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DIREITO EMPRESARIAL I – 2022.

Conteúdo 1 - Origem e evolução histórica do direito comercial

1 Origem e evolução histórica do direito comercial


1.1 Origem do direito comercial
 Direito Romano e o Jus Civile

 Feudalismo e a origem de um ramo autônomo do direito (séc. V)

 Jus mercatorum (lex mercatoria ou jus mercati) se com as Corporações


Comerciais (séc. XI a XVI)

Figura 1 - Império Romano em sua maior extensão - ano 117 DC

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Figura 2 – Divisão do Império Romano do Ocidente e do Oriente - ano 395 DC

► Direito Romano: existiu um Direito Comercial em Roma?

 Direito comercial especializado só existe quando se pode desenvolver


externamente, como direito internacional. No império romano, dada sua
extensão, as relações comerciais eram regidas pelo direito interno (Ius Civile).

 Não existiu em Roma ramo jurídico próprio das instituições comerciais. Porém,
existiram instituições de direito privado com vistas a satisfazer as necessidades
oriundas das transações comerciais.

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Figura 3 Europa no ano 500 D.C (Baixa Idade Média)

► Queda de Roma; Feudalismo; Idade Média (idade das trevas)

 Queda do Império Romano do Ocidente transformou a região em diversos reinos


independentes.

 Marco zero para no surgimento direito comercial como ramo autônomo do direito.

 Origem do modo de produção feudal (feudalismo): propriedade da terra como


principal fator de produção.

 Na ausência de normas e regras uniformes acerca do tráfico de mercadoria e de


pessoas, sobre tributação, cobrança de taxas, o cumprimento dos contratos etc.
os próprios comerciantes passaram a se organizar em corporações, que
legislavam (direito privado) acerca das normas aplicáveis ao comércio e
julgavam os conflitos decorrentes de seu não cumprimento (ius mercatorum).

 Busca de maior segurança à atividade mercantil em um continente que perdeu


sua unidade política.

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Figura 4 - Itália, ano 1.000 (Baixa Idade Média)

► Ius Mercatorum: “Direito Mercantil” (da mercancia; dos mercadores).

 Direito consuetudinário e corporativo, nascido da prática mercantil e apartado de


um Estado soberano. Essencialmente contratual.

 Possuía um caráter subjetivista/corporativista; jurisdição de natureza privada


(Juízos e Tribunais Consulares das próprias corporações, cujos cônsules eram
eleitos pelos próprios associados).

 Só se aplicava a quem fosse devidamente matriculado como mercador nas


respectivas corporações comerciais.

 Natureza consuetudinária das normas: originário dos usos e costumes dos


próprios mercadores a partir de compilações realizadas nos estatutos das
Corporações.

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 Corporações de Comerciais (ou Corporações de Ofício): associações de


trabalhadores que surgem na idade média para regulamentar as atividades
profissionais. No caso dos comerciantes/mercadores, especialmente as
Corporações Comerciais ou Mercantis.

 Corporações de Ofício: como instituição corporativa, impõe caráter subjetivista


ao exercício da atividade mercantil.

Figura 5 - Renascimento Comercial - Rotas de navegação (fim da Id. Média - 1492)

► Renascimento Econômico da Europa Central (em posição às “trevas” da Idade


Média)

 Expressão econômica das navegações pelo mar Mediterrâneo, sobretudo em


direção a Constantinopla.

 Comércio marítimo dominado por cidades italianas como Gênova, Amalfi,


Veneza, Milão e Bolonha.

 Regras comerciais consuetudinárias ganham credibilidade e importância e


acabam por ser reconhecidas pelos governantes da época.

 Sua aplicação é disseminada por toda a Europa, adquirindo, assim, caráter


internacional.

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 As mais conhecidas instituições do direito comercial remontam a este período,


tais como a matrícula dos comerciantes, o regime dos livros comerciais, as
instituições financeiras, a letra de câmbio, contrato de câmbio, o contrato de
seguro, etc.

