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Neuroanatomia

Envoltório, Cavidades e Vascularização

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Aliny Antunes

Revisão Textual:
Prof.ª Dr.ª Luciene Oliveira da Costa Granadeiro
Envoltório, Cavidades
e Vascularização

• Introdução;
• Meninges;
• Sistema Ventricular e Líquido Cerebroespinal;
• Vascularização Arterial e Venosa do Encéfalo;
• Anexo I.


OBJETIVOS

DE APRENDIZADO
• Conhecer as características dos envoltórios do encéfalo e da medula espinal;
• Conhecer as cavidades que compõem o sistema ventricular adulto, os sítios de produção e
drenagem do liquor e seu fluxo;
• Estudar as características e funções do liquor;
• Correlacionar os territórios vasculares das artérias do encéfalo e drenagens com suas
regiões funcionais.
UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

Introdução
Os ossos cranianos e a coluna vertebral envolvem o encéfalo e a medula espinal
e proporcionam um forte escudo contra a lesão traumática. As meninges são três
membranas que isolam o sistema nervoso central (SNC) do resto dos tecidos corpo-
rais, evitando, assim, que processos corporais afetem a função do SNC. O líquido
cerebroespinal (LCE) preenche os ventrículos do cérebro e o espaço entre as me-
ninges. Qualquer ruptura da geração de LCE, da circulação ou do ciclo de absorção
indica um estado patológico contínuo e requer a imediata investigação e um plano
de tratamento, pois a função primária das meninges e do líquido cefalorraquidiano é
proteger o sistema nervoso central.
Nesta unidade, iremos discutir a neuroanatomia associada às meninges, do siste-
ma ventricular e do líquido cerebroespinal, exemplificando com mecanismos fisiopa-
tológicos associados.

Meninges
As meninges são uma unidade em camadas de tecido conjuntivo membranoso
que cobrem o cérebro e a medula espinhal . Essas coberturas envolvem as estrutu-
ras do sistema nervoso central para que não entrem em contato direto com os ossos
da coluna vertebral ou do crânio.
As meninges encefálicas e espinhais se desenvolvem a partir da meninge primitiva.
Trata-se de um tecido conjuntivo mesenquimal que se origina da crista neural e do me-
soderma paraxial e envolve o tubo neural. Com a formação das lamelas de delimitação
da dura-máter, a meninge primitiva é separada em paquimeninge e leptomeninge.
Do plano mais superficial para o mais profundo, observam-se a dura-máter (pa-
quimeninge: espessa e resistente), a aracnoide e a pia-máter (leptomeninges: delica-
das e mais próximas da superfície do tecido nervoso) que revestem tanto o encéfalo
quanto a medula espinal.

Conexão clínica
Meningite é uma inflamação das meninges (do encéfalo e/ou medula espinal), mas
na prática, o termo se refere às infecções da pia-máter e da aracnoide-máter, nor-
malmente com a participação do líquido cerebrospinal, mas as infecções chegam às
meninges por diversas vias incluindo pela parte nasal da faringe. Sinais e sintomas
incluem: cefaleia; rigidez nucal, isto é, rigidez do pescoço; febre; nível alterado de
consciência e/ou irritabilidade; vômito; fotofobia; fonofobia; sinal de Kernig: inca-
pacidade de estender completamente o joelho devido à dor e à resistência quando
a coxa é flexionada a 90 graus e sinal de Brudzinski: flexão involuntária das coxas e
dos joelhos quando o pescoço rígido é flexionado. Pode ser bacteriana (Streptococcus
pneumoniae e Haemophilus influenzae tipo B; Neisseria meningiditis); viral (herpes
simples; caxumba); fúngica (cryptococcus neoformans); entre outras etiologias in-
cluindo medicamentosa. O prognóstico depende da causa e da duração antes de
iniciar tratamento. O diagnóstico é feito por punção lombar. A meningite bacteriana
é mais grave do que a viral e pode ser fatal, se não tratada.

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A dura-máter, é formada, principalmente, por tecido fibroso, com algum tecido
elástico, vasos e nervos, pode ser dividida em duas partes distintas: encefálica e espinal.

