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AO JUÍZO DA ____VARA DO TRABALHO DE ______

XXXXXXXXXXXXXXXX, devidamente qualificada nos autos da


reclamatória epigrafada, por suas advogadas, vem, com o devido respeito, a
este i. Juízo, interpor, tempestivamente1, AGRAVO DE PETIÇÃO C/C
PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO , nos termos do Art. 897, alínea a, da
CLT2, pelas fundamentações que seguem nas razões anexas, pugnando pelo
encaminhamento à Instância Superior.

Nestes termos pede deferimento.

Vila Velha/ES, 02 de Junho de 2022.

ADVOGADO
OAB

1
A decisão agravada (ID. a4cf8a1) foi publicada no dia 30/05/2022. Tendo em vista a contagem em dias úteis, nos
termos do Art. 775 da CLT, o prazo de 08 dias iniciou em 31/05/2022 e finda no dia 09/06/2022, sendo, portanto,
tempestivo o protocolo da presente peça.
2
Art. 897 - Cabe agravo, no prazo de 8 (oito) dias:
a) de petição, das decisões do Juiz ou Presidente, nas execuções;
EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 17ª REGIÃO -
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO.

1. TEMPESTIVIDADE E PREPARO

A decisão agravada (ID. a4cf8a1) foi publicada no dia xx/xx/xx. Tendo


em vista a contagem em dias úteis, nos termos do Art. 775 da CLT, o prazo de
08 dias iniciou em xx/xx/xx e finda no dia xx/xx/xx, sendo, portanto, tempestivo
o protocolo da presente peça.

Quanto ao depósito recursal, o juízo já se encontra garantido em razão


do seguro garantia judicial efetuado na interposição do Recurso Ordinário, não
tendo, portanto, valor a recolher para interpor o presente recurso, nos termos
da Súmula 128, II, do TST:

Súmula nº 128 do TST


DEPÓSITO RECURSAL (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 139,
189 e 190 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
(...)
II - Garantido o juízo, na fase executória, a exigência de depósito para
recorrer de qualquer decisão viola os incisos II e LV do art. 5º da CF/1988.
Havendo, porém, elevação do valor do débito, exige-se a complementação da
garantia do juízo. (ex-OJ nº 189 da SBDI-1 - inserida em 08.11.2000)

No que se refere às custas, estas serão pagas, ao final, pela Agravante,


nos termos do Art. 789-A, IV, da CLT e da Instrução Normativa nº 20, XIII, do
TST3.

2. DO CABIMENTO DO AGRAVO DE PETIÇÃO

No presente processo, o Magistrado a quo determinou o acionamento da


seguradora xxxxxxxxxxxx a fim de que promova o depósito do valor segurado
pela apólice nº xxxxxxxxxxxxxxxx entendendo que o seguro garantia não é bem

3
Art. 789-A. No processo de execução são devidas custas, sempre de responsabilidade do executado e pagas ao final,
de conformidade com a seguinte tabela:
(...)
IV – agravo de petição: R$ 44,26 (quarenta e quatro reais e vinte e seis centavos);
Instrução Normativa nº 20, XIII, do TST: “No processo de execução, as custas não serão exigidas por ocasião do
recurso, devendo ser suportadas pelo executado ao final”.
da reclamada e se iguala a depósito recursal efetuado em período anterior ao
deferimento da recuperação judicial.

Por ser a decisão ofensiva a jurisprudência dominante junto ao STJ e


TST, assim como da norma legal, em especial Arts. 6º e 49 da Lei n.
11.101/2005, não há alternativa à Agravante senão a interposição do presente
Agravo, nos termos do Art. 897, ‘a’, da CLT.

O presente agravo de petição é medida perfeitamente cabível contra


determinados despachos e/ou decisões que resolvem questões incidentes na
execução trabalhista, hipótese aplicável ao caso em tela.

O Art. 897, alínea "a", da CLT dispõe ser cabível agravo de petição das
decisões do Juiz ou Presidente nas execuções, o que remete à jurisprudência a
interpretação da natureza de tais decisões.

Desse modo, no procedimento executivo é admissível o agravo de


petição contra decisões definitivas ou terminativas, conforme preconiza o Art.
893, §1º da CLT, permitindo-se, contudo, que seja manejado contra decisões
interlocutórias, em casos específicos e desde que o tema debatido encerre viés
de estancamento do feito executivo, como se verifica no presente caso.

A hipótese em tela autoriza a imediata recorribilidade pela via do agravo


de petição.

Ainda, ante o caráter de urgência e eminente necessidade de suspensão


do curso da execução, uma vez que a decisão determina a execução do
seguro garantia, o presente o agravo de petição pode ser recebido, inclusive,
com efeito suspensivo, conforme inteligência dos Arts. 525, § 6º e 1.012, § §3º
e 4º, do CPC/2015.

Ainda, quanto à interposição da medida, destaque-se a lição do ilustre


doutrinador Mauro Schiavi (in 'Manual Didático de Direito Processual do
Trabalho', Editora JusPodivm, 2020, Pág. 626), que leciona ser cabível o
agravo de petição em face das seguintes decisões do Juiz do Trabalho
nas execuções: a) decisão que aprecia os embargos à execução; b) decisões
terminativas na execução que não são impugnáveis pelos embargos à
execução, como a decisão que acolhe a exceção de pré-executividade; c)
decisões interlocutórias que não encerram o processo executivo, mas trazem
gravame à parte, não impugnáveis pelos embargos à execução.
Informa o respeitado Doutrinador, ainda, que “Autores há que sustentam
a possibilidade de ser cabível o agravo de petição em face de decisões
interlocutórias na fase de execução, desde que causem gravame imediato à
parte, indeferindo sua pretensão”. (op.cit., pág. 627)

No mesmo sentido, preceitua Júlio César Bebber,"o agravo de petição


será o recurso adequado para impugnar a decisão interlocutória que
imponha obstáculo intransponível ao seguimento da execução ou que
seja capaz de produzir prejuízo grave e imediato à parte" (BEBBER, Júlio
César. Recursos no Processo do Trabalho. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 2009. Pág.
279).

