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A POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA

EDUCAÇÃO INCLUSIVA:
ESTRATÉGIAS DE RESISTÊNCIA ÀS TENTATIVAS ATUAIS DE
RETROCESSO

Resumo
Pretende-se com este trabalho fazer uma análise dos aspectos legais, que
envolvem a Política Nacional de Educação Especial, na perspectiva da Educação
Inclusiva, tendo como objetivo identificar elementos que indiquem os retrocessos nessa
política e as estratégias de resistência, para que haja uma educação inclusiva. Este
trabalho se justifica, porque cada vez mais a Escola vem abrindo o seu espaço para o
acesso e participação de todos os alunos, principalmente, daqueles que necessitam de
uma educação especial e inclusiva.

Contextualizando a temática e as justificativas


Conforme apontam várias pesquisas e estudos (MANTOAN, 2003, 2014, 2018;
KASSAR, 2012; ALMEIDA; ABDALLA, 2017), pode-se dizer que, só na década de
1960 foi aprovada a Lei n. 4.024/1961 (BRASIL, 1961), que faz referência, em seus
arts. 88 e 89, ao direito dos “excepcionais” à educaçã o. Depois, a Lei n. 5692/1971
(BRASIL, 1971) acaba reforçando o encaminhamento dos alunos para as classes
escolares especiais, havendo um retrocesso a respeito do atendimento à s
necessidades educacionais.
Também, na década de 1990, a Lei nº. 9.394/96 (BRASIL, 1996), em seu art.
59, busca assegurar, pelos sistemas de ensino, o atendimento à s necessidades dos
alunos com deficiência e aceleraçã o de estudos aos superdotados. E, desde 2008, a

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Política Nacional de Educação Especial (BRASIL, 2008), na perspectiva da Educação
Inclusiva, provocou uma transformação no espaço escolar, garantindo o acesso, a
permanência e a participação de estudantes com deficiência, transtornos globais do
desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas classes comuns.
Destaca-se, ainda, o trabalho como professora da rede pública de Contagem-
MG, de educação Especial na sala de Atendimento Educacional Especializado; além
disso, como diretora escolar e assessora pedagógica do departamento de Educação
Inclusiva, na Secretaria de Educação do município. E, desde 2010, atuando nesses
espaços com o objetivo de contribuir e divulgar estudos a respeito do processo de
Educação Inclusiva.

Dos elementos de retrocesso e de resistência: uma breve análise


Trata-se de uma análise documental realizada a partir de dispositivos legais e de
referenciais teóricos, que avaliam o desenvolvimento da Política Nacional de Educação
Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. E, neste sentido, a pesquisa analisou a
legislação específica sobre essa Política, assim como os trabalhos realizados pelo
Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diferença da Faculdade de Educação
da Universidade Estadual de Campinas (LEPED), conforme Mantoan (2014, 2018).
Não se pode deixar de destacar que a Educação Especial na perspectiva da
Educação Inclusiva é uma modalidade de ensino que perpassa todas as etapas e
modalidades de ensino, não tendo caráter substitutivo à escolarização. O Atendimento
Educacional Especializado é um dos serviços da Educação Especial, realizado nas Salas
de Recursos Multifuncionais, no contraturno da escolarização, e tem a função de
identificar, organizar e elaborar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem
as barreiras, para a plena participação dos estudantes.
Entretanto, com o pretexto de “reformular” a política, o atual governo vem
promovendo o retrocesso das conquistas já efetivadas para os estudantes com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação no

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campo do direito inalienável da escola. Com isso, os ataques à Política de Educação
Inclusiva já se iniciaram na introdução da Base Nacional Curricular Comum - BNCC,
que suprime, integralmente, as contribuições da sociedade civil nas versões de 2015 e
2016 e coloca, erroneamente, a “diferenciação curricular” como uma orientação da Lei
Brasileira de Inclusão–LBI (Lei n° 13.146/2015). A referida lei assegura que diferenciar
pessoas em razão da deficiência é considerado crime de discriminação.
Quando o grupo atual sugere a retirada da expressão “na perspectiva da
educação inclusiva” abre precedentes para que a deficiência seja o foco e não as
potencialidades e capacidades de cada um. Furtam-se das pessoas com deficiência os
direitos civis, que lhes outorgam autonomia e independência conquistadas pelo modelo
dos Direitos Humanos. Equivocam-se quanto à justificativa de falta de respaldo legal da
PNEEPEI, quando esta, em verdade, está em acordo com os marcos legais nacionais e
internacionais. Colocam-se em dúvida os serviços prestados pelo Atendimento
Educacional Especializado - AEE, induzindo ao pensamento que pessoas com algum
tipo de limitação deveriam estar em espaços segregados, menosprezando o trabalho do
professor de Educação Especial. Definem, também, a modalidade de Educação Especial
como modalidade escolar, afrontando o ordenamento jurídico e permitindo a abertura e
manutenção de classes e escolas especiais. Estão, assim, empenhando-se para a
ampliação do público-alvo; o que, na verdade, reativará os modelos antigos de classes
especiais onde estavam matriculados, além dos estudantes com deficiência, estudantes
com transtornos e dificuldades de aprendizagem que eram chamados de anormais ou
crianças difíceis de educar. Instituem, ainda, o Plano Individual de Desenvolvimento
Escolar – PIDE: instrumento individual que tem como objetivo criar um currículo à
parte, trazendo de volta o papel do professor de Educação Especial, de caráter
substitutivo, que planeja, executa o programa diferenciado dos demais da turma e avalia
o estudante com deficiência, decidindo, inclusive, por sua promoção ou retenção.
Esse modelo enfatiza que o estudante com deficiência não pode estar junto com
os outros, devido ao seu desenvolvimento cognitivo abaixo do esperado, em

