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Fisiopatologia da diabetes
A descrição feita por Kylin sobre interação entre a hipertensão, a
hiperglicemia e a gota como sendo uma síndrome foi definida em 1923.
Após essa determinação, outros desequilíbrios de metabolismo e
sequenciamentos foram agregados e, em 1948, Himsworth descreveu que
os pacientes com DM seriam divididos em dois grupos: os sensíveis e
os insensíveis à insulina. Reaven, em 1988, escreveu sobre esse tipo de
resistência que, incitada pelo aumento constante da glicose periférica,
acometia grande parte dos indivíduos com DM e os intolerantes à glicose,
e também os não obesos sem intolerância à glicose.
A etiopatogenia da resistência à insulina pode ser descrita como um
desequilíbrio central interligado à síndrome metabólica, podendo ser uma
resposta biológica inferior à que seria normal da insulina circulante.
Alguns estudos citam que a resistência à insulina pode estar como
responsável clínica de patologias com grande predominância na
população, incitando problemas de saúde pública.
A DM acometida com a resistência à insulina é uma patologia que agride,
pelo menos, 136 milhões de pessoas no mundo, sendo que 30% são
indivíduos da terceira idade. Por isso, com o aumento no número de
idosos e da expectativa de vida somados aos aspectos negativos que a
modernidade proporciona aos hábitos diários, a incidência de um
constante e crescente aumento neste número é avassalador para a saúde
pública.
A DM e a resistência insulínica estão associadas à queda HDL-c
(lipoproteína de alta densidade - colesterol bom) e à elevação das taxas do
TG no plasma (tireoglobulina), que ocorrem porque transformações na
atividade enzimática promovem participação no metabolismo e na
remodelação das lipoproteínas.
Ainda sobre o que a resistência à insulina acomete, é importante citar que
ela cinge uma alta liberação de secreção pancreática do hormônio,
promovendo a hiperinsulinêmia, uma compensação para tentar evitar a
alta taxa de glicemia. O que temporariamente proporciona uma tolerância
normal à glicose. Podemos descrever, então, que essa resistência se dá
por irregularidade no pré-receptor, receptor ou pós-receptor. É conhecido
que a insulina trabalha em associação com o IGF-1 por meio de uma trilha
enzimática comum denominada sistema fosfatidilinositol quinase 3 (PI3-
quinase), e os hormônios unem-se aos receptores das células,
promovendo a autofosforilação de uma subdivisão, o que mexe com
algumas enzimas e inibindo outras. Os depósitos da tirosina, que são
formados pela fosforilação das proteínas ativadas, fixam-se para não
haver desprendimento à PI3-quinase. Ocorre, então, um aumento da
disputa pelos sítios de ligação, de maneira harmoniosa, de acordo com o
aumento da ação da enzima, como nos de hiperinsulinemia. Quando os
sítios de ligação são ocupados por resíduos de tirosina, é produzida uma
resistência às ações da insulina que promovem a condução da glicose com
incentivo à produção de óxido nítrico vascular que se dá nos tecidos
vulneráveis, ou seja, o muscular e o adiposo.
Depois desse fato, é desenvolvida uma perturbação ou aumento da ação
da célula beta além do esperado, e, assim, inicia-se uma redução da
função pancreática, que diminui a produção de insulina, para então se
revelar como uma intolerância à glicose, instigando a elevação da glicemia
entre uma ou duas horas após uma refeição, o que é denominada de pós-
prandial. À medida em que a progressão dessa insuficiência ocorre, é
possível observar a instalação da DM. No que concerne à resistência à
insulina, há outras patologias como a dislipidemia, a obesidade, a
aterosclerose e a hipertensão arterial.
O aumento da gordura na região abdominal viabiliza o crescimento da
quantidade de células adiposas no local, o que também estimula o aporte
sanguíneo. Com isso, nesta região estão localizados mais receptores para
os glicocorticoides e os androgênios. Por esse motivo, há uma maior
degradação de lipídeos em ácidos graxos e glicerol, compelidos por
catecolaminas. Esse conjunto de acontecimentos faz com que as células
estejam mais sensíveis ao estímulo hormonal, possibilitando um
desarranjo metabólico e podendo acarretar em processos que geram
acúmulos de gordura no tecido adiposo.
No que se refere à genética, existe uma promoção da elevação na
quantidade de insulina no plasma que codifica a glicoquinase, tendendo a
uma diminuição da aptidão da célula beta de elevar os níveis de produção
da insulina. E, portanto, a interação da resistência ao hormônio
ocasionaria o quadro da DM.
Com a fisiopatologia alterada pelo metabolismo ativado em excesso, os
rins demonstram uma interação com a insulina, que mede a absorção do
sódio, e, com isso, induz a quadros nos quais o indivíduo sofre com a
hipertensão. O mesmo ocorre nas mulheres com hiperinsulinemia, pois
elas podem sofrer com o aumento da produção de andrógenos e
desenvolvimento de policistos no ovário (síndrome do ovário policístico).
Essa associação pode causar a síndrome Hair-na, caracterizada como
aquela que proporciona a elevação da quantidade de pelos em regiões do
corpo, formação de acne, aumento da oleosidade na pele, irregularidade
no período menstrual, pigmentação mais escura da pele em estruturas
como as articulações do cotovelo e joelho, virilhas, axilas e pescoço,
chamada de acantose nigricans.
A síndrome metabólica tem várias características, é cheia de
complexidade, sendo interligada com resistência à insulina e condições
associadas a ela, como fatores genéticos, genéticos, maus hábitos
alimentares, obesidade centrípeta, perturbação na camada celular que
reveste o interior de vasos sanguíneos e linfáticos, e estímulos
persistentes do sistema imunológico inato.
Resumindo a resistência insulínica em etapas, a Figura 5 exemplifica o
pâncreas produzindo insulina após uma refeição, para que consiga
conduzir a glicose e auxiliar entrada sua nas células. Assim, a insulina
secretada chega, principalmente, nas células musculares e promove a
produção da energia a partir da queima da glicose. Logo depois de ocorrer
a junção da insulina nos receptores químicos das células, há o
carregamento da glicose para dentro da célula. No caso da resistência à
insulina, uma quantidade de receptores é avariada, anulando seu efeito;
no entanto, caso as células apresentem grande quantidade de ácidos
graxos, como no caso da obesidade, infecções crônicas ou fatores
genéticos, interagem de forma incorreta na sinalização e no efeito da
insulina. Por isso, não é possível absorver a glicose, fazendo com que o
pâncreas tenha que compensar ao produzir taxas maiores de insulina
para, então, aumentar os níveis da glicose circulante no sangue.
👍
Muito bem, a resposta está correta!
O pâncreas é uma glândula endócrina que realiza a produção de um
hormônio denominado insulina, que, por sua vez, tem a função de
regular as taxas de açúcar no sangue. Com sua função exócrina, o
pâncreas produz o suco pancreático, possibilitando a digestão de
gorduras e proteínas no duodeno.
O pé de risco
A diabetes é uma patologia crônica ressaltada por ter alta listagem de
dados de morbimortalidade. Por esse motivo, essa disfunção é
considerada uma pandemia crescente e, por meio dos estudos já
realizados pela Sociedade Brasileira de Diabetes, chama a atenção pela
quantidade de casos que, no Brasil em 2017, atingia cerca de 12,5 milhões
de pessoas. A expectativa é de que no ano de 2045 esse número possa
alcançar a marca de 20,3 milhões de pessoas com a doença. É uma
condição com uma prevalência muito alta, que deve assustar ou, ao
menos, alertar para uma situação de risco para muitos, principalmente, se
levarmos em conta que a expectativa de vida vem aumentando.
Uma grande questão é que o choque provocado pela DM sobre os
indivíduos ainda é subestimado e a prevalência de suas complicações e
sequelas causadas ao doente também não são evidenciadas, o que seria
adequado para que esse impacto fosse minimizado.
É possível listar e evidenciar diferentes complicações provocadas pela DM,
como a microangiopatia de retina e rins, a prevalência de neuropatia,
neuropatia periférica, nefropatia, retinopatia, úlceras nos membros
inferiores, gangrenas e amputações, doenças cerebrovasculares e
coronarianas, hipertensão. Entre as complicações crônicas, é relevante
evidenciar as que são pertinentes aos pés, uma vez que indicam uma
condição fisiopatológica multifacetada caracterizada pelo surgimento de
lesões por seguimento de uma neuropatia apresentada em, pelo menos,
80 a 90% dos indivíduos acometidos pela DM.
Essa condição normalmente se inicia por meio de impactos (pancadas
locais) que provocam uma lesão que infecciona e, se não for cuidada de
forma adequada e minuciosa, pode ocasionar amputação. Por isso, as
ulcerações localizadas nos pés do diabético são apontadas como a
principal razão que antecede a amputação, sendo o principal fator de
internações e precipitador de aumento nas taxas de morbimortalidade
pelos indivíduos diabéticos. Para os cuidados com o pé diabético, ou pé de
risco, estima-se que haja uma elevação de 59% de gastos em comparação
com os diabéticos que não adquirem a lesão.
