Você está na página 1de 35

Faculdade de Ciências

Departamento de Física
Mestrado em Risco de Desastre e Adaptação a Mudanças Climáticas
Módulo: Avaliação do Risco e Necessidades de Adaptação

Exercício II#:
Avaliação do impacto da tempestade Ana em Moçambique

Elaborado por: Nehemias Horácio Lasse


Docente: Professor Doutor Agostinho Vilanculos

Maputo, 14 de Março de 2022


RESUMO

Sendo Moçambique um país considerado vulnerável à ocorrência de eventos climáticos


extremos, como é o caso de secas, cheias e ciclones com maior frequência,
recentemente (Janeiro de 2022) observou-se a ocorrência da tempestade tropical Ana,
facto que fez com que houvesse a necessidade de fazer uma avaliação do seu potencial
impacto a nível da população assim como infraestrutural, e especificamente, identificar
as províncias afectadas, determinar a área afectada em cada província, determionar o
número de pessoas e infra-estruturas afectadas. Neste contexto, com o aucxílio do
ArcGIS 10.8, foi utilizada uma base de dados obtida na Dkrecção Nacional de Gestão
de Recursos Hídricos (DNGRH) que consistia de dados vectoriais de províncias,
distritos, escolas, rede sanitária (hospitais), aeroportos, estradas e aldeias assim como
com a utilização de um cone da trajectória do ciclone Ana que foi previamente
digitalizada e georreferenciada. Com esta base de dados, foi feita a avaliação do
impacto da tempestade Ana, onde constatou-se que foram afectadas sete Províncias
(Nampula, Zambézia, Cabo-Delgado, Niassa, Tete, Manica e Sofala), em uma área total
de 307.271 km2 sendo as províncias de Zambézia e Nampula as que tiveram maior área
afectada, cerca de 102.219 e 78.423 km2 e Cabo Delgado tendo sido afectada em apenas
6559 km2, respectivamente. Quanto ao número de pessoas, a tempestade Ana, afectou
cerca de 5.783.982 pessoas, das quais 2304901 e 151211 são da Zambézia e Nampula,
respectivamente, e o menor número de pessoas foi observado em Manica, com cerca de
111.559 pessoas potencialmente afectadas. Referente às infra-estruturas (escolas,
hospitais, aeroportos e estradas) o maior número foi também observado nas duas
províncias, Zambézia e Nampula. E a que foi menos afectada foi a Província de Cabo-
Delgado. Desta forma, recomenda-se ao governo: (i) a construção de infra-estruturas
adaptadas ao contexto e resilientes aos eventos climáticos; (ii) o reforço da mobilização
da sociedade na redução do risco aos eventos climáticos; e à sociedade em geral: (i) a
adopção das medidas de prevenção aos eventos climáticos extremos de modo a reduzir
o risco; (ii) a construção de habitação em zonas seguras.

Palavras-chave: Tempestade Ana; Circulação atmosférica; Canal de Moçambique.

Lasse i
Índice

RESUMO .......................................................................................................................... i

Lista de Figuras ............................................................................................................... iv

Lista de Tabelas ............................................................................................................... iv

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 1

1.1. Contextualização ................................................................................................ 1

1.2. Problema de estudo ............................................................................................ 2

1.3. Justificativa ........................................................................................................ 2

1.4. Objectivos .......................................................................................................... 3

1.4.1. Objectivo geral ........................................................................................... 3

1.4.2. Objectivos específicos ................................................................................ 3

2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .................................................................................. 4

2.1. Conceitos gerais ................................................................................................. 4

2.2. Classificação e Nomenclatura dos Ciclones ...................................................... 4

2.3. Processo de formação dos ciclones tropicais ..................................................... 5

2.4. Factores que influenciam a intensidade do ciclone tropical .............................. 8

2.4.1. Temperatura superficial do mar .................................................................. 8

2.4.2. Velocidade do vento ................................................................................... 8

2.5. Trajectória dos ciclones no oceano índico ......................................................... 9

2.6. Circulação atmosférica no canal de Moçambique ........................................... 10

2.7. Ocorrência de ciclones em Moçambique ......................................................... 12

3. DESCRIÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO ................................................................ 14

3.1. Localização geográfica de Moçambique ......................................................... 14

3.2. Descrição Climática de Moçambique .............................................................. 14

3.3. Circulação do vento no canal de Moçambique ................................................ 16

3.4. Relevo .............................................................................................................. 18

3.5. Uso e Cobertura de terra .................................................................................. 19

Lasse ii
3.6. Demografia de Moçambique............................................................................ 20

3.7. Infra-estruturas de Moçambique ...................................................................... 20

4. MATERIAL E MÉTODOS .................................................................................... 21

4.1. Material ............................................................................................................ 21

4.2. Análise de dados .............................................................................................. 21

5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................ 22

5.1. Províncias afectadas pela tempestade Ana em Moçambique .......................... 22

5.2. Aldeias e Pessoas afectadas pela tempestade Ana ........................................... 23

5.3. Infra-estruturas afectadas ................................................................................. 24

6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES ............................................................... 26

6.1. Conclusões ....................................................................................................... 26

6.2. Recomendações ............................................................................................... 26

6.2.1. Ao governo: .............................................................................................. 26

6.3.2. À Sociedade: ............................................................................................. 26

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 27

Lasse iii
Lista de Figuras

Figura 2.1. Nomenclatura dos ciclones tropicais no mundo............................................. 5


Figura 2.2. Áreas de formação e trajectórias típicas de ciclones tropicais em todo o
mundo. .............................................................................................................................. 6
Figura 2.3. Formação de ciclone tropical. ........................................................................ 6
Figura 2.4. Trajectórias dos ciclones tropicais entre 1987 e 2006. .................................. 9
Figura 3.1. Localização geográfica de Moçambique. ..................................................... 14
Figura 3.2. Temperatura média anual em Moçambique. ................................................ 15
Figura 3.3. Campos de tensão de monção do vento dos Centros Nacionais de Previsão
Ambiental (NCEP) de 1990–1998, climatologia (vectores) e profundidades de 20 CC
isotérmicos (Z20) da Assimilação Simples de Dados do Oceano (SODA) 1992-2001,
cor sombreada) para (a) Janeiro, (b) Junho, (c) Agosto e (d) Novembro. ...................... 16
Figura 3.4. Descrição do declive de Moçambique. ........................................................ 18
Figura 3.5. Uso e Cobertura do solo de Moçambique .................................................... 19
Figura 5.1. Províncias afectadas pela tempestade Ana em Moçambique. ...................... 22
Figura 5.2. Aldeias afectadas pela tempestade Ana. ...................................................... 23
Figura 5.3. Ilustração de Infra-estruturas afectadas pela tempestade Ana. .................... 24

Lista de Tabelas

Tabela 3.1. Dados demográficos das Províncias em estudo ........................................... 20


Tabela 5.1. Infra-estruturas afectadas pela tempestade Ana em Moçambique. ............. 25

Lasse iv
1. INTRODUÇÃO

1.1. Contextualização

De acordo com o Ministério para a Coordenação da Acção Ambiental (MICOA, 2005);


Gustafsson & Johansson (2006), Moçambique é um país localizado na costa oriental da
África Austral, especificamente na altitude baixa relativamente aos países vizinhos
África do Sul, Essuatini (antiga Suazilândia), Malawi, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábwè.
Possui uma extensão costeira de cerca de 2.515 km que vai desde o rio Rovuma no
Norte do país até à Ponta de Ouro no Sul do país.

