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FICHAMENTO – “El proyecto político del zapatismo”, de Arturo Warman

Disciplina de História da América Independente II


Vinicius Ellero Kimati Dias – Nº USP 10340242

O texto em questão, publicado em 1990, apresenta uma análise questionadora de


pontos da historiografia tradicional com relação ao período revolucionário mexicano do
início do século. Importante destacar a presença que a Revolução Mexicana tinha na
cena política do país, inclusive no que se refere ao zapatismo, movimento analisado
pelo texto, que se conformaria como principal base ideológica para o EZLN – Exército
Zapatista de Libertação Nacional – o qual surgira alguns anos depois da publicação do
estudo de Warman e que exerce grande influência política até a atualidade na região sul
do México.
Tendo em vista a grande importância histórica do movimento analisado, o autor
inicia o texto expondo o objetivo de se contrapor a algumas visões tradicionais a
respeito do zapatismo. Tenta, então, mostrar como tal grupo revolucionário era dotado
de projeto político de transformação geral da sociedade, e não simplesmente um grupo
de camponeses organizados militarmente em torno de questões corporativas – sobretudo
o acesso à terra. Warman atribui tal leitura à noção geral de que se tem nas ciências
humanas sobre o campesinato, visto como classe atrasada, produto de estruturas sociais
anteriores à modernidade e que seria incapaz de contribuir com um projeto político
transformador, sobretudo num tempo (como as décadas de 1980 e 1990, nas quais se
situa o texto) no qual havia uma convicção bastante difundida de expansão e progresso
ilimitados da civilização e da modernidade.
Contrapondo-se a tais visões, o autor passa a buscar fontes que evidenciem a
presença de um projeto de transformação estrutural da sociedade dentro do zapatismo,
projeto este que abarcava grande parte das reinvindicações e dos ideais dos setores
políticos tidos como progressistas à época. Warman analisa primeiramente os
documentos públicos emitidos pelos zapatistas, sobretudo aqueles relacionados a
manifestos e programas políticos e legislações e decretos em áreas de controle
revolucionário. Estes documentos, formulados principalmente por um grupo de
intelectuais urbanos a serviço das tropas revolucionárias (identificados como
“secretários” do Exército Libertador do Sul), tinham caráter sobretudo propagandístico.
Seu principal objetivo político consistia na formulação e na divulgação de um programa
que, além de uma retórica revolucionária e agitativa, evidenciasse as questões e
propostas concretas defendidas pelo zapatismo. A partir destes documentos é possível
identificar a centralidade da comunidade agrária para o movimento revolucionário, que
a enxergava como protagonista do processo de mudança social e principal sujeito
econômico (a partir do acesso à terra, sobretudo), político e social da revolução.
Também são analisados documentos internos. Apesar de muitas vezes
constituírem circulares simples determinando ações práticas, essas fontes transparecem
a relação existente entre o exército revolucionário e a sociedade civil. Era muito
cultivado no zapatismo o princípio de parceria entre os poderes militar e civil
revolucionários, de forma que o Exército de Libertação do Sul não tinha pretensões de
ser um poder totalizante a partir do processo revolucionário. Pelo contrário: havia,
dentro do zapatismo, o entendimento da necessidade de, entendendo os pueblos como
centro da dinâmica da Revolução, construir uma ferramenta organizativa que
possibilitasse a incidência política popular de forma direta, nos moldes de um partido
revolucionário de massas que nunca chegou a se concretizar. O zapatismo, dessa forma,
projetava a harmonia entre os setores militarizados e o restante da sociedade através de
laços de parceria e pela construção de uma identidade de classe que partia da própria
composição do Exército de Libertação do Sul, muito similar ao restante das
comunidades do Sul do México, com uma grande maioria de camponeses pobres ou
assalariados.
Por fim, Warman identifica a prática e as medidas revolucionárias como fonte do
projeto político desenvolvido pelo zapatismo, em grande confluência com a formulação
proveniente de documentação escrita. É evidente, primeiramente, a redistribuição de
terras a partir da tomada militar de grandes latifúndios, com a divisão das terras sob
controle revolucionário entre os pueblos. No entanto, para além disso, estas áreas
passavam a funcionar sob outra dinâmica sócia, política e econômica, contrapondo-se
ao poder do Estado. A cadeia produtiva a partir da agricultura passava a ser dirigida
pelas comunidades campesinas, que também tinham poder de decisão sobre a produção
e a administração política da área. O autor, dessa forma, descreve o projeto
revolucionário zapatista, derrotado ao fim do processo revolucionário, como tendo
centralidade na tomada do poder – que abrange a necessidade do controle popular não
sobre o governo em específico, mas sobre todos os aspectos da sociedade – em vez da
luta pela tomada do governo – mais estreita e menos capaz de realizar transformações
estruturais – encabeçada pelos vencedores da Revolução.

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