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na História Antiga
Autores: Prof. Jorge Miklos
Profa. Janaina Santiago
Colaboradores: Profa. Roberta Borges Hoff Matarazzo
Prof. Adilson Silva Oliveira
Professores conteudistas: Jorge Miklos / Janaina Santiago
Jorge Miklos
Janaina Santiago
A professora é graduada e mestre em História pela Universidade de São Paulo. É docente no ensino superior com
experiência em graduação. Tem atuação universitária nas áreas de História da Arte; História da Imagem e do Som;
Teorias e Técnicas da Comunicação; Comunicação Aplicada e Metodologia do Trabalho Científico.
CDU 7.01
U505.67 – 20
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Giovanna Oliveira
Amanda Casale
Sumário
Artes Visuais na História Antiga
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7
Unidade I
1 ARTE: DEFINIÇÕES E CONCEITOS..................................................................................................................9
1.1 Conceito de arte.......................................................................................................................................9
1.2 Origem e função da arte.................................................................................................................... 13
1.2.1 Origem da arte.......................................................................................................................................... 13
1.2.2 Função da arte.......................................................................................................................................... 17
2 A ORIGEM DO HOMEM E A VIDA DO HOMEM PRÉ-HISTÓRICO................................................... 19
2.1 O surgimento do homem................................................................................................................... 20
2.2 O surgimento do homem na América.......................................................................................... 31
2.3 A vida do homem pré‑histórico...................................................................................................... 34
2.3.1 Os primeiros povoamentos: caçadores e coletores nômades................................................ 35
2.3.2 O homem do Neolítico: pastores e agricultores.......................................................................... 40
3 ORIGENS DA ARTE PRÉ‑HISTÓRICA.......................................................................................................... 44
3.1 Homo sapiens e arte pré‑histórica................................................................................................. 44
3.2 A arte pré‑histórica.............................................................................................................................. 45
3.2.1 A arte pré‑histórica: sistemas de representações...................................................................... 45
3.2.2 A arte rupestre: definições e temáticas.......................................................................................... 49
4 A ARTE PRÉ‑HISTÓRICA DOS SÍTIOS INTERNACIONAIS: PINTURAS, GRAVURAS,
ESCULTURAS E ARQUITETURA........................................................................................................................ 53
4.1 As pinturas e gravuras rupestres da Europa: Espanha e França......................................... 53
4.2 A escultura, a arquitetura e a cerâmica pré‑históricas......................................................... 64
Unidade II
5 ARTE VISUAL NA ANTIGUIDADE ORIENTAL............................................................................................ 81
5.1 Antiguidade Oriental: contexto histórico.................................................................................... 81
5.2 A Mesopotâmia e seus povos........................................................................................................... 82
5.2.1 A arte sumeriana...................................................................................................................................... 82
5.2.2 Zigurates...................................................................................................................................................... 83
5.3 A arte assíria e caldeia......................................................................................................................... 85
5.3.1 Império Assírio (1300 a.C.‑612 a.C.)................................................................................................. 85
5.3.2 O Segundo Império Babilônico (612 a.C.‑539 a.C.).................................................................... 86
5.4 Arte babilônica....................................................................................................................................... 88
5.4.1 Primeiro Império Babilônico (2000 a.C.‑1750 a.C.).................................................................... 88
5.5 A arte persa.............................................................................................................................................. 90
5.6 Arte aquemênida................................................................................................................................... 91
6 A ARTE A SERVIÇO DA IMORTALIDADE: CIVILIZAÇÕES E A ARTE EGÍPCIA............................... 92
6.1 O direito divino....................................................................................................................................... 92
6.2 A coleção de Tutankhamon – joias e ornamentos.................................................................100
Unidade III
7 ARTE VISUAL NA ANTIGUIDADE OCIDENTAL.......................................................................................110
7.1 A arte egeia............................................................................................................................................111
7.2 A arte cicládica.....................................................................................................................................111
7.3 A arte minoica......................................................................................................................................112
7.4 A arte micênica....................................................................................................................................113
7.5 A arte característica bizantina e cristã primitiva...................................................................115
7.5.1 A arte cristã primitiva – a arte a serviço da nova religião.................................................... 116
7.5.2 A arte bizantina – retrato da riqueza e do poder..................................................................... 119
8 A ANTIGUIDADE CLÁSSICA GREGA E ROMANA................................................................................122
8.1 A antiguidade clássica grega..........................................................................................................122
8.1.1 Em busca da perfeição – a arte grega.......................................................................................... 122
8.1.2 Helênico.................................................................................................................................................... 133
8.2 A Antiguidade Clássica Romana...................................................................................................139
8.2.1 Monarquia (VIII‑VI a.C.)...................................................................................................................... 140
8.2.2 República (VI‑I a.C.)...............................................................................................................................141
8.2.3 Império (27 a.C.-V d.C.)....................................................................................................................... 144
8.2.4 A cultura romana.................................................................................................................................. 146
8.2.5 Arquitetura.............................................................................................................................................. 146
8.2.6 Outras obras de arte do Império Romano.................................................................................. 149
8.2.7 Arte etrusca..............................................................................................................................................151
APRESENTAÇÃO
Esta disciplina enfoca os estudos a respeito da arte pré‑histórica e de como os homens se expressavam
e se comunicavam artisticamente durante esse período.
Teremos a oportunidade de entrar em contato com conceitos como a definição e função da arte e a
sua importância para o homem do Paleolítico e do Neolítico. Iniciando o trajeto de aprendizagem com o
conhecimento sobre a origem do homem e sua dispersão pelo planeta, chegaremos à arte produzida
durante a Pré‑história e a sua importância na compreensão da história da humanidade e das artes visuais.
A História Antiga corresponde ao estudo das manifestações artísticas que abrangem a época da
criação da escrita até o paleocristianismo, no qual emergem expressões artísticas de vários estilos dos
períodos mesopotâmicos, a arte do vale do Nilo, celta e germânica, egeia, fenícia, a arte da Antiguidade
Clássica, a arte cristã e suas respectivas civilizações.
Este livro‑texto pretende reconhecer o estilo sumério, seus palácios e templos, o uso da madeira e a
influência em nosso tempo, bem como distinguir a arte assíria com seus palácios, suas esculturas, uso
dos tijolos e as portas das cidades.
Teremos a oportunidade de estudar a Babilônia, suas dinastias e seus monumentos que compuseram
as maravilhas do mundo, discutir as tribos persas, o uso de seus artefatos e o estilo animalista.
Vamos procurar entender as funções das pirâmides e mastabas na sociedade egípcia e a arte
funerária. Conheceremos a arte celta e seus objetos de vários metais. Estudaremos os povos germânicos,
a contextualização da arte e a migração dos povos bárbaros.
Espera‑se que o aluno seja capaz, por meio desta disciplina, de conhecer a arte na Antiguidade com
seus respectivos estilos e as principais civilizações que influenciam até hoje as artes visuais.
INTRODUÇÃO
Para pensarmos em arte pré‑histórica, antes de mais nada, precisamos definir um conceito para arte. O
que é arte? Existe arte sem um artista e um observador? Podemos falar da existência de uma arte rupestre?
Essas são questões que surgem sempre que estudamos as artes visuais e, em particular, a arte Pré‑histórica.
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Este livro‑texto abordará, ainda, as grandes tradições artísticas da Antiguidade Oriental num
contexto histórico, cultural e comparativo. Observa‑se que a maioria dos estudantes fica “encantada”
com a pirâmides do antigo Egito, mas reúne pouca informação a respeito dessa civilização, bem como
desconhece as articulações entre a arte, o modo de vida e de pensamento das sociedades antigas.
Em outras palavras, as pirâmides fascinam os estudantes pela sua grandiosidade e perenidade, mas, a
respeito do contexto no qual elas foram construídas, pouco sabem.
Qual o lugar da arte para as civilizações antigas? Por que esses povos (egípcios, sumérios, fenícios,
cretenses, gregos e romanos) produziram algo que, apesar de não ter uma utilidade imediata, estiveram
presentes em suas vidas e, de alguma forma, permanecem presentes em nossas curiosidades e devaneios?
Percebemos que os seres humanos não criam arte para um fim utilitário, mas, sobretudo, para
expressar seus sentimentos (temores, alegrias, crenças, valores, sonhos, esperanças, utopias e distopias).
O ser humano é um animal que, além da sua natureza biológica, é simbólico. Assim, suas demandas
não se resumem a alimento, água, abrigo, mas seu espírito se alimenta de sonhos, beleza, poesia e tudo
aquilo que possa transcender a realidade imediata.
Esperamos que ao estudar a produção artística produzida pelos antigos povos do oriente, você,
aluno, possa vislumbrar o melhor da humanidade.
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ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Unidade I
1 ARTE: DEFINIÇÕES E CONCEITOS
(Teixeira Coelho)
É difícil definir o conceito de arte, pois cada período histórico possui diferentes formas de expressão
artística e cultural. Porém, é consenso entre os pesquisadores que todos os grupos humanos, desde a
Pré‑história, produziram algo a que se pode dar o nome arte. Além disso, é também consenso que, ao
analisar uma obra artística, podemos reconstruir um momento histórico (roupas, costumes, crenças) sob
o ponto de vista do artista que a produziu, o que mostra que a arte é fundamental para se compreender
a história da humanidade.
O que podemos entender como arte? Qual é a melhor definição de arte? Existe um único conceito
para arte? Para alguns autores, os desenhos feitos com terra colorida em cavernas ou os desenhos em
diferentes superfícies feitos pelo homem contemporâneo são atividades que podem ser chamadas de
“arte, desde que conservemos em mente que tal palavra pode significar coisas muito diferentes, em
tempos e lugares diferentes” (GOMBRICH, 1998, p. 15).
Certamente você deve ter uma ideia do significado do termo. Também já deve ter tido contato
com algumas obras chamadas artísticas e, com certeza, consegue citar as obras de arte que são do seu
agrado. Além disso, você, muito provavelmente, acredita que a arte está ligada à atividade humana e às
suas manifestações estéticas e comunicativas.