Ao longo da costa de Moçambique, habita cerca de 60% do total da população nacional


(30.366.043 habitantes) (INE, 2019a), tendo como principais fontes de rendimento a
pesca, agricultura e pecuária (MICOA, 2005). Estas actividades, associadas à
localização geográfica, torna o país vulnerável à eventos extremos climáticos (cheias,
secas, ciclones) (Veiga & Fernandes, 2009), e no caso particular das inundações
costeiras, estas são desencadeadas devido a elevação do nível das águas do mar (Bié,
2017).

De acordo com a Estratégia Nacional de Desenvolvimento (2015 – 2035) (República de


Moçambique, 2015; Veiga & Fernandes, 2009), a ocorrência destes eventos extremos
no país, tende a colocar em risco os planos de desenvolvimento do país, principalmente
nos sectores agrícola, nas infra-estruturas, pecuária, pesca, saúde pública e educação.

Nos últimos 20 anos, tem se observado maior frequência da ocorrência dos eventos
climáticos extremos com maior intensidade, e este cenário, constitui uma ameaça
crescente ao desenvolvimento nacional (Manjoro et al., 2020; Müzell, 2019).

Em Janeiro de 2022, observou-se a ocorrência do ciclone tropical Ana, formado no


Oceano Índico que devastou as zonas Centro e Norte do país, concretamente as
Províncias de Cabo Delgado, Nampula, Zambézia, Sofala, Manica, Niassa e Tete
(OCHA, 2022b). Portanto, este trabalho, visa a avaliar o impacto da ocorrência da
tempestade tropical Ana em Moçambique.

Lasse 1
1.2. Problema de estudo

Sendo Moçambique um país localizado na foz de nove rios internacionais, aliado à


existência de zonas áridas e semiáridas, a longa extensão do território nacional, a
localização na zona de convergência intertropical (ZCIT) sujeita a perdas e ganhos
excessivos de humidade, bem como a extensa zona costeira, é caracterizado como sendo
um país vulnerável aos eventos extremos, caso específico de ciclones tropicais (Manjoro
et al., 2020). De vários eventos climáticos que têm afectado Moçambique, destaca-se
cronologicamente as cheias severas entre 2008 e 2013, 2015 e 2016 nas zonas Centro e
Norte, seca severa causada pelo fenómeno El Niño entre janeiro a Março de 2016, a
ocorência do ciclone Dineu na Província de Inhambane em Fevereiro de 20147, os
ciclones tropicais IDAI e Kenneth em Março de 2019 nas zonas Centro e Norte do País,
(Manjoro et al., 2020). Recentemente, verificou-se a ocorrência da tempestade tropical
Ana, que à semelhança dos eventos anteriores, causou perdas humanas, de infra-
estruturas e sócio-económicas (OCHA, 2022b), havendo a necessidade de avaliar o seu
impacto principalmente no sector de infra-estruturas utilizando a ferramenta de sistemas
de informações geográficas (GIS).

1.3. Justificativa

Dada a ocorrência dos eventos climáticos com frequência e com maior intensidade em
Moçambique, vários tem sido os desafios para a implementação das políticas que têm
como foco o desenvolvimento sócio-económico do país, havendo necessidade por um
um lado, de recorrer ao Orçamento do Estado para fazer face a estes eventos e por outro
lado, activando uma situação de Emergência, à busca de apoio humanitário, tal como foi
verificado na ocorrência do ciclone IDAI, Kenneth (DTM et al., 2021; Yarnell & Cone,
2019) assim como após a ocorrência do ciclone Ana (ONU, 2022; UNFPA, 2022).
Portanto, para fazer face às calamidades naturais, é importante conhecer as ameaças, as
vulnerabilidades e as capacidades das comunidades afectadas da mitigação e resposta
aos impactos negativos (Hoque et al., 2021; MRNA, 2021; PARPA II, 2006; REACH,
2019). Neste contexto, este relatório visa a avaliar o impacto da tempestade tropical Ana
ocorrido no mês de Janeiro em Moçambique utilizando o GIS.

Lasse 2
1.4. Objectivos

1.4.1. Objectivo geral


 Avaliar o impacto social e infra-estrutural da tempestade tropical Ana em
Moçambique.

1.4.2. Objectivos específicos

 Determinar a área afectada (províncias, distritos) pela passagem da


tempestade tropical Ana em Moçambique;
 Determinar o número de pessoas e infra-estruturas encontradas na área de
influência da tempestade tropical Ana.

Lasse 3
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1. Conceitos gerais

De acordo com UN HABITAT (2015), define-se ciclone como sendo um sistema de


ventos fortes que sopram ao redor do centro de uma intensa área de baixa pressão, sendo
caracterizado por elevadas precipitações. A terminologia ciclone, é designada devido o
local da sua formação, sendo assim denominados quando formados no Oceano Índico e
Pacífico Sul, Tufões quando ocorrem no noroeste e nordeste do Oceano Pacífico e
Furacões quando ocorrem no Oceano Atlântico Norte.

Sendo os ciclones formados nas regiões tropicais, são também denominados


tempestades tropicais, tempestades tropicais giratórias ou ciclones tropicais, sendo que
no hemisfério norte, ventos de ciclones sopram no sentido anti-horário e no hemisfério
sul, no sentido horário (UN HABITAT, 2015).

De acordo com Fink & Speth (1998); Montgomery & Farrell (1993) definem o ciclone
tropical como sendo um sistema de baixa pressão sobre as águas tropicais ou
subtropicais com convecção organizada e uma circulação ciclônica do vento superficial
definida no sentido anti-horário no Hemisfério Norte e no sentido horário no Hemisfério
Sul. Em contraste com os sistemas de baixa pressão de latitude média, que derivam sua
energia de fortes gradientes horizontais de temperatura associados com frentes frias ou
quentes, os ciclones tropicais são conduzidos pelo calor latente liberado pela
condensação de imensas quantidades de vapor de água dentro de suas bandas de chuva
convectivas.

