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Introdução e epidemiologia
O diabetes é uma doença crônica progressiva que há anos se apresenta como um grande
Em 2014 estimava-se que 422 milhões de adultos viviam com diabetes, em comparação
com 108 milhões em 1980. A prevalência global do diabetes quase dobrou desde 1980, passando
de 4,7% para 8,5% na população adulta. Na última década, sua prevalência aumentou mais
obesidade, atividade física insuficiente e maior ingestão de alimentos não saudáveis. As causas do
entre os países com maior número de pessoas diabéticas no mundo. Nesse mesmo ano foi
instituída no Brasil, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), uma pesquisa de base domiciliar, de
âmbito nacional, realizada em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A PNS de 2013 constatou que o diabetes atinge 9 milhões de brasileiros (6,2% da população
adulta). As mulheres (7%) apresentaram maior proporção da doença do que os homens (5,4%) e a
maioria das pessoas tem mais de 60 anos de idade (54%). A PNS fará parte do Sistema Integrado
5,3% dos óbitos em 2011, complicações agudas da doença responderam por 2,45 óbitos por 100
mil habitantes em 2010, sendo de 0,29 por 100 mil habitantes entre os menores de 40 anos de
idade2.
renda
Definição e Classificação
maturidade dos jovens [MODY]), doenças do pâncreas exócrino (como fibrose cística) e
Segundo a American Diabetes Association (ADA), o diabetes tipo 1 é responsável por cerca
de 5 a 10% dos casos de diabetes no mundo e o tipo 2, por cerca de 90 a 95%. Como essas duas
formas são as mais prevalentes, este capítulo discorrerá sobre essas formas4.
Patogenia
desenvolvimento da doença variam desde a destruição autoimune das células β do pâncreas, com
insulina freqüentemente coexistem no mesmo paciente, e muitas vezes não está claro qual
diabetes tipo 1 quanto no tipo 2, vários fatores genéticos e ambientais podem resultar na perda
progressiva de massa e/ou função de células β. Uma vez que a hiperglicemia ocorre, os pacientes
com todas as formas de diabetes estão em risco de desenvolver as mesmas complicações, embora
Diabetes tipo 1
Esta forma de diabetes resulta de uma destruição auto-imune das células β do pâncreas e
Esses termos há muito deixaram de ser empregados já que a insulina pode servir ao tratamento de
qualquer tipo de diabetes e pelo fato da diabetes tipo 1, apesar de ocorrer comumente na infância
que um desses auto-anticorpos estão presentes em 85% a 90% dos indivíduos. Além disso, a
doença tem fortes associações com o antígeno leucocitário humano (Human Leukocyte Antigen -
HLA), com ligação aos genes DQA e DQB, e é influenciada pelos genes DRB. Estes alelos
está relacionada a fatores ambientais que ainda são mal definidos. Embora os pacientes
raramente sejam obesos quando apresentam esse tipo de diabetes, a presença de obesidade não
é incompatível com o diagnóstico. Esses pacientes também são propensos a outros distúrbios
Nesta forma de diabetes, a taxa de destruição das células β é bastante variável, sendo
cetoacidose como primeira manifestação da doença. Outros têm modesta hiperglicemia de jejum
que pode mudar rapidamente para hiperglicemia e/ou cetoacidose grave na presença de infecção
ou estresse. Por outro lado, alguns adultos podem reter função residual de células β suficiente
para prevenir a cetoacidose por muitos anos; esses indivíduos eventualmente tornam-se
dependentes de insulina para sobreviver e correm risco de cetoacidose. Neste último estágio da
Diabetes idiopático - Algumas formas de diabetes tipo 1 não têm etiologias conhecidas.
Alguns desses pacientes têm insulinopenia permanente e são propensos à cetoacidose, mas não
apresentam evidência de autoimunidade. Embora apenas uma minoria de pacientes com diabetes
Indivíduos com esta forma de diabetes sofrem de cetoacidose episódica e exibem graus variados
de deficiência de insulina entre os episódios. Esta forma de diabetes é fortemente herdada, carece
Diabetes tipo 2
No diabetes tipo 2, os caminhos para a destruição e disfunção das células β são menos
genéticos5.
ou diabetes do adulto, abrange indivíduos que têm resistência à insulina e geralmente apresenta
deficiência de insulina relativa (ao invés de absoluta). Pelo menos inicialmente, e muitas vezes ao
longo sua vida, esses indivíduos não precisam de tratamento com insulina para sobreviver.
