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Auto-rotação de helicópteros:
um modelo analítico para o traçado
do diagrama de altura versus velocidade

Luiz Eduardo Miranda José Rodrigues


Mestre em Ciência
[Engenharia Mecânica e Aeronáutica] – ITA;
Professor na graduação
[Engenharia Civil/
Engenharia de Produção Mecânica] – Uninove.
luizeduardomiranda@uninove.br, São Paulo – SP [Brasil]

Neste artigo, estudam-se os efeitos decorrentes da perda


de potência líquida aplicada ao rotor de helicópteros
monomotores, que resulta no regime de operação conhecido
como auto-rotação. Apresenta-se modelo analítico para
o traçado do diagrama de altura versus velocidade, que
demonstra as regiões em que o vôo da aeronave fica restrito,
no caso da auto-rotação. Realizam-se as análises qualitativa
e quantitativa do estudo proposto pela comparação dos
resultados obtidos neste trabalho com os conseguidos por
intermédio de um modelo semi-empírico disponível na
literatura.

Palavras-chave: Auto-rotação.
Diagrama de altura versus velocidade. Helicópteros.

Exacta, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 65-76, jan./jun. 2006 65


1 Introdução A

Todo helicóptero, quando por algum motivo


sofre perda de potência, pode entrar no regime de

Altura
operação conhecido como auto-rotação para efe-
Região C
tuar um pouso seguro, sem maiores danos tanto restrita
para os tripulantes quanto para a aeronave. Para
estabelecer esse regime o comandante, porém,
Região restrita
deve tomar atitudes rápidas, tão logo perceba a B D

falha no motor. A experiência do piloto, numa Velocidade de vôo à frente


situação como essa, portanto, precisa ser gran-
Ilustração 1: Diagrama de altura versus velocidade
de, pois, se o intervalo de tempo entre a perda de Fonte: Rodrigues (2001).
potência e o comando for longo, torna-se impra-
ticável o estabelecimento de um regime de auto- comandar o regime auto-rotacional e realizar um
rotação estável. Nesse caso, o helicóptero poderá pouso com segurança. Já o ponto B representa a
sofrer sérios danos, em razão da alta velocidade altura máxima em relação ao solo, em que, ha-
de queda transformar-se em energia de impacto vendo uma perda de potência durante o vôo pai-
com o solo/água, o que poderá acarretar iminente rado, o piloto pode deixar a aeronave cair, pois
risco de morte a tripulantes e/ou passageiros. o trem de pouso/esqui é suficientemente resisten-
Uma importante restrição de operação a ser te para absorver a energia de impacto da queda
observada é o chamado diagrama de altura versus sem causar maiores danos tanto para a tripula-
velocidade, que, obrigatoriamente, deve constar ção quanto para a aeronave. O ponto C significa
do manual de vôo de qualquer helicóptero e que a combinação entre velocidade mínima de vôo à
tem a finalidade de mostrar ao piloto da aeronave frente e altura, que permite ao piloto realizar um
regiões em que há restrição para o vôo tanto de pouso sem perigo, se houver a perda de potência,
altura quanto de velocidade à frente, limitando o no regime de auto-rotação. A região delimitada
envelope de vôo. Uma vez que a perda de potên- pelo ponto D fornece uma área de operação res-
cia ocorra no interior dos limites restritivos des- trita, pois combina velocidades elevadas e alturas
se diagrama, estabelece-se uma situação em que muito pequenas em relação ao solo, o que impos-
o regime de auto-rotação torna-se inviável, em sibilita a estabilização do regime de auto-rotação,
função do reduzido tempo hábil para a aeronave se necessário, uma vez que o tempo é curto demais
responder ao comando antes de chegar ao solo. para qualquer reação. Diante disso, a aeronave,
Um modelo típico do diagrama de altura versus ao chocar-se com a água, transforma sua eleva-
velocidade está demonstrado na Ilustração 1. da energia cinética em energia de impacto com os
O diagrama de altura versus velocidade, conseqüentes danos pessoais e materiais.
como se pode observar, exibe uma região de Como se pode observar, qualquer helicóptero
restrição para operação segura da aeronave e se possui uma região de vôo restrita para o estabe-
caracteriza por quatro pontos fundamentais. O lecimento do regime de auto-rotação. Este artigo
ponto A representa a altura mínima em relação ao apresenta um modelo que visa a analisar o envelo-
solo na qual, caso haja perda de potência durante pe operacional da aeronave nesse regime particu-
o vôo pairado, o piloto tem tempo suficiente para lar. Com o intuito de validar o modelo proposto