2.2. Classificação e Nomenclatura dos Ciclones

São destinguidos dois tipos de ciclones: os ciclones tropicais e os extratropicais. Os


ciclones tropicais, são aqueles que ocorrem entre os trópicos de Capricórmio e Câncer,
nas águas tropicais e subtropicais enquanto ciclone extratropical, ocorrem nas zonas
temperadas e nas regiões de altas latitudes (Bennington, 2008; Smith, 2006).

A nomenclatura dos ciclones tropicais envolve vários países da região e é feito sob a
liderança da Organização Mundial da Meteorologia (WMO), sendo que para a região do
Oceano Índico, a nomenclatura dos ciclones foi acordada em 2004 por países da região -
Bangladesh, Índia, Maldivas, Mianmar, Omã, Paquistão, Sri Lanka e Tailândia
(Bennington, 2008; Drishti, 2020).

Lasse 4
Na região do Mar da China e no Oceano Pacífico, os ciclones tropicais são conhecidos
como tufões; nas ilhas das Índias Ocidentais no Mar do Caribe e Oceano Atlântico,
como Furacões; nas terras da Guiné da África Ocidental e sul dos EUA, como
Tornados; no noroeste da Austrália como Willy willies e no Oceano Índico, como
ciclones tropicais (Figura 2.1) (Drishti, 2020).

Figura 2.1. Nomenclatura dos ciclones tropicais no mundo.


Fonte: (Drishti, 2020).

2.3. Processo de formação dos ciclones tropicais

A formação dos ciclones começa nas regiões de águas quentes equatoriais durante o
verão e tendem a movimentar-se inicialmente para o oeste, depois para o leste em
direcção da latitude (Figura 2.2) (Mathias, 2012).

Lasse 5
Figura 2.2. Áreas de formação e trajectórias típicas de ciclones tropicais em todo o mundo.
Fonte: (UN HABITAT, 2015).

De acordo com UN HABITAT (2015), o ar aquecido pela radiação solar aumenta a


temperatura da água muito rapidamente, criando áreas de baixa pressão, criando desta
forma a convecção do vento, impulsionando a subida do ar quente dada a sua baixa
densidade, porém com elevada humidade que condensa em massa nuvens de trovão.
Durante a ascenção do ar quente, uma parte do ar entra para preencher o vazio deixado,
criando assim um ciclo. Mas por causa do movimento constante da terra em torno do
seu eixo (Força de corioles), o ar é desviado para dentro e, em seguida, em espiral para
cima. Ventos rodopiantes giram mais rápido e mais rápido, formando um grande círculo
que pode ser de até 500 – 1000 km de diâmetro (Figura 2.3).

Figura 2.3. Formação de ciclone tropical.


Fonte: (Drishti, 2020).

Lasse 6
O desenvolvimento do ciclo dos ciclones tropicais é dividido em três etapas
compreendidas desde a formação e desenvolvimento inicial do ciclone, maturidade total
e fase de decadência do ciclone (Drishti, 2020; UN HABITAT, 2015).

De acordo com Drishti (2020); Jullien (2013), para a formação do ciclone, são
necessárias quatro condições atmosféricas e oceânicas, nomeadamente:

(i) Temperatura do mar superior a 26ºC a uma profundidade de 60 metros que


fornece vapores de água abundantes no ar por evaporação;
(ii) Alta umidade relativa da atmosfera a uma altura acima 7000 m facilita que
possa facilitar a condensação do vapor de água em gotas de água e nuvens,
liberando a energia térmica e induzindo assim a redução da pressão;
(iii) Fraco cisalhamento vertical do vento evitando a ruptura do vórtice e a
intrusão do ar seco superior;
(iv) A instabilidade atmosférica incentiva a formação de grandes massas verticais
convectivas de nuvens cumulus com condensação do ar ascendente sobre o
oceano, e;
(v) Localização a pelo menos 4 – 5 graus de latitude do equador permite a
influência das forças devido à rotação da Terra para tomar efeito da
circulação do vento em torno de centros de baixa pressão.

Após a formação do ciclone, se o ambiente oceânico e atmosférico continuar sendo


favorável, o ciclone pode continuar a se intensificar à medida que se move em direcção
aos pólos. O sistema de nuvem torna-se mais circular e desenvolve um olho distinto,
sendo esta fase, a mais grave e perigosa (Mathias, 2012; UN HABITAT, 2015), e este,
começa a se dissipar quando a pressão central aumenta e o olho da tempestade fica
distorcido, enfraquecendo desta forma a tempestade. Quando o ciclone atinge a terra,
ventos fortes acompanhados de chuvas fortes e inundações podem ocorrer (Drishti,
2020).

No oceano índico, especificamente no norte do equador, a formação dos cicçlones pode


ocorrer durante todo o ano, embora seja frequente entre Abril e Junho e entre Outubro e
Dezembro (Mavume et al., 2009).

Lasse 7
2.4. Factores que influenciam a intensidade do ciclone tropical

2.4.1. Temperatura superficial do mar

A temperatura da superfície do mar constitui um factor-chave na determinação do fluxo


de entalpia de superfície do oceano para a atmosfera, fornecendo a energia para a
intensificação e manutenção do ciclone tropical, determinando também a intensidade
potencial máxima do ciclone (Gao et al., 2016; Reynolds et al., 2007). E estudos
apontam que o aumento da temperatura do oceano esteja relacionado com a maior
emissão de altas concentrações de gases de efeito estufa (Levitus et al., 2005; Meyer,
2012; Phillips et al., 2021).

Com o objectivo de representar o aquecimento potencial da Corrente da Austrália


Oriental (EAC) não resolvido nos experimentos anteriores, simulações idealizadas
foram realizadas por Parker et al. (2014), onde um conjunto de dados de temperatura da
superfície do mar auxiliar de resolução de 1°x1° foi assimilado na força da superfície
(limite inferior) e 1°K foi adicionado à lagoa costeira, e com o aquecimento observou-se
a melhoria da evolução simulada e a manutenção da intensidade do ciclone em direcção
ao continente.

Em um estudo conduzido por Li et al. (2021), avaliando os factores que controlam o a


intensificação do ciclone tropical sobre os mares marginais da China, constataram que a
intensificação do ciclone tropical depende fortemente das características do próprio
ciclone, desde a sua intensidade, taxa de precipitação no interior do núcleo e o grau de
assimetria térmica vertical.

