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Supervisor:
Declaro por minha honra que este trabalho é da minha autoria e resulta da minha investigação
para a obtenção do grau de Licenciatura em Direito Instituto Superior de Comunicação e
Imagem (ISCIM),estando incluídas no texto e na referência bibliografia e as fontes recorridas.
Esta é a primeira vez que o submeto para a obtenção de um grau académico numa instituição de
ensino.
O Declarante
___________________
O Supervisor
___________________________________
Aprovação do Júri
Presidente:___________________________________________
Orientador:___________________________________________
Oponente:_________________________________________________
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho as pessoas que mais amo, por tudo que fizeram e tem feito por mim até aos
dias de hoje, pela paciência, amor e carinho que tem me atribuído.
AGRADECIMENTOS
Com a entrega deste relatório chega ao fim mais uma etapa importante da minha vida, no qual
pude adquirir muito conhecimento e criar grandes laços de amizade.
Dai que, é importante dar os meus agradecimentos a todos que, directa ou indirectamente,
contribuíram para realização deste relatório, Deus pela vida e protecção, ao meu marido Noé
Nhancale pelo apoio incondicional, ao meu filho Noé Nhancale Júnior, à minha irmã Amina
Lopes, ao meu irmão na fé Edson Chituvane e minha amiga Halima Ánasse pelo seu inestimável
apoio para a conclusão deste curso.
RESUMO
A presente pesquisa tem por objectivo analisar a eficácia das estratégias policiais de prevenção e combate
as uniões prematuras em Moçambique. O Estudo foi realizado no Departamento de Atendimento a
Família e Menores Vítimas de Violência-Comando Geral da Polícia da República de Moçambique
(DAFMVV-CG PRM), na Cidade de Maputo, de 2019 a 2021. Nesta pesquisa recorreu-se ao método
qualitativo, auxiliado pelo quantitativo, e a recolha de dados foi feita com auxílio às técnicas de
observação, pesquisa documental, revisão bibliográfica e entrevista. Para além da recolha de dados
estatísticos criminais sobre as uniões prematuras, o guião de entrevista foi o instrumento aplicado na
recolha de dados, numa amostra constituída por quinze (15) elementos, dentre membros da PRM afectos
ao DAFMVV-CG PRM na Cidade de Maputo, seleccionados de forma intencional. Através do trabalho
de campo, foi possível perceber que durante o período em estudo registou-se um número cumulativo de
760 casos de uniões prematuras em Moçambique, havendo assim uma evolução progressiva de casos
criminais, tendo a destacar como locais de maior incidência as Províncias da Zambézia, Niassa e Cabo
Delgado em 2019; e as Províncias de Tete, Manica e Gaza em 2020 e 2021. As estratégias policiais de
prevenção e combate às uniões prematuras consistem na realização de acções de sensibilização da
população sobre os direitos da criança, realização de troca de experiência da Polícia a nível da SADC,
bem como a realização de capacitação contínua dos agentes da Polícia afectos aos Gabinetes de
Atendimento em matérias de procedimentos de atendimento às vítimas de uniões prematuras. Contudo, a
Polícia continua enfrentado desafios dos quais se tem a destacar a questão do rácio da polícia e o
atendimento. O número dos gabinetes existente a nível nacional ainda não corresponde ao rácio da
população, o que significa que existe a necessidade de construção de gabinetes de atendimento com vista
a aproximar cada vez mais os serviços policiais às comunidades.
The present research aims to analyze the effectiveness of police strategies to prevent and combat
premature unions in Mozambique. The study was carried out at the Department of Assistance to Family
and Minors Victims of Violence-General Command of the Police of the Republic of Mozambique
(DAFMVV-CG PRM), in Maputo City, from 2019 to 2021. In this research, the qualitative method was
used, aided by the quantitative, and data collection was carried out with the aid of observation techniques,
document research, literature review and interview. In addition to collecting criminal statistical data on
premature unions, the interview guide was the instrument applied in data collection, in a sample
consisting of fifteen (15) elements, among PRM members assigned to the DAFMVV-CG PRM in Maputo
City , selected intentionally. Through fieldwork, it was possible to perceive that during the period under
study there was a cumulative number of 760 cases of premature unions in Mozambique, thus having a
progressive evolution of criminal cases, with the highest incidence being the Provinces of Zambézia,
Niassa and Cabo Delgado in 2019; and the Provinces of Tete, Manica and Gaza in 2020 and 2021. The
police strategies to prevent and combat premature unions consist of carrying out actions to raise
awareness of the population on the rights of the child, carrying out an exchange of experience between
the Police at SADC level, as well as ongoing training of Police officers assigned to the “Gabinetes de
Atendimento” in matters relating to procedures for assisting victims of premature unions. However, the
Police continue to face challenges, among which the issue of the police ratio and attendance is
highlighted. The number of offices at the national level still does not correspond to the population ratio,
which means that there is a need to build service offices in order to bring the police services closer to the
communities.
1. INTRODUÇÃO................................................................................................................1
1.1. Descrição do problema..................................................................................................2
1.2. Justificativa....................................................................................................................3
1.3. Objectivos......................................................................................................................4
1.3.1. Geral:.........................................................................................................................4
1.3.2. Objectivos específicos...............................................................................................4
1.4. Questões de pesquisa.....................................................................................................4
1.5. Delimitação...................................................................................................................4
1.5.1. Temática....................................................................................................................4
1.5.2. Espacial......................................................................................................................4
1.5.3. Temporal....................................................................................................................4
2. REVISÃO DE LITERATURA.........................................................................................5
CAPÍTULO III: METODOLOGIA.........................................................................................6
3.1. Método de Abordagem..................................................................................................6
3.2. População alvo e amostragem.......................................................................................8
3.2.1. População alvo...........................................................................................................8
3.2.2. Amostragem...............................................................................................................8
3.3. Técnicas e instrumentos de recolha de dados................................................................9
3.3.1. Técnicas de recolha de dados....................................................................................9
3.3.1.1. Entrevista...............................................................................................................9
3.3.1.2. Pesquisa Bibliográfica..........................................................................................10
3.3.1.3. Pesquisa documental............................................................................................10
3.3.2. Instrumentos de recolha de dados............................................................................10
3.3.2.1. Diário de pesquisa................................................................................................10
3.3.2.2. Inquérito por Questionário...................................................................................10
3.3.2.3. Guião de entrevista...............................................................................................11
4. Cronograma de actividades.............................................................................................11
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................13
1. Introdução
O objectivo deste trabalho é contribuir não só para a prevenção e irradicação das uniões
prematuras de crianças e raparigas, mas ainda para a advocacia pelos respeito dos direitos deste
grupos alvo, previstos na Lei mãe, a Constituição da República de Moçambique e nas
convenções internacionais. Porém, apesar de esta prática estar enraizada no nosso pais, a
literatura sobre a matéria é escassa, dai a necessidade de perceber como é que o fenómeno se
desenrola, os f actores que contribuem para as tais práticas e como é que a polícia de
moçambique que tem que zelar pela segurança e tranquilidade pública tem estado a lidar com a
matéria.
