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TEMAS LIVRES FREE THEMES


Avaliação de interações medicamentosas potenciais
em prescrições da atenção primária
de Vitória da Conquista (BA), Brasil

Evaluation of potential drug interactions in primary health care


prescriptions in Vitória da Conquista, Bahia (Brazil)

Danyllo Fábio Lessa Leão 1


Cristiano Soares de Moura 1
Danielle Souto de Medeiros 1

Abstract Drug interactions are risk factors for Resumo As interações medicamentosas são fato-
the occurrence of adverse drug reactions. The risk res de risco para a ocorrência de reações adversas
for drug interactions includes factors related to a medicamentos. Este estudo teve o objetivo de
prescription that are intrinsic to the patient. This avaliar as interações medicamentosas potenciais
study sought to evaluate the potential drug inter- em prescrições da atenção primária de Vitória da
actions in primary care prescriptions in Vitória Conquista (BA), visando preencher a lacuna de
da Conquista in the state of Bahia to fill the knowl- conhecimento sobre essa temática no Brasil. Fo-
edge gap on this topic in Brazil. Information about ram coletadas informações sobre diversas variá-
several variables derived from the primary health veis de prescrições oriundas da atenção primária
care prescriptions was collected and drug inter- e as interações medicamentosas avaliadas a par-
actions were evaluated based on information from tir dos bancos de dados do Medscape e Microme-
Medscape and Micromedex® databases. Polyphar- dex®. Verificou-se ainda a frequência de polifar-
macy frequency and its association with the oc- mácia e associação desta com a ocorrência de in-
currence of drug interactions were also evaluat- terações medicamentosas. Os resultados mostra-
ed. Results revealed a 48,9% frequency of drug ram frequência de 48,9% de interações medica-
interactions, 74,9% of moderate or greater sever- mentosas, 74,9% delas de gravidade moderada ou
ity, 8,6% of prescriptions in polypharmacy that maior, e 8,6% de prescrições em polifarmácia que,
in the chi-square test showed a positive associa- em teste qui-quadrado, mostrou associação posi-
tion with the occurrence of drug interactions (p tiva com ocorrência de interações medicamento-
< 0,001). Prescriptions from primary care in sas potenciais (p < 0,001). As prescrições oriun-
Vitória da Conquista in the state of Bahia showed das da atenção primária de Vitória da Conquista
a high frequency of drug interactions, however it (BA) apresentaram uma alta frequência de inte-
is necessary to analyze other risk factors for their rações medicamentosas, porém faz-se necessária
occurrence at this level of health care. a análise de outros fatores de risco para ocorrên-
1
Instituto Multidisciplinar Key words Drug interactions, Polypharmacy, cia destas nesse nível de atenção à saúde.
em Saúde, Universidade Primary health care, Prescription quality Palavras-chave Interação medicamentosa, Poli-
Federal da Bahia. R. Rio de
Contas 58/Quadra 17/Lote farmácia, Atenção Primária, Qualidade de pres-
58/Pavilhão de Aulas IMS/ crição
UFBA, Candeias.
45.029-094 Vitória da
Conquista BA Brasil.
danyllolessa@gmail.com
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Leão DFL et al.