Figura 6 - Europa, ano 1648 (destaque ao Reio da Itália - Alta Idade Média e Idade
Moderna)

► Decadência do comércio marítimo mediterrâneo.

 Com a conquista de Constantinopla pelos Otomanos, a pujança do comércio


marítimo pelo mediterrâneo arrefece.

 Os modernos Estados Europeus voltam seus esforços atrás da conquista de


novas terras, inaugurando o período das grandes navegações e do
mercantilismo.

 Itália deixa de ser o epicentro do comércio marítimo mas deixa como legado a
Escola Italiana que sistematizou e deu cientificidade ao direito comercial.

 A partir do século XV, o direito comercial, originariamente consuetudinário, fruto


da prática mercantil e independente de uma fonte estatal, passa a ser
incorporado pelo Estado que passa a legislar sobre a matéria, regulando às

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relações mercantis como forma de propiciar o desenvolvimento econômico em


um momento de expansão do mercantilismo.

Quem eram os mercadores?


No início da idade média (alta idade média) o mercador era o comerciante errante, que
transportava mercadorias de uma cidade a outra e com isso ganhava a vida. Era um
sujeito mal visto pela sociedade, considerado como um apátrida, sem um Senhor feudal
para servir, não vinculado a nenhuma terra.
No decorrer dos tempos, com o surgimento das grandes cidades organizadas em
burgos, os mercadores ganham expressão econômica, pois passam a dominar o
comércio e fazer fortunas, vendendo mercadorias nas feiras organizadas, participando
do tráfico crescente de mercadorias impulsionado pelo comércio marítimo no
mediterrâneo. O mercador, agora chamado de burguês (aquele que vive do burgo) em
oposição à figura do camponês (aquele que vive do campo), nos séculos finais da idade
média, já detêm o pleno poder econômico e passa a almejar também o poder político
como forma de consolidar suas instituições e incorporá-las a uma organização social e
política de base burguesa.
A “revolução” burguesa em busca do poder político – que então era exercido pela
Nobreza feudal nos Estados Absolutistas – era uma questão de tempo. Os burgueses
foram paulatinamente usando de sua organização política e poder econômico para
estabelecerem as bases e criarem as condições materiais que futuramente consolidaria
uma nova organização socioeconômica chamada Estado Liberal, cuja principal
característica estaria marcada pela transformação do modo de produção da sociedade,
que deixava de ser exclusivamente a terra (modo de produção feudal) para incorporar
a produção e circulação de mercadorias, inaugurando o modo de produção capitalista.

2 SÍNTESE DA AULA
Origem do direito comercial

► Idade Antiga

 Direito Romano (até sec. V): Inexistência de institutos autônomos de direito


comercial. Direito Romano regulava as relações comerciais como expressão de
uma obrigação do direito civil.

► Alta Idade Média (sec. V a XI):

 Fase embrionária. Feudalismo como marco zero no surgimento de um direito


comercial

► Baixa Idade Média (Séc. XI a XV):

 Fase de consolidação.

 Direito Comercial (jus mercatorum) como um direito consuetudinário (os usos e


costumes eram compilados nos estatutos das Corporações de Ofício), de caráter

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subjetivista/corporativista, com jurisdição privada (Juízos e Tribunais Consulares


compostos pelos próprios associados) e que só se aplicava a quem estava
devidamente matriculado nas respectivas associações/corporações.

► Idade Moderna – início (a partir do Séc. XV):

 Direito Comercial deixa de ser consuetudinário. Passa a ser codificado e


incorporado pelo Estado, com jurisdição estatal aplicável a todos,
independentemente de filiação às corporações.

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2.1 TEORIA DOS ATOS DE COMÉRCIO – Sistema francês (2ª Fase da


evolução do Direito Comercial)
 Corporações de Ofício perdem o monopólio da legislação e jurisdição mercantil,
cujo monopólio passa a ser reivindicado pelos Estados.