Para o efeito, analisaremos a actuação da PRM no combate a este flagelo, buscando entender o
enquadramento das normas internas da corporação em comparação com os instrumentos
internacionais de que Moçambique é parte, visando perceber o estágio em que Moçambique se
encontra na protecção dos direitos da rapariga, onde será explorada a legislação relativa a
matéria, casos da Lei de Prevenção e Combate as Uniões Prematuras, a Lei da Família, Lei de
Promoção e Protecção dos Direitos da Criança, O Código Penal Moçambicano, O Protocolo à
Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos Relativo aos Direitos da Mulher em África,
A Carta Africana dos Direitos e Bem-Estar da Criança, Lei da Família e a Constituição da
República.
Para melhor compreensão, o estudo está estruturado da seguinte maneira: o primeiro capítulo
apresente a introdução, constando o problema, as perguntas, justificativa e os objectivos da
pesquisa; o segundo capítulo apresenta a revisão bibliográfica onde debruçamos as abordagens
teóricas sobre a matéria em estudo; o terceiro capítulo da metodologia, o quarto capítulo de
apresentação e discussão de Dados, e finalmente o quinto capítulo a presenta a recomendações e
conclusão.
1.1. Contextualização
As uniões prematuras são um fenómeno é endémico em Moçambique, o que quer dizer que se
está perante um fenómeno habitual e de grande incidência. Moçambique encontra-se entre os
países que, ao nível mundial, apresentam um maior número deste tipo de uniões forçadas:
encontra-se em 7º lugar nesta lista, depois do Níger, do Chade, do Mali, do Bangladesh, da
Guiné e da República Centro Africana, contabilizando mais de metade de mulheres que se casam
antes dos 18 anos
Apesar das uniões prematuras serem uma prática no nosso país, não existe ainda muitas obras
retratando essa problemática. Contudo existem estudos e pesquisas realizadas por várias
organizações nacionais e internacionais que serão as principais fontes para a realização deste
trabalho.
O casamento pressupõe, antes de mais, o livre consentimento das partes. A Lei n° 19/2019, de 22
de Outubro que estabelece o regime jurídico aplicável a proibição, prevenção e mitigação das
Uniões Prematuras em Moçambique, define-o como: “a união voluntária e singular entre um
homem e uma mulher, com o propósito de constituir família, mediante comunhão plena de vida
(Artigo 7, Noção de casamento). Então se pegarmos nesta definição, todas as uniões que não
obedecerem ao carácter “voluntário” e “singular”, não são efectivamente “casamentos” perante a
lei. Esta última característica “singular” refere-se ao casamento monogâmico, enquanto o
“voluntário” diz respeito ao consentimento das partes.
Segundo a Convenção Sobre os Direitos das Crianças (aprovada na 44ª sessão da ONU em 1989
e ratificada pelo Conselho de Ministros, resolução nº 19/90, no BR, I Série, nº 42, 23/10/1990), a
criança é definida como todo o ser humano, com menos de dezoito anos, excepto se a lei
nacional conferir a maioridade mais cedo.
Assim, porque uma pessoa com idade inferior a 18 anos (criança) não é capaz de dar o seu
consentimento válido para se casar, os casamentos em que ambas ou apenas uma das partes é
menor de idade, são considerados como uniões forçadas, o vulgarmente chamada união
prematura. Uma Relatora especial das Nações Unidas para o tráfico de pessoas, em particular
mulheres e crianças, Sigma Huda (2007), vai mais longe: “o casamento imposto a uma mulher
não pela força explícita, mas submetendo-a a pressão implacável e / ou manipulação, muitas
vezes dizendo-lhe que a recusa de um pretendente irá prejudicar a sua família na comunidade,
também pode ser entendido como forçado”.
Por estas razões, o casamento prematuro é condenado tanto ao nível do sistema universal dos
direitos humanos, como em instrumentos legais regionais e nacionais.
1.2. Justificativa
As crianças que vivem nestas uniões forçadas, para além de se verem impossibilitadas de
gozarem dos seus direitos, sofrem severas consequências no que diz respeito ao seu bem-estar
psicológico e emocional, à sua saúde reprodutiva e às suas oportunidades educativas e na vida
como adultas.
Este tema é importante sob ponto de vista académico e também por si tratar de obtenção de grau
de licenciatura, que segundo orientação desta faculdade um dos requisitos principais é
elaboração de uma monografia. Segundo Marconi e Lakatos, a justificativa consiste numa
exposição sucinta porém completa, das razões de ordem teórica e dos motivos de ordem prática
que tornam importante a realização da pesquisa
A razão de fundo para a escolha desse tema dos diversos é o interessante facto de, criar sistemas
locais de referência para os casos de violência de menores através da disseminação de
informação sobre como proceder quando se é confrontado com um caso destes. Os sistemas
locais de referência devem incluir todas as pessoas e instituições que podem desempenhar um
papel de reportagem.
