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FORMAÇÃO GERAL

PROF. GISELE SANTOS DE NADAI


SUMÁRIO:
1 LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIA-
DOS AOS TEMAS GERAIS
(Educação Ambiental, Ecologia/Biodiversidade, Globalização, Políticas

Públicas, Segurança, Violência, Relações Étnico-Raciais, Informação E

Comunicação)
1.1 Análise de diferentes textos buscando identificar propriedades

específicas dos seus modos de organização 10

1.2 Conteúdo global e atribuição coerente de título, de divisão para-

gráfica de um texto e de outras normas de apresentação 17

1.3 Estratégias de manutenção da unidade temática do texto e de

sua progressão 20

1.4 Relação entre informações do texto e conhecimentos prévios 21

1.5 Identificação das palavras e ideias chave do texto 22

1.6 Aspectos semânticos do vocábulo da língua (noções de polissemia,

sinonímia, antonímia, hiperonímia, paronímia, campo semântico) 24

1.7 Relação do texto com outros textos (intertextualidade) 27

28

2
1.8 Função da Linguagem

SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUA-


GEM ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO
(Direitos Humanos, Cidadania, Violência, Responsabilidade Social, Inclu-

são/Exclusão, Vida Urbana E Rural)

2.1 Denotação e Conotação 41

2.2 Denotação e conotação 42

2.3 Figuras de linguagem 42


3 GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA (DIFERENÇAS) ASSOCIADOS
AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO
(Arte E Cultura, Avanços Tecnológicos, Ciência, Tecnologia E Inovação, De-

senvolvimento Sustentável, Relações De Trabalho)


3.1 A noção de gênero e tipos textuais 55
3.2 A descrição dos gêneros e dos tipos textuais 56
3.3 Os modos de organização da composição textual (tipos textuais

narrativo, descritivo, argumentativo, injuntivo, dialogal) 59

4 CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E


COERÊNCIA) ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO
(Responsabilidade Social: Setor Público, Privado E Terceiro Setor, Globali-

zação E Geopolítica, Políticas Públicas: Educação, Habitação, Saneamen-

to, Saúde, Transporte, Segurança, Defesa, Desenvolvimento Sustentável)


4.1 Coesão 79

4.2 Coerência 80

4.3 Procedimentos de coesão por substituição gramatical e lexical 81

4.4 Relações coesivas e semânticas entre as palavras, orações, perí-

odos ou parágrafos, promovidas pro conectivos ou sequenciadores 83

4.5 Reconhecimento da organização da macroestrutura semântica de

articulação como: adição, explicação, conclusão, oposição, restrição,

temporalidade, finalidade, comparação, alternância, concessão, etc 85


5 CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO
ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO
(Sociodiversidade: Multiculturalismo, Tolerância, Inclusão/Exclusão, Rela-

ções De Gênero, Violência)


5.1 Indução 94

5.2 Dedução 96

5.3 Argumentos dedutivos válidos 98

5.4 Sofisma ou falácias 99


101

6
5.5 Inferências

ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TE-


MAS GERAIS DE ESTUDO
(Tecnologias Da Informação E Comunicação, Relações Étnico-Raciais E His-

tória Da Cultura Afro-Brasileira E Indígena)


6.1 A tese e seus argumentos de sustentação e/ou refutação 107
6.2 A citação como elemento argumentativo 109
6.3 Os conectivos e expressões adverbiais com valor argumentativo 111
INTRODUÇÃO

A disciplina FORMAÇÃO GERAL aborda conteúdos relativo à linguagem:

» Noções de linguagem, texto e discurso.

» Prática de leitura e de produção de textos.

» Processos de leitura e produção de textos.

» Análise crítica e reflexiva.

» Avaliação de consequências a partir de escolhas valorativas. Informações implícitas, pres-

supostos e subtendidos.

» Argumentação na interpretação.

» Gêneros textuais

de forma articulada com temáticas gerais de estudo:

» Arte e cultura;

» Avanços tecnológicos;

» Ciência, tecnologia e inovação;

» Direitos Humanos;

» Democracia, ética e cidadania;

» Educação Ambiental, Ecologia / biodiversidade;

» Globalização e geopolítica;

» Políticas públicas: educação, habitação, saneamento, saúde, transporte, segurança, defe-

sa, desenvolvimento sustentável;

» Relações de trabalho;

» Responsabilidade social: setor público, privado, terceiro setor; sociodiversidade: multicul-

turalismo, tolerância, inclusão/exclusão, relações de gênero;

» Tecnologias de Informação e Comunicação;

» Vida urbana e rural;

» Violência;

» Relações Étnico-raciais e História; e

» Cultura Afro-brasileira e indígena.

Desse modo busca contribuir para formação de profissionais capazes de

• Demonstrar competência na leitura, compreensão e elaboração de textos;

• Demonstrar capacidade para comunicar-se com precisão;


» Desenvolver a capacidade de trabalhar em grupos de caráter interdisciplinar;

» Apreender conceitos deontológicos-profissionais e desenvolver perspectivas transversais

sobre direitos humanos.

Com metodologias que associam teoria e prática, recorre a práticas didático-pedagógicas que

valorizam a participação, a socialização, a reflexão e a criticidade dos estudantes, disponibilizando

um conjunto de textos comentados e indicações de pesquisa, oportunizando momentos de troca

de aprendizagens e avaliação dos conhecimentos adquiridos.


SOBRE O PROFESSOR

GISELE SANTOS DE NADAI

Doutoranda em Educação pelo Programa de Pós Gradu-

ação em Educação - PPGE da UFES, na linha de pesquisa

Educação e Linguagens.

Mestra em Educação pelo mesmo Programa e Uni-

versidade (2013).

Pós Graduada em Gestão Escolar (SABERES - 2008).

Graduada em Letras/Português (CESV- 2006), em Pedago-

gia (MULTIVIX - 2013) e em Artes Visuais (EAD - UFES, 2018).

Professora dos anos iniciais do Ensino Fundamental no

Município de Serra ES e do Ensino Superior no curso de

Pedagogia da Faculdade Estácio de Sá de Vitória - ES.

Atuou como tutora em disciplinas do curso de Letras e

de Complementação Pedagógica à distância pelo IFES e

em disciplinas no curso de formação PROFUNCIONÁRIO

do CEFOR/IFES.

Integra o Grupo de Estudos e Pesquisa em Apropriação

da Língua Portuguesa - GEPALP e o grupo de pesquisa

"Alfabetização, Leitura e Escrita" do NEPALES / UFES.


1 1.1
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE
TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Análise de diferentes textos buscando identificar propriedades

específicas dos seus modos de organização 10


1.2 Conteúdo global e atribuição coerente de título, de divisão para-

gráfica de um texto e de outras normas de apresentação 17


1.3 Estratégias de manutenção da unidade temática do texto e de

sua progressão 20
1.4 Relação entre informações do texto e conhecimentos prévios 21
1.5 Identificação das palavras e ideias chave do texto 22
1.6 Aspectos semânticos do vocábulo da língua 24
1.7 Relação do texto com outros textos 27
1.8 Função da Linguagem 28
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Leitura, análise e interpretação de textos são habilidades que precisam ser exercitadas para se-

rem aprimoradas. Portanto, não tem como falarmos delas sem efetivamente lermos ou exercitar-

mos nossa capacidade compreensiva. É preciso engajamento e disposição para compreender-

mos corretamente o que um texto comunica e quais elementos empregados nele contribuem

para que a mensagem chegue de forma clara ao seu interlocutor.


Material para uso exclusivo dos alunos da Rede de Ensino Doctum. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da lei.

O texto como evento sóciocomunicativo torna-se o fio condutor de todas as interações humanas,

apresentando-se de diferentes formas e exigindo dos sujeitos atitudes ativas e o acionamento da

memória e do contexto de vivência para compreensão.

Ele também carrega em si um conteúdo ideológico resultante de uma posição Social, Histórica e

Cultural do seu autor.

É com essa premissa básica que vamos iniciar o primeiro subtema desta unidade que está intrin-

secamente ligado aos demais:

1.1 ANÁLISE DE DIFERENTES TEXTOS BUSCANDO IDENTIFICAR PROPRIEDA-


DES ESPECÍFICAS DOS SEUS MODOS DE ORGANIZAÇÃO
Segundo a teoria bakhtiniana de linguagem, o tema, o estilo e a forma composicional compõem

as propriedades específicas dos textos/enunciados.

O TEMA
sendo o que há de único e irrepetível em cada enunciado.

Por exemplo, quando alguém come algo que gosta e diz “Que delícia!” por

duas vezes, esse mesmo enunciado assume um sentido único em cada

vez que é externado, pois na segunda vez já é um reforço da sua satisfação

O ESTILO
sendo como o modo particular que cada um tem de se enunciar (dada

sua experiência pessoal).

A FORMA COMPOSICIONAL
sendo um estilo dos gêneros, que são “relativamente estáveis”.

10
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Observe os textos a seguir e perceba que eles apresentam propriedades específicas, ou seja, um

modo de apresentação, de formatação e de uso da linguagem, particular.

TEXTO A

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FONTE: https://www.hortifruti.com.br/comunicacao/campanhas/
hollywood/, acesso em 02 out. 2019.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

TEXTO D: A BOMBA SUJA


(Ferreira Gullarw)

Introduzo na poesia É uma bomba-relógio Quem é que rouba a esse homem

A palavra diarréia. (o relógio é o coração) o cereal que ele planta,

Não pela palavra fria que enquanto o homem trabalha quem come o arroz que ele colhe
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Mas pelo que ela semeia. vai preparando a explosão. se ele o colhe e não janta.

Quem faz café virar dólar

Quem fala em flor não diz tudo. Bomba colocada nele e faz arroz virar fome

Quem me fala em dor diz demais. muito antes dele nascer; é o mesmo que põe a bomba

O poeta se torna mudo que quando a vida desperta suja no corpo do homem.

sem as palavras reais. nele, começa a bater.

Mas precisamos agora

No dicionário a palavra Bomba colocada nele desarmar com nossas mãos

é mera idéia abstrata. Pelos séculos de fome a espoleta da fome

Mais que palavra, diarréia e que explode em diarréia que mata nossos irmãos.

é arma que fere e mata. no corpo de quem não come.

Mas precisamos agora

Que mata mais do que faca, Não é uma bomba limpa: deter o sabotador

mais que bala de fuzil, é uma bomba suja e mansa que instala a bomba da fome

homem, mulher e criança que elimina sem barulho dentro do trabalhador.

no interior do Brasil. vários milhões de crianças.

E sobretudo é preciso

Por exemplo, a diarréia, Sobretudo no nordeste trabalhar com segurança

no Rio Grande do Norte, mas não apenas ali pra dentro de cada homem

de cem crianças que nascem, que a fome do Piauí trocar a arma de fome

setenta e seis leva á morte. se espalha de leste a oeste. pela arma da esperança.

É como uma bomba D Cabe agora perguntar

que explode dentro do homem quem é que faz essa fome,

quando se dispara, lenta, quem foi que ligou a bomba

a espoleta da fome. ao coração desse homem.

FONTE: GULLAR, Ferreira, Melhores poemas de Ferreira Gullar. Seleção e apresenta-


ção de Alfredo Bosi. 7 ed. Ver. E ampliada. São Paulo: Global, 2004.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

É certo que você, pela vivência que teve até chegar ao curso de graduação, já estudou diversos

aspectos da língua portuguesa. Por isso fica relativamente fácil identificar as diferenças de cada

texto apresentado, mesmo sem lê-los na íntegra.

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A principal diferença que percebemos em um primeiro plano visual diz respeito a sua forma com-

posicional.

O texto A, sendo uma propaganda, apresenta elementos verbais e não verbais (imagens) que, em

sintonia, compõem um todo enunciativo e produz diferentes sentidos.

O modo como a linguagem é utilizada, fazendo referência a outros textos de domínio público,

exigem do leitor determinado conhecimento para que possa fazer a associação e compreender

a mensagem (subtema 1.7). Sendo mais específico, é preciso que a pessoa saiba a respeito do ro-

mance de Jorge Amado “Dona Flor e seus dois maridos”, popularizado em forma de filme, para

compreender os enunciados verbais “Ela ficou dividida entre dois amores da Hortifruti”, “Couve-

-flor e seus dois maridos”, e “Aqui a natureza é a estrela” e a imagem dos alimentos com uma ca-

beceira de cama. No entanto, a forma composicional, ou a forma como o texto se apresenta para

o leitor já nos diz que ele é uma propaganda, pois conseguimos visualizar os elementos típicos

(marca, produto, frases curtas e atrativas)

Nos textos B e C, diferentemente, a prevalência de uma linguagem verbal organizada em prosa,

de margem a margem, com seus parágrafos demarcados por um recuo (texto B) ou um espaça-

mento maior entre eles (texto C), de um título bem demarcado com fonte maior e centralizado e

do nome do autor logo abaixo, caracteriza uma organização textual (forma composicional) pró-

pria de determinados tipos textuais (narrativos, descritivos, argumentativos).

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Observe:

FRAGMENTO DO TEXTO B

Sentada na varanda da minha casa, observo a fumaça que sai do calorão do asfalto. É o
tempo da seca! E meus olhos experientes veem uma paisagem bem diferente daquela do meu
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tempo de infância. Faz tanto tempo! Mas a saudade insiste em bater e trazer recordações.
Nasci numa fazenda do município de Catalão, tinha uma vida simples e tranquila. Meu pai
cuidava da roça, do gado, e mamãe, da casa, da comida e da educação dos filhos. Meus irmãos e

FRAGMENTO DO TEXTO C

[...] revolução é o progresso técnico, obtido em razão do desenvovilmento científico e baseado na


importância obtida pela tecnologia, a chamada ciência da produção.

indispensável à produção e ao intercâmbio e fundamento do consumo, em suas novas formas.

Graças às novas técnicas, a informação pode se difundir instantaneamente por todo o planeta, e o
conhecimento do que se passa em um lugar épossível em todos os [...]

No entanto, para identificarmos mais detidamente qual gênero textual corresponde à forma

composicional e quais as outras propriedades específicas (tema e estilo) é imprecindível a leitura

de seu conteúdo para sabermos. Em relação a isso, traremos uma abordagem mais detalhada

nos subitens 1.2, 1.3 e na unidade 3.

O texto D, pela sua estrutura visual, evidencia uma organização própria de poemas, mas só com

a leitura dele podemos dizer que, mesmo com uma linguagem poética e metafórica, também é

dissertativo, pois introduz a temática da fome, estabelece suas consequência, expõe exemplos,

argumentos e finaliza com proposições (o que é típico de textos dissertativos-argumentativos).

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Veja:

INTRODUZ DA TEMÁTICA: ARGUMENTA:


Introduzo na poesia Não é uma bomba limpa:

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A palavra diarréia. é uma bomba suja e mansa
Não pela palavra fria que elimina sem barulho
Mas pelo que ela semeia. vários milhões de crianças.

Quem fala em flor não diz tudo. Quem faz café virar dólar
Quem me fala em dor diz demais. e faz arroz virar fome
O poeta se torna mudo é o mesmo que põe a bomba
sem as palavras reais. suja no corpo do homem.

PROPÕE INTERVENÇÃO:
EXEMPLIFICA: Mas precisamos agora
Por exemplo, a diarréia, deter o sabotador
no Rio Grande do Norte, que instala a bomba da fome
de cem crianças que nascem, dentro do trabalhador.
setenta e seis leva á morte.

E sobretudo é preciso
É como uma bomba D trabalhar com segurança
que explode dentro do homem pra dentro de cada homem
quando se dispara, lenta, trocar a arma de fome
a espoleta da fome. pela arma da esperança.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Você deve estar se perguntando: Mas é poema, como pode ser dissertativo?

E eu te respondo que sim, o texto D tem a estrutura de um poema, mas o seu conteúdo se orga-

niza em forma de uma dissertação (como exemplifiquei), assim como você já deve ter visto um

poema em tom narrativo, ou alguma letra de música com tom de protesto. Na unidade 4, ao tra-

zermos a temática específica dos gêneros textuais e tipologias abordamos isso mais a fundo. Se

ficou curioso, vale a consulta!


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O texto E com forma composicional própria e diferente dos demais textos também é representa-

tivo de um estilo de gênero. Porém, para nos certificarmos de a qual gênero textual ele se refere,

faz-se necessária a leitura. Só depois de faze-la e levando em consideração nossas experiências

textuais é que podemos concluir que se trata de uma notícia, pois além do título, apresenta um

pequeno texto colocado em destaque - que na linguagem jornalística é chamado de lide - com

informações básicas sobre o conteúdo.

EM SÍNTESE:
Os textos têm um modo de organização específico que pode ser identificado a partir dos co-

nhecimentos prévios. Podemos identifica-los num plano visual, ou quando procedemos com a

leitura, num plano de conteúdo.

Para quem ainda não aprofundou o conhecimento acerca das características dos diferentes gê-

neros textuais que circulam na sociedade, terá a oportunidade de fazê-lo com os estudos da uni-

dade 3 deste Livro Digital: “Os gêneros textuais e tipologia”.

Seguindo com a unidade temática 1, avançamos para os próximos subtemas nos quais retomare-

mos esses textos, ampliando o que foi exposto até o momento, uma vez que os conteúdos desta

unidade estão intimamente relacionados.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

1.2 CONTEÚDO GLOBAL E ATRIBUIÇÃO COERENTE DE TÍTULO, DE DIVISÃO


PARAGRÁFICA DE UM TEXTO E DE OUTRAS NORMAS DE APRESENTAÇÃO
Se você já realizou alguma prova de concurso ou, até mesmo, o Enem, deve ter reparado que a

questão discursiva, aquela em que você tem que escrever um texto, geralmente dissertativo-ar-

gumentativo (mais comum nesses exames) apresenta uma coletânea de textos para que, a partir

deles, você desenvolva o seu.

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Essa coletânea, na verdade, traz diversas abordagens sobre um tema com o intuito de oferecer

ao candidato subsídios para a construção de seus próprios argumentos e defesa de seu ponto de

vista (tese).

Agora imagine que você se deparou com a proposta da professora de “Formação Geral”, de es-

crever sobre educação ambiental/ ecologia/biodiversidade. Nota-se que o tema gerador é muito

amplo, mas se considerarmos o contexto de queimadas na Amazônia, podemos trazer uma te-

mática específica, organizando uma ideia por vez, sem perder o todo enunciativo. Daí decorrem

os principais elementos para a construção de um texto: o tema, o título e o parágrafo.

Nem sempre os textos apresentam a temática de forma explícita. Muitas vezes, é preciso ler o

texto por completo para compreender o seu conteúdo global.

Identificar o conteúdo global de um texto, portanto, é responder à pergunta:

O texto trata de quê?

Responder a essa pergunta também é uma atribuição do título do texto que deve resumir as

ideias apresentadas de forma atrativa, com vistas a despertar no leitor o desejo de proceder com

a leitura. Logo, a principal diferença entre tema e título é que o tema corresponde a um conteúdo

mais amplo, enquanto o título sintetiza as ideias gerais do texto.

Ainda, para que nossas ideias se apresentem com mais clareza, precisamos organizá-las uma por

vez, por meio dos parágrafos, que precisam ser construídos de modo claro e coerente, ou seja,

as ideias devem estar relacionadas a temática principal, articuladas em si. Afinal, é muito ruim

quando lemos um texto que muda bruscamente de assunto ou que “não diz coisa com coisa”,

não é mesmo?