Nesse mesmo sentido, vejamos decisões sobre o tema:

AGRAVO DE PETIÇÃO. CONHECIMENTO. DECISÃO


INTERLOCUTÓRIA. PREJUÍZO À PARTE. O agravo de petição é o
recurso adequado para impugnar decisão interlocutória que imponha
obstáculo intransponível ao seguimento da execução ou que seja capaz de
produzir prejuízo grave e imediato à parte. (PROCESSO nº 0024425-
59.2015.5.24.0071 (AP); A C Ó R D Ã O 1ª Turma Redator: Des. Nicanor
De Araújo Lima Relator: Des. Marcio Vasques Thibau De Almeida
Agravante: Keyth Jainne Botelho De Freitas Advogado: Josemiro Alves De
Oliveira Agravado : Edson P Batista – Me Advogado: Peterson Lazaro Leal
Paes Origem : 1ª Vara Do Trabalho De Três Lagoas – Ms)

AGRAVO DE INSTRUMENTO DAS EXECUTADAS. DETERMINAÇÃO


DE PENHORA DE PARTE DOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA
POR ELAS RECEBIDOS. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA.
INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO DE PETIÇÃO. POSSIBILIDADE DE
PREJUÍZO GRAVE E IMEDIATO À PARTE. RECORRIBILIDADE DO
ATO IMPUGNADO. O artigo 849, IV, do CPC, via de regra, protege da
possibilidade de constrição judicial os proventos de aposentadoria, versando
os agravos de petição interpostos sobre matéria de ordem pública. Embora se
reconheça se tratar de decisão interlocutória e não terminativa do feito, o
ato atacado tem potencial para acarretar prejuízo grave e imediato às
recorrentes, por se tratar de penhora incidente sobre verbas de natureza
alimentar. Por isso, pode ser impugnado por agravo de petição, na
conformidade da disposição contida na letra a do artigo 897 da
Consolidação das Leis do Trabalho. Trata-se, pois, de caso excepcional
em que deve ser admitida a interponibilidade desse remédio específico.
Agravos de instrumento das executadas conhecidos e providos. (TRT-1 -
AI: 01001396920165010058 RJ, Relator: MARISE COSTA RODRIGUES,
Data de Julgamento: 04/08/2021, Segunda Turma, Data de Publicação:
09/09/2021)

AGRAVO DE PETIÇÃO. CABIMENTO. DECISÃO


INTERLOCUTÓRIA MISTA. NECESSIDADE DE CARGA DE
DEFINITIVIDADE OU PREJUÍZO IMEDIATO À PARTE. Em regra,
o agravo de petição somente desafia as decisões terminativas e definitivas
proferidas na fase de execução, sendo certo que há decisões
interlocutórias que causam prejuízo à parte, tornando-se passíveis de
serem atacadas por meio do presente remédio processual e representam
exceção ao princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias
(teoria mista). (TRT 17ª R., 0125600-44.2005.5.17.0006, Rel.
Desembargador Carlos Henrique Bezerra Leite, DEJT 25/09/2012).

Destarte, a decisão proferida em execução que resolve questão


incidental (constrição de bens de empresa em recuperação judicial) e que
acarreta prejuízo à parte, deve ser impugnada por meio de agravo de petição
(art. 897, ‘a’, da CLT). Assim, a via eleita se mostra adequada, devendo ser
processada por este Tribunal e, no mérito, acolhida, pelos fundamentos a
seguir expostos.

3. DO PEDIDO DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO

Assim dispõe o Art. 995 do CPC/2015:

Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou
decisão judicial em sentido diverso.

Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por


decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de
dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a
probabilidade de provimento do recurso.

Ainda, ante o caráter de urgência e eminente necessidade de suspensão


do curso da execução, uma vez que a decisão determina a execução do
seguro garantia, o presente o agravo de petição pode ser recebido com efeito
suspensivo, conforme inteligência dos Arts. 525, § 6º e 1.012, § §3º e 4º, do
CPC/2015.

Para a concessão da medida liminar, devem estar presentes 02 (dois)


requisitos fundamentais: fumus boni juris e periculum in mora.

Nesse sentido, basta a análise dos argumentos tecidos acima e da


documentação colacionada aos autos para verificar a presença da relevância
dos motivos, de maneira que, caso seja mantida, a decisão agravada resultará
em prejuízos ao plano de recuperação judicial traçado pelo Juízo Falimentar.

É indubitável o prejuízo causado pelo juízo de piso, ao deferir o resgate


da apólice do seguro.

Ademais, a decisão agravada vai de encontro à Lei e ao posicionamento


jurisprudencial no sentido de que o Juízo Universal é o competente para
determinar medidas de constrição do patrimônio da empresa em recuperação
judicial, ainda que o depósito recursal ou seguro garantia tenha sido feito antes
do deferimento da recuperação judicial.

Isso tudo demonstra a verossimilhança das alegações da autora.

Demonstrado, portanto, o fumus boni iuris essencial à concessão da


medida pleiteada.

Já o periculum in mora está caracterizado pelos prejuízos que o resgate


da apólice do seguro garantia judicial causará à Agravante e ao plano de
recuperação judicial, inviabilizando, mais ainda, a situação econômica da
empresa.

Não obstante, a liminar ora pleiteada não causará qualquer prejuízo ao


interesse público, nem mesmo prejuízo social, inexistindo risco de
irreversibilidade da medida.

Diante disso, ante o caráter de urgência e eminente necessidade de


suspensão do curso da execução, requer-se a concessão de atribuição de
efeito suspensivo ao recurso, a fim de que sejam obstados os efeitos da
decisão de ID. XXXXXXX, suspendendo-se o curso da execução e,
principalmente, o resgate da apólice do seguro garantia judicial efetuado
nos autos, nos termos dos Arts. 525, § 6º e 1.012, § §3º e 4º, do CPC/2015.

