Introdução à Teologia e

Seus Métodos
Elementos da Produção Teológica
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25 de Agosto – Duque de Caxias - RJ
1ª Edição
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Márcia Loch
Sumário
Elementos da Produção Teológica
Para Início de Conversa... ................................................................................ 4
Objetivos ..................................................................................................... 4
1. Elementos Devocionais ............................................................................... 5
2. Elementos Científicos .................................................................................. 9
Referências ..................................................................................................... 14

Introdução à Teologia e Seus Métodos 3

Para Início de Conversa... Objetivos
Neste capítulo, falaremos um pouco sobre o processo de produção da ▪ Identificar os principais elementos da produção da teologia.
Teologia, dos elementos que são muito importantes para que possamos ▪ Perceber que a Teologia se faz com elementos devocionais e
avançar nesta tarefa. Às vezes, alguns pensam que a Teologia, para ser científicos.
construída, precisa apenas de elementos intelectuais e científicos, como ▪ Analisar a importância da Teologia para o discurso e para a prática de
senso crítico apurado, rigor metodológico, etc. Outros, por sua vez, com vida cristã.
dificuldades de dar conta dos critérios intelectuais, acreditam que, para a
construção da Teologia, bastam apenas os elementos devocionais, como
se a Teologia fosse revelada ou assimilada por meio da oração.

É importante pensarmos que o essencial para a produção teológica é

a junção das duas realidades, ou seja, uma integração harmônica dos
fatores devocionais e intelectuais. Para uma boa Teologia ser de fato
produzida, é necessário orar, contemplar o Mistério, ler devocionalmente
a Bíblia, conviver com a comunidade, etc., mas, ao mesmo tempo, é
indispensável que o teólogo e a teóloga tenham critérios intelectuais,
porque a Teologia é uma tarefa humana que deve ser feita com dedicação
e comprometimento intelectual. Portanto, não podemos esquecer que
essas duas realidades são importantes na construção teológica.