Introdução tratamentos empíricos11, torna-se relevante a rea-


lização de estudos acerca desse tema.
O conceito de interação medicamentosa baseia- O presente trabalho objetivou avaliar intera-
se na resposta farmacológica ou clínica oriunda ções medicamentosas potenciais através da aná-
da interferência da ação de um determinado me- lise de prescrições da atenção primária de Vitória
dicamento, alimento ou qualquer substância da Conquista (BA).
química sobre o efeito de outro medicamento,
administrado previamente ou em concomitân-
cia ao primeiro1,2. Métodos
As interações entre medicamentos podem ser
classificadas em sinérgicas, quando o efeito da Este trabalho faz parte da pesquisa intitulada
interação é maior que o efeito individual dos “Avaliação de prescrições dispensadas em Uni-
medicamentos, e antagônicas, quando o efeito dades de Saúde em Vitória da Conquista (BA)”,
da interação é menor que o efeito individual dos inserida no Programa Educação pelo Trabalho
medicamentos ou quando há alteração/anula- (PET) – Saúde da Família do Ministério da Saú-
ção da resposta farmacológica dos mesmos. O de. Trata-se de um estudo de delineamento trans-
mecanismo de interação medicamentosa pode ser versal, realizado na farmácia da Unidade de Saú-
de caráter físico-químico, farmacodinâmico ou de da Família Urbis V, localizada na zona urbana
farmacocinético3. de Vitória da Conquista (BA). Os dados foram
Diversos são os fatores de risco para a ocor- obtidos dos registros de prescrições atendidas
rência de interações medicamentosas, sendo es- na referida unidade no período de julho a de-
tes relacionados à prescrição, onde o aumento zembro de 2010.
do risco de interações é diretamente proporcio- Somente foram incluídas as prescrições com
nal à quantidade de medicamentos prescritos4; segundas vias arquivadas e separadas por mês e
condições intrínsecas ao paciente, como idade, ano em que foram atendidas. Prescrições que
sexo e condições de saúde; e fatores intrínsecos continham um único medicamento foram ex-
ao medicamento, principalmente o índice tera- cluídas, por não apresentarem risco de interação
pêutico. A presença de um ou mais fatores de medicamentosa. A partir do universo de 2399
risco de interação medicamentosa aumenta a prescrições do período, foi selecionada uma
complexidade de uma prescrição5,6. amostra probabilística, cujo tamanho foi calcu-
Interações medicamentosas potenciais, capa- lado com base nos seguintes parâmetros: fre-
zes de resultar em reações adversas, constituem quência antecipada do evento de 50%, precisão
um importante indicador de qualidade de pres- estimada em 5%, intervalo de confiança de 95% e
crição. Esse indicador é mensurado pelo grau de efeito de desenho igual a 1, resultando em uma
polifarmácia do indivíduo, ou seja, pela quanti- amostra de 332 prescrições. A esse número foi
dade de medicamentos contidos na prescrição7. acrescentado 10% para antecipar eventuais per-
Em 2010, Fröhlich et al. evidenciaram que o das, o que resultou em 365 prescrições.
aumento da complexidade da prescrição susceti- As informações coletadas nas prescrições fo-
biliza o indivíduo a interações medicamentosas, ram: nome do medicamento, identificação da via
possíveis reações adversas, surgimento de comor- de administração, identificação da forma farma-
bidades e, consequentemente, diminuição da sua cêutica, dose, frequência, duração do tratamen-
qualidade de vida6. to e recomendações de uso. Foram coletados
Dados encontrados na literatura revelaram dados de todos os medicamentos prescritos, mas
que a incidência de internações hospitalares em a análise de interações excluiu os fitoterápicos e
decorrência de interações medicamentosas pode os princípios ativos como vitaminas, sais mine-
chegar a 2,8%8. rais e componentes da dieta.
A maior parte das investigações sobre intera- Para avaliação de interações medicamento-
ções medicamentosas foi conduzida em ambien- sas potenciais, foi utilizada parte da metodologia
te hospitalar2,9,10. Por outro lado, no Brasil, há descrita no trabalho de Moura et al.2. As intera-
lacunas de conhecimento sobre a ocorrência de ções detectadas neste estudo são consideradas
interações na atenção primária à saúde. De fato, potenciais porque expressam a possibilidade de
devido às particularidades desse nível de aten- ocorrência de uma interação, cuja manifestação
ção, onde é habitual que os pacientes manifes- clínica pode ter ocorrido ou não12. As interações