Porém, ainda temos outros significados: em latim a palavra arte, ligada ao radical ars, tem o
significado de técnica ou habilidade. A palavra latina ars ou artis corresponde ao termo grego tékne
e relaciona‑se à experiência, ao saber fazer, ou seja, à produção. Nesse sentido, mais do que a beleza,
o termo está associado à destreza e à especialização em determinado ofício. A visão de arte ligada à
inclinação racional para a produção faz parte da tradição aristotélica. Assim, faz parte dessa forma de
interpretação de arte concebê‑la como um devir, um fazer, um conjunto de regras.
9
Unidade I
Observação
A ideia de arte relacionada à produção faz com que o conceito não se limite ao campo artístico,
mas que se relacione também aos campos políticos e educacionais. Essa é a visão de arte proposta
por Aristóteles.
Saiba mais
Muito se tem discutido sobre o conceito de arte. Os autores não têm um consenso sobre seu significado,
entretanto podemos tentar delimitar seu campo de ação e ponderarmos sobre seu significado.
O autor nos remete à noção de sentimento admirativo e de privilégio. Mas o conceito de beleza varia
em função do tempo além do caráter pessoal e cultural do que é denominado belo. Janson e Janson
10
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
falam em “um impulso irresistível de reestruturar a si próprio e ao seu meio ambiente de forma ideal”
(JANSON; JANSON,1996, p. 6).
Quando sonhamos (e todos nós sonhamos) estamos, através da imaginação, formando imagens,
estórias, representações em nossas mentes. O homem é capaz tanto de imaginar quanto de fazer relatos
daquilo que imaginou. Esses relatos podem se dar tanto através do diálogo quanto da produção, do
fazer artístico, quer seja em poesia, música, quadros ou em inscrições nas paredes. ”A imaginação é uma
faceta misteriosa da humanidade, é o elo entre o consciente e o subconsciente [...] é a cola que mantém
unidos a personalidade, o intelecto e a espiritualidade” (JANSON; JANSON, 1996, p. 7).
Não podemos deixar de levar em consideração que a arte é uma das primeiras manifestações do
ser humano, ser humano esse que marcou sua presença no mundo e deixou seus registros para a
posteridade. A produção artística faz parte da nossa vida e é essencial para a construção do mundo em
sociedade. Além disso, o que é extremamente importante, representa a reconstrução simbólica que o
homem faz do universo ao seu redor, da sua forma de ver o mundo: são os sentimentos, as emoções, as
ideias transmitidas e reinterpretadas à luz do criador do objeto artístico.
Não podemos deixar de levar em consideração que esse processo de produção insere‑se em um
ambiente cultural que tem papel determinante, tanto na criação quanto no processo de compreensão
do que foi produzido.
Compreender a produção artística significa interpretá‑la à luz desse ambiente cultural, e é esse
processo de interpretação que dá ao objeto o status de artístico. Dessa forma, cabe ao discurso e à
crítica especializada, constituídos na inter‑relação entre crítico, objeto cultural e público, o poder de
classificar, privilegiando um ou outro objeto.
11
Unidade I
Nessa visão, é esse discurso, reconhecido como competente (COLI, 1995, p. 10), e os locais onde os
objetos artísticos são expostos (galerias, museus e até mesmo as ruas das cidades), que nos trazem uma
visão de arte sólida e privilegiada, porém com limites pouco precisos.
Podemos considerar a arte como processo, discurso; acreditamos que ela é repleta de imaginação,
simbolismos e de significados que competem ao observador desvendar. Como afirma um famoso dito
popular, “a arte é o tempero do mundo”. Essa ideia é abordada também no famoso verso da música
Comida, da banda Titãs: “A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte”.
Exemplo de aplicação
12
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Você considera que podemos caracterizar todos como obras de arte? Justifique sua resposta.
Para termos arte, temos que ter a obra e o artista. Esse é um processo de codependência, no qual o
artista e o produto de sua produção estão inter‑relacionados, um não existe sem o outro. É pelas mãos
do artista que a matéria‑prima se torna uma obra de arte.
13
Unidade I
14
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Essa conexão (artista/obra) nos remete a uma tríade composta pela formação de uma imagem na
mente do artista; a comunicação dessa imagem através do objeto, feito pelo artista e pelo observador,
que olha tanto a obra quanto o seu produtor.
Observador, obra e artista estão inseridos em uma dada realidade, em um determinado mundo.
Esse mundo pode ser entendido como um conjunto de significados articulados e com um sentido comum.
É a conjuntura, entendida como um conjunto de circunstâncias ou acontecimentos em um determinado
momento, que dá sentido a esse mundo. E é nele que a obra de arte ganha visibilidade, ele é o local privilegiado
para sua construção.
Expressão humana por excelência, é através da arte que o homem manifesta sua visão de mundo e
proclama suas ideias e sentimentos desde os tempos mais remotos.
Observação
15
Unidade I
No mundo contemporâneo, temos uma produção artística que se dissocia do contexto religioso e
que reflete uma diversidade cultural.
Se a arte se inicia com o aparecimento do artista e com a produção de suas obras, podemos nos
indagar em qual momento surgiram as primeiras manifestações artísticas e as primeiras obras de arte.
Podemos considerar que a origem da arte está nas produções e nos monumentos mais antigos que
encontramos – os quais, a propósito, em sua grande maioria, datam dos últimos estágios do Paleolítico.
Lembrete
Não podemos datar com precisão o início da arte. Porém, foi no final
do Paleolítico que foram elaboradas obras que se conservaram até os
dias atuais.
Contudo, nesses monumentos, já podemos perceber um refinamento e uma grande perfeição técnica.
A habilidade e a precisão dos artistas se mostram tão presentes nas obras, que fica difícil acreditar que
nelas resida a origem da arte.
Muito provavelmente a arte tem origem mais remota. É possível que tenha tido um longo e lento
desenvolvimento com uma produção elaborada com materiais que não resistiram à ação do tempo.
Desconhecemos completamente todo esse processo anterior de produção que pode ter ocorrido em
madeira, argila, em areia e de inúmeras outras formas, constituindo uma evolução gradativa que foge
completamente ao conhecimento e à observação do homem moderno. Porém, se a origem da arte não
pode ser datada, catalogada e estudada, pode ser inferida.
16
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Exemplo de aplicação
Observe as imagens:
Existem semelhanças entre elas? Podemos dizer que uma se inspira na outra, ou seja, que uma é
releitura da outra? Você acha que as duas obras foram feitas pelo mesmo motivo? Justifique.
Quanto à função da arte, estaria ela concentrada apenas no campo da percepção admirativa?
Proença nos indica que é através da arte que podemos ter a percepção, a sensibilidade, a cognição
do mundo, além da sua visão individual de trabalhar o próprio eu. Ela é uma forma de interpretar
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Unidade I
simbolicamente o mundo dentro da concepção do indivíduo e representa uma linguagem que ultrapassa
o processo de comunicação. É, portanto, uma forma simbólica de transmitir ideias e sentido ao que
nos cerca.
Proença (2005) ainda atribui três funções primordiais para a arte: a pragmática, a naturalista e
a formalista.
• Função pragmática: podemos considerar que a obra de arte tem um caráter utilitário, uma
finalidade em si mesma, que não a artística. Essa finalidade pode ser utilitária, pedagógica,
religiosa, política ou cultural.
• Função formalista: nessa concepção, valoriza‑se a forma, a concepção estética ganha destaque.
Transmitem‑se ideias e emoções minimizando os aspectos pragmático e naturalista.
Exemplo de aplicação
18
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Para compreendermos como o homem pré‑histórico produziu arte, é necessário saber um pouco
sobre o seu surgimento. Como era o homem na sua origem? Ele sempre possuiu a capacidade cognitiva
de produzir arte? Vejamos um pouco sobre essas e outras questões.
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Unidade I
Apesar de não sabermos pontualmente como o homem surgiu na face da Terra, podemos chegar a
algumas hipóteses. Inúmeras discussões têm ocorrido quando se pensa na origem do homem na Terra.
A possibilidade de consenso é bastante remota, porém duas teses têm orientado os debates a respeito
dessa questão: a criacionista e a evolucionista.
A hipótese criacionista, extraída das concepções judaico‑cristãs, surgidas da Bíblia, acredita que
Deus tenha criado tudo e todos. Para o criacionismo, a posse de sentimentos, de vontade própria e de
inteligência diferencia os homens dos demais animais.
A teoria evolucionista tem por base o livro de Charles Darwin A Origem das Espécies e propõe que
todos os seres tiveram uma origem comum. Vivendo um processo de evolução gradual e contínuo, as
diferenças teriam se dado pelo processo natural de seleção. Assim, indivíduos mais capazes adaptaram‑se
melhor ao ambiente e sobreviveram, deixando seus descendentes, que acabam sofrendo alterações em
seu mecanismo biológico.
Darwin não foi o único a inovar o pensamento científico da época. Alfred Russel Wallace foi um
naturalista inglês que chegou a uma teoria similar às de Darwin na mesma época em que o renomado
cientista estava trabalhando na hipótese evolucionista. Wallace chegou a escrever uma carta relatando
o seu trabalho a Darwin, o que apressou a publicação da teoria evolucionista.
20
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
[…] Durante cinco anos (1831‑1836), o jovem Charles viveu o que, até sua
morte, aos 73 anos, considerou como o acontecimento mais importante de
sua vida, determinando toda a sua carreira de pesquisador e sepultando seu
desejo de ser ministro religioso.
A teoria evolucionista, apesar de ter passado por muitas revisões, recebeu e recebe amplo apoio dos
meios acadêmicos. Aceitar essa teoria significa aceitar uma visão de mundo “racional e científica que
não permite abordagens pessoais ou místicas.” (POLEGATTO; SILVEIRA JR; JOAQUIM. 2009, p. 74). Assim,
21
Unidade I
O que é sítio arqueológico? É o nome do local em que os vestígios das atividades humanas do
passado ficaram preservados. Existem vários tipos de sítios arqueológicos, como os sambaquis e os
abrigos rupestres. Além disso, eles são muito variados, podendo ser desde uma cidade, como Pompeia,
até um acampamento pré‑histórico.
É através dos variados vestígios materiais deixados pelas sociedades antigas encontrados nos sítios
arqueológicos que o arqueólogo procura reconstituir o modo de vida, as formas de sobrevivência, além
das crenças, comportamentos e ideias dos povos antigos.
