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LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE
TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Análise de diferentes textos buscando identificar propriedades

específicas dos seus modos de organização 10


1.2 Conteúdo global e atribuição coerente de título, de divisão para-

gráfica de um texto e de outras normas de apresentação 17


1.3 Estratégias de manutenção da unidade temática do texto e de

sua progressão 20
1.4 Relação entre informações do texto e conhecimentos prévios 21
1.5 Identificação das palavras e ideias chave do texto 22
1.6 Aspectos semânticos do vocábulo da língua 24
1.7 Relação do texto com outros textos 27
1.8 Função da Linguagem 28
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Leitura, análise e interpretação de textos são habilidades que precisam ser exercitadas para se-

rem aprimoradas. Portanto, não tem como falarmos delas sem efetivamente lermos ou exercitar-

mos nossa capacidade compreensiva. É preciso engajamento e disposição para compreender-

mos corretamente o que um texto comunica e quais elementos empregados nele contribuem

para que a mensagem chegue de forma clara ao seu interlocutor.


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O texto como evento sóciocomunicativo torna-se o fio condutor de todas as interações humanas,

apresentando-se de diferentes formas e exigindo dos sujeitos atitudes ativas e o acionamento da

memória e do contexto de vivência para compreensão.

Ele também carrega em si um conteúdo ideológico resultante de uma posição Social, Histórica e

Cultural do seu autor.

É com essa premissa básica que vamos iniciar o primeiro subtema desta unidade que está intrin-

secamente ligado aos demais:

1.1 ANÁLISE DE DIFERENTES TEXTOS BUSCANDO IDENTIFICAR PROPRIEDA-


DES ESPECÍFICAS DOS SEUS MODOS DE ORGANIZAÇÃO
Segundo a teoria bakhtiniana de linguagem, o tema, o estilo e a forma composicional compõem

as propriedades específicas dos textos/enunciados.

O TEMA
sendo o que há de único e irrepetível em cada enunciado.

Por exemplo, quando alguém come algo que gosta e diz “Que delícia!” por

duas vezes, esse mesmo enunciado assume um sentido único em cada

vez que é externado, pois na segunda vez já é um reforço da sua satisfação

O ESTILO
sendo como o modo particular que cada um tem de se enunciar (dada

sua experiência pessoal).

A FORMA COMPOSICIONAL
sendo um estilo dos gêneros, que são “relativamente estáveis”.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Observe os textos a seguir e perceba que eles apresentam propriedades específicas, ou seja, um

modo de apresentação, de formatação e de uso da linguagem, particular.

TEXTO A

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FONTE: https://www.hortifruti.com.br/comunicacao/campanhas/
hollywood/, acesso em 02 out. 2019.

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UNIDADE 1 :
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TEXTO D: A BOMBA SUJA


(Ferreira Gullarw)

Introduzo na poesia É uma bomba-relógio Quem é que rouba a esse homem

A palavra diarréia. (o relógio é o coração) o cereal que ele planta,

Não pela palavra fria que enquanto o homem trabalha quem come o arroz que ele colhe
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Mas pelo que ela semeia. vai preparando a explosão. se ele o colhe e não janta.

Quem faz café virar dólar

Quem fala em flor não diz tudo. Bomba colocada nele e faz arroz virar fome

Quem me fala em dor diz demais. muito antes dele nascer; é o mesmo que põe a bomba

O poeta se torna mudo que quando a vida desperta suja no corpo do homem.

sem as palavras reais. nele, começa a bater.

Mas precisamos agora

No dicionário a palavra Bomba colocada nele desarmar com nossas mãos

é mera idéia abstrata. Pelos séculos de fome a espoleta da fome

Mais que palavra, diarréia e que explode em diarréia que mata nossos irmãos.

é arma que fere e mata. no corpo de quem não come.

Mas precisamos agora

Que mata mais do que faca, Não é uma bomba limpa: deter o sabotador

mais que bala de fuzil, é uma bomba suja e mansa que instala a bomba da fome

homem, mulher e criança que elimina sem barulho dentro do trabalhador.

no interior do Brasil. vários milhões de crianças.

E sobretudo é preciso

Por exemplo, a diarréia, Sobretudo no nordeste trabalhar com segurança

no Rio Grande do Norte, mas não apenas ali pra dentro de cada homem

de cem crianças que nascem, que a fome do Piauí trocar a arma de fome

setenta e seis leva á morte. se espalha de leste a oeste. pela arma da esperança.

É como uma bomba D Cabe agora perguntar

que explode dentro do homem quem é que faz essa fome,

quando se dispara, lenta, quem foi que ligou a bomba

a espoleta da fome. ao coração desse homem.

FONTE: GULLAR, Ferreira, Melhores poemas de Ferreira Gullar. Seleção e apresenta-


ção de Alfredo Bosi. 7 ed. Ver. E ampliada. São Paulo: Global, 2004.

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UNIDADE 1 :
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É certo que você, pela vivência que teve até chegar ao curso de graduação, já estudou diversos

aspectos da língua portuguesa. Por isso fica relativamente fácil identificar as diferenças de cada

texto apresentado, mesmo sem lê-los na íntegra.

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A principal diferença que percebemos em um primeiro plano visual diz respeito a sua forma com-

posicional.