DAS RAZÕES DE REFORMA DA DECISÃO AGRAVADA

Excelentíssimos Senhores Desembargadores do Egrégio Tribunal


Regional do Trabalho da 17ª Região, o M. Juízo de origem deferiu o pedido da
Agravada de liberação do seguro garantia em seu favor, determinando a
intimação da seguradora para efetuar o depósito do valor segurado, conforme
decisão de ID. XXXXX.

Data venia, a decisão deverá ser reformada, pelas razões a seguir


expostas.

4. DA IMPOSSIBILIDADE DE LIBERAÇÃO DO SEGURO GARANTIA


JUDICIAL – COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO FALIMENTAR
A Magistrada de piso deferiu o pedido da Agravada de liberação do
seguro garantia efetuado nos autos, sob o argumento de que foram feitos antes
do deferimento do pedido de recuperação judicial da Agravante, conforme se
infere do trecho destacado a seguir (ID. YYYYY):

“XXXXX”

Ressalte-se que a Agravante pugnou pela reconsideração da referida


decisão, para que se observe a Lei nº 11.101/2005 e o entendimento
jurisprudencial sobre a matéria, já que se encontra em recuperação judicial e o
crédito desta demanda deve ser habilitado no Juízo Universal.

Contudo, o Juízo manteve a decisão de ID. xxxxxxxxxx, conforme se


infere da decisão de ID. xxxx:

“aaaaaa”.

Data venia, a decisão em epígrafe merece reforma.

Isso porque, tendo em vista que a Agravante se encontra em


recuperação judicial (inclusive, houve a concessão da prorrogação do stay
period), conforme decisões de ID’s dde6105 e 491ca76, o crédito existente na
presente Reclamatória deve ser habilitado junto ao Juízo Universal.

O Juiz do Trabalho não pode praticar atos de expropriação do


patrimônio do devedor, sob pena de violação ao princípio da isonomia para
quitação dos credores da mesma classe, assim como à ordem de preferência
instituída pela Lei nº 11.101/2005.

Além disso, os atos de constrição de patrimônio do devedor podem


comprometer o plano de recuperação judicial.

Neste sentido, dispõe o Art. 6º da Lei nº 11.101/2005:

Art. 6º. A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação


judicial implica:        (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020)          (Vigência)
I - suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor sujeitas ao regime desta
Lei;        (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)          (Vigência)
II - suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores
particulares do sócio solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação
judicial ou à falência;        (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)          (Vigência)
III - proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e
apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda
de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à
recuperação judicial ou à falência.        (Incluído pela Lei nº 14.112, de
2020)          (Vigência)

§ 1º. Terá prosseguimento no juízo no qual estiver se processando a ação que demandar
quantia ilíquida.

Ademais, o Art. 76 do referido diploma legal prevê que os atos de


execução dos créditos individuais promovidos contra empresas falidas ou em
recuperação judicial devem ser realizados pelo Juízo universal; in verbis:

Art. 76. O juízo da falência é indivisível e competente para conhecer todas as ações
sobre bens, interesses e negócios do falido, ressalvadas as causas trabalhistas,
fiscais e aquelas não reguladas nesta Lei em que o falido figurar como autor ou
litisconsorte ativo.

Parágrafo único. Todas as ações, inclusive as excetuadas no caput deste artigo,


terão prosseguimento com o administrador judicial, que deverá ser intimado
para representar a massa falida, sob pena de nulidade do processo.

A Jurisprudência do STJ é uníssona no sentido de que são vedados atos


de constrição patrimonial pelo Juízo Trabalhista, quando a empresa devedora
está submetida do regime da recuperação judicial. Vejamos:

AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. DEFERIMENTO DE


RECUPERAÇÃO JUDICIAL. MEDIDAS DE CONSTRIÇÃO DO PATRIMÔNIO DA
EMPRESA. CRÉDITO EXTRACONCURSAL. CONSTRIÇÃO INDIRETA.
COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. 1. Os atos de
execução dos créditos promovidos contra empresas falidas ou em recuperação
judicial, sob a égide do Decreto-Lei n. 7.661/45 ou da Lei n. 11.101/05, bem como
os atos judiciais que envolvam o patrimônio dessas empresas, devem ser realizados
pelo Juízo universal. 2. Ainda que o crédito exequendo tenha sido constituído depois
do deferimento do pedido de recuperação judicial (crédito extraconcursal), a
jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que, também nesse caso, o
controle dos atos de constrição patrimonial deve prosseguir no Juízo da
recuperação. Precedentes. 3. Declarada a incompetência do Juízo laboral para
prosseguir com a execução e reconhecida a competência do Juízo da recuperação,
caso seja de seu interesse, incumbe ao credor-exequente diligenciar junto a este, no
intento de satisfazer e viabilizar sua pretensão executória . 4. Agravo interno não
provido. (STJ - PET no CC: 175484 MG 2020/0271 892-8, Relator: Ministro LUIS
FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 14/04/2021, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data
de Publicação: DJe 20/04/2021)

AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. RECUPERAÇÃO


JUDICIAL. EXECUÇÃO FISCAL. CARACTERIZAÇÃO. PRÁTICA DE ATOS DE
CONSTRIÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO RECUPERACIONAL. CLÁUSULA DE
RESERVA DE PLENÁRIO. INOBSERVÂNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A
jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça reconhece a existência de
conflito de competência quando um juízo diverso daquele em que se processa a
recuperação judicial pratica atos de constrição contra o patrimônio da empresa
recuperanda. 2. A despeito de as execuções fiscais não se suspenderem em
decorrência do processamento de recuperação judicial da empresa devedora,
eventuais atos de constrição contra o seu patrimônio devem passar pelo crivo do
juízo recuperacional . 3. O Supremo Tribunal Federal entende que a mera interpretação
de lei não viola a cláusula de reserva de plenário nem afronta a disposição da Súmula
Vinculante nº 10/STF. 4. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no CC: 157188 SC
2018/0055872-8, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de
Julgamento: 02/06/2020, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe
08/06/2020)

Ademais, o C. STJ também se manifestou no sentido de que havendo o


deferimento da recuperação judicial, a execução contra o devedor principal
será extinta devido a ausência de título a lhe dar suporte, somente sendo
possível exigir o depósito da indenização pela seguradora se tiver ficado
caracterizado o sinistro em momento anterior ao do pedido de
recuperação judicial, observada a extensão dos riscos cobertos pela apólice;
o que claramente não ocorreu no caso em exame!