 Usos e costumes dos comerciantes mantinham relevância como fontes do


Direito Comercial (mas não o monopólio).

 Legislação estatal ocupa cada vez maior importância: Ordenações Francesas do


Comércio (Ordonnance du Commerce, de 1673) e Código da Marinha (Code de
la Marine, de 1681) que regulamentavam o direito comercial terrestre e marítimo1
e que, anos mais tarde, representariam a base sobre a qual seria redigido o
Código Comercial francês, sob o governo de Napoleão.

 Início da tradição latina de disciplinar, de forma separada, o direito comercial do


direito civil (ato mercantil x ato jurídico).

 Em 1804 e 1808, respectivamente, são publicados na França o Código Civil e o


Código Comercial Napoleônicos. O direito comercial inaugura com isso segunda
fase evolutiva histórica.

 Código Comercial Napoleônico é um marco para o direito mercantil. Influenciou


imensamente as leis comerciais dos outros países (Espanha 1829, Portugal
1833 e Brasil 1850).

 Código Comercial brasileiro de 1850 esteve em vigor até o advento do Código


Civil de 2002, quando então foi revogado expressamente e parcialmente
(apenas a Parte Primeira).

 O Código francês, sob a influência dos ideais da Revolução Francesa, que não
admitia a existência de privilégios de classes.

 Inovou ao descrever de forma objetiva toda a matéria que estaria afeta ao Direito
Comercial.

 Supera a ideia de que a legislação Comercial se destinava a uma classe de


pessoas (os comerciantes).

 Legislação Comercial passa a regular a atividade de qualquer indivíduo que


viesse a praticar determinados atos, considerados pela lei como “de comércio”,
independentemente de quem os praticasse.

 Não mais importava como critério subjetivo, a qualidade da pessoa, se


comerciante ou não, bastando que os atos por ela praticados fossem
considerados como “atos de comércio”. Surge, então, o que se chamou de teoria
dos atos de comércio, forma encontrada para tentar delimitar a matéria
concernente ao direito comercial, diferenciando-o dos outros ramos do direito,
em especial do direito civil.

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https://www12.senado.leg.br/ril/edicoes/50/198/ril_v50_n198_p59.pdf

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 A sistematização e o estudo dos atos de comércio sempre foi um problema para


os juristas, dada a inexistência de um critério comum e objetivo empregado pelo
legislador para definir o elenco dos “atos de comércio”.

2.2 A TEORIA DA EMPRESA – SISTEMA ITALIANO (3ª Fase da


evolução do Direito Comercial)
 Descrédito da Teoria dos Atos de Comércio. Busca pela criação de um critério
científico para a caracterização da matéria comercial mais adequada à
expressão do desenvolvimento econômico.

 Em 1942 (mais de um século após o Código Napoleônico) a Itália editou um novo


Código Civil, trazendo um novo sistema delimitador da incidência do regime
jurídico comercial: a teoria da empresa.

 Código Civil italiano promove uma unificação formal do direito privado,


disciplinando as relações civis e comerciais num único diploma legislativo.

 Código italiano deixa de lado a figura tradicional do comerciante e se preocupa


em definir o empresário como aquele que exercita profissionalmente uma
atividade econômica organizada com o fim da produção ou da troca de bens ou
de serviços.

 A aplicação do direito comercial passa a ser medida através da identificação da


atividade desenvolvida por uma organização empresarial (Atividade +
organização).

 Com o Código Civil italiano e a teoria da empresa, o direito comercial deixou de


ser um direito do comerciante (período subjetivo das corporações de ofício – 1ª
fase) ou um direito dos atos de comércio (período objetivo da codificação
napoleônica – 2ª fase), para ser o direito da empresa (3ª fase), para alcançar
limites muito mais amplos e adequados para a época.

