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A ORIGEM DO TERMO TRAGÉDIA

O uso do termo tragédia adquiriu outras atribuições quando utilizado pelo senso
comum, uma vez que, pode ser visto como verbetes em situações do dia a dia ou até
mesmo em uma matéria jornalística para adjetivar algo ruim que tenha acontecido.
Porém, sua origem e suas particularidades vão além disso. Para compreender o gênero
trágico, é necessário entender que existe uma espécie de “gênero geral”, que seria o
gênero dramático, englobando a tragédia. Ou seja, o gênero drama, pode-se dividir
então, em tragédia e comédia.

O conjunto de características da tragédia, são usadas para marcar a produção de uma


peça teatral e foram extremamente relevantes para a cultura grega. Essas peças
influenciavam diretamente os pensamentos e posicionamentos jurídicos da época.

Originalmente, a palavra tragédia, vem do grego trágos + odé em que tragos


significa bode e odé significa canção, ou seja, canto dos bodes ou canto para os bodes.
Isso deve-se ao culto realizado ao deus Dionísio. O indivíduo cultuado é filho de Zeus
com uma imortal, logo, um semideus. Porém, a esposa traída de Zeus cria repulsa a
Dionísio e o proíbe de viver no Olimpo. Em uma das estratégias de fuga, Dionísio é
transformado em um bode, assim, traz sentido à origem da palavra tragédia: culto ao
bode. É importante ressaltar que em 534 a.c nasce a primeira tragédia representada, isso
ocorre durante as festas dionisíacas, quando decidiram incorporar a personagem de
Dionísio propriamente dito. Esta apresentação foi criada por Téspis, podendo então ser
considerado o primeiro autor do teatro grego.

FUNÇÃO DA TRAGÉDIA NA GRÉCIA ANTIGA

Apesar de apresentarem características de entretenimento, o foco das encenações


trágicas não era somente esse. Tendo um cunho reflexivo, as tragédias fazem com que o
ser humano elaborasse sentimentos e gerasse questões complicadas. Além disso, tinha
como função principal, discutir as questões fundamentais da vida grega e educar os
cidadãos para os debates e experiências da democracia da época.

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PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DE TRAGÉDIAS POSTERIORES

Ao analisar não só as tragédias de séculos passados, realizamos esse procedimento


também com os séculos posteriores, as características observadas foram as seguintes:

● “A característica primordial da tragédia é quando um personagem passa de


uma situação inicial de felicidade à de completa ruína quando reconhece sua
falha, ou seja, passa da ignorância ao conhecimento; transição que causa na
plateia compaixão ou terror” (DE LIMA, doris munhoz;2011)
● Por ser uma peça teatral, não possui um narrador. A narração acontece através
dos diálogos produzidos pelas personagens.
● Possui personagens, espaço cênico em tempo
● Catarse: momento em que acontece a reflexão purificadora, a busca de um
alívio por descarregar a dor.
● Clímax: mudança repentina de estados da personagem

O GÊNERO NA OBRA DE NELSON RODRIGUES

Por tratar-se de uma obra contemporânea, o autor Nelson Rodrigues atualiza o


sentido de tragédia devido ao seu envolvimento com o meio cultural em que está
inserido.

O século XX pode ser marcado por uma forte influência de valores cristãos, em que o
homem é condenado de acordo com as suas escolhas. Esta ideia, faz-se presente
na obra de Nelson Rodrigues, uma vez que, a noção de fatalidade baseada no
sentido grego torna-se inexistente pois o “dar errado” e o desastre são sempre
oriundos da natureza corrupta do homem, logo, a culpa paira sobre ele.

Os valores cristãos do homem presentes no século XX vão contrários às ideias


pregadas nas tragédias gregas, afinal, como dito no início, as tragédias antigas
eram voltadas estritamente para a cultura e estrutura social grega. Antes, a noção
de destino e fatalidade estava ligada à queda do herói, e as consequências dessa

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queda recaiam sobre o povo. Hoje, a morte e a fatalidade, estão ligadas
diretamente com a noção de causa e consequência das atitudes humanas.

