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TUTORIAL 6

• Lesões térmicas são uma das principais causas de morbidade e mortalidade, mas a adesão aos princípios
básicos de reanimação do trauma inicial pode minimizar seu impacto. Os maiores princípios da abordagem
da lesão térmica incluem manter um alto nível de suspeita da presença de comprometimento da via aérea
após inalação de fumaça e o consequente edema causado pela queimadura.
▪ Além disso, é importante identificar e abordar as lesões mecânicas associadas, manter a normalidade
hemodinâmica com reposição de volume, controlar a temperatura e remover o doente do ambiente
hostil.
▪ Devem ser tomadas medidas para prevenir e tratar as potenciais complicações específicas causadas pelas
queimaduras, como por exemplo rabdomiólise (destruição das fibras musculares) e arritmias cardíacas
causadas por queimaduras elétricas.
▪ Além disso, desenvolvimento de síndrome compartimental abdominal e de extremidades, que podem
ocorrer após excessivas reposições volêmicas decorrentes da queimadura e lesões oculares devido a fogo
ou explosões.
• A diferença mais significativa entre queimaduras e outras lesões é que as consequências das queimaduras
estão diretamente relacionadas com a extensão da resposta inflamatória para a lesão. Quanto maior e mais
profunda a queimadura, pior a inflamação. Dependendo da causa, a energia transferida e o edema resultante
podem não ser evidentes imediatamente.
▪ Devemos regularmente verificar as fixações do tubo orotraqueal e sonda nasogástrica para garantir que
eles não estejam muito apertados e que as etiquetas de identificação estejam soltas. Monitorar também
os acessos venosos para garantir que não se percam pelo aumento do edema.

FISIOPATOLOGIA DA QUEIMADURA

• A queimadura contribui para inflamação local e sistêmica. Ao redor da lesão, existe uma zona de isquemia
cuja vasculatura está comprometida. Lesões adicionais, como hipoperfusão, edema extenso, hipóxia ou
infecção podem converter essa área marginalmente viável em tecido morto.
• A zona de isquemia é circundada por tecido inflamatório (zona de hiperemia), responsável pela liberação de
inúmero mediadores (citocinas, cininas, histamina, tromboxano e radicais livres) que aumentam a
permeabilidade localmente e a distância.
▪ Estabelece-se, então, uma resposta inflamatória sistêmica de magnitude variável, com resultante perda
de fluidos ricos em proteínas do intravascular em direção ao extravascular.
• A hipovolemia resultante soma-se à depressão miocárdica (provável ação de citocinas), o que contribui para
uma situação hipodinâmica inicial que, no entanto, transforma-se a partir do 2º dia após reposição volêmica
agressiva em franco estado hiperdinâmico.
• Rh.
1. Hipermetabolismo:
• É uma recomendação de consenso que, no manejo do queimado, a nutrição enteral deva ser iniciada dentro
de 24 horas do trauma e utilizada preferencialmente em relação ao suporte parenteral sempre que possível.
• A resposta metabólica ao trauma pode ser descrita em duas fases. A fase ebb é caracterizada pela perda de
volume plasmático, choque, diminuição do consumo de oxigênio, da temperatura corpórea, do gasto
energético basal e do débito cardíaco. Após a ressuscitação, a fase ebb evolui para a fase flow.
▪ A transição para a fase flow é dominada pelas alterações hormonais. Há um incremento nos hormônios
catabólicos, como catecolaminas, glicocorticosteroides e glucagon, que desempenham importante papel
para mediar a resposta metabólica.
▪ Essa fase é caracterizada pelo aumento do débito cardíaco e da temperatura corpórea, maior consumo
energético, proteólise acelerada e neoglicogênese. O pico de demanda energética em pacientes
queimados está por volta do 10º dia de queimadura e retorna gradativamente ao normal com a
reepitelização e enxertia, se não houver episódios de infecção e falência de múltiplos órgãos.
▪ Rh.
2. Imunidade:
• Após a queimadura, ocorre a rápida ativação das cascatas do ácido araquidônico e da citocina, com a
translocação bacteriana e de endotoxina. Com 24 a 48 horas de trauma, ocorrem as maiores alterações
metabólicas, hormonais e celulares e, depois de 3 a 4 dias, o 2º pico de endotoxemia, que reinduz às cascatas
inflamatória e do ácido araquidônico da citocina.
• Apesar de as alterações ocorrerem precocemente, não são significativas até alguns dias após o trauma. Com
esses processos, ocorre uma série de alterações que determinarão a resposta imunológica do paciente, entre
elas, déficits das imunidades celular e humoral, diminuição da função dos linfócitos T, disfunção dos
neutrófilos e diminuição da IgG sérica.