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comparação com os outros. Assim, ao dizerem que querem trazer novas ações para a
aprendizagem, confirmam e legitimam a indústria de cursos sobre deficiências,
desconsiderando a formação do discente que, ao se formar professor, tem acesso a
autores, pesquisas, estudos e discussões sobre o processo de aprendizagem e o
desenvolvimento de seres humanos. Não levam também em questão que o professor
trabalha com pessoas, e que todas são diferentes umas das outras. Além disso, esses
estudantes têm limitações e capacidades diferenciadas e que todas as pessoas, sem
exceção, com ou sem deficiência, têm direito a uma escola de qualidade, na qual
possam desenvolver suas capacidades ao longo de toda a vida escolar.
Por outro lado, destaca-se, ainda, que, em 2014, foram publicados os resultados
da pesquisa “A Escola e suas (trans)fomações a partir da Educação Especial na
perspectiva Inclusiva”, proposta pelo MEC e realizada pelo LEPED, da Unicamp, em
parceria com o Instituto de Pesquisa do Discurso do Sujeito Coletivo (IPDSC), no
âmbito da cooperação internacional da Organização dos Estados Ibero-Americanos para
a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI). Os dados da pesquisa demonstraram, num
universo de 357 participantes, que 81,18% dos entrevistados indicariam às famílias de
pessoas com deficiência a matrícula na escola comum e 89,14% disseram ter percebido
muitos ganhos trazidos pela educação inclusiva aos estudantes com e sem deficiência,
tanto no aspecto pedagógico quanto na socialização e aprendizagem. Percebeu-se no
processo que os sujeitos já possuem a convicção do direito à educação para todos,
cientes dos desafios que a política inclusiva propõe.
Por fim, percebe-se que, de 2008, quando foi implantada a Política Nacional de
Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, até agora, houve um
reconhecimento do capital educacional e social da inclusão escolar. Esses valores foram
reconhecidos pelos sujeitos que participam ativamente do processo: os gestores que
tentam promover mudanças e avanços na gestão pública; os professores e
coordenadores, que buscam ampliar suas práticas pedagógicas dentro da perspectiva
inclusiva. Também, não se pode deixar de incluir a participação da família, que toma

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ciência de que o direito à educação escolar é um direito humano, e do próprio estudante
com deficiência, que, ao se inserir no espaço pedagógico, pode e deve participar do
processo de ensino-aprendizagem de acordo com sua capacidade.

Referências
ALMEIDA, P. C.A.; ABDALLA, M. F. B. Formación Inicial de Docentes, Políticas de
Inclusión y desarrollo de las Competencias Siglo XXI en Brasil. Informe Estrategia
Regional sobre Docentes. OREALC: UNESCO Brasil, 2017.
BRASIL. Lei n. 4.024, de 20 de dezembro de 1961. Fixa as diretrizes e bases da
educaçã o nacional. Diário Oficial da União, 27 dez. 1961, Seçã o 1, p. 11429.
BRASIL. Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa diretrizes para o ensino de 1º e
2º graus e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 ago.
1971.
BRASIL. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases
da Educaçã o Nacional. Diário Oficial da União. Brasília: Casa Civil da Presidência da
Repú blica, 1996.
BRASIL. Ministério da Educaçã o. Secretaria de Educaçã o Especial. Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC, 2008.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Marcos Político-
Legais da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC,
2010.
BRASIL. Presidência da Repú blica. Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015. Constitui a
Lei Brasileira de Inclusã o da Pessoa com Deficiência. Estatuto da Pessoa com
Deficiência. Brasília: MEC, 2015.
KASSAR, M, C. M. Educação especial no Brasil: desigualdades e desafios no
reconhecimento da diversidade. Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 120, p.
833-849, jul./set., 2012.

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MANTOAN, M. T. E. Inclusão Escolar: o que é? Por quê? Como fazer? São Paulo:
Moderna, 2003. (Coleção Cotidiano Escolar)
MANTOAN, M. T. E. (Org.). A escola e suas transformações, a partir da Educação
Especial, na perspectiva inclusiva. Campinas: Librum Editora, 2014.
MANTOAN, M. T. E. (Org.). Em defesa da Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva. Campinas: LEPED/FE/Unicamp, 2018.

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