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neste trabalho buscou-se compará-lo com um mo- (como área do rotor principal e solidez) e configu-
delo semi-empírico para o traçado do diagrama de ração da aeronave. Portanto, contando com ape-
altura versus velocidade disponível na literatura. nas alguns dados que definem as características da
aeronave, obtém-se todo o diagrama e, ao mesmo
tempo, pode-se avaliar o efeito da variação de um
2 Modelo proposto para determinado parâmetro sem a realização de um
o traçado do diagrama vôo de teste. Isso permite que, durante as fases
de altura versus velocidade iniciais do projeto de um novo helicóptero, seja
possível a comparação entre várias configurações
A capacidade de um helicóptero realizar um propostas para a aeronave, com o intuito de se ob-
pouso seguro em regime de auto-rotação após ter a menor restrição operacional possível.
ocorrer uma perda de potência está limitada, por
seu design estrutural e aerodinâmico, e por cer- 2.1 Adimensionalização
tas combinações de altura do solo e velocidade de
do diagrama de altura
vôo à frente. Se essa perda ocorrer no interior da
versus velocidade
região de vôo restrito, definida pelas citadas com-
Pode se obter o diagrama de altura versus ve-
binações, tem-se, como resultado, o alto risco de
locidade apresentado na Ilustração 2 por meio do
ocorrência de danos tanto na aeronave quanto em
método de adimensionalização, e verifica-se que
seus ocupantes.
sua aparência é similar para qualquer tipo de heli-
Nesta seção do artigo, é apresentado um mo-
cóptero convencional analisado.
delo analítico que demonstra os efeitos de altitude-
Este processo tem, como base, os resultados
densidade e de peso bruto da aeronave no diagra-
dos testes feitos pela Federal Aviation Administra-
ma de altura versus velocidade para helicópteros
tion (FAA) e apresentados por Rodrigues (2001),
monomotores com características similares.
e indicam que, para três combinações de altura
A idéia central do método baseia-se na cons-
e velocidade, hlo, hhi e hcr, Vcr, que variam linear-
tatação que diagramas obtidos, experimental-
mente com a altitude e o peso bruto da aeronave,
mente, de diversos helicópteros de configuração
diagramas similares são obtidos de qualquer tipo
convencional (um rotor principal e um rotor de
cauda) apresentam formas similares, indepen- de helicóptero convencional testado.
dentemente da condição de vôo dos aparelhos. Pelo diagrama adimensional representado na
Por um processo de adimensionalização aplicado Ilustração 2, pode-se notar que:
às coordenadas de altura e velocidade, alcança-
das pelo método experimental, é possível obter • O ponto crítico (hcr, Vcr) adimensionalizado
um diagrama adimensional geral, que independe possui coordenadas (1, 1);
do tipo e da condição de operação do helicóptero • As alturas máxima hhi e mínima hlo adimen-
para, posteriormente, chegar a um diagrama di- sionalizadas possuem coordenadas (0, 0);
mensional pelo processo inverso de dimensiona- • A velocidade normalizada adimensional de
lização proposto neste trabalho. vôo à frente mcr está contida no intervalo
Esse método possibilita a utilização dos dia- 0 ≤ mcr ≤ 1;
gramas dimensionais no cálculo de diversas con- • X1 e X 2 representam, respectivamente, as dis-
dições de peso, altitude, parâmetros geométricos tâncias verticais superior e inferior ao ponto

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de abscissa de valor unitário hcr adimensional rior ao ponto (hcr, Vcr), representada pela altura
e estão contidos no intervalo 0 ≤ X ≤ 1; adimensional X1, e outra inferior, representada
• Duas curvas adimensionais são obtidas, pela altura adimensional X 2 .
uma do ramo superior ao ponto (hcr, Vcr) e Esses parâmetros de adimensionalização são
outra do ramo inferior ao ponto (hcr, Vcr). dados por:
Existem, portanto, na análise, dois sistemas
hhi - hX1
de eixos verticais. X1 =
hhi - hcr
(2)
hhi
0

X2 = hX2 - hlo
hcr - hlo
(3)
h -h
X1 = hi X1
hhi - hcr
em que: hlo, hhi e hcr são fixos e h X1 e h X2 são as
(hcr, Vcr) alturas do ramo superior e inferior da curva real
1 h X2
para um dado Vff.