Introdução à Teologia e Seus Métodos 4

1. Elementos Devocionais
A Teologia é uma tarefa humana, uma atividade feita por seres humanos.
Ela acontece na vida humana de modo concreto, portanto todas as
esferas da vida humana estão inseridas no universo teológico. Enquanto
ciência humana, a Teologia deve se conectar com toda a vida humana e
trazer significados e esperança para a realidade humana.
É importante repetirmos essas realidades, porque muitos ainda pensam
na Teologia como uma tarefa divina ou angelical. Claro que o assunto
principal da Teologia é Deus, Sua revelação e o modo como os seres
humanos compreendem e vivem esse fenômeno, porém Deus não
precisa fazer Teologia, nem os anjos. Nós, seres humanos, precisamos
fazer, refletir e construir a Teologia e, para que ela faça sentido em
nossa existência, deve estar em diálogo com a vida e não apenas com
conhecimentos específicos.
Muitos pensam que os elementos de espiritualidade e de devoção não
são importantes no processo teológico, outros acreditam que o processo
se resume às atividades piedosas, porém, tanto uma análise quanto a
outra são superficiais e limitadas. Quando fazemos essas distinções
estamos expressando o Dualismo que ainda é muito presente na cultura
ocidental e no cristianismo em geral, e isso não é saudável, pois o texto
sagrado nos mostra uma realidade integradora como sendo vontade de
Deus para a vida humana.
Introdução à Teologia e Seus Métodos
Dualismo foi um pensamento popularizado no Ocidente pelo filósofo
Platão e entendia que a realidade era dividida em duas partes: uma parte
imaterial e outra material, uma transcendental e outra imanente e, assim
por diante. O Dualismo entende duas realidades em chave de exclusão.
Nós, seres humanos, fomos criados por Deus de modo integral e,
portanto, somos seres devocionais e intelectuais. Os dois elementos são
muito importantes para a vida humana e para a produção teológica; se
uma das duas realidades for superada pela outra, então nossa Teologia
estará pela metade, não estará completa.
Quando falamos de Deus, estamos falando em partes, pois trata-se de
alguém que é perfeito, que é eterno. Perfeição e eternidade são duas
realidades completamente fora da realidade humana. Quando falamos
sobre Deus, estamos falando sobre Mistério. Jamais conseguiremos
expressar quem é Deus. Jamais teremos o entendimento adequado
de Deus e sua realidade e, portanto, devemos compreender a nossa
limitação.
Toda vez que o ser humano insiste em dizer quem é Deus, Ele está
falando de um Deus conforme a sua própria imagem e semelhança, está
falando de um ídolo que ele mesmo criou, pois o ser humano não é
capaz de chegar a Deus por sua própria capacidade.
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O Salmo 46.10 nos diz algo muito interessante: Aquietai-vos e sabei que incapazes diante do Mistério e o quanto Ele é essencial em nossas
Eu sou Deus! Essa fala expressa a atitude do salmista diante do Mistério realidades, ainda que não encontremos palavras adequadas para
ao qual lhe faltaram as palavras, pois o ser humano não é capaz de dizer descrevê-lo. Estudar Teologia também é se deparar com o Mistério, mas
o indizível! Esse ser humano apenas pode contemplar a Sua divindade não é uma fuga da reflexão ou do raciocínio, nem mesmo devemos
e adorá-lo. Foi o que o salmista fez: diante do Mistério divino ele considerar como Mistério aquilo que não entendemos ou aquilo que
simplesmente emudeceu e soube que Ele era Deus. parece desconfortável para o nosso entendimento, mas não podemos ter
a arrogância de achar que conseguiremos dar conta de Deus.
Durante a história da teologia, muitos foram os pensadores e pensadoras
que tiveram uma experiência como a do salmista: homens e mulheres Alguns elementos fazem todo o sentido para
que se viram diante do Mistério e não ousaram tentar explicar o o teólogo, para a teóloga. Vamos
inexplicável ou dizer o indizível, simplesmente contemplaram. Exemplos citar alguns desses elementos
como Teresa de Ávila, Catarina de Siena, Meister Eckhart, João da Cruz e importantes chamados de
tantos outros nos ensinam Teologia por meio de sua contemplação, ao devocionais. O primeiro
mesmo tempo em que nos encorajam a também contemplarmos. desses elementos é a
Fé. A Teologia não é
uma ciência como a
Ciência da Religião;
O termo Contemplação é uma expressão teológica que indica adoração
esta segunda estuda
a Deus. A contemplação é uma atitude diante do Mistério. O que nós
o fenômeno religioso
conhecemos como devocional vem de devoção e na teologia é chamado
de Mística. de fora e fala sobre
tal acontecimento. Já a
Teologia estuda de dentro
Portanto, não podemos esquecer que estudar Teologia também é do fenômeno religioso, fala
contemplar. O Estudo da Teologia nos faz perceber o quanto somos do acontecimento.