O texto A, sendo uma propaganda, apresenta elementos verbais e não verbais (imagens) que, em

sintonia, compõem um todo enunciativo e produz diferentes sentidos.

O modo como a linguagem é utilizada, fazendo referência a outros textos de domínio público,

exigem do leitor determinado conhecimento para que possa fazer a associação e compreender

a mensagem (subtema 1.7). Sendo mais específico, é preciso que a pessoa saiba a respeito do ro-

mance de Jorge Amado “Dona Flor e seus dois maridos”, popularizado em forma de filme, para

compreender os enunciados verbais “Ela ficou dividida entre dois amores da Hortifruti”, “Couve-

-flor e seus dois maridos”, e “Aqui a natureza é a estrela” e a imagem dos alimentos com uma ca-

beceira de cama. No entanto, a forma composicional, ou a forma como o texto se apresenta para

o leitor já nos diz que ele é uma propaganda, pois conseguimos visualizar os elementos típicos

(marca, produto, frases curtas e atrativas)

Nos textos B e C, diferentemente, a prevalência de uma linguagem verbal organizada em prosa,

de margem a margem, com seus parágrafos demarcados por um recuo (texto B) ou um espaça-

mento maior entre eles (texto C), de um título bem demarcado com fonte maior e centralizado e

do nome do autor logo abaixo, caracteriza uma organização textual (forma composicional) pró-

pria de determinados tipos textuais (narrativos, descritivos, argumentativos).

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UNIDADE 1 :
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Observe:

FRAGMENTO DO TEXTO B

Sentada na varanda da minha casa, observo a fumaça que sai do calorão do asfalto. É o
tempo da seca! E meus olhos experientes veem uma paisagem bem diferente daquela do meu
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tempo de infância. Faz tanto tempo! Mas a saudade insiste em bater e trazer recordações.
Nasci numa fazenda do município de Catalão, tinha uma vida simples e tranquila. Meu pai
cuidava da roça, do gado, e mamãe, da casa, da comida e da educação dos filhos. Meus irmãos e

FRAGMENTO DO TEXTO C

[...] revolução é o progresso técnico, obtido em razão do desenvovilmento científico e baseado na


importância obtida pela tecnologia, a chamada ciência da produção.

indispensável à produção e ao intercâmbio e fundamento do consumo, em suas novas formas.

Graças às novas técnicas, a informação pode se difundir instantaneamente por todo o planeta, e o
conhecimento do que se passa em um lugar épossível em todos os [...]

No entanto, para identificarmos mais detidamente qual gênero textual corresponde à forma

composicional e quais as outras propriedades específicas (tema e estilo) é imprecindível a leitura

de seu conteúdo para sabermos. Em relação a isso, traremos uma abordagem mais detalhada

nos subitens 1.2, 1.3 e na unidade 3.

O texto D, pela sua estrutura visual, evidencia uma organização própria de poemas, mas só com

a leitura dele podemos dizer que, mesmo com uma linguagem poética e metafórica, também é

dissertativo, pois introduz a temática da fome, estabelece suas consequência, expõe exemplos,

argumentos e finaliza com proposições (o que é típico de textos dissertativos-argumentativos).

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UNIDADE 1 :
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Veja:

INTRODUZ DA TEMÁTICA: ARGUMENTA:


Introduzo na poesia Não é uma bomba limpa:

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A palavra diarréia. é uma bomba suja e mansa
Não pela palavra fria que elimina sem barulho
Mas pelo que ela semeia. vários milhões de crianças.

Quem fala em flor não diz tudo. Quem faz café virar dólar
Quem me fala em dor diz demais. e faz arroz virar fome
O poeta se torna mudo é o mesmo que põe a bomba
sem as palavras reais. suja no corpo do homem.

PROPÕE INTERVENÇÃO:
EXEMPLIFICA: Mas precisamos agora
Por exemplo, a diarréia, deter o sabotador
no Rio Grande do Norte, que instala a bomba da fome
de cem crianças que nascem, dentro do trabalhador.
setenta e seis leva á morte.

E sobretudo é preciso
É como uma bomba D trabalhar com segurança
que explode dentro do homem pra dentro de cada homem
quando se dispara, lenta, trocar a arma de fome
a espoleta da fome. pela arma da esperança.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Você deve estar se perguntando: Mas é poema, como pode ser dissertativo?

E eu te respondo que sim, o texto D tem a estrutura de um poema, mas o seu conteúdo se orga-

niza em forma de uma dissertação (como exemplifiquei), assim como você já deve ter visto um

poema em tom narrativo, ou alguma letra de música com tom de protesto. Na unidade 4, ao tra-

zermos a temática específica dos gêneros textuais e tipologias abordamos isso mais a fundo. Se

ficou curioso, vale a consulta!


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O texto E com forma composicional própria e diferente dos demais textos também é representa-

tivo de um estilo de gênero. Porém, para nos certificarmos de a qual gênero textual ele se refere,

faz-se necessária a leitura. Só depois de faze-la e levando em consideração nossas experiências

textuais é que podemos concluir que se trata de uma notícia, pois além do título, apresenta um

pequeno texto colocado em destaque - que na linguagem jornalística é chamado de lide - com

informações básicas sobre o conteúdo.