Existem provavelmente muitas causas diferentes desta forma de diabetes. Embora as etiologias
específicas não sejam conhecidas, a destruição autoimune de células β não ocorre, e os pacientes
A maioria dos pacientes com esta forma de diabetes é obeso ou tem sobrepeso, e o
excesso de peso causa algum grau de resistência à insulina. Alguns pacientes podem não se
enquadrar nos critérios tradicionais de obesidade (por peso), mas podem ter um percentual maior
raramente ocorre espontaneamente neste tipo de diabetes e, quando vista, geralmente surge em
associação com o estresse fisiológico provocado por outra doença, como a infecção. O diagnóstico
desta forma de diabetes geralmente é feito muitos anos após a instalação da doença, isto ocorre
grave o suficiente para o paciente notar qualquer um dos sintomas clássicos do diabetes. No
doença. Considerando que esses pacientes podem ter níveis de insulina normais ou elevados,
espera-se que quanto maior for o nível de glicose plasmática maior será o nível de insulina
enquanto a função das células β for normal. Assim, a secreção de insulina é defeituosa nesses
melhorar com a redução de peso e/ou tratamento farmacológico da hiperglicemia, mas raramente
é restaurada ao normal. O risco de desenvolver esta forma de diabetes aumenta com a idade,
obesidade e falta de atividade física. Ocorre mais freqüentemente em mulheres com diabetes
Diagnóstico
O diagnóstico do diabetes é feito de acordo com alguns critérios clínicos (Tabela 1).
Tabela 1 - Critérios para o diagnóstico do diabetes (Adaptado de American Diabetes
Association, 2017)
Glicemia de jejum ≥126 mg/dL (7.0 mmol/L). Jejum é definido como ausência de ingestão
OU
Durante um teste de tolerância à glicose, glicemia ≥200 mg/dL (11.1 mmol/L), 2 horas
OU
Hemoglobina glicada ≥6.5% (48 mmol/mol). O teste deve ser feito em laboratório usando
OU
*Na ausência inequívoca de hiperglicemia, os resultados devem ser confirmados com a repetição
dos testes.
Tratamento
não só o manejo da glicose circulante, com a redução dos valores de hemoglobina glicada para
(Adaptado de Bloomgarden, 2000; Bodnar et al, 2016 e Sociedade Brasileira de Diabetes, 2017).
Índices Compensação
ria
Glicemia (mg/dL)
140 140 -
180
Colesterol (mg/dL)
DC) < 70
Total 230
195
80 – 90
Índice de massa corporal
(kg/m2) 25 25 – 27 > 27
Homem 24 24 - 25 > 25
Mulher
*DC = doença cardiovascular; LDL = low-density lipoprotein (lipoproteína de baixa densidade); HDL
Ao não conseguir controlar os níveis séricos de glicose o paciente fica suscetível a episódios
As complicações agudas acontecem em curto prazo e podem ser desencadeadas tanto por
mantidas dentro de uma faixa relativamente estreita ao longo do dia (geralmente entre 55 e 165
mg / dL)7.
hipoglicemia grave e clinicamente significativa é definida como glicose <54 mg / dL, enquanto o
valor de alerta para a alerta para a diminuição de glicose é definido como ≤70 mg / dL 8.
glinidas) ou o atraso ou falta de uma refeição (que provoca variação no teor de carboidratos).
Também podem ser responsabilizados por quadros de hipoglicemia: náuseas, vômitos, retardo do
função renal, hepática ou adrenal; alcool e cocaína; drogas que afetam a consciência; outras
gatifloxacina, etc...)8,9.
plasmática.
absorção rápida (glicose ou equivalente) e realizar glicemia capilar após 15 minutos. Caso os
valores glicêmicos estejam abaixo de 70mg/dL repetir o procedimento inicial. Com valores acima
glicose (3-4), 3-4 colheres de chá cheias de açúcar, ½ copo de suco de frutas ou de refrigerante
mg/dL.
lenta9.
A primeira instala-se rapidamente (horas) enquanto que a segunda é mais insidiosa (dias).
