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capítulo 6

Mente

Seria o pensa-
O que é a mente? Temos almas não físicas?
da matéria física, apenas
mento simplesmente um aspecto
sendo estimulados? Como
um efeito no cérebro de nervos
podemos ter certeza de que as outras pessoas não passam
são de fato
de robôs sofisticados? Como podemos dizer que
conscientes? Todas essas perguntas encaixam-se na catego-
ria de filosofia da mente.

Filosofia da mente e psicologia

AA filosofia da mente deve ser distinguida da psicologia,


Psicolo-
embora sejam muito estreitamente relacionadas.
e do pensa-
gia é o estudo científico do comportamento
de pessoas, com
mento humanos: baseia-se na observação
frequência sob condições experimentais,
Em contraste,
não
filosofia da mente não é uma disciplina experimental:
envolve reais observações científicas, mas concentra-se na
análise de conceitos.

E)
MENTE
O BÁSICO DA FILOSOFIA

Os filósofos da mente preocupam-se com questões (Quando fazemos algo, assim como jogar tênis, usamos
conceituais que surgem quando pensamos sobre a mente, tanto nossos aspectos físicos quanto mentais: pensamos so-
Um psicólogo poderia investigar, por exemplo, disfunções bre as regras do jogo, onde é provável que nosso oponente
da personalidade, como a esquizofrenia, examinando pa- mande a próxima bola, e assim por diante, além de movi
cientes, aplicando-lhes testes, e assim por diante. Um filó- mentarmos nossos corpos. Mas existe uma real divisã
tre mente e corpo, ou isso é só um modo conveniente
sofo, por outro lado, faria perguntas conceituais como “O de

que mente?” ou “O que queremos dizer com “doença


é a falarmos sobre nós mesmos? O problema de explicar o ver-
mental?” Essas perguntas não podem ser respondidas ape- dadeiro relacionamento entre o corpo e a mente é conhecido
nas pelo exame de casos reais: elas exigem que analisemos como o Problema Mente/Corpo.
0 significado dos termos em que são expressas. Os que acreditam que a mente e o corpo são coisas se-
Para ilustrar esta questão, considerem mais um exem- paradas, que cada um de nós tem tar to uma mente quanto.
plo. Um neuropsicólogo investigando o pensamento hu- um corpo, são chamados dualistas mente/corpo.
Os que
mano poderia tecer observações sobre os padrões de acreditam que o mental é em certo sentido o mesmo que o
estímulos nervosos no cérebro. Um filósofo da mente fa- físico, que não passamos de carne e osso e não temos
ria a pergunta conceitual mais básica; por exemplo, se a qualquer substância em separado são conhecidos como
atividade desses nervos equivale ao pensamento, ou se “fisicalistas”,Começaremos considerando o dualismo e as

existe algum aspecto de nosso conceito de pensamento q principais críticas a ele.


impeça sua redução a uma ocorrência física. Ou, para ex-
Dualismo
pressar a questão de um modo mais tradicional, se tería-
mos mentes distintas de nossos corpos.
Neste capítulo, examinaremos alguns dos debates cen: |O dualismo, como vimos, envolve uma crença na existência
trais da filosofia da mente, concentrando-nos na questão de uma substância não fisica: a mental. O dualista acredita
distintas que interagem
de se uma explicação física da mente é adequada, e de se que corpo e mente são substâncias
podemos ter conhecimento das mentes de outras pessoas. uma com aoutra mas permanecem separadas. Os proces-
sos mentais, assim como o pensamento, não são o mestno
Problema Mente/Corpo células cerebr deflagrando;
que os físicos, assim como
às se
O
“5 processos mentais ocorrem na mente, ão no corpo. À

No modo como descrevemos a nós mesmos e ao mundo, mente não é o cérebro vivo.
habitualmente fazemos uma distinção entre os aspectos O dualismo mente/corpo é uma posição adotada por
muitos, particularmente por quem acredita que possível
é
mentais e físicos. Alguns aspectos mentais são: pensamen-
to, sentimento, decisão, sonho, imaginação, volição etc, sobreviver à morte corporal, seja vivendo em alguma espécie

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MENTE
(O BÁSICO DA FILOSOFIA

ser investigada cientificamente,


de
mundo de espíritos, ou reencarnando, Ambas essas em particular, não poderia
ciência só lida com o mundo físico,
Sé o que por
opiniões pressupõem que os seres humanos não são ape-
nas seres físicos, mas im que nossa parte mais importan-
porque a
derfamos examinar seriam seus
efeitos sobre o mundo.
podemos
te é a mente não física, ou, como é mais frequentemente
;
Contra isso, o dualista poderia replicar que
de introspecção; isto consi-
observar a mente por meio
é,