Pé de risco é a citação para compor as inúmeras transformações e
complicações sofridas, de forma conjunta ou isolada, que surgem nos pés
e membros inferiores dos diabéticos. É chamado, então, pé de risco ou pé
diabético aquele que apresenta um processo infeccioso com lesão
ulcerada e necroses teciduais relacionadas a anomalias neurológicas e
patologias vasculares periféricas nos portadores de DM. Esses indivíduos
são acometidos por anormalidade em sua anatomofisiologia dos pés, o
que acaba provocando disfunções na parte neurológica e vascular dessa
região.
O pé de risco promove modificações na nutrição, no desenvolvimento
fisiológico do tecido muscular (que recebe o nome de trofismo) e na
porção óssea dos pés, que estabelece pontos de coerção, ou seja, pontos
de pressão. O tecido cutâneo sofre, tendo em vista seu estado ressecado,
prejudicando a maleabilidade da pele, e o detrimento da circulação local
intensifica a piora e a lentidão no processo de cicatrização, tornando-o
ineficiente.
A combinação dessas disfunções eleva os riscos do surgimento de úlceras
nos pés (pé de risco ou pé diabético), que podem, por sua vez,
desestabilizar e desenvolver complicações severas, como amputações.
EXPLICANDO
O pé diabético é uma complicação da diabetes mellitus e ocorre quando
uma área machucada ou infeccionada nos pés desenvolve uma úlcera
(ferida).
No mundo atual, essas consequências e sequelas são preocupantes, pois
podem ser incapacitantes. Assim, é fundamental gerir e promover a
prevenção dessas complicações, para conscientizar sobre a carência que
existe no controle dessa doença, com diagnóstico precoce e cuidados
decisórios nas fases iniciais do surgimento das lesões. E, assim, propagar
as informações sobre como é definido, observando e diagnosticando o pé
diabético, obtendo as informações acerca de que uma alteração na parte
neurológica na vascularização, principalmente a periférica, na ortopedia e
alterações infecciosas se faz essencial para prevenir o pé diabético e suas
possíveis consequências.
Os fatores mais relevantes no que concerne ao risco de desenvolvimento
do pé diabético são: neuropatia, aporte sanguíneo inadequado para os
vasos sanguíneos e fácil infecção. Outros fatores que afetam a incidência
de pé diabético são: idade avançada, tipo e hora do diagnóstico de
diabetes, equilíbrio inadequado do metabolismo, tabagismo, alcoolismo,
obesidade, hipertensão e falta de bons hábitos de saúde no cuidado com
os pés. As complicações da doença também afetam os sistemas de saúde
de todo o mundo.
SINTETIZANDO
A diabetes mellitus é uma doença crônica com um crescente aumento de
casos no mundo. Seja nos países desenvolvidos, ou menos desenvolvidos,
a maioria dos casos abrange uma ampla escala de pessoas, podendo
atingir indivíduos acima do peso, idosos, crianças, adolescentes e até
mesmo gestantes.
De forma a facilitar a compreensão e categorização da diabetes, ela é
dividia em tipos e subtipos, os quais indicam as características e grupos
que mais são acometidos, assim como os cuidados gerais que devem ser
tomados para cada classificação.
Uma das consequências mais terríveis dessa patologia é o procedimento
da amputação de membros inferiores causada por ulcerações do pé e as
suas complicações. Além do sofrimento infligido aos pacientes, sérias
implicações e perdas econômicas em todo o mundo têm se agravado nas
últimas décadas.
Considerando a gravidade do diagnóstico tardio e das possíveis
complicações decorrentes da doença, é fundamental a definição de
estratégias preventivas, criação de metodologias terapêuticas e combate
eficaz, tanto no que se refere a políticas públicas quanto no campo
familiar e individual. A divulgação das informações de maneira clara e
abrangente tem o condão de esclarecer ao grande público e,
principalmente, prevenir o acometimento e/ou o avanço da DM naqueles
já diabéticos. Portanto, são necessárias ações que proliferem os dados
informativos para a sociedade a fim de promover a sua disseminação.
Angiopatia periférica
A diabetes pode ser descrito de forma genérica e simplificada como uma
doença provocada por excesso de açúcar no sangue. Trata-se de uma
doença causada por complicações no pâncreas, que não consegue
produzir o hormônio insulina em quantidades adequadas para regular o
índice glicêmico (açúcar) no sangue.
O fato é que a diabetes mellitus é uma doença crônica, de origem
multifatorial, que se não for diagnosticada nos seus estágios iniciais, traz
toda uma série de graves complicações irreversíveis.
Complicações renais que levam ao óbito, cegueira e amputações, são
algumas das principais consequências da DM. As chances de isquemias e
lesões por infecções por exemplo, são 90 vezes maiores nos grupos de
risco acometidos pela diabetes. A incidência da diabetes em todo o
mundo tem aumentado vertiginosamente nas últimas décadas pelo
acúmulo de uma conjunção de fatores envolvendo hábitos alimentares
inadequados, sedentarismo, bem como o estresse. Fatores genéticos,
também devem ser considerados. Existem projeções de que nos próximos
20 anos teremos um aumento de 50% aos atuais 200 milhões já
registrados. Somente no Brasil, em 2017, a incidência dessa doença foi de
8,7% (dados do Atlas do Diabetes do International Diabetes Federation).
As projeções indicam que 11,68% da população adulta no Brasil será
atingida pela DM.
Angiopatia
Angiopatia é o nome que se dá genericamente a toda e qualquer doença
relativa aos vasos sanguíneos (artérias, veias e vasos capilares). A maioria
dos casos de angiopatias está diretamente relacionada com as
complicações decorrentes da diabetes crônica.
O QUE É DIABETES?
A diabetes mellitus é definida como uma situação de elevada
concentração de glicose na corrente sanguínea (hiperglicemia) que, por
sua vez, está diretamente relacionada com a disfunção do pâncreas.
O pâncreas (que é o órgão responsável por controlar os níveis de açúcares
no sangue por meio da secreção da insulina), uma vez afetado, acaba
permitindo que excessivas doses de glicose sejam transportadas para todo
o organismo, provocando degenerações e falências de diversos órgãos.
Nessa condição, olhos, rins, coração, nervos e vasos sanguíneos são
particularmente afetados.
Dentre as várias complicações da diabetes, as dos vasos sanguíneos são as
que geralmente têm a sua identificação mais tardia, quando essa doença
já se encontra nos estágios mais avançados.
Grandes esforços são direcionados no sentido de melhor compreender a
relação das doenças vasculares com a diabetes. No entanto, nos últimos
dez anos, houve um enorme progresso na compreensão das complicações
geradas por inúmeras alterações vasculares que caracterizam essa
fisiopatologia que se divide em: macroangiopatia (ou macrovasculopatia)
e microangiopatia.
As principais complicações das macroangiopatias são: angiopatia cardíaca,
cerebral e periférica; já as microangiopatias causam retinopatia,
neuropatia e nefropatia
Macroangiopatia
Refere-se ao comprometimento de vasos sanguíneos de calibre maior
(artérias e veias), que possuem camadas celulares e paredes mais
espessas. As artérias são responsáveis por transportar o sangue
diretamente do coração, por meio da aorta que, por sua vez, distribui esse
sangue para o corpo através de uma extensa rede que vai se tornando
cada vez mais ramificada. Uma importante característica das artérias é a
sua maior elasticidade que contribui para o controle da pressão
sanguínea.
Já as veias são responsáveis por conduzir o sangue venoso (pobre em
oxigênio e rico em dióxido de carbono) do corpo para o coração.
Microangiopatia
Refere-se ao comprometimento de vasos sanguíneos de calibre bem
reduzido e com paredes finas que se comunicam de forma ramificada com
os outros vasos de maior diâmetro, responsáveis pelas trocas gasosas nos
tecidos.
DEFINIÇÃO DE MICROANGIOPATIA
As redes capilares formam regiões específicas no leito vascular, que são
constituídas por vasos com diâmetro interno médio menor ou igual 100
u.m. São vasos compostos de uma única camada de células endoteliais.
Possuem a característica especial de permitir permeabilidade variável a
macromoléculas.
Arteríolas (estruturas que atuam regulando a pressão sanguínea periférica
através da resistência ao fluxo sanguíneo), arteríolas terminais,
metarteríolas, capilares (precedidos ou não do esfíncter pré-capilar) e
vênulas pós-capilares formam a denominada unidade microcirculatória. O
sistema linfático, que é responsável por transportar o fluido linfático dos
tecidos para o sistema circulatório, realiza essa função através dos
capilares linfáticos e micro-linfáticos. Dependendo da área e da
localização, sua estrutura físico-química apresenta-se com uma
configuração variável. Todo o processo de abastecimento de oxigênio e
nutrientes se realiza por meio desse sistema.