Resultados similares foram observados no Oceano Índico e especificamente no canal de


Moçambique por Mavume et al. (2009), que reportou o aumento do número de ciclones
tropicais intensos, de 36 durante 1980 – 1993 para 56 durante 1994 – 2007. Este
aumento em ciclones tropicais intensos ocorreu ao mesmo tempo com o aumento da
temperatura da superfície média do mar em 0,12˚C. Adicionalmente, a frequência e
intensidade do ciclone podem depender dos fenómenos El Niño-Oscilação Sul (ENSO).

2.4.2. Velocidade do vento

A intensidade dos ciclones perto da superfície é gerada pela velocidade dos ventos que
excedem cerca de 60 km h-1, sendo classificados como severos (furacões sobre o
Oceano Pacífico, Atlântico, Oceano Pacífico Oriental e o Mar Caribe) com velocidades

Lasse 8
de vento iguais ou superiores a 120 km h-1, e Tufões sobre o Oceano Pacífico Norte
Ocidental. Normalmente, os ventos mais forte ocorrem em um anel a algumas dezenas
de quilómetros do centro enquanto que na região próxima ao centro (olho) há uma
calmaria, com ventos leves (Smith, 2006).

O olho é assim chamado porque normalmente está livre de nuvens, excepto talvez perto
da superfície, mas em uma tempestade madura é cercado por um anel de convecção
profunda que se inclina para fora com a altura, denominada nuvem da parede do olho
(Smith, 2006).

2.5. Trajectória dos ciclones no oceano índico

De acordo com Zehnder (2019), os ciclones tropicais nos hemisférios norte e sul tendem
a se mover para oeste e lentamente em direcção aos pólos devido a maior influência da
circulação geral da atmosfera da Terra, especificamente pelos ventos alísios, no seu
movimento do leste para oeste (Figura 2.4).

Figura 2.4. Trajectórias dos ciclones tropicais entre 1987 e 2006.


Fonte: (Zehnder, 2019).

No caso da circulação em direcção aos pólos, esta é influenciada pela descendência do


ar (zonas de altas pressões) sobre os oceanos em direcção aos ventos alísios, sendo
circulações anticiclônicas (isto é, circulação no sentido horário no Hemisfério Norte e
no sentido anti-horário no Sul), de modo que os ventos nas bordas ocidentais dessas
circulações de grande escala se movem em direcção aos pólos (Mavume et al., 2009;
Metoffice, 2021; Zehnder, 2019).

Lasse 9
O segundo factor é a Força de Coriolis, que progressivamente se torna mais forte em
latitudes mais altas, desviando o ciclone tropical em direcção aos pólos, sendo desviado
para a direita no hemisfério Norte (anti-horário) e para esqueda no hemisfério Sul
(sentido horário). Uma vez que um ciclone tropical se move em direcção aos pólos da
alta subtropical , ele começa a se mover para leste sob a influência dos ventos de
latitude média oeste (que sopram em direcção ao leste), passando a ser denominado
ciclone tropical é recursivo (Metoffice, 2021; Zehnder, 2019).

No Hemisfério Norte os ciclones podem atingir latitudes mais altas do que no


Hemisfério Sul devido à presença de correntes oceânicas quentes no sentido horário,
como Kuroshio e Golfo . No Atlântico Norte, as águas quentes da Corrente do Golfo
fornecem energia aos furacões que se movem ao longo da costa leste dos Estados
Unidos, permitindo-lhes sobreviver por mais tempo. Não é incomum que sistemas
tropicais muito intensos atinjam o norte até Boston (42° Ν). Por outro lado, os furacões
não atingem a costa oeste dos Estados Unidos, embora os ventos predominantes sobre o
Oceano Pacífico Norte se movam para o leste em direcção à terra. Em vez disso, eles
tendem a enfraquecer rapidamente à medida que se recuperam porque estão se movendo
sobre águas oceânicas mais frias (Zehnder, 2019).

Muitos ciclones tropicais eventualmente se afastam o suficiente do equador para se


moverem para áreas dominadas por ventos de oeste (encontrados nas latitudes médias) e
estes ventos tendem a reverter a direcção do ciclone tropical para o leste, e à medida que
o ciclone tropical se move em direcção aos pólos, com tendência a aumentar a sua
velocidade. Durante o ano, no hemisfério norte os ciclones tropicais ocorrem entre
Junho e Novembro, com pico em Setembro enquanto no hemisfério sul, entre
Novembro a Abril (Metoffice, 2021).

2.6. Circulação atmosférica no canal de Moçambique

A circulação superficial e subsuperficial no Canal de Moçambique é variável e muito


complexa, tendo como força motriz os vórtices anticiclônicos de mesoescala formados
na região próxima ao estreitamento, e que tem como função, controlar os fluxos
conforme se deslocam ao sul do canal para a região de retroflexão da Corrente das
Agulhas (Paloschi, 2016).

Lasse 10
O canal de Moçambique em particular, constituído pelo Oceano índico entre a ilha do
Madagascar e a porção sudeste do continente africano, mais especificamente, o país de
Moçambique é uma região de complexas dinâmicas e forte variabilidade na extensão de
fenómenos que impactam substancialmente o clima da África oriental e meridional
(Paloschi, 2016).

A sua circulação é dominada pelos vórtices de mesoscala e giros que são geralmente
formados no estreitamento do canal (~16°S) entre as bacias ciclónicas norte e central,
migrando para o sul principalmente ao longo da costa de Moçambique (Schott et al.,
2009; Schouten et al., 2003). Além destes giros do norte, outros são formados no sul de
Madagáscar, entrando no canal de Moçambique, deslocando-se para o norte ao longo da
costa oeste de Madagáscar (Quartly & Srokosz, 2004).

O fluxo no Canal de Moçambique é dominado por giros anticiclônicos deslocando-se no


sentido sul em escalas espaciais de cerca de 300 a 500 km e propagando-se a uma
velocidade aproximada de 3 a 6 km por dia (Donguy & Piton, 1986; Schouten et al.,
2003). Em contrapartida, a corrente Leste de Madagáscar (EMC) reflete para sudoeste
de Madagáscar a uma gerando giros ciclônicos e anticiclônicos com até 250 km de
diâmetro que e propagam-se sentido oeste para a Corrente das Agulhas, contribuíndo
significativamente no fluxo de volume, sal e calor no canal de Moçambique (Quartly &
Srokosz, 2004).