A dura-máter encefálica reveste o interior da caixa craniana, estando justaposta


internamente aos ossos do crânio e acompanhando os nervos cranianos até sua
saída pelos respectivos forâmens; por se encontrar diretamente fundida ao periósteo
interno do crânio, não se pode distinguir, sob o ponto de vista intracraniano, qualquer
espaço fisiológico entre a dura-máter e os ossos do crânio.

Na porção intraespinal a dura-máter, é a continuação do folheto interno da dura


matér encefálica através do forâmen magno que continua pelo canal vertebral até a
região sacral. No seu trajeto vertebral, não está aderida ao osso como na parte cra-
niana, assim, existe um espaço peridural espinhal (sinônimo: espaço peridural), que
envolve o saco dural e que se encontra preenchido com tecido adiposo e um plexo
venoso denso (plexo venoso vertebral interno).

Sua superfície externa (periosteal) relaciona-se com as paredes ósseas e os liga-


mentos da coluna vertebral, enquanto a superfície interna (meníngea) é lisa e polida,
revestida por epitélio simples pavimentoso de origem mesenquimatosa, e relaciona-se
com a aracnoide-máter.

Conexão Clínica
A injeção de um anestésico local no espaço epidural (ou peridural), que envolve o saco
dural espinhal, é referida como anestesia peridural utilizada em várias cirurgias e, em
obstetrícia, para bloqueio da dor perioperatória (analgesia). A agulha é introduzida no
espaço peridural, no plano sagital mediano, entre dois processos espinhosos, através
de estruturas ligamentares da coluna vertebral, sem perfurar a dura-máter espinhal.
Consequentemente, o anestésico local exerce seu efeito sobre as raízes espinhais e os
gânglios ­sensitivos do nervo espinhal, externamente à dura-máter.

Figura 1 – Esquema mostrando o crânio e as meninges cranianas


Fonte: NOURELDINE, 2019

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UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

Na Figura 1, observe a dura-máter, a membrana mais externa e mais forte


que consiste em tecido conectivo denso. Ela consiste em duas lâminas no
crânio: periosteal externa e meníngea interna; e uma lâmina ao redor da
medula espinal. Fluxos sanguíneos venosos cerebrais circulam pelos espa-
ços ou seios formados pela separação das lâminas periosteal e meníngea.

Figura 2 – Preparação anatômica destacando a meninge: dura-máter (d) e aracnoide


(a) ao longo da coluna vertebral, recobrindo a medula espinhal (m) e as raízes nervosas (r)
Fonte: JOTZ, 2017

A camada meníngea da região encefálica (é a dura-máter propriamente dita) ori-


gina quatro septos internos, que dividem a cavidade craniana em espaços livremente
comunicantes que alojam as subdivisões do encéfalo. A função desses septos é res-
tringir o deslocamento do encéfalo associado à aceleração e desaceleração, quando
a cabeça se move.
• A foice do cérebro: é um septo vertical que separa os dois hemisférios e se
localiza na fissura longitudinal do cérebro;
• A tenda do cerebelo ou tentório do cerebelo: é um septo transversal loca-
lizado entre os lobos occipitais e o cerebelo, dividindo a cavidade craniana em
uma fossa superior (supratentorial) e outra inferior (infratentorial), e terminando
na incisura da tenda, uma borda livre que se ajusta ao mesencéfalo);
• A foice do cerebelo é um septo vertical que separa incompletamente os dois
hemisférios cerebelares;
• O diafragma da sela: é uma pequena lâmina horizontal que fecha incompleta-
mente a sela túrcica (fossa hipofisária), deixando um orifício de passagem para
a haste hipofisária.

Nos pontos de formação das pregas, existem cavidades tubulares revestidas por
endotélio, os seios da dura-máter, dentro dos quais circula sangue venoso.

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Figura 3
Fonte: WASCHKE (2018) e MARTINEZ (2014 )

(A) Dura-máter craniana e septos da dura-máter. Vista lateral. (B) Vista ven-
tral de peça anatômica plastinada de dura-máter isolada, na qual se observa
a foice do cérebro medialmente e a tenda do cerebelo posteriormente.