Para ilustrar, segue decisão exarada no CONFLITO DE COMPETÊNCIA


Nº 161.667 - GO (2018/0274139-6), de relatoria do MINISTRO RICARDO
VILLAS BÔAS CUEVA:

CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. RECUPERAÇÃO JUDICIAL.


PEDIDO DE PROCESSAMENTO DEFERIDO. LEGITIMIDADE.
SEGURADORA. EXECUÇÃO TRABALHISTA. SEGURO GARANTIA
JUDICIAL. SINISTRO. NÃO OCORRÊNCIA. JUÍZO DA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL. COMPETÊNCIA.
1. Cinge-se a controvérsia a definir qual o juízo competente para prosseguir com os
atos executórios contra a empresa em recuperação na hipótese de ter sido oferecido
seguro garantia nos autos da execução em que o crédito foi apurado.
2. O conflito positivo de competência ocorre quando dois ou mais Juízos se
declaram competentes para o julgamento da mesma causa, nos termos do artigo 66,
I, do CPC/2015.
3. Tem legitimidade para suscitar conflito de competência quem quer que esteja
sujeito aos efeitos da sentença que algum dos juízes suscitados possa proferir.
Precedentes.
4. O artigo 49, § 1º, da Lei nº 11.101/2005 dispõe que os credores do devedor em
recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados,
fiadores e obrigados de regresso.
5. No seguro-garantia judicial, a relação existente entre o garantidor (seguradora) e
o credor (segurado) é distinta daquela existente entre credor (exequente) e o
garantidor do título (coobrigado), visto que no primeiro caso a relação resulta do
contrato de seguro firmado e, no segundo, do próprio título, somente sendo devida
a indenização se e quando ficar caracterizado o sinistro.
6. Na hipótese de haver o deferimento da recuperação judicial a execução
contra o devedor principal será extinta, haja vista a ausência de título a lhe
dar suporte, somente sendo possível exigir o depósito da indenização pela
seguradora se tiver ficado caracterizado o sinistro em momento anterior (ao
do pedido de recuperação), observada a extensão dos riscos cobertos pela
apólice.
7. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 3ª Vara
Cível de Itumbiara-GO.
(STJ, CC 161.667, Segunda Seção, Min. Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva,
publicado em: 31/08/2020)

Ademais, em recente acórdão proferido também pela Segunda Seção,


de relatoria do MINISTRO MARCO BUZZI, entendeu-se que o Juízo
Trabalhista invadiu a competência do Juízo Universal, ao deferir liberação de
carta de fiança:

AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA - EXECUÇÃO -


EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL - DELIBERAÇÃO
MONOCRÁTICA QUE DECLAROU A COMPETÊNCIA DO JUÍZO
UNIVERSAL - ESCÓLIO JURISPRUDENCIAL DA SEGUNDA SEÇÃO -
INSURGÊNCIA DO EXEQUENTE.
1. O Superior Tribunal de Justiça é competente para o conhecimento e
processamento do presente incidente, nos termos do que dispõe o artigo 105, I, "d",
da Constituição Federal.
2. A teor do julgamento do CC 116.743/MG, Rel. p/ acórdão Min. Luis Felipe
Salomão, Dje de 17/12/2012, adota-se o entendimento segundo o qual em conflitos
de competência envolvendo recuperação judicial de um mesmo grupo econômico
estes devem ser distribuído a um único relator.
2.1. Especificamente em relação ao grupo econômico envolvendo a recuperação
judicial da OI S/A, desde a distribuição do CC 147.939/RS, ocorrida em julho de
2016, consoante orientação supramencionada, este signatário é o Relator prevento
para exame de conflitos de competência, distribuídos no âmbito da Segunda Seção,
relacionados ao plano de soerguimento da suscitante. Precedentes.
3. É pacífica a orientação da Segunda Seção no sentido de ser o Juízo onde se
processa a recuperação judicial, o competente para julgar as causas em que
estejam envolvidos interesses e bens da empresa recuperanda. Precedentes.
3.1.Na hipótese, a deliberação proferida pelo r. juízo suscitado invadiu a
competência do r. juízo da recuperação judicial, na medida em que autorizou
a liquidação da garantia prestada no bojo da execução subjacente ao presente
incidente - carta de fiança -, sem franquear ao r. juízo da recuperação o
exame, se tal medida judicial - caso deferida - poderia dificultar, ou não, a
execução do plano de soerguimento aprovado pelos credores e devidamente
homologado judicialmente. Precedentes.
4. Agravo interno desprovido.
(STJ, AgInt no CC 168425 / RJ, Segunda Seção, Min. Rel. Marco Buzzi, julgado
em: 23/02/2022, publicado em: 02/03/2022)

Importante destacar, ainda, que o crédito reconhecido à Agravada já


consta da lista dos credores trabalhistas da Agravada e será pago na forma do
plano de recuperação judicial apresentado ao Juízo Universal.