De acordo com a região observada nas diversas partes do corpo, o
endotélio da rede microvascular apresenta-se numa conformação
específica.
A região onde ocorre o intercâmbio de substâncias entre tecido e sangue,
como nos rins e intestino, é chamada de fenestrada (apresenta orifícios
nas paredes das células endoteliais). Os tecidos musculares, o tecido
conjuntivo e nervoso e as glândulas exócrinas são constituídos de
capilares contínuos (ausência de fenestras em sua parede endotelial). E no
fígado e em órgãos hematopoiéticos encontram-se os capilares sinusoides
(com trajeto sinuoso e calibre aumentado com amplos espaços entre as
células endoteliais, lâmina basal contínua apresentando macrófagos em
torno da parede). Os diâmetros das paredes vasculares tendem a reduzir
quando o número de células vasculares lisas diminui. A camada de células
musculares lisas é descontinuada nas marteríolas (ramificação direta da
arteríola) e as últimas dessas células formam o esfíncter pré-capilar
próximo ao início do leito capilar. Os capilares possuem em sua parede
uma camada única de células endoteliais em sentido oposto à membrana
basal. Todas essas mudanças fisiológicas são reguladas por diferentes
tipos de bioquímica para controlar o funcionamento microvascular.
O sistema renina-angiotensina-aldosterona, o ADP (difosfato de
adenosina) com receptores purinérgicos na musculatura lisa arteriolar, o
óxido nítrico e prostaciclina, tromboxano (vasoconstritor), vasopressina e
a inervação simpática compõem o sistema de regulação da
microcirculação e interferem diretamente no diâmetro arteriolar. Uma
variável combinação entre esses compostos vai determinar o nível de
vasodilatação ou constrição do diâmetro dos vasos e suas estruturas
anatômicas.
A angiopatia diabética no caso da microangiopatia se manifesta com
complicações renais, retinopáticas e dermatológicas. Já a macroangiopatia
incide sobre artérias coronárias, cerebrais e vasos dos membros inferiores.
Estes, no entanto, são particularmente afetados através de uma interação
que acaba por potencializar os efeitos da macro e da microcirculação.
A obstrução aterosclerótica progressiva das artérias (DAOP) é uma das
maiores responsáveis pelos complicadores na qualidade de vida dos
pacientes diabéticos.
A correlação entre altas taxas de glicemia no sangue e o tempo em que o
organismo fica exposto, define a progressão, intensidade e gravidade da
diabetes. Os elevados índices glicêmicos provocam profundas alterações
nos processos bioquímicos de metabolização dos açúcares do sangue.
Apesar dos extraordinários avanços no tratamento, altas taxas de
morbidades e mortalidades ainda têm sido observadas por conta dessas
complicações. A microcirculação é a maior responsável.
Neuropatia diabética
É um processo de degeneração progressiva dos nervos que se inter-
relaciona com outras complicações oriundas da DM. Uma das suas
características mais preocupantes é a dificuldade frequente de seus
portadores perceberem a progressão dessa doença. Várias áreas do corpo
podem ser afetadas, mas, é na região dos pés que ela provoca
frequentemente os maiores danos, levando à incapacitação motora,
amputações e até mesmo a óbitos.
Os nervos podem ser definidos simplificadamente como um conjunto, em
formato tubular, de feixes de fibras nervosas, que inclui os axônios dos
neurônios revestidos por outra camada de tecido conjuntivo (perineuro).
Eles são responsáveis por garantir a comunicação por meio da transmissão
do impulso elétrico nervoso entre os diversos órgãos do corpo e o sistema
nervoso central.
Dentre as diversas complicações oriundas da diabetes, a neuropatia é a
manifestação mais frequente. O controle dos músculos e das glândulas do
suor, bem como da sensibilidade ao tato, temperatura, pressão e
vibração, é realizado pelos nervos.
Diversos fatores podem contribuir em diferentes níveis para o surgimento
de doenças que acometem os nervos. No entanto, desde que todos os
outros fatores já tenham sido descartados, as várias manifestações clínicas
diagnosticadas em decorrência da disfunção dos nervos periféricos na
população portadora de diabetes mellitus são classificadas como
neuropatia diabética.
As disfunções sensitivo-motoras e simpático-periféricas são fatores de alto
risco para os seus portadores, uma vez que a diminuição ou perda da
sensibilidade a dores, pressão, temperatura e vibrações, propicia um
aumento de inúmeras lesões se não tratadas a tempo.
A distensão das veias dorsais, a hipertrofia muscular e a ausência de
sudorese são algumas das manifestações apresentadas. O inchaço e
edemas das veias culmina com a elevação da temperatura dos pés. Aliado
ao fator de insensibilidade, instalam-se as condições ideais para o
surgimento de fissuras e ulcerações nos pés.
O acometimento dos nervos provoca atrofia e enfraquecimento
intermuscular dos pés, resultando em deformidades e flexões anormais
dos dedos, que junto das cabeças dos metatarsos, se tornam áreas de
maior pressão. Como consequência, o padrão de marcha do paciente fica
comprometido e, aliado à perda da ação protetora da sensibilidade,
provocam lesões que frequentemente resultam em úlceras.
Dentre as complicações neuropáticas, o surgimento das ulcerações é, sem
sombra de dúvida, a mais traumática. No estado hiperglicêmico, uma
classe inteira de moléculas heterogêneas é formada através da reação
aminocarbonilo (reação de Maillard). Na prática, ela descreve um
processo de incorporação da glicose nas proteínas, numa reação não
enzimática, em que a glicólise e a autoxidação de glicose, por exemplo,
formam metilglioxal e glioxal, que, por sua vez, interagem com
aminoácidos formando os Advanced Glycation End-Products (em inglês) ou
simplesmente AGEs. Os AGEs desempenham um papel fundamental para
entendermos o mecanismo neuropático, uma vez que produzem
compostos altamente oxidantes e destrutivos, tanto para macromoléculas
como para tecidos.
A glicose penetrando em níveis elevados nos nervos faz com que o
mecanismo intercelular chamado via poliol fique prejudicado. A via poliol
é uma espécie de caminho situado no interior da célula que é responsável,
com o auxílio da enzima aldose redutase, em converter a glicose em
sorbitol (um tipo de álcool que, em valores por volta de 3,5 a 6 mmol/L, é
inofensivo).
O Diagrama 1 demonstra os danos que podem ser provocados pela
hiperglicemia. Esta, interligada à via poliol, causa o aumento do ROS
(espécie reativa de oxigênio), promove o aumento do PARP (poli ADP-
ribase polimerase) e a diminuição do GAPDH (glicerídeo 3 fosfato
desidrogenase). O aumento do fluxo da via dos polióis, assim como do
AGEs (produtos finais da glicosilação avançada), do PKC (proteína quinase
C), do NFkB (fator nuclear Kb (12)) e do fluxo das vias das hexosaminas,
que também é considerado um agravante.
Neuropatia autonômica
A neuropatia autonômica é uma ocorrência mais específica, definida pelo
comprometimento das funções involuntárias do corpo em decorrência da
disfunção dos nervos. A comunicação entre o cérebro e os outros órgãos
fica prejudicada e, assim, pode afetar vários sistemas, como o
cardiovascular e gastrointestinal por exemplo. A pressão sanguínea, a
regulação da temperatura são alguns dos processos que podem ser
afetados.
Mononeuropatia aguda
Nesta forma de neuropatia os nervos são afetados de forma aguda,
provocando nos tecidos ao redor, sintomas de dor e parestesia. A
obstrução vascular e isquemia das fibras nervosas é o seu principal
motivador. Os nervos cranianos são os mais afetados.
Mononeuropatias compressivas crônicas
Nas mononeuropatias compressivas crônicas, os nervos que naturalmente
são submetidos à compressão, como punhos, cotovelo e fíbula, são
afetados de forma progressiva, gerando microtraumas e edemas,
provocando grave ação nos mecanismos motores.
Radiculoplexoneuropatias (RPNP)
Manifestam-se de forma assimétrica nas regiões distais e proximais
identificadas com complicações sensoriais e motoras e acompanhados de
dores intensas e incapacitantes. Em até 50% dos casos chegam a afetar os
sistemas autonômicos.
Neuropatia associada à intolerância à glicose
Incide-se com maior frequência nos processos autonômicos e nas fibras
finas responsáveis pelos processos sensitivos.
Neurite insulínica
Aparece em alguns casos logo após iniciada a terapia insulínica, com
consequências geralmente benignas. O seu mecanismo fisiopatológico é
ainda desconhecido.
Polineuropatia pós-cetoacidose
Ocorre como consequência de uma condição prolongada de hiperglicemia,
gerando acidose metabólica, desidratação e cetose. Seu exato mecanismo
de funcionamento ainda não é conhecido.
Neuropatia hipoglicêmica
Raros casos dessa complicação têm sido observados, sempre relacionados
a um processo contínuo de hiperglicemia. Afeta o mecanismo senso-
motorial.