AVALIAÇÃO INICIAL E REANIMAÇÃO DE DOENTES COM QUEIMADURAS

• Medidas salva-vidas para os doentes com lesões causadas por queimadura incluem interromper o processo
de queimadura, garantir que a via aérea e a ventilação estejam adequadas e estabelecer acesso intravenoso.
• Rh.
1. Interromper o processo de queimadura:
• Remover completamente toda roupa do doente para interromper o processo de queimadura, no entanto aa
roupa aderida à pele não deve ser arrancada. Tecidos sintéticos podem inflamar e queimar rapidamente em
altas temperaturas e derretem formando resíduos aquecidos que continuam a queimar o doente.
• Ao mesmo tempo, tome cuidado para evitar a hipotermia. Reconhecer que as tentativas realizadas no local
do atendimento para apagar o fogo (parar, molhar e rolar), embora necessário, pode levar a contaminação
da queimadura com resíduos de água contaminada.
• Ter cuidado ao remover qualquer roupa que esteja contaminada por produtos químicos. Escove qualquer pó
químico seco da ferida. Os cuidadores também podem ser feridos e devem evitar o contato direto com o
produto químico. Depois de retirar o pó, descontamine as áreas de queimadura enxaguando com irrigação
abundante com solução salina morna ou lavagem em banho quente.
▪ Uma vez que o processo de queimadura foi interrompido, cobrir o doente com lençol quente e limpo.
▪ Rh.
2. Providenciar controle da via aérea:
• A via aérea pode ficar obstruída não só da lesão direta (como lesão por inalação), mas também pelo edema
maciço resultante da lesão causada pela queimadura. Edema normalmente não está presente imediatamente,
e sinais de obstrução podem inicialmente ser sutis, até que o doente piore. É essencial a avaliação inicial para
determinar a necessidade de IOT.
• Fatores que aumentam o risco de obstrução da via aérea superior são o tamanho e a profundidade das
queimaduras, queimaduras na cabeça de face, lesão por inalação, trauma local, queimaduras localizadas no
interior da boca.
▪ Queimaduras na face e boca causam edema que podem comprometer a via aérea do doente. Por terem
a via aérea menor, as crianças tem um risco maior de problemas de obstrução.
• História de queimadura com confinamento em um ambiente fechado ou sinais de lesão de vias aéreas na
chegada da emergência garantem a obtenção de via aérea definitiva no doente. Lesões térmicas da farine
podem produzi edema. As manifestações clínicas da lesão por inalação podem ser sutis e aparecer depois de
24h.
• Quando em dúvida, examinar a orofaringe do doente para detectar sinais de inflamação, lesão da mucosa,
presença de fuligem e edema na faringe, tomando cuidado para não ferir ainda mais a área. Embora a laringe
proteja a via aérea subglótica da lesão térmica direta, a via aérea é extremamente susceptível à obstrução
como resultado da exposição ao calor.
• Segundo o ABLS, as indicações para intubação precoce são:
→ Sinais de obstrução de via aérea.
→ Extensão da queimadura (40 a 50% de superfície queimada).
→ Queimaduras faciais extensas e profundas.
→ Edema significativo ou risco de edema da orofaringe.
→ Dificuldade para deglutir.
→ Sinais de comprometimento respiratório.
→ Diminuição do nível de consciência.
• Um nível de carboxihemoglobina superior a 10% em um doente que estava envolvido em um incêndio
também sugere lesão por inalação. Transferência para um centro de queimados está indicada para doentes
com suspeita de lesão por inalação. No entanto, se o tempo de transporte for prolongado, intube o doente
antes do transporte.
• Rh.
3. Assegure ventilação adequada:
• Lesão direta da via aérea inferior é rara e geralmente está associada a inalação de vapor superaquecido ou
gases inflamáveis. Preocupações com a ventilação estão relacionadas com 3 situações: hipóxia, intoxicação
por monóxido de carbono e lesão por inalação de fumaça.
• A hipóxia pode estar relacionada à lesão inalatória, ventilação inadequada por queimaduras circunferenciais
no tórax ou lesões traumáticas torácicas não relacionadas à queimadura. Deve-se administrar oxigênio
suplementar com ou sem intubação.
• Sempre considere a possível ocorrência de exposição ao monóxido de carbono (CO) em doentes queimados
em ambientes fechados. O diagnóstico é feito primariamente pela história de exposição e medida direta da
carboxihemoglobina (HbCO). Doentes com níveis de CO inferiores a 20% não costumam apresentar sinais e
sintomas.
▪ Determinações de gasometria arterial devem ser obtidas como uma linha de base para avaliar a condição
pulmonar do doente. No entanto, medida de PaO2 arterial não confiável sugere envenenamento por CO,
porque uma pressão parcial de CO de apenas 1 mmHg resulta em nível de HbCO de 40% ou mais.