Tendo como base a tragédia clássica, Aristóteles destaca o processo em que o


indivíduo se encontra em sua plenitude e passa a viver em uma situação de
catástrofe, deixando claro que isso acontece por uma limitação humana ao
reconhecer uma falha. Ao contrário da moralidade cristã, em que a morte é uma
punição que o ser humano não pode evitar pois ele realizou algo de forma
intencional e precisa arcar com os resultados finais.

A OBRA DE NELSON RODRIGUES E A POÉTICA DE ARISTÓTELES:

Uma vez apontado o tópico anterior, dedicaremos este tópico para analisar a obra
de Nelson Rodrigues a fim de relacioná-lo com as características da tragédia apontadas
na obra de Aristóteles. Dito isso, a partir do pensamento de Aristóteles em “A poética”,
um dos primeiros pontos que podemos relacionar com a obra de Nelson é a construção
da obra. Ao nos referirmos sobre a construção presente no trabalho de Nelson
Rodrigues, uma interpretação comum a essa fala é inferir que a palavra “construção”,
se relaciona diretamente da estrutura obra, porém, o que nos empenhamos a tratar, é um
pensamento que pode se ter ao analisar a primeira definição de tragédia que temos no
sexto capítulo de “Poética”:

é pois a tragédia imitação de uma ação de caráter elevado, completa e de certa extensão, em
linguagem ornamentada e com as várias espécies de ornamentos distribuídas pelas diversas partes [do
drama], [imitação que se efetua] não por narrativa, mas mediante atores, e que, suscitando o “terror e a
piedade, tem por efeito a purificação dessas emoções” (1987:205).

Numa primeira análise do trecho citado, é possível a compreensão de que, para


Aristóteles, a construção do “rumo” da tragédia seria uma das partes mais importantes
da obra. Uma vez que esta não se trata da imitação de pessoas em sua futilidade, mas
sim de ações, isto é, a imitação da felicidade, da tristeza, do exagero, uma imitação da
vida. Ou seja, isso descreve que a tragédia deve ocorrer de maneira a fazer com que, em

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sua construção, cause terror e piedade naqueles que a presenciarão O que propomos,
então, é observar essa progressão e construção na obra de Nelson.

Para iniciar esta análise, é necessário entender como essa transição da felicidade
ao fracasso ocorre com Alaíde. Muitas vezes, nas peças trágicas, o personagem passa a
lutar contra o seu destino consciente ou inconscientemente, mas esse personagem não é
exatamente uma “vítima”. Na tragédia, a transição de vida do personagem principal, ou
melhor, desse herói trágico, geralmente está relacionada a um ser que transgride a linha
do permitido, do possível e da lei. Essa transição, no entanto, pode acontecer sem que o
personagem nem sequer saiba disso, como é o caso de Édipo, mas, mesmo assim, é
creditado o dever de pagar por isso. Essa construção do rumo ou enredo da obra é,
portanto, como uma “punição divina” àquele que uma vez tentou driblar seu destino. É
possível, então, ao ler “Vestido de Noiva”, nos perguntar se o rumo da personagem na
obra é dado como uma punição por ter roubado o namorado da irmã. Aqui o pecado de
Alaíde seria transgredir a lei do correto, escolher roubar algo que não lhe pertencia e aí
ser fadada ao destino de algo dar errado. Utilizamos a palavra “destino”, pois, por mais
que ela não fosse atropelada, a sua morte já estava sendo planejada e, portanto, morreria
de uma forma ou de outra.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

(DE LIMA, doris munhoz, A tragédia e o caos da Modernidade: Aspectos do gênero


trágico na obra de Nelson Rodrigues, Estação Literária Londrina, Vagão-volume
7, p. 80-92, set. 2011)

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