Feitas essas considerações que podemos chamar de teóricas sobre tema, título e parágrafo, ve-

jamos como isso se materializa de forma harmoniosa, retomando o texto B, “Valor de Infância”.
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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

VALOR DE INFÂNCIA
Sentada na varanda da minha casa, observo a fumaça que sai do caldo do asfalto. É o tem-
po da seca! E meus olhos experientes veem uma paisagem bem diferente daquela do meu tempo
de infância. Faz tanto tempo! Mas a saudade insiste em bater e trazer recordações.
Nasci numa fazenda do município de Catalão, tinha uma vida simples e tranquila. Meu
pai cuidava da roça, do gado, e mamãe, da casa, da comida e da educação dos filhos. Meus irmão
e eu tivemos uma infância ingênua, sem riquezas ou luxo, mas havia uma alegria de viver muito
grande, principalmente na hora da diversão. A noite, subindo em pedaços de galhos cortados em
forma de forquilha, brincávamos de perna de pau e assim éramos palhaços no nosso circo imagi-
nário; o aplauso era o zunzum de grlos e cigarras e o céu, a lona pretacheia de furinhos iluminados.
A casa, de estilo bem antigo, fica à sombra de flamboyants e tinha um pomar que adoçava
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minha infância: mangas, carambolas, laranjas, jabuticabas pretinhas! Ali, a sinfonia dos passaru-
nhos alegrava nosso dia. E bastava andar um pouco mais pelos arredores da fazenda para encon-
trar as mais coloridas e doces frutas do Cerrado. Eu me lambuzava com as mangabas, muricis,
gabirobas...uma delícia! Naquela época, a infância tinha muito mais sabor!
Mas o que eu mais gostava de fazer era tomar banho no riacho que ficava nos fundos da
minha casa. A água era sempre limpa e fresquinha e lá meu irmão tentava me ensinar a nadar.
Ele dizia que bastava engolir um lambari vivo que eu iria a aprender rapidinho, mas eu nunca tive
essa coragem. O riacho era passagem para outtras fazendas e para a escola e, ao fazer a travessia,
precisávamos nos equilibrar na pinguela - tronco que servia de ponte. Quando alguém caía, tchi-
bum... aproveitava para se refrescar nas águas cristalinas.
Íamos a pé para a escola, juntos com os filhos dos vizinhos, e o caminho era o nosso par-
que de diversão, principalmente quando chovia, pois, descalços, brincávamos de chutar a água
empoçada uns aos outros, e todos virávamos piratas nas canoinhas de papel que deixávamos a
enxurrada levar.
Certa noite, estávamos dormindo e o galo já começava os avisos do dia, quando, de re-
pente, ouvimos foguetes e cantoria: era uma "treição". Isso acontecia toda vez que os vizinhos e
amigos se juntavam e, de surpresa, chagavam à casa de alguém para ajudar a fazer alguma ta-
refa mais difícil. No nosso caso, era a reconstrução do rego d'água. Enquanto os homens ficavam
naquela labuta, as mulheres preparavam as comidas. O cheiro do pequi era o sinal de almoço na
mesa, que tinha também frango, angu, quiabo frito, arroz e tutu de feijão. No fim da tarde, o som
da sanfona chamava para encerrar o serviço e o forró levantava a poeira na pista de chão batido.
As festas de roça alegravam a vida das pessoas. Eram feitas em ranchões, cobertos co
folhas de coqueiro e iluminadas por lamparinas. Minha mãe preparava e doava pratos deliciosos
- as prendas - que eram disputados na hora do leilão. Vestidos com roupas de chita, íamos com a
intenção de dançar a noite inteira, mas, quando acabava o querosene das lamparinas, a escuridão
colocava fim à festa daquela noite.E era só esperar pela próxima...
A vida simples na roça me ensinou a dar valor a essas reuniões de amigos e de familiares, a
respeitar os mais velhos, a pedir a benção aos pais até na hora de dormir, a dar a palavra em nome
da honra, e me ensinou também que a história da nossa vida se mistura à história do nosso lugar.
Hoje, muito desses valores já não existem. E os lugares também não existem.
Depois de muitos anos, voltei à fazenda à fazenda onde nasci. esperava encontrar, ao me-
nos, as paredes da velha casa, alguma árvore do pomar ou então saborear as doçuras do Cerrado,
tudo numa tentativa de encontrar ali um restinho da minha antiga felicidade. Não restou nenhu-
ma árvore e o riacho banhou minha infância estava morrendo, quase seco. O meu lugar se foi e
agora só existe em minha memória.
Se tem um desejo?
Voltar aos tempos de criança e viver tudo de novo!
(Elissama Miller da Silva Mota)

Observe, com as partes destacadas em amarelo no texto, que a temática de memórias de infân-

cia e da mudança de valores em tempos de globalização é bem sintetizada pelo título escolhido

pela autora e que no decorrer de todo o memorial ela é sempre retomada para garantir um todo

coerente.

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UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

E os parágrafos?

Observe como cada um deles aborda um assunto diferente (tópico discursivo), mas relacionado

ao tema central:

» 1º PARÁGRAFO:

Introduz a temática relacionando o que vê na cidade com o que via na fazenda na

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infância, em tempo de seca.

» 2º PARÁGRAFO:

Descreve como era a vida em família, na fazenda do Catalão.

» 3º PARÁGRAFO:

Descreve como eram os sabores da infância com a localização da casa em meio a um pomar.

» 4º PARÁGRAFO:

Descreve o que gostava de fazer e como era o riacho.

» 5º PARÁGRAFO:

Descreve como era a ida para a escola com os amigos.

» 6º PARÁGRAFO:

Relata uma “treição” ocorrida com sua família.

» 7º PARÁGRAFO:

Descreve como eram as festas na roça.

» 8º PARÁGRAFO:

Reflete sobre o que aprendeu com a vida na roça.

» 9º PARÁGRAFO:

Relata a volta à fazenda depois de alguns anos e as expectativas com o reencontro.

» 10º PARÁGRAFO:

Composto por uma única frase interrogativa – Indaga.

19
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

» 11º PARÁGRAFO:

Também composto por uma única frase declarativa – Responde a sua própria inda-

gação.

Viu como eles mudam de assunto mantendo a fidelidade ao tema do texto?

Essa é uma estratégia para se manter a unidade temática por meio do que chamamos de pro-
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gressão tópica. Contudo, vejamos outras estratégias de manutenção da unidade temática e de

sua progressão.

1.3 ESTRATÉGIAS DE MANUTENÇÃO DA UNIDADE TEMÁTICA DO TEXTO E DE


SUA PROGRESSÃO
De acordo com Koch e Elias (2012) um texto com enunciados relevantes para o desenvolvimento

do tema é um texto coerente (detalhamento na unidade 4). Portanto, para se manter a unidade

temática e a progressão textual é preciso:

» Utilizar termos de um mesmo campo lexical;

» Utilizar adequadamente os conectivos de ligação que dão o encadeamento ao texto (de-

talhamento na unidade 4);

!
CAMPO LEXICAL
DE UM MESMO RADICAL:
Exemplo:

Pedra, Pedregulho, Pedreira, Pedrada...

CAMPO LEXICAL POR ÁREA:


Exemplo:

Informática, Web, Programas, Sites, Software,

Byte...

20
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Retorne ao texto B “Valor da infância” e observe que a palavra “infância”, bem como outras desse

campo lexical são recorrentes (marcações em verde).

1.4 RELAÇÃO ENTRE INFORMAÇÕES DO TEXTO E CONHECIMENTOS PRÉVIOS


Quando dissemos que em uma prova de concurso ou Enem é apresentado ao candidato uma co-

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letânea de textos sobre a temática em questão para que ele desenvolva a escrita, estamos dizendo

que é preciso ter o que dizer para dizer. Afinal, qualquer um teria dificuldade em escrever sobre

algo que não conhece, não é verdade? Por isso, é ofertado um mínimo de conteúdo sobre o tema

para que o candidato que não tenha conhecimento do tema, consiga elaborar um texto e para o

que conheça consiga ampliar e desenvolver seu texto de acordo com a proposta da questão.

Da mesma forma ocorre em relação a leitura. Quando lemos algum texto que trata de um assunto

que conhecemos a compreensão fica muito mais fácil. Ao contrário, quando lemos a respeito de um

assunto que nunca, ou pouco vimos, precisamos fazer um esforço muito maior para compreendê-lo.

Isso está relacionado aos conhecimentos prévios ou às informações que temos guardadas em nos-

sa mente e que acionamos quando precisamos. Esses conhecimentos prévios podem ter sido ad-

quiridos a partir da vivência, das leituras que fizemos, da relação com o outro, enfim. O interessante

é que todo esse conhecimento armazenado sempre se renova, se amplia, se modifica, ou até mes-

mo se perde (esquecemos) se não for acionado. Eles são fundamentais, pois contribuem para que

possamos fazer inferências, ou seja, para que possamos construir compreensões a partir do que

não está explícito no texto e tirarmos conclusões.

"
No livro “Texto e leitor – aspectos cognitivos da leitura”, Ângela Kleiman (2002, p.13) afirma que

A compreensão de um texto é um processo que se caracteriza

pela utilização de conhecimento prévio: o leitor utiliza na leitura

o que ele já sabe, o conhecimento adquirido ao longo de sua

vida.

" 21
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

E destaca três tipos de conhecimentos prévios:

» O linguístico (referente ao que já se sabe sobre a língua, suas construções enunciativas);

» O textual (referente ao que já se sabe sobre as propriedades específicas dos textos)

» O de mundo (referente ao que se sabe sobre os mais diferentes assuntos).


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Façamos um exercício com o texto E:

Você assistiu a
noticiários na TV
sobre isso? Leu
alguma coisa na
internet ou redes
sociais?

O que são focos


de calor?

O que é isso?

O que dá para
concluir com isso?

1.5 IDENTIFICAÇÃO DAS PALAVRAS E IDEIAS CHAVES DO TEXTO


Identificar palavras chaves em um texto tem muito a ver com a ideia de campo lexical visto no

subitem 1.3. Ao mesmo tempo em que elas colaboram para a manutenção da unidade temática e

progressão do texto, elas indicam e sintetizam a temática. Podem ser palavras ou expressões.

Para exemplificarmos, vamos recorrer ao texto C: “Por uma globalização mais humana”, de Milton

Santos.

22
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Como já abordamos, o título nos ajuda a identificar, inicialmente, o conteúdo global do texto. Logo, fica

fácil perceber que o conteúdo refere-se à “globalização”. Para identificarmos as palavras e ideias chaves,

vamos procura-las buscando responder a seguinte pergunta: O que é globalização, segundo o texto?

Observe as palavras que marcamos, em verde, na reprodução abaixo:

POR UMA GLOBALIZAÇÃO MAIS HUMANA

Material para uso exclusivo dos alunos da Rede de Ensino Doctum. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da lei.
Milton Santos

A globalização é o estágio supremo da internacionalização. O proceso de intercâmbio entre países,


que marcou o desenvolvimento do capitalismo desde o período mercantil dos séculos 17 e 18, expan-
de-se com a industrialização ganha novas bases com a grande indústria, nos fins do seculo 19, e, agora,
adquire mais intensidade, mais amplitude e novas feições. O mundo inteiro trna-se envolvido em todo
tipo de troca: técnica, coercial, financeira, cultural.

Vivemos um novo período na história da humanidade. A base dessa verdadeira revolução é o progresso
técnico, obtido em razão do desenvolvimento científico baseado na importância obtida pela tecnologia,
a chamada ciência da produção.

Todo o planeta é praticamente coberto por um único sistema técnico, tornado indispensáve à produ-
ção e ao intercâmbio e fundamento do consumo, em suas novas formas.

Graças às novas técnicas, a informação pode se difundir instantaneamente por todo o planeta, e o co-
nhecimento do que se passa em um lugar é possível em todos os pontos da Terra.

A produção globalizada e a informação globalizada permitem a emergência de um lucro em escala


mundial, buscado pelas firmas globais que constituem o verdadeiro motor da atividade econômica.

Tudo isso é movido por uma concorrência superlativa entre os principais agentes econômicos - a competitividade.

Num mundo assim transformado, todos os lugares tendem a tornar-se globais, e o que acontece em qual-
quer ponto do ecúmeno (parte habitada da Terra) tem relação com o acontece em todos os demais.

Daí a ilusão de vivermos num mundo sem fronteiras, uma aldeia global. Na reaidade, as relações cha-
madas globais são reservadas a um pequeno número de agentes, os grandes bancos e empresas
transnacionais, alguns Estados, as grandes organizações internacionais.

Infelizmente, o estágio atual da globalização está produzindo ainda mais desigualdades. E, ao contrá-
rio do que se esperava, crescem o desemprego, a pobreza, a fome, a insegurança do cotidiano, num
mundo que se fragmenta e onde se ampliam as fraturas sociais.

A droga, com sua enorme difusão, constitui um dos grandes flagelos desta época.

O mundo parece, agora, girar sem destino. É a chamada globaização perversa. Ela está sendo tanto
mais perversa porque as enormes possibilidaes oferecidas pelas conquistas científicas e técnicas não
estão sendo adequadamente usadas.

Não cabe, todavia, perder a esperança porque os progressos técnicos obtidos neste fim de século 20,
se usados de uma outra maneira, bastariam para reproduzir muito mais alimentos do que a popua-
lação atual necessita e, aplicadoa à medicina, reduziriam drasticamente as doenças e a mortalidade.

Um mundo solidário produzirá muitos empregos, ampliando um intercâmbio pacífico entre os povos
e eliminando a belicosidade do processo competitivo, que todos os dias reduz a mão-de-obra. É pos-
sível pensar na realização de um mundo de bem-estar, onde os homens serão mais felizes, um outro
tipo de globalização.

23
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Veja que procuramos por palavras que respondessem sinteticamente à pergunta ou que fossem

do mesmo campo lexical de “globalização”.

Depois de marcarmos as palavras ou expressões relativas ao tema do texto, com nossos conhe-

cimentos prévios (linguísticos, textuais e de mundo) e com os adquiridos com a leitura do texto,

podemos concluir que a globalização está relacionada à internacionalização, à produção industrial


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que promove um consumo excessivo e uma competitividade que reforça desigualdades e que é

perversa.

Diante disso, como palavras chaves que sintetizam as ideias do texto podemos elencar: internaciona-

lização; intercâmbio; industrialização; competitividade; processos técnicos; consumo; desigualdades.

1.6 ASPECTOS SEMÂNTICOS DO VOCÁBULO DA LÍNGUA (NOÇÕES DE POLIS-


SEMIA, SINONÍMIA, ANTONÍMIA, HIPERONÍMIA, PARONÍMIA E CAMPO SE-
MÂNTICO)
Pelo que estamos vendo, os subitens apresentados até aqui, em certa medida, tratam das relações

semânticas que contribuem para uma leitura, uma análise e uma interpretação mais eficiente de

um texto. Mas ainda tem alguns outros aspectos que são importantes conhecermos e diferen-

ciarmos, tendo em vista que eles contribuem para a construção de sentidos, para o efeito estilís-

tico e para a coerência dos textos.

Como já foi explicado o que é campo lexical, explicarei agora o que é campo semântico, pois não
"
são a mesma coisa. Embora parecidos, apresentam distinções significativas. Para facilitar, vejamos

os conceitos de léxico e semântica, segundo Cegalla (2010):

Léxico: é o conjunto de palavras utilizadas, de forma compreen-

sível, em uma língua.

Semântica: trata da significação das palavras. Pode ser descri-

tiva ou histórica. A semântica descritiva estuda a significação

atual das palavras; a histórica se ocupa da evolução do sentido

das palavras através do tempo

24
"
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Pronto! Agora diferenciamos:

CAMPO LEXICAL CAMPO SEMÂNTICO

Diferentes palavras per- Diferentes sentidos atribu-

tencentes a um mesmo ídos a uma palavra.

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campo/área de conheci-

mento

CAMPO LEXICAL CAMPO SEMÂNTICO


DE ESCOLA: DE GUARDA:

Aluno, professor, diretor, Proteção, tutela, vigilante,

coordenador, sala de aula, preservar, esconder etc.

aula, recreio, intervalo,

livros, cadernos etc.

Outros conceitos importantes:

» POLISSEMIA:

Mais de um significado para uma palavra.

Exemplo: manga - fruta ou parte do braço de uma camisa.

» SINONÍMIA (OU SINÔNIMO):

Sentido igual ou aproximado para uma palavra.

Exemplo: justo – certo, exato, reto, íntegro, imparcial.

» ANTONÍMIA (OU ANTÔNIMO):

Sentido oposto a uma palavra.

Exemplo: progredir – regredir

» HIPERONÍMIA (OU HIPERÔNIMO):

Sentido mais abrangente atribuído a uma palavra em seu campo semântico.

Exemplo: vestuário – camisas, calças, meias, vestidos, etc.

25
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

» PARONÍMIA (OU PARÔNIMO):

Pares de palavras parecidas na pronúncia e na escrita.

Exemplo: Cesta e sexta / Descrição e discrição

Coro e couro / Cético e séptico

Comprimento e cumprimento / Ratificar e retificar


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A utilização de sinônimos e hiperônimos, na atividade de escrita, cumpre o objetivo de fazer refe-

rência a algo, a alguém, a fatos, a eventos, a sentimentos (referenciação), sem ser repetitivo, e man-

tem a retomada aos referentes, para se manter o foco.

Observe como no trecho do texto C, a seguir, a temática da globalização é retomada com o uso de sinônimos:

[...]

Num mundo assim transformado, todos os lugares tendem a tornar-se globais, e o que acontece
em qualquer ponto do ecúmeno (parte habitada da Terra) tem relação com o que acontece em
todos os demais.

Daí a ilusão de vivermos num mundo sem fronteiras, uma aldeia global. Na realidade, as relações
chamadas globais são reservadas a um pequeno número de agentes, os grandes bancos e empre-
sas transnacionais, alguns Estados, as grandes organizações internacionais.

[...]

E como no mesmo trecho o autor faz uso do hiperônimo com a expressão "organização interna-
cionais" referindo-se "... a um pequeno número de agentes, os grandes bancos e empresas trans-
nacionais..."

[...]

Daí a ilusão de vivermos num mundo sem fronteiras, uma escala global. Na realidade, as relações
chamadas globais são reservadas a um pequeno número de agentes, os grandes bancos e empre-
sas transnacionais, alguns Estados, as grandes organizações internacionais.

Seguimos com a leitura, análise e interpretação de textos dando uma atenção especial à intertex-

tualidade.

26
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

1.7 RELAÇÃO DO TEXTO COM OUTROS TEXTOS (INTERTEXTUALIDADE)


Até agora vimos que os textos possuem uma forma, revelam um estilo e carregam um conteúdo.

É nesse plano do conteúdo que o diálogo, ou a referência a outro enunciado aparece, formando o

que chamamos de intertextualidade.

Fica fácil de lembrar se fizermos a seguinte associação:

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intertextualidade - interação

intertextualidade - entre os textos

Todos nós carregamos uma bagagem vivencial que nos permite fazer comparações de uma coisa

à outra, associar vários elementos de um mesmo campo conceitual/temático, completar informa-

ções que se evidenciam incompletas, fazer avaliações que vão ao encontro de nossos gostos, dese-

jos, sentimentos e tirar conclusões daquilo que vivemos. Tais habilidades cognitivas também são

acionadas quando lemos e/ou escrevemos um texto.