▪ O tratamento empírico com oxigênio a 100% durante 4 a 6 horas deve ser feito para evitar a intoxicação
pelo CO nos pacientes que estiveram envolvidos em incêndio em ambiente fechado. Deve-se suspeitar
da intoxicação por cianeto em paciente que tem acidose metabólica persistente, inexplicável e profunda.
• Produtos de combustão, incluindo partículas de carbono e vapores tóxicos, são causas importantes de lesão
inalatória. Partículas de fumaça se instalam nos bronquíolos distais, levando a danos e morte das células da
mucosa. O dano das vias respiratórias leva a uma resposta inflamatória aumentada, que por sua vez leva ao
aumento de extravasamento capilar, resultando em aumento da necessidade de infusão de líquidos e
problemas na difusão de oxigênio.
▪ Além disso, as células necróticas tendem a morrer e obstruir a via aérea. Clearance (liberação) diminuído
da via aérea produz obstruções que resultam em um risco aumentado de pneumonia.
▪ A associação americana de queimadura definiu 2 critérios para o diagnóstico da lesão por inalação de
fumaça: (1) exposição a um agente combustível e (2) sinais de exposição à fumaça na via aérea inferior,
abaixo das cordas vocais, visualizados pela broncoscopia.
▪ Para avaliar o estado pulmonar de um doente com lesão por inalação de fumaça, o médico deve obter
uma radiografia de tórax e determinar a gasometria arterial. O tratamento é favorável. Um doente com
lesão por inalação de fumaça, associado a queimadura significativa deve ser intubado.
▪ Rh.
4. Tratamento da circulação com a reanimação do choque causado pela queimadura:
• Em doentes gravemente queimados a avaliação do volume sanguíneo circulante costuma ser difícil. Além
disso, doentes gravemente queimados podem ser portadores de outras lesões que também causem choque
hipovolêmico. O choque deve ser tratado segundo os princípios de reanimação.
• A reanimação com fluidos para o tratamento da queimadura também deve ser realizada. Em contraste com a
reanimação para outros tipos de trauma nos quais o déficit de líquidos é geralmente secundário à perda
hemorrágica, a reanimação por queimadura é necessária para substituir perdas líquidas contínuas de
extravasamento capilar devido à inflamação.
▪ Portanto, os médicos assistentes devem fornecer líquidos para reanimação de doentes com queimaduras
parcial profunda e de espessura maior que 20% SCT, tomando cuidado para não exagerar na reanimação.
Doentes com queimaduras necessitam de reanimação com solução de Ringer-Lactato começando com 2
mL por Kg, durante as primeiras 24h.
• Após estabelecer a permeabilidade da via aérea e identificar as lesões que implicam em risco iminente de
vida, devem ser providenciados acessos venosos. Para isso, deve-se estabelecer imediatamente acessos
venosos com cateter de grande calibre (16G) introduzido em veio periférica.
▪ Tendo em vista a alta incidência de flebites (inflamação de veia superficial, gerando um coágulo) e flebites
sépticas nas veias safenas, os membros superiores são preferíveis para o acesso venoso. Se acessos
venosos periféricos não podem ser obtidos, considere o acesso venoso central ou infusão intraóssea.
▪ Deve-se iniciar a infusão com solução cristaloide isotônica, preferencialmente Ringer-Lactato. O edema
resultante pode desalojar linhas intravenosas periféricas.
2 ML DE RINGER-LACTATO X PESO DO CORPO DO DOENTE EM KG X ASCQ EM PORCENTAGEM
▪ Metade do volume total estimado é administrado nas primeiras 8 horas após a queimadura e o restante deve
ser administrado nas 16 horas seguintes. Essa fórmula é apenas uma estimativa da necessidade inicial. Após
essa quantidade inicial a reposição volêmica oferecida deve ser ajustada e baseada no débito urinário de 0,5
mL/Kg/h para adultos.
• Aferições da PA podem ser difíceis de obter e podem não ser confiáveis em doentes com queimaduras graves.
Insira um cateter urinário permanente em todos os doentes que estão recebendo fluidos de reanimação de
queimados e monitore a saída de urina para avaliar a perfusão.
→ É importante compreender que reanimação a menos resulta em hipoperfusão e lesão orgânica final.
Reanimação a mais resulta em aumento do edema, que pode levar a complicações, tais como progressão
de profundidade de queimadura ou síndrome compartimental abdominal e de extremidades.
• Arritmias cardíacas podem ser o primeiro sinal de hipóxia e distúrbios hidroeletrolíticos ou ácido-base.
Portanto, o ECG deve ser realizado quando ocorrem distúrbios do ritmo cardíaco. Acidemia persistente em
doentes com lesões decorrentes de queimadura pode ser multifatorial, incluindo reanimação a mais ou
infusão de grandes volumes de solução salina durante a reanimação.

