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Inteligência Limítrofe
Inteligência Limítrofe
ARTIGO et al.
ORIGINAL
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Avaliação da memória em crianças e adolescentes com capacidade intelectual limítrofe e deficiência intelectual leve
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Pereira AM et al.
que as tarefas desse tipo de memória necessitam dizagem, porém há facilidade na adaptação;
de processos de execução variados, intimamente quando adultos, podem conseguir trabalhar e
associados à inteligência fluida8. manter relacionamentos sociais9,12.
A titulo de esclarecimento, entende-se por in Indivíduos classificados com inteligência
teligência a capacidade mental geral, que inclui limítrofe apresentam capacidade suficiente para,
raciocínio, planejamento, resolução de proble- com apoio, alcançar bom grau de autonomia nas
mas, pensamento abstrato, compreensão de atividades de vida diária. Quanto às característi-
ideias complexas e aprendizagem. Inteligência cas dessa população, destacam-se: ausência de
fluida e cristalizada são subtipos desse conceito traços físicos aparentes; defasagem entre a idade
mais amplo. Enquanto a primeira se refere às cronológica e a idade mental; carecem de inicia-
operações mentais utilizadas pelo indivíduo em tiva; tem dificuldade para generalizar mecanis-
tarefas novas que não podem ser executadas de mos racionais que lhes permitam desenvolver-se
forma automática, a segunda refere-se à habili- com autonomia em situações cotidianas; dificul-
dade de aplicar definições, métodos e procedi- dade na tomada de decisões e na resolução de
mentos aprendidos previamente, para lidar com conflitos; dificuldade para adaptar-se com êxito
situações-problema8-10. em situações difíceis; baixo desempenho escolar;
Um dos modos de medir a inteligência é a dificuldade para estabelecer e manter relações
quantificação, o que pode ser realizado com interpessoais, bem como em organizar o tempo
o uso de instrumentos psicológicos variados. livre; baixa autoestima e baixa tolerância ao fra
Dentre estes instrumentos, destaca-se a Escala casso e à frustração13.
Wechsler de Inteligência para crianças (WISC- Em se tratando da relação entre aprendiza
IV), que utiliza a seguinte classificação em ter- gem e memória, chama-se a atenção para a
mos de Quociente de Inteligência (QI): muito memória operacional, pois há relatos de que
superior (QI de 130 ou mais), superior (QI de dificuldade nessa habilidade pode impactar de
120 a 129), médio superior (QI de 110 a 119), forma negativa o aprendizado.
médio (QI de 90 a 109), médio inferior (QI de 80 No caso de crianças e adolescentes com de-
a 89), limítrofe (QI de 70 a 79) e intelectualmente ficiência intelectual, estudos referem que estes
deficiente (QI abaixo de 69)11. apresentam estrutura de memória operacional
No presente estudo, atentamo-nos para defi- semelhante à de indivíduos com desenvolvimen-
ciência intelectual e para inteligência limítrofe. to cognitivo dentro do esperado. Considera-se
A deficiência intelectual é definida pela que, possivelmente isto ocorre porque tais sujei-
American Association on Mental Retardation tos se apoiam em conhecimentos armazenados
(AAMR) como incapacidade que se caracteriza na memória de longo prazo, ou nas habilidades
por limitações consideráveis principalmente no executivas centrais, o que maximiza o seu de-
funcionamento intelectual e também na capaci- sempenho nessa habilidade. Assim, quando se
dade adaptativa, competências práticas, sociais compara a memória operacional de deficientes
e emocionais. Desenvolve-se antes dos 18 anos e intelectuais com aqueles que têm desenvolvi-
resulta em prejuízos no funcionamento social do mento cognitivo dentro do esperado, pode não
indivíduo. Aprendizagem, raciocínio e resolução haver diferença significativa entre ambos14.
de problemas são capacidades cognitivas que Há estudos, no entanto, que sugerem o con-
também são prejudicadas nesse quadro9. trário, ou seja, que há diferenças significativas
A deficiência intelectual subdivide-se em entre os dois grupos mencionados, no que diz
leve (QI na faixa de 50 a 69), moderada (QI na respeito a vários elementos da memória opera-
faixa de 35 a 49), grave (QI na faixa de 20 a 34) cional. Essa diferença estaria relacionada, prin-
e profunda (QI abaixo de 20). Na deficiência cipalmente, ao comprometimento na alça fono-
intelectual leve, ocorrem dificuldades na apren- lógica, região responsável pelo armazenamento
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Tabela 1 – Comparação do desempenho dos grupos nos testes de memória operacional da WISC-IV –
dígitos ordem inversa (DOI) e sequência de números e letras (SNL).