VX
X2 = hX2 - hlo 2.2 Processo de obtenção
hcr - hlo
h Xl
do diagrama dimensional
Como o diagrama adimensional praticamen-
te não varia de um helicóptero para outro, o que
hlo 0 mcr = Vff /Vcr 1 realmente interessa ao projetista da aeronave é,
que se possa, a partir dele, calcular o diagrama
Ilustração 2: Diagrama de altura versus
velocidade em sua forma adimensional dimensional levando-se em conta todos os parâ-
Fonte: Rodrigues (2001). metros de operação e configuração da aeronave.
Neste ponto, é importante ressaltar que para
O primeiro passo para a realização do pro- a apresentação das equações do método analítico
cesso de adimensionalização é encontrar uma re- propostas para a dimensionalização do diagrama,
lação que forneça uma velocidade normalizada bem como para apresentar os resultados desses es-
adimensional de vôo à frente mcr, que pode ser ob- tudos, eles não serão expressos no corpo do artigo
tida dividindo-se a velocidade dimensional de vôo em medidas do Sistema Internacional de Unidades
à frente Vff, pela velocidade crítica Vcr, produzindo (SI), mas sim no sistema inglês, ou seja, a altura
a seguinte equação: será representada em pés (em inglês, feet [ft])1, a
velocidade em nós (em inglês, knot [kt])2 , a potên-
V
mcr = ff cia em cavalos (em inglês, horse power [HP])3 e o
Vcr
peso em libras (lb)4. Isso ocorre porque a imensa
(1)
maioria das aeronaves apresenta instrumentos de
bordo com mostradores grafados nesse sistema de
O segundo passo do processo é encontrar unidades, além das cartas de navegação aérea de
uma altura adimensional, que pode ser obtida qualquer parte do mundo que contêm indicações
dividindo-se a curva em duas regiões, uma supe- de altitude em pés e de velocidade em nós. De ou-

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tra feita, a utilização de unidades não equivalentes (cerca de 29 metros [m]). Essa aproximação é
às do sistema inglês, poderia causar certo descon- determinada pelos resultados obtidos de en-
forto entre profissionais do ramo aeronáutico na saio em vôo;
interpretação dos resultados, além de interferir, • Os dados também demonstram que, pela
em aspectos de segurança operacional dos contro- análise dos diagramas, o valor de hhi varia
ladores de vôo e dos pilotos. segundo o quadrado de Vcr.
Assim, das Equações 1, 2 e 3 obtidas ante-
riormente, é possível elaborar as equações que Na seqüência, são apresentadas as equações
fornecem o diagrama dimensional a partir do dia- que determinam as combinações críticas de altura
grama adimensional: e velocidade de vôo à frente, a fim de se aplicar o
processo de geração de pontos necessários à de-
Vff = mcrVcr finição do diagrama de altura versus velocidade
(4)
dimensional de um helicóptero.
h X1 = hhi - X1(hhi - hcr)
(5)
2.2.1 Obtenção da altura mínima hlo
h X2 = hlo + X 2(hlo - hcr) As equações que fornecem o ponto de altu-
(6) ra mínima em relação ao solo são desenvolvidas
considerando-se a somatória das forças verticais
em que: hlo, hhi e hcr são fixos e X1 e X 2 são alturas do helicóptero. Esse método é válido somente
dos ramos superior e inferior da curva adimensio- como solução de primeira ordem do problema,
nal para um dado valor de mcr. não sendo utilizado para levantar as caracterís-
Os valores de X1 e X 2 podem ser lidos direta- ticas de desempenho em auto-rotação durante o
mente da Ilustração 2, não importando qual seja tempo utilizado na análise de trajetórias. Como
o helicóptero em questão. Nestas condições, fica resultado dessa análise, obtêm-se os efeitos do
claro que a solução do problema se resume à ob- peso bruto e da altitude-densidade da aeronave no
tenção dos valores de hlo, hhi e hcr, Vcr. ponto de altura mínima em relação ao solo.
Com base na análise dos resultados apre- Parte-se da hipótese de que a aeronave está
sentados em Pegg (1990), é possível relacionar os pairando a uma certa altura em relação ao solo.
gráficos com expressões matemáticas, visando a A Ilustração 3, representada a seguir, mostra as
encontrar uma solução analítica para o traçado do forças verticais que atuam no helicóptero.
diagrama de altura versus velocidade para deter-
minados valores de peso bruto e altitude, confor- T
me comentado a seguir:

• Para se determinar a variação da altura hlo


hr
em relação a altitude-densidade e ao peso
W
bruto da aeronave, a equação para hlo deve
hlo
ser calculada utilizando-se do equilíbrio das Solo
forças atuantes no helicóptero;
Ilustração 3: Forças atuantes no helicóptero
• Indicações da FAA demonstram que o ponto durante a auto-rotação em descida vertical
médio (hcr, Vcr) encontra-se próximo de 95 ft Fonte: O autor.

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A somatória das forças verticais na aeronave em que: I r corresponde à inércia do rotor, Preq à po-
fornece as seguintes equações: tência requerida em HP, L é o parâmetro de efeito
solo, sendo a relação de velocidade angular Wf /Wd
..
mh = T - W dada por:
(7)
wf = 2,24 Ct
.. wd s
h = g(n - 1)
(13)
(8)

em que: n é o fator de carga a que está sujeita a em que: Wf representa a velocidade angular de ro-
aeronave. tação do rotor, no momento em que a aeronave
Integrando-se a Equação 8, encontra-se a ve- toca o solo após a falha do motor, enquanto Wd
locidade vertical da aeronave: representa a velocidade angular de projeto para o
rotor principal. A partir das Equações 10, 11, 12
. .
h = h0 + g(n - 1)t e 13, pode-se obter a Equação 14 que determina o
(9) valor de hlo expresso em pés:

hlo = c- k1 - 2,24 Ct og
I rwd2Vd
O deslocamento vertical do helicóptero é ob-
1100Preql
s
tido integrando-se a Equação 9:
(14)

.
hlo = h = h0dt + g(n -1) dt
2

2 em que: Vd representa a velocidade de descida ver-


(10)
tical da aeronave.
O parâmetro L, presente na Equação 14 co-
Se a velocidade vertical de impacto estiver es- nhecido como parâmetro de efeito solo, é resultan-
pecificada (considerações estruturais do trem de te da relação entre as potências requeridas sob a
pouso), a partir da Equação 9, tem-se que: influência do efeito solo e, de fora, do efeito solo.

navg = Vd + 1 2.2.2 Obtenção da altura crítica hcr


gdt
Por meio de vários testes realizados pela FAA,
(11)
constatou-se que o valor de hcr é independente da
densidade e do peso da aeronave, e praticamente
em que: Dt representa o tempo decorrido desde a não varia, assumindo um valor constante em tor-
falha do motor até o pouso da aeronave, podendo no de 95 ft (cerca de 29 m).
ser representado do seguinte modo: Portanto, pode-se escrever a equação para hcr
da seguinte forma:
w Iw 2
dt = (1 - f ) r d
wd 550Preql hcr = 95 ft
(12) (15)

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2.2.3 Obtenção da velocidade do cálculo da curva de potência em velocida-