AVALIAÇÃO DO DOENTE

• Além de uma história clínica detalhada (AMPLA), é importante estimar o tamanho da área de superfície
corporal queimada e a profundidade da lesão causada pela queimadura.
• Rh.
1. História:
• A história das circunstâncias em que ocorreu a lesão é extremamente valiosa no tratamento do doente
queimado. A vítima pode sofrer lesões associadas durante as tentativas para escapar do fogo. Explosões
podem arremessar o doente a distância e provocar fraturas ou lesões internas, como lesões do SNC,
miocárdicas, pulmonares e abdominais.
• É essencial que se determine o momento em que ocorreu a queimadura. Na existência de queimaduras em
ambientes fechados deve-se suspeitar de lesão por inalação e lesão cerebral anóxica se houver associação
com perda de consciência.
• A história clínica, obtida através do doente ou da família, deve incluir um breve interrogatório sobre doenças
preexistentes: diabetes, hipertensão arterial, doença cardíaca, pulmonar e/ou renal e uso de medicamentos.
• A existência prévia de alergia ou de hipersensibilidade também é importante. Alguns doentes podem tentar
o suicídio por queimaduras e o médico deve estar atento à essa possibilidade. Além disso, a história do
doente deve ser condizente com o padrão de queimadura. Se a história for suspeita, devemos desconfiar de
maus tratos. Deve ser investigado o estado de imunização do doente contra tétano.
• Rh.
2. Área de superfície corporal queimada:
• A "regra dos nove" é uma regra prática e útil para determinar a extensão da queimadura. O corpo de um
adulto é dividido em regiões anatômicas que representam 9% ou múltiplos de 9%, da superfície corporal
total. A área de superfície corporal (ASC) da criança é consideravelmente diferente daquela do adulto.
• Na criança, a cabeça corresponde a uma porcentagem maior e os membros inferiores a uma porcentagem
menor que no adulto. A porcentagem da superfície corporal total que corresponde à cabeça de uma criança
é duas vezes maior que a do adulto normal. A palma da mão do doente (incluindo os dedos) representa
aproximadamente 1% de sua superfície corporal.
▪ A regra dos nove ajuda a avaliar a extensão das queimaduras com distribuição irregular e é a ferramenta
preferencial para calcular e documentar a extensão da queimadura.