EM SÍNTESE:
Os textos têm um modo de organização específico que pode ser identificado a partir dos co-

nhecimentos prévios. Podemos identifica-los num plano visual, ou quando procedemos com a

leitura, num plano de conteúdo.

Para quem ainda não aprofundou o conhecimento acerca das características dos diferentes gê-

neros textuais que circulam na sociedade, terá a oportunidade de fazê-lo com os estudos da uni-

dade 3 deste Livro Digital: “Os gêneros textuais e tipologia”.

Seguindo com a unidade temática 1, avançamos para os próximos subtemas nos quais retomare-

mos esses textos, ampliando o que foi exposto até o momento, uma vez que os conteúdos desta

unidade estão intimamente relacionados.

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UNIDADE 1 :
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1.2 CONTEÚDO GLOBAL E ATRIBUIÇÃO COERENTE DE TÍTULO, DE DIVISÃO


PARAGRÁFICA DE UM TEXTO E DE OUTRAS NORMAS DE APRESENTAÇÃO
Se você já realizou alguma prova de concurso ou, até mesmo, o Enem, deve ter reparado que a

questão discursiva, aquela em que você tem que escrever um texto, geralmente dissertativo-ar-

gumentativo (mais comum nesses exames) apresenta uma coletânea de textos para que, a partir

deles, você desenvolva o seu.

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Essa coletânea, na verdade, traz diversas abordagens sobre um tema com o intuito de oferecer

ao candidato subsídios para a construção de seus próprios argumentos e defesa de seu ponto de

vista (tese).

Agora imagine que você se deparou com a proposta da professora de “Formação Geral”, de es-

crever sobre educação ambiental/ ecologia/biodiversidade. Nota-se que o tema gerador é muito

amplo, mas se considerarmos o contexto de queimadas na Amazônia, podemos trazer uma te-

mática específica, organizando uma ideia por vez, sem perder o todo enunciativo. Daí decorrem

os principais elementos para a construção de um texto: o tema, o título e o parágrafo.

Nem sempre os textos apresentam a temática de forma explícita. Muitas vezes, é preciso ler o

texto por completo para compreender o seu conteúdo global.

Identificar o conteúdo global de um texto, portanto, é responder à pergunta:

O texto trata de quê?

Responder a essa pergunta também é uma atribuição do título do texto que deve resumir as

ideias apresentadas de forma atrativa, com vistas a despertar no leitor o desejo de proceder com

a leitura. Logo, a principal diferença entre tema e título é que o tema corresponde a um conteúdo

mais amplo, enquanto o título sintetiza as ideias gerais do texto.

Ainda, para que nossas ideias se apresentem com mais clareza, precisamos organizá-las uma por

vez, por meio dos parágrafos, que precisam ser construídos de modo claro e coerente, ou seja,

as ideias devem estar relacionadas a temática principal, articuladas em si. Afinal, é muito ruim

quando lemos um texto que muda bruscamente de assunto ou que “não diz coisa com coisa”,

não é mesmo?

Feitas essas considerações que podemos chamar de teóricas sobre tema, título e parágrafo, ve-