crítica Vcr des elevadas.
O valor de Vcr é obtido a partir de uma curva
experimental que mostra a variação de Vcr em fun- Pode-se notar, portanto, que a potência to-
ção de Vmin e Cl /s. tal requerida apresenta um alto valor em vôo
A Equação 16 permite o cálculo do valor de pairado e possui um valor mínimo em algum
Vcr em nós. ponto Vff > 0; e volta a apresentar um valor ele-
vado em altas velocidades devido ao aumento
Vcr = 2,84Vmin + 5,54 Cl - 172,3 excessivo da potência parasita ou da potência de
s
(16)
perfil, decorrente dos efeitos de estol e da com-
pressibilidade. Observa-se que, para um dado
em que: Cl representa o coeficiente de sustenta- peso da aeronave, existe uma velocidade Vmin na
ção e s, a solidez do rotor principal, o que indica qual a potência requerida é mínima. Esse ponto
o quanto da área do disco do rotor é ocupada é de grande importância, pois, por meio dele é
pelas pás. possível calcular Vcr.
Na Equação 16, Cl /s é um dado do helicóp- A velocidade Vmin, na qual a potência reque-
tero e Vmin representa a velocidade de vôo à frente rida é mínima, pode ser facilmente obtida atra-
que minimiza a potência requerida. Vale ressaltar vés da curva de potência requerida; para efeito
que, nos testes realizados nos ensaios em vôo, o deste trabalho, porém, foi empregado o méto-
coeficiente de sustentação é mantido constante do analítico apresentado por Johnson (1989),
por meio de uma relação constante m/r, ou seja, considerando-se, para estimar essa velocidade,
considera-se que a diminuição da densidade do ar a potência em vôo à frente da aeronave, do se-
com a variação da altitude é compensada pela re- guinte modo:
dução de peso obtida do consumo de combustível
CP = kCt + sCd (1 + 4,6m2) + 1 f m3
2
pela aeronave. 0

2m 8 2A
A fim de determinar o valor de Vmin, pode-se
(17)
utilizar um gráfico de variação da potência reque-
rida em decorrência da velocidade de vôo à frente V
em que: m = é a razão de avanço do helicóp-
wR
e, então, observar que:
tero; kCt é o termo devido à potência induzida;
2

2m
• A potência induzida é o maior componente
da potência total, na condição de vôo paira- sCd (1 + 4,6m2) é o termo devido à potência de
0

8
do, mas ela diminui rapidamente com o au-
mento da velocidade em vôo à frente; perfil; e 1 f m3 é o termo devido à potência parasi-
2A
• A potência de arrasto de perfil apresenta um
ligeiro aumento com a velocidade; ta, sendo f a área equivalente de placa plana.
• A potência parasita é praticamente desprezí-
vel em baixas velocidades, mas aumenta pro- Pode-se então concluir que o ponto de po-
porcionalmente ao cubo da velocidade; pode tência requerida mínima é obtido derivando-se a
passar a ser considerada a parcela dominante Equação 17 em relação a m:

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CP
=0 mente relacionada com os valores dos parâmetros
m
hlo, hhi e Vcr. Portanto, conclui-se que o estudo da
(18)
diminuição da área de restrição recai na análise de
sensibilidade dos valores de hhi, hlo e Vcr levando-se
ou seja, os valores de m procurados são tais que em consideração as restrições que há nas carac-
satisfaçam a seguinte equação: terísticas de projeto e na operação da aeronave.
Neste artigo, não será apresentada a análise de
- kCt + 1,15Cd sm + 3fm = 0
2 2
sensibilidade dos parâmetros citados, cuja ínte-
2m2 0
2A
gra, no entanto, pode ser encontrada em Rodri-
(19)
gues (2001).