Diante disso, não há que falar em resgate da apólice do seguro


garantia judicial efetuado nos autos.
Desse modo, o TST se posiciona no sentido de que, ainda que os
depósitos recursais ou seguro garantia judicial tenham sido feitos
anteriormente ao deferimento da recuperação judicial, não podem ser
levantados pela parte reclamante, sendo do Juízo Universal a competência
para os atos de execução, segundo se infere dos julgados a seguir:

AGRAVO DE PETIÇÃO DA RECLAMANTE. LIBERAÇÃO DE VALORES


EM SEU FAVOR. EMPRESA EM PROCESSO DE RECUPERAÇÃO
JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. Deferido o processamento da recuperação
judicial, os atos executórios em relação aos créditos trabalhistas líquidos
passam a ser de competência exclusiva do Juízo no qual tramita a
recuperação, até seu encerramento, e não desta Especializada, à qual compete,
após a apuração do débito, a mera expedição de certidão de crédito para
habilitação perante o juízo universal (art. 6º, § 2º da Lei nº 11.101/2005). Logo,
os valores relativos ao depósito recursal e seguro garantia judicial não podem
ser liberados ao reclamante, e sim remetidos ao juízo falimentar. Agravo de
petição a que se nega provimento, neste aspecto. (TRT 6ª R.; AP 0000301-
87.2019.5.06.0001; Primeira Turma; Rel. Des. Eduardo Pugliesi; DOEPE
11/10/2021; Pág. 781)

AGRAVO DE PETIÇÃO DA RECLAMANTE. LIBERAÇÃO DE DEPÓSITO


RECURSAL. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
IMPOSSIBILIDADE. Os documentos contidos no processo demonstram que o
seguro garantia judicial realizado com vistas ao preparo do recurso de revista
foi efetuado pela reclamada, empresa que está em recuperação judicial. Logo,
não prospera o pedido de liberação dos valores em benefício da exequente, o
que estaria em franca contrariedade à Súmula 43 desta Corte, cujo teor
estabelece que “o Juízo da execução trabalhista não deve determinar a
liberação do depósito recursal realizado por empresa em recuperação judicial,
para satisfação da execução trabalhista, ainda que o depósito tenha sido
realizado anteriormente à decretação da recuperação judicial, tendo em vista
que não subsiste a competência desta Justiça Especializada, a teor da Lei n.
11.101/2005”. Agravo de petição a que se nega provimento”. (TRT6, AP nº
0001239-87.2016.5.06.0001, Quarta Turma, Des. Rel. Gisane Barbosa de Araújo,
julgado em: 03/02/2022, publicado em: 03/02/2022)

SEGURO-GARANTIA OFERTADO POR EMPRESA EM RECUPERAÇÃO


JUDICIAL. LIBERAÇÃO EM BENEFÍCIO DO EXEQUENTE.
IMPOSSIBILIDADE. Levando-se em consideração que a competência da
Justiça do Trabalho se limita à definição do direito e sua consequente
liquidação, é certo que o valor concernente ao depósito recursal efetuado no
curso da reclamatória OU MESMO O SEGURO-GARANTIA, por não mais
justificar que permaneça à disposição desta Especializada, deve ser
disponibilizado para o Juízo responsável pela recuperação judicial, que
decidirá sobre seu destino, em consonância com o quadro geral de credores.
Agravo improvido. (TRT 18ª R.; AP 0010898-98.2018.5.18.0201; Segunda Turma;
Relª Desª Kathia Maria Bomtempo de Albuquerque; Julg. 01/04/2020; DJEGO
02/04/2020; Pág. 1211)
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO
PELA SEGUNDA EXECUTADA (OI S.A.). EXECUÇÃO. DEPÓSITO
RECURSAL REALIZADO ANTES DO DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL DA EMPRESA. LIBERAÇÃO AO EXEQUENTE OU
TRANSFERÊNCIA PARA OUTROS PROCESSOS. O agravo de instrumento
merece provimento, com consequente processamento do recurso de revista por
possível violação do art. 5º, II, da CF. Agravo de instrumento conhecido e provido.
B) RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA SEGUNDA EXECUTADA
(OI S.A.). EXECUÇÃO. DEPÓSITO RECURSAL REALIZADO ANTES DO
DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DA EMPRESA.
LIBERAÇÃO AO EXEQUENTE OU TRANSFERÊNCIA PARA OUTROS
PROCESSOS. Nos moldes do art. 6º, caput e § 2º, da Lei nº 11.101/2005,
decretada a falência ou deferido o processamento da recuperação judicial, a
competência da Justiça do Trabalho para executar créditos contra a massa falida ou
a empresa em recuperação judicial estende-se até a individualização e a
quantificação do crédito, após o que cabe ao credor habilitá-lo no Juízo universal.
Nesse diapasão, comprovado que a segunda executada se encontra em
recuperação judicial, esta Justiça especializada está impedida de proceder a
atos executórios, na medida em que a competência da Justiça do Trabalho se
limita a definir o direito e liquidá-lo. Desse modo, os créditos constituídos
antes do deferimento da recuperação judicial ou da decretação da falência
estão submetidos ao concurso de credores no Juízo falimentar, de modo que os
atos judiciais relacionados à destinação dos depósitos recursais efetuados
anteriormente ao deferimento da recuperação judicial, ou que digam respeito
à transferência do saldo remanescente para outros processos, devem ser
praticados pelo Juízo falimentar, uma vez que a disposição dos bens da
empresa em recuperação judicial deve respeitar as regras inscritas na Lei nº
11.101/2005. Logo, a deliberação acerca da transferência, ou não, dos valores
remanescentes desta demanda para outra compete ao Juízo universal, mesmo
que se refira a montante depositado em juízo antes do pedido de recuperação
judicial. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (TST; RR 0000864-
93.2010.5.09.0072; Oitava Turma; Relª Min. Dora Maria da Costa; DEJT
06/08/2021; Pág. 6879)

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. EXECUÇÃO.