Introdução à Teologia e Seus Métodos 6

Um cientista da religião até pode fazer o seu trabalho sem ter fé
pessoal, mas um teólogo jamais fará isso. Subentende-se que teólogo
é o indivíduo que crê e, portanto, estuda algo do qual faz parte e não
é um mero espectador. Independentemente de fazer parte de alguma
igreja ou de qual igreja possa fazer parte, a Teologia pressupõe fé no
seu exercício. Não é fé no material teológico, mas fé na pessoa do Deus
criador.
Fé é o fundamento que nos mantém a esperança de um dia
contemplarmos a eternidade, de vivermos para sempre com Deus (Hb
13.1). Nenhum ser humano teve o testemunho de alguém que alcançou
a vida eterna, mas confiamos, pela fé, que um dia desfrutaremos dela.
Quando fazemos teologia estamos falando de fé e estamos lidando com
a fé das pessoas. Claro que devemos contribuir para o crescimento do
próximo, mas devemos fazer isso respeitosamente.
Outro elemento importante na construção teológica é a Oração. Paul
Tillich já dizia que a oração pressupõe teísmo, ou seja, já pressupõe que
Deus é, caso contrário não falaria com Ele (TILLICH, 2005, p.33).
Oração não é um mecanismo de barganha ou de chantagem com Deus
como muitos infelizmente pensam, mas é uma expressão do nosso
desejo de relacionamento com o Pai. Oração expressa carinho, vontade
de aproximação, confiança e amor.
Introdução à Teologia e Seus Métodos
Infelizmente, por causa de abusos de muitos líderes religiosos, muitas
pessoas têm pensado que a oração é um instrumento de troca com
Deus ou que só devemos orar quando estamos com algum problema
ou precisando de algo. Mas Jesus nos mostrou que o verdadeiro sentido
da oração é de nos relacionarmos com Deus, é de buscarmos um
relacionamento sincero, pelo qual deixaremos tudo o que estiver em
nosso coração diante Dele.
Com toda a certeza, não será orando que os conceitos teológicos e a
construção teológica se farão, mas através da oração nos tornamos
mais sensíveis para Deus. A oração nos transforma e, por isso, ela é um
importante elemento da construção teológica.
O terceiro elemento que citamos nesse processo é a participação da
comunidade. Seja qual for o nome da comunidade que você frequenta,
independentemente se a comunidade for formalmente constituída como
uma igreja ou apenas propuser um encontro informal, é importante a
vida comunitária.
Na vida comunitária podemos aprender uns com os outros, podemos
exercer a piedade, a misericórdia, o acolhimento. Na comunidade
podemos conviver com pessoas diferentes de nós, conhecer suas
histórias, suas necessidades e compreender de que maneira podemos
contribuir para o bem e o crescimento em comum.
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A fé cristã, embora seja íntima, não é para ser vivida individualmente, própria igreja. Sensibilidade diante
mas coletivamente. Só podemos ser filhos quando reconhecemos o Pai da dor do próximo, caso contrário
e quando reconhecemos os irmãos e as irmãs. Qual sentido faria uma nossa Teologia será apenas
pessoa ter a habilidade de ler a realidade, ver os necessitados e não discurso e jamais será capaz de
ser capaz de fazer nada pelo bem comum? Se não colaboramos para o se comunicar com o íntimo das
cuidado e o crescimento de quem está do nosso lado, como poderemos pessoas.
transformar o país e a sociedade?
Também não podemos nos
Não podemos achar que a filiação religiosa é sinônimo de comunhão esquecer do Amor e do
plena nem que é garantia de nossa salvação por si mesma. Tampouco Serviço. A única vez que a
devemos achar que a comunhão é feita pelas hierarquias e formalidades Bíblia define quem é Deus está
religiosas, pelo contrário. Mas caminharmos juntos e compartilharmos em 1 Jo 4.8: Deus é Amor. Note
daquilo que somos é muito importante para a vivência teológica e cristã que o versículo não tem vírgula, não
(BARTH, 1996, p.76). tem complemento, ele simplesmente
diz que Deus é amor. O sentimento com o
Outro elemento fundamental para o fazer teológico é a sensibilidade
qual Deus decide se revelar à humanidade e no qual baseia sua relação
à vida concreta. Não podemos pensar que a Teologia é uma tarefa de
para conosco é o amor, de outra maneira a relação entre Deus e os seres
gabinete e distante das demandas concretas das vidas das pessoas.
humanos seria inviável.
Para que a Teologia faça sentido e seja algo capaz de comunicar vida
Deus, que é amor, nos convida a vivermos o amor para com Ele, para
e esperança aos seres humanos, é preciso que nós, teólogos, tenhamos
conosco e, principalmente, para com o próximo. Muitos querem inserir
sensibilidade à vida dos seres humanos. Sensibilidade aos que sofrem
condições ao amor de Deus ou querem usar da fala religiosa para
por causa da fome, da sede, da privação das necessidades básicas,
proclamar destruição, punição e peso sobre o pecador, mas o que a Bíblia
sensibilidade com os que são rotulados como pecadores de nosso tempo
nos mostra é um Deus que ama sem exceção e sem condições. Deus ama
e que em vez de encontrarem acolhimento, encontram julgamentos da
incondicionalmente e quer que sejamos porta-vozes desse amor.

