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VIANA, João Paulo Saraiva Leão. A cláusula de barreira na Alemanha.

Estudos Eleitorais,
Brasília, DF, v. 2, n. 3, p. 79-98, maio/ago. 2006.
(Gabi, a maioria do fichamento já está escrito com formato que te permite copiar e colar
no documento do trabalho sem maiores problemas. As citações diretas estão
assinaladas).

República Federal da Alemanha se divide em 16 unidades federativas, com um sistema de


governo parlamentarista, com um presidente, chamado de bunderpräsidente, eleito a partir da
Assembleia Nacional, composta de deputados federais, delegados nomeados pelas
Assembleias Legislativas e personalidades eméritas, em Colegiado criado somente com essa
finalidade. O mandato do presidente tem duração de cinco anos, com reeleição permitida.
Além do presidente federal, há o chanceler nacional, chamado de Bundeskanzler, entendido
como o chefe de governo e que junto com os ministros federais, compõem o gabinete
presidencial. Enquanto o presidente é eleito pela Assembleia, o chanceler é nomeado pelo
Parlamento após a indicação do Presidente (p. 79).

O Parlamento alemão, tem a mesma diretriz filosófica que o brasileiro, é a representação do


povo. É responsável pela legislação, pela eleição do chanceler federal e pelo controle do
governo. Há um número de cadeiras flexível, sendo, ainda assim, divididas em dois na
tradução de votos em cadeiras: as que são compostas pelo sistema majoritário e as que são
compostas pelo sistema proporcional (a partir de listas partidárias). A base é 598 assentos,
mas, é possível ter variação (p. 80)1. Nohlen, cientista político alemão, define o sistema
alemão como 'proporcional personalizado”

O eleitor alemão tem dois votos à sua disposição: um no candidato, eleito a partir do sistema
majoritário - em seu distrito eleitoral e o segundo voto é dado na lista partidária estadual. Na
primeira forma de eleição, em candidatos majoritários distritais, é permitida a eleição de
candidaturas avulsas, isto é, sem a filiação em algum partido. (p. 80).

Há outras instituições relacionadas ao processo eleitoral que são apresentadas por Viana
(2006). O Conselho Federal Alemão, chamado de Bundesrat, é o órgão, eleito por voto
1 Citação direta: “A composição dos assentos no Parlamento alemão é definida pelo percentual de votos dado ao
partido em cada estado. No caso de um partido conseguir mais mandatos diretos (primeiro voto), nos distritos
eleitorais, do que lhe caberia pelo percentual obtido na lista partidária estadual, todos os parlamentares eleitos
pelo primeiro voto mantêm seus mandatos. Esses são os chamados “mandatos excedentes”. Nas eleições de
2002, em vez de 598 foram eleitos 603 deputados” (p. 80).
popular, que tem como capacidade a incidência em temas legislativos. Caso exista
discordância entre as decisões do Conselho e do Parlamento, uma comissão mediadora entre
as duas casas é criada como forma de buscar um consenso (p. 81).

Citação direta: “Há também o Tribunal Constitucional Federal (Bundesverfassungsgerichts)


é o órgão responsável por zelar pelo respeito à Lei Fundamental. É composto de duas salas de
oito juízes cada uma, com a metade indicada pelo Parlamento Federal e a outra metade pelo
Conselho Federal. É o Tribunal quem decide os conflitos entre a Federação e os estados
federados ou somente entre esses últimos. O Tribunal analisa as leis federais e estaduais,
verificando suas compatibilidades com a Lei Fundamental. Se for declarada inconstitucional,
a lei não pode mais ser aplicada. No entanto, ele só intervém quando invocado por
determinados órgãos, como o governo federal, o Parlamento Federal (com um mínimo de 2/3
dos deputados) e os tribunais de justiça. Qualquer cidadão tem o direito de apresentar um
recurso de inconstitucionalidade perante o Tribunal Constitucional Federal, quando considerar
que foi lesado pelo Estado em seus direitos fundamentais. Contudo, deve se dirigir
primeiramente aos tribunais competentes; não obtendo êxito, pode então apelar a este.
Somente esse órgão pode verificar se um partido político ameaça a ordem fundamental liberal
e democrática, considerando-o assim inconstitucional. Como foram os casos de dissolução do
Partido Socialista do Reich em 1952, que representava a direita extremista do pós-guerra, e,
em 1956, do Partido Comunista da Alemanha (KPD). Observa-se, assim, a importância do
Tribunal Constitucional Federal como órgão fundamental para a estabilização da Ordem
Constitucional vigente” (p. 81).