Conexão clínica
Com o aumento da pressão intracraniana, que pode surgir no caso de uma hemorra-
gia cerebral ou devido a um tumor cerebral, partes dos lobos temporais podem ser
pressionadas na incisura do tentório (herniação tentorial). Consequentemente, os
nervos oculomotores ou todo o mesencéfalo podem ser comprimidos. O resultado é
uma síndrome do mesencéfalo, que se manifesta pela progressiva perda de consci-
ência, ausência da resposta de ambas as pupilas à luz, além de reflexos patológicos
e exacerbados nos membros.

A aracnoide-máter é uma meninge muito delicada composta de feixes de tecido


fibroso e elástico, é contínua acima através do forame magno com a parte encefálica
da aracnoide-máter e inferiormente, termina sobre o filamento terminal ao nível da
borda inferior da segunda vértebra sacral . Situa-se entre a pia-máter internamente e
a dura-máter externamente. É separada da dura-máter por um espaço virtual, o es-
paço subdural, preenchido por uma quantidade bem pequena de líquido; é separada
da pia-máter pelo espaço subaracnóideo, que é preenchido por uma quantidade bem
maior de líquido cerebrospinal.

Uma rede de filamentos de tecido conjuntivo, forma trabéculas que se dirigem à


pia-máter, apresentando um aspecto de teia de aranha, que pertencem à aracnoide
e atravessam o espaço subaracnóideo para ligar-se à pia-máter. As grandes dilata-
ções do espaço subaracnoideo são denominadas cisternas. No nível dos seios da
dura-máter, principalmente do seio sagital superior, a aracnoide apresenta projeções
chamadas granulações aracnoideas, local onde o liquor é reabsorvido e passa para a
corrente sanguínea pela drenagem venosa cerebral.

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UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

Figura 4 – Meninges e seios da dura-máter. Na secção coronal, nota-se que


as granulações se projetam para os seios venosos da dura-máter
Fonte: WASCHKE, 2018

Conexão Clínica
A aracnoide-máter passa por cima dos contornos irregulares da superfície cerebral
e, em algumas localizações nessas dobras, formam-se espaços preenchidos por li-
quor, chamados de cisternas subaracnóideas. A mais proeminente delas é a cisterna
cerebelo-medular ou cisterna magna, que é utilizada para coleta de liquor em pun-
ções suboccipitais (entre o osso occipital e 1ª vértebra). Os neurocirurgiões usam o
conhecimento anatômico das cisternas subaracnóideas para criar rotas de acesso às
estruturas intracranianas sem necessidade de incisar o tecido nervoso. Na região
inferior da coluna vertebral, existe a formação de uma cisterna lombar, abaixo do
término do cone medular, geralmente abaixo da segunda vértebra lombar. Essa cis-
terna é muito utilizada para punção e acesso ao espaço subaracnóideo com diversas
finalidades clínicas.

A pia-máter é a membrana mais interna, mais fina, mais delicada e altamente


vascularizada fixando-se diretamente no tecido nervoso central, na superfície ex-
terna seguindo todos os giros e sulcos no encéfalo e na parte proximal das raízes
nervosas da medula espinal. Essa camada composta de fibras reticulares e elásticas
dá o contorno ao sistema nervoso, sendo a ele intimamente ligada em toda a sua ex-
tensão, ela acompanha os vasos, que penetram no tecido nervoso a partir do espa-
ço subaracnóideo, formando a parede externa dos espaços perivasculares, que  são
estruturas repletas de líquido intersticial revestidas por pia-máter, que acompanham
os vasos penetrantes e se projetam profundamente no córtex cerebral. As veias ge-
ralmente não são revestidas pela pia-máter.

Na sua porção mais profunda, está em íntimo contato com uma fina camada
formada por numerosos prolongamentos de astrócitos do parênquima nervoso, a
membrana glial limitante.

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Importante!
Durante a punção lombar, é mais seguro inserir a agulha entre as vértebras L3 e L4
ou L4 e L5. A agulha passa sequencialmente por ligamento supraespinal, ligamento
interespinal, ligamento amarelo, dura-máter e aracnoide-máter para entrar no espaço
subaracnóideo. Os ligamentos longitudinais anterior e posterior estão localizados nas
faces anterior e posterior do corpo vertebral e profundos ao canal vertebral e não devem
ser atingidos; a pia-máter é uma camada fina das meninges, na superfície da medula
espinal. Durante a punção lombar, a agulha é inserida abaixo da extremidade inferior da
medula espinal e, consequentemente, não deve atingir a pia-máter.