Introdução à Teologia e Seus Métodos 8

Para que possamos viver o amor, precisamos servir. Poderíamos dizer
que o serviço é a prática do amor. Amor no texto bíblico não é apenas
um sentimento, mas uma postura, um mandamento divino. O Amor não
pode apenas ser expresso com a boca, por meio de palavras, mas deve
ser vivido e mostrado na prática, na concretude da vida.
O maior chamado de Deus para a igreja não é para a glória nem para
a grandeza mas para o serviço e, principalmente, pelos mais carentes
e vulneráveis. Karl Barth definiu a santidade como a separação para
o mundo, ou seja, o chamado divino para que a Igreja se coloque a
serviço da humanidade, da sociedade, sem esperar nada em troca, sem
estabelecer relações de ganho, mas motivada unicamente pelo amor e
o desejo de servir, pois quando fazemos é ao próprio Deus que fazemos
(BARTH, 2000, p.102).
Enfim, devemos entender que todos os elementos apontados nesse
texto são muito importantes para a vida, para a vivência da fé e para
o processo de construção teológica. Não podemos pensar que a tarefa
teológica se resume à intelectualidade, por mais indispensável que ela
seja, mas as ações devocionais são elementos bastante significativos.
Também não devemos pensar que a fé cristã e a tarefa teológica sejam
apenas devocionais, não no sentido de sermos passivos diante da vida
e da realidade. Não podemos ter apenas ações contemplativas diante
da concretude da vida humana em suas realidades mais distintas. Jesus
Introdução à Teologia e Seus Métodos
nos chamou a contemplarmos o Pai, a eventualmente nos trancarmos no
quarto para oração, mas também nos chamou ao discipulado, ao serviço,
ao compartilhamento.
A fé cristã requer de nós atitudes práticas, atitudes concretas de
engajamento, e isso naturalmente deve se expressar na nossa construção
teológica.
2. Elementos Científicos
Nossos estudos têm falado sobre a importância da espiritualidade na
construção teológica. Temos visto que a prática devocional e saudável,
quando feita com equilíbrio e em conexão com o que Jesus propôs, é um
fator relevante na própria formação teológica.
Por mais que saibamos da importância da devoção, não podemos achar
que tais práticas substituem o estudo e o preparo que precisamos ter, até
porque a formação teológica é ampla e variada e, para tal, precisamos
de dedicação e bastante empenho. Paulo, que foi um dos principais
discípulos de Jesus, sabia bem disso; quando preso, pede que levem para
ele os livros e pergaminhos (2 Tm 4.13).
O mesmo Paulo falando a Timóteo cita os líderes que se afadigavam no
ensino e na palavra (2 Tm 5.17). Naturalmente podemos supor que para
9
se afadigar essas pessoas se dedicavam com muito afinco, eram aplicados
e trabalhavam muito, a ponto de ficarem cansados. Isso nos mostra que a
espiritualidade não nos tira as dúvidas nem traz informações que devem
ser buscadas intelectualmente.
Fadiga: é mais do que cansaço, é uma exaustão. Fadiga é consequência
de muito esforço, trabalho e estresse. Quem se afadiga em algo, dedica-
se visceralmente àquela atividade.
A racionalidade é própria do ser humano, foi dada pelo próprio Deus
criador e é um dos elementos que caracterizam a imagem de Deus
em nós (RUBIO, 2011, p.211). Portanto, há sempre um prejuízo e um
afastamento do que Deus propôs quando desprezamos o intelecto.
Sempre que estudamos algum assunto, precisamos da nossa aplicação
e dedicação intelectual para assimilar os conteúdos, ampliar nossa
formação e, principalmente, pensar com a nossa própria cabeça, mas de
modo estruturado, e não aleatório.
Não podemos pensar que a Teologia se alcança por meio da revelação
de Deus, como se fosse passada por um sonho ou uma visão. Muitos
afirmam isso equivocadamente, no intuito de dizer o que querem sem
ser questionados, como se fosse uma palavra divina definitiva. Mas não
Introdução à Teologia e Seus Métodos
podemos nos esquecer: toda Teologia é exercício humano e, portanto,
não é definitiva nem é uma determinação divina. Teologia são reflexões
dos seres humanos sobre sua relação com Deus, as quais são feitas a
lápis, mas também contêm belezas e ensinamentos muito significativos.
Teologia não é revelada, teologia deve ser estudada, construída, ampliada
a cada dia e precisa estar sempre em conexão com a concretude da vida
e com os contextos nos quais ela se desenvolve.
Deus não se dedica a revelar informações ou opiniões sobre Ele. Deus
não revela doutrina ou dogmas que devem ser obedecidos. Deus não