Para além dos vórtices de mesoscala, a direcção do vento e marés contribuem na


condição climática do canal de Moçambique, sendo no verão austral, a direcção média
do vento é uniformemente de sudeste e fraca. No inverno, há divergência nas direcções
médias do vento: a porção sul apresenta ventos sudeste e a porção norte, ventos noroeste
(Lutjeharms, 2007).

Em um estudo conduzido por Ternon et al. (2014), observando o campo de vórtices no


canal de Moçambique (MZC), verificou a presença de vórtices e dipolos no MZC, mas
também documentou o fluxo horizontal e vertical e características dentro e ao redor
dessas estruturas. E ainda, esta observação confirmou que os vórtices se formam
preferencialmente no norte do MZC e migram para o sudoeste ao longo da fronteira
oeste do Canal de Moçambique.

Lasse 11
2.7. Ocorrência de ciclones em Moçambique

Nos últimos 20 anos, Moçambique registou uma elevada frequência, alternância e


intensidade dos eventos climáticos extremos que passaram a constituir uma ameaça
crescente ao desenvolvimento nacional, sendo causadas por diversos factores, sejam
eles naturais ou produzidos pelas sociedades acompanhadas pelo crescimento
populacional que se reflecte na utilização intensiva dos recursos naturias (Manjoro et
al., 2020).

Devido à sua morfologia e condições geográficas, o país está exposto a eventos


extremos relacionados ao clima, sendo os mais frequentes as cheias, ciclones e secas,
tendo sido afectados nos últimos 30 anos, pelo menos 14% da população pela seca, uma
cheia ou uma tempestade tropical (Manjoro et al., 2020).

Entre 2000 e 2001, Moçambique sofreu as consequências de um dos maiores desastres


(cheias), causada pela precipitação nacional entre Outubro de 1999 e Janeiro de 2000,
com níveis de 70% acima do normal em Maputo e 26% acima do normal na foz do Rio
Limpopo, associada a descarga do caudal da África do Sul (Manjoro et al., 2020;
Mavume et al., 2009).

De vários eventos climáticos que têm afectado Moçambique, destaca-se


cronologicamente as cheias severas entre 2000 na zona sul, 2008 e 2013, 2015 e 2016
nas zonas Centro e Norte, seca severa causada pelo fenómeno El Niño entre janeiro a
Março de 2016, a ocorência do ciclone Dineu na Província de Inhambane em Fevereiro
de 20147, os ciclones tropicais IDAI e Kenneth em Março de 2019 nas zonas Centro e
Norte do País, (Manjoro et al., 2020). Recentemente, verificou-se a ocorrência da
tempestade tropical Ana, que à semelhança dos eventos anteriores, causou perdas
humanas, de infra-estruturas e sócio-económicas (OCHA, 2022)

O sistema de baixa pressa foi inicialmente formado sobre a costa leste de Madagascar,
e entrou a Moçambique no dia 23 de Janeiro, tendo evoluído para uma tempestade
tropical moderada, chamada Ana, desembarcando no distrito de Angoche, província de
Nampula, no dia 24 Janeiro de 2022 (OCHA, 2022a). No total, a tempestade Ana
afectou sete (07) províncias, nomeadamente Nampula, Cabo Delgado, Zambézia,
Niassa, Tete, Manica e Sofala, onde até o dia 02 de Março de 2022, reportou-se pelo
Instituto Nacional de Gestão e Redução do Risco de Desastre (INGD), mais de 185.000
pessoas afectadas e 126.265 hectares de terra, 2.200 famílias deslocadas pela para o

Lasse 12
Malawi, 207 pessoas feridas e 38 pessoas perderam a vida, tendo destruído 11.757 casas
e danificado 26 centros de saúde, 25 sistemas de abastecimento de água, 138 postes de
energia e cerca de 2.275 km de estradas. Além disso, danificou 781 escolas e destruiu
1.608 salas de aula, impactando um total de 209.581 alunos (OCHA, 2022c).

Lasse 13
3. DESCRIÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

3.1. Localização geográfica de Moçambique

De acordo com o Ministério para Coordenação da Acção Ambiental (MICOA, 2005), a


República de Moçambique está localizada no continente Africano, especificamente na
costa oriental da África Austral entre os paralelos 10º 27´ e 26º 52´ de latitude sul e
entre os meridianos 30º12´ e 40º51´ de latitude oeste. Faz fronteira com 6 países sendo
a África do Sul, Essuatini (antiga Suazilândia), Malawi, Tanzânia, Zâmbia e Zimbábwè,
e a nível nacional, possui 11 Províncias e com uma extensão costeira de cerca 2515 km,
da foz do rio Rovuma, no Norte do país, à Ponta do Ouro, no Sul do país (Figura 3.1).

Figura 3.1. Localização geográfica de Moçambique.


Fonte: O autor.

3.2. Descrição Climática de Moçambique

É um país possui tropical a subtropical, com distribuição de chuva seguindo o gradiente


Norte-Sul, com maior precipitação ao longo da zona costeira, e média anual entre 800 e
1200 mm (MICOA, 2005; World Bank, 2022).

Lasse 14
É um país banhado pelo canal de de Moçambique, constituído pelo Oceano índico que
passa entre a ilha do Madagáscar e a porção sudeste do continente africano (Paloschi,
2016).

Apresenta temperaturas mais quentes (entre 25 a 27ºC no verão e 20 a 23ºC no inverno)


ao longo da zona costeira relativamente ao continente que apresenta temperaturas mais
frias. As temperaturas médias na região sul são 24 a 26°C no verão e 20 a 22°C no
inverno (Figura 3.2) (World Bank, 2022).

Figura 3.2. Temperatura média anual em Moçambique.


Fonte: O autor.

Lasse 15
3.3. Circulação do vento no canal de Moçambique

O sistema de ventos no canal de Moçambique está dividido em duas partes, sendo pela
região ao sul e ao norte da latitude de 20ºS. Na região norte de 20ºS, os ventos do norte
e do nordeste do sistema de vento e monções do Oceano Índico dominam durante o
verão austral (Outubro a Fevereiro), sendo os ventos neste período geralmente mais
fracos (Lutjeharms, 2007). Entre 20ºS e 25ºS prevalecem os ventos do sul e do sudeste,
ao passo que na parte mais meridional, prevalecem os ventos de leste ao longo do ano
(Figura 3.3) (Mavume et al., 2009; Schott et al., 2009).

Figura 3.3. Campos de tensão de monção do vento dos Centros Nacionais de Previsão Ambiental
(NCEP) de 1990–1998, climatologia (vectores) e profundidades de 20 CC isotérmicos (Z20) da
Assimilação Simples de Dados do Oceano (SODA) 1992-2001, cor sombreada) para (a) Janeiro, (b)
Junho, (c) Agosto e (d) Novembro.

