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J. Dewey e Bourdieu – Passeron, uma antinomia ou dialética?

O papel do educador em sua práxis diária deve sempre estar pautado pelo conceito
que, no decorrer de sua formação, fora lhe apresentado como um “caminho suave”
na construção de seu conhecimento teórico-pedagógico. Um idealismo pedagógico
nos captura logo nos semestres iniciais da formação nas licenciaturas nas mais
diversas áreas do conhecimento. É comum ao aluno seguir seu caminho acadêmico
ocupando-se na maior parte de seu tempo, com base em uma fundamentação
teórica que esteja alinhada à sua prática cotidiana. Porém não em raros casos são
apresentados conceitos contraditórios – de Parmênides a Heráclito- podemos ler
como excludentes ou não. Tal argumento pode ser posto ao nos deparamos com a
visão que dois teóricos, não obstante ao lapso temporal que os separa, apresenta-
nos sobre o conceito da educação. Partiremos da leitura de John Dewey e
posteriormente confrontaremos com as ideias de Bourdieu e Passeron e tentaremos
apontar se existe uma antinomia nestas duas bases conceituais ou seriam elas uma
forma de dialética pedagógica.

Em sua obra Democracia e Educação J. Dewey nos apresenta um argumento


fulcral em que os seres vivos, leia-se, seres humanos se conservam a partir dos
meios que os cercam, nesta fundamentação a educação é apresentada como um
importante instrumento de continuidade da vida social onde cabe aos “maduros a
transmissão de costumes e habilidades aos imaturos” (DEWEY, 1979), observa-se
que esta relação torna-se cada vez mais distante na medida em que a sociedade se
torna mais complexa, e os seres humanos são incapazes de progredir sem o auxílio
dos mais velhos. Uma vez que o processo educacional está por Dewey colocado na
base da transmissão da vida, acontece uma atividade conjunta, onde já podemos
observar que o ser educando é educado ao passo que o educador exerce uma
influência nos hábitos mentais do educado, existe aqui uma ruptura com um
processo tradicional de aprendizagem onde o aluno é tão somente o receptor de
conhecimentos a ele transmitidos, assim observamos que a escola deve buscar
uma equidade relativa ao ambiente comum livre de fatores indesejáveis, ainda
compete a escola contrabalancear os próprios fatores desiguais da sociedade, desta
forma corrobora para que o indivíduo fuja das limitações do grupo social onde
nasceu.

Dewey segue seu pensamento postulando que os indivíduos nascem sempre aquém
dos hábitos de vida da sociedade que os gera, assim esta última tem que direcionar
os impulsos imaturos de seus jovens membros e para tal são necessários estímulos,
voltados para compressão comum dos meios e dos fins, J. Dewey caminha ainda
mais e coloca a educação como uma direção básica e natural na qual o jovem
coloca seu modo de proceder junto com a comunidade da qual faz parte, junto a um
protagonismo onde a significação do aprendizado é comum a todos. Assim partimos
para Bourdieu e Passeron.

Analisando a obra A Reprodução somos apresentados em princípio, a uma


perspectiva conceitual totalmente inversa, primeiramente, esta base conceitual para
um processo educacional é apresentado de uma forma um tanto quanto pessimista,
por apresentar uma violência “simbólica” que estaria inserida no bojo da educação
escolar e por vezes não é sentida na prática escolar. Vejamos:

Todo poder de violência simbólica, isto é, todo poder que chega a impor
significações e a impô-las como legítimas, dissimulando as relações de
força que estão na base de sua força, acrescenta sua própria força, isto é,
propriamente simbólica, a essas relações de força. (BOURDIEU, P.
PASSERON, 1979 pg. 21)

Essa forma de violência estabelecida pelos autores se dá através de uma ação


pedagógica e por ser simbólica muitas vezes é de difícil superação. Aqui somos
levados a analisar a maneira como a escola se coloca ante a seus alunos, e qual é a
sua forma de disseminação da cultura que ela detém? O que nos remete a um outro
conceito posto pelos autores (e muito utilizado na prática pedagógica atual), o de
capital cultural, uma vez que os alunos não chegam vazios à escola, trazem consigo
traços e elementos apreendidos em sua convivência familiar e social, ou seja, são o
produto social de determinada comunidade (aqui até mesmo em seu sentido mais
amplo), assim o que vemos nas escolas é uma enorme variedade de produtos
culturais múltiplos, acentuado pelo fato de que, as próprias escolas se diferenciam
entre si dentro de uma mesma rede, seja ela em qual nível for. Esta diversidade
muitas vezes não é levada em conta ao se tentar uniformizar uma prática
pedagógica, talvez pelo próprio fato de ser formada por também múltiplos
formadores, pois seus professores também se encontram na estrutura posta por
Bourdieu e Passeron. Assim o cotidiano escolar tende a ser pautado por um
princípio de igualdade entre todos seus elementos demonstrando seu potencial
democrático.

Apresentados desta forma ambos os textos coexistiriam em uma


“proporcionalidade harmônica” onde, sujeitos e objetos do processo de ensino
aprendizagem cumprem categoricamente seu papel e o título do presente texto não
teria sentido algum. A aparente antinomia dos textos é quebrada por um processo
dialético do qual a escola é protagonista, ela deve operar por princípio de equidade,
sendo um meio onde não seja transmitido apenas uma ideia passiva de exclusão,
mas que forme alunos pensantes e autônomos, tornando-os capazes de contribuir
para uma sociedade cada vez melhor.

Referencias:

DEWEY, J. Democracia e Educação: Introdução à Filosofia da Educação; tradução


de Godofredo Rangel e Anísio Teixeira, - 4 Ed. São Paulo: Editora Nacional, 1979.
Edição comentada por Leonardo Van Acker. Capítulos I, II e III.

BOURDIEU, P. PASSERON J C . A Reprodução: Elementos para uma teoria do


sistema de ensino. Tradução de Reynaldo Bairão. Revisão de Pedro Benjamim
Garcia Ana Maria Baeta - 3ª Edição. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves
Editora, 1990. Páginas 1 a 100.

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