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Referências Técnicas Para Atuação De Psicólogas (Os) Junto Aos Povos Indígenas

https://site.cfp.org.br/publicacao/referencias-tecnicas-para-atuacao-de-psicologasos-junto-aos-
povos-indigenas/
Isabel Biondo Sá

‘’Para trabalhar no contexto indígena, faz-se necessário “tirar do automático” quase tudo
o que estamos acostumados a falar e a fazer nas diversas abordagens teóricas e áreas de atuação
profissional. ” (p.40)

Os autores afirmam que compreender a identidade e a subjetividade indígena requer, uma


busca densa e descritiva pelo corriqueiro, pelas sutilezas e detalhes do cotidiano vivenciado
intersubjetivamente na dinâmica cultural.

“As culturas indígenas são a maior sócio diversidade do mundo e legitimam o que há de
mais importante na produção de conhecimentos e práticas milenares, embora não sejam
reconhecidas pelos sistemas oficiais de saúde. ” (p.129)

“A participação indígena no campo das políticas públicas tem como pressuposto,


portanto, sua autonomia e direito à autodeterminação. ” (p.52)

“A psicologia e outras ciências humanas, ao se descolonizarem, podem contribuir para a


desconstrução histórica de padrões coloniais de dominação presentes nas diferentes dimensões
da realidade social. ” (p.167)

“É muito válido mencionar isso, pois para os povos indígenas não existe a divisão
cartesiana entre um “eu pesquisador”, relativo à vida profissional, e “um eu mesmo”, relativo à
vida pessoal propriamente dita. Dessa maneira, inserir-se como trabalhador ou pesquisador
nesse campo significa concretamente adentrar em uma vida comunitária, mesmo que
involuntariamente, pois essa condição existencial, no caso da Psicologia, faz parte do processo
de atribuição de sentidos sobre nós por parte do grupo étnico. ” (p. 44)

Os autores concluem que sobre os territórios indígenas, é preciso saber que os conteúdos
psicossociais se invertem, isto é, o segredo passa a ser algo coletivo, vinculado à memória e à
oralidade; e que precisa ser mantido no coletivo em detrimento de uma escuta
hegemonicamente psicológica.

Os autores alegam que a condição de trabalho pode causar grande estranheza da (o)
profissional de psicologia, quando percebe que o que ouviu em um grupo operativo ou em uma
escuta individual é conhecido pela comunidade, e que, portanto, não possui o estatuto de um
conteúdo íntimo e ou secreto.

Os autores também afirmam que a comunidade só fala para a (o) psicóloga (o),
profissional e ou cientista, o que estiver étnico-cultural e historicamente autorizado, já que
psicólogas (os) não indígenas podem não receber informações sobre “o que branco não
entende”.

Os autores concluem que a participação indígena no campo das políticas públicas tem
como pressuposto, sua autonomia e direito à autodeterminação, mas tal reconhecimento nem
sempre esteve dado; ao contrário é fruto de uma luta do movimento indígena em âmbito
nacional.

“A Psicologia que está nas escolas da rede pública e privada pode, a propósito, contribuir
com esse processo, articulando, propondo e promovendo parcerias com lideranças indígenas,
na realização de eventos, debates, rodas de conversa, feiras e espaços estético-políticos (tal
como exposições que demandem envolvimento ativo e participação), para cumprir com essa
demanda social, de formação moral, ética e cidadã e desenvolvimento humano. ” (p. 57)

“Para que as ações de saúde mental e bem viver aconteçam, o profissional deve ser capaz
de ouvir as demandas, estimular a mobilização da comunidade para buscar uma compreensão
mais profunda e consensual a respeito das causas geradoras dos problemas percebidos e
elaborar conjuntamente os caminhos que possam levar às formas de tratamento que considerem
as cosmovisões e práticas dos povos. ” (p. 63)

“É necessário que o sistema de saúde integre em seu quadro de cuidadores os mestres,


anciões, curandeiros, parteiras, pajés, xamãs, rezadores, benzedores e outros atores que detêm
os saberes tradicionais, oferecendo as condições necessárias para que promovam tais práticas
de saúde junto às comunidades. ” (p. 63)

Alves et. Al. diz ainda que é preciso que o profissional não ocupe o lugar de detentor
absoluto do conhecimento, mas que antes conheça e aprenda, compreenda e respeite as distintas
cosmovisões e práticas dos povos indígenas, recebendo dos mais velhos e lideranças
orientações quanto às formas de enfrentamento dos problemas, organização do povo e as
condutas esperadas para que a cultura seja respeitada

“É relevante que o trabalho seja feito em consonância com o entendimento e a


participação das lideranças e dos mais velhos, que deverão se aliar na mediação das práticas de
cuidado em saúde, que envolvem necessariamente a alimentação, a espiritualidade, a relação
com a terra e com a floresta, as diversas práticas culturais tradicionais e suas perspectivas de
futuro. “ (p. 64)

Os autores deixam explicito que o psicólogo precisa se questionar sobre “quem é a pessoa
indígena? ”. É importante reiterar que “indígena” é uma condição étnico-cultural genérica e que
cada povo se distingue do outro mediante os costumes, a língua, relação com o sagrado, demais
saberes e fazeres culturais. No entanto, isso não exclui outras categorias sociais ou condições
de existência, como gênero, deficiência e classe social.
Os autores reforçam que considerando que o cerne do sistema que domina e explora
mulheres (o patriarcado) também em ameaça às mulheres indígenas, como terreno fértil para
estupro, feminicídio e lesbocídio subnotificado.

“É preciso que a (o) profissional inserida (o) nesse contexto atue com a equipe e com as
lideranças femininas para visibilizar tais questões, dialogar e orientar a comunidade e trabalhar
contra essa violência de gênero – que por sua vez encontra-se indissociável da luta pela
demarcação e autonomia pelos territórios, possível apenas por meio da soberania nacional. ”
(p. 91)

“Precisamos construir uma psicologia amazônica que respeite as especificidades culturais


de seus povos, onde ela passe de interventora para atuadora contínua nesses povos que precisam
de um olhar e entendimento com todo respeito. Que essa psicologia possa dialogar com as
cosmologias e epistemologias dos povos da Amazônia. ” (p. 197)

Referência Bibliográfica

ALVES, M. H. et. Al. Referências Técnicas para Atuação de Psicólogas (os) Junto aos Povos
Indígenas. Conselho Federal de Psicologia, Conselhos Regionais de Psicologia, Centro de
Referência Técnica em Psicologia e Políticas Pública. Brasília: CFP, ed. 1, p. 1–222, 2022.

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