revela manuais de teologia sistemática ou de qualquer outro assunto.
Deus revela a Sua própria pessoa, Deus revela a Si mesmo. É o que a
teologia chama de Autorrevelação de Deus (GIBELLINI, 2002, p.73).
Jesus nos chamou a um relacionamento, e não a um curso dogmático
sobre seus ensinamentos. Jesus nos chamou para caminharmos ao seu
lado, por isso a importância da concretude da vida e do contexto em
que estamos. A reflexão é sempre a posteriori. Deus está revelando a sua
própria pessoa para os seres humanos como ato de misericórdia e amor;
a Teologia é a nossa reflexão desse ato.
Devemos, então, entender que o exercício de construção teológica
requer dedicação intelectual de cada um de nós e, nesse sentido,
alguns caminhos são fundamentais: para ampliarmos nossa capacidade
intelectual e nosso senso crítico, precisamos ter o hábito fundamental
da Leitura.
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Essa é uma medida essencial e insubstituível. Precisamos ler os textos
sagrados, precisamos ler os textos teológicos. Quando falamos de ler
os textos teológicos, vale ressaltar que não são apenas aqueles com
os quais concordamos, mas também aqueles com os quais, a princípio,
discordamos. Nem sempre a questão é concordar ou discordar, mas sim
conhecer, aprender. Só podemos aprender quando somos confrontados,
quando somos desconstruídos; se isso acontecer é um excelente sinal
de que estamos aprendendo. Por outro lado, se passarmos três anos,
cinco anos, dez anos sem mudar em nada o que sabemos, significa que
estamos fechados para o aprendizado.
Quando falamos sobre a importância da leitura, também nos referimos
à leitura daquilo que não é inicialmente teológico ou bíblico. Ler ficção
científica, romances, literatura brasileira, poesia, etc. são formas de
ampliarmos nosso vocabulário, nossa reflexão, nosso conteúdo. Quem
tem o hábito de ler se torna um ser humano melhor. Sem a leitura não
temos condições de fazer ciências humanas, não temos condições de
fazer teologia.
Um segundo elemento muito importante na construção teológica é o
padrão científico, no caso da ciência humana. É claro que as ciências,
como são feitas por seres humanos, também não são absolutas e
definitivas, mas representam uma importante diretriz nos nossos
estudos.
Introdução à Teologia e Seus Métodos
Existem muitos estudos nas áreas de linguística, arqueologia,
história, construção literária, etc. Todos esses estudos apontam para
conhecimentos relevantes na pesquisa bíblica. Não podemos esquecer
que ainda que tenhamos a Bíblia como um livro de fé, que inspira nossas
vidas e corações, o texto bíblico ao qual temos acesso passou por um
longo processo de construção até chegar a nós. Devemos, também,
estudar a Bíblia como literatura e perceber suas construções ao longo
do tempo.
Muitas questões relacionadas à Bíblia, como autorias, formações, etc.,
chegaram até nós por meio da tradição religiosa, e não havia nenhuma
outra ferramenta que afirmasse tais dados além do ensinamento
oficial da religião. Com o avanço das pesquisas bíblicas, muitos desses
ensinamentos puderam ser questionados e investigados. Certamente,
você vai estudar isso mais a fundo nas disciplinas de Teologia Bíblica ao
longo do nosso curso.
Outro elemento fundamental para a construção teológica é a História.
Embora seja uma área independente das ciências humanas, a história
é fundamental para compreendermos a teologia. Como vimos no
exemplo anterior, a construção da Bíblia se deu na história, ou seja, a
Bíblia não nasceu pronta, não chegou até nós como vinda do céu, ela
foi sendo construída ao longo de muitos séculos e muitas disputas
político-eclesiásticas. Houve muitas discussões, livros que entraram no
cânon e outros que ficaram de fora, um processo longo até formar o que
conhecemos hoje. Depois disso vieram as análises ao longo do tempo.
11
Ao estudarmos a história da teologia, também podemos compreender
como os dogmas foram formados e os contextos históricos relacionados
a cada desenvolvimento, como a Cristologia. Nem sempre os cristãos
tiveram acesso ao mesmo conteúdo cristológico que temos hoje. No início
do cristianismo os seguidores de Jesus não sabiam defini-lo como Deus
ou pensavam nas distinções entre o Deus e o homem; eles simplesmente
criam em Jesus de Nazaré e seguiam os seus ensinamentos.
Com o passar do tempo, a teologia incipiente começou a ser influenciada
pelo pensamento platônico, e surgiu no meio cristão um segmento
chamado Gnosticismo. Essa corrente afirmava que Jesus era apenas