Quantas vezes você já leu ou viu algo que te fez lembrar de uma outra coisa (outra história

que leu, algum acontecimento vivido por você ou que ficou sabendo)?

Isso é muito comum, pois estamos rodeados de textos e vivemos no mundo da linguagem.

Portanto, a intertextualidade nos permite atribuir novos sentidos ao texto, fazer relações de um

com outro e é um recurso discursivo que o potencializa e ao mesmo se arrisca na incompreensão,

caso o leitor não tenha a experiência com outras leituras do campo temático abordado. Quantas

vezes também você já leu ou viu algo do qual não entendeu nada? Isso também é muito comum,

pois nem sempre temos a bagagem vivencional sobre os mais variados temas.

As propagandas usam a intertextualidade de forma implícita e explícita com o intuito de seduzir o

leitor/consumidor, bem como vimos no texto A. E todos os enunciados podem ser relacionados a

outro se considerarmos que eles nunca são novos. Observe as imagens abaixo e as intertextualida-

des presentes nelas.

27
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS
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Quais relações você estabelece? Anote-as:

1.8 FUNÇÕES DA LINGUAGEM


Sempre que nos comunicamos (e fazemos isso por meio da linguagem) temos um objetivo, uma

intenção, uma finalidade. Logo, somos um emissor ou destinador, que dirige uma mensagem (con-

junto de informações) referente a algo (situação, contexto), a alguém (receptor ou destinatário), por

meio de um canal de comunicação (meio físico que permite a comunicação: televisão, rádio, jornal,

revista, telefone, etc.) e de um código específico (escrita, fala, sinais...).

Portanto, emissor, receptor, código, mensagem, referente e canal são elementos constitutivos do ato

da comunicação, segundo o linguista Roman Jakobson, que embasaram Teoria da Comunicação.

28
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

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A partir desses elementos da comunicação e acordo com as nossas intenções, configuram-se seis

funções da linguagem:

» CONATIVA (OU APELATIVA)

Palavra-chave: Receptor, pois tem como objetivo influenciar o receptor ou destinatário, com

a intenção de convencê-lo de algo ou dar-lhe ordens.

É a linguagem usada nos discursos, sermões e propagandas que se dirigem diretamente ao

receptor, fazendo uso de vocativos e imperativo.

29
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

» FUNÇÃO APELATIVA:

Proibido fumar ou Não fume! e Não compartilhe a sua senha!

» EMOTIVA

SAMBA EM PRELÚDIO
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Eu sem você
Não tenho porquê
Porque sem você
Não sei nem chorar
Sou chama sem luz
Jardim sem luar
Luar sem amor
Amor sem se dar.
[...]
Vinícius de Moraes

Palavra-chave: Emissor, pois reflete as emoções e os sentimentos do emissor. O uso de reti-

cências, sinal de exclamação e interjeições são indicativos dessa função da linguagem.

» FÁTICA

Palavra-chave: canal, pois tem como foco principal o contato entre o emissor e o receptor.

Coloca em evidência o canal, ou seja, o meio pelo qual acontece a comunicação.

É utilizada nas conversas telefônicas, saudações entre pessoas e cumprimentos.

“(...) Olá, como vai ?


Eu vou indo e você, tudo bem ?
Tudo bem eu vou indo correndo
Pegar meu lugar no futuro, e você ?
Tudo bem, eu vou indo em busca
De um sono tranquilo, quem sabe …
Quanto tempo...
[...]

(Trecho da música Sinal Fechado, de Paulinho da Viola).

30
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

» METALINGUÍSTICA

Palavra-chave: Código, pois refere-se à explicação de um código usando o próprio código. É

típica das gramáticas e dicionários que utilizam a escrita para falar das regras ou significados

dela própria.

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» POÉTICA

Palavra-chave: mensagem, pois refere-se a forma como se empregou a linguagem com o

objetivo de torna-la diferente, surpreendente, com expressões fora das habituais, fugindo da

lógica e até mesmo provocando humor.

Diferentemente da função emotiva que tem como objetivo emocionar o leitor, a função po-

ética se importa mais com a mensagem em si e a forma de como ela será transmitida. As

palavras são usadas no sentido figurado (sobre sentido figurado ver Unidade 2).

É utilizada na literatura e comumente encontrada na publicidade.

31
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» REFERENCIAL (OU DENOTATIVA)

Palavra-chave: Referente, pois refere-se objetivamente a uma informação da realidade, dan-

do prioridade a fatos concretos. Coloca em evidencia o assunto.

É utilizada nas notícias de jornal, em discursos científicos, em textos dissertativos, ou qual-

quer enunciado que faça exposição de conceitos ou circunstâncias.

Observe que, na manchete da notícia, o foco está no assunto “redução do pó preto”, ou seja, no

referente.

32
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

Em síntese:

FUNÇÃO DA LINGUAGEM ÊNFASE OBJETIVO

Conativa Receptor Convencer o Receptor


Emotiva Emissor Expressar ponto de Vista
Fática Canal Testar a Eficácia do Meio
Metalinguística Código Explicar o Próprio Código

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Poética Mensagem Valorizar o Texto
Referencial Referente Transmitir Informação

33
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

RESUMO
Os textos têm um modo de organização específico que pode ser identificado em um

plano visual e em um plano de conteúdo.

Os principais elementos para a construção de um texto são:


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» Tema,

» Título e

» Parágrafo.

O tema corresponde a um conteúdo mais amplo, enquanto o título sintetiza as ideias

gerais do texto.

Os parágrafos precisam ser construídos de modo claro e coerente, articulados com a

temática principal do texto.

A utilização de termos de um mesmo campo lexical e o uso adequado dos conectivos

de ligação que dão o encadeamento ao texto são fundamentais para se manter a uni-

dade temática e a progressão textual.

Os conhecimentos prévios são as informações que temos guardadas em nossa mente

e que acionamos quando precisamos.

Eles podem ser:

» Linguístico,

» Textual e

» De mundo.

As palavras chaves colaboram para a manutenção da unidade temática e progressão

do texto, bem como indicam e sintetizam a temática.

» POLISSEMIA:

Mais de um significado para uma palavra.

(banco = instituição financeira e assento)

34
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

» SINONÍMIA:

Sentido igual ou aproximado para uma palavra

(preto = negro)

» ANTONÍMIA:

Sentido oposto a uma palavra

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(frio – quente)

» HIPERONÍMIA:

Sentido mais abrangente atribuído a uma palavra em seu campo semântico (animal = gato,

leão, cobra...)

» PARONÍMIA:

Pares de palavras parecidas na pronúncia e na escrita.

(cavaleiro – cavalheiro)

» INTERTEXTUALIDADE:

Influência e/ou relação entre diversos textos.

FUNÇÕES DA LINGUAGEM expressam as intenções dos falantes da língua, podendo ser:


» CONATIVA:

Quando o objetivo é convencer e foco está no receptor.

» EMOTIVA:

Quando o objetivo é expor a emoção e o foco é no emissor.

» FÁTICA:

Quando o objetivo é testar o meio de comunicação e o foco está no canal.

» METALINGUÍSTICA:

Quando o foco é a própria linguagem e o foco é no código.

35
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

» POÉTICA:

Quando o objetivo é valorizar o texto e o foco está na mensagem.

» REFERENCIAL:

Quando o objetivo é informar e foco está no referente.


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36
UNIDADE 1 :
LEITURA, ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS

REFERÊNCIA:

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992.

CEGALLA, Domingos Pascoal. Novíssima gramática da língua portuguesa.48ª edição

Material para uso exclusivo dos alunos da Rede de Ensino Doctum. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da lei.
revista. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2010.

GERALDI, João Wanderley. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

GULLAR, Ferreira. Melhores poemas de Ferreira Gullar. Seleção e apresentação de Al-

fredo Bosi. 7 ed. Ver. E ampliada. São Paulo: Global, 2004.

JAKOBSON, Roman. Linguística e Comunicação. São Paulo: Cultrix, 1971.

KLEIMAN, Ângela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. Campinas: Pontes, 2002.

KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: estratégias de produção

textual. 2 ed., 1ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2012.

OLIVEIRA, Luciano Amaral (org.). Estudos do discurso: perspectivas teóricas. São Paulo:

Parábola Editorial, 2013.

37
2
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO
E FIGURAS DE LINGUAGEM ASSOCIADAS
AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO
2.1 Denotação e Conotação 41
2.2 Denotação e conotação 42
2.3 Figuras de linguagem 42
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

É... a primeira unidade ficou bem extensa, pois a temática prescindiu de muitos textos para que

você pudesse exercitar a leitura, análise e interpretação de textos associados aos temas gerais de

estudo, em meio aos subtemas.

Nessa segunda unidade, perceberá que os assuntos retomam ou se relacionam com os outros,

pois estamos lidando com a questão dos sentidos dos textos.


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Para iniciarmos, apresento a você um diálogo humorístico com o qual começará a entender essa

questão dos sentidos na linguagem:

O sujeito em busca de uma casa para alugar, pergunta a um


caipira que passava na rua:

Moço, você sabe quanto está o


aluguel dessa?

O caipira prontamente responde:

Está R$ 750 reais.

O sujeito questiona:

Por acaso, você sabe me dizer se


ônibus passa aqui na porta?

E o caipira responde:

Rapaz! Já vi passar geladeira, fogão,


sofá...Mas ônibus nunca vi não

Disponível em https://orkutudo.com/whatsapp/grupos/passa-onibus-na-
-porta/1290/1/755/gostara, acesso em 06 out. 2019.

40
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

2.1 SENTIDO LITERAL E SENTIDO FIGURADO

Você deve ter percebido como, no diálogo anterior, os interlocutores atribuem sentidos diferentes

para a expressão “passar ônibus na porta”.

O moço da cidade utiliza essa expressão fazendo referência ao ônibus passar na frente da casa

(porta), o que é muito comum de se dizer na vida urbana. Logo, ele atribuiu à expressão um senti-

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do figurado, ou seja, um sentido que só pode ser compreensível em situações particulares de uso,

em um determinado contexto.

Já o moço da roça (caipira) entende como se o ônibus fosse passar através da porta da casa que

ele estava alugando. Assim, quando ele responde que já viu passar geladeira, fogão, sofá... ele atri-

bui à expressão um sentido literal, ou seja um sentido primário, exato, sem contexto.

Para deixarmos ainda mais claro, trazemos algumas frases muito utilizadas cotidianamente e

que exemplificam o sentido figurado e literal.

» Ontem, na festa, eu meti o pé na jaca.

» Estou de queixo caído com a coragem dele.

» Fulana é uma cobra.

» Hoje eu estou no mundo da lua.

» Cláudia está no céu com o novo emprego.

A primeira frase, por exemplo, assume o sentido figurado, pois em uma festa as pessoas, normal-

mente, não “metem o pé na jaca”. Essa expressão surgiu para indicar que a pessoa curtiu muito,

aproveitou.

Da mesma forma depreendemos com as outras frases em que os sentidos são figurados, pois

não expressam o que realmente a palavra ou expressão significa no sentido exato.

41
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

2.2 DENOTAÇÃO E CONOTAÇÃO


Intimamente relacionado ao sentido figurado e literal, temos os conceitos de conotação e denotação.

Quando usamos uma palavra/expressão no sentido figurado, estamos atribuindo a ela um sen-

tido conotativo, que é também um sentido criativo.


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E quando usamos uma palavra/expressão no sentido literal, estamos atribuindo a ela um sen-

tido denotativo, ou aquele que é dicionarizado (aparece no dicionário).

Então, basta fazer a seguinte associação que fica bem fácil.

2.3 FIGURAS DE LINGUAGEM


As figuras de linguagem são recursos linguísticos utilizados pelos usuários da língua para dar à

comunicação certa expressividade ou algumas características específicas, tais como:

» Entonação,

» Humor,

» Intensidade,

» Beleza,

42
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

» Leveza etc.

Por isso, elas também são denominadas de figuras de estilo, pois conferem ao enunciado o estilo

de expressão de seu autor.

Se você fizer uma busca rápida por esse assunto na internet verá que são muitas as figuras de lin-

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guagem e que existem diferentes maneiras de classificá-las. No entanto, para este estudo serão

apresentadas as que eu julgo como principais, as que têm o termo mais utilizado cotidianamente.

COMPARAÇÃO
É o emprego de palavras no sentido figurado com a intenção de comparar uma coisa com a ou-

tra. Emprega-se nexos comparativos (como, tal, qual, assim como, etc.)

EXEMPLO:

Eles não têm ideal: são como folhas levadas pelo vento.

Nero foi cruel como um monstro.

METÁFORA
É o emprego figurado de uma palavra ou expressão com tom emotivo, ou seja, é o uso de termos

com significado fora do habitual.

EXEMPLOS:

“O pavão é um arco-íris de plumas” (Rubem Braga)

Nero foi um monstro. → PARA NÃO CONFUNDIR METÁFORA COM COMPARAÇÃO!

METONÍMIA
É a troca de palavras quando uma evoca a outra, pois há estreita relação de sentido.

Observe os exemplos abaixo:

» AUTOR PELA OBRA:

Nas horas de folga lia Machado de Assis. ( = lia a obra literária de Machado de Assis.)

43
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

» SÍMBOLO PELO OBJETO SIMBOLIZADO:

Não te afastes da cruz. ( = Não te afastes da religião.)

» LUGAR PELO PRODUTO DO LUGAR:

Fumei um saboroso havana. ( = Fumei um saboroso charuto.)


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» EFEITO PELA CAUSA:

Os aviões semeavam a morte. ( = bombas mortíferas.)

» CAUSA PELO EFEITO:

Moro no campo e como do meu trabalho. ( = Moro no campo e como o alimento que produzo.)

» CONTINENTE PELO CONTEÚDO:

Bebeu o cálice/a taça todo. ( = Bebeu todo o líquido que estava no cálice.)

» INSTRUMENTO PELA PESSOA QUE UTILIZA:

Ele é bom de garfo. ( = comilão, comedor.)

» PARTE PELO TODO:

Várias pernas passavam apressadamente. ( = Várias pessoas passavam apressadamente.)

» GÊNERO PELA ESPÉCIE:

Os mortais pensam e sofrem nesse mundo. ( = Os homens pensam e sofrem nesse mundo.)

» SINGULAR PELO PLURAL:

A mulher foi chamada para ir às ruas na luta por seus direitos. ( = As mulheres foram cha-

madas, não apenas uma mulher.)

» MARCA PELO PRODUTO:

Uso Bombril para lavar as panelas. ( = palha de aço.)

» ESPÉCIE PELO INDIVÍDUO:

O homem foi à Lua. ( = Alguns astronautas foram à Lua.)

44
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

» SÍMBOLO PELA COISA SIMBOLIZADA:

O trono estava abalado. ( = o império estava abalado.)

» INDIVÍDUO PELA ESPÉCIE OU CLASSE:

O judas da classe ( = o traidor)

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Exemplos adaptados, retirados de:
https://www.soportugues.com.br/secoes/estil/estil3.php e de Cegalla (2010).

PERSONIFICAÇÃO
Também denominada de prosopopeia ou animação, é quando se atribui vida, ou características

humanas a seres inanimados ou irracionais (objetos, animais, plantas, etc.)

EXEMPLOS:

O vento beijava o meu rosto suavemente.

“Mandei meu cavaco chorar”.

HIPÉRBOLE
É o emprego de palavras no sentido exagerado, criando um efeito expressivo ampliado, desmedido.

EXEMPLOS:

Estava morto de sono.

Passaram-se mil anos e não consegui falar com ela.

EUFEMISMO
Ao contrário da hipérbole, o eufemismo suaviza uma expressão com termos mais agradáveis,

mais delicados.

EXEMPLOS:

Fulano foi desta para melhor ( = morreu)

Enriqueceu por meios ilícitos ( = roubo)

45
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

ANÁFORA
É a repetição de palavras ou expressões no começo de várias frases para tornar expressiva a men-

sagem. É muito comum em quadrinhas populares, versos e letras de músicas.

EXEMPLO:
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COMIDA
Titãs

Bebida é água!

Comida é pasto!

Você tem sede de quê?

Você tem fome de quê?

A gente não quer só comida

A gente quer comida

Diversão e arte

A gente não quer só comida

A gente quer saída

Para qualquer parte

A gente não quer só comida

A gente quer bebida

Diversão, balé

A gente não quer só comida

A gente quer a vida

Como a vida quer

[...]

ANTÍTESE
É a contraposição, ou seja, no uso de palavras que expressam ideias opostas, mas que seu sentido

volta-se para um referente diferente.

EXEMPLO:

Eu corro enquanto o mundo para.

46
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

PARADOXO
Também conhecido como oximoro, é a oposição de ideias em relação a um mesmo referente.

EXEMPLOS:

Estou correndo parado.

Quanto mais vivemos, mais nos aproximamos da morte.

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“Eu aprendi que pra te prender é só deixar a porta aberta...”

IRONIA
É quando utilizamos uma palavra no sentido contrário ao verdadeiro sentido que queremos.

EXEMPLO:

Que beleza! (Quando nos deparamos com uma situação ruim, horrível)

PLAT!
ONOMATOPEIA

P OW !
É a formação de uma palavra a partir da imitação/reprodução de:

S
» Sons,

» Barulhos emitidos por pessoas, objetos, situações.

É bem utilizada em histórias em quadrinho, charges, tirinhas.

OO
O M ! NG
A ! 47
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

ZO OOM !
BANG!
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CATACRESE
É a utilização de uma determinada palavra, fora do seu contexto original, para nomear, de modo

figurativo, algo que não possui um nome específico.

EXEMPLOS:

» Pé da mesa

» Dente de alho

» Braço da poltrona

» Céu da boca

» Cabeça de prego

» Fio de azeite

» Batata da perna

» Maçã do rosto

» Boca da garrafa

48
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

GRADAÇÃO
É o uso sequenciado de palavras na exposição de um enunciado com uma mesma ideia.

EXEMPLOS:

“É pau, é pedra, é o fim do caminho...” (Tom Jobim)

As plantas nascem, crescem, reproduzem-se e morrem.

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AMBIGUIDADE
Também conhecido como polissemia, é o duplo sentido atribuído a uma palavra ou expressão, ou

que admite mais de uma interpretação ou gera dúvidas enquanto ao seu significado.

EXEMPLO:

Carlos disse ao amigo que havia chegado. (Quem havia chegado? Pedro ou o amigo?).

Mais especificamente, a polissemia refere-se aos vários sentidos de um enunciado como é o caso

das palavras “mangueira”, “vela”, “damas”, entre outras.

PLEONASMO
É quando se repete uma palavra ou expressão na frase com outra de mesmo sentido, o que torna

o enunciado redundante, ou seja, repetitivo.

EXEMPLO:

Você deve comparecer pessoalmente ao Posto de Saúde do seu bairro.

PLEONASMOS VICIOSOS:

» Hemorragia de sangue

» Duas metades

» Ambos os dois

» Verdade verdadeira

» Fato real

» Propriedade característica

» Sair para fora

49
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

» Entrar para dentro

» Subir para cima

» Encarar de frente

» Adiar para depois

» Retornar de novo
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SINESTESIA
É o uso de palavras que nos rementem aos sentidos:

» Visão,

» Audição,

» Tato,

» Paladar,

» Olfato.