Neuropatia sensitiva dolorosa aguda
É uma manifestação secundária decorrente do descontrole glicêmico.
Manifesta-se de forma dolorosa e incapacitante.
CISTOPATIA
As alterações no músculo liso da parede da bexiga urinária e a síndrome
da bexiga dolorosa formam um conjunto de complicações urinárias que
caracterizam a cistopatia diabética.
A urgência e frequência miccional com esvaziamento vesical incompleto
são os seus principais sintomas. Esse processo disfuncional adicionado à
tendência imunossupressora provocada pela DM favorecem o surgimento
de infecções que podem culminar com insuficiência renal. A desregulação
do mecanismo de sudorese associado à DM nos membros inferiores,
provoca o aumento da temperatura dos pés que frequentemente está
associado à doença de Charcot e suas complicações, como úlceras e
amputações.
É frequente também a ocorrência da doença de Argyll Robertson, que é
caracterizada por pupilas contraídas quando os olhos focam em um objeto
próximo e ao mesmo tempo não se contraem quando expostas à
luminosidade intensa.
De acordo com a definição, nosso sistema nervoso possui uma
complexidade e quando algo promove uma agressão a esta estrutura,
surgem complicações. A Figura 1 demonstra os tipos de neuropatias, que
são algumas das complicações que atingem o sistema nervoso, causando
avarias nos nervos e, nos casos graves, podem incapacitar o paciente.
Alterações ósseas do pé do paciente diabético neuropata
O pé é um segmento do corpo que, dos membros inferiores (MMII), é a
porção distal (distante da origem) e é composto por 27 ossos que estão
distribuídos em três grupos: falanges, metatarso e tarso.
O segmento que forma os dedos é composto por 14 ossos (artelhos ou
pododáctilos), sendo que, o primeiro dedo é denominado hálux e possui
duas falanges (proximal e distal), do segundo ao quarto dedo cada um é
composto por três falanges (proximal, média e distal).
Os dedos do pé são enumerados do primeiro ao quarto, começando sua
contagem da porção medial para a lateral. Já os ossos que compõem o
dorso e a planta do pé são denominados metatarsos, e são enumerados
também começando sua contagem da porção medial para a lateral, onde
o primeiro metatarso se articula com o primeiro dedo e assim
sucessivamente, cada metatarso possui uma cabeça, um corpo e uma
base, descritos da porção distal para a proximal, sendo que o quinto
metatarso possui uma tuberosidade lateralizada.
Conforme podemos visualizar na Figura 2, as falanges estão coloridas de
forma que podemos diferenciar as falanges distais (roxo) do primeiro ao
quinto dedo, as falanges médias ou intermédias do segundo ao quinto
dedo (verde) e as falanges proximais (vermelho) do primeiro ao quinto
dedo, lembrando que o hálux só possui duas falanges. Na mesma imagem
podemos ver o metatarso, enumerado de acordo com o dedo que está
articulado (do primeiro ao quinto) e suas divisões anatômicas (cabeça,
corpo, base e a tuberosidade do quinto metatarso).
ALTERAÇÕES E DEFORMIDADES
As alterações no pé diabético significam um conjunto de acometimentos
que podem deformar e prejudicar o pé e os membros inferiores dos
portadores da DM independente de seu tipo. O que muito preocupa são o
que essas complicações podem ocasionar a esse paciente e à saúde
pública com relação à dependência e custos.
Pé chato ou pé plano
Uma das alterações que o pé do diabético pode sofrer é o pé plano ou
chato, que apresenta uma redução da curva formada na planta do pé ou
arco plantar. O pé plano tem uma relação íntima e direta com o tálus
valgo, pois altera a posição da tíbia e do fêmur, ocasionando uma
inclinação com rotação da articulação do joelho para a porção medial
(joelho para dentro).
O pé possui três arcos sendo dois longitudinais e um transverso para
formar a curvatura da planta do pé (curva do pé), como pode ser
observado na Figura 5. Essa alteração promove um alargamento do arco
longitudinal e um decaimento do arco transverso, o que joga o tendão de
Aquiles, fixado no calcâneo, para a porção lateral do pé. Não sabemos
porque isso ocorre; podemos associar essa alteração ao ganho de peso, à
diminuição do equilíbrio, a posturas inapropriadas adquiridas por maus
hábitos e à obesidade, entre outros fatores.
Se considerarmos apenas o pé plano, ou comumente conhecido pé chato,
podemos dizer que não há grandes problemas nessa alteração, pois
raramente leva a um processo cirúrgico ou a outros danos, mas, na
presença de outras comorbidades do paciente diabético, como a
obesidade, podemos ter um agravante que é o desequilíbrio. Se essa
alteração for associada à perda de sensibilidade, as consequências podem
ser severas, levando a graves ulcerações que podem chegar à amputação
do membro.
ALTERAÇÕES DERMATOLÓGICAS
Dentre as inúmeras complicações da diabetes mellitus, as cutâneas são de
ocorrência frequente. Elas costumam ter sua origem nas infecções
relacionadas à disfunção metabólica da DM. Ainda não estão esclarecidas
as causas dessas complicações, mas estudos sugerem que estariam
relacionadas com o distúrbio imunológico característico do portador da
doença diabética.
A hipótese da interação com os processos angiopáticos e neuropáticos
também é considerada. A explicação estaria no aumento da
permeabilidade e diminuição da resposta dos vasos à inervação simpática,
provocando a redução da sudorese e consequente desequilíbrio térmico
do tecido cutâneo.
Uma vez que as interações entre as várias complicações dessa doença têm
a capacidade de potencializar os seus efeitos, é imperativo esclarecer esse
mecanismo fisiopatológico, pois ele afeta profundamente a qualidade de
vida dos seus portadores. Outro fator que tem sido aventado é a
tendência das células epiteliais e de mucosa apresentarem um aumento
de aderência para patógenos como a Candida albicans, na mucosa bucal e
vaginal e Escherichia coli, nas células do epitélio urinário. Com a
diminuição da barreira natural da camada de queratina da epiderme por
conta da diminuição imunológica do diabético, a defesa da pele fica
comprometida, propiciando a maior colonização de fungos e aumentando
assim as infecções. Verifica-se também a ocorrência de ceratose
seborreica provavelmente associada à liberação de produtos glicados. Nos
tecidos celulares subcutâneos ocorrem as infecções mais graves,
provocadas tanto por germes aeróbios como anaeróbios. Observa-se uma
grande incidência de complicações graves nos membros inferiores que, se
não forem combatidas a tempo, podem levar a um quadro de septicemia
e eventualmente ao óbito.
Dermopatia diabética
A modificação cutânea comum nos diabéticos ocasiona o aparecimento de
pequenas manchas atróficas, redondas e limitadas, localizadas nos
membros inferiores. São manchas pequenas que posteriormente se
aglutinam e ficam mais pigmentadas e não provocam desconforto
doloroso ao paciente.
Necrobiose lipoídica
É uma doença degenerativa crônica do tecido conectivo dérmico
(colágeno) provocada pelo espessamento das paredes dos vasos
sanguíneos. Apresenta-se com uma área em relevo, com uma morfologia
muito peculiar e coloração avermelhada semelhante à da dermatopia
diabética.
Granuloma anular
Caracteriza-se pelo surgimento de lesões avermelhadas em formato
circular ou de anel em decorrência de uma desordem inflamatória da pele.
Doença de Kyrle
Também denominada hyperkeratosis parafollicularis, é uma erupção
clínica com aspecto perfurante que apresenta a característica de
eliminação transepitelial de material dérmico, particularmente nas pernas
e nos antebraços.
Escleredema de Buschke
De etiologia desconhecida, apresenta-se por meio de um endurecimento
da pele, mais especificamente no dorso superior. Normalmente, é
sucedido por algum tipo de doença viral ou estreptocócica provocando a
substituição de tecidos subcutâneos por tecidos conjuntivos. É observada
ocasionalmente a associação com disfunções cardíacas.
Bulose diabética
É caracterizada pela formação espontânea de bolhas, geralmente nas
extremidades inferiores.
Xantomas
Os xantomas são lesões cutâneas de morfologia variável e aspecto
amarelado, decorrentes de anormalidades no metabolismo do colesterol
que geram depósito de lipídeos na pele.
Acantose nigricante
Promove uma agressão levando a uma concentração sedosa da pele com
um aumento considerável da pigmentação local (hiperpigmentação),
sendo harmonioso nas dobras cutâneas, como as localizadas nos
segmentos cervical, axilar e inguinal, mas também pode agredir a mucosa
oral, a região umbilical, a aréola mamária, a região submamária e as mãos.
Piodermites
São infecções provocadas por fungos e ou bactérias que acometem de
maneira mais severa os pacientes portadores de diabetes, denominadas
impetigo, foliculite, furunculose, carbúnculos, ectima e erisipela.
Nos casos de otite externa maligna causada pela Pseudomonas
aeruginosa, podemos chegar à letalidade na maioria dos casos.