“mean rank” “mean rank”
Grupo Valor de “p” (*) Valor de “p” (*)
DOI SNL
GDI 8,00 8,27
GC 18,71 0,000 18,53 0,000
GL 7,25 9,35
GC 17,97 0,019 16,74 0,000
GDI 10,41 9,77
GL 11,65 0,336 12,35 0,636
Legenda: (*)Teste de Mann-Whitney, GDI = Deficiente Intelectual, GL = Limítrofe, GC = Controle.
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Tabela 3 – Comparação do desempenho dos grupos no subteste dígitos ordem direta (DOD)
da WISC-IV e Teste Blocos de Corsi (TBC) ordem direta.
“mean rank” “mean rank” Valor de “p”
Grupo Valor de “p” (*)
DOD TBC ordem direta (*)
GDI 7,55 0,000 11,64 0,134
GC 19,00 16,35
GL 7,40 0,001 9,40 0,020
GC 17,88 16,71
GDI 10,18 0,507 12,14 0,375
GL 11,90 9,75
Legenda: (*) Teste de Mann-Whitney, GDI = Deficiente Intelectual, GL = Limítrofe, GC = Controle.
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tiveram pior desempenho (estatisticamente sig também apresentam prejuízo na memória opera-
nificativo) que o controle (GC) nos testes que cional, quando comparado a controle, tanto em
avaliam processamento de informações auditi- relação ao domínio verbal, quanto visuoespacial.
vas (avaliado por meio dos subtestes de dígitos Quanto aos deficientes intelectuais, sugere-se
ordem inversa e sequência de números e letras que, quanto maior o prejuízo cognitivo, menor a
da WISC-IV). A hipótese que se levanta é que sua capacidade de memória operacional, o que
tal fato está relacionado à menor capacidade de justificaria o desempenho inferior desse grupo
armazenamento da alça fonológica, um dos com- em tais testes16,18.
ponentes da memória operacional responsável Vale ressaltar que, no nosso estudo, os defi-
pelo armazenamento de informações auditivas. cientes intelectuais tiveram pior desempenho
A literatura a respeito dessa temática é con que os limítrofes, no entanto, a comparação entre
troversa, pois trazem dados divergentes. En ambos não foi estatisticamente significativa.
contram-se dados que sugerem não haver dife- No que se refere à memória de curto prazo,
renças estruturais na memória operacional de verificou-se que, nas tarefas que envolvem in-
deficientes intelectuais quando comparados a formações auditivas, o desempenho dos nossos
grupo controle, pelo menos no que diz respeito grupos experimentais (GDI e GL) foi significa-
à alça fonológica, esboço visuoespacial e exe- tivamente inferior ao grupo controle.
cutivo central14. Por outro lado, outros estudos Uma possível explicação para esse fato é en
demonstram o contrário. contrada na literatura, quando menciona que a
Alloway18, por exemplo, avaliou e comparou memória operacional seria o melhor preditor de
o desempenho da memória operacional de defi habilidades intelectuais para tarefas de memó-
cientes intelectuais (grau leve), limítrofes e grupo ria de curto prazo. Logo, prejuízo na memória
sem comprometimento cognitivo. Os dados ob- operacional resultaria em prejuízos também nas
tidos demonstraram déficit específico na capa- tarefas de memória de curto prazo, em relação
cidade de armazenamento da alça fonológica à capacidade de armazenamento das informa
em crianças com deficiência intelectual leve. ções auditivas. Há relato também de que o pre
Entretanto, diferente do nosso estudo, não foi juízo dos deficientes intelectuais não estaria
encontrada diferença significativa no grupo de relacionado somente à redução na capacidade
crianças com inteligência limítrofe. de armazenamento, mas também à lentidão no
Brankaer et al.16 também investigaram o de- processamento da informação7,19.