chamada em contextos religiosos, a alma. René Descartes


É podemos, como de
é
provavelmente o mais famoso dualista mente/corpo: esse derando nosso próprio pensamento.
de forma indireta, por meio
dlialitimo: peral-ehamado-duakámo rcarteslário (sen
É
et fato fazemos, investigar a mente
físico. À maior parte da
do “cartesiano” o adjetivo formado a partir do nome de de seus cfeitos sobre o mundo
de efeitos observados;
Descartes)” ciência funciona inferindo as causas
de uma mente não física seria uma
Um forte motivo para se acreditar que o dualismo ver- a investigação científica
de abordagem. Além disso, o
dadeiro é a dificuldade que sentimos em aceitar que algo instância desse mesmo tipo
o benefício de ex-
puramente físico como o cérebro pode dar origem aos com- dualismo mente/corpo tem pelo menos
plexos padrões de sentimento e pensamento que chama- sobreviver à morte corporal algo
plicar como seria possível
ideia da
mos de consciência. Como algo puramente físico poderia não pode fazer sem introduzir a
que o fisiclismo
produzir melancolia ou apreciar pintura? Perguntas uma
ressurreição do corpo após a morte.
assim dão ao dualismo uma plausibilidade inicial como uma
:
Evolução
solução do problema mente/corpo. No entanto, umbom
número de fortes críticas a ele como teoria. os seres humanos
Aceita-se, de uma maneira geral, que
Entretanto, um
evoluíram de formas de vida mais simples.
Críticas ao dualismo
dualista achará difícil explicar como isso
pode ter aconte-
as amebas, não
cido. Eormas de vida muito simples, como
Não pode ser cientificamente investigado
têm mente, enquanto a possuem os seres
humanos
Como, então,
e
pro-
Uma crítica às vezes levantada contra o dualismo mente/ vavelmente alguns animais superiores.
corpo é que ele não nos ajuda realmente a entender a natu-
reza da mente. Só o que ele nos diz é que existe em cada
amebas puderam dar origem a
criaturas com mente? De
onde pode subitamente ter vindo essa
substância da men-
um de nós uma substância não física que pensa, sonha, te? E por que a evoluçãoda mente forma um modelo tão
vivencia, e assim por diante. Mas, alegam fisica! tas, uma
os estreito com evolução do cérebro?
a
mente não física não poderia ser diretamente investigada:
:
crítica argumen-
Um dualista poderia responder a esta
sim por

de um tipo mui-
tando que até mesmo amebas têm mente
“Os eruditos jos (séc. XVII) utilizavam o nome filósofa em latim: a mente evoluiu em paralelo
com a
limitado, e
da da (sé
do do
época
que
época
filósofo

to
Cartesius. (1 do
19
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MENTE
(O BÁSICO DA FILOSOFIA

evolução dos corpos animais, Ou o dualista poderia dar um Contradiz um princípio científico básico
passo a mais e dizer que toda coisa física também tem uma Outro aspecto da mesma dificuldade é a contradição de um
mente de algum tipo: este último ponto de vista é conheci- iro básico da ciência. À maioria dos cientistas,
princípio
do De acordo com os panpsiquistas, toda mudança
como panpsiquismo. particularmente os fisicalistas, pressupõe que
até as pedras têm mentes primitivas. O desenvolvi evento físico ante-
em um objeto pode ser explicada por um
muito

mento da capacidade menta! humana pode então ser ex- físicos são elas próprias
rior: as causas de todos os eventos
plicado em termos de uma combinação de substâncias físicas
Então, por exemplo, se uma célula nervosa no
físicas.
cére-
e, assim, uma fusão de mentes simples para criar uma mais
bro de alguém dispara, um neuropsicólogo buscará uma causa
complexa, Entretanto, poucos dualistas são simpáticos a esta é
fisica para o fenômeno. Mas se pensamento puro, que
uma.

abordagem, em parte porque ela nubla a distinção entre os


atividade da mente, pode levar à ação, alguns eventos mera-
seres humanos e aquilo que consideramos o mundo inani tos físicos.
mente mentais podem levar diretamente à ev
mado.
Resta aos dualistas justificar a revisão de uma pressuposição
muito básica da ciência. É claro que podem alegar que essa
Interação autoevidentemente
revisão deve ser feita por ser o dualismo
A dificuldade mais séria que o dualista enfrenta é explicar verdadeiro; mas, se houver alguma dúvida a esse respeito,
é está era-
como duas substâncias tão diferentes como mente e corpo parece mais sensato
admitir
que o dualismo que
resultados
poderiam interagir. Está claro, do ponto de vista do dualista, do, e não a pressuposição científica que produziu
tão proveirosos em pesq: sas científicas
até hoje.
que, por exemplo, eu posso ter um pensamento que pode
dar origem a um movimento corporal, Por exemplo, posso
Dualismo sem interação
pensar que quero coçar o nariz, e então meu dedo vai até o
nariz e o coça. À dificuldade para o dualista é mostrar pre-
Paralelismo menteícorpo
cisamente como a ideia puramente mental pode levar ao
ato físico de se coçar. O dualista pode contornar o problema da interação men-
dificuldade torna-se mais pronunciada pelo faro de que
AA
telcorpo negando que tal interação ocorra.
Há dualistas que
eventos no cérebro estão ligados muito de perto a eventos afirmam que, embora tanto a mente quanto o corpo exis-
mentais. Por que precisamos introd.
tam, não há efetiva interação entre eles. Essa ideia peculiar
distínta do corpo, quando é óbvio, por exemplo, que um é conhecida como paralelismo psicofísico. Mente e corpo
dano cerebral grave leva a deficiência ment Se mente e dois relógios acertados no mesmo
seguem paralelos como
corpo são realmente disti tos, por que isto acontece? horário. Quando alguém pisa no meu dedão, sinto dor, mas
não porque receba alguma mensagem do
meu corpo para

195
ss)
MENTE
(O BÁSICO DA FILOSOFIA

À mente, então, é um
É simplesmente que Deus (ou então uma origem a outros eventos mentais.
a minha mente, é algo que não afeta de
coincidência cosmológica muito assombrosa) acertou meus epifenômeno: em outras palavras,
explica que é ilu-
modo algum o corpo. O epifenomenalista
dois aspectos independentes para que seguissem para- em pensado em. erguê-
lelo.No momento em que alguém pisa no meu dedão do são
crer que posso erguer a mão por ter física apenas
que
pé, as coisas foram ajeitadas de tal forma que em minha
la.