22
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
23
Unidade I
Infelizmente, as descobertas não traçam uma linha evolutiva firme e precisa, não existe roteiro,
mas descobertas que algumas vezes elucidam e outras complicam a problemática evolutiva da espécie
humana. Apesar disso, muito se avançou no estudo da Pré‑história e atualmente algumas conclusões
são consenso, como, o fato de que os primeiros hominídeos teriam surgido na África.
Observação
Outra ideia comum é a que defende a existência há cerca de 12 milhões de anos, na Europa e na
África, de pequenos seres cujo desenvolvimento pode ser associado à evolução do Homem. Pinski (2013)
refere‑se a esses seres como Ramapithecus, os patriarcas.
Durante a década de 1960, os pesquisadores Louis e Mary Leakey concluíram que os primeiros
hominídeos teriam surgido há aproximadamente 2,5 milhões de anos numa região conhecida como as
gargantas do Olduvai, na Tanzânia.
Em 1974, o pesquisador Yves Coppens participava de uma escavação arqueológica na Etiópia quando
encontrou um esqueleto com aproximadamente 3,5 milhões de anos, representante de uma espécie que
seria, provavelmente, ancestral do homem: o Australopithecus.
As pesquisas realizadas a partir do esqueleto concluíram que ele seria feminino tanto por seu
tamanho (pequeno) quanto pela análise do osso da bacia. Assim, foi batizado de Lucy em homenagem
à música Lucy in the sky in Diamonds, da banda The Beatles. Além disso, concluiu‑se que a ela
teria uma altura aproximada de 1,10 metro, pesaria 30 quilos e possuiria um volume cerebral
de 430 centímetros cúbicos. A análise do esqueleto comprovou que os australopitecos seriam os
primeiros hominídeos bípedes.
24
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
As pesquisas realizadas pelo casal Leaky, na Tanzânia, descobriram fósseis que comprovaram a
existência de um novo gênero do qual seríamos descendentes: o gênero Homo. O esqueleto descoberto
foi classificado de Homo habilis, pois teria desenvolvido a habilidade de produzir ferramentas.
O Homo habilis vivia no mesmo período do Australopithecus e era detentor de grande habilidade
craniana e de uma postura ereta muito similar à dos seres humanos. Alguns estudiosos acreditam que
tanto o Australopthecus quanto o Homo habilis descendem do Ramapithecus. Porém, ainda nos dias de
hoje, não sabemos com certeza o motivo do sucesso de um grupo em detrimento do outro.
Durante muito tempo, acreditou‑se que os fósseis encontrados na Tanzânia, Etiópia e Quênia,
especificamente no Vale da Grande Fenda, uma grande formação geológica que atravessa essa região,
fossem os mais antigos. Porém, pesquisas realizadas por Michel Brunet, que encontrou em Chade um
crânio de 7 milhões de anos, levantaram a hipótese de que o primeiro hominídeo, chamado homem de
Toumai, seria muito mais antigo do que se acreditava inicialmente.
O Homo habilis, que até então vivia restrito à África, deu origem a uma espécie que se disseminaria
pelas Ásia e Europa: o Homo erectus, há aproximadamente 1,5 milhão de anos. Acredita‑se que essa
espécie, além de aperfeiçoar os utensílios de pedra (facas, machados, raspadores), provavelmente,
iniciou a linguagem falada, começou a abrigar‑se e a produzir fogo. Fisicamente, o Homo erectus não
ultrapassava 1,5 metro de altura, tinha a arcada superciliar saliente e uma mandíbula maciça, desprovida
de queixo. A cabeça articulava‑se com a coluna vertebral de modo a ficar ligeiramente projetada para
a frente.
25
Unidade I
Figura 19 – Reconstituição de duas subespécies do Homo erectus. Da esquerda para a direita: o Sinantropo e o Javantropo
Em aproximadamente 300.000 a.C., o Homo erectus sofreu uma série de adaptações que resultaram
no surgimento de uma nova espécie: o Homo sapiens.
Vestígios da subespécie mais antiga do Homo sapiens foram descobertos pela primeira vez no vale do rio
Neander, na Alemanha, e receberam o nome científico de Homo sapiens neanderthalensis. Posteriormente,
exemplares semelhantes foram encontrados em vários locais na Europa, na Ásia e na África do Norte.
E como era esse novo homem pré‑histórico? Ele não era muito alto, pois media em torno de 1,5 metro,
tinha um crânio levemente achatado, com a testa bastante inclinada para trás; seus maxilares eram robustos
e o queixo pequeno. A arcada superciliar era menos saliente que nas espécies precedentes. Os estudos dos
esqueletos encontrados mostram que ele era atarracado, robusto e que tinha as extremidades mais curtas.
26
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Descobertas recentes defendem que os neandertalenses teriam deixado uma herança genética na
população europeia.
Saiba mais
27
Unidade I
As datações fósseis apontam que por volta de 40.000 a.C. surgiu o homem de Cro‑Magnon, que
recebeu essa denominação pelo nome da caverna no sul da França onde os primeiros vestígios dessa
espécie foram descobertos. Esses homens eram mais altos do que os neandertalenses, medindo em
torno de 1,70 metro e pesando, aproximadamente, 70 quilos. Além disso, seu volume cerebral era muito
maior do que o do homem de Neandertal, seus traços fisionômicos eram menos pesados e seu corpo era
longilíneo e robusto.
O Homo sapiens sapiens (também chamado homem moderno) foi o responsável pelo aperfeiçoamento
das técnicas utilizadas e pela estruturação de uma organização social e religiosa. Acredita‑se que todos
os grupos humanos do planeta tenham se originado desse homem moderno.
Lembrete
O clima tropical e as condições geográficas africanas, como a formação das savanas, permitiram
uma evolução lenta e gradativa. Apesar de raros, porém, alguns vestígios foram identificados, o que
evidência sua presença na região nesse período.
28
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Porém, os seres humanos não permaneceram na África. Por razões ainda pouco identificáveis
saíram do território africano para povoar o mundo. Chegaram primeiramente à Europa e à Ásia e,
posteriormente, habitaram o continente americano.
Saiba mais
Para saber mais sobre a rota dos hominídeos, consulte o artigo a seguir:
29
Unidade I
Exemplo de aplicação
Homo erectus
Homo habilis
Australopithecus
30
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Pouco se sabe a respeito da chegada do homem no território americano, pois ainda existem muitas
ambiguidades sobre a época e a origem do homem nesse continente.
Durante boa parte do século XX, acreditava‑se que a chegada do homem à América teria ocorrido,
basicamente, em dois momentos. O primeiro deles, aproximadamente entre 18 e 13 mil anos atrás,
corresponde à hipótese de ocupação como resultado das migrações que ocorreram a partir da Ásia na
época da glaciação. Essa teoria, chamada hipótese asiática, defende que a migração ocorreu da Ásia
para a América graças a uma ponte de gelo que teria se formado no estreito de Bering, ligando esses
dois continentes.
Observação
Outra hipótese de migração aceita é a malaio‑polinésia. Ela defende que os deslocamentos teriam
sido feitos por grupos de ilhas do Pacífico que navegaram em embarcações primitivas até a costa sul do
continente americano. Isso teria ocorrido há 10 mil anos.
31
Unidade I
Por que os pesquisadores começaram a defender essa nova hipótese? Simples, foi encontrado
um fóssil humano no Brasil na região de Lagoa Santa, em Minas Gerais. Ao fazerem a reconstrução
facial do fóssil, batizado de Luzia, os pesquisadores tiveram uma grande surpresa, pois os traços
apresentados eram negroides e apresentavam notável semelhança com os aborígenes australianos.
As datações comprovaram que o fóssil era muito mais antigo do que se acreditava, uma vez que
tem 11.500 anos.
32
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Além da descoberta do crânio de Luzia, outras pesquisas que questionam a hipótese do Estreito de
Bering como a primeira onda migratória do homem para a América são aquelas desenvolvidas por Niéde
Guidon e sua equipe na Serra da Capivara, no estado do Piauí. Os estudiosos alegam que encontraram
sítios com vestígios de cinzas de fogueira com datação de 48.500. Porém, muitos cientistas nacionais e
internacionais contestam essa datação, uma vez que, pelos vestígios encontrados, é impossível garantir
que essa fogueira tenha sido feita pelos hominídeos.
Como o campo da Arqueologia é dinâmico, novas descobertas podem ocorrer apoiando ideias
ou aposentando outras. Uma das hipóteses mais aceitas para a chegada do homem no Brasil é a
defendida por Walter Neves, que afirma que teriam ocorrido duas migrações separadas de dois
grupos diferentes, ambas, porém, provenientes da Ásia. Segundo ele, a primeira teria ocorrido
há cerca de 13 mil anos e seria de uma população com feições semelhantes às dos aborígenes
australianos. Para ele, esses homens pré‑históricos teriam entrado no continente americano pelo
Alasca, provavelmente com o auxílio de canoas. Essa teoria explicaria as características encontradas
na reconstituição do crânio de Luzia.
Saiba mais
33
Unidade I
Seja como for, todas essas teorias e discussões fornecem pistas para responder a uma importante
questão: afinal, de onde vieram os brasileiros?
Exemplo de aplicação
Reveja a imagem de Luzia e a imagem da menina de Neandertal. Elas são semelhantes? Quais são os
traços da Luzia que mais causaram estranheza entre os pesquisadores?
Após analisarmos as diversas teorias sobre o surgimento e a evolução do homem, vejamos como ele
viveu, seus costumes, suas crenças e seu dia a dia.
34
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
A compreensão do universo artístico e simbólico desse homem, seu processo de se comunicar com
o mundo só chegou até os nossos dias devido à sua necessidade de deixar seus registros grafados nas
rochas e nas cavernas. É a partir da percepção visual que tentamos descobrir os mistérios desse passado
tão longínquo e tão misterioso aos olhos do Homem pós‑moderno.
Porém, só podemos adentrar no seu legado visual se tomarmos como ponto de partida sua
forma de vida, seu processo de organização econômica e social, desvendada através dos resquícios
por ele deixados.
Muitos estudiosos realizaram uma periodização, tanto da história, quanto da Pré‑história. Devemos
considerar que toda e qualquer periodização tem finalidade didática e não qualifica um ou outro
período. Afinal, os períodos coexistem e se inter‑relacionam, não havendo linha divisória e nem mudança
instantânea de um período para outro.