▪ Rh.
3. Profundidade da queimadura:
• A profundidade da queimadura é importante para avaliar sua gravidade, para planejar o tratamento da ferida
e para prever os resultados funcionais e cosméticos finais. Queimaduras de primeiro grau ou superficiais
(como queimadura solar), são caracterizadas por eritema, dor e ausência de bolhas. Elas não determinam
risco de vida e geralmente não necessitam de reposição endovenosa de fluidos.
• Queimaduras de segundo grau ou de espessura parcial são caracterizadas pela aparência vermelha ou
mosqueada e presença de edema e bolhas. Podem ser de espessura parcial superficial ou espessura parcial
profunda. Queimaduras de espessura parcial superficiais são úmidas, dolorosamente hipersensíveis (mesmo
com corrente de ar), caracterizadas pela aparência rósea e dolorosas ao toque.
▪ Queimaduras de espessura parcial profunda são mais secas, menos dolorosas, com bolhas,
avermelhadas ou manchadas na aparência e menos dolorosas ao toque.
• Queimaduras de terceiro grau ou de espessura total costumam ser escuras e ter aparência de couro a pele
também pode se apresentar translúcida, ou com aspecto de cera. A superfície é indolor e geralmente seca e
pode ser vermelha e não mudar de cor à compressão local. Há pouco edema no tecido com queimadura de
espessura total, no entanto a área ao redor da queimadura pode apresentar um edema significativo.

AVALIAÇÃO SECUNDÁRIA E MEDIDAS AUXILIARES

• Aspectos fundamentais da avaliação secundária e medidas auxiliares incluem exame físico, documentação,
exames básicos, incluindo exames laboratoriais e radiografias, manutenção da circulação periférica em
queimaduras circunferenciais de extremidade, sondagem gástrica, narcóticos, analgésicos e sedativos,
cuidados com a ferida, antibióticos e imunização antitetânica.
• Documentação: logo após a admissão do doente no departamento de emergência, deve ser iniciado o
preenchimento de uma folha de registro, descrevendo o tratamento que lhe foi ministrado, incluindo a
quantidade de fluidos administrados e um diagrama mostrando a área e a profundidade das queimaduras.
• Exames básicos para doentes com queimaduras importantes: deve-se obter amostras para hemograma,
tipagem sanguínea e provas cruzadas, HbCO (carboxihemoglobina), glicemia, eletrólitos e teste de gravidez
em todas as mulheres em idade fértil. Uma dosagem de sangue arterial também deve ser retirada para
determinação da gasometria e dosagem de HbCO.
▪ Deve ser realizada uma radiografia de tórax nos doentes intubados ou com suspeita de lesão por inalação
de fumaça, que pode ser repetida conforme a necessidade. Outras radiografias podem ser solicitadas
para avaliar lesões associadas.
• Manutenção da circulação periférica em queimaduras de extremidades: o objetivo da avaliação da
circulação periférica no doente queimadura é excluir a síndrome compartimental. A síndrome
compartimental é causada pelo aumento da pressão dentro do compartimento muscular, o que interfere na
perfusão das estruturas dentro desse compartimento.
▪ Em queimaduras, esta condição resulta da combinação de elasticidade da pele e do aumento do edema
dos tecidos moles. A perfusão da musculatura do compartimento é a maior preocupação relacionada às
extremidades. Apesar da necessidade de uma pressão compartimental maior que a PAS para que haja
ausência de pulso distal à queimadura, uma pressão compartimental de > 30 mmHg pode causar necrose
do músculo.
▪ A partir do momento que o pulso está ausente pode ser tarde demais para salvar o músculo. Portanto, o
médico deve estar atento para sinais de síndrome compartimental:
→ Dor maior que a esperada e desproporcional ao estímulo ou lesão.
→ Dor ao estiramento passivo do músculo afetado.
→ Inchaço tendo do compartimento afetado.
→ Parestesias ou alteração da sensibilidade distal no compartimento afetado.
▪ Um alto índice de suspeita é necessário quando os doentes são capazes de cooperar com o exame clínico.
Síndrome compartimental também pode ocorrer devido a queimaduras circunferenciais no tórax,
levando a um maior pico de pressão inspiratório ou no abdome levando a síndrome compartimental
abdominal.
▪ Para manter a circulação periférica em doentes com queimaduras circunferenciais de extremidades, o
médico assistente deve:
→ Remover todas as joias e placas de identificação de alergia do doente.
→ Avaliar a circulação distal, observando se há cianose, enchimento capilar, sinais progressivos de
comprometimento neurológico.
→ A escarotomia pode ser necessária depois das primeiras 6h.
→ Fasciotomia raramente se torna necessário.
• Sondagem gástrica: deve ser colocada e mantida aberta se o doente apresentar náusea, vômitos, distensão
abdominal, ou se a queimadura envolver mais de 20% da área de superfície corporal queimada (ASCQ). Em
tais doentes, é essencial que a sonda gástrica seja colocada e esteja funcionando antes de uma eventual
transferência.
• Narcóticos, analgésicos e sedativos: o doente portador de queimaduras extensas pode estar ansioso e
agitado devido à hipoxemia ou à hipovolemia mais do que a dor. Consequentemente, responde melhor ao
oxigênio ou administração de líquidos do que narcóticos, analgésicos ou sedativos que podem mascarar os
sinais de hipoxia ou hipovolemia.
▪ Os narcóticos, os analgésicos e os sedativos devem ser administrados em doses pequenas e frequentes
e apenas por via intravenosa. O simples ato de cobrir a queimadura já leva ao alívio da dor.