Com este trabalho pretende-se contribuir para uma maior advocacia sobre a necessidade das
autoridades policiais abordarem o combate a este flagelo com mais determinação e firmeza e
quiçá, contribuir para a revisão do quadro legal aplicável a Moçambique em relação a
problemática e a sua incidência, e discutir uma tentativa de criminalizar os implicados neste tipo
de situações.
1.3. Problematização
Contudo, apesar destas práticas constituírem um atentado aos direitos humanos e ao facto de
Moçambique ser signatário de muitos instrumentos internacionais que apelam ao respeito dos
direitos da criança persiste a impunidade das pessoas que se envolvem neste tipo de práticas e
estado continua a mostrar-se incapaz de reprimir esse tipo de actos.
A união prematura constitui um factor de risco porque implica quase inevitavelmente relações
sexuais. Nas sociedades onde tal se consuma existe a forte pressão para se ter filhos logo após o
casamento e a taxa de concepção de mulheres jovens casadas é muito baixa.
Noutra vertente das consequências, existe uma correlação entre o casamento prematuro e a saída
do sistema de educação, por se cuidar de outros afazeres, com consequências para a privação do
direito à educação e no desenvolvimento social e humano das raparigas envolvidas. A aparente
apatia do sistema de educação e as normas permissivas como o Despacho nº 39/GM/2003 do
Ministério da Educação, que prescreve a mudança de turno para a rapariga grávida e apenas o
processo disciplinar para o protagonista concorrem para aumentar a tolerância em relação a estes
tipos de violência e á sua reprodução.
Pergunta de partida:
Até que ponto as estratégias Policiais são eficazes na prevenção e combate as uniões
prematuras em Moçambique?
1.4. Hipóteses
A Polícia da Republica de Moçambique (PRM) adopta estratégias eficazes para a
prevenção e combate as uniões prematuras em Moçambique.
1.5. Objectivos
1.5.1. Geral:
Analisar a eficácia das estratégias policiais de prevenção e combate as uniões prematuras
em Moçambique.
Capitulo II
Desenvolvimento
Apesar das uniões prematuras serem uma prática no nosso país, não existe ainda muitas obras
retratando essa problemática. Contudo existem estudos e pesquisas realizadas por várias
organizações nacionais e internacionais que serão as principais fontes para a realização deste
trabalho.
O casamento pressupõe, antes de mais, o livre consentimento das partes. A Lei n° 19/2019, de 22
de Outubro que estabelece o regime jurídico aplicável a proibição, prevenção e mitigação das
Uniões Prematuras em Moçambique, define-o como: “a união voluntária e singular entre um
homem e uma mulher, com o propósito de constituir família, mediante comunhão plena de vida
(Artigo 7, Noção de casamento). Então se pegarmos nesta definição, todas as uniões que não
obedecerem ao carácter “voluntário” e “singular”, não são efectivamente “casamentos” perante a
lei. Esta última característica “singular” refere-se ao casamento monogâmico, enquanto o
“voluntário” diz respeito ao consentimento das partes.
Segundo a Convenção Sobre a Direitos das Crianças (aprovada na 44ª sessão da ONU, em 1989
e ratificada pelo Conselho de Ministros, através da resolução nº 19/90, no BR, I Série, nº 42,
23/10/1990), a criança é definida como todo o ser humano com menos de dezoito anos, excepto
se a lei nacional conferir a maioridade mais cedo.
Assim, porque uma pessoa com idade inferior a 18 anos (criança) não é capaz de dar o seu
consentimento válido para se casar, os casamentos em que ambas ou apenas uma das partes é
menor de idade, são considerados como uniões forçadas, o vulgarmente chamado casamento
prematuro. Uma Relatora especial das Nações Unidas para o tráfico de pessoas, em particular
mulheres e crianças, Sigma Huda (2007, p. 12), vai mais longe: “o casamento imposto a uma
mulher não pela força explícita, mas submetendo-a a pressão implacável e / ou manipulação,
muitas vezes dizendo-lhe que a recusa de um pretendente irá prejudicar a sua família na
comunidade, também pode ser entendido como forçado”.
Por estas razões, o casamento prematuro é condenado tanto ao nível do sistema universal dos
direitos humanos, como em instrumentos legais regionais e nacionais.
Referencial Teórico
Segundo a Lei da Família, Lei n.º 10/2004, de 25 de Agosto, a união prematura, mais conhecida
como “casamento prematuro”, é a junção de duas pessoas, com a finalidade de constituir família,
sendo ambas ou uma delas menor de 18 anos. Ao longo deste estudo referimo-nos a essas uniões
não como casamentos, mas simplesmente como uniões prematuras, porque, afinal, não chegam a
ser casamentos no sentido rigoroso do termo: uma união voluntária, consentida, entre duas
pessoas adultas.
Essa lei, porém, contém uma grande lacuna, pois deixa espaço para a existência de uniões
prematuras, quando, no número 2 do artigo 30.º estabelece excepcionalidade para cidadãos
menores de 18 anos. É essa lacuna que a Coligação para a Eliminação dos Casamentos
Prematuros - CECAP – procurou colmatar ao advogar a aprovação de uma Lei de Prevenção e
Combate às Uniões Prematuras. Fora da Lei da Família, no Inquérito Demográfico e de Saúde
(IDS), o casamento é definido como sendo a união ou coabitação entre uma mulher e um homem
e tem em conta a idade da primeira coabitação (INE, 2013). Portanto, a situação em que menores
de idade se envolvem em “uniões maritais” não pode ser considerada um casamento.
Segundo a Agência das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), na sua página oficial,
Moçambique tem uma das taxas mais elevadas de casamentos prematuros do mundo, afectando
quase uma em cada duas raparigas, e tem a segunda maior taxa na sub-região da África Oriental
e Austral. Cerca de 48 por cento das mulheres em Moçambique com idades entre os 20 e os 24
anos já foram casadas ou estiveram numa união antes dos 18 anos e 14 por cento antes dos 15
anos (IDS, 2011).