A bactéria gram-positiva denominada Corynebacterium minutissimum ao
acometer o paciente diabético, promove a formação do eritrasma
disseminado.
Um comprometimento cutâneo comumente encontrado nas crianças e
casualmente nos adultos diabéticos é a estomatite angular provocada por
fungo, que provavelmente ocorre pelo aumento de quantidade de glicose
na saliva.
Líquen plano
Acomete aproximadamente 4% dos pacientes diabéticos do tipo I. Sua
causa é autoimune e provoca o surgimento de lesões com pruridos e
pápulas arroxeadas com superfície lisa, acometendo regiões de cotovelos,
punhos, terço inferior das pernas e lombar. Em alguns diabéticos o
comprometimento pode incluir mucosas da boca e genitais. Podem ser
encontradas hiperplasia na camada córnea, e ancatose na camada
granular, além de alterações dentárias.
Profilaxia no paciente diabético
Dadas as inúmeras complicações e intercorrências comuns resultantes da
diabetes mellitus e também pelo fato de ser uma doença crônica, seus
portadores necessitam de uma rotina estritamente regrada. É fato que a
prevenção e o controle são essenciais para a qualidade de vida
do diabético. Muitas complicações graves podem ser evitadas nos
estágios iniciais da doença com a implementação de medidas simples:
alimentação balanceada, eliminação da obesidade, prática de exercícios
físicos, autoexame frequente e uso de calçados adequados, são exemplos
de medidas que devem fazer parte do dia a dia do diabético.
DICA/ O melhor tratamento para o pé diabético e suas complicações é a
prevenção e o autocuidado! Atividade física, bons hábitos alimentares e
não possuir vícios fará toda a diferença.
É no tocante a intervenções cirúrgicas e odontológicas que essas
preocupações se tornam críticas. A dificuldade de cicatrização, maior
suscetibilidade a infecções e tendência a hemorragias, criam um quadro
potencialmente perigoso nas intervenções odontológicas e cirúrgicas. Os
profissionais da área da saúde devem estar sempre muito conscientes da
necessidade de estabelecer um protocolo de atendimento para esse
público. Cabe ao paciente, no entanto, a maior parcela de
responsabilidade no sentido de transmitir as informações necessárias aos
médicos e dentistas.
O controle glicêmico é peça fundamental na diminuição de riscos e
melhoria da recuperação para o preparo de intervenções cirúrgicas.
O risco cardíaco, por exemplo, está sempre presente tanto na
hiperglicemia quanto na hipoglicemia. Um nível de hemoglobina glicada
menor de 8,5% é a melhor opção nos procedimentos preparatórios que
antecedem as cirurgias. Das inúmeras complicações às quais o portador da
diabetes está submetido, as relacionadas com os membros inferiores são
as que mais frequentemente causam o maior transtorno e sofrimento.
Além disso, as limitações decorrentes da perda de mobilidade, causadas
por enfermidades nos pés, criam a necessidade de constante
acompanhamento médico hospitalar, sobrecarregando o sistema de
saúde.
SINTETIZANDO
A diabetes mellitus (DM) é uma das doenças metabólicas e crônicas que
ocorrem com maior frequência em todo o mundo e para que possa ser
devidamente tratada e controlada, necessita de profundas mudanças
comportamentais por parte do paciente. É fundamental um estilo de vida
com hábitos alimentares regrados, com a supressão de bebidas alcoólicas
e tabaco, acompanhada ainda da devida administração medicamentosa. O
seu combate eficaz só pode ser realizado com um amplo conjunto de
medidas pelo fato da diabetes mellitus ser uma doença de origem
multifatorial.
Um dos grandes desafios da DM é a sua tendência de passar despercebida
(assintomática) por seus portadores por longos períodos, acarretando
assim, consequências gravíssimas. O diagnóstico precoce evita muitas de
suas complicações, como as angiopatias, neuropatias periféricas,
alterações ósseas e dermatológicas.
Para os cuidados com o surgimento de algumas das alterações provocadas
pela diabetes, como, por exemplo, o ressecamento da pele, podemos
recorrer à cosmetologia. Ela possibilita uma ampla variedade de produtos
que age com eficácia hidratando, ocluindo e promovendo emoliência ao
tecido cutâneo. Essas propriedades aumentam a elasticidade e a
resistência da pele evitando o início de lesões por rachaduras.
Portanto, o melhor para os portadores de DM são as medidas profiláticas:
uma boa alimentação, estilo de vida saudável, diminuição do peso,
realização com frequência do autoexame, uso de sapatos confortáveis.
São esses, os hábitos fundamentais que devem fazer parte da vida do
indivíduo.
O pé diabético ulcerado
Definição / A diabetes é uma doença definida por um quadro constante de
hiperglicemia envolvendo o pâncreas, que acarreta grande disfunção
metabólica do nosso organismo. O açúcar, em quantidades excessivas
nosangue, exige a produção cada vez maior do hormônio insulina
secretado pelo pâncreas, causando descontrole. Nessa condição, observa-
se um processo de destruição das células produtoras de insulina do
pâncreas, tornando necessária a reposição insulínica artificial externa.
Esse distúrbio interfere diretamente no sistema imunológico que, por sua
vez, é responsável por provocar inúmeras complicações em diversas
outras partes do nosso organismo. Outra característica dessa patologia é a
tendência frequente do inter-relacionamento entre as complicações.
Dentre as várias complicações originadas pela diabetes mellitus, uma das
mais traumáticas e incapacitantes diz respeito às amputações dos
membros inferiores. Entre as manifestações típicas que precedem as
amputações, as ulcerações (aproximadamente 85%) são as mais
determinantes.
Uma questão que frequentemente gera polêmicas é o papel da
neuropatia periférica e a doença vascular periférica (a Figura 1 demonstra
as alterações cutâneas provocadas pela vascularização comprometida) no
paciente diabético e suas particularidades no desenvolvimento das úlceras
nos pés e as amputações. É considerado, na maior parte dos casos, que
sejam os mesmos fatores de risco tanto para o aparecimento das úlceras
como no caso das amputações dos membros inferiores.
Entretanto, ainda são escassos os estudos nessa área e, sem diferenciar a
incidência da diabetes tipo 1 e 2, não podem ser considerados como prova
sustentada. Todavia, novos estudos têm demonstrado, por exemplo, que
pacientes do sexo masculino com diabetes do tipo 2 apresentam maior
risco no desenvolvimento de úlceras nos pés.
Na maioria dos casos, esse drástico procedimento cirúrgico acontece
devido às complicações resultantes da combinação de infecções
profundas e isquemia. Além disso, a falta de cicatrização das úlceras do pé
diabético em si não deve ser considerada como fator determinante para
indicação das amputações. No entanto, a redução da capacidade
imunológica do organismo, somada à deficiência do mecanismo de
coagulação do sangue, se não controladas devidamente podem culminar
em gangrena.
As chances do surgimento de úlceras é duas vezes maior na presença de
neuropatia periférica e doze vezes maior quando associada às limitações
de mobilidade articular ou deformidades nos pés. As úlceras nada mais
são que feridas profundas e abertas de difícil cicatrização, provocadas por
complexas reações bioquímicas intracelulares. Entre 20% e 25% da
população diabética desenvolvera úlceras nos membros inferiores em
algum momento da vida.
EXPLICANDO
As úlceras cutâneas em pacientes com pé diabético podem ser causadas
por isquemia secundárias à neuropatia ou mistas, quando ambos os
componentes estão presentes. O aparecimento dessas é extremamente
dependente do cuidado que o paciente apresenta com seus pés.
O seu tratamento representa um desafio para os pacientes acometidos
com diabetes mellitus tipo 1 e 2 por conta da sua baixa capacidade
imunológica, que dificulta a cicatrização e acomete o surgimento de
infecções oportunistas, exigindo, em alguns casos, a internação hospitalar
por semanas e até meses.
Além das úlceras (feridas abertas) assolarem os tecidos profundos, elas
também podem afetar os ossos, gerando vários níveis de deformidades.
Basicamente, as doenças do pé diabético ocorrem em função de uma
espécie de tripé de fatores, constituído de: anomalias neurológicas,
vasculares e vários tipos de infecções. No entanto, na maioria dos casos,
as ulcerações são precedidas pela neuropatia diabética.
As anomalias neurológicas são complicações diabéticas que provocam um
lesionamento progressivo das fibras somáticas (sensitivas e motoras) dos
nervos, denominadas neuropatia. Em linhas gerais, são três os fatores que
desencadeiam as complicações neuropáticas, isto é: o processo de
glicação das proteínas, alterações na via do poliol e os distúrbios
hemodinâmicos.
Figura 3. Úlcera por pressão em região de calcâneo com necrose. Fonte: Secretaria Municipal
da Saúde – SP, 2010.
O atrito constante nas pequenas dobras interdigitais criam calosidades,
pequenas fissuras e cortes que favorecem o aparecimento de colônias de
fungos na pele. Essas colônias podem criar portas de entrada para a
instalação de infecções e formação de úlceras, chegando, algumas vezes, a
penetrar até atingir os ossos.