Erguer a mão seria uma ação puramente


Todos os eventos
meu pensamento,
mente sinto dor, mas um evento não é causa do outro; eles parece ser causada pelo
eventos físicos, mas
simplesmente ocorrem um imediatamente após o outro. mentais são causados diretamente por
físicos.
nenhum evento menta! dá origem a eventos
o epifenome-
Ocasionalismo Como o paralelismo e o ocasionalismo,
ismo tem pouca plausibilidade como
uma teoria da
n:
Outra tentativa igualmente peculiar de explicar essa in- tum sem-número de q:
mente, Suas respostas levantam
teração é conhecida como ocasi: lismo. Enquanto o seria a inexistência do
tões difíceis. Uma dessas questões
so
paralelismo declara que a aparente ligação entre mente e
jivre-arbftrio: nunca podemos realmente
escolher agir, ape-
relação
a
é ilusão, o ocasionalismo admite que existe uma
corpo uma mas temos ilusão de agir por escolha. E por que a
ligação, mas afirma que esta é produzida pela intervenção físicas ge-
causal ocorre apenas em uma direção — causas
de Deus, Deus fornece à conexão entre mente e corpo, en- rando efeitos mentais — e não o oposto?
tre meu dedo sendo machucado e minha sensação de dor,
minha decisão de coçar o nariz e o movimento da Fisicalismo
ou entre
minha mão,
Um problema crucial do paralelismo mente/corpo, pelo "Tendo examinado o dualismo mente/corpo junto a suas
menos em sua forma mais plausível, e com o ocasionalismo,
críticas e variantes, vamos agora
dar uma olhada no fisi-
que ambos
assumem que Deus existe, algo que, como em tef-
é
calismo, corrente que explica os eventos mentais
vimos no Capítulo 1, não é de modo algum autoevidente. eventos no cérebro. Em
mos de eventos físicos, geralmente
Além do mais, é provável que até os tefsras achem estas teo- afirma que há
contraste com o dualismo mente/corpo, que
Tias um pouco forçadas. fisicalismo é uma forma
dois tipos básicos de substância, o
de monismo: é a visão de que existe apenas
um tipo de

Epifenomenalismo substância, a física. Uma vantagem


imediata do fiscalismo

Urma terceira abordagem do problema da interação


co- é sobre o dual ismoé sugerir um programa para
n teoria, pelo menos, seria
o estudo cien-
possível ela-
nhecida como epifenomenalismo, Seus defensores afirmam tífico da mente.
fisica de qualquer evento

|
que, embora os eventos no corpo causem eventos mentais, borar uma descrição inteiramente
event Iieistalt un ca ordelonam Eventos stone nen dão mental.

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MENTI E

O BÁSICO DA FILOSOFIA

é tam-
Filósofos fisicalistas não tentam descobrir em deralhes Da mesma maneira, o estalo de um relâmpago
determinado tipo. Usa-
como estas dos cerebrais particulares combinam com pen- bém uma descarga elétrica de um
elétrica” para descrever
samentos: isso é para os neuropsicólogos e outros cientis- remos “relâmpago” ou “descarga
da situação: emuma tempestade
tas. Esses filósofos estão interessados principalmente em esse evento dependendo
científica do fe-
provar que todos os eventos mentais são físicos, e que o dua- com trovoadas ou em uma apresentação
cotidiano “relâmpago”
lismo é, portanto, falso. nômeno. Podemos usar o termo
de sua análise científica, exata-
Há diversas variedades de fisicalismo, algumas mais sem qualquer consciência
“água” e enten-
abertas a críticas do que outras. mente como podemos empregar o termo
consciência da composição
der como é ficar molhado sem a
Teoria da identidade de tipo química da água.
te/cérebro,
Ora, para voltar à teoria da identidade mer
“um estado particular
Essa variedade de fisicalismo afirma que eventos mentais “um pensamento sobre o tempo” e
de se referir a precisa-
são idênticos a eventos físicos. Um pensamento sobre o do cérebro” podem ser dois modos
duas expressões descrevem um
tempo, por exemplo, é simplesmente um estado particular mente a mesma coisa. As
do cérebro, Sempre que este estado cerebral particular ocor- delas é um tanto dife-
evento idêntico, mas o significado
te, podemos descrever tal ocorrência como pensar sobre o descrição mental “um pen-
rente. À maioria de nós usaria a
descrever o processo; porém,
tempo, Isto é conhecido como a teoria da dentidade de samento sobre o tempo” para
tipo. Todos os estados
bém estados mentais de
fi icos de
um tipo
um

particular,
tipo particular são tam- segundo
a teoria da identidade de tipo, um
ria, em princípio,
cientista pode-
fornecer uma nálise detalhada do esta-
E mais, um
o

Para deixar essa posição mais clara, considerem como do cerebral que equivale a esse pensamento.
termos “água” e “HO” referem-se ambos à mesma subs- afirmaria que todos os pen-
os teórico da identidade de tipo
tância. Usamos “água” em contextos cotidianos e “H,O” verdade estados cerebrais desse mes-
samentos assim são na
em contextos científicos. Ora, ainda que os termos se refi- dessa teoria da mente é que ela
mo tipo. Uma vantagem
ram à mesma coisa, ambos têm significados ligeiramente os neuropsi cólogos poderiam
sugere o tipo padrão que
diferentes: “água” é usado a fim de chamar atenção para as científicos do cérebro que
pesquisar, ou seja, os estudos
propriedades básicas da substância, como umidade, e assim
por diante; “HO” é usado para revelar sua composição
correspondem
a variados tipos de pensamento. Entreran

to, há diversas objeções


à teoria da identidade de tipo.
química. Poucas pessoas pedem uma jarra de “H,O” para
botar em seu uísque, e no entanto água é “H,O”; ambas
são a mesmíssima coisa.