RECUPERAÇÃO JUDICIAL DECLARADA POSTERIORMENTE.
LIBERAÇÃO DOS DEPÓSITOS RECURSAIS AO EXEQUENTE.
CABIMENTO DO MANDAMUS. INVIABILIDADE. COMPETÊNCIA DO
JUÍZO FALIMENTAR QUANTO À DESTINAÇÃO DOS DEPÓSITOS. A ação
mandamental é medida excepcional com o objetivo de resguardar direito líquido e
certo não amparado por outo meio processual (artigo 5º, II, da Lei nº 12.016/2009 e
Orientação Jurisprudencial nº 92 da SBDI-2 desta Corte). No caso, cabe a
aplicação do recentíssimo posicionamento desta SBDI-2/TST no sentido de mitigar
o rigor da Orientação Jurisprudencial nº 92 da SBDI-2 desta Corte, uma vez que
verificada a possível ilegalidade no ato coator, bem como a contrariedade à
jurisprudência desta Corte. O ato tido por coator consiste na autorização do
Juízo de origem, em fase de execução, para que a parte exequente proceda ao
levantamento dos valores referentes aos depósitos recursais nesta Justiça
Especializada, mesmo que tenha sido deferido o pedido de recuperação
judicial. Em se tratando de empresa em recuperação judicial, deve a questão
ser analisada à luz do art. 6º, caput, §§ 3º e 4º da Lei nº 11.101/2005. A
jurisprudência desta Corte é no sentido de que compete ao juízo universal a
prática de todos os atos de execução relativos a reclamações trabalhistas
contra empresa que tenha sua recuperação judicial decretada. Tal
entendimento deve ser estendido à situação do depósito recursal, mesmo que
tenha ocorrido em momento anterior à declaração de recuperação judicial.
Precedentes específicos desta SBDI-2. Ressalva de entendimento da relatora.
Recurso ordinário conhecido e provido. (TST; RO 0005659-84.2019.5.15.0000;
Subseção II Especializada em Dissídios Individuais; Relª Min. Maria Helena
Mallmann; DEJT 18/12/2020; Pág. 435)

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DEPÓSITOS DE


VALORES. RECUPERAÇÃO JUDICIAL DECLARADA POSTERIORMENTE.
EXECUÇÃO PROCESSADA NO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
IMPOSSIBILIDADE DE LIBERAÇÃO DE VALORES DEPOSITADOS
ANTERIORMENTE NO ÂMBITO DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Declarada a
recuperação judicial da reclamada, a competência da Justiça do Trabalho fica
adstrita à formação do título executivo até momento da liquidação. Nos
termos da jurisprudência da SBDI-2 desta Corte, à Consolidação dos
Provimentos da CGJT, e aos precedentes do STJ e STF, firmou-se o
entendimento de que todos os atos de execução referentes às reclamações
trabalhistas cuja executada tenha a recuperação judicial declarada somente
podem ser executados perante o Juízo Universal, ainda que o
depósito/constrição tenha ocorrido em momento anterior à mencionada
declaração, sendo do Juízo Universal a competência para a prática de
quaisquer atos de execução referentes às reclamações trabalhistas movidas
contra a Empresa Recuperanda. Recurso ordinário conhecido e provido.
(TST - ROT: 10023449120195020000, Relator: Renato De Lacerda Paiva, Data
de Julgamento: 30/03/2021, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais,
Data de Publicação: 09/04/2021)

Imperioso ressaltar, também, que o STJ, no julgamento do REsp nº


1.843.382/RS, em sede de recurso repetitivo (Tema 1.051), fixou a seguinte
tese: “Para o fim de submissão aos efeitos da recuperação judicial,
considera-se que a existência do crédito é determinada pela data em que
ocorreu o seu fato gerador”, como pode ser visto na ementa transcrita a
seguir:

RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. DIREITO EMPRESARIAL.


RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CRÉDITO. EXISTÊNCIA. SUJEIÇÃO AOS
EFEITOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. ART. 49, CAPUT, DA LEI Nº
11.101/2005. DATA DO FATO GERADOR. 1. Recurso especial interposto contra
acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados
Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Ação de obrigação de fazer cumulada com
reparação de danos pela interrupção da prestação do serviço de telefonia. Discussão
acerca da sujeição do crédito aos efeitos da recuperação judicial. 3. Diante da
opção do legislador de excluir determinados credores da recuperação judicial,
mostra-se imprescindível definir o que deve ser considerado como crédito existente
na data do pedido, ainda que não vencido, para identificar em quais casos estará ou
não submetido aos efeitos da recuperação judicial. 4. A existência do crédito está
diretamente ligada à relação jurídica que se estabelece entre o devedor e o
credor, o liame entre as partes, pois é com base nela que, ocorrido o fato
gerador, surge o direito de exigir a prestação (direito de crédito). 5. Os
créditos submetidos aos efeitos da recuperação judicial são aqueles
decorrentes da atividade do empresário antes do pedido de soerguimento, isto
é, de fatos praticados ou de negócios celebrados pelo devedor em momento
anterior ao pedido de recuperação judicial, excetuados aqueles expressamente
apontados na lei de regência. 6. Em atenção ao disposto no art. 1.040 do
CPC/2015, fixa-se a seguinte tese: Para o fim de submissão aos efeitos da
recuperação judicial, considera-se que a existência do crédito é determinada
pela data em que ocorreu o seu fato gerador. 7. Recurso especial provido. (STJ
- REsp: 1.843.382 RS 2019/0310348-3, Relator: Ministro RICARDO VILLAS
BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 09/12/2020, S2 – SEGUNDA SEÇÃO, Data
de Publicação: DJe 17/12/2020)

Observa-se que a 2ª Seção do STJ decidiu que, para o fim de sujeição


do crédito aos efeitos da recuperação judicial, considera-se a data em que
ocorreu o fato gerador deste.

De acordo com o Ministro Relator Ricardo Villas Bôas Cueva, não deve
prevalecer a corrente que entende que a existência do crédito depende do
trânsito em julgado do provimento judicial que o declare. Para ele, tal corrente
“parte do pressuposto de que somente nas situações em que a obrigação é
descumprida, sendo necessária a intervenção do Poder Judiciário para que a
prestação seja satisfeita, é que se poderia falar em existência do crédito. No
entanto, o crédito pode ser satisfeito espontaneamente, a partir da
quantificação acordada pelas partes, extinguindo-se a obrigação”.
Ainda, de acordo com o Relator, esse entendimento seria corroborado
pelo Art. 6º, § 3º da Lei nº 11.101/2005, o qual permite a determinação de
reserva da importância que estimar devida na recuperação judicial ou na
falência, para posterior inclusão em classe própria quando reconhecido líquido
o crédito.