Mas, de qualquer forma, devemos pensar um pouco nessa periodização que pode ser feita, tanto
através de utensílios (Idade da Pedra Lascada e Idade da Pedra Polida), quanto através do modo de vida
(caçadores e agricultores). Essas periodizações representam etapas de um processo evolutivo que devem
ser entendidas no seu conjunto.
Segundo Crosby (1993), apesar de a historiografia ter encarado esse processo como algo
repentino e revolucionário e separar a coleta e a agricultura como duas etapas distintas e que não
coexistiram, pesquisas atuais comprovam que essa transição aconteceu de forma lenta e gradual.
Durante muito tempo, defendeu‑se essa mudança repentina da forma de sobrevivência do homem
pré‑histórico, deixando de lado o fato de que a agricultura desenvolvida inicialmente era uma
atividade complementar que enriquecia a alimentação e garantia maior sobrevivência para esses
grupos de caçadores‑coletores.
Trataremos, em um primeiro momento, dos povos caçadores e nômades. Esses viveram entre
700.000 a.C. e 10.000 a.C. Eram povos nômades que viviam da caça, da pesca e da coleta vegetal.
35
Unidade I
Saiba mais
O homem desse período vivia em aldeias organizadas em sociedades, que tinham como principal
característica não se fixar por um longo período em um mesmo espaço geográfico, mas mudar de um
lugar para outro em busca do alimento necessário a sua sobrevivência.
Caso o local onde fixavam suas comunidades ou aldeias tivesse abundância de matérias e alimentos,
a permanência do grupo poderia se estender por um longo período, mas, no momento em que os
alimentos escasseavam, o grupo direcionava‑se a um local onde houvesse uma maior abundância de
recursos para sua sobrevivência.
36
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Esse foi um longo período, quando, além do nomadismo, o homem vivia de forma simples, sobrevivendo
da caça de animais e da coleta de vegetais. A possibilidade de se proteger das intempéries da natureza
era simples e limitada: peles de animais e a moradia em grutas e cavernas eram mecanismos de extrema
importância para garantir sua sobrevivência. Seus abrigos eram cabanas feitas de galhos sustentados
por pedras que, mesmo pequenas, protegiam do vento e dos animais carnívoros. Normalmente, essas
cabanas eram construídas à beira de riachos ou próximas a lagos.
Inicialmente, esse homem pré‑histórico não caçava, vivendo de grãos vegetais retirados da natureza
e devorando a carne dos grandes animais, como mamutes e hipopótamos, encontrados mortos.
Com o tempo, esse hominídeo, organizado em plenos grupos, aprendeu a caçar. Provavelmente,
esses povos eram dotados de alguma técnica de caça, como, forçar os animais rumo a desfiladeiros sem
saída ou abismos. Uma vez acuados, esses animais eram direcionados a armadilhas feitas em covas ou a
arapucas feitas com paus pontiagudos.
Com o passar do tempo, o homem foi se aperfeiçoando e construindo ferramentas para suprir suas
deficiências corporais e favorecer sua luta contra uma natureza hostil.
Esse aprimoramento não ocorreu de forma isolada, mas sempre dentro de um complexo contexto.
Ossos, pedras e madeiras constituíam‑se em uma grande fonte de matéria‑prima, obtida na própria
natureza que o circundava, para a construção dos instrumentos que facilitavam o recolhimento dos alimentos.
Os homens pré‑históricos construíram enxadas e enxós que, se hoje nos parecem muito rudimentares, na
época eram utensílios que, além de essenciais, possibilitavam maior longevidade ao grupo. O sílex e a madeira
eram utilizados para a fabricação de armas, quer fossem de impacto, quer fossem lâminas ou lanças.
Nesse período, para fazerem esses instrumentos de pedra, também denominados de artefatos
líticos, usavam a técnica do lascamento de pedras, formando o que os arqueólogos chamam de
indústria lítica.
37
Unidade I
Por percursão
indireta
Retoque por
Por percursão pressão
direta
A fabricação de instrumentos cada vez mais aperfeiçoados é resultante da utilização das mãos
nesse trabalho. Ao fabricar essas ferramentas, os hominídeos permitiram operações mais complexas e
passaram a utilizar uma área do cérebro que é a mesma que nos permite falar.
Lenta e gradualmente e, de certa forma, auxiliado pelo acaso, o homem foi conseguindo dominar o
fogo, que a princípio era encontrado apenas pela queda dos raios. Com o passar do tempo, entretanto,
o homem dominou a técnica de produção através do atrito entre duas pedras ou da fricção de pedaços
de madeira em gravetos secos. Acredita‑se que, antes de dominar essa técnica, existia o chamado “fogo
cativo”, que era retirado de um incêndio natural e alimentado com ervas secas e galhos mortos. Para
preservá‑lo, cavavam pequenos buracos rodeados de pedra, onde as brasas ainda quentes podiam ser
reanimadas. Assim, o fogo era tratado com muito cuidado pelo grupo.
Saiba mais
38
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Assistimos a uma mudança radical do seu modo de vida, pois houve a conquista de certa independência
do meio natural. O fogo trouxe a possibilidade de aquecimento, iluminação e defesa dos animais que, à
noite, sentiam medo de chegar próximos ao grupo quando percebiam o brilho incandescente do fogo.
A sobrevivência em um clima rigoroso, onde o frio e a neve eram uma constante, tornou‑se mais fácil.
O homem também o utilizou de forma defensiva ou ofensiva, pois o dono do fogo acreditava‑se forte.
Pesquisas arqueológicas na Zâmbia e na Espanha mostram que muitas pontas de lanças eram
endurecidas passando‑as pelo fogo.
Observação
Que mudança na dieta alimentar! Foi uma verdadeira revolução gastronômica. Imagine, os vegetais
passaram a poder ser cozidos ou assados, facilitando o processo de digestão. Isso também levou à
produção de utensílios para cozinhar alimentos.
Como todos os outros animais, o homem pré‑histórico vivia em bandos, porém, ao contrário das outras
espécies, a cooperação era um fator circunstancial para a conquista do alimento necessário ao grupo.
Com os avanços da estrutura alimentar, esses grupos passaram a ser mais numerosos e, como já dito,
começaram a edificar moradias rústicas, construídas com peles de animais, gravetos ou rochas.
Em maior número e vivendo num habitat mais bem elaborado, esses grupos desenvolveram maior
sensibilidade para com o mundo que os cercava. Podemos perceber os rudimentos de uma vida espiritual
através da descoberta de sepulturas que constatam a existência do culto aos mortos. Arte e magia se
interligam na história de vida desses grupos. A presença de rituais funerários e a explosão de pinturas nas
grutas e nas cavernas comprovam a existência de um homem com maior percepção e mais relacionado
com o mundo, o que nos possibilita um maior conhecimento do período.
39
Unidade I
Por um longo período, grupos humanos viviam deslocando‑se de um lugar para outro em busca do
alimento necessário à sua sobrevivência. A caça, a pesca e a coleta vegetal garantiam a sobrevivência
dessas sociedades comunais que tinham como alimentos frutos, raízes, ervas e peixes, além dos animais
provenientes da caça. É a partir dessa sociedade de caçadores e coletores que assistimos à transformação
para uma sociedade de pastores e agricultores.
As marcas humanas que indicam o desenvolvimento da atividade agrícola surgem mais ou menos
no ano 10.000 a.C. Nessa viagem da evolução, já somos Homo sapiens sapiens.
40
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
O fim do período de nomadismo foi acompanhado de uma grande modificação climática. A glaciação
cedeu lugar a um novo clima (temperado, na Europa, ou semiárido ou desértico, norte da África) e, com
ele, o desaparecimento dos grandes animais. A partir do momento em que a caça tornou‑se mais difícil,
o homem buscou novas técnicas para sua sobrevivência.
A associação entre uma cuidadosa observação da natureza e a relação causa–efeito (observar que
o grão que cai no chão pode germinar e produzir) foi fator circunstancial para o desenvolvimento
da atividade agrícola. Não podemos deixar de levar em consideração certa dose de casualidade e
acidentalidade que contribui com o surgimento da agricultura.
A princípio, houve o cultivo de tubérculos, depois de plantas medicinais e, por fim, o desenvolvimento
de produtos suficientes para o abastecimento do grupo.
A vida adquiriu novo significado, o homem começou a dominar a natureza, colocando‑a a seu
serviço. Grãos maiores e mais nutritivos foram desenvolvidos a partir da escolha das melhores sementes
e, até mesmo, da produção de enxertos.
A mudança foi tão significativa que damos a ela o nome de revolucionária. E alterou‑se até mesmo a
densidade demográfica, pois mais alimentos significam uma maior longevidade e melhor sobrevivência.
Consequentemente, esse homem também teve mais tempo para outras atividades que não estavam
diretamente relacionadas com a procura de alimentos.
Contudo, não podemos pensar que essa foi uma mudança brusca, mas que ocorreu de forma gradual,
como assinala Pinsky (2013, p. 51):
41
Unidade I
Se, por um lado, o avanço foi gradativo, por outro, não foi um ato isolado: povos da Índia, China,
África Tropical e América de forma lenta, porém contínua, começaram a cultivar seus alimentos.
Esses grupos cultivavam produtos que variavam em função da região ou da necessidade: trigo,
cevada, batata doce, mandioca e arroz foram as principais espécies cultivadas.
As inovações não se propagam com rapidez, dessa forma, caçadores e coletores convivem em
conjunto. Porém, a existência da atividade agrícola para um determinado grupo requer a fixação em
um determinado local, possibilitando que a natureza feche o seu círculo (semeadura, cultivo e colheita).
O local escolhido para a fixação de residência, além de ter algum curso fluvial (rios, córregos e riachos),
tinha que ter recursos para o abastecimento do grupo. Algumas vezes, o crescimento populacional ia
além dos recursos da região, provocando uma divisão interna e a busca de novas regiões. O tamanho do
grupo variava em função da produtividade da terra.
Vivendo nessa constante migração em busca de sua sobrevivência, o homem pré‑histórico vivenciou
uma difusão cultural. A agricultura passou a ser uma atividade irresistível e, por isso, a irradiação dessa
nova forma de sobrevivência ocorreu de forma segura em direção a um futuro que, a princípio, se
mostrava extremamente promissor.