Em
ela
MENTE
O BÁSICO DA FILOSOFIA

da ideni
Críticas à teoria da identidade de tipo característica seria uma consequência da teoria
dade de tipo. Se eu enxergo um borrão verde fluorescente
luz, essa ima-
Falta de conhecimento dos processos cerebrais após ficar olhando por alguns segundos para a
forma particulares, e no entan-
Temos conhecimento direto sobre nossos pensamentos, e gem possui tamanho, cor e
muito diverso
to meu estado cerebral é presumivelmente
no entanto a maioria de nós nada sabe sobre processos ce- ser idênti-
nesses aspectos. Como então a imagem poderia
rebrais. Há quem veja nisso uma objeção ao fisicalismo: o
ca a um estado cerebral específico?
pensamento não pode equivaler a um processo cerebral
porque é possível saber sobre o pensamento sem saber nada Todo pensamento é sobre alguma coisa
sobre neurofisiologia. Todos nós temos acesso privilegiado
à nossos pensamentos: isto é, sabemos melhor do que “Todo pensamento é sobre alguma coisa: é impossível pen-

qualquer outra pessoa quais são os nossos pensamentos sar sobre nada. Se eu penso “Paris é minha cidade preferi-
da”, meu pensamento se relaciona a um lugar no
mundo
conscientes; mas o mesmo não ocorre quanto aos estados
cerebrais. No entanto, se pensamentos e estados cerebrais real. Mas processos e estados cerebrais não parecem ser so-

são idênticos, deveriam partilhar as mesmas propriedades. bre alguma coisa: não se relacionam a algo fora deles mes-
Entretanto, essa objeção não é um problema sério para mos, do mesmo modo que os pensamentos.
o fisicalista. Podemos nada saber sobre a composição quí-
mica da água, e no entanto isso não nos impede de enten- Qualia:* como realmente é
der o conceito “água” e de reconhecer como nos sabe ao
O fisicalismo de tipo, como muitas soluções tentadas para
paladar quando bebemos. Do mesmo modo, todos os
a criticado por não
à Problema Mente/Corpo, costuma ser
pensamentos podem ser
processos cerebrais, e no entanto
levar em conta a experiência consciente: como é realmente
não há motivo pelo qual se deva esperar que os pensadores
estar em um determinado estado, Consciência pode
ser
entendam
a natureza precisa desses processos a fim de en-
tender seus pensamentos.
difícil de def mas certams nte inclui sensações, senti-
mentos, dor, alegria, desejo, e assim por diante.
À palavra

latina qualia às vezes é usada como um termo geral para


Propriedades dos pensamentos e dos estados cerebrais
abranger essas coisas.
Se um pensamento sobre minha irmã é idêntico a um certo Embora possamos falar de “água” e “H,O” como des-
estado cerebral, segue-se que o pensamento deve estar lo- crições alternativas da mesma substância,
“uma recordação
calizado exatamente no mesmo lugar que o estado cerebral.
Mas isto parece um pouco estranho: pensamentos não pa- de qualis, que quer dizer "qual
“Sem latim, quais é plaral

recemter uma localização precisa assim. E, contudo, esta da palavra “qualidade” e de suas equivalentes. (N. do 7)

[200]
MENTE
É

OO
BÁSICO DA FILOSOFIA
/

estamos ambos pensando que


deminha primeira visão de Nova York" não pode tão facil suposição dúbia, Se você e eu
nos expressar com pala-
mente ser parafraseada como “um certo estado cerebral”, 0 céu escuro está lindo, podemos
A diferença é que, no segundo caso, não estamos lidando. vras idênticas, Podemos
ambos chamar a atenção para o
pela lua,
com objetos inani jados: há um sentimento particular nessa modo particular como as nuvens estão iluminadas
Mas estaremos necessariamente
tendo
experiência consciente. No entanto, reduzir esse pensamen- e assim por diante,
to a simplesmente um estado cerebral não é uma explica
ção satisfatória, mas equivale a ignorar um dos fenômenos
mais básicos associados à consciência e ao pensamento: a
um pensamento do mesmo tipo?
Meu pensamento sobre a beleza
isolado do todo de minha experiência
E
do céu não é facilmente
de céus noturnos,

existência dos qualia. Para enfatizar esta ideia, considerem que é obviamente
muito diferente da sua. Ou, ainda, se eu
sob um pscudôn
à diferença entre os aspectos puramente físicos de uma dor acredito que o autor de 1984 escreveu
Eric Blair escrevia sob um pseu-
terrível — em termos do comportamento de células ner- mo, e você acredita que
do mesmo
vosas e assim por diante-— e a real sensação agônica da dor: dônimo, nós dois partilhamos um pensamento
de nossas convicções iriam
à descrição física fracassa completamente em captar o que tipo? Certamente afirmações
habitualmente
é realmente experimentar esse estado. referir-se ao mesmo homem, que era mais
Orwell. E,
conhecido nos círculos literários como George
fácil para essas perguntas: O
Diferenças individuals no entanto, não há resposta
vida
é dificuldade de destrinchar nossa
Outra crítica à teoria da identidade de tipo é que ela insiste que elas mostram a
comparadas à
mental em fatias equivalentes que possam ser
em que, por exemplo, pensamentos sobre o tempo devem Se é impossível de-
fatias da vida mental de outras pessoas.
ser todos estados cerebrais do mesmo tipo, mesmo quando tendo pensamentos do
terminar quando duas pessoas esto
são pessoas rentes que têm esses pensamentos, Porém, fisicalismo de identidade de tipo é
di