espiritual e não poderia ter um corpo físico, pois no pensamento
platônico o corpo é algo ruim. Assim surgiu a primeira necessidade de se
pensar na cristologia.
Ao longo dos séculos, outros desvios e interpretações equivocadas
sobre Jesus foram surgindo e a Igreja foi percebendo a necessidade de
formular tal ensinamento.
Para que tenhamos noção do que representou isso, só as definições
cristológicas levaram mais de 450 anos para serem formuladas.
Foram sendo construídas nos quatro grandes concílios: Niceia, em
325; Constantinopla, em 381; Éfeso em 431; e Calcedônia, em 451. Os
Concílios reuniram bispos de praticamente todo o mundo para discutir
questões relacionadas a Cristo (especificamente os quatro já citados).
Introdução à Teologia e Seus Métodos
Nas reuniões, condenavam ensinos considerados errados e elaboravam
credos e definições canônicas que deveriam ser seguidos pelos cristãos
do mundo inteiro.
Os Concílios, por um lado, tiveram uma importância muito grande na
construção teológica, mas, por outro, inauguraram a tentativa de doutrina
definitiva e inquestionável. Também desencadearam condenações
por heresias e, muitas vezes, os hereges eram definidos por questões
político-eclesiásticas e nem tanto pelo conteúdo que ensinavam.
Os Concílios também fizeram uso da filosofia, do pensamento e do idioma
grego. As resoluções conciliares, embora de grande importância para a
construção da teologia cristã, acabaram por se distanciar da linguagem
dos Evangelhos, e muitas de suas definições dependiam muito mais
do pensamento grego que dos dados dos Evangelhos (CASTILLO, 2015,
p.213).
A história do pensamento cristão está repleta de personagens que
deram profundas contribuições à formação teológica. É um erro quando,
hoje, alguém que estuda teologia simplesmente acha que pode ignorar
os dois mil anos de produção teológica para tentar fazer uma teologia
a partir do nada. Certamente quem não se dedica em dialogar com os
dois mil anos de produção teológica cometerá erros graves ou afirmará
ensinos sem ter sequer noção dos contextos em que tais definições
foram feitas.
12
Como podemos pensar em fazer teologia em nosso tempo sem levar Para que tenhamos um aproveitamento
em conta o que fizeram Paulo, Atanásio, Agostinho, Tomás de Aquino, satisfatório na área teológica e para
Martinho Lutero, João Calvino, Karl Barth e tantos outros? Com toda que sejamos teólogos e teólogas
certeza precisamos dialogar com a história da teologia cristã e, a partir com conteúdo e boa formação,
desse diálogo, propormos uma construção para o nosso tempo, para o precisamos ser leitores
nosso contexto. dedicados, precisamos ser
amantes da intelectualidade e
É fundamental conhecer a história da teologia e do cristianismo para
do saber, precisamos estudar a
que possamos dialogar com o conteúdo já refletido e também para
história e a própria Teologia.
compreendermos os desdobramentos dos fatos até chegarmos aonde
estamos na história. Para estudarmos Teologia,
precisaremos nos debruçar sobre os
Outro fator que devemos considerar é que a Teologia tem suas regras
conteúdos que estarão diante de nós, e
específicas de interpretação. Por exemplo, a Bíblia como literatura possui
devemos fazer isso com dedicação e zelo,
vários tipos de escritos. Ela é composta de história, poesia, literatura
suspendendo nosso juízo inicial e nos abrindo ao aprendizado.
profética, literatura apocalíptica, parábolas, Evangelhos, etc. Cada um
O trabalho teológico em específico, assim como o da pesquisa em
desses estilos apresenta regras específicas de interpretação e análise.
geral, se compara ao trabalho de um garimpeiro, que limpa, seleciona
Não cabem as mesmas regras a estilos diferentes e, quando percebemos
o material, se dedica zelosamente e analisa com muito critério o que
isso, temos um aprofundamento muito maior dos conteúdos a serem
encontra.
estudados.
O garimpeiro precisa ir atrás do conteúdo desejado; não pode ficar
Muitos podem pensar que, por se tratar de elementos de fé, afirmar que
esperando as pedras preciosas chegarem até ele. O teólogo e o
ter fé em determinadas afirmações, tradições ou compreensões já é o
pesquisador também precisam buscar, escavar, até encontrar. Se você,
bastante, mas não é bem assim. Enquanto ciência, a Teologia tem suas
como teólogo, esperar que as coisas simplesmente apareçam na sua
regras e seus padrões, que devem ser compreendidos e aprofundados.
frente, provavelmente não vai conseguir ir muito além.