Fonte: (Schott et al., 2009).

Durante o regime de monções de inverno, os sistemas de alta pressão (anticiclónico) e


baixa pressão (depressão ciclónica) dominam o canal de Moçambique, sendo o sistema
anticiclônico freqüente durante os meses de Maio a Setembro e sendo frequentemente
formado perto do Madagáscar entre as latitudes 25ºS e 30ºS, e Longitude 55ºE e 75ºE,

Lasse 16
com predominância de ventos geralmente do sudeste e a Zona de Convergência
Intertropical (ZCIT) empurrada para o norte, para além do equador, entre as
coordenadas 20ºS e 25ºN (Lutjeharms, 2007).

Por outro lado, o sistema de baixa pressão é exclusivamente no inverno, quando a


depressão ciclônica domina o sistema, com predominância de ventos do norte e
noroeste, especialmente para o norte da ZCIT enquanto para o sul da ZCIT os ventos
são do sudeste (Lutjeharms, 2007; Mavume et al., 2009).

Lasse 17
3.4. Relevo

Moçambique apresenta zonas baixas ao longo da faixa costeira, aumentando a altitude


da costa em direcção ao interior (Albino, 2012), onde encontram-se diferentes
formações montanhosas, designadamente, a cadeia da Maniamba-Amaramba, na
província do Niassa, a de Serra Jéci a que apresenta maior altitude com 1836 metros; as
formações de Chire-Namúli, na província da Zambézia, cujo ponto mais elevado é o
Monte Namúli com 2.419 metros; a cadeia de Manica, com o ponto mais alto de
Moçambique com 2436 m e a cadeia dos Libombos, na zona ocidental sul do país
(Figura 3.4) (Gustafsson & Johansson, 2006; MICOA, 2005).

Figura 3.4. Descrição do declive de Moçambique.


Fonte: O autor.

Lasse 18
3.5. Uso e Cobertura de terra

A cobertura vegetal de Moçambique é caracterizada desde a floresta alta e de baixa


altitude, matagal, pradarias arborizadas e mangais assim como florestas exóticas.
Regionalmente, destinguem-se: as florestas montanhosas de altitude (Zambézia,
Manica, Niassa e Tete); as florestas de altitude (planaltos do Centro e Norte); Matagal
(Centro e Sul do país, em zonas de pastoreio); Savana (interior da zona Sul e Tete);
Pradaria (planícies da zona sul, facilmente alagáveis) e Mangais (na zona costeira,
principalmente nos estuários das águas salgadas) (Figura 3.5) (MICOA, 2005).

Figura 3.5. Uso e Cobertura do solo de Moçambique


Fonte: O autor.

Lasse 19
3.6. Demografia de Moçambique

Moçambique é um país que posui cerca de 27.909.798 habitantes, sendo para as


Províncias de estudo, Nampula e Zambézia as que apresentam maior número de
habitantes (Tabela 3.1) (INE, 2019b).

Tabela 3.1. Dados demográficos das Províncias em estudo


Província Habitantes

Cabo Delgado 2320261

Manica 1945994

Nampula 5758920

Niassa 1810794

Sofala 2259248

Tete 2648941

Zambézia 5164732

Fonte: (INE, 2019b).

3.7. Infra-estruturas de Moçambique

Na área afectada pela tempestade Ana, compreendida pelas províncias de Cabo-


Delgado, Nampula, Niassa, Tete, Zambézia, Niassa, Manica e Sofala, existem cerca de
10537 escolas, 1635 estradas, 33 aeroportos e 811 hospitais (Tabela 3.3).

Província Escolas Estradas Aeroportos Hospitais

Cabo Delgado 923 192 4 87


Manica 881 158 3 81
Nampula 2347 377 5 155
Niassa 980 272 3 103
Sofala 992 228 4 128
Tete 1141 159 7 89
Zambézia 3273 249 7 168
Total 10537 1635 33 811

Fonte: O autor in GIS.

Lasse 20
4. MATERIAL E MÉTODOS

4.1. Material

Para a avaliação do impacto da tempestade Ana em Moçambique, foram utilizados os


seguintes dados: (i) Cone da trajectória do ciclone Ana desde à sua entrada em
Moçambique; (ii) Base de dados obtida na Direcção Nacional de Gestão de Recursos
Hídricos – DNGRH de Moçambique, que continha dados vectoriais de clima
(precipitação e temperatura), Uso e cobertura do solo, Mapa Mundial, Mapas de
Províncias, Distritos e Aldeias; um Modelo Digital de Elevação – DEM (Declive);
Infra-estruturas (escolas, rede sanitária, estradas e aeroportos).

4.2. Análise de dados

Para a análise do impacto da ocorrência da tempestade Ana em Moçambique, foi


utilizado o Software ArcGis 10.8 seguindo os seguintes procedimentos:

 Fez-se a digitalização sobre o mapa mundial, especificamente para Moçambique


na região da influência do cone da trajectória do ciclone;
 Após a digitalização, georreferenciou-se todos os shapefiles de entrada para
WGS:1984_UTM_36S;

Para a avaliação do impacto da tempestade, fez-se a intersecção (intersect) de cada


shapefile (províncias, distritos, aldeias, e infra-estruturas) onde se extraiu a área
afectada em cada província e o respectivo número de distritos, aldeias, população1 assim
como o número das infra-estruturas afectadas em cada Província.

1
Quanto à população, uma das limitações que tive foi de fazer a projecção da população afectada
utilizando dados do último Censo Populacional de Moçambique (2017).

Lasse 21
5. RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1. Províncias afectadas pela tempestade Ana em Moçambique

Com a ocorrência do ciclone Ana, foram afectadas em Moçambique cerca de 65


distritos nas províncias de Nampula (18), Cabo Delgado (03), Niassa (07), Zambézia
(16), Tete (11), Manica (04) e Sofala (6) (Figura 5.1).

Figura 5.1. Províncias afectadas pela tempestade Ana em Moçambique.


Fonte: O autor.

As Províncias de Nampula, Zambézia e Tete, são as que possuem maior área afectada
pela tempestade Ana, facto que pode ser explicado pela localização das províncias no
centro da trajectória e ainda pela localização de Nampula na faixa costeira, local onde o
ciclone apresentava maior intensidade, tendo reduzido em direcção ao interior (OCHA,
2022d; Schouten et al., 2003).