O caso da cláusula de barreira alemã.

Assim como no Brasil (cuja implementação vem de inspiração alemã), há uma cláusula de
barreira de 5% (chamada de fünfprozentklausel), também chamada de cláusula dos três
mandatos diretos ou cláusula de barreira (sperrklausel). Este, se constitui como um
mecanismo, introduzido na partir da Lei Eleitoral de 1953, que determina que somente tem
direito a representação no Parlamento alemão (Bundestag), os partidos que alcançaram, ao
menos, 5% dos votos nas listas partidárias ou nível nacional ou três parlamentares eleitos na
forma majoritária (p 81-82).
Caso o partido não obtenha o percentual ou o número de mandatórias no majoritário, este não
tem direito a participação na distribuição de cadeiras, tendo os votos obtidos excluídos do
cálculo para a distribuição de cadeiras para o Parlamento. A primeira vez que esse mecanismo
barrou a entrada de um partido foi nas eleições de 2002, onde o PDS conseguiu eleger apenas
dois parlamentares pelo sistema majoritário e não chegou nos 5% de votos no segundo voto.
Ainda que exista a permissibilidade da cláusula para os dois sistemas de votação, somente os
partidos que ultrapassam a cláusula pela votação na lista partidária têm o status de bancada
partidária. Os partidos que são eleitos apenas pelo sistema majoritário ganham o status de
grupo, o que os permite menos benefícios estatais do que as bancadas partidárias, porém,
ainda assim, mais do que os eleitos por candidaturas avulsas (p. 82).

No caso das eleições estaduais, chamadas de Landtag, ou seja, as assembleias estaduais, a


cláusula de barreira também tem validade. A utilização da cláusula de barreira é defendida
como uma forma de impossibilitar a existência de um alto número de partidos, uma
experiência que os alemães viveram durante a República de Weimar.

A república de Weimar e a questão da fragmentação político-partidária

A República de Weimar é um resultado do fim da primeira guerra e da derrota do Império


Alemão nesta.

Citação direta: “A composição da República weimariana, no início, foi feita, em maioria,


por partidos com ideais republicanos: o Partido Social Democrata, o Partido do Centro e o
Partido Democrata Alemão. O social-democrata Friedrich Ebert foi eleito o primeiro
presidente de Weimar. Nesse período, os sociaisdemocratas já estavam distantes das idéias
revolucionárias. O direito à propriedade privada dos meios de produção foi mantido, as
tentativas de levantes revolucionários socialistas foram barradas por força militar. Os
funcionários públicos e oficiais do Exército imperial continuaram exercendo suas funções
normalmente na República de Weimar, representando assim o espírito antidemocrático
existente nas instituições. Weimar representou a primeira tentativa alemã de implementação
de um sistema democrático. Com a Lei Eleitoral de 27 de abril de 1920, foi concedido o
direito a voto às mulheres, e a idade mínima exigida diminuiu de 25 para 20 anos. A
democracia contava com instrumentos de participação popular como plebiscitos. Entrou em
vigor também a representação proporcional. O sistema de governo adotado foi o
parlamentarista, porém com certas peculiaridades. O presidente era eleito pelo povo para um
mandato de sete anos, no entanto sua função não se limitava à de chefe de Estado. Era ele
quem nomeava o chanceler e os ministros e possuía poderes para dissolver o Parlamento. Um
caso raro de junção dos sistemas parlamentarista e presidencialista de governo. “Hoje em dia,
alguns autores até mesmo utilizam o termo ‘semipresidencialismo’ para definir a
característica particular da Constituição de Weimar. A esquerda também estava dividida. O
Partido Comunista e os setores nacionalistas autoritários apresentavam oposição ao sistema.
No decorrer dos anos 20, a crise econômica e o alto índice de desemprego contribuíram ainda
mais para o ceticismo anti-republicano. “A destruição do regime republicanoparlamentar era
uma das metas políticas de amplas seções da classe média alemã desde os primeiros anos do
pós-guerra imediato”.3 Com a adoção da representação proporcional, diminuíram-se
drasticamente os distritos eleitorais, que, até 1918, eram 397, passando para 35 em Weimar”.
(p. 83).