Sem dúvida, esse foi um período de muitas mudanças, dentre elas a domesticação dos primeiros
animais. Em busca dos restos de alimentos, os lobos aproximavam‑se dos locais onde as tribos estavam
fixadas. Os seres humanos, então, aproveitando‑se dessa proximidade, começaram a utilizar alguns
desses animais para facilitar a caça. O uso feito pelo homem desse animal promoveu uma seleção
artificial, criando uma nova espécie.
O confinamento de animais também deve ter ocorrido em um processo cheio de erros e acertos.
Esse processo ocorreu por meio de um aperfeiçoamento vagaroso, conforme afirma Pinsky (2013, p. 48):
como atividade complementar, “um pequeno número de animais, [ora] alimentados por pastos naturais
em volta do aldeamento e por restos de colheita”; ora confinados e utilizados como reserva de caça.
Na medida em que a atividade pastoril começa a ganhar corpo, o homem percebe que, além do alimento,
essa atividade traz consigo inúmeras outras vantagens, como o uso do leite, do couro, da lã, dentre outros.
Essas transformações possibilitam um tempo disponível que podia ser dedicado à construção de
casas e fabricação de ferramentas que facilitavam o dia a dia. A técnica utilizada não é mais o lascamento
e sim o polimento das ferramentas após sua confecção. Logo depois, o homem descobre a metalurgia.
Então, em vez da força, é a “tecnologia” a grande auxiliar na busca da sobrevivência. O homem desce das
montanhas, sai das grutas e fixa residência onde a vida é mais fácil; no litoral ou próximo ao leito dos rios.
Surgem os primeiros aldeamentos, suas residências são feitas em material mais durável, como pedras
e adobe. Posteriormente, essas aldeias dariam origem às cidades. O vestuário se modifica, deixando de
ser exclusivamente de pele de animais: desenvolve‑se a tecelagem.
Contudo, a evolução da sociedade não ocorre de forma harmônica e organizada. Não podemos
acreditar que agricultores e criadores vivessem em paz e harmonia. Além dos conflitos inevitáveis para
salvaguardar o grupo e suas posses, é razoável acreditar que esse processo revolucionário ocorreu em
conjunto com uma diferenciação social e o surgimento de grupos que passaram a governar os demais.
Podemos, então, afirmar que a Revolução Neolítica, que possibilitou a sedentarização do grupo,
junto com a agricultura e a domesticação dos animais, mudou a organização do grupo, instituiu a
divisão do trabalho entre homens e mulheres e alterou a relação com o tempo.
Existia um tempo muito importante: o tempo entre a semeadura e a colheita. Provavelmente esse
era um período dedicado à cestaria, à cerâmica e à tecelagem – além, naturalmente não podemos deixar
de salientar – às atividades místicas e artísticas, nas quais esses homens se empenhavam em busca do
auxílio divino e mágico em prol de uma colheita abundante para abastecer o grupo. As pinturas e as
gravuras, assim, se modificam e surgem os monumentos megalíticos que veremos a seguir.
Exemplo de aplicação
Com a passagem do Paleolítico para o Neolítico, mudanças ocorreram em relação ao modo de vida
e às formas de sobrevivência de nossos ancestrais. Reflita a respeito dessas mudanças e de como elas
contribuíram para uma possível mudança na arte.
43
Unidade I
Quando surgiu a arte pré‑histórica? Foi o Homo sapiens ou o Homo sapiens sapiens que a criou?
Muito se discute em relação à origem da arte pré‑histórica e, com a constante realização de novas
pesquisas, sempre se acrescentam informações sobre o tema.
Quem foi o primeiro hominídeo a produzir arte? Esse é o ponto de partida para pensarmos sobre a
antiguidade da arte paleolítica. Desde a descoberta das pinturas rupestres, muito se pensou a respeito.
Os primeiros pesquisadores acreditavam que o chamado homem primitivo não possuía a capacidade
artística e intelectual do homem moderno. Depois, atribuíram toda a produção artística pré‑histórica ao
Homo sapiens, pois este teria desenvolvido uma linguagem simbólica, abstrata e articulada.
Para muitos pesquisadores, o Homo sapiens sapiens teria desenvolvido essa capacidade de
expressar‑se de forma simbólica graças à evolução cerebral ocorrida com o desenvolvimento do lóbulo
frontal. Outras características físicas, como a presença de uma visão binocular (permitida em decorrência
da verticalização da face), o bipedismo (que teria possibilitado a liberação das mãos, que passaram a
ter o polegar opositor) e a posição da laringe (em decorrência de uma postura ereta) também teriam
possibilitado as representações artísticas. O homem primeiro teria conquistado o universo simbólico da
fala, para depois dominar o universo da imagem e das representações visuais. É verdade que todas essas
mudanças ocorreram e foram importantíssimas para a nossa evolução,
Apesar dessas descobertas, como a ocorrida em Twin Rivers (Zâmbia), que datam as pinturas
rupestres em aproximadamente 400 mil anos, ainda é consenso entre os estudiosos que a arte rupestre
como prática teria sido desenvolvida pelo Homo sapiens em torno de 40 mil anos atrás. Assim, para
eles, a generalização do uso de pigmentos e o início das primeiras imagens e representações simbólicas
seria responsabilidade desse homem moderno, como comprovariam as últimas datações em pinturas
rupestres de regiões da Espanha e da França.
E você, o que pensa sobre isso? Reflita sobre essas controvérsias entre os pesquisadores.
Estudar arte na Pré‑história nos leva a indagar se o conceito de arte se aplica aos povos da Pré‑história.
Se entendermos arte como um processo, como nos fala Argan (1994), ligado às técnicas desenvolvidas
pela ação humana e a relação entre sua capacidade mental e de ação podemos associar essa produção
aos povos anteriores ao aparecimento da escrita.
Podemos considerar que esses povos têm comportamentos semelhantes aos nossos, como prazer
visual ou tátil, porém a palavra arte é contemporânea, não existia na época.
Desde tempos remotos, o homem representa o seu mundo e sua realidade através de imagens.
Para os seres humanos, a ordenação visual sempre esteve presente, quer de forma figurativa, quer de
forma abstrata.
Essa ordenação do mundo através de imagens, da criação de símbolos não pode ser considerada obra
do acaso, deve ser admitida como representação do comportamento simbólico e social dos grupos que
o produziram.
45
Unidade I
O que leva um homem que ainda não domina técnicas que garantam sua sobrevivência de forma
adequada a externar, através de símbolos, o mundo que o cerca?
Criando uma gramática visual própria, esse homem reproduz elementos de sua realidade, de acordo
com sua visão de mundo. Trata‑se de uma produção estética que foi feita para ser vista, logo, dá
supremacia à visão e concretiza de forma plástica o mundo que os rodeia.
É a partir de uma realidade dada que esse “artista” cria um elo entre o espectador e o mundo e
estabelece uma multiplicidade de percepções e de interpretações desse mundo circundante.
A seleção das imagens não é aleatória, expressa um recorte que não é apenas pessoal, mas que
representa informações que são relevantes tanto para quem as produziu quanto para o grupo que vai
visualizar e relacionar‑se com o objeto da produção. Mesmo levando em consideração que algumas
dessas imagens foram produzidas em grutas de difícil acesso, temos o período de produção e a observação
que está relacionada, inclusive, com a pouca luminosidade do local.
É a partir da visão que reconhecemos o mundo ao nosso redor e reagimos a ele. Formamos uma
imagem mental daquilo que vemos, e é a partir dessa imagem que decodificamos o mundo.
A compreensão de uma determinada imagem será feita a partir do repertório daquele que a observa.
Os processos referenciais pessoais e do grupo são fatores determinantes para isso. A produção dessa
imagem não pode ser considerada obra do acaso, pois está inserida em um universo de representações
e significados.
Os primeiros registros de representação visual do mundo encontram‑se na Pré‑história. Nas grutas, nas
paredes das cavernas e em pedras, os homens dessa época retratavam visualmente o mundo do período.
Surge uma representação estética de uma realidade que representa os registros dos nossos
antepassados mais longínquos. No Paleolítico, temos representações naturalistas e figurativas de
46
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
extrema fidelidade ao real; no Neolítico, vemos um mundo representado de forma geométrica. Mais do
que o real, são símbolos e conceitos que se desvendam aos olhos de um observador que vê um mundo
poetizado descortinando‑se em sua frente.
A presença desses objetos não é circunscrita a um único povo ou agrupamento, mas recorrente nos
mais diversos sítios arqueológicos de múltiplas e variadas regiões. Onde quer que esses vestígios sejam
encontrados, encontramos também um universo simbólico e de representações.
O arqueólogo Denis Vialou estudou esses sistemas de representações e afirmou que existem símbolos
frequentes e recorrentes que podem ser classificados em função de um tema em comum ou dos locais
em que foram elaborados. Desse modo, Vialou (2007, p. 66–71) indica quatro categorias metodológicas
para pensarmos a arte pré‑histórica. A primeira dessas categorias é a universalidade antrópica da arte
47
Unidade I
pré‑histórica e envolve a pesquisa antropológica a partir da evolução cerebral alcançada pelo homem
moderno, disperso por todos os continentes. É a partir desse momento que surgem os primeiros sistemas
de representações rupestres.
Ainda segundo Denis Vialou (2005, p. 245), os sistemas de representações que existem desde o
Paleolítico Superior, apesar de serem universais, por pertencerem a uma mesma espécie, também
compõem uma identidade cultural única. Assim, como sistemas de representações simbólicas, as artes e
as línguas representam aspectos de identidade cultural dentro de uma escala temporal.
O que podemos afirmar com certeza é que a arte pré‑histórica é uma arte que se apropria da
natureza que cerca o homem que a produz, demonstrando o vínculo dessas sociedades com o entorno
em que viviam. Dessa forma, podemos afirmar que o “artista” pré‑histórico representou o ambiente em
que estava inserido.
A arte pré‑histórica, portanto, representa, entre outras coisas, a expressão das sociedades desse
período a partir de sua complexidade cultural e de sua relação com o seu entorno.
48
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Exemplo de aplicação
O que é arte rupestre? O que induziu o homem pré‑histórico a produzir arte rupestre? Existe uma
arte rupestre? Essas são questões que, apesar de sua aparente simplicidade, geram muita polêmica até
mesmo na atualidade.