Mundialmente, Moçambique encontra-se no décimo lugar, enquanto país com uma elevada
prevalência de uniões prematuras: 14% das mulheres, entre os 20 e 24 anos de idade, casaram
antes dos 15 anos de idade e, 48% casaram antes dos 18 anos de idade (Estratégia Nacional de
Prevenção e de Combate de Casamentos Prematuros em Moçambique 2016-2019).
Ainda de acordo com esta organização " O Casamento prematuro põe em perigo as raparigas.
Raparigas casadas sofrem maiores abusos, violência doméstica (incluindo abuso físico, sexual ou
psicológica) e abandono".
Segundo a fonte, a análise das uniões prematuras é feita considerando duas faixas etárias: a
primeira que vai até aos 15 anos de idade, e a segunda, a que vai até aos 18 anos de idade. Nessa
perspectiva, o Instituto Nacional de Estatística (INE), no seu último Inquérito Demográfico e de
Saúde (IDS) 2011, revela que as províncias de Cabo Delgado, Manica, Nampula, Sofala, Tete e
Zambézia apresentam altos índices de união prematura.
A província mais vasta do país, Niassa, regista 24% de mulheres entre os 20 e 24 anos de idade
casadas antes dos 15 anos de idade seguida das províncias da Zambézia, de Sofala e Nampula,
com 17% cada. No concernente aos casamentos antes dos 18 anos, a província mais populosa do
país, Nampula, regista a taxa mais elevada com 62%, seguida de Cabo Delgado com 61%,
Manica com 60% e Niassa com 56%.
A situação das uniões prematuras é preocupante. Fora das percentagens, dados oficiais mostram
que a província mais populosa do país, Nampula, regista o maior número de casos, com mais de
35 mil crianças de 15 anos em situação de união prematura. O número de crianças com idade
inferior a 18 anos, em Nampula, que se encontram em uniões prematuras é mais assustador: pelo
menos de 130 mil raparigas.
4
Série 1
3
Série 2
Série 3
2
0
Niassa Zambezia Sofala Nampula
A segunda província mais populosa do país, Zambézia, é igualmente a segunda maior em termos
de uniões prematuras. Nampula e Zambézia representam um total de 42% das uniões prematuras
de todo o país.
Segundo dados obtidos nos Relatórios Balanço do Plano Economico e Social (BdPES) do
Ministério do Género, Criança e Acção Social (MGCAS), foram identificados e reintegradas em
todo o pais, 165 crianças no primeiro semestre de 2022.
Segundo este instrumento, no ano 2021, registaram-se 334 casos sendo 220 no primeiro semestre
e 114 no segundo semestre, sendo que no ano 2020 houve registo de 103 casos, correspondentes
a 41 casos no primeiro semestre e 62 no segundo semestre.
3 Série 1
Série 2
2 Série 3
0
2020 2021 2022 Categoria
4
A Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras estabelece os 18 anos como a idade para
qualquer tipo de união com o propósito imediato ou futuro de constituir família.
Não obstante estabelecer a possibilidade de se fazer cessar qualquer união prematura, nos termos
adiante explicados, são protegidos alguns direitos adquiridos na vigência da mesma,
nomeadamente os direitos das crianças nascidas fruto dessa união, para efeitos do
reconhecimento da paternidade e da maternidade e bem assim os direitos patrimoniais.
A Lei de Prevenção estabelece mecanismos legais para fazer cessar quaisquer tipos de uniões
prematuras, o que se materializa, quer pelo regime da anulação do casamento, no termos
estabelecidos na Lei de Família, quer por um processo judicial especial para fazer cessar outro
tipo de uniões prematuras.
d) Infracções Penais
De referir que a Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras inspira-se na Lei Modelo da
SADC sobre a Erradicação dos Casamento Prematuros e Protecção das Crianças já em Situação
de Casamento, aprovado pela 39ª Sessão da Assembleia do Fórum Parlamentar da Comunidade
para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), realizada em Junho de 2016, com o
objectivo principal de servir de guia para a criação de legislação específica nos Estados membro
no que concerne à protecção da criança contra os casamentos e uniões prematuras.
Ainda de acordo com a CDD, esta lei vem complementar a outra legislação existente sobre a
matéria, como o Código Penal, a Lei da Família e a Lei para a Promoção e Protecção dos
Direitos da Criança, que claramente proíbem e criminalizam actividades sexuais com menores.
De acordo com a lei moçambicana, a actividade sexual com um(a) menor de idade, definida
como qualquer pessoa com menos de 18 anos, é um crime e é punida com prisão e multas. De
acordo com esta organização, embora a Lei da Família de 2004 tenha previsto o casamento de
menores acima de 16 anos, quando existirem circunstâncias excepcionais e conhecidas de
interesse público e familiar, e quando haver consentimento dos pais (número 2 do artigo 30), o
mesmo artigo anula, enfaticamente, qualquer casamento que envolva menores de idade, por
qualquer motivo que não sejam as excepções mencionadas acima (alínea a) do número 1 do
artigo 30). Na verdade, o artigo 19, da mesma lei, anula qualquer promessa de casamento feita
por qualquer pessoa com menos de 18 anos de idade. Por sua vez, o Código Penal não abre
espaço para o casamento com menores de 16 anos, pois o seu artigo 220 pune a quem cometer
qualquer acto sexual com um(a) menor de 16 anos, com ou sem o seu consentimento.
O país tomou medidas para melhorar o ambiente legal e adoptou estratégias para travar uma
guerra vitoriosa contra os casamentos prematuros. Em seu sétimo capítulo sobre crimes contra a
liberdade sexual, o novo Código Penal, aprovado em 2014, chamou atenção à protecção de
menores contra o abuso sexual, práticas e crimes modernos, como a pornografia (artigo 226). Em
2015, o Conselho de Ministros aprovou a “Estratégia Nacional de Prevenção e Combate ao
Casamento Prematuro” para o período de 2016- 2019.