Com a tentativa falida de implementação de um sistema democrático a partir da República de


Weimar, vemos, de 1949 a 1956, também a existência de uma cláusula de barreira. Esta foi
debatida e modificada três vezes durante a temporalidade citada. Enquanto o SPD e os
partidos pequenos se pronunciavam contra, a medida tinha o apoio dos deputados da coalizão
governamental, liderados pela CDU/CSU (p. 86).

Citação direta: “Apesar de derrotas nas primeiras e segundas leituras (na República Federal
da Alemanha, uma lei, para ser aprovada, precisa passar por três leituras, sendo a terceira e
última definitiva), os opositores da cláusula de barreira conseguiram, na última leitura, em 9
de fevereiro de 1949, aprovar, por onze votos a dez,requerimento alterando a cláusula de
exclusão. A comissão dos cinco e a comissão eleitoral usavam o argumento de que a
exigência de uma barreira tiraria a liberdade do voto. Conforme Eckhard Jesse, a cláusula de
barreira não representava importância para o Conselho Parlamentar. No entanto, depois do
pedido de comentário dos aliados ingleses, franceses e americanos, os primeiros-ministros
alemães (o cargo de primeiro-ministro na Alemanha equivale ao de governador de estado no
Brasil) elaboraram a própria proposta de cláusula de barreira. O que representava motivo de
discussão, agora, era se ela deveria ser aplicada em nível federal ou estadual (p. 83-84)”.
Citação direta: “Para as eleições federais de 1953, três mudanças importantes foram
determinadas para o sistema eleitoral alemão. A divisão dos assentos no Parlamento, que, em
1949, era de 60% pelo voto majoritário e 40% pela lista partidária, agora seria igualada, com
50% para cada um. Os eleitores agora votariam duas vezes. A cláusula de barreira foi a outra
mudança. O objetivo principal do governo era ampliar a cláusula de 5% para todo o território
alemão. Já a comissão eleitoral era favorável a um percentual de 3%. ” (p. 87-88).

A medida de 5% foi apresentada em nome do Governo por deputados do CDU, que tinha ao
seu lado o partido FDP, que antes havia se pronunciado de forma contrária. Em 1956,
novamente a cláusula foi modificada, adotando os percentuais hoje considerados (p. 89). Na
primeira leitura, a proposta foi aprovada pelos deputados do CDU/CSU, FDP e DP, contra o
SPD e GB/GHE. Com a aprovação destes partidos, essa proposta foi aprovada, sendo a que
vigora até hoje no sistema alemão (p. 90).

O mecanismo alterou profundamente o número de partidos presentes no Parlamento Alemão.


Entre 1949 e 2002, apenas 4 partidos estiveram presentes em todas as legislaturas: CDU/CSU,
SPD e FDP (p. 93). Para o autor, a cláusula de barreira foi efetiva no sistema político do país,
sendo fundamental para a estabilidade política do Estado alemão. Há uma restrição
institucional que é percebida no comportamento do eleitorado, onde é observado um efeito
psicológico, nos termos de Duverger. Embora assim que implementado fosse observado um
grande número de votos desperdiçados, no decorrer dos pleitos, houve uma migração de votos
para os partidos que fossem capazes de ultrapassar a cláusula de barreira (p. 97).

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