Tanto a CAD quanto a EHH são urgências médicas e o paciente deve ser encaminhado ao hospital
(Tabela 3)10
e sinais e sintomas apresentados pelos pacientes (Adaptado de Umpierrez et al, 2016 10).
(mmol/kg)
grave
Hipocalemia Hipocalemia
oligúria
visuais, sonolência/
irritabilidade
hiperosmolar, podem ser utilizados padrões clínicos gerais que incluem glicemia capilar acima dos
anamnese relata ter utilizado insulina NPH humana 2 horas atrás, é provável que essa glicemia
diminua, já que essa insulina tem o início de sua ação entre 2 a 4 horas após a sua administração.
Outro exemplo é o paciente que chega ao consultório odontológico logo após o uso da mesma
medicação hipoglicemiante (NPH humana 2 horas atrás) mas não se alimentou e apresenta
glicemia de 80mg/dL. É bem provável que esse paciente entre em hipoglicemia durante o
atendimento odontológico.
As complicações crônicas são aquelas que vão ocorrer em longo prazo e que estão
complicações vasculares através de vários mecanismos: ativação das vias de poliol e hexosamina,
fatores de crescimento, citocinas e angiotensina II. Esses fatores podem, por sua vez, induzir uma
disfunção endotelial difusa e causar o endurecimento e espessamento das paredes dos vasos
são resultantes da união não enzimática e irreversível de glicanos a lípidios, proteínas ou outras
moléculas orgânicas. Estas substâncias que se acumulam no plasma, paredes dos vasos sanguíneos
e tecidos, são os principais responsáveis por causar expansão da matriz extracelular após sua
união ao colágeno, causando o endurecimento e espessamento das paredes dos vasos sanguíneos.
Os macrófagos apresentam receptores de alta afinidade para AGEs (RAGE) e sua ligação
determinará o início da síntese de perfis de citocinas, sendo liberados principalmente TNF-α e IL-1.
Essas citocinas têm a capacidade de se ligar a várias linhagens celulares que participam da
respondem por eventos como a retinopatía, nefropatia e neuropatia. Níveis elevados de glicemia
Assim, em termos de saúde oral, um paciente diabético pode apresentar uma doença
periodontal mais exacerbada e/ou de difícil controle, quadros de infecções oportunistas (como
Mas é importante evidenciar que somente um paciente diabético que apresente hiperglicemia de
alterações bucais, a ferramenta mais confiável e fidedigna é o exame clínico. Pacientes que
que podem requerer mais atenção do cirurgião dentista. O exame de hemoglobina glicada (A1c ou
HbA1c), nesses casos, também pode ser relevante para construir o quadro clínico do paciente. A
hemoglobina é uma proteína, presente na hemácia, que é responsável por carrear o oxigênio.
Durante sua vida útil essa proteína acaba incorporando a glicose que existe na corrente
circulatória, assim, como a meia vida da hemácia é de 90 a 120 dias, quando solicitamos um
exame de hemoglobina glicada estamos identificando qual foi a glicemia média do paciente nos
últimos 3 a 4 meses. Os níveis de glicose plasmática dos últimos 30 dias contribuem com 50% do
resultado final desse exame, e os níveis de glicose plasmática de 90-120 dias contribuem apenas
com 10%. Por este motivo, recomenda-se uma avaliação trimestral da HbA1c 12. Existe uma
correspondência entre os níveis encontrados de HbA1c e os níveis médios de glicemia que pode
Tabela 4 – Correspondência entre os níveis de HbA1c (%) e os níveis médios de glicemia dos
últimos dois a quatro meses (mg/dL). (Adaptado de Sociedade Brasileira de Diabetes, 2018 15).
4 70
5 98
6 126
7 154
8 182
9 211
10 239
11 267
12 295
paciente e, por exemplo, a reparação alveolar pós exodôntica, e, portanto, não indicam o uso de
odontológico quando a questão são os efeitos crônicos da hiperglicemia. Por outro lado, o CD
pode ter que manejar outras doenças sistêmicas crônicas que podem instalar-se como
Considerações finais
ou estado hiperglicemico hiperosmolar. Os efeitos de longo prazo da hiperglicemia não são contra-
doença de base pode auxiliar o cirurgião dentista a instituir um atendimento odontológico seguro.
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