Uma vez determinado o valor da velocidade


em que a potência requerida é mínima Vcr pode ser 3 Apresentação e análise
calculada, a partir da Equação 16, considerando- dos resultados
se a relação Cl /s para a aeronave em questão.
Nota-se que a Equação 18 pode fornecer, como Os resultados alcançados a partir da imple-
resultados, raízes reais e complexas, positivas ou mentação numérica das equações discutidas ante-
negativas, porém apenas as raízes reais positivas riormente são apresentados e comparados com os
têm o significado físico de interesse para a deter- de ensaio em vôo (PEGG, 1990). Para efeito de
minação da velocidade de vôo à frente, o que mi- estudo do comportamento do diagrama de altura
nimiza a potência requerida. Assim, desprezam-se versus velocidade, testaram-se algumas situações,
as raízes negativas e complexas que se pode obter como, por exemplo: variação de altitude e de peso.
a partir da solução da Equação 19. Esses testes foram conduzidos utilizando-se dife-
rentes configurações de helicóptero. A Fotogra-
2.2.4 Obtenção da altura máxima hhi fia 1, a seguir mostra os modelos de helicóptero
A Equação 20, apresentada a seguir, relacio- testados. Os parâmetros operacionais para cada
na os valores de hhi e Vcr. O modelo analítico para um desses aparelhos podem ser encontrados em
a obtenção dessa equação é apresentado por Ro- Rodrigues (2001).
drigues (2001). Os Gráficos 1 e 2, a seguir, mostram as formas
dimensionais e adimensionais para três helicópte-
hhi = 205,1 + 0,18Vcr2 ros com características operacionais diferentes. A
(20) finalidade principal da análise desses diagramas é
demonstrar que, independente do tipo e da confi-
Embora existam gráficos experimentais para guração da aeronave (convencional), o diagrama
a determinação de hhi, é importante que esse valor de altura versus velocidade adimensional apresen-
numérico seja obtido da Equação 20, pois assim ta características semelhantes.
tem-se a possibilidade de se fazer um cálculo ana- O diagrama em sua forma dimensional
lítico, facilitando o trabalho do projetista quando para os helicópteros BK-117, UH-60L e UH-60A
ele não possuir um desses gráficos para exame. (Gráfico 1), foi traçado para uma condição de
A análise anterior mostra que a forma do vôo ao nível do mar, em atmosfera-padrão. Os
diagrama de altura versus velocidade está intima- três helicópteros são bimotores, o que contribui

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500

400

300

Altura (ft)
200

(a) 100

0 10 20 30 40 50
Velocidade de vôo à frente (knots)

BK-117
UH-60A
UH-60L

Gráfico 1: Altura versus velocidade


em sua forma dimensional para os
helicópteros UH-60L, UH-60A e BK-117
(b)
Fonte: O autor.

2
1.75
Altura adimensional

1.5
1.25
1
0.75
0.5
(c) 0.25

0 0.2 0.4 0.6 0.8 1


Velocidade de vôo
à frente normalizada adimensional
BK-117
UH-60A
UH-60L

Gráfico 2: Altura versus velocidade


em sua forma adimensional para os
helicópteros UH-60L, UH-60A e BK-117
Fonte: O autor.
(d)

Fotografia 1: Helicópteros utilizados como


modelo para aplicação das equações: Sikorsky para a redução da área de restrição imposta pelo
UH-60A (a), Sikorsky UH-60L (b), MBB/Kawasaki diagrama de altura versus velocidade. No entan-
BK-117 (c), Eurocopter AS 350 B (d)
to, as curvas foram traçadas, considerando-se um
Fonte: Kawasaki Aerospace Company (s/d.), Meeker Aviation
(s/d.) e Sikorsky (s/d.). dos motores inoperante, ou seja, os diagramas são

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apresentados com a maior área de restrição ope- 700

racional. Assim, pode-se notar que o helicóptero


600
BK-117 ocupa uma área de restrição menor em re-
lação aos helicópteros UH-60L e UH-60A, devido 500
ao fato de o peso bruto do BK-117, 7.000 lb (ou
31.136 N [newtons]), ser bem menor que o dos

Altura (ft)
400

outros dois (20.000 lb ou 88.960 N). Portanto,


300
deduziu-se que, para uma mesma altitude, quanto
mais leve é a aeronave, menor é a sua área de res- 200
trição operacional.
Embora o peso das aeronaves UH-60L e 100

UH-60A seja igual, a área de restrição para o


segundo é maior que a do primeiro. A explica- 0 10 20 30 40 50 60 70

ção para este fato pode ser creditada à diferença Velocidade de vôo à frente (knots)
Nível do mar
de potência de 1.940 HP (1.446,658 quilowatts
5.000 ft
[kW]) fornecida pelo motor do UH-60L, em re- 9.000 ft
lação aos 1.560 HP (1.163,292 kW) do UH-60A, Gráfico 3: Diagramas dimensionais obtidos
gerando no primeiro maior velocidade de ponta da aplicação do método semi-empírico,
considerando a variação de altitude
de pá WR, o que, conseqüentemente, resulta, em
Fonte: Pegg (1990, p. 29).
maior energia cinética de rotação. Pela aplica-
ção do modelo de adimensionalização proposto,
700
obtém-se um diagrama que mostra a forma adi-
mensional para os três helicópteros em questão 600
(Gráfico 2). Observa-se que, independente do tipo
e da configuração da aeronave (aeronave conven- 500

cional), o diagrama adimensional possui caracte-


Altura (ft)