A pia-máter medular é mais espessa, firme e menos vascularizada do que a


craniana, devido ao fato de apresentar uma camada adicional externa composta
de tecido conjuntivo, disposto longitudinalmente. Abaixo do cone medular, a pia-
máter forma uma estrutura de fixação chamada filamento terminal que se dirige
inferiormente e, ao passar pela dura-máter, continua junto com essa meninge com a
denominação de ligamento da dura-máter, indo inserir-se no cóccix como ligamento
coccígeo. Uma característica típica da pia-máter espinhal é a presença do ligamento
denticulado que são importantes elementos de fixação da medula, já que se inserem
fortemente na aracnoide e na dura-máter.

Conexão Clínica
A enxaqueca é uma forma comum de cefaleia, que pode ser unilateral ou bilateral,
recorre a intervalos e associa-se a perturbações visuais prodrômicas. Acredita-se que as
perturbações visuais prodrômicas advenham de vasoconstrição simpática das artérias
cerebrais que suprem o córtex visual. A cefaleia decorre principalmente de dilatação e
estiramento de outras artérias cerebrais e ramos da artéria carótida externa. Portanto,
a doença parece afetar artérias dentro e fora do crânio, e sua causa é desconhecida,
porém, fatores genéticos, hormonais e bioquímicos podem desencadear um episódio.

Sistema Ventricular e
Líquido Cerebroespinal
Os ventrículos encefálicos são espaços, cavidades localizadas profundamente
dentro do encefálico, revestidas por células ependimárias, e denominadas sistema
ventricular. Embriologicamente, os ventrículos se desenvolvem a partir das três
vesículas primárias que se formam após o fechamento do tubo neural: prosencéfalo,
mesencéfalo e rombencéfalo. Durante as fases iniciais do desenvolvimento, os
ventrículos se expandem de forma rápida, com um crescimento maior em relação
ao tecido cerebral ao seu redor, formando cavidades mais amplas. Na sequência, o
tecido cerebral passa a crescer mais e ocupa a maior parte da cavidade ventricular,
tornando-se pequenos espaços na vida adulta.

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UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

O sistema ventricular adulto é constituído por ventrículos laterais, direito e es-


querdo, pelos III e IV ventrículos e o canal central (ependimário) na medula espinal.
São preenchidos pelo líquido cerebroespinal (LEC), também chamado de liquor ou
líquido cefalorraquidiano, e comunicam-se entre si.

Figura 5 – Esquema do desenvolvimento do ventrículos encefálico


Fonte: JOTZ, 2017

Os ventrículos se desenvolvem a partir das três vesículas primárias que se


formam após o fechamento do tubo neural: P, prosencéfalo; M, mesencéfalo;
R, rombencéfalo. Na quinta semana de gestação, o prosencéfalo dá origem
ao telencéfalo (hemisférios cerebrais) e ao diencéfalo. O rombencéfalo
dá origem ao metencéfalo (ponte e cerebelo) e ao mielencéfalo (bulbo).
As cavidades permanecem no interior dessas vesículas em desenvolvimento
e representam os futuros ventrículos. As cavidades no interior do telencéfalo
são os ventrículos laterais, a cavidade no interior do diencéfalo é o terceiro
ventrículo e a cavidade no interior do rombencéfalo é o quarto ventrículo.
A cavidade do mesencéfalo conecta o terceiro ao quarto ventrículo e,
posteriormente, se torna estreitada, formando o aqueduto do mesencéfalo,
também chamado de aqueduto cerebral ou de Sylvius.

Os dois ventrículos laterais esquerdo e direito (ficam localizados em cada hemis-


fério cerebral), encontram-se nos hemisférios cerebrais e têm forma de ferradura em
formato de C, são considerados o primeiro e o segundo ventrículos respectivamente,
comunicam-se com o terceiro ventrículo pelos forames interventriculares.

O terceiro ventrículo é uma cavidade ímpar, mediana e localizada entre os dois


tálamos, conectando-se ao quarto ventrículo pelo estreito aqueduto do mesencéfalo
(aqueduto de Sylvius). O teto é formado pela tela corioide, com inserções laterais
nas estrias medulares do tálamo, situadas entre os forames interventriculares e a

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comissura das habênulas. O assoalho é formado pelo quiasma óptico, túber cinéreo
e infundíbulo, corpos mamilares, substância perfurada posterior e parte superior do
tegmento do mesencéfalo.