jamos como isso se materializa de forma harmoniosa, retomando o texto B, “Valor de Infância”.
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UNIDADE 1 :
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VALOR DE INFÂNCIA
Sentada na varanda da minha casa, observo a fumaça que sai do caldo do asfalto. É o tem-
po da seca! E meus olhos experientes veem uma paisagem bem diferente daquela do meu tempo
de infância. Faz tanto tempo! Mas a saudade insiste em bater e trazer recordações.
Nasci numa fazenda do município de Catalão, tinha uma vida simples e tranquila. Meu
pai cuidava da roça, do gado, e mamãe, da casa, da comida e da educação dos filhos. Meus irmão
e eu tivemos uma infância ingênua, sem riquezas ou luxo, mas havia uma alegria de viver muito
grande, principalmente na hora da diversão. A noite, subindo em pedaços de galhos cortados em
forma de forquilha, brincávamos de perna de pau e assim éramos palhaços no nosso circo imagi-
nário; o aplauso era o zunzum de grlos e cigarras e o céu, a lona pretacheia de furinhos iluminados.
A casa, de estilo bem antigo, fica à sombra de flamboyants e tinha um pomar que adoçava
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minha infância: mangas, carambolas, laranjas, jabuticabas pretinhas! Ali, a sinfonia dos passaru-
nhos alegrava nosso dia. E bastava andar um pouco mais pelos arredores da fazenda para encon-
trar as mais coloridas e doces frutas do Cerrado. Eu me lambuzava com as mangabas, muricis,
gabirobas...uma delícia! Naquela época, a infância tinha muito mais sabor!
Mas o que eu mais gostava de fazer era tomar banho no riacho que ficava nos fundos da
minha casa. A água era sempre limpa e fresquinha e lá meu irmão tentava me ensinar a nadar.
Ele dizia que bastava engolir um lambari vivo que eu iria a aprender rapidinho, mas eu nunca tive
essa coragem. O riacho era passagem para outtras fazendas e para a escola e, ao fazer a travessia,
precisávamos nos equilibrar na pinguela - tronco que servia de ponte. Quando alguém caía, tchi-
bum... aproveitava para se refrescar nas águas cristalinas.
Íamos a pé para a escola, juntos com os filhos dos vizinhos, e o caminho era o nosso par-
que de diversão, principalmente quando chovia, pois, descalços, brincávamos de chutar a água
empoçada uns aos outros, e todos virávamos piratas nas canoinhas de papel que deixávamos a
enxurrada levar.
Certa noite, estávamos dormindo e o galo já começava os avisos do dia, quando, de re-
pente, ouvimos foguetes e cantoria: era uma "treição". Isso acontecia toda vez que os vizinhos e
amigos se juntavam e, de surpresa, chagavam à casa de alguém para ajudar a fazer alguma ta-
refa mais difícil. No nosso caso, era a reconstrução do rego d'água. Enquanto os homens ficavam
naquela labuta, as mulheres preparavam as comidas. O cheiro do pequi era o sinal de almoço na
mesa, que tinha também frango, angu, quiabo frito, arroz e tutu de feijão. No fim da tarde, o som
da sanfona chamava para encerrar o serviço e o forró levantava a poeira na pista de chão batido.
As festas de roça alegravam a vida das pessoas. Eram feitas em ranchões, cobertos co
folhas de coqueiro e iluminadas por lamparinas. Minha mãe preparava e doava pratos deliciosos
- as prendas - que eram disputados na hora do leilão. Vestidos com roupas de chita, íamos com a
intenção de dançar a noite inteira, mas, quando acabava o querosene das lamparinas, a escuridão
colocava fim à festa daquela noite.E era só esperar pela próxima...
A vida simples na roça me ensinou a dar valor a essas reuniões de amigos e de familiares, a
respeitar os mais velhos, a pedir a benção aos pais até na hora de dormir, a dar a palavra em nome
da honra, e me ensinou também que a história da nossa vida se mistura à história do nosso lugar.
Hoje, muito desses valores já não existem. E os lugares também não existem.
Depois de muitos anos, voltei à fazenda à fazenda onde nasci. esperava encontrar, ao me-
nos, as paredes da velha casa, alguma árvore do pomar ou então saborear as doçuras do Cerrado,
tudo numa tentativa de encontrar ali um restinho da minha antiga felicidade. Não restou nenhu-
ma árvore e o riacho banhou minha infância estava morrendo, quase seco. O meu lugar se foi e
agora só existe em minha memória.
Se tem um desejo?
Voltar aos tempos de criança e viver tudo de novo!
(Elissama Miller da Silva Mota)

Observe, com as partes destacadas em amarelo no texto, que a temática de memórias de infân-

cia e da mudança de valores em tempos de globalização é bem sintetizada pelo título escolhido

pela autora e que no decorrer de todo o memorial ela é sempre retomada para garantir um todo

coerente.

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UNIDADE 1 :
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E os parágrafos?

Observe como cada um deles aborda um assunto diferente (tópico discursivo), mas relacionado

ao tema central:

» 1º PARÁGRAFO:

Introduz a temática relacionando o que vê na cidade com o que via na fazenda na

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infância, em tempo de seca.

» 2º PARÁGRAFO:

Descreve como era a vida em família, na fazenda do Catalão.

» 3º PARÁGRAFO:

Descreve como eram os sabores da infância com a localização da casa em meio a um pomar.

» 4º PARÁGRAFO:

Descreve o que gostava de fazer e como era o riacho.

» 5º PARÁGRAFO:

Descreve como era a ida para a escola com os amigos.

» 6º PARÁGRAFO:

Relata uma “treição” ocorrida com sua família.

» 7º PARÁGRAFO:

Descreve como eram as festas na roça.

» 8º PARÁGRAFO:

Reflete sobre o que aprendeu com a vida na roça.

» 9º PARÁGRAFO:

Relata a volta à fazenda depois de alguns anos e as expectativas com o reencontro.

» 10º PARÁGRAFO:

Composto por uma única frase interrogativa – Indaga.

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UNIDADE 1 :
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» 11º PARÁGRAFO:

Também composto por uma única frase declarativa – Responde a sua própria inda-

gação.

Viu como eles mudam de assunto mantendo a fidelidade ao tema do texto?

Essa é uma estratégia para se manter a unidade temática por meio do que chamamos de pro-
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gressão tópica. Contudo, vejamos outras estratégias de manutenção da unidade temática e de

sua progressão.

1.3 ESTRATÉGIAS DE MANUTENÇÃO DA UNIDADE TEMÁTICA DO TEXTO E DE


SUA PROGRESSÃO
De acordo com Koch e Elias (2012) um texto com enunciados relevantes para o desenvolvimento

do tema é um texto coerente (detalhamento na unidade 4). Portanto, para se manter a unidade

temática e a progressão textual é preciso:

» Utilizar termos de um mesmo campo lexical;

» Utilizar adequadamente os conectivos de ligação que dão o encadeamento ao texto (de-

talhamento na unidade 4);

!
CAMPO LEXICAL
DE UM MESMO RADICAL:
Exemplo:

Pedra, Pedregulho, Pedreira, Pedrada...

CAMPO LEXICAL POR ÁREA:


Exemplo:

Informática, Web, Programas, Sites, Software,

Byte...