O excesso de pressão desbalanceada e o estresse repetitivo na cabeça do
metatarso contribuem para a aceleração do processo que culmina com o
aparecimento de ulcerações. As úlceras de etiologia neuropática são
provocadas por fatores externos, como a utilização de calçados
inadequados com pressões plantares excessivas.
É importante salientar que o paciente acometido dessas complicações
pode apresentar insensibilidade total aos traumas e contusões nos
estágios mais avançados da doença. Já as de origem vascular (isquêmica),
causadoras de obstruções arteriais, têm origem com a agressão do
endotélio dos vasos sanguíneos por substâncias tóxicas geradas pela
hiperglicemia. A aterosclerose é a manifestação mais evidente desse
processo.
👍
Muito bem, a resposta está correta!
De acordo com o que foi estudado no tópico, muito pode ser feito além
do controle glicêmico, tanto para amenizar quanto para reverter a
doença e suas complicações. A conscientização dos pacientes, agentes
de saúde e a própria saúde pública é fundamental no combate dessa
doença. Acerca das doenças nos pés diabéticos, pode haver a ocorrência
isolada, simultânea, ou ainda combinada de disfunções neurológicas,
ortopédicas, vasculares ou infecções.
Charcot de diabético
Definição / Define-se como uma deformidade óssea e articular que afeta
a disposição anatômica e funcional das estruturas do pé tendo a diabetes
como fator responsável na maioria das vezes. Apesar da formação de
edemas, não é uma doença infecciosa. Muito por conta da desnervação
muscular, ela provoca também uma situação crítica de desorganização nas
articulações, inflamação da membrana sinovial (tecido que reveste a parte
interna de algumas articulações), instabilidade postural e fraturas ósseas.
É atribuída a John Kearsley Mitchel, em 1831, a primeira descrição de uma
doença que destruía os ossos, articulações e causava desnervação
muscular dos membros inferiores, mas coube ao neurologista francês
Jean-Martin Charcot, em 1868, descrever a histologia patológica, que
ocorria como uma complicação da infecção por sífilis. Porém, apenas em
1936 essa essa doença foi associada a uma complicação da Neuropatia,
definida por William Reily Jordan.
Vale pontuar que a incidência da identificação do pé de Charcot na
população diabética é pequena, devido ao seu difícil diagnóstico. O
descontrole dos níveis de açúcar no sangue por períodos prolongados
desencadeia em um forte desequilíbrio metabólico no organismo, que
acaba afetando o funcionamento dos nervos periféricos. Uma das
primeiras consequências disso é o paciente perder gradualmente a função
protetora de sensibilidade nos membros inferiores, o que propicia o
surgimento de lesões. Essas lesões, por sua vez, tendem a se agravar por
conta do sistema imunológico já debilitado típico da diabetes.
Figura 11. Investigação radiográfica inicial. (A) Incidência anteroposterior do pé esquerdo, que
mostra fragmentação óssea na região tarsometatársica. (B) Incidência lateral que mostra
perda do arco longitudinal medial do pé com alteração do alinhamento do tálus com o
primeiro metatarso. Fonte: SANTOS, 2014.
A não identificação dessa grave doença nos seus estágios iniciais costuma
evoluir rapidamente para um quadro irreversível, que costuma culminar
com o procedimento radical de amputações.
Todo esse quadro reforça, mais uma vez, a extrema importância de se
combater as várias compilações que a população diabética está
submetida, em especial o Pé de Charcot.
Apesar de ainda hoje não haver plena compreensão do mecanismo dessa
osteopatia, é certo que ela está intimamente relacionada com as mesmas
complicações responsáveis pela formação das úlceras neuropáticas e
deficiência vascular diabética.
Basicamente, é por meio da teoria neurotraumática e/ou neurovascular
que se procuram encontrar as explicações para o mecanismo de
funcionamento e desenvolvimento da doença do pé de Charcot.
Pelo lado neurotraumático, seria o evento da propriocepção atuando em
conjunto com a diminuição ou até perda da sensibilidade à dor que
gerariam um quadro de repetição constante e repetitiva de traumas
biomecânicos decorrentes da sustentação do próprio peso que
provocariam a destruição óssea.
Figura 12. (A) Pé chato com presença de inflamação. (B) Pé com deformidade e úlcera
plantar. Fonte: PINHEIRO, 2014.
Essas calosidades formam-se justamente nesses focos onde existem novas
proeminências ósseas. As calosidades no pé diabético normalmente
precedem as úlceras. Uma vez confirmado o diagnóstico, ou até mesmo
na presença de suspeita do NP, o protocolo determina a imediata
imobilização do membro para interromper a pressão de carga sobre o pé.
Existem algumas técnicas para aliviar os pontos de pressão nos locais
ulcerados, a fim de que essa ulceração cicatrize de maneira mais rápida,
sem provocar lesões mais severas, como podemos observar na Figura 13,
onde observa-se uma sandália que promove um curativo para a úlcera e
um alívio de pressão local, nesse caso no ante pé.
Figura 13. Sandália de curativo com alívio de pressão no ante pé. Fonte: CAIAFA, 2011.
SINTETIZANDO
O pé diabético que avança com feridas, ulcerações e acaba chegando à
amputação é uma complicação em potencial da diabetes mellitus, porém
com cuidados adequados é passível de prevenção. Mesmo com cuidados
fáceis, como autoexame para a prevenção das ulcerações, ainda é alta a
prevalência do pé diabético e amputações. É uma consequência da
diabetes que acaba gerando sequelas físicas e psicológicas, afetando seu
emocional e psicológico, diminuindo significativamente a qualidade de
vida, ao mesmo tempo promove o aumento da morbimortalidade. Além
de sobrecarregar o sistema de saúde e faz e promover a saída de grande
parte de jovens capazes e competentes do mercado de trabalho.
Desse modo, é essencial que ocorra uma abrangência mais ampla sobre os
tratamentos e a prevenção dos pacientes diabéticos e das consequências
causadas pelo pé diabético. Também, a implantação de medidas que
diminuam o impacto que essas sequelas promovem, seja para o paciente
ou para a sociedade, ou seja, incluindo um programa de educação em
saúde, melhoria do acesso aos programas e serviços de saúde, inclusão de
um sistema de controle da diabetes, como as fitas para exames de
glicemia, medicamentos adequados, exames complementares, entre
outros. Importante salientar a necessidade de uma equipe
multiprofissional que possa realizar o atendimento e acompanhamento do
diabético. Medidas como essas são eficazes e de baixo custo, já que
podem ser realizadas em postos de saúde e unidades básicas o que
ajudará no controle dos índices glicêmicos e na melhora da qualidade de
vida do paciente.
Lembrando que a maior parte dos portadores de diabetes é
comprometida por neuroartropatia, que é uma complexa complicação
nessa patologia, contudo grande parte dos pacientes afetados reage bem
aos tratamentos, principalmente os que promovem o uso de gesso ou de
órtese moldada. Para que esse tipo de tratamento seja uma completa
vitória, tanto para a equipe responsável, quanto para o paciente, deve-se
ter a consciência de que é um tratamento com longo período de
imobilização, sem que haja descarga de peso sobre o membro afetado.
Isso deve ser conduzido até que haja comprovações de consolidação óssea
nos exames de imagem. Casos cirúrgicos só são indicados quando há
existência de grandes deformidades, ou nos casos de fragilidade e
vicissitude articular no pé e tornozelo que promovam uma
desestruturação do apoio plantígrado, o que acaba gerando grandes
pressões na estrutura acometida. Também pode ser indicada em casos
que a imobilização prolongada não foi eficaz por diferentes motivos.
Em casos cirúrgicos, o procedimento pode ser uma ostectomia (ato de
seccionar cirurgicamente um osso ou parte desse osso) das projeções nos
pés que sofreram com a neuroartropatia, promovendo a essas
malformações ósseas ou a artrodese modelante um alinhamento ou até
mesmo uma estabilização dos pés e tornozelos.
Quando a ostectomia é realizada pela malformação que a neuroartropia
de Charcot promove aos pés, normalmente o procedimento é de porte
pequeno, sendo responsável por diminuir e retirar a área de grande
pressão, o que auxiliará na cicatrização das úlceras formadas, não sendo
possível a realização de correções nas malformações do pé e do tornozelo,
o que pode proporcionar ao paciente dificuldades no uso de calçados e
até mesmo de órteses. Nos casos da realização do procedimento de
artrodese modelante, a proposta é a correção das malformações
provocadas pela neuroartropatia de Charcot, porém, por ser um processo
cirúrgico de maior porte, também pode levar a maiores complicações,
dentre elas as infecções, demora maior na consolidação, pseudartrose e
até mesmo uma recidiva das deformidades.