Lasse 22
5.2. Aldeias e Pessoas afectadas pela tempestade Ana

Das sete (07) províncias, cerca de 6462 aldeias estiveram no raio da influência da
tempestade tropical Ana, onde as províncias de Nampula e Zambézia são as que
apresentaram maior número de aldeias afectadas, sendo 2425 e 2346, respectivamente.
Quanto à população, foram afectadas cerca de 5.783.982 pessoas, vivem na área de
influência do ciclone (Figura 5.2).

Figura 5.2. Aldeias afectadas pela tempestade Ana.


Fonte: O autor.

Lasse 23
5.3. Infra-estruturas afectadas

Da avaliação das infra-estruturas em risco, constatou-se que as províncias de Nampula


assim como Zambézia são as que apresentaram maior número de infra-estruturas
afectadas pela tempestade, desde as escolas até os hospitais (Figuras 5.3 a e b).

Figura 5.3. Ilustração de Infra-estruturas afectadas pela tempestade Ana.


Fonte: O autor.

Estes resultados, podem ser explicados pela área de influência afectada nas duas
províncias, Zambézia e Nampula, as quais foram afectadas em mais de 90% da sua área
total. E ainda, o facto de estar localizadas na região costeira, zona caracterizada por uma
baixa altitude, factor que quanto menor for, maior é impacto causado pelos ciclones
(Lutjeharms, 2007; Schott et al., 2009).

Quantitativamente, foi afectada uma área total de 307271 km2; 783.982 pessoas; 351
hospitais; 21 aeroportos; 989 estradas e 7358 escolas. Tendo se verificado menor registo
na província de Cabo Delgado (Tabela 5.1).

Lasse 24
Tabela 5.1. Infra-estruturas afectadas pela tempestade Ana em Moçambique.

Província Área afectada (km2) Nr de pessoas Hospitais Aeroportos Nr de estradas Escolas

Cabo Delgado 6559 126929 3 0 4 110

Manica 23191 111559 19 1 24 160

Nampula 78423 2151211 125 5 376 2329

Niassa 23577 223987 27 1 133 451

Sofala 19242 230817 18 1 94 297

Tete 54060 634578 54 7 110 781

Zambézia 102219 2304901 105 6 248 3230

Total 307271 5783982 351 21 989 7358

Fonte: O autor.

Lasse 25
6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

6.1. Conclusões

 A passagem da tempestade tropical Ana, afectou sete Províncias (Nampula,


Zambézia, Cabo-Delgado, Niassa, Tete, Manica e Sofala), correspondentes a
uma área total de 307.271 km2 sendo as províncias de Zambézia e Nampula as
que tiveram maior área afectada, em cerca de 102.219 e 78.423 km2 e Cabo
Delgado tendo sido afectada em apenas 6559 km2;
 No total, a área de influência do cone da trajectória da tempestade Ana, afectou
cerca de 5.783.982 pessoas, das quais 2304901 e 151211 são da Zambézia e
Nampula, respectivamente, e o menor número de pessoas foi observado em
Manica, com cerca de 111.559 pessoas potencialmente afectadas.
 Quanto a infra-estruturas (escolas, hospitais, aeroportos e estradas) o maior
número foi também observado nas duas províncias, Zambézia e Nampula. E a
que foi menos afectada foi a Província de Cabo-Delgado.

6.2. Recomendações

6.2.1. Ao governo:
 Este relatório apresenta resultados de população e infra-estruturas
localizadas na área de influência da tempestade Ana, portanto, recomenda-
se às entidades competentes a construção de infra-estruturas adaptadas ao
contexto e resilientes aos eventos climáticos, como é o caso das cheias, e
ainda, recomenda-se o reforço da mobilização da sociedade na redução do
risco aos eventos climáticos;

6.3.2. À Sociedade:

 Recomenda-se a adopção das medidas de prevenção aos eventos climáticos


extremos de modo a reduzir o risco;
 Construção de habitação em zonas seguras.

Lasse 26
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Albino, A. J. (2012). Bases geoambientais para a gestão da Bacia Hidrográfica do rio


Umbelúzi - Moçambique. Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Bennington, V. (2008). Cyclones and Anticyclones in the Mid-Latitudes.

Bié, A. J. (2017). Estudo numérico de marés meteorológicas na costa de Moçambique.


Universidade de São Paulo.

Donguy, E.-R., & Piton, B. (1986). The Mozambique channel revisited. Oceanologia
Acta, 14(6), 549–558.

Drishti. (2020). Stages of Formation : Tropical Cyclones. Em Cyclone.

DTM, INGD, & SCM. (2021). Avaliação da recuperação de abrigos na região Centro
de Moçambique (Manica, Sofala, Tete e Zmabézia).

Fink, A. H., & Speth, P. (1998). Tropical cyclones. Naturwissenschaften, 85(10), 482–
493. https://doi.org/10.1007/s001140050536

Gao, S., Zhai, S., Chiu, L. S., & Xia, D. (2016). Satellite air-sea enthalpy flux and
intensity change of tropical cyclones over the western North Pacific. Journal of
Applied Meteorology and Climatology, 55(2), 425–444.
https://doi.org/10.1175/JAMC-D-15-0171.1

Gustafsson, A., & Johansson, M. (2006). An Investigation of nutrient levels along the
Mbuluzi River. Lund University.

Hoque, M. A. A., Pradhan, B., Ahmed, N., Ahmed, B., & Alamri, A. M. (2021).
Cyclone vulnerability assessment of the western coast of Bangladesh. Geomatics,
Natural Hazards and Risk, 12(1), 198–221.
https://doi.org/10.1080/19475705.2020.1867652

INE. (2019a). Bolemtim de Estatísticas Demográficas e Sociais, Maputo Cidade.

INE. (2019b). IV Recenseamento Geral da População e Habitação, 2017 Resultados


Definitivos – Moçambique. Instituto Nacional de Estatística, Maputo-Moçambique,
16–21.

Jullien, S. (2013). Ocean response and feedback to tropical cyclones in the South
Pacific: processes and climatology. Umr 5566, 228 pp.

Levitus, S., Antonov, J., & Boyer, T. (2005). Warming of the world ocean, 1955-2003.

Lasse 27
Geophysical Research Letters, 32(2), 1–4. https://doi.org/10.1029/2004GL021592

Li, X., Zhan, R., Wang, Y., & Xu, J. (2021). Factors Controlling Tropical Cyclone
Intensification Over the Marginal Seas of China. Frontiers in Earth Science,
9(December), 1–16. https://doi.org/10.3389/feart.2021.795186

Lutjeharms, J. R. E. (2007). Three decades of research on the greater Agulhas Current.