é possível que haja bons motivos para se acreditar que os mesmo tipo, então o
da mente.
implausível como uma teoria
cérebros de diferentes pessoas funcionem de modos ligei-
ramente diferentes, de forma que estados cerebrais diferentes Teoria da identidade de caso
em pessoas diferentes poderiam dar origem a um pen-
ainda

samento semelhante, críticas à teoria


Um modo de contornar algumas destas
Mesmo isto pressupõe que pensamentos podem ser
de
da identidade é fornecido pela teoria da identidade
tipo
ordenados: que podemos dizer onde um acaba e o outro for-
de caso. Como a identidade de tipo, a de caso, outra
começa. Uma suposição básica da teoria da identidade de são idênticos
ma de fisicalismo, afirma que os pensamentos
que duas pessoas podem ter pensamentos do mes-

]
tipo é
iferentemente da teoria
a estados cerebrais. Entretanto,
mo tipo, Em uma análise mais atenta, isto parece ser uma
Eos
O BÁSICO DA FILOSOFIA MENTE

do que pelo
de tipo, a teoria da identidade de caso aceit ja que pensa- um verdadeiro mistério: mais misterioso até
mentos do mesmo tijo não
precisam ser todos estados cere- dualismo mente/corpo.
brais do mesmo tipo, Essa teoria usa a distinção lógica entre Entretanto, teóricos da identidade de caso geralmente
“tipo” e “caso”: essa distinção é mais facilmente explicada embutem em suateoria a noção de subsequência, ou so-
através de exemplos. Todos os exemplares do livro Guerra e brevinda. Uma propriedade de alguma coisa sobrevém à
“paz são casos do tipo particular (o romance Guerra e pao); outra propriedade (literalmente, “vem em seguida”), se
se você tem um carro “Fusca” Volkswagen, possui um caso depende da outra para sua existência. Assim, por exemplo,
(ou exemplar) do tipo particular (um carro “Fusca”). O tipo pode-se dizer que a beleza (supondo-se que seja apenas su-
perficial) sobrevém a atributos físicos: se duas pessoas
é a espécie; 0 caso é a instância individual da espécie. O são

que a teoria da identidade de caso afirma é que exemplares fisicamente idênticas, é impossível uma ser bela e a outra
individuais de um tipo particular de pensamento não são não. Se adaprarmos a teoria da identidade de caso, acres-
necessariamente estados físicos do mesmo tipo. centando-lhe a ideia de que propriedades mentais são subse-
Então, quando penso "Bertrand Russel! era um filósofo”
quentes a propriedades físicas, isso significa que
se as
hoje, isso pode envolver um estado cerebral diferente de
propriedades físicas se mantiverem iguais, as mentais não
quando tive esse pensamento ontem, Da mesma maneira, paderão variar. Em outras palavras, se duas pessoas estive-
para que você tenha esse pensamento, não precisa estar no estado cerebral, terão a mesma experiência
Tem no mesmo
mesmo estado cerebral em que eu estava em qualquer das mental. Entretanto, isso não significa que, só porque duas
duas ocasiões. mental, devam
pessoas estão tendo a mesma experiência
Entretanto,
a crítica
teoria da identidade de caso fica aberta a
estar tendo o mesmo estado cerebral.
pelo menos uma importante.
Behaviourismo
Crítica à teoria da identidade de caso
O behaviourismo proporciona uma saída bem diferente do
Mesmos estados cerebrais poderiam Problema MenteiCorpo paraas teorias dualistas e fisicalistas
dar pensamentos diferentes completo a
que examinamos. Os behaviouristas negam por
Essa simplesidentidade de caso parece permitir que duas existência da mente. Vamos examinar em detalhes como esses
pessoas sejam fisicamente idênticas, até a mínima molécu- teóricos negam o que para a maioria das pessoas parece óbvio.
ja, e, no entanto, difiram mentalmente por completo. Isto Quando descrevemos a dor ou a irritação de alguém, isso
parece tornar o mental também muito independente do não é, afirma o behaviourista, a descrição de uma experiên-
físico, tornando o relacionamento entre o físico e o mental cia mental. Em vez disso, é uma descrição do comportamento.

205
MENTE
(O BÁSICO DA FILOSOFIA

da diferença entre um
público da pessoa ou de seu comportamento potencial em não há lugar para uma explicação
ator convincente e alguém que está
de fato em sofrimento,
situações hipotéricas, Em outras palavras, é uma descrição
desta-
do que ela faria em tais e tais circunstâncias, isto é, de suas Contra esta objeção, um behaviourista poderia
de alguém fingindo estar
disposições de comportamento, Estar com dor é ter uma. car que uma análise disposicional
tendência a contrair-se, gemer, chorar, gritar, dependendo, com dor seria diferente da
de alguém efetivamente sofrendo
da intensidade da dor. Estar irritado é tender a gritar, bater fosse superficialmente
de dor. Embora seu comportamento
os pés no chão e responder grosseiramente às pessoas. Em- semelhante, haveria com certeza circunstâncias em que
eles
dor di-
bora falemos sobre nossos estados mentais, de acordo com o difeririam, Por exemplo, alguém fingindo estar com
behaviouismo isto é uma maneira taquigráfica de des-