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UNIDADE 1 :
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Retorne ao texto B “Valor da infância” e observe que a palavra “infância”, bem como outras desse

campo lexical são recorrentes (marcações em verde).

1.4 RELAÇÃO ENTRE INFORMAÇÕES DO TEXTO E CONHECIMENTOS PRÉVIOS


Quando dissemos que em uma prova de concurso ou Enem é apresentado ao candidato uma co-

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letânea de textos sobre a temática em questão para que ele desenvolva a escrita, estamos dizendo

que é preciso ter o que dizer para dizer. Afinal, qualquer um teria dificuldade em escrever sobre

algo que não conhece, não é verdade? Por isso, é ofertado um mínimo de conteúdo sobre o tema

para que o candidato que não tenha conhecimento do tema, consiga elaborar um texto e para o

que conheça consiga ampliar e desenvolver seu texto de acordo com a proposta da questão.

Da mesma forma ocorre em relação a leitura. Quando lemos algum texto que trata de um assunto

que conhecemos a compreensão fica muito mais fácil. Ao contrário, quando lemos a respeito de um

assunto que nunca, ou pouco vimos, precisamos fazer um esforço muito maior para compreendê-lo.

Isso está relacionado aos conhecimentos prévios ou às informações que temos guardadas em nos-

sa mente e que acionamos quando precisamos. Esses conhecimentos prévios podem ter sido ad-

quiridos a partir da vivência, das leituras que fizemos, da relação com o outro, enfim. O interessante

é que todo esse conhecimento armazenado sempre se renova, se amplia, se modifica, ou até mes-

mo se perde (esquecemos) se não for acionado. Eles são fundamentais, pois contribuem para que

possamos fazer inferências, ou seja, para que possamos construir compreensões a partir do que

não está explícito no texto e tirarmos conclusões.

"
No livro “Texto e leitor – aspectos cognitivos da leitura”, Ângela Kleiman (2002, p.13) afirma que

A compreensão de um texto é um processo que se caracteriza

pela utilização de conhecimento prévio: o leitor utiliza na leitura

o que ele já sabe, o conhecimento adquirido ao longo de sua

vida.

" 21
UNIDADE 1 :
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E destaca três tipos de conhecimentos prévios:

» O linguístico (referente ao que já se sabe sobre a língua, suas construções enunciativas);

» O textual (referente ao que já se sabe sobre as propriedades específicas dos textos)

» O de mundo (referente ao que se sabe sobre os mais diferentes assuntos).


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Façamos um exercício com o texto E:

Você assistiu a
noticiários na TV
sobre isso? Leu
alguma coisa na
internet ou redes
sociais?

O que são focos


de calor?

O que é isso?

O que dá para
concluir com isso?

1.5 IDENTIFICAÇÃO DAS PALAVRAS E IDEIAS CHAVES DO TEXTO


Identificar palavras chaves em um texto tem muito a ver com a ideia de campo lexical visto no

subitem 1.3. Ao mesmo tempo em que elas colaboram para a manutenção da unidade temática e

progressão do texto, elas indicam e sintetizam a temática. Podem ser palavras ou expressões.

Para exemplificarmos, vamos recorrer ao texto C: “Por uma globalização mais humana”, de Milton

Santos.

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UNIDADE 1 :
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Como já abordamos, o título nos ajuda a identificar, inicialmente, o conteúdo global do texto. Logo, fica

fácil perceber que o conteúdo refere-se à “globalização”. Para identificarmos as palavras e ideias chaves,

vamos procura-las buscando responder a seguinte pergunta: O que é globalização, segundo o texto?

Observe as palavras que marcamos, em verde, na reprodução abaixo:

POR UMA GLOBALIZAÇÃO MAIS HUMANA

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Milton Santos

A globalização é o estágio supremo da internacionalização. O proceso de intercâmbio entre países,


que marcou o desenvolvimento do capitalismo desde o período mercantil dos séculos 17 e 18, expan-
de-se com a industrialização ganha novas bases com a grande indústria, nos fins do seculo 19, e, agora,
adquire mais intensidade, mais amplitude e novas feições. O mundo inteiro trna-se envolvido em todo
tipo de troca: técnica, coercial, financeira, cultural.

Vivemos um novo período na história da humanidade. A base dessa verdadeira revolução é o progresso
técnico, obtido em razão do desenvolvimento científico baseado na importância obtida pela tecnologia,
a chamada ciência da produção.

Todo o planeta é praticamente coberto por um único sistema técnico, tornado indispensáve à produ-
ção e ao intercâmbio e fundamento do consumo, em suas novas formas.

Graças às novas técnicas, a informação pode se difundir instantaneamente por todo o planeta, e o co-
nhecimento do que se passa em um lugar é possível em todos os pontos da Terra.

A produção globalizada e a informação globalizada permitem a emergência de um lucro em escala


mundial, buscado pelas firmas globais que constituem o verdadeiro motor da atividade econômica.

Tudo isso é movido por uma concorrência superlativa entre os principais agentes econômicos - a competitividade.

Num mundo assim transformado, todos os lugares tendem a tornar-se globais, e o que acontece em qual-
quer ponto do ecúmeno (parte habitada da Terra) tem relação com o acontece em todos os demais.