A Lei da Família de 2019 manteve a nulidade de qualquer promessa de casamento feita por
um(a) menor (número 2, do artigo 21) e qualquer casamento que envolva um(a) menor, com
excepção do que está previsto acima (na alínea a) do artigo 32). Com base na Lei Modelo da
SADC sobre Erradicação dos Casamentos Prematuros e Protecção da Criança em Casamento”, a
Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras é o documento legal específico e robusto que
o país possui, o qual promete desencadear golpes decisivos contra os casamentos prematuros.
2.4. Causas das uniões prematuras
Que factores contribuem para a preocupante situação das elevadas taxas de uniões prematuras
em Moçambique? Vários estudos e análises (por exemplo, Bassiano e De Lima 2018; UNICEF,
FNUAP e CECAP 2015; Osório 2015; GdM 2015; UNICEF 2015; Francisco 2014; Osório e
Macuácua 2013) sobre o fenómeno das uniões prematuras e assuntos conexos, nomeadamente, a
Pág. 16, de 45 gravidez precoce ou a educação da rapariga em Moçambique chegam à mesma
conclusão: as uniões prematuras têm como causas os factores de ordem sociocultural e de ordem
económica: pobreza, desigualdades e marginalização dos tecidos sociais rurais dos processos de
produção e distribuição da riqueza, bem como dos processos de tomada de decisão.
Com base na vasta literatura disponível, podemos afirmar que a predominância da cultura
patriarcal é a base sobre a qual assentam diversos factores que propiciam a manutenção e
reprodução das uniões prematuras. Essa cultura patriarcal funciona como fermento para a prática
de ritos de iniciação com uma orientação contrária à dignidade da pessoa humana prevista na
Declaração Universal dos Direitos Humanos, contra a Convenção sobre a Eliminação de Todas
as Formas de Discriminação contra as Mulheres e contra a Constituição da República de
Moçambique, que estabelece o princípio da igualdade entre homens e mulheres.
O contexto sociocultural dentro do qual acontecem as uniões prematuras é caracterizado por uma
visão de supremacia do género masculino sobre o género feminino. Com efeito, essa supremacia
do masculino sobre o feminino produz e reproduz mecanismos de representação social e
simbólica, incluindo práticas costumeiras que relegam a mulher para o segundo plano. A
estrutura conceptual dos programas educativos tem sido, por isso, concebida para defender o
"status quo" da rapariga que “existe para servir e obedecer ao rapaz”.
Reconhecendo esse facto, o Governo de Moçambique destaca como acção necessária para a
redução das uniões prematuras “o empoderamento das raparigas com informação, habilidades e
redes de apoio para aumentar os conhecimentos sobre si próprios, o mundo que as rodeia e que
sejam capazes de tomar decisões sobre as suas vidas” (GdM 2015; p. 10).
Apesar de ser dinâmica, a cultura leva muito tempo a mudar e a sua mudança acontece sempre
sob influência de outros factores contextuais, tais como: a Pág. 17 de 45 elevação dos níveis de
escolaridade, o aumento do poder de compra enquanto consequência do desenvolvimento
económico, o aumento da disponibilidade tecnológica, a massificação de informação (media
tradicionais e redes sociais) e maior integração intercultural. Assim, nem o Governo e nem as
Organizações da Sociedade Civil (OSC), muito menos os parceiros de cooperação devem entrar
em pânico com a lentidão da mudança cultural, pois ela não só leva tempo a acontecer como
acontece em resultado da mudança dos factores mencionados acima.
b. Os ritos de iniciação
De acordi com Bassiano e De Lima 2018, os ritos de iniciação – com algumas variantes de
diferenciação – são praticados maioritariamente nas províncias do norte (Cabo Delgado,
Nampula e Niassa) e centro (Zambézia, Tete e Manica) de Moçambique. Estas duas regiões
representam a maior área territorial do país, bem como a maioria da população do país.
Para aqueles autores há indícios de ritos de iniciação também na zona sul do país, mas
assumindo outras formas e características e parecem estar já em desuso. Na discussão corrente
sobre as uniões prematuras é comum apontarem-se os ritos de iniciação como uma das causas
das uniões prematuras, da gravidez precoce e inclusive do abandono escolar por parte das
raparigas menores de 18 anos. Ora, o que várias pesquisas (por exemplo, Bassiano e De Lima
2018; Osório 2015; UNICEF 2015; Osório e Macuácua 2013) têm provado não é uma relação
directa de causa-efeito, mas, sim, evidências de como determinados conteúdos dos ritos de
iniciação (educação sexual das raparigas orientando-as a servirem e satisfazerem os homens), a
metodologia usada para transmitir esses conteúdos (o recurso à encenação de relações sexuais
com uso de objectos de aparência do órgão sexual masculino), a finalidade subjacente à
realização desses ritos (preparar a menina para o casamento, para que saiba atender os homens e
satisfazê-los, em contraposição com os rapazes que são preparados para serem chefes de família,
para “domar” as mulheres e fazerem-se respeitar por elas – ao invés de uma educação baseada na
igualdade de direitos e deveres enquanto cidadãos) impelem à união prematura, condição
suficiente para uma gravidez precoce – esta, por sua vez, uma das principais causas do abandono
Pág. 18 de 45escolar (MINEDH 2018; O País 2018; Fernando 2019) e de altos índices de
desnutrição crónica.
“pelo que ensinam e pelo modo como são transmitidas as aprendizagens, as crianças do sexo
feminino e do sexo masculino aprendem a distinguirem-se e a adoptar práticas que lhes
condicionam o acesso a direitos. Ou seja, os ritos de iniciação têm uma primeira função que é
de formar identidades, de nos dizer o que está certo e errado no nosso comportamento. Neste
sentido, os ritos são apresentados como verdades que não podemos questionar sob pena de
estarmos a violar “a nossa cultura” (Osório 2015, p. 22).
É assim que os ritos de iniciação são percebidos como uma das fontes que impulsionam as
uniões prematuras, resultando depois em gravidez precoce e na geração de mães e crianças
subnutridas que, de seguida, têm de enfrentar todas as consequências das dificuldades da saúde
materna - infantil. No entanto, não se critica a existência dos ritos de iniciação em si, mas
somente uma parte dos seus conteúdos e a metodologia neles usada. Nos dizeres de Osório
(2015):
“Os ritos continuam a ser, pelos factores de demarcação para a sua realização, pelas cerimónias
que os constituem e pelos sentidos que lhes são conferidos, um factor de coesão cultural. Quando
falamos em coesão cultural, falamos em elementos que identificam a pertença de cada pessoa a
uma determinada maneira de ver e de se situar no mundo. Assim a coesão contém tanto o (Pág.