400
rísticas semelhantes, ou seja, as combinações de
altura e velocidade de vôo à frente adimensional 300
são as mesmas para qualquer tipo de helicóptero
estudado. Conclui-se, portanto, que, durante as 200

primeiras fases do projeto de um novo helicópte-


100
ro, é possível iniciar a análise da área de restrição
imposta pelo diagrama de altura versus velocida-
0 10 20 30 40 50 60 70
de por meio de um modelo adimensional como o
Velocidade de vôo à frente (knots)
apresentado anteriomente.
Nível do mar
Com a finalidade de validar o método pro- 5.000 ft
posto, os Gráficos 3, 4 e 5 mostram os resultados 9.000 ft

obtidos a partir da aplicação das equações expos- Gráfico 4: Diagramas dimensionais obtidos
da aplicação do método analítico proposto,
tas anteriormente neste artigo, considerando-se a considerando-se a variação de altitude
variação de altitude para um mesmo peso bruto da Fonte: O autor.

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aeronave. As características propostas são seme- Além de apontar que o método analítico
lhantes às do helicóptero Eurocopter AS-350B. proposto neste artigo pode ser aplicado, fornecen-
No Gráfico 3, são observados os resultados do resultados semelhantes aos encontrados pela
numéricos obtidos da utilização do método semi- adoção do método semi-empírico, a avaliação do
empírico apresentado por Pegg (1990) para a so- Gráfico 5 permite observar que um aumento da
lução do problema, valendo-se de diversos grá- altitude de vôo influi, de maneira negativa, no as-
ficos resultantes de ensaios em vôo. Já o Gráfico pecto do diagrama de altura versus velocidade.
4 mostra os resultados numéricos alcançados Na análise realizada, o peso bruto da aeronave se
utilizando-se a teoria proposta neste artigo, ba- manteve constante (3.700 lb ou 16.457 N), assim
seada no processo de dimensionalização pelo uso como as demais características de caráter físico do
de uma solução analítica para o problema. Com projeto do rotor.
o intuito de comparar os dois conjuntos de resul- Na análise do Gráfico 5, nota-se que um au-
tados, o Gráfico 5 representa a sobreposição dos mento na altitude de vôo, do nível do mar (zero
dois diagramas anteriores, em que é possível ob- ft/zero m) para 5.000 ft (1.524 m), acarreta uma
servar que os resultados são praticamente idênti- deformação no aspecto do diagrama. Os pontos
cos, indicando que a teoria apresentada é válida de controle do diagrama não variam do mesmo
e pode ser aplicada em qualquer configuração de modo, ou seja, cada um deles é influenciado dife-
helicóptero convencional. rentemente em relação à variação de altitude. Por
exemplo, a velocidade crítica Vcr passa de 23 kt
700 (11,817 m/s) para 38 kt (19,524 m/s), ao se variar
a altitude de vôo do nível do mar para 5.000 ft, o
600
que representa um aumento percentual de 65% em
500
relação ao valor inicial. A altura hhi passa de 300
ft (91,440 m) para 470 ft (143,256 m), represen-
tando um aumento percentual de 56% em relação
Altura (ft)

400

ao valor inicial. Para a altura hlo, percebe-se que


300
praticamente não existe influência na variação de
altitude, pois as diferenças encontradas são muito
200
pequenas quando comparadas aos demais fatores
100 de controle do diagrama. Quando a altitude passa
de 5.000 ft (1.524 m) para 9.000 ft (2.743,200
m), pode-se observar que, novamente, os princi-
0 10 20 30 40 50 60 70
Velocidade de vôo à frente (knots) pais fatores que se alteram são Vcr e hhi. Em termos
percentuais, é possível verificar que Vcr passa de
Pegg Artigo 38 kt (19,524 m/s) para 48 kt (24,662 m/s), ou
Nível do mar Nível do mar
seja, indica um aumento de 26%. No caso da altu-
5.000 ft 5.000 ft
9.000 ft 9.000 ft
ra hhi, tem-se uma variação de 470 ft (143,256 m)
para 630 ft (192,024 m), o que aponta um aumen-
Gráfico 5: Comparação de resultados da to de 34%. Portanto, o diagrama de altura versus
teoria apresentada neste trabalho com
os obtidos do método semi-empírico velocidade não se deforma do mesmo modo em
Fonte: O autor. relação aos seus parâmetros de controle.