tem sinais e sintomas precoces das enfermida- medicamentosas foram identificadas a partir de
des, que muitas vezes implicam em condutas e duas bases de dados informatizadas, o Drug In-
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teraction Checker13, do Medscape e o University clorotiazida (3,6%). Ibuprofeno, paracetamol,
of Maryland Medical Center Drug Checker14, base omeprazol e hidroclorotiazida também estavam
de dados do Micromedex®. Foram consideradas entre os dez medicamentos mais prescritos em
as interações fármaco-fármaco contidas em uma um estudo realizado na atenção primária da Re-
mesma prescrição. Nos casos de discordância gião da Múrcia (Espanha). Os autores ainda re-
entre as bases quanto à classificação de intera- latam que estes, exceto o paracetamol, estão en-
ção, foi adotada a de menor gravidade. tre os seis medicamentos mais frequentemente
A partir das informações disponíveis nas ba- implicados em interações graves, por isso foram
ses consultadas, as interações medicamentosas incluídos em uma escala com classificação de
foram descritas quanto às reações adversas po- perigo alto e extremo17.
tenciais e classificadas quanto à gravidade (me- Dentre os medicamentos analisados (N =
nor ou não significante, moderada ou signifi- 975), 35,0% apresentaram a via de administração
cante e maior ou muito significante), que leva em registrada na prescrição, 75,9% a forma farma-
consideração o risco de efeitos clínicos, e quanto cêutica, 75,2% tinham dose do medicamento es-
ao mecanismo de interação (em farmacocinéti- pecificada, 96,4% apresentaram frequência de uso,
co, farmacodinâmico, físico-químico ou misto/ 39,6% indicavam duração do tratamento e 53,2%
desconhecido). recomendações de uso para o medicamento.
As prescrições foram classificadas como em É preocupante a baixa frequência de infor-
polifarmácia com base no número de medica- mações sobre a duração de tratamento e reco-
mentos prescritos; foram consideradas em poli- mendações de uso nas prescrições analisadas,
farmácia as prescrições que continham cinco ou uma vez que a ausência desses itens pode resultar
mais medicamentos15. em tempo e forma de uso inadequado, aumen-
Os dados foram armazenados em software tando os riscos de ocorrência de efeitos não de-
QDS (Questionnaire Development System), ver- sejados, como a intoxicação medicamentosa, in-
são 2.6.1. Foram realizadas análises descritivas terações e reações adversas a medicamentos.
dos dados através de distribuição de frequência, Observou-se ainda que para a maior parte dos
medidas de tendência central (média ± desvio medicamentos prescritos a via de administração
padrão ou mediana) e dispersão das diferentes não havia sido especificada e para aproximada-
variáveis do estudo. O intervalo de confiança a mente 1/4 dos itens a forma farmacêutica estava
95% (IC95%) para a frequência de interações foi ausente. Tais falhas podem predispor a erros de
estimado com base em um método exato (mid- dispensação, que podem interferir diretamente
P exato) e o teste qui-quadrado foi empregado na segurança e eficácia do tratamento farmaco-
para avaliar a associação entre polifarmácia e lógico18,19. Resultados semelhantes foram encon-
interação medicamentosa. As análises foram exe-
cutadas no programa Epi-Info, versão 3.5.3.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Co-
mitê de Ética em Pesquisas da Secretaria Estadual
de Saúde do Estado da Bahia, de acordo com a Tabela 1. Medicamentos mais frequentes em
resolução Nº 196/96 do Conselho Nacional de prescrições da Unidade de Saúde da Família Urbis
Saúde16. Termo de consentimento da instituição V, Vitória da Conquista, Bahia, Brasil, julho a
foi obtido para permitir o acesso às prescrições dezembro de 2010.
dos usuários. Foi garantida a confidencialidade
Fármaco N %
das informações, não havendo risco de divulga-
ção dos dados pessoais obtidos a partir das pres- Ibuprofeno 130 13,3
crições. Paracetamol 93 9,5
Amoxicilina 68 7,0
Dexclorfeniramina 47 4,8
Hidroclorotiazida 35 3,6
Resultados e discussão
Metronidazol 32 3,3
Loratadina 32 3,3
Foram analisadas 350 prescrições, que apresen- Dipirona 31 3,2
taram média de 2,8 ± 1,2 medicamentos por pres- Omeprazol 29 3,0
crição. Os medicamentos mais comumente pres- Enalapril 20 2,1
critos estão dispostos na Tabela 1 e incluem ibu- Cefalexina 20 2,1
profeno (13,3%), paracetamol (9,5%), amoxici- Outros 438 44,9
lina (7,0%), dexclorfeniramina (4,8%) e hidro- Total 975 100,0
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Leão DFL et al.