19) reconhecimento da pertença através da conformação com representações e práticas
consagradas nos processos de interacção, e também de subjectivação, como o reconhecimento de
exclusão para as e os que não pertencem ao grupo.”
Portanto, os ritos de iniciação – com todos os defeitos que lhe são apontados ao longo deste
estudo - constituem uma manifestação cultural profunda, secular e que, como qualquer
manifestação cultural, contém defeitos que devem ser corrigidos. Os ritos de iniciação não se
realizam como simples momento em que as crianças têm uma oportunidade de receber roupa
nova e ter uma festa, como escreveu o jornal notícias na sua edição de 23 de Maio de 2019
“Distrito de Ngaúma: Roupa nova e festas impelem crianças para os ritos de iniciação.”
(i) Pelo menos um membro do agregado familiar ter finalizado a escola primária completa;
Considera-se pobre o agregado familiar privado de, pelo menos, 4 dos 6 indicadores
apresentados. As províncias com os mais altos índices de pobreza (Zambézia, Cabo Delgado,
Nampula, Tete, Niassa e Manica) são, coincidentemente, aquelas onde se praticam ritos de
iniciação e, ao mesmo tempo, são as províncias com as mais altas taxas de uniões prematuras e
gravidez precoce.
Por um lado, as raparigas dos agregados familiares mais pobres correm o dobro do risco de
casarem antes dos 18 anos, em comparação com as raparigas dos agregados mais ricos (Walker,
2005). Por outro lado, as jovens que vivem em agregados familiares chefiados por mulheres têm
uma probabilidade significativamente mais baixa de casar antes dos 18 anos de idade, do que as
raparigas que vivem em agregados chefiados por homens (UNICEF et al., 2014).
CAPÍTULO III:
3.1. METODOLOGIA
Este capítulo apresenta as seguintes secções: método de abordagem, população alvo, técnicas e
instrumentos de recolha de dados.
A pesquisa qualitativa não se preocupa com representatividade numérica, mas, sim, com o
aprofundamento da compreensão de um grupo social de uma organização. Os pesquisadores que
utilizam os métodos qualitativos buscam explicar o porquê das coisas, exprimindo o que convém
ser feito, mas não quantificam os valores e as trocas simbólicas nem se submetem à prova de
factos, pois os dados analisados são não-métricos (suscitados e de interacção) e se valem de
diferentes abordagens (Gerhardt & Silveira, 2009).
A pesquisa qualitativa preocupa-se com aspectos da realidade que não podem ser quantificados,
centrando-se na compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais. Para Minayo
(2004), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações,
crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos
processos e dos fenómenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.
Para o alcance dos objectivos do estudo iremos recorrer ao método qualitativo complementado
pelo quantitativo. A conjugação das abordagens qualitativa e quantitativa permitirá recolher mais
informações do que se poderá conseguir isoladamente.
A opção por uma metodologia mista parte do pressuposto de que as duas (2) abordagens
(qualitativa e quantitativa) se complementam: as duas abordagens têm pontos fracos e fortes e os
elementos fortes de uma complementam as fraquezas da outra. Como refere Terence (2006, p.3),
“as abordagens quantitativas e qualitativas, apesar das suas especificidades, não se excluem”.
3.4.2. Amostragem
Segundo Neves e Domingues (2007), a amostra é o subconjunto da população, por meio do
qual se estabelecem ou se estimam as características desse universo. Richardson (1999) define
amostra como um subconjunto da população alvo que habita num determinado lugar.
Para Doxsey e De Riz (2003, Apud Gerhardt & Silveira, 2009, p. 67), numa pesquisa é sempre
essencial determinar qual será a principal fonte das informações a serem colectadas.
Assim, a escolha dos participantes desta pesquisa será baseada na procura de indivíduos sociais
que tenham uma vinculação significativa com o tema em estudo (Neves & Domingues, 2007).
Desta forma, a amostra da presente pesquisa será composta por 15 Agentes da Polícia de que
lidam com a questão das uniões prematuras no Departamento de Atendimento à Família e
Menores Vítimas de Violência, nomeadamente: um (1) Chefe de Departamento, (3) Chefes de
repartição, oito (8) Chefes de secção, Três (3) Técnicos de atendimento.
Esta constituirá uma amostra relativamente pequena, contudo, para Bogdan e Biklen (1994), na
investigação qualitativa os métodos de recolha de dados conduzem a um trabalho intenso, uma
vez que o objectivo é a obtenção de respostas e explicações através da exploração com maior
profundidade das questões sob investigação, contrariamente à investigação quantitativa em que
os investigadores usam grandes amostras com o objectivo de generalizar os resultados das
pesquisas.
Os Agentes da Polícia serão escolhidos por conveniência para se explorar as facilidades que a
investigadora tem para conseguir o grupo sobre o qual incide o estudo e este procedimento é
defendido por Gil (1999). A sua escolha permitirá a recolha de opiniões, sentimentos,
experiências, representações que os sujeitos da pesquisa constroem sobre as estratégias de
prevenção e combate às uniões prematuras. Trata-se, pois, de uma amostra não-probabilística,
pois será uma amostra formada em função de escolha explícita da investigadora. É o caso da
amostra típica em que a partir das necessidades do estudo, o investigador selecciona casos
julgados exemplares ou típicos da população-alvo ou de uma parte desta (Laville & Dionne,
1999).
A pesquisadora acredita que esta será uma amostra ideal, pois segundo Minayo (2004), a
amostra ideal na pesquisa qualitativa é a que reflecte o conjunto em suas múltiplas dimensões.