ficilmente seria capaz de reproduzir todos os acompanha-
rever nosso comportamento e nossas tendências a nos com- mentos físicos da dor, como mudança de temperatura e
portar de certos modos. Esse modo taquigráfico de descrever sudorese.Da mesma maneira, alguém fingindo estar com
“o
comportamento mental levou-nos a acreditar que a mente dor reagiria muito diferentemente a drogas analgésicas:
o
é algo à parte: Gilbert Ryle (1900-1976), filósofo beha- co-
fingidor não teria como dizer quando as drogas haviam
viourista famoso, em seu livro O conceito de mente chamou sofre dor se daria conta
meçado a funcionar, enquanto quem
essa visão dualista de “o dogma do fantasma na máquina”, o
fantasma sendo a mente, e a máquina, o corpo.
rapidamente destes efeitos.
A explicação do behaviourista torna o
problema men- Qualia
telcorpo um pseudoproblema, não um problema autênti-
co. Não há problema em deixar de detalhar a relação entre
Uma outracrítica ao bebaviourismo é que a teoria não
mente e corpo porque a experiência mental é facilmente estar em
abrange qualquer referência a como realmente
é
explicada em termos de padrões comportamentais, Então,
reduzir todos os eventos
em vez de resolver o problema, os behaviouristas alegam um estado mental particular, Ao
behaviourismo
tê-lo dissolvido. mentais a tendências comportamentais, o
É certamente crítica
deixa os qualia fora da equação, uma
ele reduz a experiência da dor
Crítica ao behaviourismo importante à teoria a de que
e dizer “Estou com
uma disposição para gritar, retrair-se
é
a
dor”, Existe realmente a sensação de como estar com dor,
Fingimento
da vida mental, algo que, no
e esse é um aspecto essencial
Uma critica às vezes feita ao behaviourismo é que não pode behaviourismo ignora.
entanto, o
estabelecer distinção entre alguém efetivamente com dor e
alguém fingindo estar com dor. Se tudo que se diz sobre o
mental for reduzido a descrições de comportamento, então

206
(O BÁSICO DA FILOSOFIA MENTE

Como fico sabendo sobre minhas próprias convicções? Dor dos paralisados

De acordo com o urismo, o modo como fico saben-


behavi Já que o behaviourismo baseia-se inteiramente nas reações
do sobre mi: has próprias convicções é o mesmo pelo qual ou potenciais reações do indivíduo em questão, isto signi-
fico sabendo das convicções de outras pessoas, ou seja, pela fica, em uma análise behaviourista, que pessoas completa-

observação do comportamento. Mas esta é uma imagem mente paralisadas não podem ter experiência mental. Senão
imprecisa do que se passa de fato. Talvez seja verdade que eu podem e nunca poderão se mover, como podem se com-
de algum modo? Um behaviourista teria de dizer que
possa fazer descobertas interessantes sobre o que realmente portar
acredito prestando atenção ao que digo e monitorando o que “os totalmente paralíticos não podem sentir dor, uma vez

de dor. No
faço em circunstâncias Variadas. Entretanto, não preciso fa- que não demonstram qualquer comportamento
zer observações acerca de meu próprio comportamento a fim entanto, pelo testemunho de pessoas que ficaram paralíti-
de saber coisas como a minha convicção de que assassinato é cas e recuperaram o movimento, sabemos que pessoas pa-
errado, ou de que eu vivo neste país. Sei dessas coisas sem ralisadas têm com frequência uma experiência mental mui
rica, e, certamente, a capacidade para sentir dor.
precisar agir como um detetive
particular investigando meu
próprio comportamento. Assim, o behaviourismo não for-
Convicções podem causar comportamentos
nece uma explicação satisfatória da diferença entre caminhos
para o autoconhecimento e modos de descobrir sobre as con- Outra crítica ao behaviourismo que à teoria não admite a
é

Vicções de outras pessoas. possibilidade de que as convicções alheias possam ser a causa
Uma réplica
possível a essa crítica é que o que eu faço de seu comportamento. Em uma análise behaviourista, ves-
quando estou introspectivo, olhando dentro de mim mes- tir sua capa de chuva não é efeito da convicção de que está
mo, para ver se acredito que, por exemplo, a tortura é cruel, chovendo. Em vez disso, é a tendência a vestir uma capa de
é pensar comigo mesmo: “O que eu diria e faria se soubesse chuva que constitui o principal elemento da convicção.
que alguém está sendo torturado?” À resposta a essa per- Eventos mentais não podem provocar comportamentos
dos comportamen-
gunta me revelaria então as has disposições relevantes. porque não existem independentemente
Se isto for verdade, então o behaviourismo está justificado tos: de acordo com o behaviourismo, eventos mentais são
modos.
por assumir que não há diferença importante entre desco- apenas disposições a se comportar de determinados
brir sobre o seupróprio caso e descobrir sobre o de outra Porém, é certamente verdade que, pelo menos ocasional-

pessoa. Entretanto, essa análise da introspecção não é par- mente, nossos eventos mentais produzem certos compor-
ticularmente convincente: cla não combina com minha tamentos, Ponho minha capa porque acho que vai chover
Mas um behaviourista não poderia usar minha convicção
percepção do que faço quando estou introspectivo,
de que vai chover, nem mesmo como uma explicação de

208 209
MENTE
(O BÁSICO DA FILOSOFIA

adaptado para uso


meu comportamento, porque minha convicção é na ver- 1 hardware executa, O software pode ser
um
em vários sistemas diferentes, O software geralmente
dade constituída pelo comportamento e por minha dispo- é