LESÕES ESPECÍFICAS POR QUEIMADURA

• Embora a maioria dos ferimentos sejam por queimadura térmica, existem outras causas de queimaduras que
merecem especial consideração, incluindo as queimaduras químicas, elétricas e as causadas pelo piche
quente, bem como as queimaduras que indiquem abuso.
• Rh.
1. Queimadura química:
• A lesão química pode resultar da exposição a ácidos, álcalis, ou derivados do petróleo. Queimaduras ácidas
causam uma necrose de coagulação do tecido circulante, que impede a penetração do ácido em certa medida.
Queimaduras por álcalis são geralmente mais graves do que queimaduras por ácido, porque o álcali penetra
mais profundamente devido à necrose de liquefação do tecido.
• É essencial remover rapidamente o produto químico e cuidar imediatamente da ferida. As queimaduras
químicas são influenciadas pela duração do contato, pela concentração e pela quantidade do agente químico.
Se o produto químico for em pó seco e ainda estiver depositado na pele, deve-se removê-lo antes de iniciar
a irrigação com água.
▪ Logo após, irrigue imediatamente o local com grandes quantidades de água aquecida, por pelo menos 20
a 30 minutos, utilizando uma ducha ou mangueira. Queimaduras por álcalis necessitam de irrigação mais
prolongada.
▪ Agentes neutralizantes não têm vantagem sobre a lavagem com água, pois a reação com estes produtos,
por si só, produz calor e causa maior lesão tecidual. As queimaduras por álcalis exigem irrigação durante
as primeiras 8h.
▪ Rh.
2. Queimadura elétrica:
• As queimaduras elétricas resultam do contato de uma fonte de energia elétrica com o corpo do doente. O
corpo pode servir como condutor da energia elétrica e o calor gerado resulta em lesão térmica dos tecidos.
Diferentes velocidades de perda de calor por parte de tecidos superficiais e profundos são responsáveis pela
coexistência de pele aparentemente normal com necrose muscular profunda.
• Portanto, as queimaduras elétricas frequentemente são mais graves do que parecem à inspeção externa, e
as extremidades, especialmente os dedos estão particularmente propensos à lesão. Além disso, a corrente
elétrica passa por vasos sanguíneos e nervos e pode causar trombose local e lesão nervosa.
• Graves ferimentos elétricos geralmente resultam em contratura (contração muscular incorreta) da
extremidade afetada. Uma mão contraída com um pequeno orifício de entrada elétrica deve alertar o médico
atendente que uma lesão de tecidos moles profundos é provavelmente muito mais extensa do que é visível
a olho nu.
▪ Doentes com queimaduras elétricas frequentemente necessitam de fasciotomias e devem ser
transferidos precocemente para um centro de queimados no início do seu tratamento.
• O atendimento imediato de um doente com queimadura elétrica grave inclui a atenção à via aérea e à
respiração, o estabelecimento de acesso venoso em membro que não tenha sido afetado, a monitoração
eletrocardiográfica e a sondagem vesical de demora da bexiga.
▪ A eletricidade pode causar arritmias cardíacas que podem evoluir para parada cardíaca. Monitorização
prolongada é indicada para doentes que demonstram a lesão da queimadura, perda de consciência,
exposição a alta tensão (> 1000 volts) ou anormalidades do ritmo cardíaco.
▪ Como a eletricidade causa contrações forçadas dos músculos, o médico deve examinar o doente para
procurar lesões musculoesqueléticas associadas, incluindo a possibilidade de lesões vertebromedulares.
▪ A rabdomiólise decorrente da propagação elétrica através do músculo provoca liberação de mioglobina
que pode causar insuficiência renal aguda. Nessas circunstâncias, não cabe esperar a confirmação
laboratorial antes de instituir a terapia para mioglobinúria.
▪ Rh.
3. Queimadura por piche quente:
• Em ambientes industriais, indivíduos podem sofrer lesões secundárias por piche quente ou asfalto. A
temperatura do piche derretido pode ser muito alta - até 232 ºC - quando retirado do caldeirão. Um fator
complicador é a adesão do piche quente à pele e infiltração das roupas, resultando em contínua transferência
de calor.
• Tratamento inclui refrigeração rápida do piche e cuidado para evitar trauma adicional ao remover o piche.
Vários métodos são descritos na literatura, o mais simples é o uso de óleo mineral para dissolver o piche. O
óleo é inerte, seguro na pele lesada e disponível em grandes quantidades.
• Rh.
4. Padrões de queimadura que indicam abuso:
• É importante para o médico atendente ter a consciência de que o ferimento de queimadura intencional pode
ocorrer tanto em crianças como em adultos. Os doentes são incapazes de controlar seu ambiente, tais como
muito jovens e os muito velhos, são vulneráveis ao abuso e negligência.
• Queimaduras circulares e queimaduras com bordas claras e padrões únicos devem levantar suspeita, elas
podem indicar que um cigarro ou outro objeto quente foi colocado em contato com a pele do doente. Acima
de tudo, o mecanismo e o padrão das lesões devem coincidir com a história da lesão.