Alguns arqueólogos defendem que o termo arte para a Pré‑história seria equivocado. Para esses
pesquisadores, nas sociedades pré‑históricas não haveria um artista e, portanto, não existiria arte.
Porém, muitos são os estudiosos que defendem o conceito de arte rupestre e os arqueólogos que se
interessam por esses registros.
Lembrete
Mas desde quando os pesquisadores se preocuparam em analisar a arte rupestre? Do século XV até
meados do século XX essas representações foram, basicamente, analisadas como arte pela arte, sendo
ignoradas como fonte de informação sobre os povos que as produziram. Somente a partir dos trabalhos
de Laming‑Emperaire e Leroi‑Gourhan é que se iniciou uma discussão em torno da necessidade de se
criar uma metodologia de estudo da arte parietal e se defendeu a existência de uma estruturação lógica
para as representações rupestres das cavernas da França, especialmente Lascaux e Chabot.
49
Unidade I
Observação
Assim, as análises das representações rupestres procuraram compreender o homem e o mundo que
as produziram.
A interpretação da arte pré‑histórica sempre foi motivo de muita polêmica, e todos os pesquisadores
desse período, de uma forma ou outra, abordaram seu significado e sua função. A maior parte das
interpretações, contudo, era vaga, e durante boa parte do século XX, os pré‑historiadores buscavam em
sociedades contemporâneas respostas para as questões da Pré‑história, ignorando, geralmente, as
especificidades de cada povo e de cada realidade.
Ao longo do século XIX e início do século XX, entretanto, surgiram algumas interpretações balizadas
pela concepção evolucionista de mundo. Essas interpretações defendiam, principalmente, a ideia da
“arte pela arte”. Segundo essa teoria, o homem do Paleolítico teria muito tempo livre em períodos como
o inverno, quando não ocorreria a caça. Assim, esse homem teria se preocupado em enfeitar o entorno
em que vivia durante o seu tempo livre.
Como vimos anteriormente, essa linha de interpretação foi questionada em meados do século XX
pelo trabalho de alguns pesquisadores franceses. Leroi‑Gourhan foi um dos primeiros a defender uma
linha estruturalista para a interpretação da arte pré‑histórica. Assim como esse autor,
Atualmente, a análise da arte rupestre é realizada por novos campos de interpretação, como o
estudo de gênero e de fenômenos astronômicos, biológicos e acústicos. Porém, apesar disso, a hipótese
mais corrente ainda é a que defende uma finalidade mágica para essas pinturas e gravuras relacionadas
com rituais que tinham o objetivo de garantir a sobrevivência do grupo.
50
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Nesse sentido, é significativa a presença de pinturas de animais atravessados com flechas. Além
disso, acredita‑se que se utilizava a imagem para assegurar a morte do animal mais difícil de capturar
ou para proteger‑se contra seus ataques. Por isso, na Europa, era comum a presença dos bisões na arte
rupestre, enquanto os cervos, principal fonte de alimentação segundo os vestígios encontrados nessa
região, está praticamente ausente, pois eram “fáceis de caçar”. Sob essa perspectiva de interpretação, a
caverna adquire o papel de santuário.
Não é amor realístico pelas formas dos animais, para com suas massas
plásticas, ou seus atos irrompentes, o que impele o homem do Paleolítico a
fixar‑lhes a imagem. É, porém, a fome; a terrível fome, individual e coletiva, de
uma humanidade que da caça obtém os meios de subsistência. A figuração,
como ato mágico, se acrescenta aos métodos de caça, à pederneira, às
armadilhas (PISCHEL, 1996, p. 12).
Como vimos, existe uma grande discussão acerca das interpretações da arte rupestre. Não podemos
esquecer que o ser humano é complexo, então, por que deveria ser simples analisar sua produção?
Um consenso, porém, entre os pesquisadores atuais é que, independentemente da linha interpretativa,
a análise de uma pintura ou gravura em rocha não pode ser feita de uma maneira isolada, mas sim
levando‑se em conta todo o contexto em que ela é encontrada.
Além disso, apesar de todas essas controvérsias, devemos nos lembrar de que o artista do Paleolítico
e do Neolítico
[...] que retratou nas rochas os fatos mais relevantes da sua existência, tinha,
indubitavelmente, um conceito estético de seu mundo e da sua circunstância.
A intenção prática da sua pintura podia ser diversificada, variando desde
a magia ao desejo de historiar a vida de seu grupo, porém, de qualquer
forma, o pintor certamente desejava que o desenho fosse ”belo” segundo
seus próprios padrões estéticos. Ao realizar sua obra, estava criando arte
(MARTIN, 1996, p. 235).
51
Unidade I
Assim, quais foram os elementos dignos de registros para os homens pré‑históricos? Como visto
anteriormente, o repertório do homem desse período envolvia a natureza que o cercava, tornando a
temática da arte rupestre mundial homogênea.
A presença de figuras humanas, de animais, sinais geométricos e símbolos da natureza, como o Sol e
a Lua, são, portanto, elementos comuns na arte parietal das grutas e cavernas encontradas na Espanha,
na França, em Portugal, na África e no Brasil, entre outros países ao redor do mundo.
Na Europa, por exemplo, é comum a presença de imagens de bisões, cervos, cavalos, renas, cabras,
javalis e ursos representando o universo vivido por estes homens.
As cenas de caçada também são uma temática constante na arte rupestre mundial, demonstrando,
mais uma vez, segundo os pesquisadores, a preocupação do homem com a sua sobrevivência.
Exemplo de aplicação
Várias teorias de interpretação da arte rupestre foram apresentadas. Reflita sobre elas e escolha a
que você considera a mais indicada. Feito isso, tente interpretar a imagem.
52
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Em que regiões aparece a arte pré‑histórica? A arte pré‑histórica, como comentado anteriormente,
aparece em todos os continentes, com exceção da Antártida. O maior número de sítios existe no
continente africano. A Austrália é outro território rico em arte rupestre (região de Laura, Pilbara e terra
de Arnhem – Parque Nacional de Kakadu). Na Ásia, encontramos sítios na China, na Ásia Central, no
Oriente Médio e na Índia. O continente americano apresenta sítios de norte a sul. No Brasil, acredita‑se
que os sítios de São Raimundo Nonato, no Piauí, sejam os mais antigos.
As grutas e cavernas europeias ainda hoje são as mais estudadas. A descoberta e as análises
desses locais fizeram que, durante muitos anos, essa arte rupestre fosse considerada a mais antiga.
Por isso, as informações e as interpretações realizadas na Europa foram norteadoras de todas as
demais pesquisas.
Saiba mais
Em 1879, Marcelino Sanz de Sautuola escavava com sua filha de sete anos em busca de vestígios
pré‑históricos, quando descobriu, por acaso, as cenas de animais que recobriam o teto da gruta de
Altamira, no município cântabro de Santillana del Mar, Espanha. Apesar de defender que os desenhos
tinham sido feitos pelas mãos dos homens da Pré‑história, morreu em 1888 sem conseguir que se
reconhecesse o seu achado. Para muitos, essas pinturas eram meras falsificações ou a obra de pastores
da região que haviam vivido durante a Idade Média.
As descobertas das grutas de Altamira, seguidas pelas descobertas das pinturas e gravuras parietais
na França, levaram a comunidade científica do final do século XIX e começo do século XX a analisar essas
representações como produções do homem pré‑histórico. A partir daí, as descobertas foram sucessivas,
e a última grande descoberta ocorreu em 1994, na França.
53
Unidade I
Já sabemos que foi durante o Paleolítico que surgiram as primeiras representações de arte rupestre,
mas como analisar essa arte rupestre? Todas as cavernas e grutas encontradas apresentam desenhos da
mesma época?
Um dos aspectos mais importantes para a análise da arte rupestre é o processo de datação.
Muitas vezes, os arqueólogos recorrem às escavações em busca de vestígios que permitam uma
datação absoluta (aquela que utiliza o carbono 14, que é um método radioativo de análise). Para
isso, buscam pigmentos, instrumentos usados nas pinturas ou restos de carvão. Uma das técnicas
usadas atualmente é a chamada radiocarbônica, que mistura materiais na preparação de amostras de
carbono. Como essas técnicas de datação são muito recentes, no início, a interpretação dos desenhos
era o método mais utilizado para analisá‑las. Porém, como vimos anteriormente, nem sempre houve
consenso nas interpretações.
Assim, podemos afirmar que existiam várias culturas paleolíticas, sendo a aurignaciana a mais antiga
(40 mil a.C. – 28 mil a.C.). Foi durante essa época que começaram a ser produzidas as primeiras imagens
e representações simbólicas. A cultura aurignaciana foi sucedida pela cultura gravetiana (28 mil a.C. –
20 mil a.C.), que, por sua vez, foi sucedida pela solutreana (20 mil a.C. – 10 mil a.C.), que apresenta uma
quantidade significativa de gravuras, e, por fim, a última seria a magdaleniana (10 mil a.C. – 5 mil a.C.)
com pinturas como as encontradas em Niaux, França.
Observação
Durante o período aurignaciano, os desenhos apresentam traços simples realizados, entre outras
técnicas, com os dedos em argila mole. No repertório desse período, a presença de animais era comum,
e eram pouco frequentes as representações humanas.
Outra representação desse período são as pinturas de mãos encontradas em grutas como a de
Gargas, nos Pirineus franceses.
Não sabemos se, e até que ponto, o motivo rupestre da impressão da mão
aberta, contornada, se reveste de significado mágico, como acontece com
a maior parte das figurações do Paleolítico. Em todos os tempos, a arte
apreciará a figuração da mão: raramente, porém, conseguirá a sugestão
destas, que são gritos de presença e de conquista. Assinalando a meta
54
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Essas marcas de mãos apareciam em positivo ou negativo, dependendo da técnica utilizada. Quando
as mãos eram apoiadas cheias de tinta nas paredes, o efeito conseguido era denominado mãos em
positivo. A técnica utilizada para se obter as chamadas mãos em negativo era a seguinte:
“Após obter um pó colorido a partir da trituração de rochas, os artistas o sopravam, através de um canudo,
sobre a mão pousada na parede da caverna. A região em volta da mão ficava colorida e a parte coberta, não.