Sição a me comportar de determinado modo: a convicção complicado sistema deinstruções ao hardware do computa-
modos di-
€ a ação não são separáveis. dor que pode ser executado fisicamente de vários
ferentes, mas alcançando o mesmo resultado.
Funcionalismo O funcionalismo, como teoria da mente, se interessa
pelo software do pensamento, e
não pelo handivare, Nisto
O funcionalismo é uma abordagem do Problema Mente/
(Corpo desenvolvida recentemente, Ela se concentra no-pa-
ele se parece com
o behaviourismo. Em contraste, o fisi-
calismo se interessa por demonstrar a relação entre certos
pel funcional dos estados menta : na prática, isso significa (bits de hardware — o cérebro humano — e um pacote
de

concentrar-me nas entradas, nas saídas e a relação entre es- humano. O funcio-
software em particular, o pensamento
tados interiores, Um funcionalista define qualquer estado nalismo não é de modo algum uma teoria sobre o hardiare
mental em termos de suas relações típicas com outros esta- do pensamento, embora seja certamente compatível com
dos mentais e seus efeitos sobre o comportamento. Assim, ele é neutro sobre em que tipos
vários tipos de fisice lismo:
um pensamento sobre o tempo é definido em termos de de sistemas físicos os programas mentais operam. Seu prin-
Suas relações com outros pensamentos e com o cor orta- cipal interesse é especificar as relações que se
mantêm entre
mento: o que me leva a ter o pensamento, sua relação com diferentes tipos de pensamento e comportamento.
meus outros pensamentos, e o que ele me leva a fazer. Como
tal, o funcionalismo se beneficia de alguns dos insighes do Crítica ao funcionalismo
behaviourismo — como a associação íntima entre ativida-
de mental e disposições comportamentais — enquanto Qualia: computadores e pessoas
admite que eventos mentais poder de fato ser causas de
Enquanto ofuncionalismo é uma teoria da mente extre-
comportamentos,
O funcionalismo pode ser mais facilmente entendido mamente popular entre filósofos, uma crítica frequente a
ele é que não considera à experiência e as sensações cons-
por meio de uma comparação com a relação entre um feliz, pensar sobre o
cientes: como é estar com dor, estar
e
computador seus programas, Quando falamos sobre com-
tempo, e assim por diante.
putadores, é conveniente fazer uma distinção entre hardware
e software, O hardware de um computador é aquilo de que
Uma objeção semelhante costuma ser feita contra o
concretamente é feito: transistores, circuitos, chips de silico- ponto de vista de que computadores podem ter
mentes. Por
Searle (1932-)
ne, tela do monitor, teclado e assim por diante. O software, exemplo, o filósofo contemporâneo John
destacar a dife-
usou uma experiência de pensamento para
por outro lado, é o programa, o sistema de operações que

Fo]
216
EM
o BÁSICO DA FILOSOFIA MENTE

rença entre um que compreende uma história


ser humano não capta uma compreensão autêntica, tornando-a equi-
e um computador “compreendendo” outra. Imagine que valente a uma manipulação de simbolos,
você está trancado em um aposento. Você não entende
chinês, Por meio de uma bandeja de correspondência na porta Outras mentes
entram vários caracreres chineses impressos em pedaços de
cartolina, enquanto sobre uma mesa estão um livro e uma. Já examinamos a maioria das principais tentativas de resolver
pilha de pedaços de cartolina com outros caracteres chi- 0 Problema Mente/Corpo. Como vimos, nenhuma teoria da
neses. O que você precisa fazer é comparar o caractere mente é satisfatória por completo. Vamos passar agora a uma
chinês no pedaço de cartolina que chegou pela bandeja outra questão da filosofia da mente, o chamado Problema das
com um caractere chinês do livro. O livro então indicará
Outras Mentes, Como eu sei que os outros pensam, sentem e
são conscientes do mesmo modo que eu? Sei com certeza quan-
um outro caractere, diferente, que faz par com ele, Você
deve tirar esse outro caractere da pilha de pedaços de car- do estou com dor, mas como possa ter certeza de que alguém
tolina sobre a mesa e mandá-lo de volta pela bandeja. Fora mais está? Do modo como vivo a minha vida, pressuponho
do aposento, parece que você está respondendo a pergun- que as outraspessoas são seres conscientes, capazes de expe-
Tiências muito semelhantes às minhas. Mas como posso saber
tas sobre uma história em chinês. Às cartolinas que entram
disso com certeza? Pelo que sei, os outros poderiam ser robôs
no aposento são perguntas escritas em chinês; as que você
manda de volta são as suas respostas, também em chinês,
altamente sofisticados ou, como às vezes são chamados, autô-

Mesmo você não entendendo uma palavra de chinês, de matos programados para reagir como se tivessem uma vida
interior, quando na verdade não têm.
fora do aposento parece que você está entendendo a histó-
Embora isso possa parecer uma forma de paranoia, é
ria e dando respostas inteligentes às perguntas que lhe
uma pergunta séria a que filósofos dedicam muita atenção.
são feitas. No entanto, você não entende a história: está
Um estudo revela importantes diferenças entre o modo
simplesmente manipulando o que para você são carac-
teres sem sentido.
como chegamos
a
ficar sabendo sobre nossa própria expe-
riência e o modo como ficamos sabendo sobre a experiên-
O chamado programa de computador “inteligente”
cia das outras pessoas.
encontra-se na mesma posição que você na experiência de
pensamento do "salão chinês”, de Searle. Como você, ele Não é um problema para o behaviourismo
apenas manipula símbolos, sem entender autenticamente
a que se referem. Consequentemente, se pensarmos no fun- (Antes de examinar modo mais comum
o de
responder a
cionalismo pela analogia do computador, sugerida acima, essas dúvidas sobre a experiência das outras pessoas, vale
ele não pode nos dar uma imagem completa da mente, Ele à pena destacar que o problema das outras mentes não se