Pretende-se com este instrumento recolher dados sobre as estratégias de prevenção e combate as
uniões prematuras, além da percepção dos Agentes da Polícia sobre a caracterização das
actividades realizadas no âmbito do atendimento às vitimas de uniões prematuras. Algumas
perguntas serão construídas de forma a permitir avaliar as atitudes e opiniões que visam o
conhecimento quantificado e directo do comportamento dos sujeitos (Gerhardt & Silveira, 2009).
Este capítulo é constituído por cinco (5) secções a saber: Processo de recolha de dados;
Caracterização do local de estudo; Quadro legal aplicável às uniões prematuras em Moçambique;
Situação criminal das uniões prematuras em Moçambique; e estratégias policiais de prevenção e
combate às uniões prematuras em Moçambique.
Nesta secção é apresentado o quadro legal aplicável para abordagem preventiva e combativa às
uniões prematuras em Moçambique. Ou seja, pretende-se nesta secção apresentar os
instrumentos legais Moçambicanos que falam sobre as uniões prematuras.
Tem-se em destaque a lei mãe, que é a Constituição da República de Moçambique (CRM), como
um dos instrumentos que protege os interesses da criança, ao estabelecer no seu artigo 47, que as
crianças têm o direito à protecção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar. O mesmo
dispositivo legal, advoga ainda no seu artigo 121 que todas as crianças têm direito à protecção da
família, da sociedade e do Estado, tendo em vista o seu desenvolvimento integral.
Lei da Família
A Nova Lei da Família, aprovada pela Lei n.º 22/2019, de 11 de Dezembro, a qual revoga a Lei
n.10/2004, de 25 de Agosto (antiga Lei da Família), é um instrumento legal que compreende um
conjunto de normas que regulam as relações entre pessoas ligadas entre si por laços de
familiaridade, que o Estado reconhece efeitos jurídicos, nomeadamente, a procriação, o
parentesco, a afinidade, o casamento e a adopção.
O casamento é definido como união voluntária e singular entre um homem e uma mulher, com o
propósito de constituir família, mediante comunhão plena de vida (art.º. 8 da Lei da Família).
Quanto a modalidade de casamentos, a lei estabelece a existência do casamento civil, religioso
ou tradicional (art.º 17, Lei da Família). O casamento religioso e o tradicional produzem efeitos
previstos na respectiva lei, desde que esteja devidamente transcrito pelos serviços do registo civil
nos termos da lei (nº 2, art.º 18 Lei da Família).
Uma das principais novidades trazidas pela nova Lei da Família no âmbito da prevenção e
combate às uniões prematuras, consiste na revogação do nº 2 do art. 30 da Lei n.10/2004, de 25
de Agosto (antiga lei da família), que fala acerca da emancipação para o casamento com 16 ou
17 anos.
A revogação trazida na Lei da Família sobre a idade núbil, visa, por um lado, conformar a nova
Lei da Família com as disposições da Constituição da República sobre:
Direitos da criança: o direito de exprimir a sua opinião nos assuntos que lhes dizem
respeito, o direito à protecção e ao bem-estar e o princípio do superior interesse da
criança (art. 47);
Infância: o direito à protecção pela família e do princípio do desenvolvimento integral (nº
1, do art. 121);
Princípio do livre consentimento para o casamento (nº. 3, do art. 119).
Por outro lado, a revogação sobre a idade núbil, visa essencialmente, adequar a Lei da Família às
políticas e estratégias vigentes sobre a eliminação dos casamentos prematuros; a Lei sobre
Promoção e Protecção dos Direitos da Criança, Lei nº 7/2008, de 9 de Julho (art. 3); A
Declaração Universal dos Direitos do Homem (nº 2, do art. 16,), o Protocolo à Carta Africana
dos Direitos do Homem e dos Povos relativo aos Direitos da Mulher em África (als. a) e b), do
art. 6,), Protocolo da SADC sobre Género e Desenvolvimento (als. a) e b), do nº 2, do art. 8,) e a
Convenção sobre os Direitos da Criança (art. 1).
A questão da oposição dos Pais ou Tutor, prevista no art. 41 da Nova Lei da Família, é um
postulado legal que fazia sentido em conjugação com o n.2 do art. 30 da lei revogada, uma vez
que a nova lei revogou a possibilidade de celebração do casamento com 16 ou 17 anos, em que
se exigia consentimento dos pais ou tutor. Com isto, subentende-se que o artigo 41 da Nova Lei
da Família perde o seu sentido de existência.
Com a aprovação da Lei n.º 19/2019, de 22 de Outubro, Lei de Prevenção e Combate às Uniões
Prematuras, Moçambique deu mais um passo na promoção dos direitos e protecção integral da
Criança. Esta Lei tem por objecto a proibição, prevenção, mitigação e penalização das uniões
prematuras, bem como a protecção das crianças que se encontrem nessas uniões.
Não obstante, sendo Moçambique um País onde as uniões prematuras constituem um fenómeno
complexo, a sua implementação trará inúmeros desafios aos diferentes sectores nas instituições
de Administração da Justiça, bem como na sociedade moçambicana.
Estudos feitos indicam que Moçambique está entre os 10 países a nível mundial, com maior
prevalência de uniões prematuras. Ocupa o 7º lugar em África e o 3º a nível da África Austral.
Dados indicam ainda que, a criança representa cerca de 53% da população e destas, 48% unem-
se antes dos 18 anos de idade.
Estrutura da Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras
A Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras comporta cerca de 50 artigos, subdivididos
em 4 títulos, para além do preâmbulo, sendo:
É a ligação entre pessoas, em que pelo menos uma seja criança, formada com propósito imediato
ou futuro de constituir família.
O casamento, o noivado, união de facto ou qualquer relação que seja equiparável à relação de
conjugalidade, independentemente da sua designação regional ou local, envolvendo criança, são
havidos como união prematura para os termos da Presente Lei.
Proibição de Celebração
Nenhuma autoridade, seja administrativa, tradicional, local ou religiosa, pode legitimar por
qualquer forma e no âmbito das suas funções, a constituição da união com o propósito
imediato ou futuro de constituir família, na qual uma ou ambas as pessoas sejam crianças.