A partir desses argumentos, conclui-se que a sujeição de um crédito aos


efeitos da recuperação judicial independe de declaração ou quantificação
judicial, menos ainda do trânsito em julgado da referida decisão judicial. Para
que um crédito tenha que observar as disposições do plano de recuperação,
basta a ocorrência do fato gerador.

Assim, os créditos submetidos aos efeitos da recuperação judicial são


aqueles decorrentes da atividade do empresário antes do referido pedido, ou
seja, de fatos praticados ou de negócios celebrados pelo devedor em momento
anterior ao pedido de recuperação judicial, com as ressalvas legais. Ocorre
que, dentre as exceções legais, não está incluído o crédito trabalhista.

No mesmo sentido, no âmbito do Colendo STJ, tem-se as ementas


abaixo:
AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA. LIMINAR
DEFERIDA. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO TRABALHISTA.
RECUPERAÇÃO JUDICIAL. JUSTIÇA LABORAL. DEPÓSITO RECURSAL
REALIZADO ANTES DO DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO.
RETENÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO JUÍZO UNIVERSAL.
ART. 76 DA LEI N. 11.101/2005. 1. Os atos de execução dos créditos
individuais e fiscais promovidos contra empresas falidas ou em recuperação
judicial, tanto sob a égide do Decreto-Lei n. 7.661/45 quanto da Lei n.
11.101/2005, devem ser realizados pelo Juízo universal. Inteligência do art. 76
da Lei n. 11.101/2005. Precedentes. 2. A decretação da falência carreia ao juízo
universal da falência a competência para distribuir o patrimônio da massa
falida aos credores conforme as regras concursais da lei falimentar, inclusive,
decidir acerca do destino dos depósitos recursais feitos no curso da
reclamação trabalhista, ainda que anteriores à decretação da falência (CC
101.477/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado
em 09/12/2009, DJe 12/05/2010). 3. É da competência do juízo da recuperação
a execução de créditos líquidos apurados em outros órgãos judiciais, inclusive
a destinação dos depósitos recursais feitos no âmbito do processo do trabalho
(CC 162.769/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA
SEÇÃO, julgado em 24/06/2020, DJe 30/06/2020). 4. Agravo interno não
provido. (STJ, AgInt no CC 172707/SP, 2ª Seção, Min. Rel. Luis Felipe Salomão,
julgado em: 29/09/2020, publicado em: 02/10/2020)

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO CONFLITO DE


COMPETÊNCIA. JUÍZO DO TRABALHO E JUÍZO DA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
PARA A PRÁTICA DE ATOS EXECUTÓRIOS OU CONSTRITIVOS QUE
PERSISTE ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA QUE
DECLARA O ENCERRAMENTO DO PROCESSO. 1. Nos termos da
jurisprudência consolidada desta Corte, é competente o juízo universal para
prosseguimento de atos de execução que incidam sobre o patrimônio de
empresa em processo falimentar ou de recuperação judicial. 2. Não compete
ao juízo trabalhista interferir no acervo patrimonial da suscitante enquanto
não houver a certificação do trânsito em julgado da sentença que declara o
encerramento da sua recuperação judicial. 3. Nos estreitos limites cognitivos do
conflito de competência, cabe a esta Corte apenas declarar o juízo competente para
dirimir a controvérsia. Qualquer questão referente à reserva e/ou registro do
crédito do ora agravante no Quadro Geral de Credores deve ser apresentada
ao juízo competente. 4. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no CC
167826/PA, 2ª Seção, Min. Rel. Nancy Andrighi, julgado em: 18/08/2020,
publicado em: 21/08/2020)

COMPETÊNCIA SUSCITADO POR EMPRESA EM RECUPERAÇÃO


JUDICIAL EM FACE DE JUÍZO DO TRABALHO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO
FALIMENTAR. 1. A execução individual trabalhista e a recuperação judicial
apresentam nítida incompatibilidade concreta, porque uma não pode ser
executada sem prejuízo da outra. 2. O Juízo universal é o competente para
julgar as causas em que estejam envolvidos interesses e bens da empresa
recuperanda, inclusive para o prosseguimento dos atos de execução, ainda que
o crédito seja anterior ao deferimento da recuperação judicial, devendo,
portanto, se submeter ao plano, sob pena de inviabilizar a recuperação.
Precedentes do STJ. 3. Competência do Juízo de Direito da 1.ª Vara Cível de Santa
Helena de Goiás/GO, para o prosseguimentos de execuções trabalhistas. 4. Agravo
interno desprovido. (STJ, AgInt no CC 148536/ GO, 2ª Seção, Min. Rel. Marco
Buzzi, julgado em: 08/03/2017, publicado em: 15/03/2017)

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.


DEVEDOR EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL NÃO VERIFICADA. CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO.
EVENTO DANOSO OCORRIDO EM MOMENTO ANTERIOR AO PEDIDO
RECUPERACIONAL. SUBMISSÃO AOS SEUS EFEITOS. SENTENÇA
CONDENATÓRIA PROFERIDA POSTERIORMENTE. IRRELEVÂNCIA. 1.
Ação ajuizada em 20/5/2013. Recurso especial interposto em 27/9/2017 e concluso
ao Gabinete em 8/3/2018. 2. O propósito recursal é definir se o crédito de
titularidade das recorridas, decorrente de sentença condenatória transitada
em julgado após o pedido de recuperação judicial do devedor, deve sujeitar-se
ao plano de soerguimento. 3. Devidamente analisadas e discutidas as questões
controvertidas, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, não há como
reconhecer a ocorrência de negativa de prestação jurisdicional. 4. Para os fins do
art. 49, caput, da Lei 11.101/05, a constituição do crédito discutido em ação de
responsabilidade civil não se condiciona ao provimento judicial que declare sua
existência e determine sua quantificação. Precedente. 5. Na hipótese, tratando-se
de crédito derivado de fato ocorrido em momento anterior àquele em que
requerida a recuperação judicial, deve ser reconhecida sua sujeição ao plano
de soerguimento da sociedade devedora. 6. Recurso especial provido. (STJ,
REsp nº 1.727.771 - RS (2018/0050035-8), Min. Rel. Nancy Andrighi, julgado em:
15/05/2018)

Verifica-se, portanto, que a questão já se encontra pacificada no âmbito


do Superior Tribunal de Justiça, que reconhece ser o Juízo onde se processa a
recuperação judicial o competente para julgar as causas em que estejam
envolvidos interesses e bens da empresa recuperanda, inclusive para o
prosseguimento dos atos de execução, ainda que o crédito seja anterior ao
deferimento da recuperação judicial, devendo, portanto, se submeter ao plano,
sob pena de inviabilizar a recuperação.