O quarto ventrículo, por sua vez, é uma cavidade situada anteriormente ao cerebelo
e posteriormente à ponte e porção alta do bulbo. É contínuo com o estreito canal
central  da medula espinal, que se abre superiormente no quarto ventrículo e
Inferiormente, estende-se através da metade inferior do bulbo e de toda a extensão
da medula espinal. No cone medular, expande-se formando o ventrículo terminal.

Margeando a parede dos ventrículos, encontram-se dobras vascularizadas de pia-


-máter chamadas de tela corióidea. São recobertas por uma camada única de células
epiteliais colunares ou cuboidais que estão em continuidade com as células ependi-
márias, revestindo a superfície dos ventrículos e formando o plexo corioide. Algu-
mas vezes, o termo plexo corioide se refere à estrutura toda, o plexo e a tela juntos.
Os plexos corióideos dos ventrículos laterais e do terceiro ventrículo se dispõem em
“formato de T” ou em “formato de seta”, com os ramos laterais do “T” quase hori-
zontais, ou com as extensões laterais da extremidade da seta se estendendo para a
face medial, na parte central e nos cornos temporais dos ventrículos laterais, enquan-
to o ramo longo vertical do “T”, ou o eixo da seta, se posiciona no teto do terceiro
ventrículo. O plexo corióideo do quarto ventrículo se projeta parcialmente para fora
das aberturas laterais, em direção ao espaço subaracnóideo.

O plexo corioide possui como principal função a produção do LEC, no entanto


mais recentemente tem-se reconhecido diversas outras importantes funções, como:
manutenção da pressão intracraniana, eliminação de substâncias e metabólitos do
LEC, manutenção da homeostase iônica liquórica e secreção de micronutrientes,
proteínas e hormônios para o desenvolvimento glial e neuronal.

Conexão clínica
Caso ocorra a produção excessiva de líquido cerebroespinhal ou esse líquido não cir-
cule ou não possa ser reabsorvido, ocorre uma hidrocefalia. A causa mais frequente
de hidrocefalia é uma obstrução que promove o acúmulo do líquido cerebroespinhal
previamente à constrição. Se tal obstrução ocorrer antes que as suturas do crânio
estejam fechadas, o aumento da pressão intracraniana pode levar a um aumento
na circunferência da cabeça. Mais tarde, o aumento da pressão provoca dores de
cabeça, náuseas e vômitos, distúrbios de consciência e de visão, estes últimos devido
à congestão nas papilas dos nervos ópticos.

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UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

Figura 6 – Observar em (a) vista lateral tridimensional dos ventrículos do encéfalo;


em (b) localização e circulação do líquido cerebrospinal (LCS)
Fonte: Toy, 2016

Conexão clínica
Os nervos ópticos são circundados por bainhas derivadas da pia-máter, aracnoide-
-máter e dura-máter. Há uma extensão do espaço subaracnóideo intracraniano para
a frente em volta do nervo óptico até o dorso do bulbo do olho. A elevação da pressão
do líquido cerebrospinal causada por um tumor intracraniano comprime as paredes
finas da veia da retina quando ela cruza a extensão do espaço subaracnóideo para
entrar no nervo óptico. Isso resulta em congestão da veia da retina, abaulamento do
disco óptico e edema do disco; o último distúrbio denomina-se papiledema. Como
as extensões subaracnóideas são contínuas com o espaço subaracnóideo intracra-
niano, os dois olhos exibem papiledema. O papiledema persistente leva a atrofia
óptica e cegueira.

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O líquido cerebrospinal encontra-se nos ventrículos do encéfalo e no espaço su-
baracnóideo em volta do encéfalo e da medula espinal é produzido principalmente
pelos plexos coroides existentes nos ventrículos e, em menor quantidade, no espaço
subaracnóideo, e pelos espaços perivasculares seu volume aproximado é de 150 mL,
sendo esse conteúdo renovado, aproximadamente, 4 vezes em um dia. É um líquido
claro e incolor e possui, em solução, sais inorgânicos semelhantes àqueles do plasma
sanguíneo. Há apenas uma pequena quantidade de proteína com algumas células
presentes, geralmente linfócitos.