Introdução à Teologia e Seus Métodos 13

Não espere um PDF, vá atrás de livros. Não espere que o professor te dê
tudo pronto, vá em busca do conhecimento, procure, vasculhe, escave Referências
até encontrar. O trabalho do garimpeiro vale o tanto quanto ele está BARTH, K. Artigos selecionados. São Leopoldo: Sinodal, 2000.
disposto a buscar, e isso também se aplica ao teólogo.
BARTH, K. Introdução à teologia evangélica. São Leopoldo: Sinodal, 1996.
Nesse capítulo, refletimos sobre duas realidades muito importantes: o
devocional e a intelectualidade na produção teológica. CASTILLO, J. M. Jesus, a humanização de Deus. Petrópolis: Vozes, 2015.

Para alguns, parecem duas áreas diferentes. Outros entendem que buscar GIBELLINI, R. A teologia do século XX. São Paulo: Loyola, 2002.
uma dessas realidades anula a outra, mas ambas se complementam e RUBIO, A. G. Unidade na pluralidade. São Paulo: Paulinas, 2011.
são fundamentais.
TILLICH, P. Textos selecionados. São Paulo: Fonte, 2005.
O trabalho teológico precisa se dedicar em se
relacionar com Deus, em orar, em praticar a
piedade, a bondade, o amor e o serviço,
mas também precisa estar disposto a
ler, refletir, pesquisar, pensar.

É necessária uma construção teológica

dialogal, intelectual e espiritual. São
elementos que se completam, que se
aprofundam. Uma teologia construída
na sua integralidade é capaz de trazer
esperança e vida às relações e aos corações.

Introdução à Teologia e Seus Métodos 14

Introdução à Teologia e
Seus Métodos
A Teologia na Pós-Modernidade
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A Teologia na Pós-Modernidade
Para Início de Conversa... ................................................................................ 4
Objetivos ..................................................................................................... 4
1. Elementos Culturais da Pós-Modernidade ........................................... 5
2. A Teologia Periférica .................................................................................... 9
Referências ..................................................................................................... 13

Introdução à Teologia e Seus Métodos 3