trados em medicamentos prescritos na atenção o momento, a maioria dos estudos realizados


primária da Província Riyadh (Arábia Saudita), no Brasil sobre interação medicamentosa na aten-
onde a forma farmacêutica, a dose e a via de ad- ção primária limitou-se à inclusão de algumas
ministração em 21,7%, 8,8% e 99,6%, respectiva- classes terapêuticas e dispuseram de uma peque-
mente, não estavam presentes20. na população de estudo, dificultando a compa-
A frequência de interações medicamentosas ração dos seus resultados com os dados desta
nas prescrições do estudo foi de 48,9%, com pesquisa.
média de 0,80 interações por prescrição. Em re- Por outro lado, há mais investigações sobre
lação à gravidade, 71,7% das interações medica- interações medicamentosas em prescrições da
mentosas foram consideradas de gravidade mo- atenção primária em outros países. Lopez-Pica-
derada (ou significante), sendo suas consequên- zo et al., em estudo realizado na atenção primá-
cias exigentes de tratamento e monitoramento. ria da Região da Múrcia (Espanha), encontra-
Para 3,2% das interações, a gravidade foi consi- ram prevalência de interações de 5,8%, sendo
derada maior (ou de relevância muito signifi- 50,0% dessas consideradas graves; a interação
cante), situações nas quais pode haver uma rea- mais frequente foi entre omeprazol e diazepam17.
ção adversa grave, com risco de morte (Tabela Doubova-Dubova et al., relataram em estudo re-
2). Os pares de medicamentos mais envolvidos alizado no México, que cerca de 80% das prescri-
em interações incluem os anti-inflamatórios não ções ambulatoriais em pacientes com mais de 50
esteroidais, anti-hipertensivos (inibidores da anos de idade apresentavam pelo menos uma
ECA, diuréticos, β-bloqueadores), antibióticos e combinação com risco potencial de interação me-
antiasmáticos (Tabela 3). dicamentosa. Nesse estudo, 64,0% das interações
No âmbito nacional, poucos estudos retra- foram classificadas com gravidade moderada e
taram o perfil das interações medicamentosas na cerca de 40% das interações medicamentosas en-
atenção primária. Em farmácias públicas de São volviam a combinação de anti-inflamatórios não
Paulo foram encontradas interações medicamen- esteroidais com anti-hipertensivos23. Fiss et al.
tosas em 8,0% das prescrições que continham avaliaram a ocorrência de interações medicamen-
antibióticos. Dessas interações, 57,1% foram clas- tosas em prescrições de pacientes inseridos no
sificadas como interação de baixa gravidade e modelo de atenção multidisciplinar em saúde em
cerca de 42,9% consideradas de gravidade mo- áreas rurais da Alemanha. Naquele estudo, foi
derada21. A presença de interações medicamen- encontrada frequência de 44,6% de interações me-
tosas também foi descrita em 19 das 29 prescri- dicamentosas relevantes e as classes mais envol-
ções que combinavam anti-hipertensivos, anti- vidas foram os analgésicos, antagonistas dos β-
depressivos e hipoglicemiantes em pesquisa de- receptores, inibidores da ECA e alguns minerais24.
senvolvida em Minas Gerais22. É notável que, até Em dois outros estudos, que propuseram meto-