Esse líquido circula através dos forames interventriculares para o terceiro ventrí-
culo, através do aqueduto do mesencéfalo (de Sylvius) para o quarto ventrículo e,
finalmente, através dos forames laterais e mediano para o espaço subaracnóideo
e, portanto, em direção aos espaços liquóricos externos. Uma quantidade pequena
é direcionada para o canal central da medula espinhal, enquanto o fluxo principal
passa pela cisterna basal e pela convexidade dos hemisférios telencefálicos para o
cerebelo e para o canal vertebral. A interação entre diferentes mecanismos de trans-
porte é descrita: além de um batimento ciliar direcionado das células ependimárias
da parede ventricular, consideram-se, também, as variações de pressão dependentes
da respiração  e uma corrente pulsátil devido a alterações do volume sistólico no
encéfalo. Circulando em pequenas quantidades através do epêndima no espaço ex-
tracelular do encéfalo ou de volta para o sistema ventricular. Ele é, principalmente,
reabsorvido através de granulações aracnóideas, em particular por meio das fovéolas
granulares (granulações de Pacchioni), no seio sagital superior, para os seios venosos
da dura-máter. Outras vias de drenagem podem ser encontradas ao longo de vasos
sanguíneos e linfáticos dos nervos cranianos e das raízes dos nervos espinhais, no
canal vertebral.

O líquido cerebrospinal serve como amortecedor entre o sistema nervoso central


e os ossos circundantes, desse modo protegendo-o contra traumatismos mecânicos
proporcionando flutuabilidade mecânica e sustentação para o encéfalo.

Vascularização Arterial
e Venosa do Encéfalo
O encéfalo é perfundido por cerca de 15% do débito cardíaco e, consequentemen-
te, recebe um suprimento contínuo de oxigênio e de glicose, por isso precisa de um
intenso fluxo sanguíneo, suprido por uma intrincada série de vasos sanguíneos que
asseguram seu adequado funcionamento. Sem esse suprimento de sangue, a função
do encéfalo falha em poucos minutos, uma vez que o encéfalo não contém r­ eservas
próprias de energia.

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UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

Basicamente, o SNC é irrigado por dois sistemas arteriais: o carotídeo e o verte-


bral. A artéria carótida comum, na margem superior da cartilagem tireóidea, bifurca-
-se e dá origem à carótida interna, elas sobem pelo pescoço (sem se ramificar) e,
após penetrarem na base do crânio, ela entra no espaço subaracnóideo, vai em dire-
ção ao nervo óptico e curva-se para cima, ao lado do quiasma óptico. Então, no iní-
cio do sulco lateral, dão origem a dois ramos principais: as artérias cerebral anterior
(acompanha o sulco situado acima do corpo caloso e origina ramos na face medial
do cérebro) e cerebral média (acompanha o sulco lateral e origina vários ramos na
face dorsolateral do cérebro).  

As artérias subclávias esquerda e direita, na altura da raiz do pescoço, originam


um ramo denominado artéria vertebra, que penetram no crânio pelo forame magno,
atravessam a dura-máter e a aracnoide-máter, estendendo-se na face ventral do bulbo,
dão ramos que irão irrigar a medula e o cerebelo e se fundem na face ventral da
ponte (parte do tronco encefálico), formando a artéria basilar, que dá origem a ramos
que vão para o tronco encefálico e o cerebelo e se divide em duas artérias cerebrais
posteriores, que irrigarão a superfície inferior do cérebro. O sistema vertebrobasilar
e seus ramos são também conhecidos, clinicamente, como circulação posterior do
encéfalo (meninges cranianas e cerebelo).

A partir das duas artérias carótidas internas e da artéria basilar, na base do cérebro,
forma-se um circuito vascular poligonal, o círculo arterial do cérebro (ou polígono de Willis).