Daí a ilusão de vivermos num mundo sem fronteiras, uma aldeia global. Na reaidade, as relações cha-
madas globais são reservadas a um pequeno número de agentes, os grandes bancos e empresas
transnacionais, alguns Estados, as grandes organizações internacionais.

Infelizmente, o estágio atual da globalização está produzindo ainda mais desigualdades. E, ao contrá-
rio do que se esperava, crescem o desemprego, a pobreza, a fome, a insegurança do cotidiano, num
mundo que se fragmenta e onde se ampliam as fraturas sociais.

A droga, com sua enorme difusão, constitui um dos grandes flagelos desta época.

O mundo parece, agora, girar sem destino. É a chamada globaização perversa. Ela está sendo tanto
mais perversa porque as enormes possibilidaes oferecidas pelas conquistas científicas e técnicas não
estão sendo adequadamente usadas.

Não cabe, todavia, perder a esperança porque os progressos técnicos obtidos neste fim de século 20,
se usados de uma outra maneira, bastariam para reproduzir muito mais alimentos do que a popua-
lação atual necessita e, aplicadoa à medicina, reduziriam drasticamente as doenças e a mortalidade.

Um mundo solidário produzirá muitos empregos, ampliando um intercâmbio pacífico entre os povos
e eliminando a belicosidade do processo competitivo, que todos os dias reduz a mão-de-obra. É pos-
sível pensar na realização de um mundo de bem-estar, onde os homens serão mais felizes, um outro
tipo de globalização.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Veja que procuramos por palavras que respondessem sinteticamente à pergunta ou que fossem

do mesmo campo lexical de “globalização”.

Depois de marcarmos as palavras ou expressões relativas ao tema do texto, com nossos conhe-

cimentos prévios (linguísticos, textuais e de mundo) e com os adquiridos com a leitura do texto,

podemos concluir que a globalização está relacionada à internacionalização, à produção industrial


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que promove um consumo excessivo e uma competitividade que reforça desigualdades e que é

perversa.

Diante disso, como palavras chaves que sintetizam as ideias do texto podemos elencar: internaciona-

lização; intercâmbio; industrialização; competitividade; processos técnicos; consumo; desigualdades.

1.6 ASPECTOS SEMÂNTICOS DO VOCÁBULO DA LÍNGUA (NOÇÕES DE POLIS-


SEMIA, SINONÍMIA, ANTONÍMIA, HIPERONÍMIA, PARONÍMIA E CAMPO SE-
MÂNTICO)
Pelo que estamos vendo, os subitens apresentados até aqui, em certa medida, tratam das relações

semânticas que contribuem para uma leitura, uma análise e uma interpretação mais eficiente de

um texto. Mas ainda tem alguns outros aspectos que são importantes conhecermos e diferen-

ciarmos, tendo em vista que eles contribuem para a construção de sentidos, para o efeito estilís-

tico e para a coerência dos textos.

Como já foi explicado o que é campo lexical, explicarei agora o que é campo semântico, pois não
"
são a mesma coisa. Embora parecidos, apresentam distinções significativas. Para facilitar, vejamos

os conceitos de léxico e semântica, segundo Cegalla (2010):

Léxico: é o conjunto de palavras utilizadas, de forma compreen-

sível, em uma língua.

Semântica: trata da significação das palavras. Pode ser descri-

tiva ou histórica. A semântica descritiva estuda a significação

atual das palavras; a histórica se ocupa da evolução do sentido

das palavras através do tempo

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"
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Pronto! Agora diferenciamos:

CAMPO LEXICAL CAMPO SEMÂNTICO

Diferentes palavras per- Diferentes sentidos atribu-

tencentes a um mesmo ídos a uma palavra.

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campo/área de conheci-

mento

CAMPO LEXICAL CAMPO SEMÂNTICO


DE ESCOLA: DE GUARDA:

Aluno, professor, diretor, Proteção, tutela, vigilante,

coordenador, sala de aula, preservar, esconder etc.

aula, recreio, intervalo,

livros, cadernos etc.

Outros conceitos importantes:

» POLISSEMIA:

Mais de um significado para uma palavra.

Exemplo: manga - fruta ou parte do braço de uma camisa.

» SINONÍMIA (OU SINÔNIMO):

Sentido igual ou aproximado para uma palavra.

Exemplo: justo – certo, exato, reto, íntegro, imparcial.

» ANTONÍMIA (OU ANTÔNIMO):

Sentido oposto a uma palavra.

Exemplo: progredir – regredir

» HIPERONÍMIA (OU HIPERÔNIMO):

Sentido mais abrangente atribuído a uma palavra em seu campo semântico.

Exemplo: vestuário – camisas, calças, meias, vestidos, etc.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

» PARONÍMIA (OU PARÔNIMO):

Pares de palavras parecidas na pronúncia e na escrita.

Exemplo: Cesta e sexta / Descrição e discrição

Coro e couro / Cético e séptico

Comprimento e cumprimento / Ratificar e retificar


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A utilização de sinônimos e hiperônimos, na atividade de escrita, cumpre o objetivo de fazer refe-

rência a algo, a alguém, a fatos, a eventos, a sentimentos (referenciação), sem ser repetitivo, e man-

tem a retomada aos referentes, para se manter o foco.