dologias diferenciadas de determinação de inte-
rações, 13,9 a 15,0% das prescrições com terapia
medicamentosa combinada continham intera-
ções medicamentosas consideradas de gravidade
maior, capazes de desencadear uma reação ad-
Tabela 2. Frequências absoluta e relativa de interações
medicamentosas em prescrições da Unidade de Saúde da versa ao medicamento25,26. Divergências entre os
Família Urbis V, Vitória da Conquista, Bahia, Brasil, julho a resultados encontrados no presente trabalho e
dezembro de 2010. os estudos mencionados podem ser atribuídas
aos métodos empregados para a classificação de
N % IC95%
interações e ao perfil da população estudada.
Gravidade da interação O mecanismo de interação medicamentosa
Menor ou não significante 70 25,1 (20,3–30,4) mais comumente encontrado foi o farmacociné-
Moderada ou significante 200 71,7 (66,2–76,7) tico, representando 45,2% do total de interações
Maior ou muito significante 9 3,2 (1,6–6,8) analisadas, seguido do mecanismo farmacodi-
Total 279 100,0 nâmico que representou 40,4% e, por fim, 14,3%
Mecanismo de interação
apresentaram tanto mecanismo de interação
Farmacocinético 123 44,1 (38,3–50,0)
Farmacodinâmico 110 39,4 (33,8–45,3)
misto, unindo interação farmacocinética com
Físico-Químico 0 0,0 (0,0–1,1) farmacodinâmica, quanto desconhecido (Tabela
Misto/Desconhecido 39 14,0 (10,3–18,4) 2). As interações encontradas no trabalho de
Não classificado 7 2,5 (1,1–4,9) Coelho e Brum em São Paulo envolveram por-
Total 279 100,00 centagem distinta de mecanismo farmacocinéti-
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Tabela 3. Interações medicamentosas mais encontradas e suas consequências potenciais em prescrições da
Unidade de Saúde da Família Urbis V, Vitória da Conquista, Bahia, Brasil, julho a dezembro de 2010.
Interação medicamentosa % (IC95%) Efeito adverso potencial Gravidade
Amoxicilina e ibuprofeno 13,6 (10,0–18,0) Interferência nos níveis Moderada ou
plasmáticos de ambos por significante
competição em proteína de
ligação e clearence renal
Enalapril e hidroclorotiazida 4,3 (2,4–7,2) Hipotensão Moderada ou
significante
Ibuprofeno e omeprazol 4,3 (2,4–7,2) Aumento do nível ou efeito do Menor ou
ibuprofeno por interferência do não
metabolismo hepático significante
Sulfametoxazol e trimetoprima 3,9 (2,1–6,8) Arritmia cardíaca Moderada ou
significante
Cefalexina e ibuprofeno 2,2 (0,9–4,4) Aumento do nível ou efeito do Menor ou
ibuprofeno por interferência no não
clearence renal significante
Hidroclorotiazida e ibuprofeno 2,2 (0,9–4,4) Alteração na concentração sérica Moderada ou
de potássio significante
Hidroclorotiazida e propranolol 2,2 (0,9–4,4) Alteração na concentração sérica Moderada ou
de potássio significante
Ácido acetilsalicílico e hidroclorotiazida 1,8 (0,7–3,9) Alteração na concentração sérica Moderada ou
de potássio significante
Budesonida e loratadina 1,8 (0,7–3,9) Aumento do nível ou efeito de Moderada ou
ambos por interferência do significante
metabolismo hepático e bomba
de efluxo (glicoproteína P)
Outras 63,7 (58,0–69,3) Não se aplica Não se aplica
Total 100,0