EXEMPLO:

Antes de ser solto, já sentia o cheiro da liberdade.

Como pode ver, são muitas as figuras de linguagem. No entanto, ainda existem outras as quais

não nos referimos aqui:

» Antonomásia,

» Perífrase,

» Anacoluto,

» Elipse,

» Polissíndeto,

» Silepse,

» Aliteração,

» Assonância,

» Paranomásia, etc.

50
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

RESUMO:
A DENOTAÇÃO quer dizer que a palavra é empregada no SENTIDO LITERAL.

A CONOTAÇÃO quer dizer que a palavra é empregada no SENTIDO FIGURADO.

Sobre figuras de linguagem, veja um síntese no quadro abaixo:

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FIGURA PALAVRA-CHAVE EXEMPLO

Comparação Como Dirige como um louco.

Metáfora Conotativo Joana é uma flor.

Metonímia Troca Bebi um copo de leite.

Personificação Humanização As casas espiam os homens.

Hipérbole Exagero "Por você eu largo tudo /

Vou mendigar, roubar, matar..." (Cazuza)

Eufemismo Suavização O vereador faltou com a verdade

Anáfora Repetição É preciso amor para pulsar, é preciso paz pra

poder sorrir, é preciso a chuva florir.

Antítese Antônimo Estou cheio de me sentir vazio.

Paradoxo Oposição O riso é uma coisa séria.

Ironia Sarcasmo És burra como uma porta: um amor!

Onomatopeia Sons Psiu! Que zum zum zum é esse?

Catacrese Empréstimo Segurou no pescoço da garrafa.

Gradação Sequência Dei um passo, apressei-me, corri.

Ambiguidade Duplo Sentido Ele só quer saber da sua esposa.

Pleonasmo Redundância Saiu pra fora / Subiu no alto

Sinestesia Sentidos Um silêncio amargo invadiu a sala.

Perífrase Substituição "Cidade Maravilhosa, cheia de encantos mil..."

51
UNIDADE 2 :
SENTIDO DENOTATIVO, CONOTATIVO E FIGURAS DE LINGUAGEM [...]

REFERÊNCIA:
CEGALLA, Domingos Pascoal. Novíssima gramática da língua portuguesa. 48ª edição

revista. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2010.


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52
3
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS
AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

3.1 A noção de Gênero e Tipos Textuais 55


3.2 A Descrição dos Gêneros e dos Tipos Textuais 56
3.3 Os Modos de Organização da Composição Textual 59
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Continuando nossos estudos sobre os elementos que integram a linguagem como um todo, pas-

saremos agora para a parte que trata das características dos textos, percebíveis na forma e no

conteúdo.

Mas antes de iniciarmos, preciso questioná-los:

» Afinal, o que é um texto?


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» Uma palavra pode ser considerada um texto?

» Para que produzimos textos?

» Como os textos circulam socialmente?

Então, primeiramente é preciso ter em mente que nos comunicamos por meio de textos, ou seja,

produzimos textos para interagir com alguém e isso responde a pergunta “Para que produzi-

mos textos?”.

Quando perguntamos “Como que os textos circulam socialmente?” ampliamos um pouco a

noção de texto e passamos a entende-los como discursos. Então também indiciamos que há algo

entre texto e discurso. Mas vamos nos ater em saber o que é um texto e se uma palavra pode ser

considerada um texto.

Se já sabemos que nos comunicamos por meio de textos então o que precisa ser ou ter

para se constituir como tal?

É exatamente a situação de comunicação.

Estudiosos da área da comunicação vão dizer isso (vimos isso na unidade 1), mas estudiosos da

linguagem, tipo Bakhtin, vão dizer que é preciso ter “interação verbal”. Então, uma palavra pode

ser um texto?

Sim, desde que ela esteja numa situação de comunicação, que ela esteja num contexto de produ-

ção e que os interlocutores a entendam.

VAMOS EXEMPLIFICAR:

A palavra “chuva” se eu a disser agora não tem sentido. Mas se eu estou aqui conversando

com você, olho para a janela, e digo a palavra com uma entonação de pergunta, então ela

passa a ter sentido e a se configurar como um texto, porque transmitiu uma mensagem e

54
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

esteve num contexto de interação verbal no qual os interlocutores produziram sentidos, ou

seja, o falante perguntou e instigou a resposta ou o diálogo de seu ouvinte.

É lógico que não nos comunicamos por palavras soltas, mas por um encadeamento de palavras

que vão externar aquilo que queremos dizer. Também conseguimos perceber que para cada situ-

ação de comunicação, ou de interação, adequamos as nossas falas, os nossos textos.

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VEJAMOS:

O modo como contamos uma piada ou um caso que aconteceu conosco eventualmente se

dá da mesma forma do modo quando estamos numa entrevista de emprego, por exemplo?

Ainda, o modo como escrevo no WhatsApp para uma amiga, alguém íntimo, é diferente da forma

como escrevo para uma empresa solicitando um orçamento, não é mesmo?

Pois então, continuamos nossa conversa avançando para o subtema 3.1.

3.1 A NOÇÃO DE GÊNERO E TIPOS TEXTUAIS


As situações que trouxe anteriormente são apenas algumas. Poderia elencar várias outras aqui,

mas essas já nos bastam para dizer que os textos são diferentes e que se diferem pela situação de

comunicação (ou seja onde estou, o conteúdo temático do que comunico e como eu comunico),

pelo interlocutor (ou seja, com quem eu falo) e pelo objetivo da comunicação (ou seja, para que

eu falo).

55
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

São exatamente esses diferentes modos de produção que são conhecidos como gêneros textu-

ais. Consideramos, embasados em Koch e Travaglia (2000), que têm como base os estudos de

Bakhtin, que o texto é uma unidade linguística concreta, que é tomada pelos usuários da língua

(falante/ouvinte, escritor/leitor) em uma situação de interação, como uma unidade de sentido

completo que preenche uma função comunicativa.


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Nos livros didáticos para o ensino da Língua Portuguesa, em propostas curriculares e em textos

teóricos é muito comum vermos a referência aos tipos de textos, ou tipologia textual. É com base

na Linguística Textual que se faz isso.

Mas gênero e tipologia textual é a mesma coisa?

Marcuschi (2005) esclarece que


"
os tipos textuais são limitados, ao contrário dos gêneros textu-

ais que apresentam número ilimitado.

"
Avançando para o subtema 3.2, compreenderá melhor.

3.2 A DESCRIÇÃO DOS GÊNEROS E DOS TIPOS TEXTUAIS


Você já devem ter ouvido falar em tipos de textos: descritivos, narrativos, dissertativo, expositivo e

injuntivo. Alguns autores ainda acrescentam o tipo poético e outros o dialogal.

Segundo Caldas (s.d)


"
“[...]a diferença entre tipos e gêneros textuais ainda não está cla-

ra para nem para os alunos nem para os professores. Para de-

finir esse aspecto teórico e terminológico, Marcuschi (2002:22)

apresenta uma breve definição das duas noções”:

56
"
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

TIPOS TEXTUAIS GÊNEROS TEXTUAIS

Constructos teóricos definidos por propriedades Realizações linguísticas concretas definidas por

linguísticas intrínsecas propriedades sócio comunicativas

Constituem sequências linguísticas ou sequências Constituem textos empiricamente realizados cumprindo

de enunciados no interior dos gêneros e funções em situações comunicativas

não são textos empíricos

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Sua nomeação abrange um conjunto limitado de Sua nomeação abrange um conjunto aberto e praticamente

categorias teóricas determinadas por aspectos lexicais, ilimitado de designações concretas determinadas pelo canal,

sintáticos, relações lógicas, tempo verbal estilo, conteúdo, composição e função

Designações teóricas dos tipos: Exemplos de Gêneros:

Narração, argumentação, descrição, injunção e exposição. telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, aula

expositiva, romance, reunião de condomínio, lista de compras,

conversa espontânea, cardápio, receita culinária, inquérito

policial, etc.

Para este estudo, veja algumas características básicas dos cinco tipos textuais apresentados por

Marchuschi (2005):

» NARRAÇÃO, quando o que se pretende é contar, apresentar os fatos, os acontecimentos;

» Descrição, quando o que se busca e caracterizar, dizer como é o objeto, a situação, a pes-

soa, fazendo conhecê-lo(a);

» DISSERTAÇÃO/ARGUMENTAÇÃO, quando o que se quer é refletir, explicar, avaliar, co-

mentar, conceituar, expor posicionamentos, pontos de vistas, para dar a conhecer, para fa-

zer saber, crer;

» EXPOSIÇÃO, quando o que se quer é expor dados, apresentar teorias, conceitos, informa-

ções.

» INJUNÇÃO, quando o que se busca é incitar a realização de uma ação por parte do inter-

locutor, orientando-o e aconselhando-o;

57
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Perceba como se relaciona alguns gêneros textuais às tipologias:

TIPOLOGIAS GÊNEROS

NARRATIVA: Conto de fadas; Fábula, Biografia Romanceada; Roman-


» Liga-se a percepção no tempo; ces, Contos; Crônicas: Literária, Social, Esportiva; Charge,
» Realiza-se por meio de verbos de mudanças no preté- Piada; Notícia, Reportagem; Casos Contados em rodas
rito perfeito e imperfeito e por expressões adverbiais de de amigos, etc.
tempo e de lugar.
» Quando uma história é narrada, inclui-se tempo, espa-
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ço, personagens, enredo,etc...

DESCRITIVA:
» Liga-se a nossa percepção de espaço; Conto de fadas; Poema (Descritivo), Fábula; Biografia
» Permite ao leitor construir um retrato mental; Romanceada; Romances; Contos; Crônicas: Literária, So-
» Possui uma estrutura simples com um verbo estático cial, Esportiva; Noticia; Reportagem; Casos Contados em
no presente do indicativo ou no pretérito perfeito do Rodas de Amigos etc.
indicativo;
» Adjetivos, advérbios de lugar e de modo;
» Caracteriza uma pessoa, uma paisagem, um ambien-
te, um objeto;

ARGUMENTATIVA:
» Liga-se ao ato de julgar e a tomada de posição; Artigos de opinião; Carta de Leitor; Carta de Reclama-
» Realiza-se por meio de conectores lógicos; ção; Carta de Solicitação; Debate Regrado; Discurso de
» Predominam as sequências contrastivas explícitas. Defesa (advocacia); Discurso de Acusação (advocacia);
» Além de muitas outras relações, expõem-se ideias Resenha Crítica; Editorial; Ensaio etc.
para convencer o leitor/ouvinte de certos posiciona-
mentos.

EXPOSITIVA:
» E caracterizada pela intenção de facilitar a compre- Seminário; Conferência; Comunicação Oral; Palestra;
ensão do leitor/ouvinte através de informações que Entrevista de Especialista.
normalmente são feitas por meio de texto expositivo Predominam as sequências explicitamente explicativas,
(em livro didático); artigos científicos, notícias jornalísticas, verbetes de en-
» Pode ocorrer em trechos de: afirmações e logicidade ciclopédias. Também em trechos informativos de outros
na ordenação de conceitos, entre outros aspectos; gêneros, como romances, relatórios e cartas.

INJUNTIVA
» Liga-se a previsão de comportamento por meio de Anúncios e peças publicitárias;
enunciados incitadores à ação. Receitas de culinária, Instruções de uso;
» Concretiza-se por meio de verbos no imperativo ou de Instruções de montagem, Regras de utilização; leis; re-
perguntas e de expressões congeladas de cumprimento. ceitas de culinária, Guias; regras de trânsito, obrigações a
» Direta ou indiretamente, se instrui ou se orienta o cumprir/ normas de conduta etc.
leitor/ouvinte, visto como aquele que pode tomar uma
decisão ou realizar algo.

58
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Por que muitas vezes classificamos o gênero notícia como texto narrativo?

Por que o texto se organiza em torno da estrutura da narração:

» Equilíbrio Inicial;

» Instauração de um conflito;

» Clímax e resolução do conflito;

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Ou seja, para a tipologia textual, o que define um tipo de texto é a sua característica, ou a sua

estrutura predominante.
"
Em contrapartida, para os gêneros discursivos, segundo Bakhtin (2003, p. 277)

Cada enunciado é particular e individual, mas cada campo de

utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis

de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso

(BAKHTIN, 2003, p.277).

"
Por isso também que muitas vezes ficamos confusos em classificar um determinado texto em

uma tipologia textual, pois eles podem apresentar partes com características tipológicas diferen-

tes, mistas.

Com o intuito de exemplificar esses modos de organização dos textos (tipos e gêneros) é que

seguimos para o subitem 3.3, onde você compreenderá melhor o que está sendo abordado nesta

unidade.

3.3 OS MODOS DE ORGANIZAÇÃO DA COMPOSIÇÃO TEXTUAL

NARRAÇÃO
É contar histórias, oralmente ou de forma escrita. Logo, as narrativas são textos com a exposição

de um acontecimento ou uma sucessão deles, reais ou imaginários.

De acordo com Gancho (2003), toda narrativa tem elementos fundamentais, que são:

59
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

» ENREDO:

Conjunto de fatos da história, marcados por u conflito que é dividido em partes (exposição,

complicação ou desenvolvimento, clímax e desfecho).

» PERSONAGENS:

Ser fictício (ou não) que é responsável pelo desempenho do enredo. Quem faz a ação. Eles
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podem ser protagonista (principal), antagonista (que se opõe ao principal) e secundário

(menos importantes ou com participação menor na história). Trechos descritivos na narra-

tiva caracterizam melhor os personagens.

Veja um exemplo com um trecho inicial do conto Negrinha, de Monteiro Lobato:

Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta? Não; fusca, mulatinha es-
cura, de cabelos ruços e olhos assustados.
Nascera na senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos vivera-os pelos
cantos escuros da cozinha, sobre velha esteira e trapos imundos. Sempre
escondida, que a patroa não gostava de crianças.
Excelente senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos pa-
dres, com lugar certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu. Enta-
ladas as banhas no trono (uma cadeira de balanço na sala de jantar), ali bor-
dava, recebia as amigas e o vigário, dando audiências, discutindo o tempo.
Uma virtuosa senhora em suma — “dama de grandes virtudes apostólicas,
esteio da religião e da moral”, dizia o reverendo.
Ótima, a dona Inácia.
Mas não admitia choro de criança. Ai! Punha-lhe os nervos em carne viva.
Viúva sem filhos, não a calejara o choro da carne de sua carne, e por isso
não suportava o choro da carne alheia. Assim, mal vagia, longe, na cozinha, a
triste criança, gritava logo nervosa:
— Quem é a peste que está chorando aí?
Quem havia de ser? A pia de lavar pratos? O pilão? O forno? A mãe da cri-
minosa abafava a boquinha da filha e afastava-se com ela para os fundos do
quintal, torcendo-lhe em caminho beliscões de desespero.
— Cale a boca, diabo!
No entanto, aquele choro nunca vinha sem razão. Fome quase sempre, ou
frio, desses que entanguem pés e mãos e fazem-nos doer...
Assim cresceu Negrinha — magra, atrofiada, com os olhos eternamente as-
sustados. Órfã aos quatro anos, por ali ficou feito gato sem dono, levada a
pontapés. Não compreendia a idéia dos grandes. Batiam-lhe sempre, por
ação ou omissão. A mesma coisa, o mesmo ato, a mesma palavra provocava
ora risadas, ora castigos. Aprendeu a andar, mas quase não andava. Com
pretextos de que às soltas reinaria no quintal, estragando as plantas, a boa
senhora punha-a na sala, ao pé de si, num desvão da porta.

[...]

60
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

» ESPAÇO:

Lugar físico onde se passa a ação de uma narrativa, situando as ações dos personagens (es-

paço fechado, aberto, espaço urbano, rural, na escola, na praça, em casa, na rua, etc.)

Para designar um espaço “psicológico”, “social”, “econômico” etc. Gancho (2003) emprega

o termo ambiente.

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» TEMPO:

Época que se passa a história, duração da história (curta, longa, horas, dias), cronológico (tem-

po que transcorre na ordem natural dos fatos) ou psicológico (tempo que transcorre numa

ordem determinada pelo desejo ou pela imaginação do narrador ou dos personagens).

» NARRADOR:

Elemento estruturador da história, é aquele que a conta. Pode ser a terceira pessoa (ele/ela),

estando fora dos fatos narrados (narrador observador) ou a primeira pessoa (eu - narrador

personagem), participando diretamente do enredo como qualquer personagem:

OBSERVE OS EXEMPLOS:
"
Com narrador observador (extraído de Gancho - 2003):

(...) Pedro sentou-se, cruzou as pernas, tirou algumas notas da

flauta, como para experimentá-la e depois, franzindo a testa,

entrecerrando os olhos, alçando muito as sobrancelhas, come-

çou a tocar. Era uma melodia lenta e meio fúnebre. O agu do

som do instrumento penetrou Ana Terra como uma agulha, e

ela se sentiu ferida, trespassada. (...) Tirou as mãos de dentro

da água da gamela, enxugou-as num pano e aproximou-se

da mesa. Foi então que deu com os olhos de Pedro e daí por

diante, por mais esforços que fizesse, não conseguiu desviar-se

deles. Parecia-lhe que a música saia dos olhos do índio e não

da flauta — morna, tremida e triste como a voz duma pessoa

infeliz. (...) (O continente. ln: O tempo e o vento. Rio de Janeiro,

Globo, 1963. t. 1, p. 88.)

" 61
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Com narrador personagem (extraído de Mariconi, 2001)

As minhas primeiras relações com a justiça foram dolorosas e deixaram-me


funda impressão. Eu devia ter quatro ou cinco anos, por aí, e figurei na qua-
lidade de réu. Certamente já me haviam feito representar esse papel, mas
ninguém me dera a entender que se tratava de julgamento. Batiam-me por-
que podiam bater-me, e isto era natural.

Os golpes que recebi antes do caso do cinturão, puramente físicos, desa-


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pareciam quando findava a dor. Certa vez minha mãe surrou-me com uma
corda nodosa que me pintou as costas de manchas sangrentas. Moído, vi-
rando a cabeça com dificuldade, eu distinguia nas costelas grandes lanhos
vermelhos. Deitaram-me, enrolaram-me em panos molhados com água de
sal – e houve uma discussão na família. Minha avó, que nos visitava, conde-
nou o procedimento da filha e esta afligiu-se. Irritada, ferira-me à toa, sem
querer. Não guardei ódio a minha mãe: o culpado era o nó. Se não fosse ele,
a flagelação me haveria causado menor estrago. E estaria esquecida. A his-
tória do cinturão, que veio pouco depois, avivou-a.

Meu pai dormia na rede, armada na sala enorme. Tudo é nebuloso. Pare-
des extraordinariamente afastadas, rede infinita, os armadores longe, e meu
pai acordando, levantando-se de mau humor, batendo com os chinelos no
chão, a cara enferrujada. Naturalmente não me lembro da ferrugem, das ru-
gas, da voz áspera, do tempo que ele consumiu rosnando uma exigência. Sei
que estava bastante zangado, e isto me trouxe a covardia habitual. Desejei
vê-lo dirigir-se a minha mãe e a José Baía, pessoas grandes, que não leva-
vam pancada. Tentei ansiosamente fixar-me nessa esperança frágil. A força
de meu pai encontraria resistência e gastar-se-ia em palavras.