A justificativa para a competência exclusiva do Juízo Universal para a


prática dos atos de execução da empresa recuperanda é a concentração, no
referido Juízo, de todas as decisões que envolvam o patrimônio da empresa,
inclusive os depósitos recursais e/ou seguro garantia judicial, ainda que
anteriores à recuperação judicial, a fim de não comprometer a tentativa
de manter a sociedade em funcionamento.

De acordo com o princípio da preservação da empresa, o juízo de valor


acerca da essencialidade ou não de algum bem ao funcionamento da
sociedade cumpre ser realizada pelo Juízo Universal, que tem acesso a todas
as informações sobre a real situação dos bens da empresa recuperanda.
Assim, equivocado o Juízo de piso, quando aduz que “o seguro garantia não é
bem da reclamada e se iguala a depósito recursal efetuado em período anterior
ao deferimento da recuperação judicial” (ID. XXXXXX).
Ademais, cumpre destacar que eventual utilização do seguro garantia
judicial viola o princípio da isonomia para quitação dos credores da mesma
classe, assim como afronta a ordem de preferência instituída pela Lei nº
11.101/2005, além de comprometer o plano de recuperação judicial.

Com efeito, importante destacar a decisão exarada pelo Supremo


Tribunal Federal nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.934-2,
na qual se impugnava os artigos 60, parágrafo único, 83, I e V, c, e 141, II, da
Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, sob o argumento de serem
incompatíveis com o disposto nos artigos 1º, III e IV, 6º, 7º, I, e 170, VIII, da
Constituição Federal.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a competência residual da


Justiça Comum para deliberar sobre o adimplemento dos créditos de natureza
trabalhista de empresas em falência ou recuperação judicial, afastando,
portanto, a competência desta Justiça Especializada após a fase de
quantificação do crédito exequendo.

Assim, qualquer decisão que determine o prosseguimento da execução


perante a Justiça do Trabalho, implicará em violação da coisa julgada,
consoante previsão contida no Art. 5º, XXXVI da Constituição Federal.

Portanto, eventual prosseguimento da execução perante o Juízo


Trabalhista implicará no desvirtuamento da Lei nº 11.101/2005 e consequente
ineficácia da finalidade a qual se destina.

Merece ser destacado, ainda, que o Provimento da Corregedoria Geral


da Justiça do Trabalho – Provimento CGJT nº 1/2012 dispõe sobre os
procedimentos a serem adotados pelos MM. Juízos do Trabalho relativamente
a credores trabalhistas de empresa falida ou em recuperação judicial,
determinando a habilitação perante o Administrador Judicial da Empresa
Falida, cabendo aos Magistrados a expedição da competente Certidão para
Habilitação de Crédito.

Portanto, em observância ao Art. 6º, III, da Lei nº 11.101/2005 e com


respaldo no posicionamento do STJ e do TST, o crédito existente na presente
demanda deve ser habilitado no juízo falimentar, sendo vedado o resgate da
apólice do seguro garantia judicial existente nos autos.

Assim, deve ser reformada a decisão agravada ( ID. a4cf8a1), a fim


de que sejam sobrestados os atos executórios até que seja finalizado o
processo de recuperação judicial da Agravante, determinando-se, por
conseguinte, a não liberação do seguro garantia judicial efetuado nos
autos.

Destaca a Agravante que, caso seja mantida a referida decisão,


haverá afronta ao princípio da legalidade, insculpido no Art. 5º, II, da CF.

Isso porque, o Art. 6º, III, da Lei nº 11.101/2005 prevê a “ proibição de


qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição
judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou
extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência ”.

Assim, o Juiz do Trabalho não pode determinar a realização de atos de


expropriação do patrimônio da parte reclamada, sob pena de violação ao
princípio da isonomia para quitação dos credores da mesma classe, assim
como à ordem de preferência instituída pela Lei nº 11.101/2005, em
observância ao princípio da legalidade, previsto no Art. 5º, II, da CF:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:

(...)

II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em


virtude de lei;

Conforme estabelece o dispositivo constitucional supratranscrito,


somente a lei poderá criar direitos, deveres e vedações, ficando os indivíduos
vinculados aos comandos legais, disciplinadores de suas condutas.

Desse modo, havendo previsão legal quanto à proibição de atos


expropriatórios da empresa em recuperação judicial, não pode o julgador, na
seara trabalhista, agir contrariamente à Lei e determinar medidas
expropriatórias em face da empresa recuperanda; o que denota clara afronta
ao princípio da legalidade.

Ademais, violação a tal garantia constitucional no caso em tela, além de


configurar provimento judicial contrário a preceito de lei, prejudica o regular
prosseguimento do processo de recuperação judicial e respectivo pagamento
dos credores da empresa recuperanda, afetando, inclusive, o planejamento
financeiro da empresa para que possa se reerguer no mercado.
Diante disso, em conformidade com a Lei e o entendimento
jurisprudencial sobre a referida temática, deve ser dado provimento ao
Agravo de Petição, reformando-se a decisão agravada de ID. a4cf8a1.

5. CONCLUSÃO

Por todo o exposto, pugna a Agravante para que seja dado provimento
ao Agravo de Petição, nos termos da fundamentação supra.

Termos em que pede deferimento.

Vila Velha/ES, 02 de Junho de 2022.

ADVOGADO
OAB

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