co e farmacodinâmico deste estudo (23,4% e o uso concomitante de fármacos envolvidos em


61,7%, respectivamente), sendo 15,9% de meca- interações medicamentosas potenciais é feito com
nismo misto. Essa diferença pode ser explicada cautela; substituição, quando há uma alternati-
pelo fato da pesquisa destes autores incluírem va terapêutica mais segura e eficaz; resposta tera-
apenas antidepressivos, anti-hipertensivos e hi- pêutica, quando o monitoramento é realizado a
poglicemiantes orais, predominando as intera- partir da resposta farmacológica de um ou mais
ções entre fluoxetina e diuréticos - hidroclorotia- fármacos; evitar, quando não é recomendado o
zida e furosemida (19,2%); fluoxetina e inibido- uso concomitante dos fármacos; horário, quan-
res da ECA – captopril e enalapril (10,6%); e imi- do se recomenda alterar o horário de adminis-
pramina e β-bloqueadores – propranolol e ate- tração dos medicamentos; dentre outros27,28.
nolol (10,6%); que apresentam mecanismo de Verificou-se que 8,6% das prescrições da Uni-
interação farmacodinâmico22. dade de Saúde estudada apresentavam polifar-
O manejo para prevenção ou resolução das mácia; nesse grupo de prescrições, a frequência
interações medicamentosas potenciais pode ser de interações foi superior a 80%, valor significa-
realizado a partir de parâmetros sugeridos pelas tivamente maior do que o grupo de prescrições
bases de dados consultadas, em que se preconi- sem polifarmácia (45,6%; p < 0,001). Estudo re-
za: ajuste de dose, quando se recomenda a dimi- trospectivo com prescrições ambulatoriais reali-
nuição ou o aumento da dose dos fármacos en- zado em Taiwan mostrou resultados semelhan-
volvidos em interações medicamentosas; moni- tes aos deste trabalho, onde 67,7% dos pacientes
toramento, quando se determinam as concen- com prescrições que apresentavam interação
trações séricas destes fármacos; precaução, onde medicamentosa potencial também continham
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quatro ou mais medicamentos prescritos, suge- Em contrapartida, este é um estudo relevante, já


rindo associação entre polifarmácia e interação que ajuda a preencher lacuna de conhecimento
medicamentosa29. sobre interação medicamentosa na atenção pri-
A principal limitação deste estudo refere-se mária à saúde no país.
ao fato das prescrições arquivadas na farmácia
da Unidade de Saúde não conterem informações
sobre idade, sexo, diagnóstico, condições de saú- Conclusões
de e coprescrições dos pacientes, impossibilitan-
do, dessa forma, a análise de outras variáveis A análise das prescrições oriundas da atenção
que predispõem ao risco de ocorrência de intera- primária de Vitória da Conquista sugere fre-
ções medicamentosas. A impossibilidade de ve- quências elevadas de interações medicamentosas
rificar, seja por análise de prontuário ou acom- potenciais de gravidade moderada e maior. Ade-
panhamento dos pacientes, se interações resul- mais, a associação encontrada entre polifarmá-
taram em reações adversas é outra limitação im- cia e interações reforça a necessidade de acompa-
portante do estudo. As bases de dados utilizadas nhamento farmacoterapêutico mais rigoroso.
para detecção de interações medicamentosas (o Cabe ressaltar que o Brasil ainda não possui um
Drug Interaction Checker - Medscape e o Univer- sistema informatizado de registros que contem-
sity of Maryland Medical Center Drug Checker - ple informações sobre o histórico do paciente em
Micromedex®) não continham informações acer- todos os níveis de atenção à saúde, o que dificul-
ca de alguns fármacos prescritos, como a dipiro- ta a realização desse tipo de estudo no país.
na, presente em 3,2% das prescrições analisadas.

Colaboradores

DFL Leão trabalhou na concepção e delineamen-


to, análise e interpretação dos dados e redação
do artigo; CS Moura na análise e interpretação
dos dados, revisão crítica e aprovação da versão
a ser publicada; e DS Medeiros na concepção e
delineamento, revisão crítica e aprovação da ver-
são a ser publicada.

Agradecimentos

Os autores agradecem a Rodrigo Damascena,


farmacêutico responsável pela Unidade de Saúde
da Família Urbis V e preceptor do PET - Saúde
da Família, e aos integrantes da linha de pesquisa
“Avaliação de prescrições dispensadas em Uni-
dades de Saúde em Vitória da Conquista (BA)”
inserida no PET - Saúde da Família.
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Artigo apresentado em 15/11/2012


Aprovado em 17/01/2013
Versão final apresentada em 29/01/2013

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