Assim, obtinha‑se uma silhueta da mão, como num filme em negativo” (PROENÇA, 2000, p. 12).
Para muitos, foi somente depois de dominar a técnica das mãos em positivo e em negativo que o
artista do Paleolítico passou a, efetivamente, desenhar, pintar e gravar nas paredes das grutas e cavernas.
Saiba mais
Partindo da hipótese interpretativa que considera que a arte rupestre possuía uma função mágica e
que, ao executá‑la, o homem garantia uma caça abundante para seu grupo, uma questão é levantada:
o homem teria a única intenção de matar com a sua arte, ou também buscaria criar animais?
55
Unidade I
Tudo isso, porém, são possíveis interpretações sobre a arte rupestre. O que podemos afirmar é que
a principal característica da arte rupestre do Paleolítico é o naturalismo, ou seja, o realismo de suas
representações. Além disso, outra característica da arte parietal paleolítica é o fato de os desenhos
serem feitos em grutas e cavernas de difícil acesso.
Ao falarmos de pinturas e gravuras rupestres na Europa, devemos, sem dúvida nenhuma, destacar aquelas
encontradas na região franco‑cantábria, pois, desde sua descoberta, muito se avançou em suas análises.
Observação
Mais uma vez, destacam‑se o naturalismo das imagens e a capacidade do homem do Paleolítico
de recriar a natureza que o cerca. Geralmente, os bisões são representados com traços que apresentam
56
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
força e movimento, mas, “nas imagens que representam renas e cavalos, os traços revelam leveza e
fragilidade” (PROENÇA, 2000, p. 12).
Nas pinturas rupestres franco‑cantábricas, como nas demais representações parietais do Paleolítico,
algumas características comuns são perceptíveis, sendo o naturalismo uma delas, com as figuras de
animais isoladas sem formar cenas. Outra característica se refere às cores utilizadas, que variam da
monocromia à policromia. Os homens pré‑históricos utilizavam o preto, que conseguiam a partir
do carvão vegetal, e cores como o amarelo e o vermelho, que obtinham do óxido de minerais. Esses
pigmentos naturais eram mesclados com gordura animal e se utilizavam, provavelmente, os dedos e
pincéis feitos de penas e pelos para a pintura. Além disso, era comum que os artistas se aproveitassem
das reentrâncias e das saliências das paredes para realizar as pinturas, encontradas, principalmente, nas
áreas pouco iluminadas do fundo das cavernas e grutas.
A temática mais frequente nas pinturas de Altamira é o bisão. Ele aparece em variadas posições: em
repouso ou em movimento, com a cabeça voltada para o lado, mugindo e em outras posturas. Outros animais
também impressionam por seu realismo, como os cavalos, cervos e mamutes. Seu conjunto de pinturas é
muito impressionante e é o que fez essa gruta ganhar o título de “Capela Sistina da arte quaternária”.
Saiba mais
http://museodealtamira.mcu.es/El_Museo/index.html.
Outra gruta que também impressiona pelas figuras representadas é Lascaux. As pinturas dessa gruta
demonstram diversas técnicas, desde as figuras monocromáticas, passando pelas bicromáticas (nas quais
se destacam as combinações amarelo e preto, vermelho e preto) e pelas policromáticas, com destaque
para vermelho, amarelo e preto.
A gruta de Lascaux, no sul da França, foi descoberta em 1940, por Marcel Ravidat, que passeava uma
tarde com seu cachorro pelos arredores. Como não conseguiu entrar num primeiro momento, voltou
dias depois, acompanhado por amigos, e, juntos, finalmente entraram na cova. Qual não foi a surpresa
dos rapazes quando, avançando pela gruta, chegaram a uma galeria estreita e, ao levantar a lanterna
viram que o teto estava cheio de representações de cavalos e touros? Impressionados com o achado,
57
Unidade I
avisaram a um professor aposentado da região que, por sua vez, entrou em contato com o abade Henri
Breuil, uma das maiores autoridades em arte paleolítica da época.
Henri Breuil, ao iniciar seus estudos de Lascaux, chamou‑a de “Altamira francesa” e acreditava
que as pinturas e gravuras parietais encontradas na gruta fossem do período aurignaciano, porém as
pesquisas posteriores comprovaram que as figuras eram do final do Paleolítico Superior, ou seja, do
período magdaleniano. A temática comum é a presença de animais, com uma grande frequência de
cavalos, touros e bisões.
No sul da França, encontramos a gruta de Niaux, uma das mais famosas do mundo. As pinturas,
pertencentes ao período magdaleniano, destacam‑se pela sua policromia e pelo uso do carvão
e do óxido de ferro. A temática presente nas representações são animais como cavalos, cabras,
bisões e cervos.
Em Niaux, existe uma grande sala circular subterrânea chamada de Salão Negro, onde a arte parietal
se caracteriza pela presença de figuras delineadas em negro e policromáticas. Uma dessas figuras retrata
um bisão ferido por flechas com os traços negros delineados com grande efeito realista.
Apesar de diversas grutas com arte parietal terem sido encontradas na região francesa de
Ardèche desde o século XIX, essas figuras não despertaram o mesmo interesse que aquelas da região
franco‑cantábrica. Porém, isso mudou quando, em 1994, três amigos descobriram uma gruta que
recebeu o nome de Chauvet.
O nome Chauvet foi uma homenagem a uma das descobridoras da gruta. Jean‑Marie Chauvet, e seus
amigos Éliette Brunel e Christian Hillaire, espeleólogos amadores, resolveram explorar as cavernas do
chamado círculo d’Estre, na região do rio Ardèche. Em expedições anteriores, haviam achado uma cavidade
pequena que apresentava uma corrente de ar. Desta feita, contudo, resolveram verificar se era ou não a
entrada de uma gruta. Quando finalmente o grupo entrou na gruta, realizou uma inspeção prévia, e ficou
58
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
óbvio para todos que aquele lugar, provavelmente, servira de abrigo para homens pré‑históricos. Porém, a
grande emoção só ocorreu quando pensavam em sair do local, pois uma das pessoas do grupo iluminou
as paredes, e eles puderam visualizar as pinturas e gravuras rupestres representadas com tanto realismo.
Além de ser o último descobrimento em relação a sítios de arte rupestre, o que mais ocasionou o
repentino interesse dos pesquisadores pela gruta? O que o fez foram as datações iniciais com carbono 14,
que comprovaram que as pinturas e gravuras não eram do período áureo da arte rupestre, como se
pensava pelas análises interpretativas – ou seja, não eram do final do Paleolítico Superior, mas sim dos
primórdios dessa arte durante o período aurignaciano.
As datações a partir dos carvões vegetais presentes nas pinturas e nos resíduos de tochas da gruta
comprovaram que o local fora ocupado em dois momentos pelos homens do Paleolítico. A primeira
ocupação teria ocorrido em torno do período de 32.000 a.C. a 29.000 a.C. A segunda ocupação, por sua
vez, seria do período que de 27.000 a.C. a 24.500 a.C. Essas ocupações englobariam então os períodos
aurignaciano e gravetiano.
Apesar dessa datação com o carbono 14, a discussão sobre a antiguidade desse sítio continuou
sendo resolvida somente em 2012, quando as pesquisas geológicas comprovaram que a entrada da
gruta tinha sido vedada por um terremoto há mais de 21 mil anos.
A arte rupestre da gruta de Chauvet é, atualmente, a representação humana mais antiga da Europa.
Esse status permanece, pelo menos, até que se faça uma nova datação radioativa da arte parietal da
gruta de El Castillo, na Espanha, a que se tem atribuído, inicialmente, uma idade de 40 mil anos.
Lembrete
Mas por que tanta polêmica em torno da datação desse sítio de arte rupestre?
Toda essa discussão deve‑se ao realismo, à elegância dos traços, ao sombreamento e ao dinamismo
das imagens que levaram os pesquisadores a classificarem essa arte rupestre como contemporânea de
Altamira e Lascaux.
59
Unidade I
O dinamismo e o realismo das representações são tão surpreendentes que podemos imaginar a cena
de criação dessa arte: o artista paleolítico, com a ajuda de tochas para iluminar seu caminho, adentra
a gruta e, ao encontrar o local ideal, pinta e grava animais de seu cotidiano. A possibilidade de que a
gruta seja local de hibernação de ursos durante o inverno não desanima; ao contrário, parece ser fonte
de inspiração, como mostra a figura do urso desenhado na parede da gruta.
Como podemos observar na figura do urso, o artista lidava com o movimento e a perspectiva.
Aproveitava‑se das saliências e reentrâncias das paredes para conseguir o volume e representar a
musculatura das figuras, recriando o movimento e a ação.
Na pintura, os materiais mais usados eram o carvão, a argila vermelha e outros pigmentos minerais,
sendo as cores mais comuns o preto, o vermelho e o amarelo. Uma técnica utilizada nesse local era a
raspagem da superfície parietal até surgir uma camada mineral branca, onde os gravadores talhavam
com pedras as figuras por eles escolhidas, ou alguns pintores realizavam seus desenhos.
Muitas figuras eram diretamente esboçadas nas paredes com carvão vegetal sem a raspagem prévia.
Havia uma variedade de animais representados, como mamutes, cavalos, rinocerontes, leões, cervos
gigantes (megáceros), ursos e até mesmo representações únicas no mundo, como panteras e corujas.
Outra temática identificada foi a representação de mãos, principalmente, as que utilizavam a técnica de
passar tinta na parede e depois apoiar as mãos de modo que deixassem uma impressão.
60
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Saiba mais
E no Neolítico, com todas as mudanças que ocorreram, a arte continuava igual à do Paleolítico?
Mas não foi apenas a maneira de desenhar e pintar que sofreu modificações.
Os próprios temas da arte mudaram: começaram as representações da
vida coletiva. Como as pessoas passaram a serem representadas em suas
atividades cotidianas, um novo problema se colocou para o artista: dar ideia
de movimento através da imagem fixa [...]. E o artista do Neolítico conseguiu
isso de maneira eficiente, como se pode notar nas pinturas de cenas de
danças coletivas, possivelmente ligadas ao trabalho de plantio e de colheita.