Objectivos da Lei
Nesta secção é apresentada a situação criminal das uniões prematuras registada durante o período
em estudo, a partir dos relatórios anuais das estatísticas das ocorrências colhidas junto ao
Departamento de Atendimento a Família e Menores Vítimas de Violência. Para o efeito,
considerou-se o agrupamento de dados em função do género, idade e tipificação criminal.
De referir que, os casos de Uniões prematuras, foram ao longo dos períodos de análise até 2019
designados por Casamentos prematuros, em conformidade com a Estratégia Nacional de
Prevenção e Combate dos Casamentos Prematuros (2016-2019), cuja Matriz de Acções inclui
responsabilidades específicas para o MINT (Comando Geral da PRM), com destaque a
necessidade de prover, à toda Criança vítima de Casamento Prematuro, informação de serviços
de apoio, aconselhamento, encaminhamento e acompanhamento na Rede de Apoio, bem como a
capacitação de agentes da Polícia.
De acordo com a Chefe de Departamento, a subida dos casos criminais sobre uniões prematuras
justifica-se pelo trabalho de disseminação e consciencialização da comunidade acerca da lei de
prevenção e combate às uniões prematuras, passo fundamental para o acesso à justiça. Ademais,
ao se olhar a tipificação das uniões prematuras, podem ser identificados os seguintes crimes: (i)
noivado com criança, (ii) violência contra criança, (iii) violação de criança, (iv) actos sexuais
com crianças, (v) auxílio a união com criança, (vi) união com criança, (vii) autorização e
incentivo para união, (viii) coação para união, (ix) entrega de criança como troca, pagamento.
Os casos de casamentos prematuros registados no ano 2019, foram notificados pelas seguintes
Províncias, nos respectivos números, nomeadamente: Cidade Maputo (02), Inhambane (11),
Sofala (04), Tete com (6), Zambézia com (83) Niassa (25) e Cabo Delgado (18). Não constam da
tabela abaixo, o registo de casos de casamentos prematuros nas Províncias de Maputo, Gaza,
Manica e Nampula o que não significa a não ocorrência de casamentos prematuros.
Província Sexo Idade Local de N° de casos Total
Ocorrência
Em C. Maputo F 12-17 2 2
Inhambane F 11 11
Sofala F 4 4
F 12-15 Cidade de Tete 2
Tete F 12 Changara 1 06
F 13-14 Moatize 2
F 12 Zumbo 1
Zambézia F 83 83
F 14-17 Lichinga 9
F 15 Cuamba 1
F 14,15,17 Mandimba 3
Niassa
F 15 Maua 1
25
F 15,15,16 Nipepe 3
F 14,15,15 Ngauma 3
F 16 Chimbunila 1
F 17 Muembe 1
F 14-17 Sanga 2
F 16 Lago 1
C. Delgado F 18 18
Total 149
relação ao ano 2020, os 213 casos de Uniões Prematuras foram notificados pelas seguintes
Províncias: Cidade Maputo (3), Província de Maputo (14), Gaza (44), Inhambane (30), Sofala
(30), Manica (44), Tete (47), Nampula (1).
TIPOLOGIA CRIMINAL
Noiva Violência Violação Actos sexuais Auxilio a união União com Autorização e Coação
Distritos Total
do contra de criança com crianças Com Crianca Crianças incentivo para união para
com criança união
crianç
a
Cidade de Maputo 1 2 3
Província de Maputo 1 1 2 2 8 14
Gaza 44 44
Inhambane 4 10 14 2 30
Sofala 2 2 1 9 13 3 30
Manica 1 4 14 19 5 1 44
Tete 1 21 25 47
Nampula 1 1
48 8 21 47 21 57 8 3 213
TOTAL
Para o ano 2021, o Departamento registou um total de 398 casos de Uniões Prematuras, contra
225 Casos, tendo registado um aumento em 173 casos, correspondentes a 76.9 %, destacando as
Províncias de Tete (94), Manica (62) Gaza (58) casos, equivalentes a 23.6%, 15.6% e 14.6%,
respectivamente. A cidade de Maputo é que apresentou menor nº de casos, com o registo de
apenas 1 caso.
TIPOLOGIA CRIMINAL
Noiva Violên Violaçã Actos Auxilio a União Autorizaçã Coação Entrega de
Distritos do cia o de sexuais união Com com oe para criança Total
com contra criança com Criança Criança incentivo união como
crianç criança crianças s para união troca,
a pagamento
ou dadiva
Cidade de
Maputo 1 1
Província de
Maputo 1 1 16 3 15 1 1 38
Gaza 58 58
Inhambane 6 8 29 1 1 1 46
Sofala 1 1 2 3 13 20
Manica 2 1 1 28 1 20 6 3 62
Tete 84 9 1 94
Zambezia 6 4 1 11
Nampula 8 3 8 3 4 26
Niassa 6 4 4 1 4 19
Cabo Delgado 1 1 10 2 9 23
Total 82 6 101 79 15 99 10 5 1 398
De referir que além destas actividades, existem as denominadas medidas cautelares anteriores e
posteriores às uniões prematuras.
As medidas cautelares anteriores a união são aquelas desencadeadas com vista a impedir a
ocorrência de uma união prematura, das quais se destacam as seguintes:
As medidas cautelares posteriores a união são aquelas desencadeadas após a ocorrência de uma
união prematura, das quais se destacam as seguintes:
O problema de investigação levantado foi o seguinte: até que ponto as estratégias Policiais
são eficazes na prevenção e combate as uniões prematuras em Moçambique? Neste sentido, o
objectivo geral do estudo foi analisar a eficácia das estratégias policiais de prevenção e combate
as uniões prematuras em Moçambique. Este objectivo foi desdobrado nos seguintes objectivos
específicos: identificar o quadro legal aplicável às uniões prematuras em Moçambique; descrever
a situação criminal das uniões prematuras em Moçambique; avaliar a eficácia das estratégias
policiais de prevenção e combate às uniões prematuras em Moçambique.
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