O paciente amputado
Pesquisas indicam que aproximadamente 60% de todas as amputações
não traumáticas (sem ocorrência de acidentes) têm como fator
desencadeante a diabetes. De acordo com estudos internacionais, a
população acometida por diabetes mellitus tem a probabilidade de sofrer
amputações dos membros inferiores aumentada em quinze vezes em
relação ao restante da população. O crescimento exponencial dessa
doença nas últimas décadas tem se revelado um enorme desafio para os
seus portadores e para os sistemas de saúde, acarretando graves
implicações socioeconômicas no mundo. Na década de 80, tínhamos
aproximadamente 30 milhões de diabéticos no mundo, e as projeções
indicam que atingiremos 300 milhões de doentes em 2030.
Os países em desenvolvimento são responsáveis por aproximadamente
80% dos casos de diabetes e apresentam um alto índice de crescimento
entre a população mais jovem. Observa-se, ainda, maior incidência de
problemas relacionados às artérias nos países mais desenvolvidos e a
prevalência das infecções, especialmente relacionadas a úlceras, nos
países em desenvolvimento.
O aumento da incidência de diabetes na população mundial está
intimamente relacionado a hábitos e costumes da vida moderna, como
alimentação inadequada associada ao sedentarismo. O consumo de
alimentos processados altamente calóricos, aliado à baixa queima de
calorias, por conta da inatividade física, acarreta altos índices de açúcar na
corrente sanguínea, aumentando as chances de ocorrência da diabetes.
É sabido que o papel do paciente, no que diz respeito ao autocuidado, é
de importância fundamental para o sucesso do tratamento e recuperação
dessa doença. Na verdade, a maioria das complicações da DM pode ser
atenuada, revertida e até eliminada com medidas simples de
autoconhecimento e autocuidado.
A diabetes do tipo II, por exemplo, que representa 90% dos casos, pode
praticamente ser evitada com a combinação de exercícios físicos e dieta.
Um agravante está no fato de ser uma doença insidiosa e que costuma
manifestar seus sintomas tardiamente. Dentre as várias complicações,
aquelas que acometem os pés costumam ser as mais graves.
Aproximadamente 60% das amputações dos membros inferiores no
mundo são decorrentes das complicações do diabetes.
Uma das características dessa doença é apresentar, frequentemente,
múltiplas complicações crônicas e simultâneas que tendem a
potencializar-se ao longo de seu desenvolvimento. No caso das doenças
do pé diabético, por exemplo, há um conjunto de complicações
vasculares, neurológicas e infecciosas que costumam coexistir e contribuir
para o seu agravamento. Uma dessas complicações é a neuropatia
diabética. A neuropatia diabética é uma doença crônica cuja incidência
ocorre por conta do excesso de açúcar no sangue. Os altos índices
glicêmicos provocam um descontrole bioquímico que, ao gerar
substâncias tóxicas no sistema sanguíneo, acabam por lesionar os nervos e
tecidos do paciente.
Figura 3. Anatomia dos ossos do pé, vista dorsal e os pontos de desarticulação de Chopart e
Lisfranc. Fonte: INSS, 2017, p. 15.
AMPUTAÇÃO E PROTETIZAÇÃO
A distribuição assimétrica de massa da amputação exige que o paciente se
adapte à nova condição de instabilidade lateral. Sendo assim, o
ortopedista deve realizar uma avaliação meticulosa antes de escolher o
nível e técnica cirúrgica para a amputação, levando em conta fatores
como a capacidade de vascularização da região afetada, presença de
infecção e condições clínicas do paciente. Ênfase deve ser dada quando os
membros inferiores estão envolvidos, porque o sucesso da reabilitação do
paciente está intimamente ligado com a adequação à futura prótese.
Sempre que possível, o cirurgião deve preservar a articulação do joelho, já
que essa tem a função crítica de proporcionar eficiência no processo de
marcha. Ainda assim, mesmo com cotos transtibiais extremamente curtos,
a função de marcha atinge níveis satisfatórios após o processo de
reabilitação.
Nesse sentido, o método convencional de fixação de próteses ao membro
residual nos pacientes amputados ocorre por meio do uso de um encaixe
protético dimensionado para ajustar-se ao membro. Com o passar do
tempo, podem ocorrer alterações no volume e superfície do coto, que
causam ferimentos e dores no paciente. Isso implica dificuldades na
utilização da prótese e alterações na amplitude e ordem da marcha do
indivíduo.
Assim, a técnica de osseointegração tem sido estudada com o objetivo de
aperfeiçoar a tecnologia protética, procurando uma perfeita
compatibilidade com o usuário, ao mesmo tempo em que procura atingir
certa viabilidade de custos. A grande vantagem dessa técnica é permitir
que a prótese seja fixada diretamente no osso, aumentando o conforto e
reduzindo da quantidade de lesões.
Em casos específicos e não emergenciais, as amputações podem ser
realizadas com o uso de uma técnica em que se constrói um cilindro de
periósteo retirado da tíbia, contendo fragmentos de osso cortical presos
ao mesmo, com o objetivo de conseguir uma união completa dos ossos,
por ossificação da zona fibrosa ou cartilaginosa na articulação tibiofibular,
situada na extremidade distal do coto (periosteoplastia).
Com o uso dessa técnica, ocorre aumento na capacidade de absorver o
esforço da descarga distal, sem ocorrência de dor no uso da prótese. A
consequência desse procedimento é a formação de um coto ósseo distal
mais estável e uma superfície também maior, o que propicia melhor
absorção da descarga de peso e da fixação do soquete protético. Esse é
um exemplo de técnica cirúrgica não convencional que apresenta
excelentes resultados no processo de reabilitação, comparada à cirurgia
transbidial clássica (apesar da existência de cotos transtibiais
extremamente curtos). A Figura 4 exibe uma prótese ortopédica não
implantável como um meio auxiliar de locomoção, um joelho policêntrico
para pacientes que sofreram desarticulação ao nível do joelho.
Figura 4. Joelho policêntrico para desarticulação de joelho. Fonte: INSS, 2017, p. 52.
Além disso, membros superiores não podem ser esquecidos, pois, uma vez
que estejam fortalecidos, eles propiciarão auxílio para a independência do
paciente no leito hospitalar, transferências corriqueiras e uso de cadeira
de rodas. Um programa personalizado de fortalecimento muscular será
fundamental para o desenvolvimento do processo pós-operatório. Esse
fortalecimento permitirá que o paciente realize funções prioritárias, como
o autocuidado, trocas posturais adequadas, troca de vestuário e
alimentação, por exemplo.
Assim, o posicionamento do tronco, dos membros inferiores e superiores
devem estar sujeitos às determinações específicas do fisioterapeuta.
Movimentos como flexão do joelho, rotação externa da coxa e apoio de
travesseiros sob as articulações, bem como o desalinhamento dos
membros inferiores, devem ser evitados. Nesse sentido, desde que não
existam contraindicações clínicas, deve-se buscar a mobilização ativa e
passiva das articulações proximais.
Um frequente obstáculo para a implementação de todos esses
procedimentos é quando o amputado não adere ao tratamento da forma
adequada. É evidente, portanto, que o fator psicológico precisa ser
trabalhado no paciente. Faz-se necessário, inclusive, uma avaliação
cognitiva do paciente, para identificar qual é a sua capacidade para
aprender, adaptar-se e usar a prótese. Um profissional devidamente
habilitado terá condições de compreender os eventuais conflitos advindos
do estresse de frequentes e longas internações hospitalares e o desafio do
pré e pós-operatório. Esse profissional poderá explorar as melhores
possibilidades e alternativas para que o paciente recupere a confiança e
possa contribuir para o êxito do tratamento.
Dessa forma, passada essa etapa, o exame clínico determinará o nível
ideal de amputação, sempre levando em conta a necessidade de procurar
preservar o máximo possível de tecidos, facilitando a protetização.
Retrações musculares acontecem, geradas pela secção de alguns
músculos, e devem ser minimizadas pelo correto posicionamento do coto
no pós-operatório.
Importante lembrar, também, que o paciente estará sujeito a
complicações no coto, como edemas, dores fantasma, hematomas,
sangramentos, infecções, má circulação, má cicatrização, necroses
teciduais, úlceras, neuromas e espículas ósseas. Deformidades no coto, no
entanto, podem ser evitadas pela mobilização, a fim de manter o trofismo
muscular e a amplitude de movimento (ADM).
Como mencionado, a análise e manipulação minuciosa do coto pode
revelar a presença de problemas, como espículas ósseas, que
frequentemente causam sensibilidade e dor, interferindo na utilização
eficiente da prótese. Espessamento causado por uma fibrose no nervo
(neuroma) pode ser evitado com o seccionamento do nervo em um nível
proximal, provocando sua retração. Já nos casos de aparecimento de
necroses graves, o tratamento pode exigir uma nova amputação em nível
mais proximal, embora necroses não graves possam ser tratadas por
terapêutica simples.