Débil e ignorante, incapaz de conversa ou defesa, fui encolher-me num can-


to, para lá dos caixões verdes. Se o pavor não me segurasse, tentaria escapu-
lir-me: pela porta da frente chegaria ao açude, pela do corredor acharia o pé
do turco. Devo ter pensado nisso, imóvel, atrás dos caixões. Só queria que
minha mãe, sinhá Leopoldina, Amaro e José Baía surgissem de repente, me
livrassem daquele perigo.

Ninguém veio, meu pai me descobriu acocorado e sem fôlego, colado ao


muro, e arrancou-me dali violentamente, reclamando um cinturão. Onde es-
tava o cinturão? Eu não sabia, mas era difícil explicar-me: atrapalhava-me, ga-
guejava, embrutecido, sem atinar com o motivo da raiva. Os modos brutais,
coléricos, atavam-me; os sons duros morriam, desprovidos de significação.

Não consigo reproduzir toda a cena. Juntando vagas lembranças dela a fa-
tos que se deram depois, imagino os berros de meu pai, a zanga terrível, a
minha tremura infeliz. Provavelmente fui sacudido. O assombro gelava-me
o sangue, escancarava-me os olhos.

Onde estava o cinturão? Impossível responder. Ainda que tivesse escondido


o infame objeto, emudeceria, tão apavorado me achava. Situações deste gê-
nero constituíram as maiores torturas da minha infância, e as consequências
delas me acompanharam.

62
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

O homem não me perguntava se eu tinha guardado a miserável correia: or-


denava que a entregasse imediatamente. Os seus gritos me entravam na
cabeça, nunca ninguém se esgoelou de semelhante maneira.

Onde estava o cinturão? Hoje não posso ouvir uma pessoa falar alto. O co-
ração bate-me forte, desanima, como se fosse parar, a voz emperra, a vista
escurece, uma cólera doida agita coisas adormecidas cá dentro. A horrível
sensação de que me furam os tímpanos com pontas de ferro.

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Onde estava o cinturão? A pergunta repisada ficou-me na lembrança: pare-
ce que foi pregada a martelo.

A fúria louca ia aumentar, causar-me sério desgosto. Conservar-me-ia ali


desmaiado, encolhido, movendo os dedos frios, os beiços trêmulos e silen-
ciosos. Se o moleque José ou um cachorro entrasse na sala, talvez as pan-
cadas se transferissem. O moleque e os cachorros eram inocentes, mas não
se tratava disto. Responsabilizando qualquer deles, meu pai me esquece-
ria, deixar-me-ia fugir, esconder-me na beira do açude ou no quintal. Minha
mãe, José Baía, Amaro, sinhá Leopoldina, o moleque e os cachorros da fa-
zenda abandonaram-me. Aperto na garganta, a casa a girar, o meu corpo a
cair lento, voando, abelhas de todos os cortiços enchendo-me os ouvidos – e,
nesse zunzum, a pergunta medonha. Náusea, sono. Onde estava o cinturão?
Dormir muito, atrás de caixões, livre do martírio.

Havia uma neblina, e não percebi direito os movimentos de meu pai. Não o
vi aproximar-se do torno e pegar o chicote. A mão cabeluda prendeu-me, ar-
rastou-me para o meio da sala, a folha de couro fustigou-me as costas. Uivos,
alarido inútil, estertor. Já então eu devia saber que gogos e adulações exaspe-
ravam o algoz. Nenhum socorro. José Baía, meu amigo, era um pobre-diabo.

Achava-me num deserto. A casa escura, triste; as pessoas tristes. Penso com
horror nesse ermo, recordo-me de cemitérios e de ruínas mal-assombradas.
Cerravam-se as portas e as janelas, do teto negro pendiam teias de aranha.
Nos quartos lúgubres minha irmãzinha engatinhava, começava a aprendiza-
gem dolorosa.

Junto de mim, um homem furioso, segurando-me um braço, açoitando-me.


Talvez as vergastadas não fossem muito fortes: comparadas ao que senti de-
pois, quando me ensinaram a carta de A B C, valiam pouco. Certamente o
meu choro, os saltos, as tentativas para rodopiar na sala como carrapeta eram
menos um sinal de dor que a explosão do medo reprimido. Estivera sem bulir,
quase sem respirar. Agora esvaziava os pulmões, movia-me num desespero.

O suplício durou bastante, mas, por muito prolongado que tenha sido, não igua-
lava a mortificação da fase preparatória: o olho duro a magnetizar-me, os gestos
ameaçadores, a voz rouca a mastigar uma interrogação incompreensível.

Solto, fui enroscar-me perto dos caixões, coçar as pisaduras, engolir solu-
ços, gemer baixinho e embalar-me com os gemidos. Antes de adormecer,
cansado, vi meu pai dirigir-se à rede, afastar as varandas, sentar-se e logo se
levantar, agarrando uma tira de sola, o maldito cinturão, a que desprendera
a fivela quando se deitara. Resmungou e entrou a passear agitado. Tive a

63
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

impressão de que ia falar-me: baixou a cabeça, a cara enrugada serenou, os


olhos esmoreceram, procuraram o refúgio onde me abatia, aniquilado.

Pareceu-me que a figura imponente minguava – e a minha desgraça dimi-


nuiu. Se meu pai se tivesse chegado a mim, eu o teria recebido sem o arrepio
que a presença dele sempre me deu. Não se aproximou: conservou-se longe,
rondando, inquieto. Depois se afastou.

Sozinho, vi-o de novo cruel e forte, soprando, espumando. E ali permaneci,


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miúdo, insignificante, tão insignificante e miúdo como as aranhas que tra-


balhavam na telha negra.

Foi esse o primeiro contato que tive com a justiça.


(RAMOS, Graciliano. Um Cinturão. In: Os Cem Melhores Contos Brasileiros
do Século. Org. MORICONI, Ítalo. Rio de Janeiro: OBJETIVA, 2000, p.144-146)

As narrativas também apresentam, segundo Gancho (2003):

» TEMA:

Ideia em torno da qual se desenvolve a história. Pode-se identificá-lo, pois corresponde a

um substantivo (ou expressão substantiva) abstrato(a).

» ASSUNTO:

Concretização do tema, isto é, como o tema aparece desenvolvido no enredo. Pode-se iden-

tificá-lo nos fatos da história e corresponde geralmente a um substantivo (ou expressão

substantiva) concreto(a).

» MENSAGEM:

Pensamento ou conclusão que se pode depreender da história lida ou ouvida.

DESCRIÇÃO
Descrição é caracterizar algo, fazer o detalhamento, a representação oral ou escrita de. Logo, tex-

tos descritivos detalham os aspectos de um determinado lugar, acontecimento, pessoa, objeto,

animal, etc., de modo que o leitor consiga criar mentalmente a imagem do que foi descrito.

Um texto descritivo é rico em adjetivos, substantivos e locuções adjetivas. Ele não apresenta ações

realizadas e não situa o leitor no tempo (como vimos isso caracteriza a narrativa), mas pode fazer

referência as atividades realizadas por um profissional, bem como veremos no exemplo. Dessa

64
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

forma, a descrição pode ser feita de forma objetiva ou subjetiva. Veja como Duarte (s.d) difere:

Na descrição objetiva, como literalmente ela traduz, o objetivo principal é relatar as características

do “objeto” de modo preciso, isentando-se de comentários pessoais ou atribuições de quaisquer

termos que possibilitem a múltiplas interpretações.

A subjetiva perfaz-se de uma linguagem mais pessoal, na qual são permitidas opiniões, expressão

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de sentimentos e emoções e o emprego de construções livres em que revelem um “toque” de

individualismo por parte de quem a descreve.

É muito comum, em editais de concurso público, a descrição das atribuições dos profissionais a

serem contratados. Observe.

FUNÇÃO: ADVOGADO

CÓDIGO DA FUNÇÃO: 1002 CARGA HORÁRIA: 40 horas semanais

CBO: 241005 JORNADA: na forma da legislação vigente

ESCOLARIDADE EXIGIDA :
Graduação em Direito, Fixado na forma da Lei Estadual Nº 15.050 de 12/04/2006.

DESCRIÇÃO SUMÁRIA DAS TAREFAS :

Postular, em nome da Instituição ou clientes, em juízo, propondo ou contestando ações, solicitar


providências junto ao magistrado ou ministério público, avaliar provas, realizar audiências.
Analisar legislação e orientar a sua aplicação.

DESCRIÇÃO DETALHADA DAS TAREFAS QUE COMPÕEM A FUNÇÃO :

01. Postular em juízo.


02. Prestar assessoria jurídica extrajudicial.
03. Realizar estudos específicos sobre temas e problemas jurídicos de interesse da Instituição.
04. Formalizar parecer técnico-jurídico.
05. Analisar, fatos, relatórios e documentos.
06. Realizar auditorias jurídicas.
07. Definir natureza jurídica da questão.
08. Redigir e formatar documentos jurídicos.
09. Auxiliar nos trabalhos das comissões instituídas.
10. Analisar a legislação e orientar a sua aplicação no âmbito da Instituição.
11. Preparar relatórios, planilhas, informações para expedientes e processos sobre matéria própria do Órgão
e proferir despachos interlocutórios e preparatórios de decisão superior.
12. Participar de programa de treinamento, quando convocado.
13. Participar, conforme a política interna da Instituição, de projetos, cursos, eventos, convênios e progra-
mas de ensino, pesquisa e extensão.
14. Executar tarefas pertinentes à área de atuação, utilizando-se de equipamentos e programas de informática.
15. Executar outras tarefas compatíveis com as exigências para o exercício da função.

FONTE: http://www.uel.br/prorh/carreira/classe_1/advogado.pdf

Nota-se que é diferente de uma descrição em prosa, bem como foi mostrado nos fragmentos

que descrevem as personagens no conto Negrinha, de Monteiro Lobato, na seção narrativa desta

65
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

unidade.

Por isso, é importante dizer que dificilmente encontraremos um texto todo descritivo, sendo mui-

to mais provável encontrarmos trechos descritivos em outros tipos de texto. É dessa forma que os

textos se constituem como “relativamente estáveis”, fazendo menção a Bakhtin (2003).


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DISSERTAÇÃO/ARGUMENTAÇÃO
Dissertação é a apresentação de um tema, explicando-o, enquanto argumentação é defender

um ponto de vista com base em argumentos. Um texto dissertativo argumentativo apresenta

a temática e defende uma opinião baseada em fatos comprobatórios, referência a autores que

também discutem a temática e em dados de pesquisas. Tem uma estrutura bastante rígida, divi-

dindo-se em três partes fundamentais: introdução, desenvolvimento e conclusão. O site do Brasil

Escola traz uma definição pertinente:

» INTRODUÇÃO

No início da dissertação, é necessário que o autor deixe claro qual é o assunto abordado no

texto e, além disso, qual será a tese - ou ponto de vista - a ser defendida.

» ARGUMENTAÇÃO

Os parágrafos intermediários de uma dissertação devem ser destinados à defesa da tese

mediante argumentos. É importante lembrar que um argumento é uma estrutura textual

que, por meio da análise de provas ou fundamentos, confirma o ponto de vista do autor.

» CONCLUSÃO

O final de um texto dissertativo-argumentativo pode ser produzido de duas formas, en-

quanto síntese ou com propostas de solução.

No caso da conclusão por síntese, o autor repete os argumentos resumidamente e conclui

o texto afirmando a veracidade da tese.

No caso da conclusão com propostas de solução, é necessário retomar os problemas dis-

cutidos na argumentação e propor intervenções que eliminem ou diminuam a questão

problemática.

66
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

É importante frisar que um texto dissertativo-argumentativo é muito solicitado em provas de

concurso, do Enem e de processos seletivos diversos.

É o mais utilizado na esfera jurídica e em trabalhos de conclusão de cursos (graduação), dis-

sertações (mestrado) e teses (doutorado). Por isso a linguagem deve obedecer à norma culta

da língua, apresentar elementos coesivos adequadamente, ser claro, coerente e fundamentar os

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conhecimentos com base em argumentos de diversas áreas, estabelecendo uma relação entre a

temática principal (veremos isso na unidade 4 deste Livro Digital).

Os textos a seguir ilustram a qualidade de um texto dissertativo argumentativo realizado na ocasião

do Enem, em 2017 e 2018, cujos temas foram “Desafios para a formação educacional de surdos no

Brasil” e “Manipulação do comportamento de usuário pelo controle de dados na internet”.

A obra musical “Admirável Chip Novo”, da cantora Pitty, retrata a manipu-


lação das ações humanas em razão do uso das tecnologias, que findam
por influenciar o comportamento dos indivíduos. Não obstante, tal questão
transcende a arte e mostra-se presente na realidade brasileira através da Introdução com
apresentação da
filtragem de dados na internet e sua utilização como ferramenta de deter-
temática
minação de atitudes, consequência direta do interesse do mercado globali-
zado e da vulnerabilidade dos usuários. Assim, torna-se fundamental a dis-
cussão desses aspectos, a fim do pleno funcionamento da sociedade.

Convém ressaltar, a princípio, o estabelecimento do comércio virtual e sua


contribuição para a continuidade da problemática. Quanto a esse fator, é
válido considerar a alta capacidade publicitária da web, bem como sua con-
solidação enquanto espaço mercantil, possibilitador de compra e venda de
produtos. Sob esse aspecto, o célebre geógrafo, Milton Santos, afirma a exis-
tência de relação entre o desenvolvimento técnico-científico e as demandas
da globalização, justificando, assim, a constante oferta de conteúdos cultu-
rais e comerciais que podem ser adquiridos pelos usuários, de modo a forta-
lecer o mercado mundial e o capitalismo.
Desenvolvimento
com argumentos,
Paralelo a isso, a imperícia social vinculada ao déficit em letramento digital referências e com-
fomenta a perpetuação do impasse. Nesse viés, as instituições educacionais parações
ainda não são eficazes na educação tecnológica, por não contarem com es-
trutura profissional e material voltado ao tema. Ademais, a formação de in-
divíduos vulneráveis possibilita a ação do mecanismo que pode transformar
comportamentos, tornando-os passíveis de alienação. Essa conjuntura con-
traria o Estado proposto pelo filósofo John Locke - assegurador de liberdade
-, gerando falsa sensação de autonomia e expondo internautas a um am-
biente não transparente, em que decisões são previamente programadas
por outrem.

67
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Em suma, faz-se imprescindível a tomada de medidas atenuantes ao en-


trave abordado. Posto isso, concerne ao Estado, mediante os Ministérios da
Educação e Ciência e Tecnologia, a criação de um plano educacional que
Conclusão com
vise a elucidar a população quanto aos riscos da navegação na rede e à ne- proposta de inter-
cessidade de adaptação aos novos instrumentos digitais. Tal projeto deve venção
ser instrumentalizado na oferta de aparelhos tecnológicos às escolas, para a
promoção de palestras e aulas práticas sobre o uso da tecnologia, mediadas
por técnicos e professores da área, objetivando a qualificação dos usuários
e a prevenção de casos de manipulação de atitudes. Dessa maneira, o Brasil
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poderá garantir a liberdade de seus cidadãos e o Estado lockeano poderá


ser consolidado.”

Rylla Lídice Varela de Melo, 19 anos, de Ipanguaçu/RN, apro-

vada em Medicina na UFPB

A formação educacional de surdos encontra, no Brasil, uma série de empe-


cilhos. Essa tese pode ser comprovada por meio de dados divulgados pelo
Inep, os quais apontam que o número de surdos matriculados em institui-
Introdução com
ções de educação básica tem diminuído ao longo dos últimos anos. Nesse apresentação da
sentido, algo deve ser feito para alterar essa situação, uma vez que milhares temática
de surdos de todo o país têm o seu direito à educação vilipendiado, confron-
tando, portanto, a Constituição Cidadã de 1988, que assegura a educação
como um direito social de todo o cidadão brasileiro.

Em primeira análise, o descaso estatal com a formação educacional de de-


ficientes auditivos mostra-se como um dos desafios à consolidação dessa
formação. Isso porque poucos recursos são destinados pelo Estado à cons-
trução de escolas especializadas na educação de pessoas surdas, bem como
à capacitação de profissionais para atenderem às necessidades especiais
desses alunos. Ademais, poucas escolas são adeptas do uso de libras, se-
gunda língua oficial do Brasil, a qual é primordial para a inclusão de alunos
surdos em instituições de ensino. Dessa forma, a negligência do Estado, ao
investir minimante na educação de pessoas especiais, dificulta a universali-
zação desse direito social tão importante.
Desenvolvimento
Em segunda análise, o preconceito da sociedade com os deficientes apre- com argumentos,
análise de conjun-
senta-se como outro fator preponderante para a dificuldade na efetivação tura e referência à
da educação de pessoas surdas. Essa forma de preconceito não é algo re- história
cente na história da humanidade: ainda no Império Romano, crianças de-
ficientes eram sentenciadas à morte, sendo jogadas de penhascos. O pre-
conceito ao deficiente auditivo, no entanto, reverbera na sociedade atual,
calcada na ética dilitarista, que considera inútil pessoas que, aparentemente
menos capacitadas, têm pouca serventia à comunidade, como é caso de
surdos. Os deficientes auditivos, desse modo, são muitas vezes vistos como
pessoas de menor capacidade intelectual, sendo excluídos pelos demais, o
que dificulta aos surdos não somente o acesso à educação, mas também à
posterior entrada no mercado de trabalho.

68
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Nesse sentido, urge que o Estado, por meio de envio de recursos ao Ministé-
rio da Educação, promova a construção de escolas especializadas em defi-
cientes auditivos e a capacitação de profissionais para atuarem não apenas
nessas escolas, mas em instituições de ensino comuns também, objetivan-
do a ampliação do acesso à educação aos surdos, assegurando a estes, por
fim, o acesso a um direito garantido constitucionalmente. Outrossim, ONGs Conclusão com
devem promover, através da mídia, campanhas que conscientizem a popu- proposta de inter-
lação acerca da importância do deficiente auditivo para a sociedade, enfati- venção
zando em mostrar a capacidade cognitiva e intelectual do surdo, o qual seria

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capaz de participar da população economicamente ativa (PEA), como fosse
concedido a este o direito à educação e à equidade de tratamento, por meio
da difusão do uso de libras. Dessa forma, o Brasil poderia superar os desafios
à consolidação da formação educacional de surdos.

Fonte: https://vestibular.brasilescola.uol.com.br/enem/conheca-as-redacoes-nota-mil-

-enem-2018/345063.html

https://g1.globo.com/educacao/noticia/leia-redacoes-nota-mil-do-enem-2017.ghtml.

Acesso em 08 out. 2019.

EXPOSIÇÃO
Exposição é a apresentação de informações sobre um determinado objeto ou fato. Trata-se de

um texto usado para apresentar informações, características, permitindo que o leitor identifique

de forma bastante clara qual é o tema central do texto.

De acordo com o site https://conceitos.com/texto-expositivo/, existem duas variantes de textos

expositivos: os textos de divulgação e os especializados.

» TEXTOS DE DIVULGAÇÃO:

São aqueles em que o tema tratado se dirige a toda população, como um artigo de história

em uma revista escolar, os conteúdos de Wikipédia ou até mesmo os artigos que compõem

este site.