Exacta, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 65-76, jan./jun. 2006 75


4 Considerações finais quantitative analysis of the study are carried
out, by comparing the results obtained in this
Com relação ao estudo, concluiu-se que: work and the ones achieved by means of a semi-
empirical model available in the literature.

• O diagrama adimensional apresentado inde-


pende do tipo e da configuração da aeronave Key words: Auto-rotation.
Height versus speed diagram. Helicopters.
e, portanto, possui caráter genérico, podendo
ser aplicado a qualquer tipo de helicóptero de
estrutura convencional. Notas
• Tal diagrama foi obtido experimentalmente 1 N. Ed.: Um pé equivale a 0,3048 metro (m).
de testes realizados pela FAA, com pilotos de 2 N. Ed.: Um nó equivale a uma milha náutica por hora ou
0,5144 metros por segundo (m/s).
prova experientes, e representam o vôo de he-
3 N. Ed.: Um cavalo equivale a 746 watts (W).
licópteros testados na condição limite de se- 4 N. Ed.: Como medida de massa, uma libra equivale a
453,59237 gramas (g). Freqüentemente utilizada como
gurança. Daí conclui-se que os diagramas di- medida de peso equivale a 4,448 newtons (N).
mensionais resultantes do método exposto por
Pegg (1990) são também diagramas-limite, Referências
que minimizam a área de restrição e não são
JOHNSON, W. Helicopter theory. 1. ed. Princeton:
aplicáveis a pilotos menos experientes. Princeton University Press, 1989.
KAWASAKI AEROSPACE COMPANY. BK-117.
A fim de minimizar a área de restrição im- Helicopters. Tóquio: KHI, s/d. Disponível em: <http://
www.khi.co.jp/aero/helicopters/bk117_e.html>. Acesso
posta pelo diagrama de altura versus velocidade em: 10 mar. 2006.
chega-se à conclusão de que a melhor maneira é di-
MEEKER AVIATION. AS-350B3 side view. Products.
minuir o valor de Vcr, pois, dessa forma, consegue- Eurocopter. Pitt Meadows: Meeker Aviation, s/d.
Disponível em: <http://www.meekeraviation.com/
se tanto uma aproximação da curva em direção ao
images/products/eurocopter/AS-350-B3-SIDE-VIEW_
eixo vertical quanto uma redução no valor de hhi. W.jpg>. Acesso em: 10 mar. 2006.
Entretanto, limitações físicas ou tecnológicas po- PEGG, R. J. An investigation of the helicopter height-
dem estar presentes, dependendo da combinação velocity diagram showing effects of density altitude and
gross weight. Nasa TN D-4536, Hampton, 1990.
de parâmetros escolhidos para minimizar Vcr.
RODRIGUES, L. E. M. J. Estudo do desempenho
de helicópteros monomotores operando no regime
de auto-rotação. 2001. Dissertação (Mestrado em
Helicopters’ auto-rotation: Ciência [Engenharia Mecânica e Aeronáutica])-Instituto
an analytical model Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos,
2001.
for the diagram profile of height SIKORSKY. UH-60A. Image gallery. Military aircraft.
versus speed US army. Stratford: Sikorsky, s/d. Disponível em: <http://
www.sikorsky.com>. Acesso em: 10 mar. 2006.

This article focuses the effects from the loss of


net power in the main rotor of single-engined
helicopters that results in the regime of operation Recebido em: 6 jan. 2006 / aprovado em: 10 mar. 2006
usually known as auto-rotation. An analytical Para referenciar este texto
model, presented in the article, helps to trace RODRIGUES, L. E. M. J. Auto-rotação de
the height versus speed diagram, that shows the helicópteros: um modelo analítico para o traçado do
regions in which the flight remains restricted, diagrama de altura versus velocidade. Exacta, São
in the case of auto-rotation. Qualitative and Paulo, v. 4, n. 1, p. 65-76, jan./jun. 2006.

76 Exacta, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 65-76, jan./jun. 2006

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