TRANSFERÊNCIA DE DOENTES

• Os seguintes tipos de queimadura geralmente necessitam de transferência para um centro de queimados:


1. Queimaduras de espessura parcial comprometendo mais que 10% ASCQ.
2. Queimaduras envolvendo a face, mãos, pés, genitália, períneo ou a pele sobre as principais articulações.
3. Queimaduras de 3ª grau em qualquer grupo etário.
4. Queimaduras elétricas, incluindo por raios.
5. Queimaduras químicas.
6. Lesões por inalação.
7. Queimaduras em doentes com doenças prévias (DM, IR).
8. Qualquer doente queimado com trauma concomitante (como fraturas).
9. Crianças com atendimento em hospitais sem pessoal qualificado.
10. Queimaduras em doentes que irão necessitar de suporte pessoal, tanto do ponto de vista social, como
emocional, ou de reabilitação prolongada.

LESÕES POR FRIO

• A gravidade das lesões por frio depende da temperatura, da duração da exposição, das condições ambientais,
do grau de proteção conferida pelas roupas e do estado de saúdo do doente. Temperaturas mais baixas,
imobilização, exposição prolongada, umidade, presença de doença vascular periférica e de feridas abertas
são fatores que aumentam a gravidade da lesão.
• Rh.
1. Congelamento:
• O congelamento é devido a lesão do tecido por formação de cristais de gelo causando lesão de membrana
celular, oclusão microvascular e anóxia tecidual subsequente. O dano tecidual também pode resultar da lesão
de reperfusão que ocorre no reaquecimento. O congelamento é classificado em graus, primeiro, segundo,
terceiro e quarto graus de acordo com a profundidade de envolvimento.
▪ 1º grau: hiperemia e edema presentes, sem necrose da pele.
▪ 2º grau: formação de vesícula grande, clara acompanhada de hiperemia e edema com necrose de pele de
espessura parcial.
▪ 3º grau: necrose de tecido subcutâneo e de espessura total e comumente com formação de vesículas
hemorrágicas.
▪ 4º grau: ocorre necrose de pele de espessura total, incluindo o músculo e osso com posterior necrose.
• Embora parte do corpo afetada se apresente inicialmente endurecida, fria, branca e anestesiada, a aparência
da lesão muda durante o curso do tratamento na medida que a área é aquecida e torna-se perfundida.
• O regime de tratamento inicial se aplica a todos os graus de lesão, e muitas vezes a classificação inicial da
lesão não é prognóstica. O tratamento cirúrgico final do congelamento depende do nível de demarcação dos
tecidos perfundidos. Essa delimitação pode levar de semanas a meses para chegar a uma fase final.
• Rh.
2. Lesão não congelante:
• A lesão não congelante é devida ao comprometimento do endotélio microvascular, estase e oclusão vascular.
O termo pé (ou mão) de trincheiro ou pé (ou mão) de imersão descreve um tipo de lesão não congelante que
pode acometer as mãos ou os pés, que afeta tipicamente soldados, marinheiros ou pescadores e que resulta
da exposição crônica a ambiente úmido e a temperaturas pouco acima do ponto de congelamento (1,6ºC a
10ºC).
• Embora o pé inteiro possa parecer preto, pode não haver destruição de tecidos profundos. O quadro evolui
através da alternância de vaso-espasmo e de vasodilatação arterial. Os tecidos afetados apresentam-se frios
e anestesiados no início e evoluem para a hiperemia em 24 a 48 horas.
• Com a hiperemia surge uma sensação intensa e dolorosa de queimação e de disestesia, assim como lesões
teciduais caracterizadas por edema, formação de bolhas, vermelhidão, equimoses e ulcerações. Podem surgir
complicações de infecção local, como celulite, linfangite ou gangrena. Bons cuidados higiênicos locais podem
evitar a ocorrência da maioria dessas lesões.