Observe como no trecho do texto C, a seguir, a temática da globalização é retomada com o uso de sinônimos:

[...]

Num mundo assim transformado, todos os lugares tendem a tornar-se globais, e o que acontece
em qualquer ponto do ecúmeno (parte habitada da Terra) tem relação com o que acontece em
todos os demais.

Daí a ilusão de vivermos num mundo sem fronteiras, uma aldeia global. Na realidade, as relações
chamadas globais são reservadas a um pequeno número de agentes, os grandes bancos e empre-
sas transnacionais, alguns Estados, as grandes organizações internacionais.

[...]

E como no mesmo trecho o autor faz uso do hiperônimo com a expressão "organização interna-
cionais" referindo-se "... a um pequeno número de agentes, os grandes bancos e empresas trans-
nacionais..."

[...]

Daí a ilusão de vivermos num mundo sem fronteiras, uma escala global. Na realidade, as relações
chamadas globais são reservadas a um pequeno número de agentes, os grandes bancos e empre-
sas transnacionais, alguns Estados, as grandes organizações internacionais.

Seguimos com a leitura, análise e interpretação de textos dando uma atenção especial à intertex-

tualidade.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

1.7 RELAÇÃO DO TEXTO COM OUTROS TEXTOS (INTERTEXTUALIDADE)


Até agora vimos que os textos possuem uma forma, revelam um estilo e carregam um conteúdo.

É nesse plano do conteúdo que o diálogo, ou a referência a outro enunciado aparece, formando o

que chamamos de intertextualidade.

Fica fácil de lembrar se fizermos a seguinte associação:

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intertextualidade - interação

intertextualidade - entre os textos

Todos nós carregamos uma bagagem vivencial que nos permite fazer comparações de uma coisa

à outra, associar vários elementos de um mesmo campo conceitual/temático, completar informa-

ções que se evidenciam incompletas, fazer avaliações que vão ao encontro de nossos gostos, dese-

jos, sentimentos e tirar conclusões daquilo que vivemos. Tais habilidades cognitivas também são

acionadas quando lemos e/ou escrevemos um texto.

Quantas vezes você já leu ou viu algo que te fez lembrar de uma outra coisa (outra história

que leu, algum acontecimento vivido por você ou que ficou sabendo)?

Isso é muito comum, pois estamos rodeados de textos e vivemos no mundo da linguagem.

Portanto, a intertextualidade nos permite atribuir novos sentidos ao texto, fazer relações de um

com outro e é um recurso discursivo que o potencializa e ao mesmo se arrisca na incompreensão,

caso o leitor não tenha a experiência com outras leituras do campo temático abordado. Quantas

vezes também você já leu ou viu algo do qual não entendeu nada? Isso também é muito comum,

pois nem sempre temos a bagagem vivencional sobre os mais variados temas.

As propagandas usam a intertextualidade de forma implícita e explícita com o intuito de seduzir o

leitor/consumidor, bem como vimos no texto A. E todos os enunciados podem ser relacionados a

outro se considerarmos que eles nunca são novos. Observe as imagens abaixo e as intertextualida-

des presentes nelas.

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LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS
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Quais relações você estabelece? Anote-as:

1.8 FUNÇÕES DA LINGUAGEM


Sempre que nos comunicamos (e fazemos isso por meio da linguagem) temos um objetivo, uma

intenção, uma finalidade. Logo, somos um emissor ou destinador, que dirige uma mensagem (con-

junto de informações) referente a algo (situação, contexto), a alguém (receptor ou destinatário), por

meio de um canal de comunicação (meio físico que permite a comunicação: televisão, rádio, jornal,

revista, telefone, etc.) e de um código específico (escrita, fala, sinais...).

Portanto, emissor, receptor, código, mensagem, referente e canal são elementos constitutivos do ato

da comunicação, segundo o linguista Roman Jakobson, que embasaram Teoria da Comunicação.

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A partir desses elementos da comunicação e acordo com as nossas intenções, configuram-se seis

funções da linguagem:

» CONATIVA (OU APELATIVA)

Palavra-chave: Receptor, pois tem como objetivo influenciar o receptor ou destinatário, com

a intenção de convencê-lo de algo ou dar-lhe ordens.

É a linguagem usada nos discursos, sermões e propagandas que se dirigem diretamente ao

receptor, fazendo uso de vocativos e imperativo.

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» FUNÇÃO APELATIVA:

Proibido fumar ou Não fume! e Não compartilhe a sua senha!

» EMOTIVA

SAMBA EM PRELÚDIO
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Eu sem você
Não tenho porquê
Porque sem você
Não sei nem chorar
Sou chama sem luz
Jardim sem luar
Luar sem amor
Amor sem se dar.
[...]
Vinícius de Moraes

Palavra-chave: Emissor, pois reflete as emoções e os sentimentos do emissor. O uso de reti-

cências, sinal de exclamação e interjeições são indicativos dessa função da linguagem.

» FÁTICA

Palavra-chave: canal, pois tem como foco principal o contato entre o emissor e o receptor.

Coloca em evidência o canal, ou seja, o meio pelo qual acontece a comunicação.

É utilizada nas conversas telefônicas, saudações entre pessoas e cumprimentos.

“(...) Olá, como vai ?