» TEXTOS ESPECIALIZADOS:

São direcionados para um tipo de leitor que já tem algum conhecimento prévio, por exem-

plo, um artigo de história em uma publicação universitária, uma tese doutoral ou um rela-

tório pericial.

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UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Eles tem uma linguagem clara, objetiva, não apresenta a opinião do autor e se estrutura, na maio-

ria das vezes, em torno de uma apresentação, de um desenvolvimento e de uma conclusão. Veja

nos exemplos a seguir como a informação é clara e informativa, apresentando a temática da ofer-

ta de bolsas para estudos no Canadá e a do saneamento básico nas comunidades.


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Fonte: http://portal.mec.gov.br/component/content/article?id=81121

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FONTE: http://socioambiental-diocesesjc.blogspot.com/2016/02/lanca-

mento-da-cartilha-o-saneamento_13.html. Acseso em 08 out. 2019.

INJUNÇÃO
O texto injuntivo, também chamado de instrucional, indica um procedimento para realizar algo.

Alguns exemplos, como visto anteriormente, são a bula de um remédio, um manual de instruções

ou uma receita culinária. Veja os exemplos:

Pizza

Disolva o fermento no Acrescente aos poucos a


leite morno. farinha de trigo, o sal e
óleo.
Ingredientes:
2 1/2 de xÀcara de farinha de trigo

1 colher de sopa de fermento para p¡o.


3
/4 de xÀcara de —leo ou azeite

1 pitada de sal

Abra a massa e deixe Asse por 15 minutos antes


descansar até crescer. de colocar o molho de
tomate e o recheio.

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UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

RESUMO:
Para que um enunciado se constitua como um texto é necessário que ele esteja numa situa-

ção de comunicação, ou seja, num contexto de produção e que os interlocutores a entendam.

Os textos se diferem pela situação de comunicação (ou seja onde estou, o conteúdo

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temático do que comunico e como eu comunico), pelo interlocutor (ou seja, com quem

eu falo) e pelo objetivo da comunicação (ou seja, para que eu falo).

Esses diferentes modos de produção que são conhecidos como gêneros textuais.

Os gêneros textuais são inúmeros, a tipologia textual é limitada.

São tipos textuais:

» Narrativo,

» Descritivo,

» Argumentativo,

» Expositivo e

» Injuntivo.

Pode-se dizer que um gênero textual pode conter uma ou mais tipologias textuais.

Para os gêneros crônica, romance, fábula, piada, contos de fadas, entre outros, a tipolo-

gia textual predominante é a narrativa.

Para os gêneros anúncio de classificado, lista de compras, cardápio, cartaz de procura-

-se, a tipologia que predomina é a descritiva.

Para os gêneros manifesto, sermão, monografia, ensaio, editorial, dissertação, a tipolo-

gia predominante é argumentativa.

Para os gêneros livro didático, verbete de dicionário e enciclopédia, é a tipologia expo-

sitiva que predomina.

Para os gêneros propaganda, receita culinária, manual de instruções, entre outros, é a

tipologia injuntiva.

73
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

REFERÊNCIA:
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

BRASIL / Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.

Parâmetros curriculares nacionais de Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1997.


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CALDAS, Lilian Kelly. Trabalhando tipos/gêneros textuais em sala de aula: uma estra-

tégia didática na perspectiva da mediação dialética. IBILCE/Unesp. São José do Rio Pre-

to-SP. Sd. Disponível em: < http://alb.com.br/arquivo-morto/edicoes_anteriores/anais16/

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DUARTE, Vânia Maria do Nascimento. O texto descritivo; Brasil Escola. Disponível em:

https://brasilescola.uol.com.br/redacao/o-texto-descritivo.htm. Acesso em 09 out. de 2019.

GANCHO, Cândida Vilares. Como analisar narrativas. 7. Ed. Série Princípios. São Paulo:

Ática, 2003.

KOCH, Ingedore. Introdução à Linguística Textual: Trajetória e grandes temas. São

Paulo: Martins Fontes, 2006.

MARCUSCHI, Luiz Antonio. Gêneros Textuais: definição e funcionalidade. In: Gêneros

Textuais e ensino. Organizado por Angela Paiva Dionísio, Anna Rachel Machado e Maria

Auxiliadora Bezerra. 3 ed. – Rio de Janeiro: Lucerna, 2005. p. 19-36

MARCUSCHI, Luiz Antonio. Produção Textual, Análise de Gêneros e Compreensão. São

Paulo: Parábola Editorial, 2008.

MARICONI, Italo (Org.). Os cem melhores contos brasileiros do século. Rio de janeiro:

Objetiva, 2001.

MARINHO, Fernando. Texto Dissertativo-Argumentativo; Brasil Escola. Disponível em:

https://brasilescola.uol.com.br/redacao/texto-dissertativo-argumentativo.htm. Acesso

em 09 de outubro de 2019.

74
UNIDADE 3 :
GÊNEROS TEXTUAIS E TIPOLOGIA ASSOCIADOS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

TRAVAGLIA, L. C. [2003]. Tipelementos e a construção de uma teoria tipológica geral

de textos. In: FAVERO, Leonor Lopes; BASTOS, Neusa M. de O. Barbosa e MARQUESI,

Sueli Cristina (org.). Língua Portuguesa pesquisa e ensino – Vol. II. São Paulo: EDUC/

FAPESP, 2007. p. 97-117.

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75
4
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E
COERÊNCIA) ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO
4.1 Coesão 79

4.2 Coerência 80

4.3 Procedimentos de coesão por substituição gramatical e lexical 81

4.4 Relações coesivas e semânticas entre palavras, orações, períodos ou

parágrafos, promovidos por conectivos ou sequenciadores 83

4.5 Reconhecimento da organização da macroestrutura semântica de arti-

culação como: adição, explicação, conclusão, oposição, restrição, tem-

poralidade, finalidade, comparação, alternância, concessão, etc. 85


UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

Até agora você teve acesso a diversos conhecimentos de composição estrutural e semântica de

textos. Esses conhecimentos, aliados a práticas de leitura e de escrita, bem como a reflexão sobre

o que se lê, são indispensáveis na produção de seu texto.

Entretanto, não existe uma “fórmula mágica” que nos ensine a escrever um bom texto. Mas assu-

mir uma postura crítica diante do que nos é apresentado e dominar alguns recursos linguísticos
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básicos contribui para a construção de sínteses contextualizadas.

O que isso quer dizer?

Quer dizer que devemos organizar nosso discurso(texto) em parágrafos textuais (partes) garan-

tindo a gradação das ideias.

Para tanto, a concisão, a correção e a clareza são qualidades que você deve cultivar quando for

escrever um texto, ou seja, ir direto ao assunto, não abusar de palavras/expressões rebuscadas,

que dificultam o entendimento do leitor e utilizar a norma padrão da língua.

Pensando assim você já deu um grande passo para que seu texto seja compreensível e acessível

aos mais diversos leitores. Outro passo seria dar a ele unidade de sentido, ou melhor, coesão e

coerência.

Coesão e coerência funcionam como um quebra-cabeça:

É o encaixe adequado das palavras(peças) que vão garantir a completude do enunciado(imagem).

São coisas diferentes, de modo que um texto coeso pode ser incoerente. Ambas têm em comum

o fato de estarem relacionadas com as regras essenciais para uma boa produção textual.

A coesão textual tem como foco a articulação interna, ou seja, as questões gramaticais. Já a coe-

rência textual trata da articulação externa e mais profunda da mensagem.

Veja de forma mais específica!

78
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

4.1 COESÃO
A coesão é resultado da disposição e da correta utilização das palavras que propiciam a ligação

entre frases, períodos e parágrafos de um texto. Ela colabora com sua organização e ocorre por

meio de palavras chamadas de conectivos.

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CONECTIVOS são palavras ou expressões que

interligam as frases, períodos, orações, pará-

grafos, permitindo a sequência de ideias.

COESÃO REFERENCIAL:
Esse tipo de coesão diz respeito ao uso de termos que retomam vocábulos ou expressões que já

ocorreram, porque existem entre eles traços semânticos semelhantes, até mesmo opostos.

“Comprei aquela fruta. Vou comê-la”

Quando há termos que retomam outros no texto, temos coesão referencial. Sobre esse assunto

ver subitem 4.3

COESÃO SEQUENCIAL:
Esse tipo de coesão diz respeito ao uso de termos que fazem o texto ‘andar”, ou seja, promove a

sequência do texto.

Os mecanismos de coesão sequencial são os que ligam, sintaticamente, as sentenças umas às

outras, através dos articuladores. Os articuladores serão apresentados no subitem 4.4.

Mas antes, leia as frases e tente identificar por que elas nos causam estranheza.

» Gosto de ir a festas, mas vou a sua festa.

» Gosto de ir a festas, portanto não posso ir à sua.

» Maria saiu para ir ao supermercado, como estava chovendo, porém retornou ao seu quarto

79
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

para pegar o guarda-chuva, pois estava na gaveta.

» Ricardo é amigo de Karina. Ricardo e Karina se conheceram na faculdade. Ricardo e Karina

fazem graduação em Administração.

É como se o nó não estivesse atado. Não tem uma “amarração” lógica das ideias.
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4.2 COERÊNCIA

FONTE: http://metropolerevista.com.br/gente/entrevista-e-perfil/tiago-silva-mente-inquieta/1616

80
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

Texto coerente é aquele que não se contradiz, mas que promove os sentidos de forma eficaz a

fim de tornar a comunicação mais clara. O que chamamos comumente de ser coerente ao se

produzir um texto, é apresentar um raciocínio lógico e manter em seu texto a unidade de sentido.

A coerência depende de uma série de fatores, entre os quais vale ressaltar:

» Conhecimento do mundo e o grau em que esse conhecimento deve ser ou é comparti-

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lhado pelos interlocutores;

» Domínio das regras que norteiam a língua: isto vai possibilitar as várias combinações dos

elementos linguísticos;

» Os próprios interlocutores, considerando a situação em que se encontram, as suas inten-

ções de comunicação, suas crenças, a função comunicativa do texto.

Observe o seguinte exemplo, retirado do site https://www.estudopratico.com.br/coerencia-textu-

al/ :

Fui ao médico e ele me recomendou repouso e uma alimentação mais saudável, porque eu não

estou doente.

A frase acima faz sentido para você? Não, porque ela não é coerente. Agora veja:

Fui ao médico e ele me recomendou repouso e uma alimentação mais saudável, apesar de

eu não estar doente.

A última frase apresenta coerência, não é mesmo?

Veja que a troca do conectivo “porque” pelo “apesar de” alterou completamente o sentido da fra-

se e passou a dar coerência a ela.

Foi um elemento coesivo que interferiu na coerência (sentido) do texto. Por isso, estude o próximo

subitem.

4.3 PROCEDIMENTOS DE COESÃO POR SUBSTITUIÇÃO GRAMATICAL E LEXICAL


Sobre coesão lexical, no site do professor Marcelo Braga, (https://www.professormarcelobraga.

com.br/coesao-textual-lexical/) é explicado, bem como vimos sobre campo lexical na unidade 1,

que ela envolve a repetição da mesma unidade lexical ao longo do texto ou a sua substituição por

81
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

outras unidades lexicais as quais com ela mantêm relações semânticas.

Com o texto a seguir, sobre transportes/mobilidade urbana, destacamos, em amarelo, a repetição

por substituição da mesma unidade lexical que garante a coesão do texto. Ou seja, o tema do

texto foi reiterado com palavras e expressões diferentes de modo a se garantir a permanência

temática.
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Desde os incentivos à expansão da política rodoviarista, promovidos por Jus-


celino Kubitschek em seu governo, o Brasil passa por uma valorização exa-
gerada do carro, que culminou no problema de mobilidade urbana, uma
vez que o excesso de veículos impede a fácil locomoção dos indivíduos. Essa
situação ressalta um contexto de descrédito financeiro com relação aos
transportes públicos, que têm investimentos insuficientes, assim como as
estruturas de locomoção a pé; e exaltação do carro como bem fornecedor
de status.

Em primeiro lugar, é possível conceber o diminuto tamanho da malha me-


troviária brasileira como um dos responsáveis pelo estímulo à aquisição de
carros para a locomoção urbana, já que, com linhas escassas, trens descon-
fortáveis e antigos, grandes metrópoles apresentam opções pouco variadas
de locomoção. A insuficiência de investimentos atinge também os ônibus
– que circulam em estado precário – e os caminhos de pedestre, os quais
apresentam perigo a deficientes, idosos e demais indivíduos com movimen-
tação limitada, por conta das calçadas esburacadas. Assim, em busca de
conforto e segurança, a população opta pela utilização dos automóveis, cuja
frota dobrou nos últimos dez anos, segundo o Observatório das Metrópoles.

Por conseguinte, não é incomum observar cidadãos se endividando para


obter um transporte individual, tanto para suprir a necessidade de desloca-
mento quanto para munir-se do status advindo de tal compra. A noção de
luxo que paira no imaginário popular ainda tem muito a ver com as ideias
proferidas no governo de JK perante o excessivo engrandecimento do trans-
porte individual – fomentador da implementação das empresas automobi-
lísticas no Brasil. Entretanto, seus resultados são vistos até os dias atuais, nos
longos congestionamentos de horários de pico. De acordo com o jornal O
Globo, os paulistanos gastam em média 45 dias do ano presos no trânsito,
reiterando a diminuição da qualidade de vida proporcionada pela má mo-
bilidade urbana.

Portanto, é viável pensar em soluções para o problema. Por isso, as Secre-


tarias dos Transportes Metropolitanos de cada estado devem ampliar a
quantidade de linhas de metrô no território brasileiro, por meio de maio-
res investimentos financeiros e fiscalização de funcionamento que garanta
pleno bem-estar da população, com o intuito de desincentivar a busca pelo
transporte individual e facilitar a locomoção urbana no Brasil. Dessa forma, o
Brasil se distanciará de seu passado histórico, rumo a uma mobilidade ade-
quada e digna.

(Fonte: https://www.stoodi.com.br/redacao/redacao-pronta-mobilidade-ur-
bana/. Acesso em 10 out. 2019).

82
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

Em verde, destacamos a substituição gramatical ocorrida por meio da troca de pronomes, o que

é denominado de coesão referencial.

?
E os outros? Faça você um exercícios.

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O que os outros pronomes, destacados em

verde no texto, retomam?

O pronome relativo que retoma a “valorização exagerada do carro” e “transporte público”, no pri-

meiro parágrafo.

4.4 RELAÇÕES COESIVAS E SEMÂNTICAS ENTRE PALAVRAS, ORAÇÕES, PERÍO-


DOS OU PARÁGRAFOS, PROMOVIDOS POR CONECTIVOS OU SEQUENCIADORES
As relações coesivas e semânticas entre palavras, orações, períodos ou parágrafos dizem respeito

à coesão sequencial.

Esse tipo de coesão diz respeito ao uso de termos que fazem o texto ‘andar”, ou seja, promove a
sequência do texto.

Os mecanismos de coesão sequencial são os que ligam, sintaticamente, as sentenças umas às

outras, através dos articuladores. Os articuladores podem ser de:

CAUSA:
Porque, que, uma vez que, já que, por isso que, porquanto, visto que, por, por causa de, em vista

de, em virtude de etc.

OPOSIÇÃO:
» SUBORDINAÇÃO CONCESSIVA (ocorre mudança no verbo): embora, muito embora, por

mais que, por menos que, apesar de, a despeito de, não obstante etc.

83
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

Embora seja bom, não podemos comprar aquele carro.

» COORDENAÇÃO ADVERSATIVA: mas, porém, todavia, contudo, entretanto etc.

Valdeir é excelente profissional, mas/porém/contudo/todavia/entretanto será afasta-

do de suas funções por tempo indeterminado.


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CONDIÇÃO:
caso, desde que, contanto, uma vez que, sem que etc.

Se não chover amanhã, podemos ir à praia.

Desde que não chova amanhã, podemos ir à praia.

CONCLUSÃO:
logo, portanto, por conseguinte, assim, então, de modo que, em vista disso, pois (antes do verbo)

Maria tem faltado muito sem justificativa, logo será demitida.

Ele infartou; não pode, pois, continuar o trabalho.

Agora leia o texto “O que é responsabilidade social?”, extraído do site https://www.significados.

com.br/responsabilidade-social/ e perceba como os conectivos de ligação (em verde) garantem

a coesão sequencial do texto.

O QUE É RESPONSABILIDADE SOCIAL:

Responsabilidade social é quando as empresas decidem, voluntariamen-


te, contribuir para uma sociedade mais justa e para um ambiente mais limpo.

O conceito de responsabilidade social pode ser compreendido em dois ní-


veis: o nível interno relaciona-se com os trabalhadores e, a todas as partes
afetadas pela empresa e que, podem influenciar no alcance de seus resul-
tados. O nível externo são as consequências das ações de uma organização
sobre o meio ambiente, os seus parceiros de negócio e o meio em que estão
inseridos.

A responsabilidade social implica a noção de que uma empresa não tem


apenas o objetivo de fazer lucro e além de trazer benefício financeiro às pes-

84
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

soas que trabalham na empresa, também deve contribuir socialmente para


o seu meio envolvente. Desta forma, a responsabilidade social muitas vezes
envolve medidas que trazem cultura e boas condições para a sociedade.

Existem diversos fatores que originaram o conceito de responsabilidade so-


cial, em um contexto da globalização e das mudanças nas indústrias, surgi-
ram novas preocupações e expectativas dos cidadãos, dos consumidores,
das autoridades públicas e dos investidores em relação as organizações. Os
indivíduos e as instituições, como consumidores e investidores, começaram

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a condenar os danos causados ao ambiente pelas atividades econômicas
e também a pressionar as empresas para a observância de requisitos am-
bientais e exigindo à entidades reguladoras, legislativas e governamentais a
produção de quadros legais apropriados e a vigilância da sua aplicação.

Os primeiros estudos que tratam da responsabilidade social tiveram início


nos Estados Unidos, na década de 50, e na Europa, nos anos 60. As primei-
ras manifestações sobre este tema surgiram em 1906, porém essas não rece-
beram apoio, pois foram consideradas de cunho socialista, e foi somente em
1953, nos Estados Unidos, que o tema recebeu atenção e ganhou espaço. Na
década de 70, começaram a surgir associações de profissionais interessados
em estudar o tema, e somente a partir daí a responsabilidade social deixou de
ser uma simples curiosidade e se transformou em um novo campo de estudo.

4.5 RECONHECIMENTO DA ORGANIZAÇÃO DA MACROESTRUTURA SEMÂNTI-


CA DE ARTICULAÇÃO COMO: ADIÇÃO, EXPLICAÇÃO, CONCLUSÃO, OPOSIÇÃO,
RESTRIÇÃO, TEMPORALIDADE, FINALIDADE, COMPARAÇÃO, ALTERNÂNCIA,
CONCESSÃO, ETC.
Para simplificar, dizemos que o reconhecimento da organização da macroestrutura semântica

de articulação é o reconhecimento dos operadores discursivos (os conectivos) que contribuem

para se manter uma unidade de sentido (coerência) no enunciado.

Você certamente já estudou no ensino médio sobre orações coordenadas e orações subordinadas.

É exatamente sobre isso que a organização da macroestrutura semântica de articulação trata.