 A teoria da empresa faz com que o direito comercial não regulamente apenas a
alguns atos específico, mas sim regulamente uma forma específica de exercer
uma atividade econômica: a forma empresarial.

2.3 O DIREITO COMERCIAL NO BRASIL


 Brasil Colonial (1500 a 1822): inexistência de um direito comercial brasileiro.

 Atividade mercantil era regulada pelas normas ditadas por Portugal, situação
que só se modifica com a Independência em 1822.

 Ano de 1822 é portanto o marco zero para a construção do ordenamento jurídico


nacional.

 Lei 556, de 25.06.1850: promulga o Código Comercial do Império do Brasil,


inspirado pelo Códigos de França (Napoleônico), Portugal e Espanha.

 Código Comercial Brasileiro não adotou expressamente a teoria dos atos de


comércio. Em seu art. 4.º o Código estabelecia que “ninguém é reputado

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comerciante para efeito de gozar da proteção que este Código liberaliza em favor
do comércio, sem que se tenha matriculado em algum dos Tribunais do
Comércio do Império, e faça da mercancia profissão habitual (art. 9.º)”.

 Grande dificuldade do CCom: em conceituar o que era mercancia.

a) Se fosse comerciante: competência dos Tribunais do Comércio e aplicação do Código


Comercial.

b) Se não fosse comerciante: competência dos Tribunais civis e não aplicação do


Código Comercial.

 Solução: publicação do Regulamento 737, ainda em 1850. Enumerava quais


eram os atos que objetivamente identificavam a mercancia, adotando-se, desta
forma, a teoria objetiva dos atos de comércio.

 O art. 19 do Regulamento 737, considera mercancia:

 “A compra e venda ou troca de efeitos móveis ou semoventes para os vender


por grosso ou a retalho, na mesma espécie ou manufaturados, ou para alugar
o seu uso;
 “As operações de câmbio, banco e corretagem;
 “As empresas de fábricas, de comissões, de depósito, de expedição,
consignação, e transporte de mercadorias; de espetáculos públicos;
 “Os seguros, fretamentos, riscos, e quaisquer contratos relativos ao comércio
marítimo;
 “A armação e expedição de navios.”

 Regulamento 737 vigorou até a extinção dos Tribunais do Comércio em 1875,


ocasião em que ocorre também a unificação da jurisdição civil e comercial.

 Com a revogação do Regulamento 737 (1875), seu rol enumerativo dos atos de
comércio continuou sendo levado em conta, tanto pela doutrina quanto pela
jurisprudência, para a definição das relações jurídicas que mereceriam disciplina
jurídico-comercial. Leis posteriores seguiam o mesmo caminho.

 Código Civil de 1916 manteve separada a legislação Civil e Comercial.

 Apenas em 2002 com novo Código Civil foi adotado expressamente a Teoria da
Empresa no direito brasileiro.

2.4 SÍNTESE DA AULA


Fase 1: Origens do Direito Comercial ou Mercantil:

 Direito consuetudinário (os usos e costumes eram compilados nos estatutos das
Corporações de Ofício);

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 Caráter subjetivista/corporativista, com jurisdição privada (Juízos e Tribunais


Consulares compostos pelos próprios associados) e que só se aplicava a quem
estava devidamente matriculado nas respectivas associações.

Fase 2: Atos de Comércio:

 Código Comercial Napoleônico.

 Direito Comercial deixa de ser consuetudinário.

 Passa a ser codificado e incorporado pelo Estado, com jurisdição estatal


aplicável a todos, independentemente de filiação às corporações.

 Consolida-se como um regime jurídico autônomo em relação ao Direito Civil e


baseado pela “teoria dos atos de comércio”.

Fase 3: Direito Empresarial:

 Código Civil Italiano de 1942


 Permanece estatal
 Deixa de regular apenas os “atos de comércio” e adota a “teoria da empresa”,
passando a ser um regime jurídico que disciplina toda e qualquer atividade
econômica organizada para produção ou circulação de bens ou serviços.

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