante da decisão soberana do Tribunal do Júri, JULGO PROCEDENTE a pretensão


punitiva estatal, e CONDENO o pronunciado CRISTIANO CARVELLAS MATHEUS como incurso
nas penas dos crimes do art. 121, §2º, III e IV; e art. 121, §2º, III e IV c/c art.14, II, do Código
Penal.

Passo à individualização e fixação da pena a ser imposta ao acusado ora condenado:

Do crime de homicídio consumado praticado contra a vítima Jakson Medeiros Arouca Alcântara

Em face da escala penal do dispositivo incriminador apontado e, atenta aos arts. 59 e 68 do


Código Penal, verifico que, quanto à culpabilidade do réu, o grau de reprovação pessoal é normal
para o injusto praticado. Não disponho de elementos seguros capazes de avaliar negativamente a
sua personalidade e sua conduta social. Além disso, as consequências do crime, bem como o
comportamento da vítima, não concorrem para o recrudescimento da sanção. Ocorre, contudo,
que as circunstâncias do crime merecem maior reprimenda penal, vez que, conforme laudo de fls.
104/108, bem como fls. 242/251, a vítima foi encontrada com mais de dez lesões, inclusive com
duas perfurações na região frontal. Por tais razões, fixo a pena-base em 13 (treze) anos de
reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes. Como foram reconhecidas pelos jurados duas qualificadoras,
quais sejam de perigo comum (inciso III) e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima (IV),
utilizo uma destas como a circunstância agravante constante do artigo 61, II, "c", CP e aumento a
pena para 15 (quinze) anos e 2 (meses) de reclusão.

Na terceira fase, não se vislumbra a presença de causas de aumento, tampouco de diminuição,


tendo em vista que os jurados votaram negativamente ao quesito de reconhecimento do artigo
121, §1º do CP, bem como do artigo 28, §2º do CP, de modo que fixo a pena quanto à vítima
Jakson Medeiros Arouca Alcântara para 15 (quinze) anos e 2 (meses) de reclusão.

Do crime de homicídio tentado praticado contra a vítima Odair da Silva

Em face da escala penal do dispositivo incriminador apontado e, atenta aos arts. 59 e 68 do


Código Penal, verifico que, quanto à culpabilidade do réu, o grau de reprovação pessoal é normal
para o injusto praticado. Não disponho de elementos seguros capazes de avaliar negativamente a
sua personalidade e sua conduta social. Além disso, o comportamento da vítima não concorre
para o recrudescimento da sanção.

Ocorre, contudo, que os jurados reconheceram três circunstâncias que, de acordo com a lei,
tornam mais gravoso o delito, quais sejam o meio cruel, o perigo comum, estas últimas constantes
do mesmo inciso (III do §2º do artigo 121), e o recurso que dificultou a defesa da vítima (inciso IV).
Considerando que a terceira circunstância foi utilizada para qualificar o delito e a segunda será
usada como circunstância agravante (artigo 61, II, "d", CP), considero o meio cruel como
circunstância que recomenda a maior reprimenda penal e a consequente exasperação da pena
base.

Além disso, no que tange às consequências do crime, percebe-se pelo depoimento da vítima Odair
em Juízo, a qual compareceu em plenário visivelmente debilitada, de muletas e com dificuldades
de se locomover, que este ficou internado por mais de 3 meses, inclusive em coma, conforme fls.
196/197, perdeu o emprego e não pode sustentar sua família, razão pela qual também merece ser
aumentada a pena base. Diante disso, fixo a pena-base em 14 (quatorze) anos de reclusão.

Não há circunstâncias atenuantes. Conforme anteriormente narrado, utilizo uma das

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circunstâncias reconhecidas pelos jurados, consistente no perigo comum, como circunstância


agravante prevista no artigo 61, II, "d", CP, razão pela qual aumento a pena para 16 (dezesseis)
anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Na terceira fase, não se vislumbra a presença de causas de aumento. Os jurados votaram


negativamente ao quesito de reconhecimento do artigo 121, §1º do CP, bem como do artigo 28,
§2º do CP. Contudo, estes reconheceram a causa de diminuição da tentativa, respondendo
afirmativamente, por maioria, ao quesito de que o réu deu início à execução de um crime de
homicídio, que somente não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, haja vista o
término das munições e o pronto e eficaz atendimento médico recebido pela vítima. Conforme fls.
196/197 e o próprio depoimento da vítima em Juízo, a tentativa restou próxima à consumação,
ficando a vítima próxima à morte, somente não se consumando o delito pelo pronto atendimento
médico, de modo que reduzo a pena em 1/3, restando a pena definitiva quanto à vítima Odair da
Silva em 10 (dez) anos, 10 (dez) meses e 20 (vinte) dias de reclusão.