Veja no quadro a seguir a classificação dos articuladores perante a ideia (sentido) que eles trans-

mitem em orações coordenadas.

85
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

CLASSIFICAÇÃO CONJUNÇÕES EXEMPLO

Aditivas e, nem, mas também, como tam- Pedro é educado e gentil.

bém, bem como, etc...

Adversativas mas, porém, todavia, contudo, Não se esforço muito, porém

entretanto, no entanto, etc... obteve um bom resultado.

Alternativas ou...ou, ora...ora, quer...quer, já, etc. Ou você estuda, ou trabalha.

Conclusivas logo, portanto, por isso, assim, por Possui um bom histórico profissional, logo
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conseguinte, etc. não ficarás desempregado.

Explicativas que, porque, porquanto, pois, etc. Não compareci á festa porque

não fui convidada.

No próximo quadro consta a classificação dos articuladores perante a ideia(sentido) que eles

transmitem em orações subordinadas.

CLASSIFICAÇÃO CONJUNÇÕES EXEMPLO

Causais porque, uma vez que, sendo que, Como estava frio, resolvemos adiar o passeio.

visto que, como, etc.

Consecutivas que (precedido de tal, tão, tanto, Tamanho foi o mau desempenho do rapaz,

tamanho), sem que, de modo que, que a empresa optou por não contratá-lo.

de forma que, etc.

Comparativas como, tal qual, que ou do que, assim A menina era delicada era delicada

como, mais...que, menos...que, etc. como uma flor.

Conformativas conforme, segundo consoante, as- Conforme o combinado, entregamos

sim como,etc. a pesquisa para o professor.

Concessivas mesmo que, por mais que, ainda Embora gostasse muito dele,

que, se bem que, embora, etc. resolvi terminar a relação.

Condicionais se, caso, contanto que, a menos que, Terá seu dia cortado, a menos que apresente

sem que, salvo se, etc. justificativa.

Proporcionais à medida que, à proporção que, Quanto mais agir desta maneira, amsi será

quanto mais, quanto menos, etc. excluída do grupo.

Finais a fim de que, para que, etc. Estudo bastante, a fim de que possa construir

meu futuro.

Temporais quando, enquanto, sempre que, Quando chegar de viagem, avise-me.

logo que, depois que, etc.

Como pode ter notado, cada conjunção carrega em si um sentido próprio e pode resumir a ideia

do enunciado. Para este subitem mostramos este quadro representativo, de modo que possa

reconhecer que a macroestrutura semântica se articula a esses conectivos de ligação, denomina-

dos de conjunções. Ainda sobre esse assunto, retomarem-no no subitem 6.3 da unidade 6.

86
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

RESUMO:
Coesão e coerência são mecanismos fundamentais na construção de textos.

A coesão é resultado da disposição e da correta utilização das palavras que propiciam a

ligação entre frases, períodos e parágrafos de um texto. Ela colabora com sua organiza-

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ção e ocorre por meio de palavras chamadas de conectivos.

A Coerência é a relação lógica das ideias de um texto que decorre da sua argumentação

- resultado especialmente dos conhecimentos do transmissor da mensagem.

Um texto contraditório e redundante ou cujas ideias iniciadas não são concluídas, é um

texto incoerente. A incoerência compromete a clareza do discurso, a sua fluência e a

eficácia da leitura.

Assim a incoerência não é só uma questão de conhecimento, decorre também do uso

de tempos verbais e da emissão de ideias contrárias.

87
UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

Tabela com alguns dos principais conectores discursivos:

ADIÇÃO E, pois, além disso, e ainda, mas também, por um lado … por outro

CAUSA É evidente que, certamente, naturalmente, evidentemente, por


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REAFIRMAÇÃO Nesse sentido, nessa perspectiva, em outras palavras, ou seja, novamente, em suma,

em resumo, dessa forma, outrossim, dessarte, destarte

SEMELHANÇA Do mesmo modo, tal como, assim como, pela mesma razão

OPOSIÇÃO / RESTRIÇÃO Mas, apesar de, no entanto, entretanto, porém, contudo, todavia, tampouco, por outro lado

LIGAÇÃO TEMPORAL Atualmente, contemporaneamente, após a década de, antes de, em seguida, até que, quando

OPINIÃO Ao meu ver, creio que, em meu/nosso entender, parece-me que, (in)felizmente, in-

crível como, admito que, (não) penso dessa forma/assim, obviamente

HIPÓTESE A menos que, supondo que, mesmo que, salvo se, exceto se

FINALIDADE Para, para que, com o intuito de, com o objetivo de, a fim de

EXEMPLIFICAÇÃO Por exemplo, isto é, como se pode ver, a exemplo de

ESCLARECER (não) significa que, quer dizer, isto é, não pense que, com isto, (não) pretendemos

ENFATIZAR Efetivamente, com efeito, na verdade, como vimos, como pudemos refletir, mais uma vez

DÚVIDA Talvez, é provável, é possível, provavelmente, possivelmente, porventura

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CHAMAR A ATENÇÃO Note-se que, atentar para o fato de que, constata-se que, verificamos, mais uma vez

CONCLUSÃO Portanto, logo, enfim, à guisa de conclusão, em suma, concluindo, para que

CERTEZA Evidentemente, certamente, decerto, naturalmente

PROPORÇÃO À medida que, da mesma forma

CONFORMIDADE Conforme o(a), de acordo com, consoante, em conformidade

FONTE: https://www.todamateria.com.br/coesao-e-coerencia/
https://brasilescola.uol.com.br/redacao/conectores-discursivos.htm

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UNIDADE 4 :
CONSTRUÇÃO DE SÍNTESES CONTEXTUALIZADAS (COESÃO E COERÊNCIA) [...]

REFERÊNCIA:
KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: estratégias de produção

textual. 2 ed., 1ª reimpressão. São Paulo: Contexto, 2012.

TERRA, Ernani. Gramática, Literatura e Redação para o 2º grau. São Paulo: Scipione, 1997.

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5
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU
DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

5.1 Indução 94
5.2 Dedução 96
5.3 Argumentos dedutivos válidos 98
5.4 Sofisma ou falácias 99
5.5 Inferências 101
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Nesta unidade você estudará sobre as formas de raciocínio, de modo que possa construir e ve-

rificar argumentos, partindo de premissas até chegar a uma conclusão e vice-versa. Para tanto,

conhecerá os dois processos básicos “segundo os quais organizamos os nossos raciocínios: a in-

dução e a dedução” (CAMARGO, c1996).

Mas antes, leia a introdução do artigo “Violência de gênero, sexualidade e saúde”, de Karen Giffin,
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sobre relações de gênero e violência e um trecho do artigo “A dificuldade da tolerância”, de Tho-

mas M. Scalon para dialogarmos com eles nos próximos subitens.

INTRODUÇÃO
Nas sociedades onde a definição do gênero feminino tradicionalmente é referida à esfera familiar

e à maternidade, a referência fundamental da construção social do gênero masculino é sua ativi-

dade na esfera pública, concentrador dos valores materiais, o que faz dele o provedor e protetor

da família.

Enquanto nestas mesmas sociedades, atualmente, as mulheres estão maciçamente presentes

na força de trabalho e no mundo público, a distribuição social da violência reflete a tradicional di-

visão dos espaços: o homem é vítima da violência na esfera pública, e a violência contra a mulher

é perpetuada no âmbito doméstico, onde o agressor é, mais frequentemente, o próprio parceiro.

[...]

TOLERÂNCIA: EU E OS OUTROS
Sem dúvida, a tolerância se instaura a partir do reconhecimento da existência do outro, que além

de ocupar um espaço, tem direitos e deveres, como eu, mas é essencialmente diferente de mim.

Estas palavras de aparência simples revelam-se continuamente enganadoras, desde a compre-

ensão do “outro”, até o significado do “reconhecimento”.

92
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Em sua “Lei Fundamental da Razão Pura Prática”, conhecida como “imperativo categórico”, Kant

estabelecera: “Age de tal modo que a máxima de tua vontade possa valer-te sempre como prin-

cípio de uma legislação universal”. Tal princípio, consentâneo ao ensinamento cristão “Ama ao

próximo como a ti mesmo”, ou, em sua forma negativa, ao aforismo confuciano em epígrafe, pode

acolher igualmente a pressuposição de uma simetria na relação eu/tu que, em muitos casos,

significa simplesmente uma limitação da tolerância, o desconhecimento do outro, ou mesmo,

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o germe da intolerância. As epígrafes com a aguda observação de Bernard Shaw e o poema/

lembrete de Antônio Machado parecem suficientes para sublinhar a necessidade da assimetria

na relação com o outro. O outro não sou eu, pode não gostar do mesmo que eu gosto; importa

jamais esquecer isto.

De fato, não basta o conhecimento da existência do outro, que se realiza no âmbito da razão

prática, mas onde eu sou o sujeito e o outro permanece como objeto. Os navegantes espanhóis

tiveram conhecimento da existência dos “índios”, ainda que sua atitude em relação aos mesmos

tenha se aproximado minimamente da ideia de tolerância aqui analisada. Além do conhecimen-

to, é necessário compreender o outro, o que exige a disponibilidade para colocar-se em seu lugar

e enriquecer a perspectiva pessoal com a percepção das relações que se estabelecem do ponto

de vista do outro. Tal atitude compreensiva, no entanto, ainda é insuficiente para a caracterização

de uma atitude tolerante, em razão justamente da expectativa de simetria que frequentemente

subjaz. A compreensão do outro costuma ocorrer por meio da assimilação de suas características

pelo referencial daquele que compreende, como se realizasse certa tradução de seus horizontes

na linguagem compreensiva. A tolerância, no entanto, deve fundar-se em outra atitude, que pres-

supõe o respeito, o reconhecimento.

A assimetria é, portanto, um elemento imprescindível para o reconhecimento do outro, para o res-

peito a sua perspectiva, o que caracteriza efetivamente a ideia de tolerância. Não se trata de dissol-

ver o outro em minhas análises, de situá-lo em meu cenário, de traduzi-lo em minha linguagem, de

apreendê-lo em minhas categorias; trata-se 3 de respeitá-lo como outro, de reconhecer a legitimi-

dade do cenário que vislumbra, diverso do meu, de colocar-me em disponibilidade para a comuni-

cação com ele ainda que continuemos a falar línguas diferentes, ou a alimentar diferentes projetos.

O respeito pela diversidade de cenários ou projetos, tanto em termos individuais quanto no plano

cultural ou coletivo não pode elidir, no entanto, algumas dificuldades teóricas bastante reniten-

tes, diretamente relacionadas com tais questões. Elas incluem, por exemplo, certa identificação

93
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

indevida entre as ideias de diferença e de desigualdade, o que conduz a inevitáveis paradoxos,

ou ainda, a legitimação de um relativismo radical, no que se refere aos valores, o que fatalmente

condena a ideia de tolerância a semear seu próprio fim: tolerar incondicionalmente os intoleran-

tes significaria eventualmente permitir a destruição dos próprios tolerantes.

[...]
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5.1 INDUÇÃO
Do verbo induzir, a indução ou raciocino indutivo é um modo de raciocínio em que se compara

várias regras para se chegar a uma conclusão. Por isso, diz-se que ela se constitui das partes para

o todo, ou do particular para um padrão, ou do isolado para o conjunto. É aquilo que te induz a

algo, ou seja, que te leva a uma conclusão.

Veja na tirinha a seguir como isso se presentifica com Mafalda tentando chegar a uma conclusão:

FONTE: http://www.emdialogo.uff.br/node/3543

Na construção de um texto dissertativo-argumentativo, por exemplo, esse raciocínio constitui a

lógica interna do texto, pois apresenta vários argumentos para comprovação de uma tese.

Veja! Na introdução do texto sobre relações de gênero, apresentado anteriormente, a conclusão

que a autora chega de que a tradicional divisão dos espaços reflete a violência contra os gêneros,

é fundamentada nas ideias de que as atividades do gênero feminino pertence às esferas fami-

liar e maternal e que as atividades do gênero masculino pertence a esfera pública. Ou seja, duas

constatações que levam a uma conclusão. Dessa forma, há um raciocínio indutivo!

94
UNIDADE 5 :
"
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Francis Bacon foi o “sistematizador do Método Indutivo, pois

a técnica de raciocínio da indução já existia desde Sócrates e

Platão”, conforme (LAKATOS; MARCONI, 2000, p. 71).

"

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OBSERVA•°O DOS RELA•°O ENTRE GENERALIZA•°O DA
FEN≤MENOS FEN≤MENOS RELA•°O

O ferro conduz eletricidade. Rela≈¡o do metal com Todos os metais conduzem


O ferro « metal. a eletricidade eletricidade.
O ouro conduz eletricidade.
O ouro « metal.
O cobre conduz eletricidade.
O cobre « metal.

As pesquisas que utilizam o método indutivo de raciocínio buscam a generalização provável a

partir dos resultados obtidos por meio das observações e das experiências. No entanto, é preciso

ter cuidado! Muitas vezes, o método indutivo leva a uma generalização indevida dos casos espe-

cíficos, que nem sempre podem ser consideradas verdades.

Mais uma vez Mafalda e Miguelito nos dão um exemplo do raciocínio indutivo: Miguelito expõe

seu pensamento sobre tudo que já existe no mundo e a conclusão de que estando tudo feito ele

pode descansar.

95
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

5.2 DEDUÇÃO
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FONTE: http://www.ivancabral.com/2008/04/deduo.html

Do verbo deduzir, a dedução ou raciocino dedutivo é um modo de raciocínio em que se parte

das teorias e leis consideradas gerais e universais para explicar a ocorrência de fenômenos parti-

culares. Originou-se na obra “O discurso do método” de René Descartes, que instituiu a dedução

como caminho para o conhecimento.

Veja o exercício metódico da dedução, como exemplo clássico:

“Todo mamífero tem um coração.

Ora, todos os cães são mamíferos.

Logo, todos os cães têm um coração.”

96
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Ainda, segundo Bittencourt (2019)


"
O raciocínio dedutivo – também chamado por Aristóteles de

silogismo – parte da dedução formal tal que, postas duas pre-

missas, delas, por inferência, se tira uma terceira, chamada

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conclusão. Entretanto, deve-se frisar que a dedução não ofe-

rece conhecimento novo, uma vez que a conclusão sempre se

apresenta como um caso particular da lei geral. A dedução or-

ganiza e especifica o conhecimento que já se tem, mas não

é geradora de conhecimentos novos. Ela tem como ponto de

partida o plano do inteligível, ou seja, da verdade geral, já esta-

belecida.

"
O ponto de partida é sempre um enunciado. Do enunciado inicial são extraídas premissas que a par-

tir daí são tiradas as devidas conclusões. Assim se deu com o texto sobre tolerância apresentado no

início desta unidade, em que as premissas são desenvolvidas em torno de uma ideia central apresen-

tada de início “a tolerância se instaura a partir do reconhecimento da existência do outro, que além de

ocupar um espaço, tem direitos e deveres, como eu, mas é essencialmente diferente de mim”.

É muito comum deduzirmos informações no dia a dia. Por exemplo, quando uma pessoa uma

mãe diz que o filho está doente e pede para uma amiga ir a farmácia comprar um remédio, logo

acionamos um raciocínio lógico que estabelece relação de um enunciado com o outro e deduzi-

mos que o remédio é para o filho.

Isso também é conhecido como fazer inferências, o que veremos no subitem 5.6 e 5.7.

97
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

"
De acordo com o site https://filosofianaescola.com/logica/argumento-dedutivo/, acesso em 10 out. 2019:

É comum ver a palavra “deduzir” sendo usado em diferentes si-

tuações cotidianas. O dicionário atribui o seguinte significado

a ela “concluir (algo) pelo raciocínio, inferir”. Nesse sentido, fa-


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lamos que uma pessoa deduziu que seu telefone, que não é a

prova de água, deixaria de funcionar, porque cai na piscina.

Esse é o uso mais conhecido de “deduzir”, mas, como já deve

ter notado, quando falamos em “argumento dedutivo” estamos

dizendo outra coisa com “dedutivo”.

Assim, no uso comum, “deduzir” significa “tirar uma conclusão”.

Na lógica, “deduzir” significa “tirar uma conclusão que é neces-

sariamente verdadeira se as premissas forem verdadeiras”.

"
Portanto, conheça um pouco mais da dedução a partir dos argumentos dedutivos válidos, tema

do próximo subitem.

5.3 ARGUMENTOS DEDUTIVOS VÁLIDOS


Os argumentos dedutivos válidos preservam a verdade e as premissas são consideradas provas

evidentes da verdade da conclusão, caso contrário não é válido.

Quando é válido, podemos dizer que a conclusão é uma consequência lógica das premissas, ou

ainda que a conclusão é uma inferência decorrente das premissas.

EXEMPLO:

Se eu ganhar na Loteria, serei rico.

Eu ganhei na Loteria.

Logo, sou rico.

98
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

É Válido

(a conclusão é uma decorrência da lógica das duas premissas.)

Quando os argumentos dedutivos não são válidos, ou seja verdadeiros, temos as falácias ou sofis-

mas, conforme veremos a seguir.

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5.4 SOFISMA OU FALÁCIAS
Um raciocínio incorreto quando tem aparência de correto é chamado de falácia, ou sofisma. Al-

guns estudiosos fazem distinção desses termos, atribuindo a sofisma uma intenção de enganar

o interlocutor, e à falácia um engano involuntário.

Muitas falácias decorrem de generalizações apressadas ou irrelevância das premissas, como no exemplo:

» As mulheres preferem os homens carecas.

» Eu não sou careca.

» Logo, as mulheres não gostam de mim.

Veja que a premissa 1 parte de uma generalização apressada que leva a uma conclusão falaciosa,

ou seja, incorreta.

O site https://www.bandab.com.br/entretenimento/curiosidades/30-falacias-mais-comum-uti-

lizadas-em-debates-e-discussoes/ apresenta 30 falácias mais comuns utilizadas em debates e

discussões. Os exemplos são muito interessantes e valem um consulta. Para este texto trazemos

apenas três exemplos que consideramos bem comuns.

APELO À EMOÇÃO
Você tentou manipular uma resposta emocional no lugar de um argumento válido ou convincente.

Apelos à emoção são relacionados a medo, inveja, ódio, pena, orgulho, entre outros.

É importante dizer que às vezes um argumento logicamente coerente pode inspirar emoção, ou

ter um aspecto emocional, mas o problema e a falácia acontecem quando a emoção é usada no

lugar de um argumento lógico. Ou, para tornar menos claro o fato de que não existe nenhuma

99
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

relação racional e convincente para justificar a posição de alguém.

Exceto os sociopatas, todos são afetados pela emoção, por isso apelos à emoção são uma tática

de argumentação muito comum e eficiente. Mas eles são falhos e desonestos, com tendência a

deixar o oponente de alguém justificadamente emocional.


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EXEMPLO:

Lucas não queria comer o seu prato de cérebro de ovelha com fígado picado, mas seu pai o

lembrou de todas as crianças famintas de algum país de terceiro mundo que não tinham a

sorte de ter qualquer tipo de comida.

ALEGAÇÃO ESPECIAL
Você altera as regras ou abre uma exceção quando sua afirmação é exposta como falsa.

Humanos são criaturas engraçadas, com uma aversão boba a estarem errados.