61
Unidade I
Na região chamada de Levantino Espanhol, que engloba lugares como Valência, Castellón, Alicante,
Teruel, Lérida e Barcelona, entre outras, existe uma expressiva representação de arte rupestre que
data do final do Paleolítico e do Neolítico. Assim, a arte rupestre dessa região apresenta as principais
características da pintura neolítica citadas anteriormente. As representações levantinas esquematizam
a figura a tal ponto que podem ser reduzidas a ideogramas. O ser humano, muitas vezes, é representado
com traços que aludem à cabeça, ao tronco e às extremidades.
Mas não há uma norma que tenha validade universal para explicar a arte
esquemática: em cada cova ou em cada abrigo há soluções diferentes, o que
não impede estabelecer nexos ou círculos artísticos. Os paralelismos podem
ser fixados no campo da cor [...], nos recursos utilizados para sintetizar as
figuras, no ritmo das composições [...].
As pinturas neolíticas estão já muito perto dos esquemas que deram vida
às primeiras formas de escritura de algumas culturas (LOPERA, 1995, p. 26).
62
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Assim, o caminho da arte rupestre é longo, percorrendo um trajeto que vai do naturalismo e de uma
representação da realidade até as figuras esquemáticas quase abstratas, antecipando nossa tendência
contemporânea ao abstracionismo.
Saiba mais
Exemplo de aplicação
Escolha uma imagem de arte rupestre do Paleolítico e uma do Neolítico e compare‑as, descrevendo
as características presentes em cada uma.
63
Unidade I
Acredita‑se que o homem pré‑histórico desse ênfase ao corpo feminino, pois ele representava a
fecundidade. Estátuas com formas femininas foram encontradas em quase todos os lugares por onde
ele passou.
Por serem representações femininas, essas estátuas receberam a denominação de “Vênus”. Eram
pequenas, mais ou menos do tamanho da palma da mão. Sobre o assunto, afirma Proença (1995, p.
12): “Predominam as figuras femininas com a cabeça surgindo como prolongação do pescoço, seios
volumosos, ventre saltado e grandes nádegas”.
Assim, todas apresentam um estilo comum: o corpo feminino é apresentado com um grande realismo
anatômico, apesar de exagerado, e o rosto está praticamente ausente ou é pouco detalhado. A mínima
preocupação com o rosto, as pernas e os braços contribui para a hipótese de que essas figuras fossem
realmente ligadas ao culto da fertilidade.
Esculpidas em marfim, madeira, pedra e ossos ou modeladas em terracota, por suas dimensões tão
pequenas, as estátuas podiam ser facilmente transportadas e, consequentemente, difundidas por esse
homem nômade que buscava na caça e na coleta a sua forma de sobrevivência.
Saiba mais
64
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Figura 40 – Vênus de Lespugue, França (réplica) Figura 41 – Vênus de Brassempovy, França (réplica)
65
Unidade I
Além do tempo conquistado por não precisar mais buscar a subsistência de modo tão desgastante,
esse nosso antecessor não precisa mais mudar‑se com regularidade. Pode, então, passar a pensar na
construção de moradias utilizando matérias mais resistentes, como a pedra e o adobe, pois, para
alguém que precisa se proteger do frio e das intempéries da vida, nada melhor do que um abrigo
resistente e seguro.
É então que grupos agricultores se estabelecem próximo aos rios e lagos para garantir condições
favoráveis ao desenvolvimento da agricultura e iniciam, a partir da elevação de suas moradias, a
construção de aldeias. Dentre elas, vale notar que as estabelecidas na região dos rios Nilo, Tigre e Eufrates
deram origem às civilizações egípcia e mesopotâmica.
66
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Ainda no período Neolítico, encontramos os chamados monumentos “megalíticos”, que são blocos
de pedras de dimensões gigantescas, provavelmente associados a questões de caráter religioso, já
que, na maioria das vezes, encontram‑se junto a eles sepulturas que apresentam um padrão de
enterramento. Esses monumentos aparecem dispostos de formas variadas, como, muitas vezes, numa
única estrutura de pedra fincada ao chão – menir, duas estruturas com mais uma sobreposta ou,
ainda, estruturas dispostas em forma de círculos.
Observação
67
Unidade I
Figura 46 – Stonehenge
O que levaria esse homem neolítico, que não conhecia a roda ou a carroça, a carregar enormes
rochas com cerca de quatro toneladas cada e empilhá‑las a mais de 320 quilômetros de distância do
lugar de onde foram retiradas?
68
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Saiba mais
300. Direção Zack Snyder. EUA: Warner Bross, 2007, 117 min.
69
Unidade I
Observação
Além da arquitetura, você imagina outras mudanças tecnológicas relacionadas com as novas
condições econômicas e sociais do homem do Neolítico? Com o excedente de produção, cresce a
preocupação em armazenar os grãos em recipientes e, assim, surge a cerâmica. É provável, entretanto,
que essa técnica tenha se desenvolvido graças a uma boa dose de acaso e observação. Acredita‑se que,
ao observar o que ocorria com a argila quando entrava em contato com o fogo, o homem tenha
criado essa nova técnica.
A metalurgia é outro destaque que surge no Neolítico, já em sua fase final, permitindo que, aos
poucos, o homem do período possa substituir os instrumentos de pedra.
O conhecimento que foi se acumulando a partir da fusão de cobre, estanho, bronze, até chegar
ao ferro fortaleceu sobremaneira os grupos que puderam desenvolver essas técnicas, contribuindo,
então, para o exercício de supremacia na defesa e consolidação de seu território, o que coopera com a
sedentarização, que tem como consequência a formação das primeiras civilizações.
70
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Para o escultor que usava o método da fôrma de barro, o primeiro passo consistia em fazer uma
fôrma com esse material. Nela era despejado o metal já derretido em fornos. O metal fundido era
deixado dentro da fôrma até que esfriasse. Depois de frio, a fôrma era quebrada. Obtinha‑se, assim, uma
escultura com uma configuração anteriormente dada ao barro.
Já o trabalho do artista que usava a técnica da cera perdida começava com a construção de um
modelo em cera. Esse modelo era revestido de barro aquecido. Com o calor do barro, a cera derretia e
escorria por um orifício que era propositalmente deixado na peça de cerâmica. Obtinha‑se, assim, um
objeto oco. Depois, por esse mesmo orifício, preenchia‑se o objeto com metal fundido. Quando o metal
estivesse derretido e frio, quebrava‑se o molde de barro. Dentro dele estava a escultura em metal igual
à que ele tinha moldado em cera (PROENÇA, 2000, p. 15).
Essa ordenação do mundo através de imagens, da criação de símbolos não pode ser considerada
obra do acaso, deve ser admitida como representação do comportamento simbólico e social dos
grupos que a produziram.
71
Unidade I
Resumo
73
Unidade I
74
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
Exercícios
Questão 1. O conceito de arte é abrangente e não consensual. Autores de diferentes épocas têm
posicionamentos distintos acerca do que pode ou não ser considerada arte. Observe as imagens que seguem:
I −
Figura 49 – Operários, de Tarsila do Amaral (1933)
76
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
II −
Figura 50 – Coruja
III −
Figura 51
77
Unidade I
IV −
Figura 52 – Busto
De acordo com os posicionamentos adotados neste livro-texto acerca do conceito de arte, podem
ser consideradas obras artísticas apenas as imagens:
A) I e IV.
C) I, II e IV.
D) I, III e IV.
E) II e III.
I – Afirmativa correta.
Justificativa: a pintura Operários, de Tarsila do Amaral, é uma obra artística. Retrata o momento
da industrialização brasileira, principalmente a paulistana. Com Getúlio Vargas, o país passou a se
industrializar e a classe operária começou a surgir. O quadro mostra a diversidade cultural de um povo
78
ARTES VISUAIS NA HISTÓRIA ANTIGA
oprimido pela elite, representada pela fábrica ao fundo. Embora as pessoas estejam em primeiro plano
e todas tenham traços diferentes, não é fácil diferenciá-las. Elas parecem todas iguais, representando,
portanto, um sistema que massifica o cidadão.
II – Afirmativa correta.
Justificativa: a coruja, feita com fios de cobre por um artista popular da cidade mineira de São
Thomé das Letras comprova a ideia de que a arte é resultado de uma imaginação criadora. O homem, ao
criar uma obra artística, transmite suas ideias de múltiplas e variadas formas. Recria o ambiente ao seu
redor e a si mesmo em um processo carregado de símbolos passíveis de diversas interpretações.
Justificativa: a bola está sendo mostrada como objeto utilitário. Não há, nesta imagem, nenhuma
intenção artística.
IV – Afirmativa correta.
Justificativa: a escultura do busto, feita em argila, é uma criação artística, pois o escultor, ao criá-la,
representou simbolicamente o universo ao seu redor, a sua forma de ver o mundo. A obra artística é
repleta dos sentimentos e das emoções do seu criador.
Questão 2. Há, entre as esculturas do Período Paleolítico, predomínio de figuras femininas e ausência
de figuras masculinas. As mulheres são comumente representadas com ancas largas e seios grandes.
Essas características, observadas por estudiosos e historiadores, conduzem-nos à interpretação de que
a arte paleolítica:
A) Alternativa incorreta.
Justificativa: a representação da figura feminina com ancas largas e seios grandes não tem relação
com o padrão estético de beleza da época.
79
Unidade I
B) Alternativa correta.
Justificativa: com base nos vestígios encontrados, atribui-se às “Vênus” as primeiras formas de arte
conhecidas pelo homem. Essas esculturas femininas com ancas largas, seios grandes e poucos detalhes no
rosto foram produzidas no Paleolítico Superior (30.000 a 18.000 a.C). Esculpidas em pedra ou marfim, elas
têm pequenas dimensões e estão associadas ao culto à fertilidade. A chamada Vênus de Willendorf é uma das
inúmeras estatuetas da fertilidade e, em forma arredondada e bulbiforme, sugere um “seixo sagrado” oval.
C) Alternativa incorreta.
Justificativa: a representação da figura feminina com ancas largas e seios grandes não tem relação
com a valorização do erotismo.
D) Alternativa incorreta.
Justificativa: a representação da figura feminina com ancas largas e seios grandes não tem relação
com a valorização da sexualidade.
E) Alternativa incorreta.
Justificativa: a representação da figura feminina com ancas largas e seios grandes não tem relação
com a valorização do ideal de sobrevivência.
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