sempenho na memória operacional de crianças Interessante mencionar que neste estudo
deficientes intelectuais e grupo controle e en- uma situação diferente aconteceu nas tarefas
contraram alteração não só no processamento que avaliam aprendizagem verbal, que envolve
da alça fonológica, mas também em outros dois informações auditivas com repetição. Embora o
componentes da memória operacional, ou seja, grupo de deficientes intelectuais tenha obtido
no esboço visuoespacial e executivo central. resultados inferiores, a diferença não foi esta-
Sugere-se, ainda, que tais alterações seriam pro tisticamente significativa. A hipótese que se
porcionais ao grau de deficiência intelectual. levanta, a partir de dados fornecidos pela litera-
Nesse estudo depreendeu-se que os sujeitos tura19, é que tais sujeitos teriam capacidade para
dos grupos experimentais tiveram prejuízo no aprender, entretanto, diferentemente daqueles
esboço visuoespacial, uma vez que foram encon- que não possuem comprometimento cognitivo,
tradas alterações no processamento de infor- estes necessitariam de mais tempo e do uso de
mações visuoespaciais, como confirmado por repetições do conteúdo para o favorecimento da
outros autores15,16. memorização. Quanto maior o comprometimen-
No que se refere ao grau de comprometimen- to, maior seria a necessidade de repetições. Isso
to cognitivo, há relato de que sujeitos limítrofes demonstra que estratégias de ensino envolvendo
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deficiência intelectual apresentam pior desem- e memória de longo prazo episódica e semântica.
penho nas habilidades de memória operacional Quando comparados aos deficientes intelectuais,
auditiva e visuoespacial, memória de curto prazo os limítrofes apresentaram diferença significati-
auditiva e na memória de longo prazo semântica, va apenas na memória semântica, com melhor
quando comparados a crianças com desempenho desempenho que os deficientes intelectuais de
cognitivo global preservado. Na memória de grau leve. Com isso, sugere-se que discussões
longo prazo episódica, no entanto, o desempe- amplas sejam realizadas no contexto escolar,
nho, apesar de inferior, não foi estatisticamente principalmente, no sentido de se avaliar a ne-
significativo; em relação à aprendizagem verbal, cessidade de crianças com inteligência limítrofe
este dado pode ser útil, pois aponta o benefício receberem na escola o mesmo suporte educacio-
do uso dessa habilidade no desenvolvimento nal oferecido às crianças com deficiência inte-
de métodos de aprendizagem na população de lectual. Além disso, sugere-se que seja realizada
deficientes intelectuais. a análise pormenorizada dos diferentes tipos de
Finalizando, ressalta-se que o grupo de su- memória das crianças que apresentem qualquer
jeitos com inteligência limítrofe teve desempe- nível de comprometimento cognitivo (limítrofe e
nho significativamente inferior ao controle na deficiente intelectual), a fim de que sejam pla
memória operacional auditiva e visuoespacial, nejadas estratégias adequadas de ensino e de
memória de curto prazo auditiva e visuoespacial intervenção.
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SUMMARY
Memory evaluation in children and adolescents with
limitrophe intellectual capacity and mild intellectual disability
This study aimed to evaluate and compare the memory of children and
adolescents classified as intellectually disabled (mild degree), limitrophe
intelligence and with no intellectual impairment. Particularly the operational
memory, the short-term immediate memory and long-term memory (episodic
and semantic) were subjected to analysis in the three aforementioned groups.
Thirty-eight subjects participated in this study divided in three groups, all of
which were composed by children with intelligence quotient of normality:
intellectually disabled of mild (GDI), limitrophe (GL) and control degree
(GC). In order to evaluate the different types of memory the Rey Complex
Figure, the Rey Auditory-Verbal Learning Test (RAVLT), the Corsi Block
Test (TBC) and the WISC-IV digits, sequence of numbers and letters, and
vocabulary subtests were performed. The obtained data shows that when
compared to GC, the GDI presented meaningful loss in the operational
and in the long-term semantic memory, but not in the episodic memory.
With tests that use information repetition, children with GDI had better
performance. Such data is important because refers to the idea that tea
ching strategies based on this approach may favor these children learning.
As for the GL, a meaningful loss in all the types of evaluated memory was
noticed, when compared to the GC. The comparison between GL and GDI
presented that the firsts had better performance (statistically meaningful)
only in the semantic memory. Accordingly, the debate regarding the need
of children with limitrophe intelligence receiving at school the same
specialized educational support offered to children intellectually disabled
is considered important.
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Avaliação da memória em crianças e adolescentes com capacidade intelectual limítrofe e deficiência intelectual leve
8. Rudebeck SR, Bor D, Ormond A, O’Reilly 16. Brankaer C, Ghesquière P, Smedt BD. The
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