Em vez de aproveitar os benefícios de poder mudar de ideia graças a um novo entendimento,

muitos inventarão modos de se agarrar a velhas crenças. Uma das maneiras mais comuns que as

pessoas fazem isso é pós-racionalizar um motivo explicando o porquê aquilo no qual elas acredi-
tavam ser verdade deve continuar sendo verdade.

É geralmente bem fácil encontrar um motivo para acreditar em algo que nos favorece, e é neces-

sária uma boa dose de integridade e honestidade genuína consigo mesmo para examinar nossas

próprias crenças e motivações sem cair na armadilha da auto-justificação.

EXEMPLO:

Eduardo afirma ser vidente, mas quando as suas “habilidades” foram testadas em condi-

ções científicas apropriadas, elas magicamente desapareceram. Ele explicou, então, que

elas só funcionam para quem tem fé nelas.

100
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

AMBIGUIDADE
Você usa duplo sentido ou linguagem ambígua para apresentar a sua verdade de modo enganoso.

Políticos frequentemente são culpados de usar ambiguidade em seus discursos, para depois, se

forem questionados, poderem dizer que não estavam tecnicamente mentindo. Isso é qualificado

como uma falácia, pois é intrinsecamente enganoso.

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EXEMPLO:

Em um julgamento, o advogado concorda que o crime foi desumano. Logo, tenta conven-

cer o júri de que o seu cliente não é humano por ter cometido tal crime, e não deve ser jul-

gado como um humano normal.

5.5 INFERÊNCIAS
Para tratar de inferência sugiro a leitura do texto de Regina L. Péret Dell’Isola, da Faculdade de

Letras da Universidade Federal de Minas Gerais(UFMG) sobre “Inferência na leitura”, dada a coe-

rência da abordagem.

Agora que já leu sobre o que é inferência e como ela se realiza, vamos proceder com inferências

na charge a seguir que tematiza a questão do desenvolvimento sustentável.

101
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO
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“Eles sujam a água...” refere-se ao ser humano.

O ser humano degrada o meio ambiente para ganhar dinheiro.

O dinheiro compra uma vida melhor, com saúde e alimentação.

As atitudes humanas não condizem com a racionalidade.

E assim seguimos, acionando nossos conhecimentos prévios e imersos em um contexto de enunciação,

inferimos o tempo todo de situações cotidianas, de relações com o outro, de leituras que realizamos.

102
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

RESUMO:
Na indução tem-se várias premissas, ou vários enunciados, de onde tira-se uma conclu-

são (nem sempre verdadeira).

Na dedução o ponto de partida é sempre um enunciado. Do enunciado inicial são ex-

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traídas premissas que a partir daí são tiradas as devidas conclusões.

Os argumentos dedutivos válidos preservam a verdade e as premissas são considera-

das provas evidentes da verdade da conclusão.

Se os argumentos não forem válidos e conduzirem a uma conclusão falsa, temos as

falácias ou sofismas.

Fazemos inferência cotidianamente sempre que tiramos conclusões de alguma situ-

ação, ou deduzimos algo de um enunciado de forma implícita. É aquilo que não está

posto ou dito, mas que nos induz a uma conclusão.

103
UNIDADE 5 :
CONSIDERAÇÕES OBTIDAS POR INDUÇÃO E/OU DEDUÇÃO ASSOCIADAS AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

REFERÊNCIA:

BITTENCOURT, Fernando Kurten. Aplicação de técnicas didáticas ao ensino do Direi-

to. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 13 out 2019. Disponível em: https://conteudojuridico.

com.br/consulta/Artigos/29386/aplicacao-de-tecnicas-didaticas-ao-ensino-do-direito.

Acesso em: 13 out 2019.


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CAMARGO, Maria Ângela de. Dedução e indução – noções elementares de lógica. Edu-

cação Uol. C1996. Disponível em: <https://educacao.uol.com.br/disciplinas/matematica/dedu-

cao-e-inducao-nocoes-elementares-de-logica.htm. Acesso em 12 out. 2019.

GIFFIN, Karen. Violência de Gênero, Sexualidade e Saúde. Cad. Saúde Públ., Rio de Janei-

ro, 10 (suplemento 1): 146-155, 1994. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/csp/v10s1/v10su-

pl1a10.pdf>. Acesso em 12 out. 2019.

MACHADO, Nílson José. Sobre a Idéia de Tolerância. Disponível em:< http://www.iea.usp.br/

publicacoes/textos/machadoideiadetolerancia.pdf>. Acesso em 12 out. 2019.

104
6
ARGUMENTA•°O NA INTERPRETA•°O
ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

6.1 A tese e seus argumentos de sustentação e/ou refutação 107

6.2 A citação como elemento argumentativo 109

6.3 Os conectivos e expressões adverbiais com valor argumentativo 111


UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Nesta unidade, vamos estudar a respeito da argumentação como ato persuasivo, ou seja, como

técnica de convencimento do outro. Agora que já sabe que os argumentos podem ser verda-
deiros ou falaciosos, vamos, a partir da leitura e observação de argumentos em textos, buscar

compreender como eles se articulam para sustentar uma tese ou refutar (questionar) uma ideia.
Portanto, leia um trecho da tese de Shirlei Neves dos Santos Campos, intitulada de “Estudo dialó-

gico de um programa público-privado de formação continuada do professor de língua portugue-


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sa”, defendida em 2016, antes de iniciar o próximo subitem.

O propósito de trazer um fragmento de tese é o de oportunizar a você contato com a escrita aca-
dêmica. Essa esfera comunicativa (textos acadêmicos) recorre a argumentação para elucidação

e ampliação de conceitos, para validação de uma tese, para refutação (questionamento) de uma

ideia ou para elaborar conclusões de uma temática.

2.4. AS ORGANIZAÇÕES DO SEGMENTO DO TERCEIRO SETOR


O termo terceiro setor surgiu na década de 1970 do século XX nos Estados
Unidos da América. Segundo Coelho (2002), esse termo foi utilizado pela pri- Argumento de
meira vez por pesquisadores estadunidenses, na década de 1970, e, na dé- autoridade e por
evidência
cada de 1980, começa a ser utilizado também por pesquisadores europeus.

Também Landim (2002) assinala a proveniência estadunidense do termo


terceiro setor e associa o seu aparecimento a um contexto marcado por uma Argumento de
autoridade e por
cultura política e cívica baseada no individualismo liberal, que tem o associa- associação
tivismo e o voluntariado como partes constitutivas em um ideário dominan-
te de procedência da sociedade em relação ao Estado.

Para Landim (2002), o cenário atual de desmonte de direitos e diminuição


da responsabilidade do Estado com relação às políticas sociais é propício à
funcionalidade dada ao termo. Implícita ou explicitamente, propaga-se uma
ideia de que o universo das organizações sem fins lucrativos é uma espécie
de panaceia que substitui o Estado no enfrentamento do social.

O termo terceiro setor não possui uma definição precisa, sendo mesmo men-
cionado como um termo nunca definido (COHN, 2002), vago e impreciso a Argumento por
ponto de se transformar em uma daquelas palavras que explicam tudo e nada comparação
ao mesmo tempo, carregando muitas contradições em si (TEODÓSIO, 2002).

A Constituição Federal de 1988, nos vários pontos em que aborda o universo


das entidades sem fins lucrativos, não faz qualquer referência à expressão Argumento por
terceiro setor, mas a instituições sem fins lucrativos, instituições assisten- exemplificação
ciais, entidades beneficentes de assistência social, entidades filantrópicas,
escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas (VIOLIN, 2007). Coelho
(2002), uma pesquisadora-insider no tema, reconhece a problemática ligada
ao uso do termo, justificando que o utilizou em seu trabalho na ausência de Argumento de
uma denominação melhor e com vistas a se adequar à linguagem comum autoridade
no campo da pesquisa empírica.

104
UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

O aparecimento do termo terceiro setor no Brasil ocorre em um período de


mudanças na economia e na política em âmbito internacional, as quais influen- Argumento por
princípio
ciaram na redefinição do conceito de sociedade civil no mundo ocidental. Essas
transformações abriram espaço para o avanço do neoliberalismo no país e para
mudanças políticas que seguiam as tendências internacionais no cenário na- Argumento por
cional, com impacto nas políticas sociais e mudanças internas no próprio cam- consequência
po da sociedade civil também no contexto brasileiro (GOHN, 2000).

Com a redefinição, a sociedade civil passa a ser vista como a esfera respon-

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sável pelo bem-estar social e representativa da estabilidade, da provisão, da
confiança e da responsabilidade social, depositadas no âmbito privado das Argumento por
famílias, das comunidades, das instituições religiosas e filantrópicas. A essas comparação e por
consequência
entidades é atribuída a responsabilidade pela tessitura de uma rede de so-
lidariedade capaz de proteger os mais pobres e não toda a sociedade me-
diante o Estado (RAMOS, 2005).

A perspectiva de sociedade civil que aparece com as mudanças políticas e


econômicas dos anos 1990 a aproxima de uma visão neoliberal segundo a
qual as políticas assistenciais voltadas para a justiça social devem ser promo-
vidas, de maneira focalizada e descentralizada, pelas instituições sociais, as
igrejas e as organizações não-governamentais, consideradas como os atores
da sociedade civil (RAMOS, 2005).

Nessa perspectiva, sociedade civil passa a ser vista como um amplo setor
não-governamental, formado por associações comunitárias, movimentos Argumento por
princípio
sociais, organizações não-governamentais, entidades beneficentes, associa-
ções profissionais, igrejas e fundações de empresas, todos situados em um
âmbito privado. Essas organizações civis de iniciativa privada são tidas como
as responsáveis pelas questões sociais públicas e, a partir dos anos 1990, al- Argumento por
guns desses segmentos passam a se identificar com o campo conhecido comparação
atualmente como o terceiro setor.

[...]

6.1 A TESE E SEUS ARGUMENTOS DE SUSTENTAÇÃO E/OU REFUTAÇÃO

!
MAS O QUE É UMA TESE?
Tese, do grego thesis, significa proposição intelectual. Logo, é
aquilo que se busca alcançar, objetivo, intuito, finalidade.

Tese é o que, comumente, chamamos de opinião, ponto de vista,

posicionamento crítico. É a parte fundamental para a existência

de um texto argumentativo.

105
UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

Conforme foi demonstrado no texto de Campos (2016), os argumentos sustentam uma tese, dan-

do a ela credibilidade, veracidade, reforçando a exposição do ponto de vista do autor.

A tese central da autora, nessa parte do texto, é de que as organizações do segmento do terceiro

setor são organizações civis de iniciativa privada responsáveis pelas questões sociais públicas.
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Todos os argumentos em torno dessa tese são apresentados para sustenta-la.

Desse modo, eles podem ser classificados da seguinte forma:

» Argumento de autoridade: quando apresenta o que um outro autor/estudioso/pesquisa-


dor disse sobre o tema.

» Argumento por evidência: quando faz referência a alguma pesquisa estatística, de campo,
ou fato real sobre o tema.
» Argumento por comparação: quando faz analogias, comparações de enunciações sobre

o tema.
» Argumento por exemplificação: quando apresenta exemplos representativos da temática.
» Argumento de princípio: quando apresenta uma crença com constatação lógica, dada a
partir de uma verdade concretizada.
» Argumento por causa e consequência: quando se apresenta uma causa (os motivos) ou

uma consequência (os efeitos) dos desdobramentos da temática, ou quando a própria tese
é uma causa ou uma consequência dos dados.
» Argumento de refutação: quando se questiona ou quando são feitas críticas sobre um

desdobramento da temática, apontando fragilidades (ir contra).

Acesse as indicações abaixo e veja mais exemplo para cada tipo de argumento.

Tipos de argumento TIPOS DE ARGUMENTOS Argumentação e


Tipos de Argumentos

106
UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

6.2 A CITAÇÃO COMO ELEMENTO ARGUMENTATIVO


A citação como elemento argumentativo aparece quando apresentamos, conforme o subitem

anterior, os argumentos de autoridade.

Portanto, esse é um recurso muito bem visto na avaliação de textos dissertativos argumentativos,

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pois além de reforçar as ideias do autor, demonstra que ele tem uma bagagem de leitura que o
sustenta nas enunciações sobre o que se propõe, ou seja, não diz do nada.

Ao citar outro autor em seu texto, pode-se parafrasear ou escrever na íntegra o texto da referên-

cia. Parafrasear significa dizer com suas próprias palavras o que o outro disse, ou o seu entendi-
mento sobre o que o outro disse, e essa técnica argumentativa é chamada de citação indireta.

Já escrever na íntegra, ou copiar partes do texto de outrem é conhecido como citação direta. Em
ambas, a referência ao autor utilizado e obrigatória, sob a pena de se configurar como plágio, o
que é crime, pois viola os direitos autorais (artigo 184, do Código Penal).

Veja como as citações devem ser apresentadas no texto:

» SE FOR UMA CITAÇÃO DIRETA COM ATÉ TRÊS LINHAS (CITAÇÃO DIRETA CURTA), deve
vir em sequência ao texto, mas transcrita entre aspas. Logo após, ou antes, apresenta-se o

sobrenome do autor, ano da publicação e página da parte copiada.

EXEMPLO:

A cidadania plena é exercida em democracia, que exige como condição necessária a “cons-

trução intercultural da igualdade e da diferença”, em palavras de Boaventura de Souza San-


tos. Esta exigência nos leva a uma nova articulação entre políticas de igualdade e políticas
de identidade: “temos direito a reivindicar a igualdade sempre que a diferença nos infe-

rioriza e temos direito de reivindicar a diferença sempre que a igualdade nos descarac-

teriza” (SANTOS, 2008, p.316).

» SE FOR UMA CITAÇÃO DIRETA COM MAIS DE TRÊS LINHAS (CITAÇÃO DIRETA LONGA)
deve vir destacada com recuo de 4 cm, em fonte tamanho 10 e sem aspas. O sobrenome do

autor, ano da publicação e página da parte copiada também deve aparecer antes ou logo

107
UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

após a citação.

EXEMPLO:
Em última instância, como afirma a Declaração de Princípios sobre a Tolerância da UNESCO

(1995) no terceiro parágrafo do capítulo II,


Para a harmonia internacional, torna-se essencial que os indivíduos, as comunida-

des e as nações aceitem e respeitem o caráter multicultural da 5 família humana.


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Sem tolerância não pode haver paz e sem paz não pode haver nem desenvolvi-

mento nem democracia.

» SE FOR UMA CITAÇÃO INDIRETA, deve vir na sequência do texto, alterando a escrita do
original, mas mantendo-se o sentido. Também é obrigatório colocar o sobrenome do autor
e o ano da publicação.

EXEMPLO:

A questão multicultural, embora presente em todos os continentes, se faz especialmen-


te significativa em Latino América, conforme nos indica a educadora Vera Maria Candau
(2010), por ser uma terra onde as relações inter-étnicas têm sido uma constante através de
toda sua história, especialmente dolorosa e trágica com respeito aos indígenas e aos afro-
-descendentes.

» SE FOR UMA CITAÇÃO DA CITAÇÃO, quando não se teve acesso ao original de um autor,
mas referência a ele por meio de uma outra autoria, deve vir o sobrenome do autor da parte

transcrita e o ano da publicação, seguido da palavra apud (que significa “citado por”) para

depois vir o sobrenome do autor da fonte pesquisada e ano.

EXEMPLO:

Salanova (1996 apud SILVA, 2004) definem motivação como sendo uma ação endereçada

a objetivos […]

Trechos extraídos do texto “SOCIODIVERSIDADE, MULTICULTURALIDADE E SUSTENTABILIDADE”, de Ma-


nuel Muñoz. Disponível em: < http://izabelahendrix.edu.br/humanidades1/meio-ambiente-e-consciencia-
-planetaria/artigos/arquivos/sociodiversidade-multiculturalidade_e_sustentabilidade.pdf>. Acesso em 15 out.
2019.

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UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

» LOCUÇÃO ADVERBIAL DE MODO:


às pressas, ao contrário, em silêncio, de cor, às claras, à toa, em geral etc.

Exemplo:

O suspeito permaneceu em silêncio durante todo o interrogatório.

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» LOCUÇÃO ADVERBIAL DE QUANTIDADE:
de muito, de pouco, de todo, em excesso etc.

Exemplo:

O atleta passou mal porque fez atividade física em excesso.

Conteúdo extraído de https://mundoeducacao.bol.uol.com.br/gramatica/locucao-adverbial.htm,


acesso em 15 out. 2019.

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UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

RESUMO:
É isso!

A argumentação em textos dissertativos são fundamentais para elucidação e amplia-

ção de conceitos, para validação de uma tese, para refutação (questionamento) de uma

ideia ou para elaborar conclusões de uma temática.


Material para uso exclusivo dos alunos da Rede de Ensino Doctum. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da lei.

Os argumentos podem ser classificados em:

» De autoridade,

» Por evidência,

» Por comparação,

» Por exemplificação,

» De princípio,

» Por causa e por consequência, e

» De refutação.

A citação como elemento argumentativo aparece quando apresentamos os argumen-

tos de autoridade. Ela pode aparecer de forma:

» Direta (curta e longa),

» Indireta (paráfrase), ou

» Como citação de citação.

Os conectivos de ligação (conjunções) e as locuções adverbiais também podem apare-

cer nos textos com valores argumentativos.

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UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

REFERÊNCIA:

CAMPOS, Shirlei Neves dos Santos. Estudo dialógico de um programa público-privado

de formação continuada do professor de língua portuguesa. 2016. [s.n.]. Tese (Doutora-

do em Linguística Aplicada) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2016.

Material para uso exclusivo dos alunos da Rede de Ensino Doctum. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da lei.
PACHECO, Mariana Do Carmo. O que é tese?; Brasil Escola. Disponível em: https://brasi-

lescola.uol.com.br/o-que-e/portugues/o-que-e-tese.htm. Acesso em 15 de outubro de 2019.

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Sistema Integrado de Bibliotecas.

Orientações para elaboração de trabalhos técnicos científicos conforme a Associa-

ção Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). 3. ed. vista rev. atual. / Elaboração: Roziane

do Amparo Araújo Michielini e Fabiana Marques de Souza e Silva. Belo Horizonte, 2019.

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UNIDADE 6 :
ARGUMENTAÇÃO NA INTERPRETAÇÃO ASSOCIADA AOS TEMAS GERAIS DE ESTUDO

REFERÊNCIA:

CAMPOS, Shirlei Neves dos Santos. Estudo dialógico de um programa público-privado

de formação continuada do professor de língua portuguesa. 2016. [s.n.]. Tese (Doutora-

do em Linguística Aplicada) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2016.

Material para uso exclusivo dos alunos da Rede de Ensino Doctum. Proibida a reprodução e o compartilhamento digital, sob as penas da lei.
PACHECO, Mariana Do Carmo. O que é tese?; Brasil Escola. Disponível em: https://brasi-

lescola.uol.com.br/o-que-e/portugues/o-que-e-tese.htm. Acesso em 15 de outubro de 2019.

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Sistema Integrado de Bibliotecas.

Orientações para elaboração de trabalhos técnicos científicos conforme a Associa-

ção Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). 3. ed. vista rev. atual. / Elaboração: Roziane

do Amparo Araújo Michielini e Fabiana Marques de Souza e Silva. Belo Horizonte, 2019.

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