Eu vou indo e você, tudo bem ?
Tudo bem eu vou indo correndo
Pegar meu lugar no futuro, e você ?
Tudo bem, eu vou indo em busca
De um sono tranquilo, quem sabe …
Quanto tempo...
[...]

(Trecho da música Sinal Fechado, de Paulinho da Viola).

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» METALINGUÍSTICA

Palavra-chave: Código, pois refere-se à explicação de um código usando o próprio código. É

típica das gramáticas e dicionários que utilizam a escrita para falar das regras ou significados

dela própria.

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» POÉTICA

Palavra-chave: mensagem, pois refere-se a forma como se empregou a linguagem com o

objetivo de torna-la diferente, surpreendente, com expressões fora das habituais, fugindo da

lógica e até mesmo provocando humor.

Diferentemente da função emotiva que tem como objetivo emocionar o leitor, a função po-

ética se importa mais com a mensagem em si e a forma de como ela será transmitida. As

palavras são usadas no sentido figurado (sobre sentido figurado ver Unidade 2).

É utilizada na literatura e comumente encontrada na publicidade.

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» REFERENCIAL (OU DENOTATIVA)

Palavra-chave: Referente, pois refere-se objetivamente a uma informação da realidade, dan-

do prioridade a fatos concretos. Coloca em evidencia o assunto.

É utilizada nas notícias de jornal, em discursos científicos, em textos dissertativos, ou qual-

quer enunciado que faça exposição de conceitos ou circunstâncias.

Observe que, na manchete da notícia, o foco está no assunto “redução do pó preto”, ou seja, no

referente.

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Em síntese:

FUNÇÃO DA LINGUAGEM ÊNFASE OBJETIVO

Conativa Receptor Convencer o Receptor


Emotiva Emissor Expressar ponto de Vista
Fática Canal Testar a Eficácia do Meio
Metalinguística Código Explicar o Próprio Código

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Poética Mensagem Valorizar o Texto
Referencial Referente Transmitir Informação

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UNIDADE 1 :
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RESUMO
Os textos têm um modo de organização específico que pode ser identificado em um

plano visual e em um plano de conteúdo.

Os principais elementos para a construção de um texto são:


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» Tema,

» Título e

» Parágrafo.

O tema corresponde a um conteúdo mais amplo, enquanto o título sintetiza as ideias

gerais do texto.

Os parágrafos precisam ser construídos de modo claro e coerente, articulados com a

temática principal do texto.

A utilização de termos de um mesmo campo lexical e o uso adequado dos conectivos

de ligação que dão o encadeamento ao texto são fundamentais para se manter a uni-

dade temática e a progressão textual.

Os conhecimentos prévios são as informações que temos guardadas em nossa mente

e que acionamos quando precisamos.

Eles podem ser:

» Linguístico,

» Textual e

» De mundo.

As palavras chaves colaboram para a manutenção da unidade temática e progressão

do texto, bem como indicam e sintetizam a temática.

» POLISSEMIA:

Mais de um significado para uma palavra.

(banco = instituição financeira e assento)

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UNIDADE 1 :
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» SINONÍMIA:

Sentido igual ou aproximado para uma palavra

(preto = negro)

» ANTONÍMIA:

Sentido oposto a uma palavra

Material para uso exclusivo dos alunos da Rede de Ensino Doctum. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da lei.
(frio – quente)

» HIPERONÍMIA:

Sentido mais abrangente atribuído a uma palavra em seu campo semântico (animal = gato,

leão, cobra...)

» PARONÍMIA:

Pares de palavras parecidas na pronúncia e na escrita.

(cavaleiro – cavalheiro)

» INTERTEXTUALIDADE:

Influência e/ou relação entre diversos textos.

FUNÇÕES DA LINGUAGEM expressam as intenções dos falantes da língua, podendo ser:


» CONATIVA:

Quando o objetivo é convencer e foco está no receptor.

» EMOTIVA:

Quando o objetivo é expor a emoção e o foco é no emissor.

» FÁTICA:

Quando o objetivo é testar o meio de comunicação e o foco está no canal.

» METALINGUÍSTICA:

Quando o foco é a própria linguagem e o foco é no código.

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UNIDADE 1 :
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» POÉTICA:

Quando o objetivo é valorizar o texto e o foco está na mensagem.

» REFERENCIAL:

Quando o objetivo é informar e foco está no referente.


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LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

REFERÊNCIA:

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992.

CEGALLA, Domingos Pascoal. Novíssima gramática da língua portuguesa.48ª edição

Material para uso exclusivo dos alunos da Rede de Ensino Doctum. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da lei.
revista. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2010.

GERALDI, João Wanderley. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

GULLAR, Ferreira. Melhores poemas de Ferreira Gullar. Seleção e apresentação de Al-

fredo Bosi. 7 ed. Ver. E ampliada. São Paulo: Global, 2004.

JAKOBSON, Roman. Linguística e Comunicação. São Paulo: Cultrix, 1971.

KLEIMAN, Ângela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. Campinas: Pontes, 2002.

KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: estratégias de produção

textual. 2 ed., 1ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2012.

OLIVEIRA, Luciano Amaral (org.). Estudos do discurso: perspectivas teóricas. São Paulo:

Parábola Editorial, 2013.

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