Ocean Science, 3(1), 129–147. https://doi.org/10.5194/os-3-129-2007

Manjoro, A., Rosse, M. E. G., & Ferreira, P. A. (2020). Desafios de Moçambique Após
os Ciclones IDAI e Kenneth.

Mathias, R. de S. B. (2012). Análise e Classificação de Ciclones Utilizando Diagramas


de Fase: Conceitos e Aplicações em Previsão de Tempo Operacional. Universidade
Federal do Rio de Janeiro.

Mavume, A., Rydberg, L., Rouault, M., & Lutjeharms, J. (2009). Climatology and
Landfall of Tropical Cyclones in the South- West Indian Ocean. Western Indian
Ocean Journal of Marine Science, 8(1), 15–36.
https://doi.org/10.4314/wiojms.v8i1.56672

Metoffice. (2021, Março 12). Location of tropical cyclones. weather_learn about.


https://www.metoffice.gov.uk/weather/learn-about/weather/types-of-
weather/hurricanes/location

Meyer, A. A. (2012). Respondendo às mudanças climáticas em Moçambique: Tema 8:


Mudanças climáticas Oceânicas. Stellenbosch:CSIR, Fase II, 61.

MICOA. (2005). Ministério para a Coordenação da Acção Ambiental.

Montgomery, M. T., & Farrell, B. F. (1993). Tropical cyclone formation. Journal of the
Atmospheric Sciences, 50(2), 285–310. https://doi.org/10.1175/1520-
0469(1993)050<0285:TCF>2.0.CO;2

MRNA. (2021). Multi-Sectoral Rapid Needs Assessment Post-Cyclone Eloise.


February, 0–23.

Müzell, L. (2019, Março 4). Entenda o ciclone que devastou Moçambique e cameras.
Planeta verde. https://www.rfi.fr/br/africa/20190321-entenda-o-ciclone-que-
devastou-mocambique-e-zimbabue

OCHA. (2022a). Madagascar, Mozambique, Malawi | Tropical Storm ANA: Flash


Update No. 1 (Número 1).

Lasse 28
OCHA. (2022b). Madagascar, Mozambique, Malawi | Tropical Storm ANA: Flash
Update No. 9. Em United Nations Office for the Coordination of Humanitarian
Affairs (Número 9).

OCHA. (2022c). MOZAMBIQUE - Tropical Storms Ana and Dumako: Flash Update
No . 10 (Número 10).

OCHA. (2022d). MOZAMBIQUE – TROPICAL STORM ANA: Flash Update No.7


(Número 7).

ONU. (2022, Março 7). Em Moçambique, ONU avalia necessidades com passagem da
tempestade tropical Ana. ONU News, 2–4.

Paloschi, N. G. (2016). Investigação sobre a influência do vento na variabilidade da


temperatura da água do mar do canal de Moçambique. Universidade Federal do
Paraná.

Parker, C., Lynch, A. H., & Arbetter, T. E. (2014). Factors Affecting the Intensity and
Trajectory of Tropical Cyclone Yasi (Febuary 2011). American Geophysical Union,
February, 4313.

PARPA II. (2006). Plano de Acção para a Redução da Pobreza Absoluta 2006-2009
(PARPA II). 2009(Parpa Ii).

Phillips, H. E., Tandon, A., Furue, R., Hood, R., Ummenhofer, C., Benthuysen, J.,
Menezes, V., Hu, S., Webber, B., Sanchez-Franks, A., Cherian, D., Shroyer, E.,
Feng, M., Wijeskera, H., Chatterjee, A., Yu, L., Hermes, J., Murtugudde, R., Tozuka,
T., … Wiggert, J. (2021). Progress in understanding of Indian Ocean circulation,
variability, air-sea exchange and impacts on biogeochemistry. Ocean Science,
March, 1–109.

Quartly, G. D., & Srokosz, M. A. (2004). Eddies in the southern Mozambique Channel.
Deep-Sea Research Part II: Topical Studies in Oceanography, 51(1–3), 69–83.
https://doi.org/10.1016/j.dsr2.2003.03.001

REACH. (2019). Assessing humanitarian needs after Cyclone Idai proved two things –
the first was the importance of baseline data. Reliefweb, 3–7.

República de Moçambique. (2015). Estratégia Nacional de Desenvolvimento (2015 -


2035).

Reynolds, R. W., Smith, T. M., Liu, C., Chelton, D. B., Casey, K. S., & Schlax, M. G.

Lasse 29
(2007). Daily high-resolution-blended analyses for sea surface temperature. Journal
of Climate, 20(22), 5473–5496. https://doi.org/10.1175/2007JCLI1824.1

Schott, F. A., Xie, S.-P., & Mccreary, J. P. (2009). Indian Ocean circulation and climate
variability. Rev. Geophys, 47, 1002. https://doi.org/10.1029/2007RG000245

Schouten, M. W., De Ruijter, W. P. M., Van Leeuwen, P. J., & Ridderinkhof, H. (2003).
Eddies and variability in the Mozambique Channel. Deep-Sea Research Part II:
Topical Studies in Oceanography, 50(12–13), 1987–2003.
https://doi.org/10.1016/S0967-0645(03)00042-0

Smith, R. K. (2006). Lectures on tropical Cyclones.

Ternon, J. F., Roberts, M. J., Morris, T., Hancke, L., & Backeberg, B. (2014). In situ
measured current structures of the eddy field in the Mozambique Channel. Deep-Sea
Research Part II: Topical Studies in Oceanography, 100(January 2013), 10–26.
https://doi.org/10.1016/j.dsr2.2013.10.013

UN HABITAT. (2015). Manual on Cyclone Causes,effects & preparedness. Em United


Nations Human Settlements Programme.

UNFPA. (2022). Reproductive health needs in Mozambique a priority after Tropical


Storm Ana. Reliefweb, 2–5.

Veiga, A., & Fernandes, P. (2009). Perfil de risco climático de Moçambique. United
States Agency.

World Bank. (2022, Fevereiro 22). Current climate: climatology of Mozambique.


Climate Change Knowledge Portal.
https://climateknowledgeportal.worldbank.org/country/mozambique/climate-data-
historical.

Yarnell, M., & Cone, D. (2019). Devastação e desabrigados_Ciclones sem precedentes


em Moçambique e Zimbábue-um aviso do que está por vir?

Zehnder, J. A. (2019, Março 12). Location and patterns of tropical cyclones. Britannica
Science. https://www.britannica.com/science/tropical-cyclone/Location-and-patterns-
of-tropical-cyclones

Lasse 30

Você também pode gostar