Do concurso de crimes

A defesa requer a aplicação ao caso do artigo 71, parágrafo único do Código Penal, reconhecida
pela doutrina e jurisprudência como continuidade em sua modalidade específica, de modo que,
nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à
pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a
personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só
dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo.

Tendo em vista que os delitos foram praticados pelo mesmo agente, mediante mais de uma ação,
contra vítimas diferentes, de forma dolosa, com desígnios autônomos, com violência e grave
ameaça à pessoa, pelas mesmas condições de tempo e local, bem como maneira de execução,
assiste razão à defesa e aplico ao caso o artigo 71, parágrafo único do Código Penal.

No entanto, conforme tal artigo, para o cálculo da fração da exasperação, não se analisa apenas a
quantidade de vítimas dos crimes, no caso duas, devendo ser considerado pelo Juízo também as
circunstâncias do crime. Na espécie, conforme narrado nos autos e pelos depoimentos colhidos
em Plenário, os delitos foram praticados mediante diversos disparos de arma de fogo, em local
público, durante o dia e gerando consequências que visivelmente merecem maior reprimenda: (i)
seja diante das circunstâncias e consequências quanto à vítima falecida e seus familiares, vez que
o laudo de fls. 104/108, bem como de fls. 242/251, informa que o ofendido Jakson foi encontrado
com mais de dez lesões, inclusive dois na região frontal; (ii) seja pelas circunstâncias e
consequências no que tange à vítima que sobreviveu, a qual, conforme já narrado, compareceu
em Plenário de muletas e com dificuldades de se locomover, após ter ficado internado por mais de
3 meses, inclusive em coma, conforme fls. 196/197, e ter perdido o emprego. Assim, aumento a
maior pena de ½, pelo que a fixo a pena definitiva em 22 (vinte e dois) anos e 9 (nove) meses de
reclusão.

Fixo o REGIME FECHADO para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade, já que o
quantitativo da pena não autoriza a adoção de regime diverso, com base no art. 33, §2o, alínea 'a'
do CP.

Incabível a substituição da pena, já que o crime foi cometido mediante violência à pessoa e a pena
privativa de liberdade foi fixada em patamar superior a quatro anos (art. 44, I, do CP).

Também inaplicável o benefício previsto no art. 77 do CP, tendo em conta o quantitativo de pena
aplicado.

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TALITABRETZ
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Nos termos do parágrafo único do artigo 387 do Código de Processo Penal, mesmo diante do
princípio da presunção de inocência, não há razão de ordem fática ou jurídica que justifique a
liberdade do réu nesta fase processual, uma vez que presentes os requisitos previstos nos artigos
312 e 313, I e II, ambos do CPP, e que justificam sua segregação provisória, os quais se
encontram ainda mais evidentes, diante da presente sentença condenatória, com pena elevada.

Decreto a perda da arma, na forma do art. 25 da Lei 10.826/03.

Condeno, ainda, o apenado ao pagamento da taxa judiciária e das custas processuais, com
fundamento no art. 804 do CPP, destacando que eventual requerimento de isenção deve ser
formulado perante o Juízo da Execução Penal.

Deixo de fixar indenização em favor dos lesados já que tal não foi objeto de pedido expresso e,
assim, não restou submetida a questão ao contraditório e à ampla defesa. Neste sentido,
precedentes Superior Tribunal de Justiça: STJ, AgRg no AREsp. 389.234/DF, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 08/10/2013; REsp. 1236070/RS, Rel. Min.
Mauro Aurélio Bellizze, Quinta Turma, julgado em 27/03/2012.

Registrada eletronicamente. Cientes os presentes, inclusive o condenado.

Independentemente de recurso da acusação expeça-se CES provisória e encaminhe-se à VEP


para início da execução.

Após o trânsito em julgado, realizem-se as anotações e comunicações de praxe, remetam-se os


autos ao Contador Judicial para elaboração do cálculo das custas processuais, notifique-se a
vítima, adite-se a CES e arquivem-se os autos enquanto se aguarda o cumprimento da pena.

Nova Friburgo, 04/03/2015.

110
TALITABRETZ

TALITA BRETZ CARDOSO DE MELLO:000033068 Assinado em 05/03/2015 12:15:21


Local: TJ-RJ

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