Tratamento do congelamento e lesão não congelantes

• O tratamento deve ser imediato para reduzir a duração do congelamento dos tecidos. Entretanto, o
reaquecimento não deve ser iniciado se existir o risco de um novo congelamento. Roupas úmidas e apertadas
devem ser substituídas por cobertores aquecidos e, desde que possa ingerir líquidos, o doente deve receber
líquidos quentes por via oral.
• As medidas iniciais a serem tomadas incluem a colocação da parte afetada em água circulante a 40ºC até que
ocorre o retorno da perfusão e a coloração volte a ser rosada (o que leva, usualmente, 20 a 30 minutos). A
melhor forma de conseguir, isto é, no ambiente hospitalar, em um grande tanque como uma banheira de
hidromassagem com água circulante.
• O calor seco deve ser evitado, assim como esfregar ou massagear a área. O processo de reaquecimento que
se utilizem analgésicos adequados (narcóticos, infundidos por via IV). Durante o reaquecimento, recomenda-
se a monitoração cardíaca.
▪ Aquecimento de grandes áreas pode resultar em síndrome de reperfusão, com acidose, hipercalemia e
inchaço local. Portanto, monitore o ritmo cardíaco e a perfusão durante o reaquecimento do doente.
▪ Rh.
1. Cuidados locais no congelamento:
• O objetivo do tratamento das lesões devidas a congelamento é preservar os tecidos danificados, prevenindo
a infecção, evitando abrir vesículas não infectadas e elevando a parte afetada que é deixada exposta ao ar
ambiente. Os tecidos lesados devem ser protegidos por uma tenda ou por outro dispositivo de modo a não
exercer pressão sobre eles.
• Quando do tratamento de doentes com hipotermia, é importante reconhecer as diferenças entre o
reaquecimento passivo e ativo. Reaquecimento passivo envolve colocar o doente em um ambiente que
reduza a perda de calor (usando roupas secas e cobertores) e se baseia no mecanismo de termorregulação
intrínseca do doente para gerar calor e elevar a temperatura do corpo.
▪ Esse método é usado para hipotermia leve. O reaquecimento ativo envolve fornecer fontes adicionais de
energia de calor para o doente (administrar solução endovenosa aquecida, colocação de almofadas
aquecidas em áreas de alto fluxo vascular e iniciar desvio circulatório). O reaquecimento ativo é usado
em doentes com hipotermia moderada a grave.
• Embora os doentes possam encontrar-se desidratados, apenas raramente a perda de líquidos é
suficientemente grande a ponto de exigir medidas de reanimação com o uso de soluções endovenosas. A
adoção de medidas de profilaxia antitetânica depende do estado prévio de imunização do doente. O uso de
antibióticos por via sistêmica deve ser reservado para infecções já instaladas.
• As feridas devem ser mantidas limpas e as bolhas não infectadas devem ser deixadas intactas por 7 a 10 dias,
com o intuito de oferecer um curativo biológico estéril. Nicotina, e outros agentes vasoconstritores devem
ser evitados. Atividades físicas intensas são proibidas até a resolução do edema.

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