Artéria oftálmica: Origina-se da artéria carótida interna quando esta entra no espaço
subaracnóideo, logo abaixo do processo clinoide anterior. Passa no interior da órbita pelo
canal óptico e irriga o olho e outros componentes da órbita, a área frontal do couro cabelu-
do, os seios paranasais frontais e as células etmoidais e partes do nariz. Um aneurisma da
artéria carótida interna, pode comprimir o nervo abducente e causar paralisia do músculo
reto lateral. A expansão adicional do aneurisma pode causar compressão do nervo oculo-
motor e da divisão oftálmica do nervo trigêmeo, onde estão situados na parede lateral do
seio cavernoso. 

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Figura 7 – Artérias internas da cabeça. O encéfalo é suprido por duas artérias carótidas internas
e duas artérias vertebrais e esquema do círculo arterial do cérebro (polígono de Willis)
Fonte: WASCHKE, 2018

Conexão clínica
Um acidente vascular encefálico hemorrágico pode ocorrer quando uma artéria se
rompe, desse modo liberando sangue no tecido circundante. Um AVE hemorrágico
não só produz perda de fluxo adiante, mas também pode causar dano ao tecido
cerebral no local da ruptura devido ao volume agora ocupado pelo sangue fora do
vaso. Uma causa comum de AVE hemorrágico é quando se rompe um aneurisma, ou
balonismo de uma artéria devido à fraqueza da parede muscular.

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UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

A drenagem venosa do sangue  do encéfalo ocorre independentemente das ar-


térias, as veias do encéfalo se dispõem em um sistema venoso superficial e em um
sistema venoso profundo, unidos por numerosas anastomoses vasculares.

O sistema venoso superficial é formado por veias que drenam o córtex cerebral e
a substância branca subjacente. Essas veias apresentam uma distribuição muito vari-
ável, sendo as mais proeminentes e frequentes a veia anastomótica superior, situada
sobre o lobo parietal, e a veia anastomótica inferior, na superfície do lobo temporal.
O sistema superficial drena majoritariamente para os seios sagitais superior e infe-
rior. O sistema venoso profundo drena parte da substância branca, os núcleos da
base e parte do diencéfalo. As veias que compõem esse sistema convergem para a
veia cerebral magna (de Galeno) que, por sua vez, desemboca no seio reto.

Figura 8 – Veias internas e externas do encéfalo


Fonte: WASCHKE, 2018

As veias encefálicas coletam o sangue por meio de um sistema venoso su-


perficial e de um sistema venoso profundo. Desse último, o sangue segue
para os seios da dura-máter e para a veia jugular interna.

Figura 9 – Desenho da base do crânio com o encéfalo


removido evidenciando vários seios durais
Fonte: NOURELDINE, 2019

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A vascularização da medula é bastante irregular, sendo a arterial proveniente das
artérias espinais e radiculares, essas artérias de percurso longitudinal são reforçadas
por pequenas artérias dispostas segmentarmente que surgem de artérias fora da
coluna vertebral e entram no canal vertebral através dos forames intervertebrais.
Tais vasos anastomosam-se sobre a face da medula espinal e enviam ramos para o
interior da substância das substâncias branca e cinzenta. Existe variação considerável
quanto ao tamanho e aos níveis segmentares em que as artérias de reforço surgem.
As veias da medula espinal drenam para seis canais longitudinais tortuosos que se
comunicam superiormente dentro do crânio com as veias do encéfalo e os seios da
dura-máter. Elas drenam principalmente para o plexo venoso vertebral interno.

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UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

Anexo I
Vamos Praticar
Caso clínico 09
Uma mulher de 25 anos é levado ao pronto-socorro com cefaleia grave, náusea
e febre. Familiares afirmam que a paciente estava bem de saúde até dois dias atrás.
Luzes brilhantes parecem incomodá-la (fotofobia). No exame, ela parece letárgico e
enfermo, a temperatura é de 38,8ºC, e o movimento do pescoço parece provocar
um pouco de dor. Os exames do coração e pulmão estão normais. A paciente se
recusa a flectir a cabeça para permitir que o mento toque o tórax, porque o esforço
é muito doloroso. Após uma punção lombar deu positivo para H. influenzae. Qual
o diagnóstico provável que justifique os sinais e sintomas apresentados e explique
qual ou quais estruturas neuroanatômicas comprometidas com essa enfermidade e
sua importância?
1. Observe as regiões estruturas destacadas pelos números (1-9) e faça cor-
respondência com o roteiro abaixo: Seio Sagital Superior; Granulações
aracnóideas; Dura-máter; Aracnoide; Pia-máter; Espaço subdural.