Nesse sentido, para diminuir o sofrimento dos amputados, o
fisioterapeuta tem alguns recursos que devem ser aplicados de forma
individualizada após a avaliação do paciente, bem como objetivos a serem
atingidos no tratamento. Dentre eles, podemos destacar:
1 – Massoterapia / A massoterapia por fricção, deslizamento superficial,
deslizamento profundo, percussão e amassamento tem a função de
estimular e fortalecer a musculatura do coto;
2 – Ultrassom / O ultrassom terapêutico (UST) é empregado com o
objetivo de acelerar a reparação tecidual de lesões musculares. Quando
usado no modo pulsado (10-20%), a 16-48Hz e dose de 0,4 W/cm2, obtém
bom resultado sobre neuromas. Já no modo contínuo 1,0 W/cm2,
melhora a extensibilidade muscular, minimizando retrações;
3 - Estimulação elétrica nervosa transcutânea / Quando moduladas nos
parâmetros adequados, as correntes podem promover analgesia,
tonificação ou relaxamento muscular, melhoria do fluxo circulatório local,
drenagem local de líquidos e contrações musculares. Além disso, auxilia na
regeneração e na cicatrização de diversos tecidos corporais;
4 – Crioterapia / Indicada para promover analgesia e diminuir edemas;
5- Turbilhão /É uma modalidade da fisioterapia que, com o uso de um
tanque com água (tanque de Hubbard), promove uma condução térmica
em movimentos circulares que melhoram a extensibilidade muscular e
minimizam a rigidez articular, aumentando a amplitude de movimento;
6 – Hidroterapia / A característica hidrocinética que a água produz gera
atrito ou pressão contra o corpo, trazendo benefícios cardiovasculares,
aumentando a resistência do paciente por meio do alongamento e
relaxamento de cadeias musculares. A temperatura morna da água
também exerce influências positivas na redução de espasmos musculares;
7 – Laser / O laser de baixa potência atua com bons resultados no
processo, cicatrização de feridas de difícil cicatrização;
8 – Dessensibilização / Conjunto de técnicas de dessensibilização do coto
para melhora da sensibilidade local, indicadas para a ocorrência de
neuromas. Estas massagens podem ser superficiais ou profundas, e são
realizadas por meio de um processo de estímulos que utilizam diversas
texturas e temperaturas como, por exemplo, esponja, algodão, gelo e
água morna;
9 – Enfaixamento compressivo em oito / É uma técnica específica de
enfaixamento, em formato de oito, com maior compressão na região
distal do coto e menor na região proximal, que deve ser controlada por
medidas da circumetria, usando-se fita métrica. Indicada também para
redução de edemas, minimiza a dor fantasma e contribui para modelagem
da região do coto para futura protetização. A Figura 5 mostra as fases do
enfaixamento.
Para melhorar a compreensão do texto, seria melhor colocar a Figura 5
dentro deste item.
10 – Cinesioterapia / Contribui para a melhora do tônus muscular, por
meio de exercícios passivos, ativos assistidos, ativos e ativos resistidos. Os
exercícios devem ser realizados nas cadeias musculares do coto, do
membro contralateral, do tronco e dos membros superiores;
11 - Exercícios com resistência manual e faixa elástica / São realizados
para o fortalecimento muscular dos flexores, extensores, adutores e
rotadores internos do quadril;
12 - Exercícios isométricos /Indicados na fase pós-operatória imediata,
para fortalecimento do coto. Esses exercícios estimulam as fibras
musculares, facilitando os movimentos;
13 - Exercícios respiratórios / É definido como um conjunto de
procedimentos, técnicas e uso de instrumentos para prevenção,
promoção e recuperação de disfunções envolvidas com o processo de
respiração. Com o desuso por conta de longos períodos de inatividade, em
decorrência de frequentes internações hospitalares, o membro
contralateral e a amplitude articular têm o seu tônus muscular diminuído.
Em que:
(A) Início do enfaixamento em oito no arco plantar.
(B) Início do enfaixamento em oito atrás do tornozelo.
(C) Continuação do enfaixamento em oito, posicionando a articulação do
tornozelo em eversão e dorsiflexão plantar.
(D) Enfaixamento em oito finalizado.
Ademais, atenção também deve ser dada às características construtivas da
prótese. Ela deve ser leve e resistente, estar alinhada e ter bom
acabamento para o equilíbrio postural e movimento de marcha do
paciente. Ênfase deve ser dada à transmissão correta das informações
necessárias para que o amputado possa colocar e retirar sua prótese com
segurança e autonomia.
Em suma, todos esses cuidados, além do tratamento fisioterapêutico, têm
papel crucial no processo de reabilitação da amputação, para reduzir e
evitar possíveis intercorrências que possam interferir no sucesso da
utilização de próteses. Enfim, o trabalho do fisioterapeuta tem como
objetivo permitir que o amputado atinja níveis satisfatórios de adaptação
no pré e pós-operatório, como sua independência no leito hospitalar e a
autonomia sustentável para atividades de sua vida diária (AVDs).
Confecção de palmilhas
A utilização de palmilhas personalizadas para uso em calçados
confeccionados sob criteriosos estudos científicos faz parte dos esforços
para a recuperação e reabilitação de pacientes portadores de disfunções
de mobilidade. Um dos maiores beneficiários dessas técnicas é o paciente
acometido de diabetes mellitus. A úlcera do pé diabético é uma grave
complicação, com altíssima incidência na população diabética. As
ulcerações são resultantes de sérias complicações vasculares somatizadas
por lesões nos nervos, causadas pelo excesso glicêmico. Assim, os nervos,
quando lesionados, perdem a sua capacidade de executar
adequadamente sua função de enviar os impulsos elétricos para o
controle do sistema muscular.
Com a musculatura dos membros inferiores debilitada e funcionando de
forma descoordenada, o processo postural e de marcha fica
comprometido. A própria estrutura dos pés, que envolvem um delicado
conjunto de ossos interligados, é afetada. Concomitantemente, há perda
ou ausência de sensibilidade à dor do paciente. Todos esses fatores juntos
exercem um papel crítico para criar lesões que rapidamente evoluem para
úlceras. O andar descoordenado é, portanto, um dos fatores que devem
ser examinados. A adoção de palmilhas como medida terapêutica pode
compensar em parte essas disfunções, redistribuindo as pressões e
impactos no processo de marcha do paciente. Assim, por meio do
entendimento da biomecânica da marcha humana, foi possível observar
que ela é realizada por meio de movimentos compostos por ações
integradas e sincronizadas com o mecanismo muscular e articular dos pés.
Nesse seguimento, o comprimento dos membros, a massa e a forma
estrutural do organismo influenciam no processo de caminhar, estudados
por meio da cinemática e cinética. A marcha humana resulta de um
movimento de constante transferência do peso do corpo de um membro
para o outro, quando os dois pés estão em contato com o solo. Quando
ocorre uma sequência dessa função por parte de um dos membros, o
fenômeno é chamado de ciclo de marcha, composto de períodos de apoio
e balanço. A distribuição desses dois períodos dá-se da seguinte forma:
60% para a função de apoio e 40% para a função de balanço.
À medida que o tempo passa, as anomalias de pisadas são observadas por
meio de sintomas, como dores na região lombar, nas pernas e desgastes
irregulares nas solas de sapatos. Extensos estudos têm sido realizados
sobre as alterações da chamada pressão plantar dos pés, por meio de
inúmeras técnicas, como a baropodometria, por exemplo. Essas técnicas e
procedimentos proporcionam valiosas informações para os profissionais
da saúde, porque ajudam na criação de procedimentos terapêuticos para
o paciente. A utilização de palmilhas sintéticas, sendo assim, consegue
reduzir significativamente a pressão plantar durante o processo de
marcha. O látex natural e o etilvinilacetato (EVA) possuem propriedades
físico-químicas que os tornam aptos para customização, sob estritos
critérios e especificações de engenharia.
SINTETIZANDO
Um dos maiores dramas que podem acontecer na vida de um diabético é
a amputação. Esse é um drástico procedimento que pode ocorrer como
consequência das complicações da doença. Uma vez consumada, a
restrição de mobilidade provoca mudanças profundas no modo de vida do
paciente, geralmente com repercussões na área econômica e social. O
fato é que o paciente pode recorrer a uma série de recursos que, se
devidamente disponibilizados, podem proporcionar plenas condições para
retomada de uma vida normal.
Nesse sentido, aprendemos que a amputação deve ser encarada como um
processo abordado por uma equipe de saúde multidisciplinar, que
concentrará esforços para encontrar as melhores soluções
individualizadas para o paciente. O cirurgião escolhe meticulosamente
uma técnica de amputação, visando sintonia com a confecção da prótese.
O fisioterapeuta, por sua vez, tem a missão de preparar o fortalecimento
do paciente no pré e pós-cirúrgico, bem como de auxiliá-lo com a
adaptação da prótese. Por fim, mas não menos importante, cabe ao
psicoterapeuta conscientizar o paciente sobre a adesão aos tratamentos e
aceitação de sua nova condição de vida.