23
O BÁSICO DA FILOSOFIA MENTE

coloca para behaviouristas, Para um behaviourista, é cla- Críticas ao argumento por analogia
ramente apropriado atribuir experiência mental aos ox
Não é uma prova
tros, com base em seu comportamento, uma vez que é isso
0 que a mente tendências a se comportar de certos mo- O argumento por analogia não fornece uma prova conclu-
dos em certas situações. Isso dá origem à infame piada
siva de que as outras pessoas têm mentes, Argumentos por
behaviourista: dois behaviouristas fazem sexo e depois um
analogia exigemo apoio de muitas evidências. Mas no caso
diz para o outro — “Foi ótimo para você; e para mim, deste argumento por analogia existe apenas uma única ins-
como foi?” tância — eu mesmo — em que testemunhei a ligação en-
tre um certo tipo de corpo e comportamento e um certo
O argumento por analogia tipo de consciência,
Não somente isto, mas há muitos aspectos em que os
diferem dos
resposta mais óbvia à dúvida sobre se outras pessoas são corpos é o comportamento de outras pessoas
AA

do que
conscientes é um argumento por analogia. Como vimos no meus. Essas diferenças podem ser mais importantes
Capítulo 1, quando examinamos o Argumento do Desig- as semelhanças: eu poderia usar um argumento por analogia
não para a existência de Deus, um para demonstrar que as diferenças meu corpo e meu
argumento por analogia
entre

se baseia em uma comparação entre duas coisas muito se- comportamento e os de outras pessoas indicam uma prová-
melhantes. Se uma coisa é semelhante a outra em alguns vel diferença em tipos de experiência mental entre nós. Além
analogia, sendo indutivos, só podem
aspectos, presume-se que também o será em outros. disso, argumentos por
Há pessoas que se parecem comigo em muitos aspec- dar evidênci provável para suas conclusões: unca podem
melhor das hipóre-
tos importantes: somos todos membros da mesma espécie, provar algo conclusivamente. Então, na
ses, esseargumento só poderia demonstrar que é bastante
com corpos e comportamentos muito semelhantes. Quan-
do experimento uma dor extrema, eu grito, e assim tam- provável que outras pessoas tenham mente, Não é uma pro-

bém o faz a maioria dos membros da espécie humana va dedutiva, mas, como vimos no capítulo sobre a ciência,
não há prova de que o sol se levantará amanhã, e no entanto
quando estão em situações de dor. O argumento por ana-
temos bons motivos para nos sentir seguros de que assim
será.
logia alega que as semelhanças no corpo e no comporta-
mento no meu próprio caso e nos de outras pessoas são Inverificável
suficientes para que eu infira serem as outras pessoas ge-
nuinamente conscientes do mesmo modo como eu sou. Parece não haver modo algum de mostrar conclusivamen-
te que uma afirmação como “ele está sentindo dor" é ver-
dadeira ou falsa. Só porque alguém grita, não significa que

E)
MENTE
(O BÁSICO DA
FILOSOFIA

do que se escreveu nesta


está sentindo o mesmo tipo de coisa que eu quando estou da mente, Como resultado, muito
técnico. Os livros relaciona-
em dor extrema. Pode não haver dor alguma, Qualquer área é altamente sofisticado e
pelo com-
relato verbal de sua experiência é desconfiável: um robô dos a seguir devem lhe dar alguma orientação
sobre este assunto.
poderia ter sido programado para responder convincente plicado labirinto de cexcos
mente nessas circunstâncias. Não há observação possível
Leituras adicionais
capaz de confirmar ou refutar a ideia de que aquela pessoa
está sentindo dor. Obviamente, o grito seria suficiente, em
casos concretos, para confirmar a dor alheia. Mas, de um A melhor introdução à filosofia da menteThe Philosophy
é

R. Jones (Cambridge: C
ponto de vista lógico, o comportamento não dá prova ofMind, de Perer Smirh e O.
absoluta de dor (embora a maioria das pessoas trabalhe com 1986): é claro e informativo sobte
bridge University Press,
a pressuposição de que ele é confiável). nessa área. Matéria
a maioria dos debates contemporâncos
É claro
que podemos achar muito forçado supor que P. M. Churchland (São Paulo: Unesp,
e consciência, de
Theories of the Mind, de
os outros não são conscientes. Então, podemos já ter tanta 2004), é outra introdução útil.
certeza de que as outras pessoas têm mesmo mentes que 1991), faz um levanta-
Stephen Priese (Londres: Penguin,
não precisaríamos de uma prova conclusiva dessa questão da filosofia da
mento critico das principais abordagens
— por certo a maioria de nós age partindo do pressuposto The Character of Mind, de
mente, Também recomendo
de que elas têm, na maior parte do tempo. O solip
Colin McGinn (Oxford: Oxford University Press, 1982),
como vimos no capítulo sobre mundo externo, não é uma
o
embora seja bastante difícil em alguns pontos.
posição defensável. R. Hofstadter e
The Minds 1, organizado por Douglas
1982), é uma cole-
Conclusão Daniel C. Dennett (Londres: Penguin,
rânea interessante agradável de artigos, meditações e con-
e
filosóficas sobre a mente, Tncl
Este capítulo concentro: se em debate sobre dualismo, tos que tratam de ideias
“Minds, Brains, and Programs”, em
fisicalismo e o Problema das Outras Mentes. São questões artigo de John Searle
cruciais na filosofia da mente. Uma vez que a filosofia tem que se discute se
computadores podem realmente pensar,
bastante in eresse na natureza do pensamento, grande par- o tópico de
Mechanical Mind, de Tim Crane (Londres:
te dos filósofos, sobretudo os que se especializam na filoso- Philosopy ofMind, organizado por
Penguin, 1996). Modern
1995), é
fia da mente, privilegiaram o tipo de questões discutidas William Lyons (Londres: |. M. Dent, Everygman,
lo em boa parte das questões filosóficas. Certa-
outra antologia úti! de artigos.
itos dos filósofos mais brilhantes do século XX
concentraram suas energias em questões sobre a filosofia

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