Figura 10
Fonte:  Adaptado de SCHMIDT, 2014

Caso clínico 10
Mulher de 55 anos de idade foi submetida ao um exame oftalmoscópico, e apresen-
tou edema dos discos ópticos (papiledema bilateral) e congestão das veias da retina.
Descobriu-se que a causa do distúrbio era um tumor intracraniano em rápido cresci-
mento. Usando seu conhecimento de neuroanatomia, explique o papiledema bilateral?
1. Observe a imagem a seguir e preencha os espaços com base nas estru-
turas do roteiro. Destaque a circulação do líquido cerebrospinal descre-
vendo sua circulação.

Roteiro: Terceiro ventrículo com plexo corióideo, Arqueduto do mesencéfalo, Quarto


ventrículo, com plexo corióideo, Espaço subaracnoideo, Cisterna quiasmática, Canal
central da medula espinal.

22
Figura 11
Fonte: SCHMIDT, 2014

Caso clínico 11
Ao exame físico, homem de 41 anos de idade apresentava paralisia do músculo
reto lateral do olho esquerdo; a pupila esquerda estava dilatada, mas reagia lenta-
mente à luz, e havia alguma anestesia da pele no lado esquerdo da fronte. Uma
arteriografia da carótida revelou um aneurisma da artéria carótida interna esquer-
da situado no seio cavernoso. Usando seu conhecimento de anatomia, explique os
achados clínicos ao exame físico.
1. Identifique os vasos encefálicos que estão enumerados na imagem abaixo:

Roteiro: artéria basilar, artéria comunicante posterior (direita), artéria cerebral mé-
dia (direita), artéria comunicante anterior, artéria cerebral posterior, artéria verte-
bral esquerda.

Figura 12
Fonte: SNELL , 010

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UNIDADE Envoltório, Cavidades e Vascularização

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

 Livros
Atlas Colorido de Anatomia Humana de McMinn
SPRATT, J.; LOUKAS, M.; VAN SCHOOR, A.-N.; ABRAHAMS, P. Atlas colorido
de Anatomia Humana de McMinn. 7. ed. Rio de Janeiro: GEN Guanabara
Koogan, 2014.
Importância do Raciocínio Etiológico e Topográfico de Lesões: Relato de Neuropatia óptica
Traumática conduzida como Acidente Vascular Cerebral
AZEVEDO, M. de O. Importância do raciocínio etiológico e topográfico de
lesões: relato de neuropatia óptica traumática conduzida como acidente vascular
cerebral. Rev Med Minas Gerais, v. 30, n. Supl 2, p. S15-S17, 2020.

 Vídeos
Meningite
https://bit.ly/39GV8ZY
Punção Lombar
https://bit.ly/39Iy6Cb

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Referências
COSENZA, M. R. Fundamentos de Neuroanatomia. 4. ed. Rio de Janeiro: Grupo
GEN, 2012. 

JOTZ, G. P. et al. Neuroanatomia clínica e funcional: anatomia, fisiologia e pato-


logia. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017.

MARTIN, J. H. Neuroanatomia: Texto e Atlas. Porto Alegre: AMGH editora, 2014.

MARTINEZ, A.; ALLODI, S.; UZIEL, D. Neuroanatomia Essencial. Rio de Janeiro:


Guanabara Koogan, 2014.

MENESES, M. S. Neuroanatomia Aplicada. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara


Koogan, 2011.

NOURELDINE, M. H. A. Fundamentos de Neuroanatomia: Um Guia Clinico.


1 ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2019.

SCHMIDT, A. G.; PROSDÓCIMI, F. Manual de Neuroanatomia Humana – Guia


Prático. Rio de Janeiro: Grupo GEN, Roca, 2014.

SNELL, R. S. Neuroanatomia Clínica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010.

TOY, E. C.; ROSS, L. M.; ZHANG H.; PAPASAKELARIOU, C. Casos Clínicos


em Anatomia. Porto Alegre: AMGH, 2016.

WASCHKE, J.; BÖCKERS ,T.; PAULSEN, F. Sobotta: atlas de anatomia humana.


24. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018.

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